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Gênero textual e ensino

Outra iconicidade
DARCILIA SIMÕES
UERJ

1. Enquadre teórico
artindo de Ba~htin ([Voloshinov], 2003 1), entendemos que são rele-

P vantes para o ~ nsino de língua materna, no que se refere aos gêneros


tex~uais, as seguintes premissas: todos os campos da atividade huma-
na se ligam ao uso da linguagem; o emprego da língua ocorre por meio de
enunciados (orais ou escritos) concretos e únicos; os enunciados refletem as
condições e objetivos particulares de cada uso específico, documentando, por
meio da seleção lexical, recursos fraseológicos e gramaticais, um conteúdo e
um estilo peculiares.
Subjacente ao que estabelece o autor russo, estão a riqueza .e a diversi-
dade dos gêneros, com o possibilidades infinitas de expressão em decorrência
da infinitude da ação humana. A partir de tal heterogeneidade, os gêneros
do discurso oferecem um sem-número de opções de trabalho didático, com
o que se faz possível desenvolver o potencial comunicativo-expressivo dos
sujeitos. E mais, o autor de Marxismo efilosofia da linguagem apc-nta o gênero
como sendo o ponto de partida para um ensino proficiente, uma vez que porá
o estudante em contato direto com a língua em funcionamento. Essa obser-
vação decorre da certeza de que o domínio da língua não se faz por meio de
um convívio com dicionários e gramáticas, sist ema abstrato da língua que
a apresenta como uma forma idêntica a si mesma, senão, ao cc·nt rário, pelo
contato com enunciados reais que atestam a flexibilidade e a 'lariabilidade
dos signos verbais.
124 Darcilia Simões

Nessa linha de raciocínio e considerando a heterogeneidade dos gêneros


(primários e secundários - ou ideológicos), é que Bakhtin tenta demons-
trar a importáncia e a eficiência de um ensino de língua a partir dos gêneros
do discurso. É na diferença que se constrói a partir de certa estabilidade do
sistema linguístico que se pode constituir uma discussão das constantes na
verbalização que se especificam nas práticas reais de interação, segundo seus
temas e consequentes estilos. E é nesse ponto que nossas pesquisas e propos-
tas dialogam.

2. Preparando a prática
Rodrigues (in Meurer, Bonini e Mota-Roth, 2005: 153) selecionou trecho
bakhtiniano que achamos por bem transcrever:

A língua materna - sua composição vocabular e sua estrutura gramatical -


não chega ao nosso conhecirn entoa partir de dicionários e gramáticas, mas de
enunciações concretas [enunciados concretos] que nós mesmos ouvimos e nós
mesmos reproduzimos na comunicação discursiva viva com as pessoas que nos
rodeiam. Assimilamos as formas da língua somente nas formas das enunciações
[enunciados] e justamente com essas formas. As formas:da língua e as formas
típicas dos enunciados, i. e., os gêneros do discurso, cheg~m à nossa experiência
e à nossa consciência em conjunto e estreitamente vincuiadas. Aprender a falar
significa aprender a construir enunciados (porque falamos por enunciados e
não por orações isoladas e, evidentemente, não por palavras isoladas) (Bakhtin,
2003a (1952-1953]: 282 ~283) .

Ora, esse excerto trata da constatação absoluta do aprender pelo uso, ~

pela experiência. Como nosso.foco atual é a aqu isição lexical como condição
de desenvolvimento da competência verbal, temos de chamar à cena palavras
de Bazerman (in: Hoffnagel & Dionisio, 2006: 87): "Quase todas as palavras e
frases que usamos já havíamos ouvido ou visto an tes". No entanto, essa aqui-
sição tácita não resolve sozinha o desenvolvimento da competência verbal.
Como sujeitos ativos (ou atores) os falantes precisam saber/poder recombi-
G~ne ro textual e ensino 125

lexical em prol da gé:lrantia da interação. Assim sendo, Bakhtin e Bazerman


fornecem s ubs ídios para a produ ção de um ensino de língua flindado na ob-
servação e experimentação de práticas efetivas de lingu agem que, de algum
modo, servirão de modelo p ara novas práticas.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) fundamentam a prática
de ensino de língua portuguesa, em par te, n a teoria dos gêneros discursivas.
Aponta-se a relevJ ncia da compilação fe ita por Schnewly e Do lz em 2004 2
sobre o tema. No entanto, ainda se vê boa parte dos docentes e discentes per-
didos pelas vielas do ensino na travessia pelos gêneros. Há um equívoco fun-
damental quanto ao objeto. O estudo previs to é da língua e de suas estrutu ras
para a comunicação eficiente. No e nta nto, a cada novidade científica surg id a,
dá-se um deslu mbramento ante a possibil id ade de have r-se encontrado aso-
lução para o problema do en sino da língua. Em consequência, o obje to líng ua
é su bs titu ído por outros objetos que, além de não estarem adequados ao ní-
vel de ensino, não atingirão os objetivos fi nais d as aulas de língua portuguesa
como língua ma terna (ou L1 ), qu e é a aquis ição do uso padrão e o dese nvo lvi-
mento da competência de leitura e de expressão escri ta (ou redação).
Falamos disso muito à vontade, por virmos, há mais ou menos 20 anos,
tecendo estratégias s ubsidiadas pela sem iótica, em especial pela teoria da
iconicidade, para a melhoria da qualidade das au las de linguage m. Nessa tri-
lha, vem-se buscando compreender e fazer compreender as qualidades e vir-
tualid ades dos s ignJs para garantir a apropr iação destes, de modo que eles
possam ser recriado ~ a cada necessidade co mun icativa, sem, contudo, se p er-
derem de seu s istema gerador (o s is tema linguístico em uso numa dada co-
mu nidade, daí o interpretante). Entendemos que a capacidade de identificar
a força icônica ou indiciai do s signos verbais (Simões, 2009) é potencialidade
d e expressão eficiente.
É preciso então entend er que ensinar a língua por meio do estudo dos
gêneros não pode resulta r em ate nção exclusiva às caracter ísticas daqueles
sem atentar para os compo n entes linguísticos q ue os constituem e os qua-
lificam.Veja-se que u ma carta familiar se d is tingue de uma carta comercial
desde o trata me nto até a seleção vocabula r.
126 Darcilia Simões

li u strando: o pai fala ao filho sobre como ligar ou desligar a televisão,


e nq ua n to o manual d e in strução discorre so bre como ativar ou desativar o
receptor de TV. O m édico diz ao paciente que este fo i acometido por uma
in festa ção bacterian a severa, ao p asso que o doente relata à família que está
com uma infecção terríve l. A receita médica traz o no m e do medicamento
seguido da dosagem diária prescrita. A bula do remédio fala de posologia e
admin istração de doses. E assim por dia nte.
Ora, ao nd e se quer chegar? Ao simples entendimento de que ensinar e
a prender lí ngua demanda con hecer as peças da língua - vocábulos em geral -
e as regras de seleção e co mbinação dessas peças durante a realização dos
jogos co municativos.

3. Conteúdos a ensinar
Parece-nos des necessá rio discutir quais os conteúdos léxicos e gramati-
cais a ensinar. A princí pio, o falan t e precisa de tudo o que a língua lhe ofe rece,
para qu e se com uni que e m qualquer circunstância. Por isso, o convívio com
os textos é co ndição indispensável à aqu isição lexical e à incorporação de mo-
delos da estruturação linguística.
Segundo Marcuschi, os gé ne ros prestam grande se rviço ao ens ino da
língua. No entanto, alerta o estudi oso sobre o fato de serem os gêneros enti-
dades comun icativas, funcionais. Por isso, distingue m-se de acordo com suas
fun ções, propósitos, ações e co nteúdos. Logo, a ti picidade de um gênero deri-
va de suas características funcio na is e de s ua organi zação retórica. O au tor de
Análise da Conversação ainda informa que Carolin Myller (1984) sugere que
os gêneros são formas ve rbais de ação social estabilizadas e recorrentes em
texto s situados em comunidades de práticas em domín ios d iscursivos espe-
cíficos. Por isso, é-nos possível d istinguir, por exemplo, uma receita culinária
e um manual de ins trução. Cada um desses géneros traz, além do voca bulá-
rio a ltame nte especializad o, uma distribuição particular dos enunciados que
gera algo como uma image m genérica que a uxilia a ide ntifi cação automática
de d eterm inados géneros.
Gênero textual e en sino 127

RECEITA CULINÁRIA RECEITA MÉDICA


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128 · Darcilia Simões

Como se pode ver, a partir da imagem do texto (nosso objeto de estudo


é o texto escrito), torna-se possível identificar as diferenças organizaciot\ais
de cada gênero. Uns mais marcados (com particularidades mais destacadas),
outros menos. Essas marcas documentam a iconicidade dos gêneros. A ico-
nicidade verbal (Simões, 2009) se apresenta nos gêneros de forma clara, a
saber:
(a) vocabulário específico;
(b) estruturação frasa! distinta;
(c) distribuição dos conteúdos de modo peculiar, além da
( d) presença ou ausência de ilustrações.
Se observarmos especialmente gêneros que circulam em âmbito admi-
nistrativo, temos, por exemp lo:

"'XCF..LE..,'11S.~IMO SE."t'.OR PltOC:UR.\l>Ol.(if.lAl. DO EST.\00 OF. MATO DfClARAÇÃ.0


GRm"ro-Dl. JOÁO 11Rf7LIOOONASCIJIENTOSOft.l.Vlf0.

O COMnt O\.ito!PICO 6 ....SllEl"O, tntid•M ~ de: dlreçlo


daoorliva, s.em fins tuo'~ÚYO$ ou «OnÕl'nk:oS, ct. ub1tCMdc ~ ~'1.
com M<l• rw RUI! dc!i M~em~fll, 10 s.alH 3107/13, Rio dt J1n.WO, RJ, Onô@
cem Foro, lnscrlt.a no CNPJ 500 o n• }4,117.366/0001·67, .ntslt •te
'~"rl'Sf'otad.a pot seu ViCc•l>foslOei'ltlt e Sto"et4rto•Gtn.t, Dr. Md~ Gustew
Aleher, 0«4~1'3. Pfl'a toóos os l\n' dt dtr~to. que a Confed~ Bnrsllet111 de
Ka,..tt. soded•d• ~Yll. s.em l'\f\I lv-'..1a.li"'OS ou «Ol'IÕfftlCOS, O. c.ar6ter
A AS.WCtAÇÁO 00~ PIOCl!l.ADOkf_1: 00 t:!'TAI)(') Df. d e\90ltfvo, Oe .dmkWwtçlo ~I do desporto k.9tM•.
com Jc* M rua
)!ATO (;R.OSS() ... ArROMAT, ~ad.t r- ••• o;.....nrw. l"r\"l'mJltiU~ "''ft'I .,,.,.; M~ .S. ~. ll6l ~ 21, oa ddaõf' ~ Slo PaulO, SP, ln~ no
CNflJ sob o n• OJ.631.014/0001·09, Ot~ peto St. foOef ~ dt
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Género textual e ensino 129

Afonso Penteado Rodrigues

Primeiro grau compfeto (2005}. cursando segundo ano


do ensino médio (noturno). com espirita de equipe .
iniciativa, resPonsabil1dade. boa comunicação.

Fonnação
Cin&l"ldo se~~o <SrQ 00 ~~ono l't>fooo (r.:::>:\ll'n:ll tt{) CQll:>ç.o
Pos• iYi:sUI R enovador
Conduiv Q prirnt6Q 9't1U. Sf;.1'1\ lt'Ol<N:t(:,Jo, n.a F. s,(,{jll, 8.11~ C1<\UC.3
~(2(:05)
IX)IT'(lllt!T'lefll•t~
C..,.s05 O•;)ll'IÇ.ii,l 1Cet:<1911J E~q..ema _ '°O<l'). W.1v;x,., ,
XP lSE.St 100JL Pr«a~ C0ir>C"C"3~ 1S(NAC PeOf,) °'"""'ª '200~1.
Téc,,1c;;nttuV1nO.n(CAIJd.a4hot 2MI
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Experi ência 2 .-....,,.c. lc..o•"9 ~nd• s,...,.,.


J Ãr<ll ftU l . C • l M I
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Hidlamu, desempem.anoo .....-...-ou OOe<:i .u dr ;u oJo a tdl1cat.
cordeeis. ~ tvramt rtc • ...~ciis ~ e.ai:- p.,.,.,. ~•e~~
• 200S - v1-ndedof 1empor~10 p.,a o po!lr10dc> °' r.""'1 f:lt a r-o ro.in C3$M IS E.:..1>eC......,..
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• 2003·200il - ~pe~O!;>f@ ""1~cg.:tao1 no S11perme-ruoo G~n.l ~ ...... a.~&w.....
Ll.-.!t.l_ ....._........,,.L,...,..
Atl\lldades c omplementares I OL~ .. r~~Gl.>trr •

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Comt>sào do "ºm~at~•a O.. E•oo~ Oh>::a CIO.Ud•a Raoa. •)-...... e.,.., .. º~
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SecretW!oi MutVop.arcl"' [W>O'\n. '"' 2005. 2(l()(l o 2oor 1• l.4ri11t T••M ~'IOI-•~
lr\$111,tlOt d • Q~I rw ~cor ... ~ C'O SESI Ped16 81ar.c:a. 2006 em
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1/ 1-.y~1r>in"uo

Outras Informações
• catt ... a <l•ft,,r:i ~ itf~OpõlflYt'1CUI0 '1t' p,ISs&08"10I O
Con<!vçao prOprl•
tt al'IO&. re 51der11t ~ l"tlflanóp::i•s. C:ispor.ibllidll'dó! para t<abll'IM em
oib'aicld.iesrJareç~

C'... ...,.......... ..... . ~,.. .......... ...\~' ...~ ..... ~ ..... ...... ...:........

Obs erve-seq ue, alé m d as caracte r ísticas ver bais, o co mp o nente não ve r-
ba l é relevante, um$ vez que desenha o texto, do pon to de vis ta da distribui -
ção do conteúd o n a página.
Ainda no texto escrito, comparemos os traços do estilo, que se manifes-
tam, por vezes a despe ito do gênero, na seleção extravagan te do vocabulário
(o que só ocor re quando deste se tem domínio) .
Ilustrando:
Prefeitura Municipal de Palmeira dos Índios
Relatório
Ao Governo do Estado de Alagoas
Exmo. Sr. Governa do r:
Trago a V. Ex.~ um resumo dos trabalhos realizados pela Prefeitura de
Palmeira dos Índios em 1928.
Não fo ram muitos, que os nossos recursos são exíguos. Assim, minguados,
130 Darcilia Simões

COMEÇOS
O principal, o que sem demora iniciei, o de que dependiam todos os outros,
segundo creio, foi estabelecer alguma ordem na Administração.
Havia em Palmeira inúmeros prefeitos: os cobradores de impostos,
o Comandante do Destacamento, os soldados, outros que desejavam
administrar. Cada pedaço do Município tinha um administrador particular,
com Prefeitos Coronéis e Prefeitos inspetores de quarteirões. Os fiscais,
esses, resolviam questões de polícia e advogavam.
Para que semelhante anomalia desaparecesse lutei com tenaci dade e
encontrei obstáculos dentro da Prefeitura e fora dela - dentro, uma
resistência mole, suave, de algodão em rama; fora, um a campanha sorna,
oblíqua, carregada de bíl is. Pensava uns que tudo ia bem nas mãos de Nosso
Senhor; que administrava melhor do que todos nós; outros me davam três
meses para levar um tiro.
Dos funcionários que encontrei em janeiro do ano passado restaram poucos:
saíram os que faziam política e os que não faziam coisa nenhuma. Os atuais
não se metem onde não são necessários, cumprem com suas obrigações e,
sobretudo, não se enganam na s contas. Devo muito a eles.
Não sei se a administração do Município é boa ou ruim. Talvez pudesse ser
pior.

( ...)
(extraído de http://blogln.ning.com / profiles/blogs /relato do-da-prefeitura

Trecho de um relatório contemporâneo de município fluminense:

RELATÓRIO FINAL· Comissão Especial Estudos Pedágio BR-101 / SIT


COMISSÃO ESPECIAL DESTINADA A TRATAR SOBRE A TARIFA DO
TRANSPORTE COLETIVO URBANO E
PEDÁGIO DA BR 101, INSTITUÍDA PELA PORTARIA aaa/aaaa,
PUBLICADA EM aa/aa/aaaa.
Dispõe sobre a Elaboração de estudos e sugestões de soluções para a tarifa
dos ônibus de transporte coletivo urbano no Município de Macaé e tratar do
pedágio que será instalado na BR 101, e dá outras providências.
Membros: Presidente, Relator: Titul;.ir: ... S 1ml pntp ·
Gênero textual e ensino · 131

A aferir nas ru as e nós jornais (anexo!,) a insatisfação popular quanto ao


aumento da ta rifa do transporte coletivo
urbano, a defici ênci a do sistema integrado de transporte e a instalação de
praças de pedágio na BR 101, os
Vereadores(...), apresentaram o Requerimento Legislativo ns.>.aaa/aaaa
(fl. 01), em Sessão Ordinária, para apreciação dos demais vereadore~ .
requerendo instauração de comissão especial, para apreciar os assuntos
acima relacionados, requerimento que foi aprovado por u nanimidade,
produzindo seus efeitos legais através da Portaria aaa/aaaa (fl. 02),
pub licado em aa/aa/aaaa, no jornal O Debate, fixa a com petência pa ra
iniciarem-se os trabalhos.
Por conseguinte a Comissão Especial, solicita ao Presidente da Casa
Legislativ~ (fl 03), conforme lhe confere o Art.
12, XXI, do Regimento Interno da Casa, a convocação de au diência pi:blica
para 10/04/2006, com a finalidade de
ouvir a população e demais interessados.
No dia 30/03 /2006, foi solicitado da XXXXX (fl. 04), cópia de alguns
documentos para apreciação da Comissão,
antes da Audiência Pública. Entre eles a planilha de custo ta rifário, que levou
ao aumen to da tarifa de ônib us para o
transpo rte coletivo (fls. 5 a 11). A Comissão Especial por não possuir técnico,
específico para es t ud(1r a planilha de
custo tarifário, co ntratou o IBEC - Instituto Brasileiro de Engenharia de
Custos, a qual avaliará a planilha
apresentada até a data da audiência pública.

Nesses dois exemplos, apesar de se man te r uma organização diagramá-


tica semelhante (por cumprir exigência do gênero relatório administrativo),
observe-se que, apesar da opção por uma linguagem objetiva e nada formal,
o Prefeito de Palmeira dos Índios (AL) faz um relato claro e direto. Qualquer
munícipe seria capaz de entender o que ele declara. No entanto, o trecho de
relatório atual extraído dos documentos administrativos de um município
flum inense, a despeito do rigor do estilo administrativo-parlamentar, muito
pouco diz de objetivo e requer do leitor uma iniciação no gênero.
( ..... - ~ -- --
132 Darei 1ia Simões

gênero, é preciso discutir cuidadosamente as particularidades verbais que


caracterizam cada um deles. Ademais, o conhecimento do léxico também é
fator determi:lante para a aquisição de domínio linguís.tico, sobretudo no uso
padrão (ou culto). Destacamos esse uso, uma vez que d;ele depende o trânsito
social dos sujeitos.
Pensamcs poder ter trazido uma contribuição, ainda que mínima, quan-
to à questão do ensino da língua portuguesa e o trabalho com os gêneros
textuais.

Referências bibliográficas
BAKHTJN, M. (2003). Estética da criação verbal. Trad.: P. Bezerra. São Paulo: Martins Fontes.
BAZERMAN, C. (2006). Gênero, agência e escrita. Org.: j . C. Hoffnagel, A. P. Dionisio. São Paulo: Cort~z
Editora.
KARWOSKI, A. M., GAYDECZKA, B. & BRITO, K. S. (2011). Géneros textuais: reflexões e ensino. São Paulo:
Parábola Editorial.
MARCUSCHI, L. A. (2008). Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola
Editorial.
RODRIGUES, R. H. (< OOS). Os gêneros 1o discurso na perspectiva d ialógica da linguagem: a abordagem de
Bakhtin, in: ~EURER. J. L, BONINI, A. & MOTA-ROTH, D..(orgs.). G6neros: teorias, métodos e debates.
São Paulo: Pa~ábola Editorial.
SCHNEUWLY, B. & DOLZ ]. (2004). Géneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras.
SIMÕES, D. (2009). /conicidade verbal. Teoria e prática. Edição on-line. Rio de Janeiro: Dialogarts.

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