Pretendo saber se pode existir na ordem civil uma regra de
administração legítima e segura que considere os homens
tais como são e as leis como devem ser. Renunciar à liberdade é renunciar ao que mais qualifica o homem, aos direitos da humanidade, aos próprios deveres. Para quem renuncia a tudo não há qualquer compensação. Tal rellllncia é incompatível com a natureza do homem. Rouba às suas acções todo o sentido moral, quem retira do seu querer toda a liberdade. Enfim, é uma convenção contraditória e vã, aquela que estipula, por um lado, a autoridade absoluta e, por outro, uma obediência sem limites. Não é evidente que a nada se é obrigado para com aquele a quem se tem o direito de exigir tudo? E esta única condição, sem equivalente, nem retribuição não implica a nulidade do acto?
A vontade geral é sempre recta, mas o juízo que a guia nem
sempre é esclarecido. E necessário fazer ver ao povo as coisas tais como são, e algumas vezes, como devem parecer-lhe, indicar-lhe o bom caminho que procura, defendê-lo da sedução das vontades particulares, pôr-lhe perto dos olhos os lugares e os tempos, contrabalançar o atractivo das vantagens presentes e palpáveis, com o perigo de males distantes, e, ocultos. Os particulares vêem o bem que rejeitam, o povo quer aquele que não vê. Todos necessitam de guias. É preciso forçar uns a harmonizar as suas vontades com a razão; é preciso ensinar o outro a conhecer 6 que quer. Então, da instrução pública, resultará a união do entendimento e da vontade no conj unto social, para um mais exacto concurso das partes e, finalmente, uma maior força do todo. Veja-se agora, onde nasce a necessidade de um legislador.
A soberania não pode ser representada, porque não
consente alienação, consiste essencialmente na vontade geral e a vontade não tem representantes; ou é ela ou não é; não há meio-termo. Os deputados do pOVO não são nem podem ser seus representantes, não são mais do que elementos de uma comissão e nada podem concluir em definitivo. Toda a lei que o povo, pessoalmente, não ratifique, deve ser anulada; nunca será uma lei. O povo inglês julga ser livre mas está muito enganado; só o é durante a eleição dos membros do parlamento; logo que são eleitos, passa a ser escravo e nada é. Nos breves momentos em que goza de liberdade, faz tão mau uso dela, que bem merece perdê-la. Quando o povo está legitimamente reunido como soberano, imediatamente cessa toda a j urisdição do governo, fica suspenso O poder executivo, e a pessoa do último cidadão é tão sagrada e inviolável como a do primeiro magistrado porque, quando o representado está Presente, não é necessário o representante.