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ANOTAÇÕES DE TRIBUTÁRIO E FINANCEIRO

Princípio da Legalidade Tributária 03


Princípio da Anterioridade Tributária 06
Princípio da Isonomia Tributária 09
Princípio da Capacidade contributiva 11
Princípio da Irretroatividade Tributária 14
Princípio da Uniformidade Geográfica 17
Princípio do Não Confisco 18
Princípio da Não Limitação ao Tráfego 19
Princípio da Não-cumulatividade 19
Imunidades Tributárias 20
Sistema Tributário Nacional 29
Conceito de Tributo 32
Classificação dos Tributos 40
Competência 43
Fontes do Direito Tributário 50
Interpretação e Integração 53
Obrigação Tributária 56
Responsabilidade Tributária 63
Lançamento 75
Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário 78
Prescrição e Decadência 88
Exclusão do Crédito Tributário 99
Garantias do Crédito Tributário 102
Administração Tributária 104
Impostos em Espécie 111
Importação e Exportação 112
IPI 117
2
IOF 123
IR 125
ICMS 132
ITCMD 150
IPVA 152
IPTU e ITBI 154
ISSQN 158
Execução Fiscal, Ação cautelar fiscal, Arrolamento 159
Direito Financeiro 178
Receitas públicas 179
LC 101/00 – Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) 182
Lei do Orçamento (Lei 4320/64) 189
Repartição de Receitas Tributárias 216
3
DIREITO TRIBUTÁRIO

Introdução
O estudo do Direito Tributário deve ater-se, principalmente, à CF/88 (arts.
145 a 162), à EC 42/03 e ao CTN (mormente a partir do art. 96, com as
alterações até a LC 118/05).
A CF/88, em matéria tributária, pode ser sistematizada em três partes:
princípios, imunidades e tributos. As duas primeiras constituem as chamadas
limitações ao poder de tributar.

Princípio da Legalidade Tributária


Está no art. 150, I, CF/88, c.c. art. 97, I e II, do CTN. A lei, como regra,
deve impor a tributação. As pessoas jurídicas de Direito Público (União, Estados,
DF e Municípios), dotadas de poder de tributar, só poderão criar ou majorar
tributos por lei. Isto decorre da colocação de Pontes de Miranda, pela qual é “o
povo tributando a si mesmo”, por intermédio do Poder Legislativo. Essa máxima
advém diretamente da titularidade do poder, da soberania pelo povo (art. 1º,
parágrafo único, CF/88), a ser representado, na democracia semidireta, por meio
dos seus delegados – vereadores, deputados e senadores. Nesse passo, a lei
como um produto dessa vontade, é a única idônea a materializar o poder de
tributar. Como se verá na análise do desiderato da reserva legal, em regra, a
norma instituidora da exação será a lei ordinária. Ademais, a jurisprudência é
pacífica em considerar que iniciativa de lei tributária é concorrente entre todos os
legitimados. Ao contrário de diplomas orçamentários, de iniciativa exclusiva do
Executivo, os tributários podem ser oferecidos também pelo Legislativo, como já
disse o STF1.
Reserva Legal, também chamada de tipicidade fechada, cerrada ou
regrada, ou de estrita legalidade constitui uma relação taxativa pela qual a lei
“stricto sensu” institui o tributo, assim como aquela que tipifica crimes e comina
penas (arts. 5º, XXXIX, CF/88, e 1º, CP). Com efeito, há certas matérias que a
Constituição determina que só podem ser viabilizadas por lei em sentido estrito.
Esse tratamento mais rigoroso corresponde exatamente ao ditame em análise,
qual o seja da reserva de lei. Dessa feita, a lei que institui o tributo deve
estabelecer, obrigatoriamente, os seguintes elementos (art. 97, III a VII, CTN):
alíquota, base de cálculo, sujeito passivo, multa e fato gerador. Já o prazo
para pagamento pode ser estipulado por norma infralegal (decreto), conquanto
não previsto no rol “numerus clausus” dos incisos do art. 97, CTN2.
Para Cassone (2004, p. 169), de regra, somente a lei ordinária é apta a
instituir tributo, pois “a Constituição fixa a regra-matriz de incidência, e a Lei

1
STF, ADIn 3809/ES, rel. Min. Eros Grau, j. 14.6.2007, citando precedentes no mesmo sentido: ADIn 3205/MS (DJU de
17.11.2006); ADIn 2659/SC (DJU de 6.2.2004); ADIn 2548/PR (DJU de 15.6.2007); ADIn 3312/MT (DJU de 23.3.2007) –
Informativo do STF n° 471.
2
Esta é a posição pacificada na doutrina, escudada pelo STF.
4
3
Complementar estabelece normas gerais” . Entretanto, o autor admite, em sede
de exceção, a criação de exação por LC ou por EC. Nesse raciocínio também
estabeleceu o constituinte, vez que União pode instituir, por lei complementar4,
outros quatro tributos:
1.Impostos sobre grandes fortunas (art. 153, VII, CF/88)5.
2.Empréstimos compulsórios (art. 148, “caput”, CF/88).
3.Impostos residuais (art. 154, I, CF/88) – diversos daqueles já instituídos
pelo constituinte. Na criação da nova exação, a União deverá observar,
além da forma específica da LC, a inexistência de “bis in idem” de base
de cálculo e de fato gerador e o princípio da não-cumulativa. Os outros
entes federados não detém essa competência residual para instituir
novos tributos.
4.Contribuições previdenciárias residuais (art. 195, § 4º, CF/88) – além
daquelas já expressamente antevistas pelo legislador constitucional.
Nenhuma dessas quatro exações pode nascer por medida provisória (art.
62, § 1º, III, CF/88).
Exceções à legalidade (art. 153, § 1º, CF/88) – há quatro impostos
federais que refugam à estrita legalidade, prevista no art. 97, I a VII, CF/88,
encontrando-se expressamente ressalvados pelo constituinte:
1. Importação;
2. Exportação;
3. IPI;
4. IOF.
São tributos que regulam o mercado e a economia, chamados de
extrafiscais. Na batuta do Direito Econômico, com fulcro na doutrina de Grau
(1975), a extrafiscalidade é autêntica manifestação de intervenção estatal
econômica, na modalidade indireta por indução. A extrafiscalidade tem a função
de fomentar ou de desencorajar condutas por parte dos agentes econômicos.
Além da fiscalidade (função arrecadatória), os impostos mencionados possuem a
extrafiscalidade (capacidade regulatória do mercado)6. O Poder Executivo pode

3
Como adequadamente explana Vittorio Cassone, Direito Tributário: fundamentos constitucionais da tributação,
classificação dos tributos, interpretação da legislação tributária, doutrina, prática e jurisprudência, atualizado até a EC nº
42, de 19-12-2003, 16ª ed., São Paulo, Atlas, 2004, p. 36, a LC em matéria tributária é o CTN. Inicialmente nascido sob a
alcunha de LO, subiu de “status” pelo Ato Complementar 36/67, disposição essa atinente e posterior à própria Carta de 1967.
Posteriormente, a opção do legislador foi referendada pela chancela do Excelso Pretório, do qual o autor destaca o RE 93850
de 1982, da lavra do Min. Moreira Alves. Por fim, o constituinte de 1988 recepcionou o diploma também como LC, mantendo
a posição anterior (art. 146, CF/88).
4
Trata-se da chamada reserva constitucional de lei complementar, tantas vezes invocada pelo constituinte e lembrada pela
doutrina de Direito Constitucional. Exige quorum privilegiado para a aprovação, correspondente à maioria absoluta da Casa
Legislativa (art. 69, CF/88), diferentemente da LO.
5
Consoante será exposto em passagem abaixo, há posição na doutrina, liderada por Roque Antônio Carrazza, Curso de Direito
Constitucional Tributário, 2ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1991, que defende a não submissão do imposto sobre
fortunas à reserva constitucional de lei complementar.
6
Como lembra Maximilianus Cláudio Américo Führer e Maximiliano Roberto Ernesto Führer, Resumo de Direito Tributário,
8ª ed., São Paulo, Malheiros, 2001, p. 17, a palavra fisco vem do latim “fiscus”, que designa cesta de junco ou vime, a qual era
usada para amassar uvas ou para guardar dinheiro. “Conta-se que os agentes romanos passavam entre os negociantes a cesta de
5
aumentar ou diminuir a alíquota por decreto, porque há uma exceção à
legalidade. Por meio de delegação, o Presidente da República pode autorizar
outra autoridade pública a estabelecer os mencionados percentuais tributários,
como Ministros de Estado ou Superintendentes de órgãos ou entidades públicas
encarregadas da capacidade tributária ativa.
A EC 33/01 trouxe mais duas exceções:
 CIDE-combustíveis – é a contribuição de intervenção no domínio
econômico (art. 177, § 4º, I, “b”, C/88). Neste caso, sendo tributo federal,
as alíquotas são alteradas por ato do Poder Executivo da União. A
contribuição em comento não pode ser confundida pela CIDE-remessas
para o exterior, instituída pela Lei 10168/01 (SABBAG, 2004, p. 84).
Essa sim deve observar a legalidade em todos seus parâmetros.
 ICMS-combustível (art. 155, § 4º, IV, “c”, CF/88) – como se trata de
tributo estadual, as alíquotas são disciplinadas por ato do Poder
Executivo estadual7.
Esse, à luz de convênios assinados pelos secretários de Fazenda (no
âmbito do CONFAZ – art. 155, § 5º, CF/88), autorizados por LC,
estipulará originalmente a alíquota, podendo depois alterá-la como lhe
aprouver, o que confronta com o art. 97, IV, CTN8.
Obs.: com a EC 32/01, MP pode aumentar ou diminuir tributos no Brasil
(art. 62, § 2º, CF/88). Nota-se que o legislador constituinte restringiu o fenômeno
a impostos. Ex.: pode haver, sem problemas, aumento de ITR por MP. Segundo a
CF/88, a MP é medida idônea para criar e aumentar impostos. Todavia, tal
restrição a “impostos” não desfruta de endosso na interpretação do STF. A corte
entende viável a MP em outras espécies de tributos. Ex.: MP 164/04, a qual
instituiu a PIS-Importação e a COFINS-Importação, que são contribuições. Dessa
feita, onde a LO puder dispor, a MP também o será, ainda em matéria tributária e
a despeito da disposição literal do art. 62, § 2º, CF/88, na leitura do Excelso
Pretório.
No diapasão, importante destacar que, onde LC versar, a MP não irá
incidir (art. 62, § 1º, III, CF/88), Aquela trata de matérias delicadas, enquanto essa
visa imediatismo de eficácia (relevância e urgência). Ex.: não pode surgir
empréstimo compulsório por meio de MP.
O princípio da legalidade está esculpido no art. 150, I, CF/88, prevendo o
constituinte que a majoração e a modificação do tributo deve ser feito por meio de
lei. O art. 97, CTN, minudencia o dispositivo constitucional, porque traz os
elementos do tributo sujeitos à reserva legal (base de cálculo, alíquota, sujeitos
passivo e ativo e fato imponível). É o que configura o tipo tributário ou tipicidade

vime para que depositassem ali a participação (forçada) de César. No sentido figurado, fiscus tomou o significado de Fazenda
Pública”.
7
Originalmente, a alíquota do ICMS-combustível é estabelecida pelo Executivo estadual, não nascendo por via de lei.
8
A única hipótese genuína, sob o aspecto técnico, de exceção à legalidade está esculpida no art. 155, § 4º, IV, CF/88, porque o
ato definido pelo convênio, com firma dos representantes de cada Estado-membro (por meio dos Secretários de Fazenda, com
delegação dada pelo Governador), tem o condão “per se” de estabelecer a alíquota do ICMS, não ficando sujeita à ratificação
ou reapreciação pelas Assembléias Legislativas. Isso não ocorre nas demais espécies normativas previstas como exceções à
legalidade.
6
cerrada. Todo componente tributário que não estiver no rol do art. 97, CTN, não
se sujeita obrigatoriamente ao regime da legalidade estrita. Ex.: mudança no
prazo de pagamento não se sujeita à legalidade restrita9.
A alteração da base de cálculo, em princípio, só pode ser feita por meio de
lei (art. 97, § 1º, CTN). Entretanto, essa assertiva não é absoluta, porque pode
não implicar necessariamente em majoração do tributo correspondente. Quando
essa mudança importar em mera atualização monetária, não está sujeita à
legalidade estrita (art. 97, § 2º, CTN). Ex.: revisão do valor venal de imóveis de
acordo com o mercado para cobrança de IPTU ou de ITR.
De regra, a lei que altera o tributo é ordinária, inclusive para contribuições.
Todavia, há dois instrumentos legislativos que têm força de LO: a MP e a LD.
Ambas podem criar ou majorar tributos. O art. 62, § 1º, CF/88, limita o uso da MP
em algumas matérias, mas seu § 2º expressamente autoriza, desde que
observadas suas próprias balizas, a criação ou majoração de exações. No
mesmo sentido, as limitações da LD estão no art. 68, § 1º, CF/88, ausentando-se
a disciplina tributária. A MP é espécie normativa de competência exclusiva do
Presidente da República. Tem prazo de vigência de 60 dias, podendo ser
prorrogada por igual período uma única vez (art. 62, § 7º, CF/88). Ao final do
interregno total, a MP pode ser convertida em LO por decisão do CN (art. 62, §
1º, III). Ao revés, na LD, o CN dá autorização ao Presidente da República para
legislar sobre determinado assunto, mediante prévio requerimento desse (art. 68,
“caput”, CF/88).
Pergunta: a participação nos lucros e resultados (art. 7º, XI, CF/88) e a
indenização devida por acordo em plano de demissão voluntária (PDV) são
tributadas pelo imposto de renda?
Resposta: a indenização paga em detrimento de PDV não é tributada por
IR (Súmula 215 do STJ).

Princípio da Anterioridade Tributária


O Princípio da Anterioridade consubstancia uma “vacatio legis” especial
para a vigência de lei tributária que modifique ou crie exação.
Inexoravelmente, é inevitável a aplicação da anterioridade tributária, para
conferir tempo ao sujeito passivo para o pagamento (art. 150, III, “b”, e “c”,
CF/88). Com a postergação da exigência, é possível afirmar que a há importante
sinônimo para o postulado: eficácia diferida. Os detentores do poder de tributar só
podem exigir tributo no exercício financeiro posterior àquele em que foi publicada
a lei instituidora. Exercício financeiro corresponde ao ano fiscal ou civil, indo de 1º
de janeiro a 31 de dezembro de cada ano. Tanto o princípio da anterioridade
(preconizado pela Constituição) quanto a segurança jurídica – tantas vezes
invocada pela doutrina – trazem à baila a proibição da tributação surpresa
(SABBAG, 2004).

9
STF, RE’s 182.971 e 193.531.
7
O tema em comento não pode ser confundido com o princípio da
anualidade, cuja dicção sinaliza a necessária previsão do tributo na lei
orçamentária. Nota-se que a exigência do princípio da anterioridade é outra:
publicação prévia da lei. Assim, o sistema constitucional tributário não hospeda a
anualidade, pela qual a exigência do tributo só era possível se sua receita
correspondente estivesse previsto na lei orçamentária (Súmula 66 do STF)10.
Exceções à anterioridade anual (art. 150, § 1º, parte inicial, CF/88):
 II, IE, IPI, IOF, IEG (art. 154, II, CF/88) e Empréstimo Compulsório
especial (art. 148, I, CF/88), sendo os dois últimos instituídos em
situações de emergência, de guerra ou de calamidade pública,
enquanto os demais se deferem à extrafiscalidade (regulação do
mercado e da economia);
 ICMS e CIDE combustíveis (arts. 155, § 4º, IV, “c”, “in fine”, e 177, § 4º,
I, “b”, CF/88), acrescidos pela EC 33/01, tendo também o cunho
extrafiscal.
Com exceção dos mencionados tributos inerentes a situações calamitosas
(IEG e empréstimo compulsório especial), as demais correspondem também às
ressalvas da legalidade. Essas são as exações que podem ter sua alíquota
alterada por ato do Executivo (art. 153, § 1º, CF/88).
Antes da EC 42/03, só havia a anterioridade anual, pela qual a lei que
criasse ou majorasse tributos só poderia entrar em vigor a partir do primeiro dia
do ano seguinte ao de sua publicação. Inspirado no limite dado pela
noventalidade, o constituinte derivado incluiu-o concomitantemente à
anterioridade anual, devendo o tributo observar ambas as regras. Foi a inclusão
do art. 150, III, “c”, CF/88, pela EC 42/03, cujo objetivo foi melhorar a segurança
jurídica deferida ao contribuinte. A produção de efeitos da nova lei tributária fica
postergada até que sejam perfeitos os 90 dias de sua publicação.
De fato, a EC 42/03 trouxe à baila a obediência a um novo período de
anterioridade de 90 dias, entre a lei e a exigência do gravame. É a chamada
anterioridade qualificada (privilegiada, nonagesimal ou noventalidade), prevista
no art. 150, III, “c”, CF/88. Foi extraída de construção constitucional sobre as
contribuições sociais (art. 195, § 6º, CF/88). Como foi instituto acrescido por
emenda de 2003, passou a ter eficácia a partir de 2004. Todos os aumentos ou
criações de tributos nos meses de janeiro a setembro ensejarão exigência em 1º
de janeiro do ano seguinte. Caso haja a situação nos meses de outubro a
dezembro, a exigência poderá ser em data posterior a 1º de janeiro do ano
seguinte.
Exceções à anterioridade nonagesimal (art. 150, § 1º, parte final, CF/88):
 II, IE, IR, IOF, IEG, Empréstimo Compulsório espcial, os quais poderão
ser exigidos no dia seguinte à sua instituição;
 Alterações na base de cálculo do IPTU e do IPVA.

10
Súmula 66 do STF: “É legítima a cobrança do tributo que houver sido aumentado após o orçamento, mas antes do início do
respectivo exercício financeiro”.
8
No tocante ao II, IE, IOF, IEG e empréstimo compulsório especial, é
perfeitamente compreensível a intenção do constituinte, dada a extrafiscalidade
na essência desses tributos. Eles compreendem idênticas exações em relação às
ressalvas à anterioridade anual, com exceção daquelas trazidas pela EC 33/01 –
CIDE-combustível e ICMS-combustível – e da exclusão do IPI. Todavia, quanto
ao IR e às alterações da base de cálculo do IPTU e do IPVA, é incompreensível a
razão de torná-los imunes à noventalidade.
Dessa forma, o IPI é exceção da anterioridade anual, só que ele não faz
parte da lista de exceções aos 90 dias (anterioridade nonagesimal). A partir de
2004, o IPI que for majorado não poderá ser cobrado no dia seguinte, só 90 dias
depois. Assim como o IPI, a CIDE-combustível e o ICMS-combustível também
respeitam a anterioridade nonagesimal, pois não se encontram no rol das
exceções.
Já o IR e as alterações da base de cálculo do IPVA e do IPTU, uma vez
majorados em 31 de dezembro, poderão ser exigidos em 1º do janeiro do ano
seguinte, perpetuando um condenável expediente.
Obs.: como o STF interpreta o instituto da isenção como regra de
incidência (e não de não-incidência), ou seja, lei que venha a revogar isenção
não precisa observar a anterioridade, seja essa ordinária ou qualificada. A
isenção, como aventa Nogueira (1999, p. 167), é uma situação em que o
legislador obstou abstratamente o fato gerador, impondo-lhe uma intributabilidade
no plano normativo. Já a imunidade é uma espécie de isenção qualificada pelo
constituinte, o qual impede, já no Texto Maior, que o legislador infraconstitucional
inclua tal hipótese no campo da incidência do gravame. No ponto, é possível
dizer que se trata de regra de não-incidência. Já a alíquota zero opera o mesmo
reflexo suspensivo atinente à isenção. No entanto, essa paralisação da
subsunção do fato gerador se encontra no plano fático, não no legislativo-
abstrato, vindo também a constituir hipótese de incidência.
Princípio da anterioridade e a MP – segundo o art. 62, § 2º, CF/88, argüi-
se quando se deve pagar o imposto criado ou majorado por MP. Resposta: dever-
se-á o imposto no ano seguinte ao da conversão da MP em lei. A MP tem 60 dias
de vigência, prorrogável por igual período, para ser transformada em lei. A partir
de 2004, é possível entender que deve haver também a contagem dos 90 dias, a
partir da conversão da MP em lei, de modo a ensejar a exigência do tributo em
meados de março do ano seguinte. Todavia, a matéria ainda não está pacificada
pelo STF. No tocante às taxas, a anterioridade se aplica de igual maneira: é
contada a partir da conversão da MP em lei. O art. 62, § 2º, CF/88, faz menção
literal a imposto. Portanto, em caso de MP que majore taxa, não deverá ter
aplicação o dispositivo.
Em melhores termos, as outras espécies tributárias (mormente
contribuições), ao contrário, terão termo inicial na sua publicação, porque o art.
62, § 2º, CF/88, se refere expressamente a impostos. Caso não haja a conversão
em lei, o pagamento do tributo majorado não implica em direito à restituição, visto
que, durante o mencionado lapso, a exação era assim exigida “ex vi” da MP
vigente.
9
Contribuição previdenciária e anterioridade – aplica-se a anterioridade
nonagesimal às contribuições sociais, também conhecida como noventena,
nonagentídio, noventalidade, período de eficácia mitigada ou de anterioridade
especial (art. 195, § 6º, CF/88). No caso, a contribuição para seguridade social
pode ser exigida em 90 dias a partir da edição da MP que instituiu a exação ou
que a alterou, como já disse o Supremo. Mas o que seria modificar a contribuição
previdenciária? Seria alterar o prazo de pagamento? Segundo o STF, a mudança
no prazo de exigência da contribuição social não representa alteração substancial
que venha a ensejar a aplicação dos 90 dias do art. 195, § 6º, CF/88.
A CPMF foi criada por meio da EC 12/96, devendo observar a
anterioridade nonagesimal. Em suas sucessivas prorrogações, esse comando
não foi exprimido (EC 37/02). O STF se pronunciou no sentido de que não se
aplica o princípio da noventalidade, porque não se trata de instituição ou
modificação de tributo11. O que persiste é mera prorrogação, não estando
abrangida pela contingência dos 90 dias. A anterioridade em tela é chamada
mitigada, porque reduzida em relação às demais exações (art. 150, III, “b”,
CF/88).
Anterioridade e IR – pelo fato do STF acolher a Teoria Retrospectiva
(Súmula 584 do STF)12, não coadunando com o sistema de bases correntes, nas
palavras de Aliomar Baleeiro, como se fosse um “filme em andamento”, segundo
Sacha Calmon Navarro Coelho, a alíquota aplicada é aquela vigente por ocasião
da entrega da declaração.
Anterioridade e revogação de isenções – a isenção é uma dispensa legal
do pagamento do tributo (obrigação principal). Segundo o STF, se houver isenção
revogada sem prazo certo e condição específica (isenção incondicionada), a
revogação não observa a anterioridade. Em contrário senso, a isenção deverá se
pautar pela anterioridade tributária. A regra não alcança a disposição do art. 104,
III, CTN, ou seja, tratando-se de imposto sobre renda ou patrimônio, a isenção
deve observar a anterioridade anual. Isenção concedida com prazo certo e sob
condição específica é considerada irrevogável durante seu curso, tendo natureza
de direito adquirido para o Excelso Pretório.

Princípio da Isonomia Tributária


Está previsto no art. 150, II, CF/88. O legislador constituinte de 88 fez
menção à ISONOMIA em diversos dispositivos da Carta: preâmbulo, art. 5º,
“caput”, I, art. 3º, IV, arts. 150, II, etc. A doutrina chama a isonomia de
“superprincípio”, justamente porque se encontra presente sob diferentes ângulos
no Documento Maior. De fato, a isonomia específica (tributária) decorre da
isonomia genérica (“todos são iguais perante a lei” – art. 5º, “caput”, parte inicial,
CF/88), como disse Oliveira e Horvath (2003, p. 76). Por seu postulado (art. 150,
II, CF/88), todos que realizam o fato gerador devem arcar com o ônus da

11
STF, 2666/DF, rel. Min. Ellen Gracie.
12
Súmula 584 do STF: “Ao Imposto de Renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício
financeiro em que deve ser apresentada a declaração”.
10
tributação. A lei tributária não pode atribuir tratamento desigual a contribuintes
que se encontrem na mesma situação.
É fácil perceber que o legislador pretendeu onerar o contribuinte, a partir
da perspectiva da hipótese de incidência realizada, menosprezando os aspectos
extrínsecos ao fato imponível. Ademais, é evidente a predileção do legislador
pelo critério objetivo que marca o princípio, uma vez que as características
subjetivas atreladas ao contribuinte são desimportantes. Assim, há maior
possibilidade de realização da justiça fiscal, tentando-se onerar igualmente os
iguais e desigualmente os dessemelhantes.
O princípio em tela, como se nota, respalda-se na “interpretação objetiva
do fato gerador” ou na utilização do ditame do “non olet”, que significa “não
cheira”13. Esta cláusula permite, destarte, que se tributem quaisquer pessoas,
independentemente da ilicitude da atividade, da incapacidade civil (arts. 118 e
126, CTN), ou de outros fatores que, à primeira vista, poderiam excluir a
responsabilidade tributária. Por exemplo, no art. 126, I a III, CTN, fica patente que
a capacidade tributária passiva é plena e independe da capacidade civil das
pessoas naturais, da regularidade da constituição de pessoa jurídica ou de achar-
se a pessoa sujeita a restrições de ordem civil, empresarial, administrativa ou
profissional, ainda que não possa administrar seu patrimônio. Um menor pode ser
contribuinte, mas não terá a obrigação de recolher a exação (pagamento), porque
o legislador conferiu responsabilidade tributária aos seus pais (art. 134, I, CTN).
De igual forma, o traficante de entorpecentes, quando aufere renda, realizando o
fato gerador, deve IR ao fisco. Não se pode confundir o poder de punir do Estado
– decorrente do sistema penal – com o poder de tributar, o qual visa angariar
divisas para o aparelho estatal. A hipótese de incidência para a lei tributária é
auferir renda, independentemente da forma como foi efetivada. Do
comportamento do traficante, haverá duas conseqüências distintas:
responsabilidade penal em face da conduta criminalmente ilícita e incidência da
tributação sobre a renda14. Isso não quer dizer que o tributo recairá sobre
condutas ilícitas ou imorais, porque o fato gerador não pode assim o ser. A causa
do fato gerador pode ser ilegal, mas a essência da hipótese de incidência não. A
fundamentação legal reside no art. 118, I, CTN, além, no caso em tela, do art.
153, § 2º, I, CF/88 (universalidade do IR).
Há possibilidade de “ressalvas” a este postulado, desde que previstas
explícita ou implicitamente na CF. Note os exemplos:
a.STF: afastar o princípio em razão de extrafiscalidade. Ex.: isenção de IPI
para taxistas.

13
Na Roma antiga, o imperador Vespasiano resolveu tributar o uso dos sanitários públicos. Seu filho, Tito, contestou o pai
sobre a atitude. O monarca respondeu-lhe com uma simples expressão: tributo “non olet”. Na realidade, o César quis dizer que
a exação deve ser tratada sob um aspecto objetivo. Se o contribuinte realizar a conduta nela prevista, incidirá a tributação,
independentemente de qual fato esteja se referindo ou da pessoa que o realizou. Esta idéia redundou no tratamento objetivo do
fato gerador, cerne da isonomia tributária. Ademais, caracterizou a cisão entre o direito de punir estatal – direcionado àqueles
que urinassem nos logradouros públicos – e o poder de tributar – o uso dos banheiros públicos. Como resquício da passagem
histórica, permaneceu, para a posteridade, a palavra do soberano latino.
14
STJ, HC 7444, em que são invocados o princípio da isonomia (tratamento igual àqueles que auferiram renda) e a teoria da
interpretação econômica do fato gerador (concretizada a hipótese de incidência, incide a tributação). É o posicionamento
também do STF.
11
b.Art. 151, I, “in fine”, CF/88: afastar o princípio da isonomia em razão da
tributação federal diferenciada para empresas localizadas em áreas
com desequilíbrio socioeconômico. Ex.: Zona Franca de Manaus (futuro
Pólo Industrial da Amazônia Brasileira, de acordo com o PEC 59/04).
O tratamento diferenciado das ME`s e EPP`s não gera ofensa à isonomia,
porque não há situação equivalente para com empresas de maior monta. Ao
revés, trata-se de realização material do princípio em relevo, de sorte a colimar a
igualdade entre aquelas e essas. O próprio constituinte assim disse nos arts. 146,
III, “d”, e 146-A, CF/88, consubstanciados pela LC 123/06.

Análise do postulado da capacidade contributiva ou capacidade


econômica15
Está previsto no art. 145, § 1º, CF/88. É possível estudá-lo como
subprincípio da isonomia. Note o teor do comando: “sempre que possível, os
impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade
econômica de cada um”. A técnica de estabelecimento de alíquotas fiscais
diferenciadas (progressividade) é uma outra forma de efetivar a justiça fiscal. Os
desiguais serão diferentemente tratados. Desta feita, a tributação, segundo a
capacidade econômica, configura correlato da isonomia tributária. A
jurisprudência e a doutrina interpretam este preâmbulo da ordem tributária de
forma a adequar a exação ao seu conteúdo, na medida do possível. Há alguns
tipos tributários que não comportam tal possibilidade, como é o caso do IPI e do
ICMS. Do contrário, o IR se adequa perfeitamente à preceituação do legislador.
Frise-se que tal postulado não é propriamente o princípio da isonomia,
mas um instituto deste decorrente. De fato, o art. 145, § 1º, CF/88 preconiza a
possibilidade de onerar mais gravosamente aqueles que detêm maior riqueza
tributável. Como fora mencionado, note que a expressão, “sempre que possível”
é limitadora, devendo ser compreendida como “sempre que o tributo comportar
tal variabilidade das alíquotas”. Não há dúvida que existem tributos aos quais se
pode aplicar a técnica de variação de alíquotas, buscando a justiça fiscal.
Entretanto, há outros que não se coadunam, em princípio, com tal sistemática
(tributos regressivos). Portanto, a técnica de variação de alíquotas, em uma razão
não proporcional à base de cálculo, recebe o nome de “PROGRESSIVIDADE de
alíquotas”, justificando o comando do art. 145, § 1º, CF/88.
Em tese, a capacidade tributária só cabe aos impostos. Moreira Alves
(apud CASSONE, 2004, p. 201) afirma que “em se tratando de aplicação
extrafiscal de imposto, não está em jogo a capacidade contributiva que só é
levada em conta com relação a impostos pessoais com finalidade fiscal”. É o que
preceitua Tipke e Yamashita (apud CASSONE, 2004, p. 212), ao asseverarem
que “o princípio da capacidade contributiva não se aplica a tributos com finalidade
extrafiscal, que, no entanto, têm sua constitucionalidade controlada pelo princípio

15
Cassone, op. cit., p. 206, diferencia capacidade econômica e contributiva. Atribui o fundamento da primeira no art. 145, § 1º,
CF/88, tal qual explanado na matéria. Aliás, segundo o autor, esta é a terminologia empregada pelo constituinte. No entanto,
confere à segunda fulcro nos arts. 194 e 195, CF/88, ressaltando que se trata capacidade para contribuir para a Seguridade
Social. Não é o entendimento da maioria da doutrina.
12
da proporcionalidade”. Contudo, há julgados que o estendem a outros tributos,
mormente a taxas (STF).
Capacidade econômica e contributiva não são conceitos coincidentes. A
primeira representa aptidão de um sujeito em receber rendimentos e incrementar
o patrimônio próprio. A segunda é uma espécie da primeira, segundo a qual o
sujeito tem capacidade econômica em um nível tal que o torna sujeito à
tributação. Fica caracterizado o “plus” para contribuir para o Estado, pois o nível
de renda assim permite. No âmbito tributário, seria a graduação dos impostos
segundo a potencialidade de riqueza demonstrada pelo sujeito passivo na relação
tributária.
A capacidade contributiva pode ser realizada segundo diferentes técnicas,
destacando-se duas:
 Por dedução de despesas essenciais – é o caso daquelas tidas no IR,
segundo a essencialidade estabelecida no seu regulamento.
 Progressividade de alíquotas – é o instrumento mais utilizado.
Progressividade fiscal e extrafiscal – a primeira corresponde ao aumento
da alíquota diante da majoração da base de cálculo. Tem por objetivo primeiro a
arrecadação, orientando-se pelo princípio da capacidade contributiva. Na
segunda, não há necessária relação entre o aumento de alíquota e de base de
cálculo. Objetiva realizar um princípio constitucional, não se relacionando com a
capacidade contributiva.
No âmbito da CF/88, a progressividade fiscal é observada no IR, o qual é
necessariamente progressivo (art. 153, § 2º, I, CF/88), no IPTU, tendo em conta
seu uso (residencial, comercial ou industrial), valor e localização, e no IPVA,
progressivo em razão do tipo e da utilização do veículo. Já progressividade
extrafiscal pode ser vislumbrada no IPTU, em face do tempo de subutilização do
imóvel (realização da função social da propriedade mediante alíquotas
progressivas), e no ITR, cujas alíquotas oscilarão devido à produtividade do
imóvel (quanto maior a produtividade, menor a alíquota – regressividade). A
progressividade do ITR é extrafiscal, o que não importa em dizer que ele, em si, é
um tributo extrafiscal.
Dentre as exações mencionadas, é possível destacar três impostos com
previsão explícita de progressividade na CF/88:
1.IR (art. 153, § 2º, I CF/88) – o comando indica três critérios informadores
do IR: generalidade, universalidade e progressividade.
2.IPTU* (art. 156, § 1º, CF/88, com redação conferida pela EC 29/00).
3.ITR* (art. 153, § 4º, I, CF/88, com a redação da EC 42/03).
*Não perca de vista que a progressividade de tais impostos (IPTU e ITR) é
EXTRAFISCAL, uma vez que não visa ao intuito exclusivamente arrecadatório.
Note as explicações abaixo:
 ITR – as alíquotas progressivas deverão desestimular a manutenção de
propriedades improdutivas, tal qual se aduz literalmente da vontade do
legislador, exprimida pelo art. 184, § 4º, II, CF/88.
13
 IPTU – inicialmente, a progressividade deste impostos visava somente
o cumprimento da função social da propriedade (art. 5º, XXIII, CF/88),
denotando claramente extrafiscalidade. Com base nesta premissa, seria
permitida a tributação maior de um terreno em relação a uma casa (art.
182, § 4º, II, CF/88). Com o fito de aumentar a tributação dos municípios,
o constituinte derivado alterou o dispositivo, a despeito de colocações
inconstitucionais.
A questão se liga ao direito de moradia, elevado constitucionalmente a
direito fundamental (art. 6º, “caput”, CF/88). O crescimento geométrico da
população sugere um gargalo de moradia insuportável a médio e longo
prazo. Percebendo tal entrave, o constituinte previu uma situação de
redistribuição de terras para a habitação e a geração de riqueza. Uma dos
meios de efetivar tal política é a tributação extrafiscal pelo IPTU e ITR. O
escopo é evitar a desapropriação da propriedade, forçando o senhor a
adequar seu domínio à sua função social.

ANTES DEPOIS
O IPTU era progressivo em razão de Três novos critérios de
um critério: a função social da progressividade: localização, valor
propriedade (art. 5º, XXIII, CF/88). e uso do bem imóvel. Foram
somados à função social da
propriedade.
Progressividade no tempo – EC
conforme se mantivesse o 29
descumprimento da função social, de
haveria aumento do tributo no correr 2000 Progressividade fiscal e extrafiscal.
do tempo.
Progressividade extrafiscal.
Arts. 156, § 1º e 182, § 4º, II, CF/88. Art. 156, § 1º, I e II, e 182, § 4º, II,
CF/88, Lei 10252/01, em seus arts.
39 a 41 e 3º a 8º (art. 21, XX,
CF/88)16.

Observação: após a EC 29/00, em razão dos critérios novos anunciados,


o IPTU ganhou feições de imposto pessoal, contrariando a doutrina e a
jurisprudência majoritárias. Nesse passo, é possível entender que o art. 145, § 1º,
CF/88 (princípio da capacidade contributiva) passou a abranger o IPTU, um
imposto real (não pessoal). Assim, até que o STF se pronuncie, não se pode
assegurar que tal princípio está afeto apenas a impostos pessoais. Desta forma,
a progressividade fiscal teve sua constitucionalidade fortemente contestada,

16
Como o plano diretor é aquele que define a função social da propriedade (art. 182, § 2º, CF/88) e o município com menos de
20 mil não é obrigado a promulgar tal lei (art. 182, § 1º, CF/88), essa pequena localidade não poderá utilizar o IPTU
progressivo por desrespeito à mencionada função. Essa possibilidade só pode ser efetivada mediante prévio plano diretor,
promulgado por meio de lei municipal.
14
porque transforma a exação de real (STF) em pessoal, atingindo a capacidade
contributiva (art. 145, § 1º, CF/88).
Tal comando veda a progressividade do IPTU antes da emenda, salvo se
destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade (Súmula
668 do STF)17.

Princípio da Irretroatividade Tributária18


Está previsto no art. 150, III, “a”, CF/88. Tal comando anuncia que a lei
tributária deverá abranger fatos geradores posteriores à sua edição. Não perca
de vista que o art. 5º, XXXVI, CF/88 preconiza a irretroatividade genérica,
emanando efeitos à confecção do princípio tributário ora estudado.

Lei Fato Gerador


(anterior) (posterior)

É perceptível que a lei deve preceder os fatos geradores aos quais se


referem, sob pena de retroação da norma – anomalia que se pretende coibir.
É vital ao estudioso que conceba a irretroatividade como postulado da
segurança jurídica. Nesse sentido, deve-se inquirir: há exceções a ele previstas
na CF, à semelhança das exceções aos demais princípios? Não, pois as
exceções estão previstas no art. 106, I e II, CTN, o que leva alguns doutrinadores
a crer na sua inconstitucionalidade (ausência de recepção). A lei atual poderá
retroagir/retroceder/retrotrair.
Art. 106, CTN (2 incisos):
I – LEI INTERPRETATIVA – condição para a retroação: nenhuma. É
possível em qualquer caso. A lei interpretativa se limita a aclarar pontos
obscuros, não inovando na ordem posta, sob pena de constituir mera norma
nova. O cuidado que se deve ter é a separação e a hierarquia de poderes, pois o
Legislativo pode estar afastando a função jurisdicional do Judiciário, de modo a
minar a segurança jurídica.
A lei interpretativa poderá ter eficácia retrospectiva. Na verdade, a lei
interpretativa é aquela que retira os pontos obscuros da norma interpretada, sem
criar situação jurídica paradoxal. A doutrina critica tal comando – interpretação
“autêntica” –, sob o argumento de que haveria extrapolação de função do
Legislativo, pois a interpretação caberia ao Judiciário. Evidentes, pois, seriam as
lesões à segurança jurídica e à separação de poderes.

17
Súmula 668 do STF: “É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000,
alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana”.
18
O princípio da irretroatividade tributária não pode ser confundido ou imiscuído com o ditame da anterioridade. É certo que
ambos caminham lado a lado, em nome da segurança jurídica. No entanto, há de se perceber que cada qual refere-se a
fenômenos jurídicos distintos: enquanto a irretroatividade diz respeito à eficácia da norma, a anterioridade adstringe-se à
vigência da lei. Nesse passo, faz-se premente afirmar que nem mesmo um é sucedâneo do outro, pois protegem bens jurídicos
distintos dentro da ordem constitucional tributária.
15
Nogueira (1999, p. 85) defende que a lei interpretativa não pode causar
gravames ao contribuinte (criar ou aumentar exações, estabelecer penalidades
ou ônus), devendo limitar-se a dispor sobre suavizações da letra normativa
(eqüidade, remissão, anistia, etc.).
A LC 118/05, em seu art. 3º, pretendeu constituir norma tributária
interpretativa do art. 168, I, CTN, dizendo que o prazo para a repetição de
indébito tributário é de cinco anos. A jurisprudência e a doutrina, já pacificadas,
indicavam o prazo de 10 anos. O comando legislativo pretendeu atingir fatos
geradores até então protocolizados. Em dissonância com o legislador, o STJ
considerou o art. 3º da LC 118/05 como lei inovadora, não como mera
interpretação. Deste modo, conferiu efeito “ex nunc” ao diploma, asseverando
que somente ela é a corte apta a realizar a interpretação da norma federal,
constituindo sua guardiã. Por recente decisão de sua Corte Especial, o STJ
afirmou que o prazo prescricional de cinco anos, erigido pela LC 118/05, só terá
vigor a partir do diploma, não se aplicando a fatos anteriores. Esses estarão
acobertados pelo decênio prescricional para a repetição de indébito, desde que o
termo final não extrapole o lustro posterior à vigência da LC 118/0519.
II – LEI MAIS BENÉFICA, à luz do Direito Tributário Penal20 – condição:
desde que o ato não esteja definitivamente julgado.
Condição detalhada: a aplicação retroativa da lei mais benéfica ocorrerá
se o ato não estiver definitivamente julgado. Assim, se já tiver ocorrido o trânsito
em julgado da demanda, não se falará em retroatividade, mas sim em
irretroatividade da lei. Só será aplicada a lei mais benigna se houver pendência
de julgamento. Quanto à definição de julgamento definitivo, são líquidas as
opiniões, falando alguns em caráter peremptório jurisdicional (coisa julgada
“stricto sensu”) e outros, em mera decisão administrativa na esfera recursal.
Sabbag (2004, p. 33 e 34) denomina o fenômeno de princípio da benignidade,
retroação benéfica da multa tributária ou “retroatio in mellius”.
O art. 106, II, “c”, CTN, tem por objeto a penalidade mais branda ao
contribuinte como fato de retroação da norma tributária. Observe que a definição
do tributo se aplica ao tempo de ocorrência do fato gerador, sendo certo que o
princípio “tempus regit actum” tem vez também no campo tributário, mesmo que a
lei então vigente à época esteja atualmente revogada (ultratividade). A retroação,
no entanto, poderá alcançar as sanções tributárias, desde que mais benéfica ao
sujeito passivo da relação jurídico-tributária. Entretanto, penalidades já
adimplidas, com crédito tributário extinto, não fazem nascer direito à restituição
em retroação futura.
Observação (análise do art. 144, CTN)21: o art. 144, “caput”, CTN, apesar
de, na aparência, sugerir uma retroação da lei, de fato, corrobora com o princípio
da irretroatividade, porquanto a lei aplicada no lançamento deve ser aquela

19
STJ, 1ª T., REsp 943.116-SP, rel. Min. José Delgado, j. 19/6/2007, Informativo do STJ n° 324.
20
A retroação da lei mais benigna só ocorrerá quanto a sanções tributárias, não abrangendo redução de alíquotas nem de base
de cálculo.
21
Nogueira (1999, p. 223 a 226), filiando-se à doutrina germânica-suiça, defende o lançamento como mero procedimento
administrativo, de natureza declaratória. Desta feita, em face do princípio da irretroatividade da norma tributária, o lançamento
apresenta efeito “ex tunc”, fazendo aplicar a lei tributária à época da ocorrência do fato gerador.
16
vigente no momento do fato gerador. Não se trata de exceção ao ditame, vez
que, como já fora dito, esta se encontra somente no art. 106, I e II, CTN. Do
mesmo modo, o art. 144, § 1º, CTN, não excepciona o princípio mencionado,
porque a lei, referida no dispositivo, é de natureza formal. Não altera
substancialmente o fato gerador e a obrigação dele decorrente, “per se”, mas sim
aspectos procedimentais quanto ao ato de lançamento.
Observe, portanto, que o art. 144, “caput”, CTN, ratifica a regra constante
do art. 150, III, “a”, CF/88, indicando que a lei deve preceder os fatos geradores
aos quais ela se refere. Nesse passo, perquire-se qual o alcance do art. 144, § 1º,
CTN, segundo o qual se aplicará ao lançamento a lei que ampliar as garantias do
crédito tributário, que aumentar os poderes de investigação, ou que aprimorar os
métodos de apuração do importe devido. Com efeito, trata-se de lei adjetiva ou
formal, adstrita a aspectos rituais de fiscalização. Por conseguinte, tal norma não
se refere propriamente ao cerne do liame obrigacional à luz do fato gerador, o
que lhe daria o rótulo de lei material –, mas à estrutura formal do lançamento.
Importante: há ressalva na parte final do art. 144, § 1º, CTN, indicando a
necessidade de aplicação da “regra” – lei contemporânea do fato gerador. De
fato, há menção à lei que, ampliando as garantias do crédito, atribuiria
responsabilidade a terceiros, o que a reveste de caráter de norma material, e não
formal.
Dica final (o IR e o princípio da irretroatividade): até a década de 80, a
doutrina e a jurisprudência (Súmula 584 do STF, já comentada) entendiam o fato
gerador do IR no contexto estritamente temporal, afastando o enfoque
econômico. Assim, o fato gerador tinha marco temporal preciso – último segundo
do último dia do ano. Nesse contexto, uma lei majoradora do IR em 31/12, por
exemplo, “antecederia” o fato gerador, “respeitando-se” o princípio da
irretroatividade. Tal fenômeno era conhecido como retroatividade imprópria ou
como aplicação da Teoria da Retrospectiva, de fundo alemão. Não obstante o
posicionamento citado, aos poucos a doutrina passou a refletir sobre a
necessidade de ver o fato gerador do IR na perspectiva econômica, isto é, à luz
de um sistema de bases correntes, nas palavras de Aliomar Baleeiro. Por meio
de tal análise, o fato gerador do IR seria a soma algébrica de fatos ou
disponibilidades econômicas, no transcorrer do ano-base (ano-
base=f1+f2+f3+...+fn), até que o movimento, à semelhança de um “filme em
exibição”, como disse Sacha Calmon Navarro Coêlho, chegasse ao seu fim. Note
que se trata de estrutura dualista para o IR: um ano-base de auferimento de
renda e um ano seguinte de entrega de declaração e recolhimento do imposto. É
fácil perceber, destarte, que a doutrina mudou o pensar, adotando
majoritariamente a Teoria do Fato Gerador Complessivo para o IR, ressalvados
casos isolados de pensamento diverso, como Machado (1993), Paulo de Barros
Carvalho e Cassone (2004). A partir de meados da década de 80, alguns
doutrinadores (Luciano Amaro, Ives Gandra da Silva Martins e outros) já
passaram a apregoar o posicionamento do fato complessivo, principalmente em
congressos e seminários jurídicos. O dado curioso está no fato de que a atividade
legislativa que marcou os anos que sucederam a CF/88 pautou-se na obediência
à Teoria do Fato Gerador Complexivo, na esteira da doutrina então majoritária
17
(Lei 9430/96, Lei 8383/91, etc.). Por fim, diga-se que, surpreendentemente, a
Súmula 584 do STF (já comentada) – editada na década de 80, no superado
contexto da “teoria da retrospectiva” – apresenta-se hábil e vigorosa para aquela
corte, em total dissonância com a doutrina majoritária. Esta, como se expendeu,
entende hábil a teoria do fato gerador complessivo.
A Lei 9113/96, que instituiu a CPMF, proibia o uso de informações dela
decorrentes para fiscalização de outras exações, “ex vi” do seu art. 11, § 3º. Essa
disposição se devia ao art. 38, § 1º, Lei 4595/64, a qual determinava que só o
Poder Judiciário poderia quebrar sigilo bancário de pessoa. Esse entendimento
era vigorante à época por leitura jurisprudencial. No entanto, o art. 5º, LC 105/01,
previu a possibilidade de investigação ampla pela autoridade fiscal, o que incluía
dados bancários. A Lei 105/01 alterou a redação do art. 11, § 3º, Lei 9113/96,
adequando-a às colocações da LC 10174/01, de sorte a permitir que dados sobre
CPMF servissem à fiscalização de outros tributos. Quanto a esse poder fiscal
amplo, garantido pelo diploma mais hodierno, em tese, não seria possível
retroação a fatos ocorridos sob a égide do art. 11, § 3º, Lei 9311/96, em letra
original. No entanto, essa retroatividade é permitida, porque a ampliação dos
poderes da Administração Tributária encontra fundamento no art. 144, § 1º, CTN,
segundo jurisprudência pacífica do STJ. Ademais, para fins penais, a corte já
fixou entendimento no sentido da natureza processual do art. 1º, § 3º, III, LC
105/01, o qual alterou o alcance do art. 11, § 3º, Lei 9113/96, tem aplicação
retroativa, não havendo de se falar em ilicitude da prova obtida anteriormente à
vigência do referido diploma complementar22.

Princípio da Uniformidade Geográfica (art. 151, I, CF/88)


Trata-se de comando previsto em artigo distinto daquele que abarca
quase toda a base principiológica na CF/88 – o seu art. 150. É princípio afeto tão-
somente à União, isto é, à tributação federal.
Compete à União instituir o tributo UNIFORME no Brasil, devendo prever
as mesmas alíquotas em toda a extensão territorial. Assim, tal postulado vem ao
encontro da isonomia e, é claro, do pacto federativo (art. 60, § 4º, I, CF/88).
Há exceção, entretanto, ao princípio em tela, conforme se nota na parte
final do art. 151, I, CF/88: “... incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio
socioeconômico entre as diferentes regiões do país”. Exemplo: Zona Franca de
Manaus (observação: os benefícios fiscais foram prorrogados de 2013 para 2023,
conforme se depreende do art. 92 do ADCT, com redação dada pela EC 42/03).
Para Nogueira (1999), a regra do art. 152, CF/88 – a qual veda a “guerra
fiscal”, promovida pela União, entre os membros da Federação – é um
consectário do princípio da uniformidade geográfica, esculpido no art. 151, I,
CF/88. No diapasão, Baleeiro (apud NOGUEIRA, 1999) afirma que, "em
conseqüência dessa uniformidade, as discriminações dos tributos limitar-se-ão a
critérios pessoais, reais, ou de valor, mas nunca de lugar". Para este renomado
autor, o princípio em pauta presta-se à preservação da unidade territorial do

22
STJ, HC 31.448-SC, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23/8/2007, Informativo do STJ n° 328.
18
mercado nacional. O STF corrobora com o enunciado do art. 152, CF/88,
especialmente quando se trata de norma estadual referente a ICMS. De fato,
eventuais benefícios fiscais relativos à exação citada devem estar de acordo com
deliberações de convênio celebrado entre todos os Estados, sob pena de macular
o art. 155, § 2º, XII, “g”, CF/8823. Em recente decisão quanto à redução de base
de cálculo sobre operações com café torrado e moído oriundo do Rio de Janeiro,
o Supremo declarou a disposição inconstitucional, porquanto fere o comando dos
arts. 152 e 155, § 2º, XII, “g”, CF/88 (Convênio CONFAZ 128/94)24.
O princípio da uniformidade geográfica é decorrente da isonomia, sendo
exprimido no art. 151, I, CF/88. É ditame aplicado diretamente aos entes da
federação, só influenciando na esfera privada de forma reflexa. A União, por meio
de seus tributos federais, não poderá estabelecer discriminação tributária entre as
demais pessoas políticas. Ex.: não é possível IPI menor para automotores no RS
em detrimento dos demais Estados. As exações federais deverão ser uniformes
em todo território nacional. O próprio comando em comento foi excepcionado pelo
próprio constituinte, desde que se justifique pela situação concreta apresentada.
Com efeito, a União pode dar tratamento fiscal diferente para áreas com menos
desenvoltura financeira, com o fito de “promover o equilíbrio do desenvolvimento
sócio-econômico entre as diferentes regiões do País”. Não é mácula à isonomia,
mas sim tentativa de equiparação regional.

Princípio do Não Confisco (art. 150, IV, CF/88)


Nas palavras de Nogueira (1999, p. 126), confisco é “a absorção, pelo
tributo, da totalidade do valor da situação ou do bem tributado, como qualquer
parcela que exceda à medida fixada legalmente”. Na mesma esteira, Carrazza
(1991) diz que “é confiscatório o tributo que, por assim dizer, esgota (ou tem a
potencialidade de esgotar) a riqueza tributável das pessoas, isto é, que não leva
em conta suas capacidades contributivas”. Em outros termos, pode ele ser
entendido como tributação exacerbada, excessiva. De fato, o legislador não
definiu estritamente o termo, deixando ao arbítrio do aplicador do direito sua
configuração. Sabbag (2004, p. 38) preconiza que a caracterização do confisco é
ônus do contribuinte, porquanto ele deve suscitá-lo na esfera jurisdicional. Nesta
esteira, sua consubstanciação depende da análise “in casu”, levando em conta
uma hermenêutica sistemática do setor tributário (entendimento do STF).
Observação: quanto à possibilidade de existência de confisco em multa, o
STF já se manifestou positivamente, assentando o entendimento no direito de
propriedade (art. 5º, XXII, CF/88).
Dessa feita, a definição de confisco não é dada por colocação abstrata,
mas sim no caso concreto, segundo a razoabilidade e a proporcionalidade. Em
princípio, é um desiderato aplicado tão-só a tributos. Destarte, a jurisprudência

23
STF, ADI 1247 MC/PA, DJU 8.9.95; ADI 2021 MC/SP, DJU 25.5.2001; ADI 3936 MC/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, j.
19.9.2007, Informativo do STF n° 480.
24
STF, ADI 3389/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 6.9.2007, Informativo do STF n° 478; ADI 3673/RJ, rel. Min. Joaquim
Barbosa, j. 6.9.2007, Informativo do STF n° 478; ADI 2377 MC/MG, DJU de 7.11.2003; Plenário, RMS 17949/ES, DJU de
27.9.68.
19
majoritária, com fulcro em entendimento do STF e conforme mencionado, diz
esse princípio é extensível às multas25.

Princípio da Não Limitação ao Tráfego de Pessoas e Coisas (art. 150, V,


CF/88)
A base axiológica deste ditame – erigido em nível constitucional –
encontra tutela na própria Carta de 1988, particularmente no direito individual à
liberdade de locomoção (art. 5º, LV e LXVIII, CF/88). Dessa forma, não pode
haver exação que erija, como fato gerador, a intermunicipalidade ou a
binterestadualidade, no veio do deslocamento de pessoas e bens (SABBAG,
2004, p. 40). O autor ainda indica duas atenuações26:
 A instituição de pedágio, para a conservação das rodovias, vez que o
fato gerador é outro;
 A exigência de comprovação de recolhimento de ICMS nos postos fiscais
em fronteiras interestaduais.

Princípio da Não-cumulatividade
É técnica de redução de carga tributária sobre o consumo, desonerando a
cadeia produtiva. Em termos genéricos, a não-cumulatividade se estende ao IPI
(art. 153, § 3º, CF/88), ao ICMS (art. 155, § 2º, II, CF/88), aos impostos residuais
da União (art. 154, I, CF/88), às contribuições sociais residuais federais (art. 195,
§ 4º, CF/88) e às contribuições sociais da União que incidam sobre faturamento,
receita e importação (art. 195, § 12, CF/88). Ex.: não cumulatividade de PIS e
COFINS (Lei 10833/03).
A não-cumulatividade não erige uma regra uniforme para todas as
exações. Cada tributo terá sua regência própria, nos termos do estipulado pelo
constituinte ou pelo legislador infraconstitucional, desde que a desoneração do
consumo seja atingida.
A não cumulatividade do IPI segue uma norma (art. 153, § 3º, II, CF/88): a
cada entrada, há um crédito; a cada saída, um débito. A base de cálculo é o valor
da operação, sendo somado ao tributo incorporado (tributo indireto com
repercussão econômica por transferência ao próximo da cadeia). Ex.: mercadoria
de R$ 100, com alíquota de 4%, sendo vendida por R$ 104. O imposto será pago
mensalmente, compensando-se a diferença entre créditos e débitos. O STF
definiu a extensão da não-cumulatividade do IPI, vinculando o direito a crédito à
tributação da operação anterior, em que pese não haver expressa previsão nesse
sentido no art. 153, § 3º, II, CF/88, ao contrário do ICMS (art. 155, § 2º, II, “a” e
“b”, CF/88). A expressão “imposto cobrado” faz entender que o constituinte quis
permitir a compensação somente na existência de operação anterior. Esse

25
STF, ADIn 2010/DF-MC, em que multa de 300% por não emissão de nota fiscal foi considerada confiscatória.
26
Além desses casos, a doutrina indica outros, de natureza diversa. A cobrança de exação para o ingresso em instância turística
não configura ranhura ao princípio da não-restrição à circulação, porquanto se trata de taxa, com necessária contraprestação.
De igual maneira, a incisão de tributo para o embarque em ônibus interestaduais ou intermunicipais não comporta ferimento ao
ditame do art. 150, V, CF/88.
20
entendimento do Supremo foi alterado, porque, desde 1995, o plenário dava
ganho de causa aos contribuintes. Dessa feita, isenção, não-incidência,
imunidade e alíquota zero na operação anterior não dão direito à compensação
de crédito em IPI, consoante reiterada e hodierna jurisprudência do STF27.
Como o IPI é imposto de repercussão econômica (transferência ao
próximo da cadeia), a restituição de montante recolhido a mais é dada nos termos
do art. 166, CTN. O comando condiciona a restituição a:
• Prova de que arcou com o ônus do tributo, não o repassando ao próximo
elo da corrente; ou
• Apresentação de autorização do próximo na cadeia a receber a
restituição em seu lugar, no caso de ter havido o repasse, visto que esse
é o contribuinte de fato do IPI e aquele, de direito. O STJ, apesar de
emprestar natureza jurídica de condição da ação de repetição de
indébito ao art. 166, CTN, admite que a justifica seja apresentada
posteriormente ao ajuizamento da demanda, mormente se houve
impossibilidade de fazê-lo antes28.
O Supremo referenda o comando do art. 166, CTN, por meio de suas
Súmulas 71 e 54629.

Imunidades Tributárias30
As imunidades tributárias indicam limitações constitucionais ao poder de
tributar, a par dos princípios anteriormente estudados. Trata-se de dispensas
constitucionais de tributos, isto é, normas de intributabilidade que gravitam em
torno da “não-incidência” tributária. Nos termos de Nogueira (1999, p. 167), “a
imunidade é, assim, uma forma de não-incidência pela supressão da
competência impositiva para tributar certos fatos, situações ou pessoas, por
disposição constitucional”.
Com efeito, a imunidade é uma delimitação negativa da competência
tributária, segundo a melhor doutrina. Como é sabido, a competência tributária
traduz-se no poder de instituição do tributo, conferido às entidades impositoras.
Note que estas, ao mesmo tempo em que se valem do poder de criar, devem se
afastar diante do campo imunizante estabelecido e demarcado pelo legislador.
Assim, a norma imunizadora coexiste com a norma de imposição, ambas
previstas na CF/88.

27
STF, RE 353657/PR, rel. Min. Marco Aurélio, j. 25.6.2007, Informativo do STF nº 473; RE 370682/SC, rel. Min. Ilmar
Galvão, j. 25.6.2007.
28
STJ, 2ª T., REsp 962.909-BA, rel. Min. Castro Meira, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
29
Súmula 71 do STF: “Embora pago indevidamente, não cabe restituição de tributo indireto”. Súmula 546 do STF: “Cabe a
restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte de jure não recuperou do
contribuinte de facto o quantum respectivo”.
30
Além dos pontos tratados na matéria, Cassone, op. cit., p. 255 e 256, indica alguns outros a serem discutidos quanto às
imunidades: deve se lhes aplicar interpretação extensiva, em acordo com a finalidade da imunidade e com a razoabilidade; é
possível a regulamentação da imunidade por lei infraconstitucional; as obrigações acessórias não são atingidas pela imunidade
(art. 194, parágrafo único, CTN).
21
É importante frisar que as principais imunidades referem-se a impostos
(art. 150, VI, CF/88). Entretanto, há exemplos pertinentes que indicam
imunidades para tributos diversos de impostos. Note:
a.Art. 195, § 7º, CF/8831 – contribuição previdenciária (entidades
beneficentes de assistência social). Observação: a expressão “são
isentas de...” indica impropriedade terminológica para o STF, que vê no
dispositivo nítido exemplo de imunidade.
b.Art. 149, § 2º, I, CF/88 (EC 33/01) – CIDE’s e contribuições
previdenciárias (receitas decorrentes de exportação).
c. Art. 184, § 5º, CF/88 – impostos de todas as pessoas jurídicas
(operações de transferência de imóveis desapropriados para a reforma
agrária). Nesse sentido, o art. 18, “caput”, LC 76/93, isentou tais fatos
também de taxas judiciais e emolumentos cartoriais.
d.Taxas para certidões, para protocolização de certas ações coletivas, etc.
Vamos, agora, às principais imunidades previstas no art. 150, VI, CF/88:
 Há quatro alíneas (DECORAR).
 São casos de não-incidência de impostos, o que permite concluir pela
normal incidência dos demais tributos (taxas, contribuições de melhoria,
etc.).
1.Alínea “a” (IMUNIDADE RECÍPROCA) – União, Estados, Municípios e
DF não poderão cobrar impostos uns dos outros.
− Elemento teleológico – quis o legislador proteger os entes tributantes
contra a reciprocidade na tributação de impostos. Com efeito, o
imposto é tributo unilateral, indicando um poder de sujeição daquele
que tributa com relação àquele que é tributado. Neste passo, a
provável incidência colocaria em risco o pacto federativo – o próprio
elemento teleológico da imunidade em exame.
− Atenção – a alínea “a” apresenta menção a rol classificatório oriundo
do CTN (arts. 19 a 73) – “impostos sobre patrimônio, renda ou
serviços”. Segundo a literalidade do comando, não deverá haver a
incidência de IPTU, de IPVA, de IR, de ITR e de ISS, por exemplo. A
questão é problemática: e os impostos não pertencentes ao rol
mencionado, tais como II, ICMS, IPI e o IOF? Para o STF e
renomados tributaristas32, a imunidade deve abranger quaisquer
espécies de impostos, independentemente da limitação
classificatória ora guerreada. Exemplos:
 Não-incidência de IOF nas operações financeiras desencadeadas
pelos Municípios (STF).
31
O dispositivo exigiu lei regulamentadora para surtir reflexos, cujo prazo para publicação não foi definido. O STF, no MI
232-1/RJ, rel. Min. Moreira Alves, ajuizado pelo Centro de Cultura, inovou seu entendimento. Adotando uma posição
concretista moderada, fixou prazo para que o legislador se manifestasse acerca da omissão legislativa, findo o qual a própria
corte asseguraria o direito subjetivo em comento – no caso, imunidade de contribuições sociais para entidades beneficentes de
assistência social (art. 195, § 7º, CF/88).
32
Regina Helena Costa, por exemplo, em “Imunidades Tributárias”, editado pela Malheiros.
22
 Não-incidência de II nas operações de importação de um
Estado qualquer.
− Análise do art. 150, § 2º, CF/88 – há extensão da imunidade
recíproca às autarquias e fundações públicas, desde que se
cumpram às necessidades essenciais/precípuas da entidade. Não
perca de vista que a condição se atrela tão-só ao § 2º, não existindo
para a alínea “a”. Exemplos:
 Uma autarquia, proprietária de bem imóvel utilizado para
finalidade esdrúxula, receberá a tributação de imposto.
 Uma empresa pública, por exemplo, a CEF, é alvo normal da
incidência de impostos (Concurso de Advogado da CEF).
DADO JURISPRUDENCIAL RELEVANTE – há certas empresas
públicas que executam atividades revestidas de estatalidade,
apresentando-se com nítida “roupagem” estatal. Nesta medida,
perguntar-se-ia: é válida a extensão da imunidade a elas? Para o STF,
a resposta é afirmativa, valendo a pena ao estudioso consultar
jurisprudência pertinente. Nesse sentido, são a EBCT (Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos), quanto ao serviço postal, com
fulcro no art. 21, X, CF/88, e a INFRAERO (Empresa Brasileira de Infra-
Estrutura Aeroportuária), com base no monopólio estatuído no art. 21,
XII, “c”, CF/8833.
2.Alínea “b” (IMUNIDADE PARA OS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO)
 Elemento teleológico – a razão finalística da proteção constitucional
está na liberdade de culto/religiosa (art. 5º, VI, CF/88), que caracteriza
o laico Estado brasileiro (art. 19, I, CF/88). A doutrina majoritária a
considera imunidade subjetiva, mas Cassone (2004, p. 254)
denomina-a de objetiva, pois estaria ligada à atividade e não à pessoa
da entidade religiosa.
 Abrangência – a imunidade alberga o templo e seus anexos,
emanando os efeitos da não-incidência para o veículo da igreja, para
a casa do representante religioso, para as rendas obtidas nos eventos
religiosos, etc.
 Análise do art. 150, § 4º, c.c. alínea “b” do inciso VI, CF/88 – as
igrejas deverão respeitar o cumprimento da finalidade essencial (§ 4º).
Entretanto, o STF entende ser possível a execução de atividades
inessenciais pelo templo (locação de bens de sua propriedade) e,
mesmo assim, ter a extensão da imunidade de templo ao bem
locado34. Há condições para isso: prova da inexistência de prejuízo à
livre concorrência; prova da aplicação integral das rendas na
consecução dos objetivos institucionais do templo. Ex.: a Igreja

33
STF, RE 265749/SP, DJU 2.2.2007; RE 357291/PR, DJU 2.6.2006; RE 407099/RS, DJU 6.8.2004; 2ª T., RE 363412
AgR/BA, rel. Min. Celso de Mello, j. 7.8.2007, Informativo do STF n° 475.
34
STF, AgRg RE 205.169-7, 2ª T., rel. Min. Marco Aurélio Mello, DJU 5-6-1998, p. 10. Jurisprudência extraída de Cassone,
op. cit., p. 256.
23
apostólica, uma vez que caracterize vínculo causal à sua função
precípua, pode remeter divisas para o Vaticano, o que não abarca o
envio puro e simples de valores ao Estado Católico.
3.Alínea “c” (IMUNIDADE PARA PARTIDOS POLÍTICOS, ENTIDADES
SINDICAIS DE TRABALHADORES, INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO E
ENTIDADES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL)
 Natureza – trata-se de imunidade subjetiva35, destinada a pessoas
jurídicas, sobre as quais não incidirão exações não vinculadas
(impostos).
 Elemento teleológico – cabe frisar que, como opção política do
legislador, a regra imunitória prevista na alínea “c” vem ao encontro
dos valores mais relevantes, previstos no texto constitucional. Vamos
detalhá-los, tentando identificar o elemento finalístico de cunho
axiológico, que moveu o constituinte em cada caso:
− Partidos políticos – a regra visa proteger a liberdade política no
Brasil, prevendo a exoneração de impostos sobre os partidos
políticos. Com efeito, o pluralismo político é um dos fundamentos da
nossa Federação (art. 1º, V, CF/88), delineando a necessidade de
tutela àquelas entidades que traduzem politicamente os anseios
plurais dos filiados – e de toda a coletividade. As fundações ligadas
aos partidos também gozam da prerrogativa prevista na Lei Maior.
Ex.: Fundação Pedroso Horta, pertencente ao PMDB. Somente
partidos políticos registrados no TSE serão abarcados pelo benefício
em tela, não incluindo aqueles clandestinos, contrários à ordem
constitucional-democrática posta. Ex.: partido neonazista.
− Entidades sindicais de trabalhadores – objetiva a proteção dos
direitos sociais (art. 7º, CF/88) e, mais precisamente, abrigo àqueles
que ocupam, em tese, o pólo mais fragilizado da relação laboral – os
empregados. Curioso apontar a existência de um ponto de
convergência entre o Direito do Trabalho e o Direito Tributário. No
entanto, é importante firmar que se protegem os sindicados dos
empregados, isto é, as entidades obreiras. Assim, o legislador
admitiu a normal tributabilidade dos sindicatos patronais,
segundo postulam Carrazza (1991), Cassone (2004) e doutrina
majoritária36. Há vozes minoritárias na doutrina que preconizam
violação à isonomia, em face do discrime aventado, propugnando
pela inclusão dessa entidade no rol dos imunes. É o que professam
Chimenti (2002) e Machado (1993).
− Instituições de educação – idem colocações infra sobre as
expressões “in fine” da alínea “c”.

35
Cassone, op. cit., p. 254 e 255, considera a imunidade prevista no art. 150, VI, “c”, CF/88, como mista, ou seja, aquela
dispensada a determinados bens (renda, patrimônio e serviços) de certas pessoas (partidos políticos, sindicatos de empregados,
instituições de educação e de assistência social).
36
Cf. Ac. 8.872 do TAPR, 3ª Câm. Cív., AC 106.838.000 – Maringá, Juiz conv. Eugenio Achille Grandinetti, j. de 19-8-1997,
publ. Em 5-9-1997, Juis, Saraiva, n. 17.
24
− Entidades de assistência social – ibidem. Além de tudo, no
magistério de Sabbag (2004, p. 51), necessário é lembrar que tais
pessoas também são imunes às contribuições sociais, consoante
comando exprimido no art. 195, § 7º, CF/88.
− Análise das expressões constantes da parte final da alínea “c”:
o “Sem fins lucrativos” – o legislador fez menção a termo pouco
elucidativo – o lucro. De fato, quis mencionar o superávit, isto é, a
diferença entre receitas e despesas financeiras da entidade.
Portanto, a expressão merece uma associação cautelosa, pois o
“lucro”, em tese, estaria ligado de modo imediato às entidades
educacionais e beneficentes, não obstante a mediata ligação a
todas pessoas citadas37.
o “Atendidos os requisitos da lei” – é fácil perceber que se trata de
condicionamento imposto à norma, o que permite chamá-la de
imunidade condicionada ou limitada (SILVA, 1996). Ademais, há
quem a denomine de “norma não bastante em si mesmas” (Pontes
de Miranda), dependendo de regulamentação futura, segundo
Maria Helena Diniz, de integração, segundo Celso Bastos e Carlos
Ayres Brito, e não auto-aplicável, nas palavras de Rui Barbosa.
Nesse passo, insta inquirir: qual lei será esta? O STF e a doutrina
majoritária, como Machado (1993), Amaro (2006), José Eduardo
Soares de Melo, Misabel Derzi, Paulo de Barros Carvalho,
Chimenti (2002), Cassone (2004) e Sabbag (2004), entendem que
se trata de lei complementar, “ex vi” do art. 146, II, CF/88, que
impõe tal norma às limitações constitucionais ao poder de tributar
(imunidade). No caminho hermenêutico ora trilhado, perguntar-se-
ia: qual lei complementar será esta? É sabido que o CTN (Lei
5172/66) foi concebido como lei ordinária, porém, desde então, em
razão das matérias disciplinadas naquele compêndio, ganhou o
“status” de lei complementar, sendo assim recepcionado pela
CF/88. Portanto, a resposta à pergunta é clara: a lei complementar
que traduz a condição imposta às imunidades será o CTN.
Nesse contexto, o art. 14, I a III, CTN anuncia, em seus três
incisos, os requisitos à fruição da imunidade. São eles:
I. Não distribuição do patrimônio ou renda, a qualquer título
(LC 104/01), entre os mantenedores da entidade. Note que
aquela expressão da CF/88 – “sem fins lucrativos” – deve ser
traduzida à luz deste inciso I. Não se veda o resultado positivo
na entidade, nem mesmo o “animus lucrandi”. O que se quer é o
REINVESTIMENTO daquele resultado nos objetivos
institucionais, vedando-se a apropriação particular do lucro.
Note que as entidades educacionais e assistenciais poderão – e

37
Em sentido contrário, Luciano Amaro, Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed., São Paulo, Saraiva, 2006, p. 155, apregoa que
o alcance das expressões se atém somente às entidades educacionais e assistenciais, não havendo de cogitar sua aplicação aos
partidos políticos e sindicatos de trabalhadores.
25
deverão – almejar o resultado financeiro positivo, merecendo
a proteção da imunidade, se cumprirem a exigência ora
analisada. Diga-se, por fim, que o MANTENEDOR da instituição
poderá receber uma contraprestação pelos serviços realizados,
entretanto, os valores não poderão se apresentar como
“distribuição” disfarçada de lucro”. Nesse passo, a análise é
subjetiva, indicando a jurisprudência no sentido da adstrição a
valores de mercado.
II. Não aplicação de recursos fora do país, prejudicando a
manutenção dos objetivos institucionais – trata-se de
requisito óbvio, pois, diante do resultado positivo, é natural que
se apliquem os valores na consecução dos objetivos
institucionais, não os carreando para países estranhos. O
eminente Aliomar Baleeiro cita curioso exemplo de gasto com
universitário, ligado à instituição educacional, em país
estrangeiro. Haveria desrespeito ao inciso em análise? Para o
mestre, não se perderia a imunidade, havendo respeito à
disposição legal. É o caso também de instituição filantrópica
internacional, a qual possui filial no Brasil. Uma vez que
caracterize vínculo causal à sua função precípua, pode remeter
divisas para o exterior, não incluindo o envio desvinculado de
valores ao exterior.
III. Manter a escrituração contábil em dia e hábil a provar o
cumprimento dos requisitos anteriores – sem a
demonstração mencionada, os pressupostos dos incisos I e II
são iníquos.
 Observações finais – caso a entidade deixe de cumprir os requisitos
do art. 14, I a III, CTN, passará, imediatamente a ser alvo da
TRIBUTAÇÃO, devendo passar a recolher os impostos. A legislação
pertinente (art. 14, § 1º, CTN) trata o assunto com terminologia
criticável, segundo Amaro (2006) e José Eduardo Soares de Melo,
quando permite à autoridade “cassar” a imunidade, como uma
“punição”, o que não parece de todo apropriado. É, sim, mera
paralisação dos efeitos imunitórios. De fato, Amaro (2006, p. 157)
chama o art. 14, § 1º, CTN de aberrante, conquanto sua redação
parece pretender instituir um Poder de punição à autoridade tributária,
a qual poderá realizar ou não a ação – na expressão “pode fazê-lo” –,
mediante ato discricionário.
 Análise do art. 150, § 4º, CF/88 – repetindo comentário supra, o STF
analisa tal comando, afastando a interpretação restritiva, quanto ao rol
classificatório ali inserto – impostos sobre o patrimônio, renda ou
serviços. Ademais, aquela Corte interpreta a expressão “finalidade
essencial” de modo lato, permitindo a extensão da imunidade a bens
ligados a atividades inessenciais (locação, arrendamento, etc),
desde que se cumpram os requisitos já conhecidos, quando dos
comentários retro sobre a imunidade de templos: prova da aplicação
26
integral das rendas nos objetivos institucionais (Ex.: alugueres
recebidos de locação de área pertencente à entidade filantrópica) e da
inexistência de prejuízo à livre concorrência (aferição por meio de
critérios subjetivos). A prova deve ser feita pelo titular da imunidade38.
A propósito, incidiria o ICMS nas rendas e bens provenientes de
bazares organizados por entidade filantrópica? A 1ª Turma do STF
sempre entendeu que deveria haver a incidência do imposto, em
razão da teoria da repercussão tributária, segundo a qual o ônus
recai sobre o contribuinte de fato (adquirente), e não sobre o
contribuinte de direito (a entidade). A 2ª Turma, por sua vez, entendia
cabível a não incidência. O STF (Pleno), em 2 de fevereiro de 2003,
no RE 210.251-2-SP, decidiu por maioria pela não incidência de ICMS
nas vendas, desde que o lucro fosse reinvestido39. É a posição
cristalizada na Súmula 724 do STF40.
 Súmula 730 do STF41 – as entidades fechadas de previdência social
serão imunes quando não houver contribuição dos beneficiados, à
luz dos conceitos de universalidade e generalidade. A participação
onerosa do beneficiário no plano de previdência privada, fruto de
relação contratual entre o órgão e a categoria específica, afasta a
imunidade, consoante entendimento já firmado pelo Pretório
Excelso42.
4.Alínea “d” (IMUNIDADE PARA LIVROS, JORNAIS, PERIÓDICOS E O
PAPEL DESTINADO À SUA IMPRESSÃO)
 Natureza – é objetiva, porque está ligada a bens e não pessoas. De
fato, a alínea “d” versa sobre bens e não sobre pessoas, ao contrário
das demais (“a”, “b” e “c”). Nessa medida, é imunidade objetiva ao
afastar a incidência de impostos reais (sobre os bens),
exclusivamente. Vale dizer que a editora, por exemplo, receberá a
carga de impostos sobre si, naturalmente. Em contrário senso, não
incidem sobre o livro e sucedâneos: ICMS, IPI, II, IE, etc. E incidirão,
normalmente: IPVA (carro da editora), IR (renda da venda dos
livros), ITBI (aquisição de prédio pela editora), etc. Mas a regra da
imunidade não inclui atividades ligadas ao bem, como é o caso de ISS
sobre a publicidade nas publicações.
 Elemento teleológico – é a difusão do conhecimento e da cultura.
Independe do conteúdo difundido, isto é, a proteção alcança as
revistas pornográficas (material fescenino), aquelas de pouco

38
STF, AgRgRE 106.169-7, rel. Min. Marco Aurélio, DJU e-1, de 5-6-1998, p. 10.
39
STF, Pleno, RE 210.251-2/SP, rel. Min. Ellen Gracie, j. 2-3-2003, DJU 19-11-03; RE 286.692, Informativo do STF nº 220;
RE 237.718-SP, DJU 6.9.2001; RE 235.737-SP, DJU 12.11.2001. No mesmo sentido, defende Amaro, op. cit., p. 154.
40
Súmula 724: “Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao iptu o imóvel pertencente a qualquer das entidades
referidas pelo art. 150, VI, c, da Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais
entidades”.
41
Súmula 730 do STF: “a imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150,
vi, c, da constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos
beneficiários”.
42
STF, RE 202.700/DF.
27
conteúdo informativo, etc. Encontra guarida constitucional nos arts.
5º, IV, IX e XIV, e 220, § 6º, CF/88.
 Mídia eletrônica – a doutrina mais abalizada, representada, dentre
outros, por José Eduardo Soares de Melo e por Cassone (2004), e a
jurisprudência vêem a EXTENSÃO da imunidade aos livros na forma
de CD-Rom. Justificam que a imunidade deve ser aferida a partir do
fim da difusão do conhecimento, e não em razão do suporte difusor de
cultura. O art. 2º, parágrafo único, VII, Lei 10753/03 (Lei da Política
Nacional do Livro) equipara o livro em meio digital a livro impresso,
reforçando a tese majoritária.
 Lista telefônica – segundo entendimento assentado pelo STF, as
listas telefônicas são imunes, na condição de periódicos,
independentemente da ausência de conteúdo informativo43. Na
mesma idéia, vêem outras decisões do Excelso Pretório aceitando a
extensão da imunidade a manuais técnicos e apostilas44.
 Insumo – o único insumo protegido pela regra será o PAPEL
destinado à impressão. Entretanto, foi publicada a Súmula 657 do
STF45, que estendeu a imunidade da alínea “d” aos filmes e papéis
fotográficos necessários à publicação de jornais e revistas. Em
sentido contrário, Chimenti (2001, p. 41) leciona que imunidade a
deve abranger todos os meios indispensáveis à produção dos objetos
imunes, como equipamentos destinados à função. Ex.: imunidade de
II sobre máquinas de impressão de jornais. Não é a posição
cristalizada pelo Excelso Pretório, porquanto este procura conferir
uma interpretação restritiva ao dispositivo46.

Pergunta: A jurisprudência tem entendido que as imunidades devem ser


interpretadas ampliativamente?
Resposta: a jurisprudência tem admitido sempre a aplicação da
imunidade de forma restritiva, valorizando os direitos fundamentais que lhe são
afetos. Lembre-se que não havendo tributação, a norma imunizante deve ser
observada com bastante rigor e os Tribunais caminham neste sentido.
Pergunta: Uma imunidade pode ser regulamentada por lei ordinária ou
complementar? Ou é auto-aplicável?
Resposta: imunidade acaba sendo implantada por lei ordinária, tendo em
vista ser a Receita Federal o órgão escolhido para certificar tal proteção
constitucional.
Pergunta: Como fica a situação das obrigações acessórias quando há
imunidade: elas são devidas?

43
STF, RE 101.441/RS; RE 199.183, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 12.06.1998.
44
STF, RE 183.403-SP, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 07.11.2000.
45
Súmula 657 do STF: “A imunidade prevista no art. 150, VI, d, da CF abrange os filmes e papéis fotográficos necessários à
publicação de jornais e periódicos”.
46
STF, RE’s 204.234, 203,859 e 273.308/SP, rel. Min. Moreira Alves, DJU 22.8.2000.
28
Resposta: lembre-se que, se não há tributação, não há obrigação
principal e muito menos acessória, no que diz respeito aos impostos. Caso haja
cobrança de uma contribuição social, por exemplo, a obrigação acessória
persistirá, pois esta modalidade tributária não é abarcada pela imunidade, daí o
teor do art. 9º do CTN. No entanto, o art. 194, parágrafo único, CTN, deixa claro
que as pessoas imunes, assim como as isentas, sujeitam-se à fiscalização
tributária, o que, em tese, engloba as obrigações acessórias.
Pergunta: quanto à imunidade condicionada do art. 150, VI, “c”, CF/88, foi
dito que o art. 14, I a III, CTN, estabelece as condições para o exercício, segundo
o STF e a doutrina majoritária. Entretanto, o art. 12, § 2º, “a”, Lei 9532/97, e o art.
3º, § 2º, III, D. 4382/02, inovam em suas disposições, preceituando condição
inexistente na citada LC. Como compatibilizar os dispositivos?
Resposta: a Constituição Federal estabelece que os requisitos da 'lei'
devem ser cumpridos. O termo lei, sem adjetivo algum, corresponde à figura da
lei ordinária, abarcando assim, as mencionadas disposições citadas por V.Sa.
Não há que se falar em incompatibilidade já que a lei e a LC (CTN) especializarão
o assunto a ser implementado.
Pergunta: o art. 2º, parágrafo único, VIII, Lei 10753/03 (Política Nacional
do Livro) equipara o livro somente às mídias eletrônicas destinadas a deficientes
visuais exclusivamente. Ademais, o "caput" do dispositivo deixa claro que suas
conceituações valem intrinsecamente ao diploma ("para efeitos dessa lei"). Nesse
passo, à guisa do entendimento do STF, a disposição legal não poderia ser
usada como argumento jurídico para extensão da imunidade do art. 150, VI, “d”,
CF/88. A posição está correta?
Resposta: já ocorre uma aplicação extensiva em função de outro
raciocínio. O termo livro quer representar um suporte físico que tanto pode ser
escrito em papel ou digitalizado, nesse sentido o CD-rom recebe seu tratamento
imunizante.
Pergunta: quanto ao art. 156, XI, CTN, há alguma regulamentação ou
aplicação em vigor? Qual? Ela seguiu a orientação do art. 146, III, “b”, CF/88?
Resposta: Não, o assunto deve ser regulado por cada uma das pessoas
políticas interessadas (M, E-m, DF e UF). O inciso XI do art. 156 do CTN foi
incluso pela Lei Complementar n.104/01, respeitando as previsões expressas da
CF, em seu art.146, III.
Pergunta: uma entidade, recebendo certificação de organização social ou
de organização da sociedade civil de interesse público, somente por esse fato,
faz jus à imunidade do art. 150, parágrafo VI, “c”, CF/88? Como é concedida a
imunidade em termos práticos? Por requerimento às Fazendas e autarquias de
capacidade tributária ativa? Basta um requerimento ou deve ser feito a todos?
Resposta: não, uma entidade, recebendo certificação de organização
social ou de organização da sociedade civil de interesse público, somente por
esse fato, não faz jus à imunidade do art. 150, parágrafo VI, “c”, CF/88. Apenas a
entidade assistencial social ou educacional, conforme expressa disposição
constitucional, pode, após ter cumprido os requisitos da lei para receber a
29
concessão da imunidade, receber a concessão imunizante. Deve ser pleiteada
perante a Receita Federal, via requerimento conforme estabelece os
procedimentos da Receita e Lei nº 9532/97, em seus arts. 12 e 13, e Lei
10.637/02.

Sistema Tributário Nacional


Quando se deu a formação do Sistema Tributário Nacional (STN)?
Qual a importância da EC 18/65?
A EC 18/65 foi a criadora do Sistema Tributário Nacional. Transformou a
Carta de 1946, sendo chamada de a grande reforma tributária brasileira (primeira
delas). Criou um regime sistematizado, especialmente voltado para fruição de
algumas liberdades fundamentais, em consonância com o setor fiscal
(NOGUEIRA, 1999, p. 118). Nas negociações entre as forças políticas da época –
com mediação do então presidente do STF, Aliomar Baleeiro –, por ocasião do
golpe de 1964, foram firmados dois pontos: sujeição à Lei de Diretrizes
Orçamentárias (Lei 4320/64) e EC 18/65 (STN). Esta última configurou um marco
no Direito Tributário brasileiro, fazendo nascer uma vertente doméstica moderna
nesse ramo. No Brasil, até tal diploma, não existia equilíbrio entre Estado e
cidadão na atividade fiscal. O princípio da supremacia do interesse público era
levado a cabo exacerbadamente (“I need, I can”). A constitucionalização do
Direito Tributário configurou a positivação de um mecanismo que conferiu
garantias mínimas das liberdades individuais (“ability to pay”): imunidades, regras
rígidas de competência, etc.
Qual é a característica do STN (rigidez x flexibilidade)?
Quanto à rigidez/flexibilidade, o STN segue o mesmo diapasão da própria
Constituição: sendo essa rígida, também o é aquele. Para Cassone (2004, p. 26),
a rigidez em matéria tributária se atém a dois aspectos: instituição constitucional
de impostos e princípios constitucionais tributários. Destarte, há uma grande
crítica a essa premissa da CF/88, porquanto houve mais de 50 emendas em
pouco mais de 15 anos de sua existência. O Poder Constituinte Derivado
Reformador deveria permitir a adaptação dos preceitos inicialmente constituídos
às mudanças sociais ocorridas. Porém, esse Poder deveria ser utilizado “cum
grano salis”. Para refrear o ímpeto do constituinte reformador, foi erigido o
sistema do bicameralismo duplo de 3/5 (art. 60, § 2º, CF/88) para garantir a
necessária rigidez. Não funcionou a contento! Politicamente, a EC
consubstanciou um instrumento de implementação de políticas do Executivo. De
fato, a concepção crítica sugere uma verdadeira flexibilidade da CF/88 e, por
conseqüência, também do STN.
Qual é a estrutura do STN?
A estrutura do STN é quaternária: poder de tributar, competência tributária,
limitações ao poder de tributar (princípios e imunidades) e repartição de receitas
tributárias47.
47
Eduardo de Moraes Sabbag, Direito Tributário, São Paulo, Prima Cursos Preparatórios, 2004, defende que o Sistema
Tributário Nacional é ternário, composto de princípios, imunidades e tributos.
30
A estrutura do Estado é viabilizada mediante um preço, aduzido
materialmente por meio da tributação. O Estado de Direito enxerga na tributação
a via pela qual ele efetiva suas funções. A coletividade deve contribuir,
coercitivamente, para formar o bolo, de modo a permitir a consecução dos fins da
própria gestão pública. Segundo Carlos Ayres Brito, garantir o mínimo de
existência (de essencialidade) quanto aos direitos fundamentais deve ser a pauta
do Estado (vida digna – mínimo essencial – garantia e efetivação dos direitos
fundamentais – prestação de serviços públicos). O Estado, em uma atividade
administrativa, deve prestar serviços públicos mínimos, de interesse coletivo,
propiciando uma vida digna. Esta tarefa será efetivada por meio da Administração
Pública, a qual pressupõe um custo para agentes, para órgãos e para serviços
respectivos (JERKINS apud DI PIETRO, 2006). Esse arcabouço será mantido
pelas receitas originárias e, principalmente, pela atividade fiscal ou receitas
derivadas (tributação). Dessa feita, o legislador recebe do constituinte o poder de
impor a tributação, de acordo com a capacidade contributiva isonômica: a cada
um na medida de suas possibilidades. O ato de tributação, em sua essência
ontológica, é extorsivo. Dessa forma, somente a chancela do constituinte poderia
garantir-lhe legitimidade. E ela foi efetivada pela instituição do poder de tributar.
PODER DE TRIBUTAR é prerrogativa de impor a tributação, de criar
tributo. É exercido pelos entes políticos (União, Estados, DF e Municípios),
titulares da competência tributária. O instrumento de criação do tributo é a lei.
Neste sentido, somente aquelas pessoas que possuem Poder Legiferante
(Congresso Nacional, Assembléia Legislativa, Câmara Legislativa, Câmara
Municipal) podem instituir tributos. O poder de tributar, à luz do art. 145, “caput”,
CF/88, é uma faculdade. Todavia, a LC 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal),
com o intuito de estabelecer um equilíbrio nas contas públicas, preceitua, em seu
art. 11, “caput”, que a gestão fiscal equilibrada pressupõe, dentre outras medidas,
a criação de tributos. Desta forma, conclui-se que o exercício da competência
tributária é obrigatória, sob pena de renúncia de receita e, em conseqüência, de
responsabilidade fiscal. Considerando que o dispositivo legal está em choque
com o art. 145, “caput”, CF/88, diz-se que padece de inconstitucionalidade. E por
que não há ADIn? Pela razão fática de que o Estado já onera o contribuinte por
demais, criando tributos até mesmo de forma errônea. Deve-se distinguir,
entretanto, o direito potestativo de tornar exigível a obrigação (adequado ao
lançamento) e o direito subjetivo de crédito, que surge depois da exigência.
COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA é o poder recebido do constituinte para
servir ao custeio da máquina estatal, direcionado aos entes políticos – que,
sabendo que não tem o todo, detêm parte dele – para exercê-lo dentro dos limites
de sua circunscrição e mediante determinadas condicionantes (imunidades e
princípios, os quais conformam as limitações ao poder de tributar). Com efeito, a
divisão nacional do poder de tributar é a fatia de competência tributária relegada
a cada um dos entes políticos.
LIMITAÇÃO AO PODER DE TRIBUTAR tem dois objetivos e se faz
mediante dois instrumentos: proteção ao federalismo e aos direitos fundamentais,
havidos por meio das imunidades e dos princípios. Ex.: a imunidade de livros
presta-se a maximizar a divulgação de idéias, exercício de direito fundamental
31
(arts. 5º, IV, IX, XIV, e 220, § 6º, CF/88); assim como é a imunidade de templos
e religiões, porque se presta à liberdade de culto (art. 5º, VI, CF/88). A imunidade
tributária é uma regra de não-incidência da competência tributária, aduzida e
qualificada pela Constituição, tendo como fim promover o federalismo e a
proteção aos direitos fundamentais. À guisa dessas não-incidências, existem as
regulações do poder de tributar, ou seja, regras a determinar como deve ser
exercida a competência tributária, com o mesmo escopo federalista e valorizador
dos direitos humanos.
REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS – decorre do ranço de
valorizar majoritariamente o Poder Central. Em contrapartida, o constituinte
colimou re-equilibrar a federação, conferindo parte da receita auferida por uns
entes a outros. O poder de tributar foi criado para garantir autonomia financeira à
pessoa política, porque a exploração econômica do patrimônio público é prática
na contramão da tendência moderna e pós-moderna. De forma suplementar ao
poder de tributar, o constituinte institui o mecanismo de repartição das receitas,
para que os maiores entes políticos não fiquem com todas as rendas tributárias.
Neste diapasão, a União deve entregar parte de sua riqueza tributável aos
Estados e aos Municípios. É fato de que toda esta renda, concretamente, é
produzida no município. Fazendo tais considerações, se for o caso de tributo,
cuja receita deva ser repartida com outro ente político, por comando
constitucional, o exercício da competência é coercitivo. Ex.: metade do IPVA
é destinado ao município onde foi emplacado o veículo (art. 158, III, CF/88); 25%
do ICMS é destinado aos municípios do respectivo Estado arrecadador (art. 158,
IV, CF/88); 22,5% do IR forma o Fundo de Participação dos Municípios (art. 159,
I, “b”, CF/88); 21,5% do IR forma o Fundo de Participação dos Estados (art. 159,
I, “a”, CF/88); 3% do IR vai para programas de financiamento do setor produtivo,
destinado às áreas geográficas menos desenvolvidas (Norte, Nordeste e Centro-
Oeste), com o fim de efetivar a idéia da união federativa (art. 159, I, “c”, CF/88);
10% do IPI aos Estados, nas respectivas atividades de exportação de produtos
industrializados (art. 159, II, CF/88).
Entretanto, é cediço postular que a Constituição, em si, não cria tributos,
em qualquer esfera de Poder. A CF/88 somente determina a competência
tributária. As Constituições estaduais e distrital e as leis orgânicas municipais
também não criam as exações nem determinam competências. Quem institui os
tributos é a lei ordinária, em regra, e lei complementar excepcionalmente,
mediante o comando autorizador dado pelo constituinte federal.
O SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL possui dois enfoques:
 1ª corrente – será nacional quando suas normas vinculam,
simultaneamente, todos os entes políticos (União, Estados, DF e
Municípios). Ex.: arts. 145 e 150, CF/88. Também é nacional a norma
que vincula determinada categoria de pessoa política. Ex.: arts. 155 e
156, CF/88. Todavia, há normas exclusivamente federais, quando estas
se aplicam exclusivamente à União. Ex.: arts. 148, CF/88.
32
 2ª corrente – é integralmente nacional. Quando uma norma da CF/88
dá competência tributária para um ente determinado político,
simultaneamente retira dos demais.

Teoria Geral da Tributação


CONCEITO DE TRIBUTO – etimologicamente, tributo vem do latim
“tributum”, ou seja, aquilo que um Estado (ou tribo) devia a outro em decorrência
de autêntica relação de vassalagem (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 17). A
definição jurídica de tributo encontra-se no art. 3º, CTN. Tributo é prestação
pecuniária compulsória, pago em moeda ou outro valor que possa nela ser
exprimido, diversa de multa, instituída por lei e cobrada por lançamento.
 Prestação pecuniária48 – está ligada à idéia de riqueza, de vantagem
patrimonial. Pecúnia é a moeda corrente (Real) ou o próprio cheque.
Tais formas de pagamento do tributo são usuais, convivendo, por outro
lado, com métodos antiquados de pagamento: vale postal, estampilha,
papel selado, etc. (art. 162, I e II, CTN). Não se admite o tributo “in
natura”, isto é, aquele pago com bens agrícolas, por exemplo. A LC
104/01 inseriu o inciso XI no art. 156 do CTN, ao prever uma nova causa
extintiva do crédito tributário – a dação em pagamento. Trata-se de
instituto oriundo do Direito Privado (art. 356 a 359, CC), indicando a
possibilidade de se entregar um bem distinto daquele anteriormente
avençado, na extinção das obrigações. O CTN prevê a dação tão-só
para bens imóveis. Segundo o art. 146, III, “b”, CF/88, a matéria em
análise deve estar afeta à lei complementar, razão pela qual uma lei
ordinária estadual, por exemplo, estaria impedida de versar sobre o
tema49. Ademais, uma lei que permitisse a dação por bens móveis
ofenderia a exigência constitucional de licitação para a aquisição de
mercadorias pela Administração (art. 37, XXI, CF/88)50.
 Compulsória – é a eliminação do elemento vontade. Ao sujeito passivo,
não é permitida discricionariedade na prestação ou não do tributo. A
tributação é um ato de agressão patrimonial obrigatório e coercitivo. A
captação da riqueza particular em favor do interesse público não pode
depender da voluntariedade do contribuinte, sob pena de inexistir a
tributação. A vontade não se vincula à formação da relação jurídico-
tributária (obrigação tributária), ao contrário dos demais negócios jurídico
civis, em que a ela é pressuposto de existência.
Nesse passo, a doação (art. 538, CC), por representar uma liberalidade,
poderia sugerir que o tributo decorrente do negócio jurídico não estaria
48
Hugo de Brito Machado, Curso de Direito Tributário, 7ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1993, consegue enxergar, na letra do
art. 3º, CTN, – por meio da expressão “cujo valor nela se possa exprimir” – uma forma de compatibilização com o art. 156, XI,
CTN. Na esteira, consoante comentário a ser aduzido, outros doutrinadores protestam no mesmo sentido, admitindo a dação de
bens móveis como forma de extinção do crédito tributário. Em sentido totalmente oposto, Amaro, op. cit., p. 19 a 21,
depreende ferrenha crítica à redação do art. 3º, CTN, protestando pela impossibilidade absoluta na prestação não pecuniária
referente ao tributo.
49
A Lei 1624/97-DF, contrariando o impedimento sistêmico imposto pela CF/88, regulamentou a matéria de dação em
pagamento de tributos por meio de bens móveis.
50
STF, ADIn 1917-DF, Informativo do STF n° 136.
33
abarcado pela regra da obrigatoriedade. Ledo engano, porque o
fenômeno tributável é o ato em si e não seu caráter voluntário (“animus
donandi”). Uma vez ocorrendo o negócio mencionado, incidirá o ITCMD
(art. 155, I e § 1º, CF/88).
A Súmula 545 do STF51 determina a diferenciação entre taxa e tarifa: a
compulsoriedade. Além disso, é cediço recorrer ao Direito Administrativo
para desigualá-las. O teor do serviço prestado determinará o tipo de
contraprestação.
O constituinte preceituou que o Estado preste alguns serviços públicos
de interesse público primário, para tutelar a coletividade. Nessa seara,
eles serão de domínio público exclusivo do Estado, prestados diretamente
por ele. Pode, no máximo, descentralizar a atividade, sem permitir o lucro
(distribuição de dividendos) e a livre concorrência. No diapasão, o
consumo do serviço também é compulsório por parte do administrado, por
questão de interesse público da coletividade. Só há aquele meio de uso,
não existindo outra opção. Nesse âmbito, pode haver duas espécies: os
serviços a título universal e singular. O primeiro é “remunerado” por meio
de impostos e os segundos, por taxas – também conhecido por preço
tributário. O pagamento dessa então se deve à retributividade do custo do
serviço prestado, para corrigir a imperfeição da arrecadação por impostos,
pois somente alguns recebem o serviço “uti universi”, enquanto todos
contribuem para ele.
Em tese, as taxas são devidas desde que colocados os serviços à
disposição do usuário, mesmo que deles não se utilize. As taxas podem
ser de serviços propriamente ditos (coleta de lixo, água e esgoto, etc.) e
aquelas decorrentes do poder de polícia. No entanto, há três taxas que
fogem à idéia geral de sua concepção: judiciárias, de preservação
ecológica e de emissão de passaporte. São conhecidas vulgarmente
como “taxas de uso”. São exações atípicas, porque não serão
remuneradas pelos usuários em potencial, mas tão-somente pelos
efetivos. Nesse sentido, elas aproximam-se dos preços, mas não se lhes
equiparam.
Ao revés, há serviços públicos que não cabe ao Estado prestar. A
natureza do ajuste entre as partes é contratual, pendendo facultatividade
na contratação e na conseqüente remuneração (autonomia da vontade).
Nesse campo, é lícito o lucro e a livre concorrência. A contraprestação
dessa espécie de serviço é tida por preço (não tributário), também
conhecida como tarifa52. Inexiste compulsoriedade, porque há opção na
contratação (liberdade de contratar).

51
Súmula 545 do STF: “Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são
compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu”.
52
O preço é a remuneração por qualquer serviço não tributário. Caso seja prestado por entidade da Administração Indireta
(sociedade de economia mista ou empresa pública), denomina-se preço público; do contrário, é chamado de tarifa ou preço
privado. É o entendimento esposado por Cassone, op. cit., p. 116, no qual fica patente que o preço público é a remuneração de
um serviço público prestado indiretamente pelo Estado (por concessão ou por permissão), enquanto preço privado, de um
serviço privado de livre concorrência. Não há propriamente grande diferença entre os conceitos, com exceção da nomenclatura.
Ambos se submetem ao regime de Direito Privado, não se cogitando de sua submissão e inclusão no sistema tributário, de
34
Em resumo, o que diferencia a taxa e a tarifa é a natureza do serviço
público prestado, segundo entendimento já firmado pelo Excelso
Pretório53. Ex.: quanto ao serviço funerário, sua remuneração pode ser
extraída de preço, pois salvo melhor juízo, não é serviço exclusivo de
Estado, é delegável à iniciativa privada, permite exploração de lucro; caso
contrário, poder-se-ia advogar a natureza tributária.
 Diversa da multa – o tributo não é sanção por ato ilícito, não incidindo o
“jus puniendi” estatal. O fato que gera a obrigação tributária não é uma
conduta contrária ao Estado de Direito. O princípio do “non olet” pode ser
vislumbrado nos exemplos da renda auferida por traficante54 e do IPTU
com alíquota progressiva, em face do desrespeito às normas
urbanísticas. A progressividade do IPTU visa preservar a função social
da propriedade (art. 5º, XXIII, CF/88). O imposto tem por fato gerador a
propriedade. A ilicitude da conduta somente provocou a progressividade,
não autorizou a incidência da exação em si. Essa já preexistia. Para
justificar a existência do IPTU, outros entendem que há uma exceção ao
seu conceito. Não há pacificação doutrinária quanto ao tema.
 Paga em moeda (regra) ou valor do qual se exprime (exceção) – tributo
deve ser pago em dinheiro como regra. Moeda é a principal forma
corrente de transmitir riqueza. O valor que se pode exprimir é um
conceito aberto, permitindo que o legislador ordinário pudesse receber
crédito tributário de outra maneira que não moeda. Títulos da dívida
pública, cheque e selo já foram algumas dessas formas, hoje não mais
usados. A doutrina mais tradicional afirmava que o tributo não se paga
“in labore” nem “in natura”. Prestação de serviço e produtos não são
formas corriqueiras de recebimento pelo fisco. Mas a LC 104/01 alterou
bastante o CTN, mitigando essa construção, ao prever a dação em
pagamento por bens imóveis (bem diverso de moeda) para extinção do
crédito tributário. De fato, a dação, nessa forma, é uma prestação “in
natura”. A LC 104/01 apôs o inciso XI ao art. 156, CTN, permitindo a
dação em pagamento para crédito tributário. Como se trata de norma de
eficácia limitada, necessita de LO para regulamentação, no âmbito da
competência tributária respectiva.

Direito Público. O Direito Administrativo distingue o preço público da tarifa (ou preço privado) sob alguns aspectos. O
primeiro se reverte inteiramente ao Estado prestador do serviço, sendo fixado unicamente para custear um serviço, sem
qualquer outra espécie de remuneração. Já o segundo se volta a concessionário, permissionário ou autorizatário de serviço
público delegado, remunerando-o do custo envolvido e de uma parcela de lucro, suficiente para atrair o afã do particular e
manter a atualidade da prestação. Eventualmente, quando houver previsão no ato de delegação (contrato ou ato administrativo),
pode ter parcela revertida ao Estado.
53
Cf. REsp 167489-SP e RE 89876-RJ, rel. Min. Moreira Alves. Para o eminente ministro, os serviços públicos divisíveis e
singulares podem ser catalogados em 3 planos: os propriamente estatais, indelegáveis e passíveis de taxação, não podendo o
Estado cobrar por aquilo que não prestar ou o usuário, por aquilo que não utilizou (cartórios judiciais e emissão de passaporte);
os essenciais ao interesse público, em prol da comunidade, remunerados por taxa, mediante utilização efetiva ou potencial
(água, esgoto, remoção de lixo, sepultamento, etc.); os não essenciais, porquanto não usados, não acarretam ranhura ao
interesse público, sendo delegáveis e pagos por preços públicos (serviço postal, telefonia, energia elétrica, gás, etc.). Lapatza
(apud AMARO, 2006, p. 45) afirma que os serviços públicos inerentes ao Estado, quando por ele prestados, podem incitar a
remuneração por meio de taxa. Todavia, continua Amaro (2006), pode também ser objeto de preço. A determinação de uma ou
de outra saída reputa-se ao legislador, ao verificar conveniência da melhor escolha.
54
Cf. nota de rodapé “4”.
35
A grande questão que se coloca é a possibilidade ou não de deferir
dação para bens mobiliários. A LO que dessa forma dispusesse seria
ilegal (art. 156, XI, CTN) e inconstitucional (art. 146, III, “b”, CF/88), porque
exorbita de sua competência regulamentadora. Mas esses argumentos
podem ser contestados.
Com efeito, a dação de bens imóveis é uma manobra ardilosa, porque se
presta a permitir que grandes devedores extingam seus créditos tributários
sem desembolsar nenhum centavo. Isso se deve ao fato de que os
pequenos devedores do fisco não possuem dívidas de montante a
justificar a dação de imóvel, mesmo porque a maioria deles não possui
bens de raiz ou se os tem, será de família. No mesmo sentido estão os
pequenos empresários. O imóvel a ser oferecido será o expurgo de
grandes empresários, bens de categoria inferior, possibilitando o
“sucateamento” do fisco. Essa é a finalidade política da dação.
Juridicamente, seguindo a orientação de recuperação fiscal (REFIS)
italiana, o Brasil tentou implementar a mesma política. Dentro dessa
realidade, as leis que instituem esses programas geralmente condicionam
sua concessão à desistência de demandas judiciais. Apesar dos
contribuintes se debaterem sobre a constitucionalidade dessa disposição,
muito pela pretensa inafastabilidade do Judiciário (art. 5º, XXXV, CF/88), a
jurisprudência pacífica os considera legítimos, conquanto se trata de
opção do contribuinte. Entretanto, o gênero REFIS engloba várias
categorias, dentre elas o parcelamento. Aqui, essa espécie acabou sendo,
por metonímia, equiparada àquela espécie. O mecanismo visou
movimentar a máquina estatal para cobrar dívidas tributárias com o menor
esforço, permitindo resolver as questões na esfera administrativa. Nesse
passo, o pequeno devedor deveria ter a possibilidade de adimplir seus
débitos com bens móveis, muito mais afeto à sua realidade. Dessa feita,
surge uma brecha a legitimar, pela necessidade de eficácia da norma, a
dação de bens móveis, reputando o art. 156, XI, CTN, como rol
exemplificativo. Esse dispositivo, por sua gramática, seria inconstitucional,
por colidir com o espírito Carta de 1988. Mas essa interpretação conforme
a Constituição talvez ferisse os freios e contrapesos da divisão orgânica
do poder. Essa antítese pode ser solucionada pelos seguintes
argumentos, em favor da inconstitucionalidade do art. 156, XI, CTN55:
- Lesão à isonomia – o princípio, estipulado no art. 150, II, CF, não
permite que o fisco trate desigualmente pessoas iguais. A norma do
art. 156, XI, CTN, se presta, como está, somente a favorecer certa
parcela das pessoas, porquanto opera discriminação aos iguais.
Somente alguns possuem imóveis, havendo uma desigualdade aos
iguais. Com efeito, há formação de um privilégio, elemento proibido
na ordem tributária nacional. De todos aqueles que possuem “animus
solvendi”, somente parcela poderia efetivar o desejo.

55
A ADIn 2405 versa sobre dação em pagamento na extinção de crédito tributário.
36
- Segurança jurídica – a extinção da relação jurídica tributária é o
grande fim colimado pela lei, no seu art. 156, I a XI, CTN. O intérprete
não tem o direito de colocar restrições onde o legislador não fez. O
texto do art. 156, XI, CTN, permite a dação de imóveis, mas não
proibiu a dação de móveis. O devedor quer pagar e, como tal, deve
ter o desejo atendido, afinal há coincidência de afã com o interesse
público. No ponto, a lei deve viabilizar a intenção, pacificando a
relação jurídico-tributária e conferindo segurança à sociedade e ao
particular.
- Interpretação sistemática do CTN com a LEF – o art. 156, XI, CTN,
em interpretação literal, viola os princípios da razoabilidade, da
economicidade e da operabilidade. A LEF permite a penhora sobre
bens móveis, obrigando-se passar por esses antes de um imóvel (art.
11, I a IV, LEF). Se o legislador determinou a prevalência na penhora
de móveis antes de imóveis, haveria um contra-senso na extinção do
crédito tributário, lesando a razoabilidade. Por que chegar a ponto da
cobrança judicial se o entrave pode ser resolvido no momento pré-
processual, administrativo? Se o devedor pudesse adimplir antes da
execução fiscal com seus móveis, evitaria o movimento da máquina
Judiciária, porquanto, somente depois do processo judicial devido,
poderia pagar com seus bens móveis. Esse mecanismo favoreceria a
economicidade. O fisco não aceitar o bem móvel certo, na seara
administrativa, estaria em flagrante afronta à realidade, porquanto a
execução fiscal poderia não atingir outros bens (incerteza). Para
solver o problema, a hermêutica extensiva é a melhor solução ao
intérprete.
- Art. 111, I a III, CTN – exige a interpretação estrita em matéria de
exclusão e de suspensão de crédito tributário. Mas a interpretação
restritiva deve se ater à concessão de liberalidades (isenções,
anistias, etc.) e às extremas exceções (dispensa de obrigação
acessória, por exemplo). Afora esses dois casos, a hermenêutica
restritiva não pode ter vez. O legislador não tem a capacidade de
exprimir toda sua vontade simplesmente pela letra da lei. A função do
operador do Direito é buscar essa verdadeira “mens legis”, não se
permitindo sua exegese restritiva. Dessa feita, o dispositivo em tela
não proibiu a interpretação extensiva de norma de extinção de crédito
tributário, gênero da dação em pagamento. Com efeito, não urge a
interpretação restritiva do art. 156, XI, CTN.
Ainda nessa seara, discutiu-se o pagamento do tributo por meio de
compensação com precatórios. O art. 156, I a XI, CTN, ao definir as
modalidades de extinção do crédito tributário, permite a compensação, em
seu inciso II. O conceito de compensação se aduz da lei civil (arts. 368 a
380, CC, c.c. art. 110, CTN). Em tese, portanto, poderia haver a
compensação da forma descrita. Na mesma esteira, o art. 170, “caput”,
CTN, ao descrever a compensação do crédito tributário, permite o
precatório como forma de crédito líquido, certo, ainda que não exigível
37
(parcelas vincendas ou vencidas). Mas existem alguns entraves à
operabilidade desse mecanismo. Via de regra, precatório exprime dívidas
de grande valor. A maioria da população deve ao fisco um crédito
tributário de pequena monta. Certamente, somente médios e grandes
empresários possuem montante de dívidas tributárias a justificar a
compensação. No entanto, essas empresas geralmente não possuem
precatórios para com o Estado, erigindo um paradoxo. A
despersonalização do precatório reside exatamente nesse ponto,
porquanto aqueles grandes empresários adquirem os direitos creditícios
por valores bastante inferiores ao nominal, para possibilitar a
compensação com seus débitos fiscais. Na esteira, os grandes grupos
econômicos fazem “lobby” para o não pagamento do precatório, a fim de
possibilitar cessão de crédito ao seu patrimônio e, por conseguinte,
realizar a compensação. Esse expediente foi bastante corroborado com a
possibilidade de não incidência da lei penal nos crimes tributários (Lei
4729/65 e 8137/90), desde que haja pagamento do tributo antes do
recebimento da denúncia (arts. 34, Lei 9249/95, 15, § 3º, Lei 9964/00 e 9º,
Lei 10684/03), de modo a favorecer, mormente, delitos de sonegação
fiscal e contra a ordem tributária, econômica e relações de consumo56. Se
a prescrição qüinqüenal já atingiu a pretensão do fisco em exigir
judicialmente o débito ou a decadência fulminou o direito postestativo de
realizar o lançamento, perfaz-se a prescrição do delito correspondente.
Ocorre que a jurisprudência pacífica entende que os crimes tributários são
materiais, os quais só se concretizam pelo ato de lançamento do débito
co-respectivo57. Concluindo, a compensação é uma modalidade de
extinção do crédito tributário que visa tão-somente à perpetuação desse
sistema censitário, a facilitar a elisão tributária de grandes pessoas
jurídicas ao mesmo tempo em que flanqueia ao Estado a lesão de direitos
fundamentais, porquanto jamais recomporá os danos de terceiros.
Ganham os empresários – que sonegaram deliberadamente – e ganha o
Estado – que percebe seu tributo e não precisa adimplir seus
compromissos indenizatórios. O STF tem bastante complacência com
essa sistemática, desde que haja uma lei ordinária a regulamentar a
compensação, seguindo os ditames do art. 170, “caput”, CTN, e os arts.
100, “caput”, CF/88, e 78, “caput”, ADCT. Destarte, na ADIn-MC 2099, o
rel. Min. Marco Aurélio Mello denegou a compensação, porque haveria
56
Os arts. 34, Lei 9249/95, e 15, § 3º, Lei 9964/00, previam que a extinção da punibilidade somente se daria se o pagamento
fosse feito antes da denúncia. O art. 9º, § 2º, Lei 10684/03, revogou as disposições anteriores por dispor de forma diferente. O
comando autoriza a extinção da punibilidade, pelo pagamento, a qualquer tempo, não erigindo termo final para tal. Nesse
sentido, a jurisprudência pacífica se posiciona no sentido de que a constituição do crédito tributário definitivamente efetivada é
condição objetiva de punibilidade por delito fiscal (STF, 1ª T., RO em HC 77258-2, rel. Min. Moreira Alves, j. 23.6.1999, RT
770/492). No ponto, o termo inicial da prescrição penal será o da correspondente decisão administrativa definitiva (STF, HC
81611/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10.12.2003). No mesmo sentido, o STJ tem dado interpretação analógica à extinção
da punibilidade pelo pagamento ao delito de descaminho e aos previdenciários, constantes do CP, em que pese a previsão da
Lei 10684/03 silenciar sobre eles (HC 48.805-SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 26/6/2007, Informativo do STJ
n° 325). Atualmente, no HC 84223/RS, 1ª. T., rel. Min. Eros Grau, j. 14.8.2007, Informativo do STF n° 476, está-se em
discussão a possibilidade de configuração ou não de crime de quadrilha (art. 288, CP) nos delitos fiscais, dada situação
simples, como ocultação de faturamento da empresa. Não há decisão sobre o assunto dentro do próprio Supremo.
57
STF, HC 81.611-DF, DJU 20/5/2005; HC 84.262-DF, DJU 29/4/2005. STJ, REsp 747.829-PR, DJU 1º/2/2006; AgRg no
REsp 762.144-PR, DJU 13/3/2006; HC 56.799-SP, DJU 16/4/2007; 5ª T., HC 77.986-MS, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j.
13/9/2007, Informativo do STJ n° 331.
38
lesão à ordem cronológica de pagamento dos precatórios, em
flagrante afronta ao comando do constituinte (art. 100, “caput”, CF/88).
Inobstante tal colocação, o emérito ministro ainda argumentou no sentido
de lesão aos interesses dos sujeitos ativos dos precatórios, legítimos
detentores dos direitos neles exprimidos. Ademais, as dívidas de pequeno
porte, inclusive as alimentícias, seriam ultrapassadas pelo mecanismo. No
entanto, a EC 30/00 permitiu expressamente a compensação de créditos
tributários, fazendo cair por terra o argumento supra citado. Dessa forma,
na ADIn 2851, o STF passa a perfilhar a disposição do constituinte, a
seguir o comando alterado e existente na própria Constituição. Por fim,
lembra-se que o STJ tem admitido compensação de multas moratórias
pagas indevidamente com tributos, porque ambos são causas subjacentes
do mesmo crédito tributário (art. 113, § 1º, e 139, CTN)58.
 Instituída por lei – há quatro tributos que necessitam LC: empréstimo
compulsório, impostos residuais, contribuições de seguridade residuais e
imposto sobre grandes fortunas (IGF). Sobre esse último (art. 153, VII,
CTN), há controvérsia doutrinária. A Constituição não diz que deve ser
instituído por LC, porque a expressão “nos termos de lei complementar”
se refere à regência de todos os impostos do art. 153, CTN. Não quer
dizer que a LC vá criar o tributo, mas sim que deve ela definir “grande
fortuna” (CARRAZZA, 1991). Quem instituirá o imposto seria a LO. LC só
será exigida para a instituição de tributos residuais, diversos daqueles já
previstos na Carta, com exceção do empréstimo compulsório, por
questão de urgência (art. 148, I, CF/88). A finalidade do art. 148, II, CTN,
é evitar que empréstimo compulsório seja instituído por MP, incompatível
com a previsão de LC, segundo colocação do constituinte. Apesar de
razoável a explicação, trata-se de posição minoritária.

O princípio da legalidade visa proteger um valor básico: dar limite ao


exercício de competência, de modo a tutelar um dentre três elementos basilares –
liberdade, justiça (igualdade) e segurança jurídica (fraternidade ou solidariedade).
É justamente a última que será protegida pela legalidade. A segurança jurídica se
desmembra nas vertentes legitimidade e não surpresa. Com relação a esta, a
anterioridade, a irretroatividade e a transparência são sucedâneos da legalidade,
porque colima a lealdade e refuta o abuso de direito. No tocante à legitimidade, o
administrador é eleito do povo, para o povo e pelo povo. Ele gere a coletividade
em favor dela própria. O respeito à vontade popular, ao interesse público, é o
“norte” que deve seguir o agente político. Não é a volição própria do
administrador que deve imperar. Dessa forma, a legitimidade do ato democrático
se consubstancia pela democracia representativa, cujos representantes eleitos
manifestam a vontade popular, em um autêntico mandato sem reserva de
poderes. A lei, por conseguinte, é a tradução da atividade desse mandatário,
meio pelo qual o povo empresta ao Estado publicidade, amplitude e aplicabilidade
de suas disposições (CANOTILHO, 1993). Trazendo o raciocínio para o Direito

58
STJ, 1ª Seç., EREsp 760290.
39
Tributário, o tributo, instituído legalmente, é a manifestação democrática
do povo, por uma questão de segurança jurídica.

 Cobrada por lançamento – é a atividade administrativa plenamente


vinculada, referida no art. 3º, CTN. A atividade de cobrança de tributo é o
próprio lançamento. O CTN perfilha a teoria de que o crédito é
constituído pelo lançamento59. O procedimento vinculado se rende a
duas idéias:
- Obrigatoriedade – não existe discricionariedade permeando o
procedimento administrativo. A autoridade fiscal é obrigada a realizar o
lançamento.
- Nos termos da legislação – não é dado ao agente a prerrogativa de
escolher o modo de fazer. Deve fazê-lo de acordo com a norma.
Os desrespeito a esses dois postulados pode levar a conseqüências
para o agente. A Lei 8429/92 regula exatamente o reflexo, sendo
enquadrado como ato de improbidade administrativa. O art. 142, “caput”,
CTN, define o lançamento. Seu parágrafo único prevê como conseqüência
pelo descumprimento a responsabilidade funcional (administrativa). Essa
assertiva diz respeito à sanção disciplinar no âmbito do estatuto.
Improbidade é um ato híbrido, de conseqüência administrativa e cível, não
alcançando a seara penal. O ato de improbidade pode se ater a três
condutas: auferir vantagem, causar prejuízo ou violar princípio da
administração pública (art. 11, “caput”, Lei 8429/92). Para essa última
conduta, é necessário que haja dolo, pois a culpa não a caracteriza (DI
PIETRO, 2006). Essa não pode ser presumida, devendo ser prevista pelo
legislador, mesmo não se tratando de Direito Penal (STJ). A culpa só pode
se ater às duas primeiras condutas (auferir vantagem ou causar prejuízo).
FUNÇÃO DOS TRIBUTOS – em que pese haver tributos não vinculados –
impostos –, todas as exações prestam-se a, direta ou indiretamente, custear a
máquina estatal, para que, por meio dos serviços públicos, consiga-se perfazer a
justiça distributiva e manter o estado de bem-estar do povo. Nas palavras de
Carlos Ayres Brito, a função do Estado é manter o nível mínimo de dignidade da
pessoa humana, representado pela efetivação dos direitos fundamentais através
da prestação de serviços públicos. Essa tarefa só é possível quando são
alocados os meios necessários, os quais são consubstanciados pela parcela da
riqueza de cada qual para o bem comum. Em suma, a grande finalidade da
tributação é arrecadar. Entendendo essa colocação, o legislador qualificou o
tributo como entrada definitiva, isto é, receita da espécie derivada (arts. 9º, e 11,
§ 1º, Lei 4320/64).
NATUREZA JURÍDICA DOS TRIBUTOS – natureza jurídica é a qualidade
essencial do instituto, sob a óptica do Direito. O tributo é uma forma de ingresso
público (valor positivo ao erário) derivado. Qualquer conteúdo patrimonial

59
Cf. Paulo de Barros Carvalho, em sentido contrário, afirmando que o crédito surge na ocorrência do fato gerador. Em
comentários abaixo, essa idéia será mais bem delineada.
40
entregue ao Estado pode ser considerado ingresso ou entrada. Porém, o que
determina a natureza específica do tributo é o fato gerador (art 4º, “caput”, CTN),
isto é, a espécie tributária é determinada pelo fato gerador. Em regra, cada tributo
é identificado por sua hipótese de incidência. Excepcionalmente, o legislador
flanqueia a bi-tributação (“bis in idem”) – um fato gerador produzindo dois tributos.
Ex.: o IEF pode conter fato imponível igual àquele previsto para outra exação (art.
154, II, CF/88). Dessa forma, não há de se confundir a natureza jurídica do tributo
com a determinação da espécie tributária.
Mas o “nomen juris” e a forma de cobrança do tributo são irrelevantes para
determinar a exação (art. 4º, I, CTN). Também não importa a destinação da
receita gerada para definir o tributo (art. 4º, II, CTN). Nesse passo, não podem ser
imiscuídos os conceitos de impostos e de contribuições especiais, mesmo que
ambos não estejam vinculados a uma prestação estatal específica de sua parte.
O que os faz diferir é justamente sua destinação. O imposto é uma receita
totalmente desvinculada, agindo o administrador com discricionariedade (princípio
da não-afetação das receitas). Já o valor auferido pela contribuição tem destino
certo. Aparentemente, haveria uma controvérsia para com o art. 4º, II, CTN. A
destinação dada ao imposto ou à contribuição é irrelevante para determinar a
espécie tributária em análise.
Todo tributo tem por natureza jurídica ser um ingresso público derivado.
Como regra, são receitas derivadas (ingressos definitivos; não restituíveis). É o
caso dos impostos, taxas, contribuições de melhoria e especiais; vide expressa
previsão legal no art. 9º, Lei 4320/64.
Excepcionalmente, tributo é empréstimo compulsório (ingresso
temporário, restituível). Por não ser ingresso definitivo, não deve esse último ser
qualificado como “receita”, já que na acepção técnica da expressão estas
designam apenas os valores que entram em caráter permanente. Entretanto,
mesmo não sendo receita, os empréstimos compulsórios preservam seu caráter
de ingressos públicos derivados. Observe o seguinte esquema:

CLASSIFICAÇÕES DOS TRIBUTOS – duas classificações são mais


importantes: tributos diretos e indiretos e impostos reais e pessoais.
Alguns tributos permitem que o próprio contribuinte pague. Ex.: IR. Em
outros, o ônus do recolhimento da exação se defere a um terceiro (substituto
tributário), diverso daquele que detém relação jurídico-tributária direta para com o
fisco. Ex.: IPI e ICMS. Nesses últimos, o verdadeiro devedor repassa a carga
tributária ao consumidor final. Repercussão tributária, portanto, é o fenômeno
no qual o contribuinte legal ou de direito (contribuinte de “jure”) consegue
repassar a carga tributária a uma terceira pessoa, contribuinte de fato
(contribuinte de “facto”). Na primeira situação, refere-se aos tributos diretos; na
segunda, aos indiretos. Na essência, somente o IPI e o ICMS são indiretos.
Contudo, outras exações diretas podem comportar repercussão tributária,
assumindo um viés de tributo indireto, apesar de não sê-lo na sua natureza. É o
caso, por exemplo, do pagamento de IPTU por parte do locatário. O fisco
desconhece tal relacionamento privado (art. 123, CTN), porquanto cobrará o
41
imposto do titular do imóvel. Todavia, a art. 22, Lei 9245/90 (Lei do Inquilinato)
permite essa transferência. O fisco cobrará do locador e esse, em ação
regressiva, exigirá o valor do locatário. De fato, esse acabará pagando o tributo.
Na mesma esteira, o importador paga vários tributos na sua atividade (II,
PIS/COFINS-Importação, ICMS). Na venda dos artigos, ele repassará tais
valores, fazendo com que o comprador arque com a carga tributária.
Mas vamos supor que o recolhimento do tributo, nos casos supra, seja
feito a mais. O contribuinte de direito solicita restituição, a qual será negada pelo
fisco, uma vez que ele não suportou de fato a carga tributária (enriquecimento
sem causa). É o entendimento esposado pelo STF, em suas Súmulas 71 e 546
(já mencionadas). No mesmo sentido é a redação do art. 166, CTN. O dispositivo
permite, além da prova de ter suportado o encargo tributário, a restituição
mediante autorização pelo contribuinte de fato. O STJ, apesar de emprestar
natureza jurídica de condição da ação de repetição de indébito ao art. 166, CTN,
admite que a justifica seja apresentada posteriormente ao ajuizamento da
demanda, mormente se houve impossibilidade de fazê-lo antes60. No entanto,
como bem dispõe a própria letra normativa, é necessário que haja pagamento
indevido para que o art. 166, CTN, seja invocado61. Complementando, se o
contribuinte de fato tentar fazer restituir o montante, o fisco negar-lhe-á, porque
não é titular direto de relação tributária com ele. Em tese, esse entendimento leva
à iniqüidade de restituição para tributos indiretos ou indiretos por equiparação,
por ser praticamente impossível sua ocorrência. Por décadas, o Excelso Pretório
manteve a posição (Súmula 71), a qual foi ratificada pela súmula posterior. Na
prática, para furtar-se ao mecanismo, as empresas sempre solicitam a
compensação, a qual só poderá ser materialmente aplicada quando a demanda
judicial transitar em julgado nesse sentido (art. 170-A, CTN)62. Da denegatória,
impetra-se mandado de segurança. Cediço, nesse ponto, lembrar que a
compensação de plano para com créditos de terceiros não é permitida, dada a
disposição do art. 74, § 12, II, “a”, Lei 9430/96, com redação pela Lei 11051/0463.
Todo imposto tem como fato gerador a conduta praticada pelo sujeito
passivo e sugestiva de riqueza, ao contrário dos demais tributos, que implicam
em prestação estatal. A demonstração objetiva de riqueza por parte do
contribuinte dá ao fisco o direito de presumir que tem capacidade de contribuir. O
sujeito passivo tem condição de suportar o gravame. A maneira como essa
riqueza é espelhada determinará a classificação do imposto em pessoal ou real.
O primeiro implica na pessoalidade do contribuinte, incidindo diretamente sobre a
renda auferida. O maior exemplo dessa categoria é o IR. Dessarte, caso a
riqueza demonstrada seja o patrimônio, a coisa, a “res”, está-se diante de um
imposto real. Todo imposto, sem exceção, atinge a renda. No entanto, no imposto
pessoal, ela é atingida diretamente, enquanto no real, indiretamente. No imposto
pessoal, a base de cálculo é a renda, a alíquota incide diretamente sobre ela. O
contrário representa o imposto real.

60
STJ, 2ª T., REsp 962.909-BA, rel. Min. Castro Meira, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
61
STJ, REsp 449.304-PR, DJU 14/6/2006; AgRg no REsp 673.441-SC, DJU 12/12/2005; 2ª T., REsp 757.203-RS, rel. Min.
Eliana Calmon, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
62
STJ, 2ª T., REsp 757.203-RS, rel. Min. Eliana Calmon, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
63
STJ, 1ª T., REsp 653.553-MG, rel. Min. Denise Arruda, j. 14/8/2007, Informativo do STJ n° 327.
42
É possível classificar os tributos segundo o seguinte esquema:
1. Impostos
2. Taxas
3. Contribuições de Melhoria
4. Empréstimos Compulsórios
5. Outras Contribuições (ou contribuições especiais):
a. Para iluminação pública (art. 149-A, CF/88)64.
b. Para profissões regulamentadas (CFM, CFP, CREFITO, CFO, OAB –
com a ressalva feita pelo STF na ADIn 3026/DF).
c. De intervenção no domínio econômico
 CIDE-combunstíveis;
 CIDE-remessas para o exterior;
 IAA, AFRMM, ATP.
d. Sociais “lato sensu”
 Sociais “stricto sensu”
- Salário-educação;
- Para o Sistema “S”65;
- Para o INCRA (antigo FUNRURAL);
- Contribuição sindical (antigo imposto sindical);
- CONDECINE (MP 2228-1/01);
- FGTS;
- Fundo Aeroviário (FA);
- Diretoria de Portos e Costa da Marinha (DPC).
 Para seguridade social “lato sensu”:
- Previdenciárias:
Do empregado sobre folha de salários e equiparados;
Do empregado;

64
A EC 39/02 trouxe à tona a contribuição de iluminação pública (CIP). O fisco sempre deteve um afã para invadir o
patrimônio do contribuinte, no sentido de custear a resolução de entraves do sistema elétrico do país, os quais não foram
gerados pelo particular. A modalidade de tributo chamada de taxa só pode incidir sobre serviço público individualizado, não
sobre serviço de caráter geral. Para "corrigir" tal problema, o governo fez aprovar a citada EC. A CIP não se enquadra nas
cinco espécies de tributos, previstas no ordenamento doméstico. Trata-se de um ente anômalo. Para alguns, a CIP é um
imposto e não uma contribuição, à luz do art. 4º, “caput”, CTN. Tratando-se de imposto novo, deve surgir mediante a edição de
lei complementar, conquanto também residual (art. 154, I, CF/88). Contudo, a norma que instituiu a CIP é ordinária e não
complementar, o que fere o princípio da legalidade. Os tributos devem obedecer a três ditames – legalidade, anterioridade e
irretroatividade. No entanto, ao estabelecer que a CIP pudesse ser instituída mediante lei ordinária, o constituinte
flagrantemente contra os próprios princípios da Carta Magna de 1988.
65
Contribuição de empresa prestação de serviço para o Sistema “S” é devida, segundo diz a jurisprudência. Cf. STJ, RESp
431.347-SC, DJU 25/11/2002; REsp 719.146-RS, DJU 2/5/2005; REsp 705.924-RJ, DJU 21/3/2005; REsp 446.502-RS, DJU
11/4/2005; 1ª Seç., REsp 895.878-SP, rel. Min. Eliana Calmon, j. 8/8/2007, Informativo do STJ n° 326.
43
Do estatutário para o RPPS (art. 149, § 1º, CF/88).
- Para seguridade social “stricto sensu”:
CSLL-empresa (cuja base de cálculo e fato gerador são idênticos ao
IRPJ);
CSLL-importador;
CONFINS-empresa;
PIS-empresa;
CONFINS-importador;
PIS-importador;
CPMF;
Contribuição sobre receitas de prognósticos;
FINSOCIAL66;
SAT.
COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA – trata da distribuição do poder de tributar.
Diferenciação entre poder de tributar e competência tributária – o poder
de tributar é pleno e genérico, destinado ao Estado brasileiro e instituído pela
Carta de 1988. É uma manifestação da SOBERANIA. Entretanto, a federação
brasileira é formada por quatro entes independentes e harmônicos: União,
Estados, DF e Municípios. Nesse sentido, o poder de tributar, assim como outros
poderes soberanos (jurisdição, polícia, punitivo, etc.), é repartido entre tais
pessoas para evitar a balbúrdia, caracterizando pela competência tributária. Cada
fatia do bolo tributário é determinado pela Constituição de 1988, revelando a
parcela do poder pleno constitucionalmente designado para cada ente.
A competência não foi determinada aleatoriamente, mas segundo
critérios técnicos e jurídicos. Levou em conta uma análise histórica da
realidade concreta de cada um dos entes federados, suas necessidades e
suas competências legislativas e executivas (arts. 22 e ss., CF/88),
determinando “quantum” dever-se-ia despender para manter a máquina
administrativa e para levar a cabo os objetivos colimados por cada uma das
pessoas da federação.
Características da competência tributária – podem ser arroladas três:
- Limitabilidade – todo poder, incluindo a competência, deve ser sempre
limitado, sob pena de autodestruição. O poder de tributar e sua
competência não são exceções, os quais são tangenciados pelos
princípios e pelas imunidades, com a finalidade de preservar a
66
O Fundo de Investimento Social (FINSOCIAL) foi instituído pelo DL 1940/82, sendo ratificado pela LC 70/91. É formado
por contribuição específica, segundo lembra Chimenti, op. cit., p. 53, a incidir sobre a receita bruta das vendas de mercadorias
e de mercadorias e serviços, exceto aqueles destinados ao exterior, auferida por empresas públicas e privadas. Sua base de
cálculo inclui o ICMS, segundo menciona a Súmula 94 do STJ: “A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do
FINSOCIAL”. Nas palavras do art. 1º, “caput”, DL 1940/82, o FINSOCIAL destinava-se a “custear investimentos de caráter
assistencial em alimentação, habitação popular, saúde, educação, e amparo ao pequeno agricultor”. Com a LC 70/91, foi
basicamente alterada a alíquota e a destinação da exação, a qual constitui uma das fontes de custeio da seguridade social como
um todo (art. 195, I, CF/88).
44
estrutura federativa e proteger as liberdades essenciais humanas. Os
limites são estabelecidos por intermédio de algumas formas: a proibição
é uma delas. Ex.: não incidência constitucionalmente qualificada
(imunidade) de impostos sobre templos (art. 150, VI, “b”, CF/88). Além
do mecanismo da vedação, o constituinte estabeleceu uma segunda
maneira de estabelecer a limitação: a regulação de incidência. O “modus
operandi” de instituição do tributo é guiado “ex vi” dos princípios
tributários constitucionais.
- Rigidez da titularidade – distribuída a competência pelo legislador
constitucional, não há de se alterá-la por mera medida legislativa. A
competência foi distribuída ao ente federado e não lhe cabe rejeitá-lo
(irrejeitabilidade). Além disso, é irrenunciável, não podendo o titular
abdicar do tributo lhe deferido. A titularidade da competência tributária
(de instituir tributo) também não pode ser emprestada a um outro titular,
mesmo que seja um terceiro a título temporário (indelegabilidade). Em
verdade, a indelegabilidade é espécie da irrenunciabilidade. Da mesma
maneira, um titular não pode tomar o tributo de outro para si, mesmo que
a competência tributária, no seu exercício, não tenha ainda sido
efetivada pelo titular constitucionalmente estipulado (exclusividade).
- Flexibilidade do exercício – apesar da titularidade ser imutável, seu
exercício é facultativo pelo ente legitimado (art. 145, “caput”, CF/88). O
titular não está obrigado a criar a exação tal qual está previsto na
Constituição e na LC regulamentadora. O direito potestativo de instituir o
tributo – desde que constitucionalmente previsto para certo titular –
nunca se perecerá pelo não exercício no tempo. A decadência da
competência tributária não se opera.
Esquematizando:
RIGIDEZ DA TITULARIDADE FLEXIBILIDADE DO
EXERCÍCIO
Irrejeitabilidade Incaducabilidade
Irrenunciabilidade Facultatividade
Indelegabilidade -
Exclusividade -

Crítica à facultatividade no exercício da competência tributária – a maioria


da doutrina reputa por não obrigatório o exercício da competência tributária
(parcela do poder tributário), porque a Constituição não impõe, mas o faculta.
Mas Carrazza (1991) protesta em sentido contrário, construindo uma
argumentação à parte:
- Quanto às taxas, por ter a finalidade de corrigir o desequilíbrio dos
impostos e de estabelecer a justiça distributiva, o autor afirma que o
legislador não tem a facultatividade.
45
- Na contribuição de melhoria, para evitar o enriquecimento sem causa,
incidiria também a obrigatoriedade, porque alguns que tiveram seus
imóveis valorizados e devem retornar sua parcela de riqueza acrescida
ao erário67.
- Para os impostos, a obrigatoriedade se manifesta de modo mais
arraigado. O constituinte, ao estipular cada uma das suas treze espécies,
fez uma estimativa estrita das receitas derivadas para manter a máquina
administrativa do ente federativo, bem como para atingir metas razoáveis
de gestão. Aliás, a instituição do tributo não vinculado se liga
especialmente à capacidade legislativa e administrativa estabelecida na
própria Constituição (arts. 21 e ss., CF/88), fazendo um encaixe entre a
atividade a ser prestada (serviço público) e os meios a serem
empregados (tributos). Para estabelecer tais estipulações, o legislador
observou histórica e concretamente a realidade de cada ente federado,
adaptando os serviços públicos e os respectivos tributos distribuídos.
Dessa forma, a autonomia do titular do tributo não poderia ser entendida
como facultativa, porque há um contra-senso entre a possibilidade de
conferir melhor dignidade ao administrado e a não instituição da exação
(renúncia de receita). Instituir o imposto não é injusto, mas o modo de
fazê-lo pode ser68.
Carrazza (1991) respalda legalmente suas assertivas na Lei de
Responsabilidade Fiscal (art. 11, “caput”, LC 101/00), porque toda renúncia de
receita deve ser justificada pelo administrador69. Nesse passo, isenção, remissão
e anistia, bem como subsídio, crédito presumido e benefício fiscal devem seguir
uma fundamentação contábil, demonstrando que a não incidência legal vai render
frutos para o ente federado competente (art. 14, “caput” e §§, LC 101/00).
Atributos formadores da competência – capacidade instituidora, legislativa,
fiscalizadora, arrecadatória.
a.“Capacidade tributária” como atributo formador da competência
(delegabilidade X indelegabilidade). Delegação ordinária de capacidade
tributária de fiscalização e arrecadação (limites estritos). O atípico
fenômeno da parafiscalidade (capacidade tributária ativa somada à
deferência para administrar tributos).
As palavras competência e capacidade possuem a mesma acepção
etimológica. O que os fará diferenciar-se é o tratamento jurídico conferido.

67
Mas a inviabilidade da contribuição de melhoria quase que coloca o argumento à margem da discussão doutrinária. Diversos
princípios constitucionais sacrificam o modo de instituição e cobrança da mencionada exação. É válido o argumento ao menos
na seara teórica.
68
Segundo Carraza, op. cit., na tarefa do exercício da competência tributária, o legislador ordinário deve observar todos os
tipos conferidos, de modo a distribuir parcela de riqueza entre cada um deles. Se um imposto estiver com base de cálculo e/ou
alíquota muito altos, propiciando a suficiência das riquezas para o titular, deverá ser reduzido, observando um equilíbrio para
com os outros.
69
A doutrina majoritária entende que o referido dispositivo é sugestivo, mas não obrigatório ao legislador. A renúncia de
receita pressupõe: estimativa de impacto no exercício financeiro aplicado e nos dois seguintes; previsão na LDO; consonância
com o anexo de metas fiscais e com a estimativa de receitas ou implementação de medidas de compensação (art. 14, “caput”, I
e II, LC 101/00). Entretanto, essas condicionantes não se aplicam na mudança de alíquota de tributos extrafiscais (II, IE, IPI e
IOF) nem no cancelamento de débitos cujo valor de cobrança seja maior que o montante da dívida (art. 14, § 3º, I e II, LC
101/00).
46
Partindo desse raciocínio, a titularidade plena da competência é
estabelecida pelo constituinte. Uma vez realizada a distribuição do
poder de tributar, são conferidos determinadas aptidões para o exercício
dessa competência: instituir, legislar, fiscalizar e arrecadar. Nessas quatro
prerrogativas, as duas primeiras (instituir e legislar sobre o tributo) não são
delegáveis – por questão de legitimidade –, mas as duas seguintes
(fiscalizar e arrecadar a exação) podem sê-las. Essas últimas ações,
denominadas capacidades delegáveis, podem ser repassadas a um ente
terceiro, inicialmente alheio à relação tributária. No entanto, essa
delegação é realizada no âmbito de limites mínimos do poder de polícia,
desde constitua tarefa não essencial e inerente ao Estado. O delegatário
ordinário realiza a faina em nome do Leviatã, somente recolhendo o
tributo (não pode executar e administrar os valores auferidos). Ex.: lotérica
que recebe o pagamento do IPTU, não podendo realizar nenhuma outra
tarefa além dessa.
b.“Capacidade tributária” com prerrogativa de ser sujeito na relação
tributária (material e processual, ativa e passiva). Capacidade tributária X
capacidade civil. A delegação ordinária de capacidade não pode ser
confundida com a parafiscalidade.
A doutrina majoritária, para justificar essa última, entende que o Estado
faz uma delegação atípica para as entidades parafiscais de forma plena,
conferindo-lhes capacidade tributária ativa (recolhem o tributo, gozam de
suas receitas e administram seus valores, podendo inclusive defender
seus créditos). Aquele que delega não fica com as receitas, porquanto o
delegatário parafiscal passa a ser o possuidor delas.
A capacidade tributária ativa é inerente à competência tributária, dela
fazendo parte. Desta feita, capacidade tributária ativa é o dever-poder de
arrecadar tributos e ficar com o produto da arrecadação. ARRECADAR,
portanto, é obrigatório ao Estado, porque o tributo é bem público
indisponível, sob pena de renúncia de receita e má gestão fiscal. Quem
tem competência tributária, sempre possui capacidade tributária ativa. A
competência tributária é indelegável, porquanto está taxativamente
prevista na Constituição. Já a capacidade tributária ativa é passível de
delegação, dependendo do ente político que a possui originariamente.
Esta delegação é efetivada por LEI, da mesma espécie que instituiu o
tributo. Tratando-se de lei ordinária, pode ser delegada por medida
provisória. Há duas possibilidades para a delegação:
 Para outro ente político, sendo que este não pode subdelegar nem
legislar sobre o tributo (conceder remissão, anistia, isenção, etc.). O art.
153, § 4º, III, CF/88 (EC 42/03), prevê um caso da possibilidade da
União delegar a capacidade tributária ativa do ITR para os municípios,
em que pese não haver necessidade de tal disposição na Carta
Política, bastando mera lei em sentido estrito.
 Para um ente não-político – ente não-político é qualquer pessoa
diferente da União, Estados, DF e Municípios. Ele atua em nome do
47
Estado, arrecadando o tributo, com ele permanecendo e
administrando-o. É o fenômeno da parafiscalidade. Há três hipóteses
de pessoas não-políticas que podem ser delegadas:
• Pessoas jurídicas de Direito Público – autarquias e fundações
públicas. Ex.: INSS, OAB70.
• Pessoas jurídicas de Direito Privado – concessionários e
permissionários. Dependendo do contrato de delegação, pode cobrar
tributo (principalmente taxa) ou tarifa. No segundo caso, não é
delegação de capacidade, conquanto os preços públicos não se
sujeitam à ordem tributária.
• Pessoas físicas – é possível. Ex.: notários, tabeliães, perito nomeado,
tradutor juramentado.
Crítica à delegação atípica – com efeito, não há delegação nenhuma por
parte do Estado. Quem estabeleceu a repartição da capacidade ativa foi o
constituinte. O Estado não pode revogar a delegação, ato natural e característico
do instituto, porque foi a Constituição que estabeleceu a repartição das receitas.
Como as entidades parafiscais, por uma questão de legitimidade (ausência de
Poder Legislativo próprio), não podem exercer a competência plena (instituir e
legislar sobre exações), o constituinte resolveu conferir-lhes titularidade para a
capacidade ativa (arrecadar e fiscalizar). Nesse contexto, o ente federado do qual
se descentralizou a atividade da entidade parafiscal deve legislar em seu favor,
como bem preceituou o legislador no art. 24, I, CF/88.
Em termos tributários, qualquer pessoa pode ser autor, réu ou devedor
– capacidade processual tributária passiva e ativa e capacidade material passiva.
Nesse passo, a imunidade recíproca só se restringe a impostos sobre patrimônio,
rendas e serviços (art. 150, VI, “a”, CF/88), não cabendo no tocante às taxas,
contribuições especiais e de melhoria. Fazenda Pública pode demandar em face
de outra. Mesmo não sendo pessoa personificada, ente coletivo
despersonalizado pode ser demandado e demandar em juízo, chamados de
pessoas formais (condomínio, espólio, sociedade em comum, etc.). Mas
particular não pode ser credor de tributo. Além dos entes federados, as entidades
parafiscais são também credores tributários. Há dois pontos interessantes nessa
seara, quanto à devolução de crédito tributário:
- No empréstimo compulsório, a relação de ida (recolhimento do tributo) é
tributária, mas a volta não. O sujeito passivo da primeira terá direito a
ressarcimento proporcional, mas não quer dizer que isso seja tributo
restituído. Há crédito em seu favor, mas não é tributário.
- Na ação de repetição de indébito, o valor a ser ressarcido pelo erário não
tem natureza de crédito tributário, porque tributo não nasce de erro de
vontade das partes, mas da lei. Alguns doutrinadores, como Machado

70
Na ADIn 3026, o STF definiu que a OAB não é autarquia federal, ou seja, possui personalidade jurídica de Direito Público,
mas não integra a Administração. É pessoa “suis generis”, inerente e essencial ao Estado Democrático de Direito. Sendo assim,
as contribuições de seus associados não têm natureza tributária, ela não se sujeita ao controle do TCU, não precisa fazer
licitação para contratação nem concurso para seus trabalhadores. Sua contabilidade também não é pública, nos termos da Lei
4320/64, não podendo usar a execução fiscal para cobrança de seus débitos.
48
(1993), não concordam com assertiva, afirmando que o valor teria
natureza de exação.
A competência residual para taxa é deferida aos Estados, a teor do art.
25, § 1º, CF/88. Eles poderão instituí-las, desde que o serviço não seja local (art.
30, V, CF/88) nem da União (art. 21, I a XXV, CF/88). Os Estados também têm
autorização para instituir contribuições previdenciárias sobre os vencimentos de
seus servidores públicos (art. 149, § 1º, CF/88).
Conflitos de competência – ainda que haja partilha do poder de tributar
estabelecida pelo constituinte, persistem conflitos de competência tributária.
Entretanto, não se cuida – e não deve fazê-lo – a Constituição de solver os
choques dessa natureza, relegando à lei complementar tal tarefa (art. 146, I,
CF/88).
Bitributação e “bis in idem” – um ente pode extrapolar de sua
competência e exercê-la de modo excessivo, excedendo-se na sua autonomia,
querendo tributar duas vezes o mesmo fato gerador (excesso de competência ou
de autonomia). Paralelamente, dois entes desejam tributar o mesmo fato gerador
(invasão de competência ou de autonomia). Em ambos, há uma tributação dupla
sob a mesma ocorrência fática: no primeiro caso, denomina-se “bis in idem”; no
segundo, bitributação. Tanto “bis in idem” quanto bitributação são, em regra,
vedados, porquanto somente aí há conflito de competência. A bitributação foi
excepcionalmente autorizada pelo constituinte no art. 154, II, CF/88, no momento
em que há franquia para estabelecer IEG sobre fatos imponíveis já previstos para
outros tributos (SABBAG, 2004, p. 63). Alberto Xavier também elenca uma
terceira situação: quando se refere a exações sobre o comércio internacional
(bitributação internacional) – IE na saída dos produtos e II na entrada em país
diverso. Essa prática não é proibida, porque cada Estado possui soberania
(duplo exercício livre de soberania). Nesse sentido, a autonomia diz respeito ao
exercício de um poder interno, enquanto a soberania, uma manifestação externa.
Alguns autores, utilizando essa nomenclatura, afirmam que o “bis in idem” diz
respeito ao primeiro, enquanto a bitributação, ao segundo.
Exceções à permissão de bitributação internacional – a bitributação
internacional é um entrave à globalização71. Há inviabilidade da ampliação dos
mercados e da própria atividade mercantil. Há duas formas de atenuar ou
eliminar a bitributação internacional:
- Tratado ou acordo internacional – para compartilhar um “contrato” entre
os Estados, de modo a reduzir as barreiras tributárias. Não se trata de
mitigação da soberania, vez que o sistema dualista doméstico permite
que os representantes do povo analisem o tratado firmado pelo chefe de
Estado ou por seu plenipotenciário. Se o Legislativo não acolher o
tratado, esse não tem validade na ordem interna.
- Imunidades na exportação – por questão de costume internacional,
geralmente o país que exporta não tributa o produto na saída. Dessa
feita, a maioria dos países veda, dentro de suas Constituições, a
71
Globalização pode ser definida como o fenômeno jurídico, político, social e econômico que tenta fazer, através da moeda, a
reaproximação daquilo que se separou por força do choque das placas tectônicas: seus povos, seus costumes e seus mercados.
49
incidência de exação nas operações de exportação, para que seja
garantida a reciprocidade em nível de estabilidade máxima. Assim é o
Brasil: ICMS (art. 155, § 2º, X, “a”, CF/88), IPI (art. 153, § 3º, III, CF/88) e
contribuições sociais e CIDE (art. 149, § 2º, I, CF/88). A doutrina chama
essas três vedações ao poder de tributar de imunidades do
exportador.
Exceções à bitributação e ao “non bis in idem” no âmbito interno – podem
ser arroladas duas situações:
- Bitributação quanto ao IEG – na competência extraordinária da União, o
IEG não está sujeito ao princípio em tela (art. 154, II, CF/88). Por se
tratar de situação excepcional, em verdade, não há invasão ou excesso
de competência, porque se tratam de competências distintas. Há um
duplo exercício de autonomia: uma está presente de modo ordinário; a
outra está constitucionalmente autorizada, mediante a ocorrência de
determinada condição – a guerra.
- “Bis in idem” nas operações de importação (ICMS, IPI, II) – na verdade,
há três fatos geradores diferentes, os quais, por coincidência, ocorrem
no mesmo contexto fático. O ICMS é devido porque há circulação de
mercadoria72; o IPI é devido porque houve alteração substancial da
matéria; o II é devido pelo ingresso de produto do estrangeiro para o
Brasil. A EC 42/03 alterou o prospecto, pois autorizou a criação a
CONFINS-Importação (art. 195, IV, CF/88, e Lei 10865/04), afirmando
que os importadores custeariam a seguridade social. Nesse caso, há um
autêntico “bis in idem”, porque a exação em tela e o II têm o mesmo fato
gerador. Na mesma esteira, o STF73 entendeu que cabe ICMS no
“leasing” internacional74, afirmando que o fato gerador é a importação
(entrada de mercadoria e não necessariamente a circulação, como está
no art. 155, § 2º, IX, “a”, CF/88), ocorrendo a mesma hipótese de
incidência do fato típico do II. De fato, o Excelso Pretório estendeu o
ICMS a uma modalidade de importação, pelo qual entendeu que a
bitributação é constitucionalmente autorizada.
72
Em tese, o ato de importar não se adequaria à matriz reveladora da circulação de mercadoria. No entanto, na prática, essa
idéia não impera, prevalecendo, de modo pacífico, a incidência de ICMS sobre tal espécie de fato gerador. Para legitimar a
cobrança do imposto, o constituinte deixou isso claro no art. 155, II, “in fine”, CF/88, com a redação dada pela EC 3/93.
a73 STF, RE 206069-SP, rel. Min. Marco Aurélio, rel. para o acórdão Min. Ellen Gracie, Informativo do STF nº 399.
74
A circulação, como fato gerador do ICMS, pressupõe: operação de mercância (mercadoria que se aliena com habitualidade,
com lucro, com atividade organizada) e transferência de domínio (alteração da titularidade de bem a título oneroso). Sobre o
contrato de “leasing” interno não incide o ICMS, porque lhe ausenta um dos requisitos: a transferência econômica do domínio.
Há atividade de mercância, mas não transferência. Com efeito, o “leasing” é um contrato híbrido, em que coexistem uma
locação e uma promessa de venda (e não de compra). Há uma cisão da posse: a direta fica com o arrendatário e a indireta, com
o arrendante. Para evitar que o ICMS dos Estados incidisse indevidamente sobre as operações de “leasing”, a LC 87/96 (art. 3º,
VIII), a qual versa sobre o ICMS, vedou tal prática, com fulcro na competência distribuída pelo art. 146, III, “a”, CF/88. Nessa
mesma seara, até 2001, o STF garantiu a não-incidência do ICMS nas importações realizadas por pessoas físicas e jurídicas, as
quais não exerciam atividade importadora de mercância. Com a EC 33/01 (art. 155, § 2º, IX, “a”, CF/88), esse entendimento
do Excelso Pretório ficou esvaziado, porque a ICMS de importação passou a incidir sobre todas as pessoas, independentemente
da finalidade do bem importado. Nesse sentido, a redação de sua Súmula 660 foi emendada (4 Ago 2004), acrescendo-se, no
seu início, a expressão “até a vigência da EC 33/2001”. No Informativo do STF nº 455, a corte firmou entendimento, na linha
do que vinha decidindo o STJ, que a operação de “leasing” internacional, em regra, não importa em fato gerador do ICMS.
Esse posicionamento não é absoluto, conquanto em situações ímpares, em que os bens importados fazem parte do patrimônio
imobilizado da empresa, não há de se falar em não-incidência da exação (RE 206069/SP, DJU de 1º.9.2006). Mas a regra
anterior continua vigorante no Excelso Pretório (RE 461968/SP, rel. Min. Eros Grau, 30.5.2007, Informativo do STF nº 469).
50
FONTES DO DIREITO TRIBUTÁRIO (art. 96 a 112, CTN) – segundo a
Teoria Geral do Direito, suas fontes principais são: lei, doutrina, costumes e
jurisprudência. Dentro do Direito Tributário, há necessidade de adaptar o
postulado ao estudo da matéria em análise. O art. 96, CTN, começa a delinear o
objeto em estudo ao definir o que é legislação tributária: leis, tratados
internacionais, decretos e normas complementares. A doutrina encarregou-se
em hierarquizá-las segundo a seguinte classificação:
- Fontes primárias – são as leis, os tratados internacionais e até mesmo
os decretos, regulados respectivamente pelos arts. 97, 98 e 99, CTN.
Os decretos deveriam ser considerados como fonte secundária, porque
devem se limitar a regulamentar a lei em sentido estrito. Dessa feita, o
decreto executivo, dentro do sistema constitucional posto, não poderá
ser autônomo, sem ter como base um diploma legal. O art. 5º, II, CF/88,
traz o chamado princípio da legalidade, o qual, com certeza, não abarca
o ato do executivo dado por decreto. Em verdade, o legislador reforçou
essa idéia no texto do próprio art. 99, CTN, o qual espancou
definitivamente o decreto autônomo no campo tributário75.
Em contrário senso, resoluções do Senado, decretos legislativos, MP
e EC podem ser incluídas no rol das fontes primárias, em uma
interpretação conforme a Constituição (art. 59, I a VII, CF/88).
O art. 97, CTN, traz, em seu bojo, o princípio da legalidade tributária, tal
qual está expresso no art. 150, I, CF/88. No entanto, a Constituição não
ventila a possibilidade de reduzir tributo somente por meio de lei, ao
contrário do art. 97, II, CTN. Esse aparente contra-senso é aduzido pela
própria função do CTN, como LC que é (art. 146, II, CTN). Esse visa
preencher eventuais lacunas no Texto Constitucional, dando um “norte”
para a atividade do legislador ordinário. Dessa forma, é válida e aplicável
a previsão do art. 97, II, CTN, exigindo-se lei para reduzir o valor dos
tributos. Exceção à regra da legalidade estrita, quanto à majoração da
exação, se defere somente aos impostos extrafiscais (II, IE, IPI e IOF) e
ao IEG. No mesmo diapasão, a redução de CIDE-combustíveis também
independe de lei, tal qual está no art. 177, § 4º, “b”, CF/88 (redação dada
pela EC 33/01). Veja que a alteração das alíquotas dessa última exação
só é possível para reduzir ou para restabelecer, sendo que a majoração
pura simples depende de lei estrita76.
A regra do art. 97, III e IV, CTN, traz o princípio da tipicidade, ou seja, a
definição do fato gerador (elemento objetivo), do sujeito passivo
(elemento subjetivo), a base de cálculo e alíquota (elemento
quantitativo). Além desses parâmetros, o ditame também abarca o
número de vezes do pagamento do tributo (elemento temporal) e o
75
No âmbito do Direito Administração, a doutrina majoritária, assentada em posicionamento firmado pelo STF, admite o
decreto executivo autônomo nas hipóteses do art. 84, VI, “a” e “b”, CF/88. Nesse sentido, lembra Maria Sylvia Zanella Di
Pietro, Direito Administrativo, 19ª ed., São Paulo, Atlas, 2006.
76
Essa medida se funda na importância do setor de combustíveis no giro da economia global. O setor energético tem uma
repercussão altamente sensível na estabilidade dos mercados, tanto interno quanto interno. Tanto isso é verídico que a mesma
EC 33/01, que autorizou a instituição da CIDE-combustível, também permitiu a incidência de ICMS sobre a circulação de
energéticos comburentes entre Estados.
51
lugar do adimplemento (elemento espacial), porquanto o dispositivo
em comento é um rol sugestivo e não exaustivo. Dessa feita, a tipicidade
garante a segurança jurídica, complementando a legalidade. O elemento
material é o antecedente normativo (hipótese de incidência normativa),
enquanto os demais constituem o conseqüente normativo (modo de
incidência normativa), configurando a relação jurídica-tributária.
O art. 97, V, CTN, afirma que somente a lei pode determinar sanções
tributárias. O legislador é único que pode fazê-lo. Ademais, o ar. 97, VI,
CTN, dispõe que a legalidade deve imperar sobre a exigibilidade do
crédito tributário: suspensão, exclusão e extinção – além da dispensa ou
da redução de penalidades. Nesse sentido, a renúncia de receita depende
de autorização legislativa prévia, consoante o preenchimento dos
requisitos do art. 14, “caput”, I e II, LC 101/00.
O art. 98, CTN, se refere dos tratados internacionais. O dispositivo
contém impropriedades terminológicas. Em um primeiro assunto, os
acordos não revogam a legislação interna – porquanto prestam a
minorar a bitributação internacional e a estabelecer cooperação no poder
de polícia. Estando nessa seara, o pacto traz um regramento próprio no
procedimento a ser estabelecido, geralmente diverso da legislação
ordinária anterior77. Não há revogação pela incorporação do tratado no
ordenamento doméstico, porque a aparente antinomia é solvida pelo
critério da especialidade: para os países signatários – inclusive o Brasil
–, vige o regramento específico, não sendo aplicado a outras situações.
O tratado deveria colimar a atuação do legislador posteriormente, tal qual
a redação do art. 98, “in fine”, CTN, porquanto as relações por ele
abrangidas não poderiam ser modificadas por norma interna posterior. No
entanto, o STF entende, com base no art. 49, I, CF/88, que o CN pode
alterar o acordo unilateralmente, por disposição normativa própria. Não é
uma posição pacífica na doutrina. O STJ faz uma leitura semelhante,
afirmando que a especialidade só vale quanto à legislação anterior,
resolvendo-se os demais entraves pela cronologia. A soberania interna
prevalece, mesmo a despeito de eventuais sanções na ordem
internacional a serem sofridas pelo Brasil.
Com efeito, quando da edição do CTN, o Supremo deu vezo ao primado
dos tratados sobre a legislação interna, fazendo com que a disposição
daqueles, no tocante à matéria tributária, deveria ser coercitivamente
observada pelo legislador doméstico. Em verdade, a comissão
encarregada de elaborar o anteprojeto do futuro CTN incluiu o citado art.
98 na esteira da jurisprudência do Excelso Pretório (AMARO, 2006, p.
181).
O STJ entende que legislação interna não pode revogar tratados-leis, os
quais trazem à baila autênticas normas de Direito Internacional Público, o
que não se aplica quanto aos tratados-contratos.

77
O Supremo entende que esse tipo de tratado tem o “status” de lei ordinária: STF, Plenário, Ext 662-2, rel. Min. Celso de
Mello, j. 28.11.1997, DJU 30.5.1997.
52
Questão que também se coloca quanto ao art. 98, CTN, versa sobre a
possibilidade da União conceder isenções quanto a tributos estaduais e
municipais. Essa prerrogativa era factível na ordem constitucional anterior
(EC 1/69). Na vigência da atual Constituição, isso não é possível (art. 153,
III, CF/88), tanto quanto reciprocamente: cada ente só pode conceder
isenções dentro de sua competência tributária, vedando-se a isenção
heterônoma. E se o Brasil assinar tratado internacional que venha nesse
sentido? A possibilidade persiste, pois a firmação de acordo é
manifestação da República Federativa do Brasil, em um autêntico ato de
soberania. A heteronomia diz respeito à autonomia e não à soberania,
sendo essa incontrastável. Ao contrário do que apregoa Carraza (1991), o
STF entende dessa maneira, porque qualquer ente federativo não pode
invocar isenção heterônoma nessa. Todas as pessoas políticas devem
reverência à soberania do Estado brasileiro78. Por uma questão de opção
do legislador, ocorre que a União representa o Brasil na celebração de
convenções internacionais, porque o Presidente da República, nesta
tarefa, atua como chefe de Estado (art. 84, VIII, CF/88). Ademais, a
incorporação do pacto só é possível depois da ratificação parlamentar, em
que se encontra a câmara representativa dos Estados-membros: o
Senado79. Dessa forma, a tese do professor Carraza (1991) não vigora,
apesar de encontrar muitos adeptos na doutrina jurídico-tributária. As
Súmulas 575 do STF, 20 e 71 do STJ80 já pacificaram o posicionamento.
Os precedentes normativos dos tribunais superiores advieram
principalmente dos acordos do GATT, inicialmente sobre a importação de
bacalhau. Entenderam as cortes que o ditame da reciprocidade deve
imperar nesses casos81.
- Fontes secundárias – compõem-se das chamadas normas
complementares. Essas visam completar as fontes primárias, nos
exatos termos do art. 100, CTN, dispositivo que deve ser concatenado
com o art. 103, CTN, em termos de vigência.
 Atos administrativos – portarias, circulares, instruções normativas são
normas complementares que visam especificar as medidas
normativas primárias, constituindo regra a ser observada pelo
aplicador do direito (art. 100, I, CTN). Todavia, esse não está adstrito
ao seu texto se houver infringência das normas primárias. A teor do
art. 103, I, CTN, entram em vigor na data de sua publicação, salvo
disposição em contrário.

78
Nesse passo, Machado, op. cit., não utiliza terminologia adequada ao estabelecer a isenção heterônoma em acordo
internacional como exceção à vedação.
79
Em matéria de tributação municipal, esse argumento não subsume à situação em apreço. Apesar de não haver precedente
jurisprudencial, é possível a concessão de isenção a uma exação municipal por convenção internacional em homenagem à
soberania nacional, em que pese não haver opinião do legislativo municipal.
80
Súmula 575 do STF: “À mercadoria importada de país signatário do GATT, ou membro da ALALC, estende-se a isenção do
Imposto de Circulação de Mercadorias concedida a similar nacional”. Súmula 20 do STJ: “A mercadoria importada de país
signatário do GATT é isenta do ICM, quando contemplado com esse favor o similar nacional”. Súmula 71 do STJ: “O
bacalhau importado de país signatário do GATT é isento do ICM”.
81
No mesmo sentido, STJ, REsp 480563/RS, rel. Min. Luiz Fux, j. 6.9.2005. STF, Plenário, RE 229096/RS, rel. orig. Min.
Ilmar Galvão, rel. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, j. 16.8.2007, Informativo do STF n° 476.
53
 Decisões do órgãos julgadores administrativos – podem ser alçadas
à eficácia “erga omnes”, desde que exista uma lei posterior que assim
disponha (art. 100, II, CTN). Ressalvada estipulação ao reverso,
surtem reflexos jurídicos 30 dias depois de sua publicação.
 Práticas reiteradas da Administração – o art. 100, III, CTN, é um misto
de costume e de ato normativo. No exercício da capacidade tributária
ativa, elas podem ser configuradas como fonte tributária. Observa-se
que o termo “práticas reiteradas” é uma expressão jurídica
indeterminada, devendo ser verificado o caso concreto em análise.
Como são formadas gradativamente, não há de se falar em termo
inicial de vigência.
 Convênios entre os entes federados – também podem constituir fonte
do Direito Tributário (art. 100, IV, CTN). Visam uniformizar um
regramento comum entre conveniados, para criar um campo de
intersecção nas diversas legislações tributárias, mormente no tocante
ao poder de polícia (fiscalização). Os convênios tributários têm o
condão de ampliar a incidência do princípio da territorialidade.
Vigoram a partir da data estatuída no seu instrumento de veículo (art.
103, III, CTN).
INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DA NORMA TRIBUTÁRIA (arts. 107
a 112, CTN) – as questões sobre o preenchimento de lacunas da legislação
tributária são resolvidas segundo os critérios do art. 108, I a IV, CTN, os quais
serão analisados sucessivamente, segundo uma ordem peremptória. São os
seguintes, de acordo com os incisos do art. 108, CTN:
I. Analogia – aplicar decisões anteriores a casos semelhantes é o meio
integrativo primário da legislação tributária. Mas a analogia não pode se
prestar à criação de um tributo frente a uma situação assemelhada (art.
108, § 1º, CTN), porque haveria infringência à legalidade e à tipicidade
tributárias (art. 97, I e III, CTN).
II. Princípios gerais de Direito Tributário – preconiza a aplicação de um
interpretação sistemática em face dos comandos implícitos na norma
tributária.
III. Princípios gerais de Direito Público – uma vez que os anteriores restem
insuficientes, recorre-se a uma seara mais ampla.
IV. Equidade – é o valor maior da justiça. No entanto, não poderá o
aplicador do direito lançar mão desse critério para conceder dispensa
de pagamento da exação (art. 108, § 2º, CTN), sob pena de arranhar a
legalidade aduzida no art. 97, VI, CTN. A renúncia de receita por
equidade não é possível.
Os princípios de Direito Privado são necessários para definição dos
institutos a ele afetos, mas não sobre os efeitos tributários (art. 109, CTN). Ex.:
empresário, prescrição, decadência, prestação de serviço, locação, etc. são
conceitos de Direito Privado, mas não podem levar a reflexos tributários diretos.
54
O art. 110, CTN, dispõe que não se pode alterar o conceito, o alcance e
a forma de elementos de Direito Privado, desde que expressos nas Leis
Maiores (CF, CE e Lei Orgânica) e definidores ou limitadores de competência
tributária. A definição do instituto privado não precisa estar erigido nos referidos
diplomas, mas sua utilização neles leva a uma certa concepção. É exatamente
esta idéia que não pode ser alterada pelo legislador tributário. É possível citar
dois casos: mercado eletrônico interestadual de “download” tributado por ICMS e
ISS sobre bens móveis locados.
No primeiro caso, os advogados postularam que o artigo não é mercadoria
corpórea, não se fazendo a incidência da exação sobre a operação em tela. O
conceito privado de mercadoria foi criado em uma época que não contemplava a
realidade hodierna, devendo ser adaptado à atualidade.
No segundo caso, contestou-se a incidência de ISS sobre a locação de
bens móveis, porquanto não havia previsão nesse sentido na relação de serviços
contida na LC 116/03 e, seguindo tal orientação, no rol de lei municipal. E mais:
deve existir conduta que seja verdadeiramente uma prestação de serviço, tal qual
se define por seu conceito aduzido do Direito Privado: obrigação de fazer por
meio da qual alguém deve realizar algo em favor de terceiro, sendo remunerado
pela correspondente prestação. Dessa forma, a locação não estaria aí englobada,
porque, na realidade, estar-se-ia diante de uma obrigação de dar. Em contrário
senso, as procuradorias municipais advogaram que a exação incide sobre
serviços, não sobre prestação, tal qual a redação do art. 156, III, CF/88. A
obrigação de dar estaria englobada pelo conceito de serviço, não importando se
inexiste uma concreta prestação de serviço. O STF82, em votação folgada no
Plenário, com apenas um voto de dissidência, decidiu favoravelmente aos
contribuintes, porquanto até mesmo o CC disciplina de modo diverso o contrato
de locação e de prestação de serviços. Nesse caso, o Excelso Pretório declarou
inconstitucionais todas as leis municipais nesse sentido, as quais determinavam a
incidência de ISS sobre locação de móveis. Dadas recentes mudanças na
composição do STF, esse entendimento pode ser alterado.
Os arts. 111 e 112, CTN, se referem à interpretação da norma tributária. O
primeiro determina uma exegese gramatical sobre as matérias nele vinculadas.
Não é a melhor técnica a ser empregada pelo operador do Direito, devendo ser
utilizada em situações específicas, como aquelas apresentadas na disposição do
legislador. São os casos de suspensão da exigibilidade do crédito tributário (arts.
151 a 155-A, CTN), de exclusão da exigibilidade tributária (arts. 175 a 182, CTN)
e de dispensa de exigibilidade de obrigações acessórias83. Nessa última, há uma
extrema exceção, vez que se liga ao poder de polícia estatal. Sua interpretação
extensiva pode levar à criação hermenêutica de uma outra exceção, diversa
daquela deseja pelo legislador. O art. 112, CTN, pode ser analogamente
comparado ao princípio penal “in dubio pro reo”, porque preconiza a aplicação do

82
STF, Pleno, RE 116121.
83
Nesse sentido, a imunidade recíproca (art. 150, VI, “a”, CF/88) só alcança alguns impostos (sobre patrimônios, bens e
serviços), não abarcando o conceito de obrigações acessórias e muito menos a idéia de crédito tributário. É o que leciona
Carrazza, op. cit., o qual preconiza a tributação nesse sentido entre os entes federados, por se tratar de questão muito mais
administrativa que tributária.
55
84
dispositivo mais benigno ou favorável ao administrado, nos casos de infração
ou de cominação de sanção tributária.
Lei Complementar – em matéria tributária, sua função está perfeita no art.
146, CF/88. Como pressuposto, é necessário firmar posição de que não cabe MP
em matéria veiculada por LC (art. 62, § 1º, CF/88). A LC veio a lúmen pela Carta
de 1967, em razão da necessidade de expressão da vontade majoritária do
legislador para quebrar a facilidade de aprovação de um diploma ordinário. A
tendência foi acolhida pela ordem constitucional de 1988, configurando real
manifestação da maioria dos representantes do povo (art. 69, CF/88). O art. 146,
CF/88, está nesse âmbito, dispondo sobre as seguintes matérias tributárias,
consideradas mais relevantes pelo constituinte:
I. Conflito de competência tributária entre entes federados.
II.Regular a limitação do poder de tributar. Ex.: redução de tributos,
isonomia, interpretação benéfica, etc.
III. Estabelecer normas gerais em legislação tributária, segundo os
pontos previstos nas alíneas:
a. Perfil dos tributos – o princípio da tipicidade quanto aos impostos
está delineado do art. 146, III, “a”, “in fine”, CF/88 (base de cálculo, fato
gerador e sujeito passivo), e se deve à unicidade no âmbito nacional.
Ex.: “leasing” interno não é tributado.
b. Estrutura obrigacional-tributária – as definições de obrigação
tributária (art. 113, CTN), crédito tributário (art. 139, CTN), lançamento
(art. 142, CTN), prescrição (art. 174, CTN) e decadência (art. 173, CTN)
estão contidas no dispositivo. Essas disciplinas estão perfeitamente
delineadas na LC geral (CTN).
c. Tratamento mais benéfico às cooperativas – para estimular o
cooperativismo.
IV. Estabelecer normas gerais mais benéficas a empresas de
pequeno porte e microempresas (acrescido pela EC 42/03) – o legislador
visou fomentar os empresários pequenos, formando a base do “Super
Simples”, ainda melhor que o atual “Simples”. No entanto, a intenção de
facilitar a vida dos destinatários acabou por quase que inviabilizá-la, pois
dificultou sua aprovação no CN (LC). Dessa feita, os grandes
empresários fizeram “lobby” em sentido contrário para evitar que os
pequenos fossem favorecidos, crescendo e com eles fazendo
concorrência. Com efeito, os regimes “Simples” instituídos foram
revogados pela LC regulamentadora (art. 94, ADCT), a qual encontra-se
atualmente em vigência (LC 123/06).
O parágrafo único do art. 146, CF/88, abriu possibilidade para instituição
de um sistema único de arrecadação, à guisa de convênios possíveis e
existentes. Seria uma medida legislativa a desburocratizar a tributação e a

84
O CTN, dessa forma, traz três modalidades de interpretação da lei tributária: a literal (art. 111, CTN), a mais benigna ao
contribuinte (art. 112, CTN) e a econômica (art. 118, CTN, incorporando o princípio “non olet”).
56
otimizar a arrecadação e a fiscalização tributária das ME’s e EPP’s. A
sistemática, no entanto, deverá obedecer aos seguintes limites:
- O regime será opcional aos contribuintes.
- Devido às diferenças geográficas e consuetudinárias do país, com
dimensões continentais, o legislador pode estabelecer procedimentos
diversos em cada local, a serem adaptados à realidade cada ente
federado ou região.
- O repasse deve ser imediato, não sendo lícita a retenção.
- Previsão de um cadastro único de contribuintes, bem como da
possibilidade de fiscalização compartilhada (poder de polícia). A
arrecadação será obrigatoriamente centralizada, de acordo com o
espírito colimado pelo constituinte.
Na esteira do que previa o art. 146, III, “d”, e parágrafo único, CF/88, o
legislador complementar criou o “Super Simples”. Foi instituído pela LC 123/06,
criando um sistema simplificado de tributação no âmbito de todas as pessoas
políticas. O diploma não ofende a isonomia quanto às demais empresas, visto
que as MEE’s e as EPP’s não se encontram no mesmo nível econômico.

Direito Obrigacional Tributário


ESTRUTURA DA RELAÇÃO TRIBUTÁRIA (arts. 113 a 127, CTN) –
engloba a obrigação tributária, o fato gerador e os aspectos subjetivos – sujeito
ativo e sujeito passivo (solidariedade, capacidade tributária, domicílio e lugar do
pagamento).
Obrigação tributária – está inserta no art. 113, CTN. Esquematizando, é
possível aduzir a seguinte explicação:
Crédito Tributário (art. 139 a 141, CTN), Extinção (art. 156, CTN),
Exclusão (art. 175, CTN).
A lei estabelece os parâmetros da hipótese de incidência: aspectos
subjetivo, quantitativo, temporal e espacial. A hipótese de incidência é uma
previsão abstrata, inserta na norma, uma mera descrição sugestiva de uma futura
conduta que pode ou não ocorrer. A doutrina, por tal previsão, compara o
conceito de hipótese de incidência com o tipo criminal, erigindo a chamada
tipicidade tributária. A partir da caracterização concreta de todos seus critérios,
fica materializado o fato gerador85. A obrigação tributária nasce da subsunção do
fato (pragmático) à norma, quando da ocorrência real do fato imponível86 – termo
“a quo” dela.
Quando se diz que a obrigação tributária tem como traço o fato de ser “ex
lege”, afigura-se que ela independe da vontade do sujeito passivo. Ela nasce da
85
Paulo de Barros Carvalho estabelece, nesse passo, a teoria dos planos de tributação: um abstrato – constituído pela hipótese
de incidência – e outro concreto – formado pela efetiva ocorrência do fato gerador.
86
Amaro, op. cit., 259, critica a expressão “fato imponível” assim como fato tributável, expressões aduzidas de Aliomar
Baleeiro, citado pelo primeiro. O sufixo “-ível” dá a idéia de ocorrência futura, algo que ainda não se sucedeu. Essa colocação
não coaduna com o conceito de fato gerador. Em verdade, o objeto de crítica advém da doutrina espanhola, capitaneada por
Jarach, também citado por Amaro, op. cit., p. 258, que muito o utiliza.
57
lei e será devida mesmo sem a colaboração do devedor. Produzido o previsto
na lei, configura-se o fato gerador e, por conseqüência, fica perfeita a obrigação
tributária.
Fato gerador condicional (art. 117, I e II, CTN) – exige um estudo prévio
sobre o negócio jurídico do Direito Civil. Entre as diversas condutas possíveis
para o fato gerador, ele pode constituir um negócio jurídico. Ex.: compra e venda
pode gerar a obrigação de recolher ICMS ou ITBI; a doação de um carro pode
fazer incidir o ITCMD. No plano ponteano da eficácia dos fatos jurídicos, dentre
seus elementos acidentais, a condição pode estar abarcada pelo fato gerador.
Com efeito, a condição implica em efeitos futuros, a qual pode ensejar a
suspensão da eficácia do negócio – evento futuro incerto (art. 121, CC),
consubstanciado condição suspensiva (art. 125, CC). Do contrário, o negócio
pode estar produzindo os efeitos desde já, indo até determinado evento futuro e
incerto, quando deixará de fazê-lo (condição resolutiva – art. 127, CC). No
segundo caso, como ocorreu o fato gerador, a exação incide desde já,
independendo de implementação ou não da condição (art. 117, II, CTN); no
primeiro, como o negócio não produz efeitos, a tributação não terá vez até que a
condição seja efetivada – não sendo exigível a obrigação tributária porque, em
realidade, o fato gerador ainda não se deu (art. 117, I, CTN).
Ademais, é necessário aduzir o exemplo clássico da compra e venda com
retrovenda (ITBI municipal) e doação com cláusula de reversão (ITCMD
estadual). Acontecendo a condição resolutiva (retrovenda ou reversão), haveria
incidência dos respectivos tributos? A jurisprudência ainda não se pacificou,
mesmo no STJ, perfazendo DUAS CORRENTES:
 Não cabe a exação na “volta” – não persiste novo negócio jurídico –
nova doação ou nova venda. Não há novo consenso, “animus” de
realizar um outro ato jurídico bilateral. O que persiste é a conclusão do
anterior. Tanto a reversão quanto a retrovenda são cláusulas acessórias
ao negócio principal. A cobrança no momento do novo registro, como
seu pressuposto, enseja mandado de segurança contra o registrador do
CRI – exigir o tributo é fato independente da mera translação do imóvel.
Na reversão, o fato gerador do ITCMD é a doação, o que torna a defesa
fácil. Já na retrovenda, o fato gerador do ITBI é a mera transmissão de
direito de propriedade. Seu negócio “inter vivos” pode ser uma compra e
venda, arrematação em hasta, permuta, etc. Destarte, a retrovenda não
implica em uma verdadeira transmissão, visto que há verdadeiro
encerramento da compra e venda anterior, não persistindo nova
transação negocial. O imposto deve incidir sobre a efetiva demonstração
de riqueza, de capacidade econômica objetiva, o que torna a exação na
“volta” como injusta dentro da ordem jurídico-tributária em sentido amplo.
Em ambos os casos, não há essa real mostra de potencial financeiro,
porque persiste simples retorno ao “status quo ante”.
 Incide o imposto na “volta” – no ITBI, transmissão é a simples alteração
da propriedade, não havendo de se cogitar sua causa. O fato gerador
não é a compra e venda, mas sim a transmissão escritural “inter vivos” e
onerosa, porque o preço é devolvido ao alienante original. Do mesmo
58
modo, a doação não deve ser excluída da exação, com menor
propriedade, porque o argumento se enfraquece ante o fato gerador
(“doação”). Em verdade, ambos os casos fundam-se no princípio do “non
olet”, que garante a tributação sobre o fato gerador sob cunho objetivo,
não se admitindo perquirir suas causas.
Cláusula geral antielisão (art. 116, parágrafo único, CTN) – além da
própria fraude tributária, a qual consubstancia atividade flagrantemente ilícita
(evasão fiscal), é possível reduzir a tributação por meio de práticas de
supralegalidade. Muitas condutas não estão expressamente proibidas pelo
ordenamento, as quais possibilitam a descaracterização do fato gerador – apesar
de sua ocorrência de fato, mas não de direito – e, por conseqüência, a redução
da carga tributária. Essas atuações são traduzidas pelo chamado planejamento
tributário ou elisão fiscal. Ex.: ao invés de realizar uma compra e venda de um
imóvel de alto valor, para não recolher o ITBI correspondente, as partes
constituem uma sociedade empresária, sendo certo que o alienante ingressa com
o capital imobilizado e o adquirente, com o valor líquido do preço – algum tempo
depois, mesmo a despeito de não realizar o objeto da empresa, dissolve-se
sociedade.
A Fazenda Pública tem tentado, ao longo de anos, proibir a elisão fiscal,
porquanto se trata de verdadeira simulação de fato gerador e, conseguintemente,
prática de caráter ilícito, apesar de legal87. Com tal intenção, foi acrescido o
parágrafo único ao art. 116, CTN, por meio da LC 104/01. No entanto, o
dispositivo necessita de regulamentação por meio de lei ordinária, porquanto é de
eficácia limitada. Atualmente, não existe tal diploma, o que implica em
impossibilidade de aplicação.
Interpretação objetiva do fato gerador (princípio do “non olet”) – a
interpretação econômica a ser impelida pelo fisco encontra fundamento no
próprio art. 118, I e II, CTN, tal qual já foi comentado em oportunidade anterior.
Elemento objetivo (prestação tributária) – além do pagamento em si – o
que inclui as penalidades tributárias, há outras obrigações a serem cumpridas
pelo sujeito passivo da relação jurídico-tributária. De fato, a cessão de riqueza é o
principal escopo da relação em pauta, em que pese haver outras prestações a
serem implementadas pelo contribuinte: são as obrigações acessórias
(assessoram o credor na atividade de tributação, informando-o acerca do
pagamento do tributo). Não é acessória no sentido do direito privado, de seguir o
principal (art. 59, CC/1916), mesmo porque possui caráter autônomo. É devida
mesmo a despeito do não pagamento do tributo, como no caso de alíquota zero
ou de isenção (art. 194, parágrafo único, CTN).
As obrigações acessórias, conhecidas como deveres instrumentais,
revelam o exercício do poder de polícia do fisco, tido em decorrência da
necessária fiscalização a ser realizada. Dessa feita, para Ricardo Lobo Torres,
persiste uma relação tributária material ou substancial – de pagar – e outra formal
87
A definição de negócio jurídico simulado e suas conseqüências, dentro do plano da validade, estão especificadas no art. 167,
CC. Em verdade, o legislador, por opção política, considerou o negócio nulo, desde que não se possa aproveitá-lo de outra
forma, quando as partes queriam praticar outro ato. O dispositivo considerou de tal gravidade o vício social que o inquinou de
nulidade, podendo ser declarado de ofício pelo julgador e suscitado a qualquer momento processual.
59
ou procedimental – de informar o fisco segundo as estipulações previstas na
norma. Com efeito, o art. 113, “caput”, CTN, as delineia. A primeira está descrita
no art. 113, § 1º, CTN, advindo necessariamente de lei; a segunda, no seu § 2º,
prevista na legislação “lato sensu”88, compreendendo prestação positiva ou
negativa por parte do sujeito passivo (art. 115, CTN), necessariamente não
envolvendo entrega de dinheiro. O art. 113, § 3º, CTN, determina que o não
cumprimento dessa leva ao nascimento de uma obrigação principal (sempre
positiva de pagamento), justamente para imprimir caráter coercitivo à obrigação
procedimental (positiva ou negativa). Nesse caso, a obrigação acessória ainda
persiste, podendo ou não ser dispensada pela autoridade fiscal, porquanto não
há “conversão”, tal qual a defectiva letra do art. 113, § 3º, CTN.
A obrigação acessória instrumentaliza a obrigação tributária principal,
fornecendo subsídios para que a autoridade fiscal exerça sua cobrança
fiscalizatória.
A sanção pecuniária do poder de polícia administrativo visa inibir a
frustração da fiscalização. Dentro de um controle de proporcionalidade e de
razoabilidade, a imposição da multa administrativa atinge o objetivo de
desencorajar o descumprimento da obrigação acessória, não sendo necessário
tipificar criminalmente a conduta. A criminalização da atuação do contribuinte
somente se dará em situações mais graves, a serem escolhidas pelo legislador. A
infringência da norma procedimental (obrigação não pecuniária), portanto,
implicará em um pagamento duplo: da obrigação principal, a qual não foi
propriamente adimplida, e da obrigação acessória não cumprida, convertida em
sanção pecuniária. Dessa forma, a obrigação principal é de pagar, podendo
incluir o tributo e a multa. O crédito tributário engloba ambas as categorias,
sendo um conceito mais amplo que o tributo.
Aspecto subjetivo (sujeitos ativo e passivo) – sujeito ativo tributário é
aquele que detém a capacidade tributária ativa, englobando um rol mais amplo
que dos entes com competência tributária (U-E-DF-M). Aliás, esses últimos
recebem parcela do poder de tributar, deferido pela Constituição ao Estado
brasileiro (República Federativa do Brasil). A repartição do poder de tributar
(competência), segundo as necessidades de cada ente, defere-lhe a capacidade
de instituir o tributo, de sobre ele legislar, de fiscalizá-lo e de arrecadá-lo
(capacidade tributária plena). Mas essa competência pode ser delegada, em
parte, a uma pessoa autônoma. Obviamente que essa nova figura não terá Poder
Legislativo, fato esse que a impede de operar as duas primeiras ações – instituir
e legislar –, as quais dependem de potencial para exarar leis em sentido estrito.
Dessa feita, elas poderão deter o dever-poder de fiscalizar e de arrecadar
somente, caracterizando a capacidade tributária ativa. Em suma, a competência
tributária não é delegável, mas a capacidade tributária ativa sim. Já a

88
A obrigação acessória será estabelecida por fontes secundárias. No entanto, a penalidade, ainda que administrativa, deverá
ser prevista em lei em sentido estrito (art. 97, V, CTN). Os procedimentos são determinados por norma infralegal – a qual é
englobada pelo conceito de legislação tributária (art. 96, CTN) –, mas a obrigação principal, decorrente do seu
descumprimento (art. 113, § 3º, CTN), só é estipulada por lei. “Legislação tributária” compreende toda e qualquer norma que
diga respeito a tributo: leis, tratados internacionais, decretos e normas complementares (atos normativos administrativos,
costumes administrativos, decisões administrativas e convênios – art. 100, I a IV, CTN).
60
parafiscalidade é aptidão para cobrar, fiscalizar e administrar tributos, sendo
instituto mais profundo que a capacidade tributária ativa.
A capacidade de ser sujeito ativo tributário abarca não só as entidades
fiscais, mas outras paralelas, denominadas parafiscais, como a Secretaria da
Receita Federal do Brasil (SRFB – Lei 11457/06) e os conselhos de profissões
regulamentadas (OAB89, CNM, etc.). O art. 119, CTN, pecou em sua redação,
porquanto, em tese, conferiu a sujeição ativa da obrigação tributária somente aos
entes públicos políticos – U-E-DF-M – porque se referiu expressamente à
“competência”. No entanto, a doutrina corrige o erro do legislador, asseverando
que o rol do art. 119, CTN, é meramente sugestivo, não “numerus clausus”.
Havendo desmembramento territorial, salvo disposição legal em contrário,
o novo ente tributário utilizará a legislação daquele do qual se desprendeu, por
sub-rogação, para não permitir a solução de continuidade (art. 120, CTN).
Posteriormente, quando de sua nova legislação, será substituída a antiga. Foi
exatamente o que ocorreu com o Estado de Tocantins, originado a partir do
Estado de Goiás (art. 13, “caput”, ADCT).
Empréstimo compulsório – o particular, ao exigir a restituição dos valores
já adimplidos (a título de exação), não se sub-roga em uma relação tributária.
Aliás, essa já se encontra esgotada. O particular será credor do Estado, mas não
tributário. O indivíduo jamais será sujeito ativo tributário, porquanto a obrigação a
ser cumprida pela pessoa pública nunca terá a natureza de tributo.
Repetição de indébito – opera-se o mesmo raciocínio do empréstimo
compulsório. O indébito não terá natureza de tributo90. Tributo não nasce do erro
de pagamento, mas sim da lei (princípio da legalidade e da tipicidade fechada).
Persistirá um crédito do indivíduo para com a Fazenda, de cunho financeiro, mas
nunca de fundo fiscal.
Pergunta: inicialmente, consideram-se dois sujeitos passivos tributários,
como condôminos de um imóvel. O inadimplemento do IPTU faz o fisco municipal
insurgir em face de somente um deles. Na execução fiscal, a Fazenda do
Município conseguiu satisfazer seu débito mediante penhora de bens e
conseqüente hasta. Considerando que não cabe o chamamento ao processo do
outro condomínio pelo executado, como esse poderia obter o ressarcimento da
cota parte a que lhe assiste o direito? Teria de ajuizar ação cognitiva ordinária ou
caberia alguma medida judicial mais célere?Resposta: em termos práticos, caso
não se consiga fazer com que o outro executado “B” seja chamado, terá que ser
proposta pelo executado “A” outra ação regressiva em face do “B”, para ser
ressarcido de sua quota parte.
89
A Primeira Seção de Direito Público do STJ firmou jurisprudência de que a contribuição para OAB não tem natureza
tributária, em que pese disposição cristalina do art. 149, “caput”, CF/88. Argumentou-se que se trata de instituição “suis
generis”, essencial à administração da justiça e, por conseqüência, à existência do Estado Democrático de Direito. Nesse passo,
não incide o modo de cobrança pela LEF (Lei 6830/80), o prazo prescricional tributário de cinco anos (art. 174, “caput”, CTN)
– aplicando-se o decurso de 10 anos do art. 205, CC –, a fiscalização pelo TCU, os princípio da anterioridade e da
irretroatividade tributária (art. 150, III, CF/88) e a obrigatoriedade de concurso público ou de licitação nas contratações (art.
37, II e XXI, CF/88). A decisão é muito mais política que jurídica, pois estipula uma exceção onde o constituinte não
estabeleceu, ferindo a isonomia e a ordem tributária constitucional. O STF referendou o posicionamento firmado pelo STJ na
ADIn 3026.
90
Cf. Machado, op. cit., em sentido contrário, para quem o demandante em restituição de empréstimo compulsório e em
repetição de indébito passa a figurar como autêntico credor tributário, dada a “causa petendi” do crédito envolvido.
61
Na sujeição passiva, analisa-se quem poderá ser devedor da
obrigação tributária. Pode ser qualquer pessoa, inclusive o próprio Estado, não se
restringindo ao particular. Nesse passo, a imunidade recíproca impede somente a
cobrança de impostos sobre patrimônio, rendas ou serviços entre os entes
públicos (art. 150, VI, “a”, CF/88), não abrangendo as demais espécies tributárias
– taxas, contribuições e empréstimos compulsórios –, bem como impostos como
de importação. O STF só alarga a incidência da imunidade recíproca na análise
“in casu”, em situações bastante específicas.
O caráter de sujeito passivo tributário inclusive independe de
personalidade jurídica, como o espólio, a massa falida e as sociedades de fato
(art. 126, I a III, CF/88).
O nome técnico do sujeito passivo é dado pelo art. 121, parágrafo único,
CTN:
 Contribuinte – é aquele que assume responsabilidade em decorrência
de um débito (prática de um fato gerador) por ele adquirido, sendo
denominado sujeito passivo direto, natural ou ordinário. Há de
observar-se que essa relação obrigacional decorre de lei, não da
vontade das partes. O contribuinte é aquele que detém o débito da
obrigação, também denominado “schuld” ou “debitum”.
 Responsável – não pratica o fato gerador (débito), mas a lei, em
homenagem à garantia do credor, transfere-lhe a responsabilidade de
realizar o recolhimento do tributo. O instituto da responsabilidade
tributária leva ao fenômeno da substituição. O responsável configura
um substituto tributário ou sujeito passivo indireto, detendo a
responsabilidade pela obrigação tributária (“haftung” ou “obligatio”). Ele
não tem relação jurídico-tributária direta com o sujeito ativo, mas
deverá arcar com o pagamento do tributo por expressa disposição legal
(arts. 150, § 7º, CF/88, e 121, parágrafo único, II, “in fine”, CTN).
Quanto às obrigações acessórias, o sujeito passivo poderá ser, além do
contribuinte e do responsável, terceiro alheio à relação tributária. Como se trata
de matéria referente à fiscalização, a obrigação acessório será mais bem
delineada no tópico apartado sobre Administração Tributária. Sem perder de vista
a linha de raciocínio, observa-se que o passivo da citado dever tributário pode ser
mesmo o imune, o isento ou o agraciado com alíquota zero (art. 194, parágrafo
único, CTN), ainda que envolva hipótese de não-incidência do fato gerador.
Solidariedade – é a possibilidade de uma pluralidade subjetiva na relação
jurídica material, com responsabilidade concomitante, ilimitada e alternativa pelo
débito. No âmbito tributário, ao contrário da seara civil, só é possível a
solidariedade passiva, em detrimento da competência indelegável dada pela
repartição constitucional do poder de tributar. No entanto, a doutrina estabelece
uma exceção a tal ditame: no caso da contribuição de melhoria gerada por obra
efetivada por convênio entes públicos. No entanto, o acordo entre os realizadores
do empreendimento deverá determinar, no seu instrumento, qual a Fazenda que
perceberá os valores da exação, apesar de haver legitimidade para ambas
exigirem a satisfação do crédito no que toca sua parte.
62
A solidariedade tributária não implica em benefício de ordem, porque o
fisco não pode se sujeitar às convenções particulares de negócios jurídicos (arts.
123 e 124, parágrafo único, CTN). A obrigação tributária advém de lei e não da
vontade das partes. O argumento não é oponível ao fisco, podendo esse cobrar
integralmente a dívida de qualquer dos devedores solidários. A assertiva decorre
do princípio da inoponibilidade das convenções particulares (art. 123, CTN), como
no caso clássico da cobrança de IPTU em face do locador, em que pese haver
previsão contratual de adimplemento da exação pelo locatário. De fato, a relação
obrigacional tributária nasce da lei, não se perfazendo e se sujeitando às
manifestações volitivas de qualquer um que seja. O art. 123, CTN, só é
excepcionado se houver comando legal em contrário.
Exemplo clássico de solidariedade tributária é a cobrança de IPTU sobre
imóvel cuja propriedade é tida em condomínio. Cada um dos condôminos é
devedor solidário da exação, ou seja, o fisco poderá cobrar de um, de alguns ou
de todos. A integralidade do tributo é devida por todos, independentemente da
cota-parte de cada qual.
Os efeitos da solidariedade podem se dar (art. 125, I a III, CTN):
I.No pagamento – uma vez que um dos devedores solidários realize o
adimplemento, os demais serão aproveitados. Isso significa que a
solidariedade leva em conta a dívida.
II.Nos benefícios fiscais (isenção, remissão e anistia) – se o benefício for
dado em relação à dívida, objetivamente, extingue-se a obrigação
tributária principal, aproveitando todos os devedores solidários. No
entanto, sendo o benefício realizado “intuito personae”, levando em
conta aspectos pessoais do sujeito passivo, somente os devedores
assim abarcados serão alcançados. Nesse segundo caso, o
beneficiário deverá aduzir requerimento ao fisco para obter a isenção,
permanecendo a dívida em relação aos demais. Obviamente, deverá
ser abatida a cota-parte do beneficiário.
III.Na prescrição – será sempre considerada em relação à dívida, sendo
favorável ou desfavorável a todos. Ou seja, sua interrupção ou sua
suspensão também assim se opera, quer seja em favor do fisco ou dos
devedores solidários.
Os arts. 134, VII, e 135, III, CTN, trazem dois casos de responsabilidade
solidária dentro do CTN, os quais merecem detenção mais apurada.
No primeiro, o sócio atua com omissão ou negligência na liquidação de
sociedade de pessoas (incluindo as sociedades de fato), excluindo-se as
sociedades de capitais. Os sócios que assim agem respondem solidariamente
com a sociedade somente se essa não cumprir as obrigações tributárias devidas.
A rigor, o art. 134, VII, CTN, desenha uma responsabilidade subsidiária, na qual
se pressupõe um benefício de ordem. Por fim, a responsabilidade ora enunciada
só abrange as multas moratórias, não aquelas decorrentes de descumprimento
de obrigação acessória (art. 134, parágrafo único, CTN).
63
No segundo, o sócio responde solidariamente como resultado da prática
de atos dolosos, com excesso de poder ou com infração à lei, ao contrato social
ou ao estatuto. Nessa hipótese, não interessa o tipo societário adotado,
porquanto os infratores responderão pessoalmente perante terceiros, excluindo-
se a pessoa jurídica do correspondente. Trata-se de previsão legal de
desconsideração da pessoa jurídica, na linha do art. 50, CC. Os sócios, para
responder nos moldes do art. 135, III, CTN, deverão ter poder de gerência na
empresa. Para que se caracterize infração a normas, segundo o STJ, deve haver
atuação deliberada do sócio-administrador, o que exclui sua responsabilidade
solidária (pessoal) no caso de mero não recolhimento de tributo pela ausência de
caixa para tal. Se o sócio constar da CDA como devedor, o ônus da prova da
exclusão da responsabilidade solidária passa a ser dele, como bem vem
decidindo o STJ. Esse entendimento decorre da presunção relativa de liquidez e
certeza da CDA (art. 204, parágrafo único, CTN). A demonstração pelo sócio
deverá ser feita por meio de embargos à execução.
O art. 78, “caput”, LC 123/06, permite que as MEE’s e EPP’s podem dar
baixa de suas atividades mesmo sem comprovação de prova de quitação de
tributos. Será medida célere, a ser efetivada em até 60 dias (art. 78, § 1º, LC
123/06). Entretanto, a desativação da empresa não obsta futura cobrança de
débito tributário, entendendo-se solidariamente responsáveis os titulares, sócios e
administradores, não sendo necessária dolo, culpa ou má-fé pelo simples não-
recolhimento de tributos (art. 78, § 3º, LC 123/06). O requisito subjetivo só será
exigido quanto à outra irregularidade, diversa do não pagamento da exação.
Observa-se que é uma responsabilidade integral, mesmo que a pessoa já não
mais esteja ligada à empresa na época da baixa. O lapso temporal de referência
é a época do fato gerador.

Responsabilidade Tributária
Responsável tributário é o chamado sujeito passivo indireto da relação
tributária, isto é, aquele que, sem praticar o fato gerador, deverá recolher o
tributo. Nota-se que a obrigação tributária envolvida é a principal, mormente
ligada ao recolhimento de tributo, não envolvendo propriamente sanção
pecuniária nem obrigação acessória. A figura em análise pode ser classificada
como responsável por transferência (sucessão tributária) ou por substituição.
Características gerais – em qualquer das duas categorias, é possível
destacar três traços marcantes:
- Expressa previsão legal – harmoniza-se com inoponibilidade das
convenções particulares ao fisco (art. 123, CTN). Somente a lei em
sentido estrito pode determinar a relação tributária com
responsabilidade (arts. 121, II, “in fine”, e 128, CTN). Em que pese o
codex já trazer previsão da estrita legalidade, a responsabilidade
ganhou ares constitucionais pela pena da EC 3/93, a qual integrou ao
Texto Maior o art. 150, § 7º, CF/88.
- O terceiro responsável, qualificado pela lei como sujeito passivo, deve
necessariamente ter proximidade com o causador do débito pelo qual
64
estará respondendo – deve haver uma vinculação entre responsável
e contribuinte, sendo certo que o liame há de ser econômico. A doutrina
costuma falar de uma “participação indireta” no fato gerador. Essa
característica decorre, sobretudo, da segurança jurídica, para não
permitir que o responsável arque com débito de quem nunca
“conheceu” ou se relacionou.
- O instituto representa, na sua essência, uma garantia pró-credor – a
responsabilidade foi erigida fundamentalmente para favorecer a
Fazenda Pública, quando no exercício do poder de tributar. Visa evitar
o inadimplemento da obrigação tributária e facilitar administrativamente
a arrecadação. Em que pese intensos debates hermenêuticos, o
instituto da responsabilidade colima proteção ao fisco, mesmo porque
se trata de quebra da regra ordinária sobre débito e responsabilidade
tributários. Amaro (2006, p. 304) indica que as razões que determinam
a incidência da responsabilidade tributária pelo legislador vão desde a
conveniência até a necessidade.
Responsabilidade por transferência versus responsabilidade por
substituição – havendo débito e responsabilidade reunidos em uma só pessoa,
por ocorrência de um fato superveniente, a responsabilidade é deslocada
(transferida) para um terceiro. Ex.: na alienação imobiliária (fato superveniente),
havendo débito de IPTU atrasado, a responsabilidade pelo seu pagamento é
transferida do alienante ao adquirente, porquanto esse sucede aquele. Já na
substituição, a obrigação tributária é dividida já na sua nascente, sendo deferido o
débito a um (substituído tributário) e a responsabilidade, a outrem (substituto
tributário). Essa divisão decorre diretamente da lei, não havendo de se cogitar
qualquer fato superveniente a determinar a quebra entre débito e
responsabilidade.
“(...), na substituição, a lei desde logo põe o ‘terceiro’ no
lugar da pessoa que naturalmente seria definível como
contribuinte, ou seja, a obrigação tributária já nasce com seu
pólo passivo ocupado por um substituto legal tributário
(AMARO, 2006, p. 307).

Responsabilidade por substituição – substituição tributária não é


fenômeno exclusivo do IPI e do ICMS, em que pese persistir um ambiente natural
nessas exações. O IR, por exemplo, possui vários exemplos, como é o caso da
retenção na fonte pagadora de percentagem da remuneração do empregado. Na
esteira, quando a casa lotérica vai pagar o prêmio do concurso de prognóstico,
ela já recolhe, no ato, as exações correspondentes, inclusive o IR e a
contribuição social consectária (art. 195, III, CF/88). Esse traço não é exclusivo
dos tributos não vinculados, porque existe em outros, como a CPMF, no caso da
instituição financeira retê-la já na conta do correntista. Da mesma forma, o
empregador da construção civil deve realizar o recolhimento das contribuições
previdenciárias dos seus obreiros.
65
Mas a tributação de consumo e as vendas em cadeia são a coqueluche
da substituição tributária, englobando exatamente os mencionados IPI e ICMS,
sendo que o primeiro só incidirá em produtos industrializados. Para eliminar
custo, trabalho, risco de inadimplemento e ônus à máquina administrativo-
tributária, o Estado criou a responsabilidade por substituição, sem, contudo,
submeter o responsável a qualquer exação a maior, porque esse repassa os
valores recolhidos nos valores de venda do produto ou serviço. Com efeito, a
substituição não onera o substituto e muito menos privilegia o substituído. A
tributação dessa cadeia de consumo transcende a simples facilidade da
tributação, porque seria faticamente impossível fazê-lo de todos os
intermediários. No contexto em tela, o consumidor final arcará com a carga
tributária, constituindo o que a doutrina e a jurisprudência costumam designar
como contribuinte de fato.
Sistemas de não cumulatividade – o regime de tributações individuais
provavelmente levaria a um enriquecimento sem causa por parte da Fazenda
Pública. Para evitar tal ocorrência, utiliza-se a técnica da não cumulação, a qual
pode ser aduzida de duas formas: pela compensação de débito e crédito
(perfilhado pela legislação doméstica) e pelo valor agregado. Nessa última, a
exação, com suas alíquotas, só incide sobre os valores efetivamente agregados
(base de cálculo). Cada intermediário na cadeia pagará o tributo dentro do valor
por ele agregado. Na anterior, utilizada pelo Brasil, o tributo incide sobre o valor
total estabelecido pelo componente da cadeia, fazendo uma compensação em
relação ao valor anteriormente pago, sendo calculado sobre o valor de quem lhe
vendeu.
No esquema da substituição, a Administração Fiscal, tal qual estabelecido
na legislação tributária, escolhe um dos componentes da cadeia de consumo
para fazer o recolhimento integral do tributo. Ora o fisco seleciona o primeiro
componente, ora destaca o último, dependendo da conveniência e da facilidade
em realizar a fiscalização e o recolhimento. No primeiro caso, há uma
antecipação na tributação (substituição para frente, progressiva, por presunção
ou crédito e fato gerador presumidos); no segundo, uma postergação, um
retardamento (substituição para trás, regressiva ou diferimento fiscal)91. Em
ambas, além da alíquota, a base de cálculo do produto ou serviço deve ser
monetariamente estabelecido pelo legislador (pauta fiscal)92, o qual estatui uma
forma de arbitramento – quilo da carne, pacote de cigarro, unidade de automóvel,
91
São exemplos de produtos englobados pela substituição regressiva o leite cru (laticínios), a cana em caule (usina de açúcar e
álcool), a sucata (reciclagem e siderurgia) e animais de abate e corte (açougue). O diferimento tributário, no caso de exação
estadual ou municipal, pode ser estatuída, respectivamente, por norma regional ou local, porquanto não se trata de reserva de
lei complementar ou constitucional, como é o caso da isenção e da imunidade, segundo entende o STF (ADIn 2056/MS, rel.
Min. Gilmar Mendes, DJU 17.8.2007, Informativo do STF nº 469).
92
Ocorrendo desvalorização de modo a depreciar os valores da tabela normativa, já sendo realizada a tributação pelo modelo
de substituição para trás, não há uniformidade quanto ao entendimento. Alguns argumentam que há um ato jurídico perfeito,
não cabendo restituição ao substituído final. O fisco teria dado cumprimento à lei, o que privilegia a segurança jurídica. Não há
também que se invocar a retroatividade da lei mais benéfica, porque não se trata de sanção. É o entendimento prevalente nos
tribunais, inclusive no STJ, apesar de não haver pronunciamento pacífico do STF. É uma tese a favor da Fazenda, aduzida com
base no art. 146, CTN. As cadeias a serem atingidas pela redução da tabela são aquelas não iniciadas, não havendo de se
persistir um direito à restituição dentro dessas. Ao revés, outros advogam que incide um enriquecimento sem causa.
Acontecendo situação contrária, se a pauta previr um aumento do produto ou serviço, o fisco realiza a cobrança da diferença,
da mesma forma caso o substituído final vendesse o produto por um preço maior que o estipulado pela pauta fiscal. No entanto,
haveria pesos diversos para a mesma situação, sendo irrazoável tal posição.
66
etc. Segundo o STF, é possível atualizar a tabela fiscal por ato do Executivo
(decreto), porque a base de cálculo já está estipulada abstratamente pela lei, de
acordo com a LC 87/96 (Lei Kandir). A flexibilização da pauta fiscal se destina
justamente à agilidade na atualização, necessária a exprimir o real valor da
riqueza tributada.
A substituição tributária é um sistema inteligente, por diminuir os riscos ao
credor tributário e por minimizar os custos de fiscalização e de recolhimento.
Além disso, a sonegação fica eficazmente mitigada, mormente no tocante à
modalidade de substituição para frente, porque a receita tributária é antecipada
em relação ao fato gerador ocorrido. Entretanto, esse traço marcante é palco de
discussões doutrinárias acerca da constitucionalidade do instituto.
Regime da substituição progressiva e constitucionalidade – a matéria foi
pacificada pelo STF, mesmo porque, promulgada a EC 3/93, a qual acrescentou
o art. 150, § 7º, CF/88, garantiu-se constitucionalidade ao instituto. A questão se
vincula a antecipação do crédito tributário, antes mesmo da ocorrência do fato
gerador. Aparentemente, os empresários estariam onerados, porque o produto ou
serviço poderia só ser repassado muito tempo depois, mediante outras
condições, levando em conta que o fato gerador nem mesmo poderia ocorrer.
Nesse passo, o Estado estaria se enriquecendo ilicitamente, porque cobrara
tributação sobre algo que nem mesmo se sucedeu. Mais: a substituição para
frente tende a tolher e limitar a livre iniciativa, tutelada pelo arts. 1º, IV, e 170,
“caput”, CF/88, vindo a abalar a atividade econômica do empresário e o equilíbrio
de mercado.
Porém, foram erigidos argumentos relevantes a favor do instituto. Os
produtos englobados pelo regime da substituição presumida sugerem a
impossibilidade concreta de fiscalização e de recolhimento do tributo, tornando a
sonegação francamente presente. O habitat natural desses bens se vincula a
uma tributação impossível. Dessa feita, o Estado estaria abrindo mão de receita,
porque o tributo é seu principal sustentáculo financeiro, da máquina
administrativa e dos serviços públicos. Com efeito, a extinção levaria à
insegurança jurídica na arrecadação, à estimulação ao crime de sonegação, a
gravame financeiro da Administração e à potencial afetação ao Judiciário, o qual
seria inundado de executivos fiscais a maior do que a já exaurida e cambaleante
capacidade de prestação jurisdicional. Nessa ponderação de valores, o STF
optou pela decisão política, sendo posteriormente coadunado pelo legislador da
EC 3/93.
Restituição – a referida emenda, além de constitucionalizar a presunção
do crédito e do fato gerador, garantiu a restituição dos valores recolhidos, caso
não ocorra o fato gerador. Isso não significa a operação em valores a menor na
ponta da cadeia, a qual não legitima a restituição. Na esteira, o direito de
restituição compete ao substituído, porque há um repasse na nota de compra,
vindo a sentir diretamente os efeitos da tributação a maior pela inocorrência do
fato gerador. Vamos ao delineamento dessas considerações.
Por liberalidade, supõe-se que o último elo da cadeia de consumo vende o
bem por valor a menor que a pauta fiscal. No entanto, a exação já foi recolhida
67
sobre o montante cheio, havendo uma diferença em favor do fisco. Nesse
sentido, o (último) substituído pleiteará a restituição do diferencial entre o valor
tributado e o preço da venda efetiva, montante concretamente agregado. O
substituído advoga pela real demonstração de riqueza, fazendo-se argüir: é
cabível a restituição no regime da substituição tributária para frente, quando o
substituído final promove a redução da base de cálculo do imposto por
liberalidade? Se não, por quê? Se sim, a quem compete o direito de restituição?
Ao substituto, que foi quem efetivamente pagou, ou ao substituído? O eventual
direito a ressarcimento recairia sobre que montante? Qual a posição atual do STF
sobre o questionamento93? Formaram-se duas correntes:
- Pela restituição – o direito a pleitear a restituição é do substituído final,
recaindo-se sobre o valor da liberalidade (tributado e não agregado). O
primeiro fundamento se reveste no enriquecimento sem causa da
Fazenda Pública, porque a lei autoriza a tributar a alíquota em cima da
riqueza efetivamente circulada (agregada). Do contrário, não há causa
para arrecadação. O argumento se funda na agregação concreta e não
legislativa. O segundo fulcro liga-se ao confisco, prática vedada pelo
art. 150, IV, CF/88. A tributação de uma riqueza não efetivamente
demonstrada é um confisco. O terceiro fundamento se vale da violação
da efetiva capacidade contributiva. A riqueza apresentada pela
operação mercantil não é aquela que corresponde à presunção erigida
pela tributação, a incidir sobre um montante maior que o apresentado
pela capacidade contributiva do substituído final.
- Pela não restituição – preliminarmente, os postulantes da tese anterior
visam, em realidade, a sonegação fiscal, porque se estaria liberando o
substituído final para praticar qualquer preço na venda na ponta da
cadeia. O acatamento do postulado levaria ao sepultamento da
substituição por presunção, porque o valor inicialmente recolhido pelo
substituto corresponderia, em tese, a um depósito, o qual deveria ser
integralmente devolvido ao final da cadeia, sendo determinado pelo
preço que o substituído final praticasse94. A riqueza efetivamente
circulada é aquela estabelecida na pauta fiscal, mesmo que o
substituído final receba a menor pelo bem. Preço e valor são conceitos
diversos, não devendo o fisco se assentar sobre o efetivamente
praticado. A riqueza revelada corresponde àquela existente, não
dependendo de qual o preço determinado pelo vendedor. Essa riqueza
é direito do administrado na prestação estatal, não podendo o Estado
abrir mão dela. Ao aceitar o preço imposto pelo contribuinte na nota de
venda, a Administração tributária estaria violando o princípio da
tipicidade, porque é a lei que fixa a base de cálculo e a alíquota (art.
146, III, “a”, CF/88). Base de cálculo é valor e não preço. Ex.: a base de

93
Cf. ADIn 1851-AL versus ADIn’s 2675-SP e 2777-SP, sendo certo que, na primeira, a votação no pleno foi de 6 votos a 5
pelo não ressarcimento, entendimento que tende a ser revertido nas seguintes (Informativo do STF nº 418).
94
Os principais setores atingidos pela substituição para frente são: automóveis, bebidas, medicamentos, produtos de limpeza e
fumo. Todos os segmentos possuem grande lobby legislativo, com bastante força política. Dessa feita, há grande pressão para
alteração legislativa e, principalmente, sobre a mudança jurisprudencial.
68
cálculo do ITBI é o valor do imóvel (previsto em tabela estabelecida
em lei), não importando qual o preço estipulado pelos negociantes.
Além disso, quem faz liberalidade deve suportar seus efeitos. O direito
dos terceiros de boa-fé – incluindo o fisco – não pode ser prejudicado em
face da atuação do particular. Não se está tolhendo a autonomia privada
do alienante do bem, mas sim que ela não poderá invadir a seara dos
direitos de outrem – do Estado –, sob pena de abuso de direito.
A aceitação abalaria a segurança jurídica, gerando uma instabilidade
para o Estado quanto ao montante arrecadado na cobrança feita ao
substituto, posto que, em um momento futuro (venda final), se houvesse
um subfaturamento, a Fazenda teria que devolver o montante. Daí, gerar-
se-ia a incerteza: o valor arrecadado pode ser utilizado? Deixaria de ser
receita e passaria a ser entrada provisória (componente do Anexo de
Riscos Fiscais – art. 4º, § 3º, LC 101/00). A otimização da arrecadação,
com os fatores já supra mencionados, estaria prejudicada.
O STF só aceita a restituição na substituição “para frente” quando
efetivamente não há o fato gerador. Quando esse se realiza a valores
menores, não há direito à restituição95. Ocorre que o art. 150, § 7º, CF/88,
utiliza a expressão “caso não se realize o fato presumido”, levando à
crença de que as operações a menor não estariam contempladas pelo
constituinte. Após o posicionamento do Supremo, o STJ seguiu a
orientação96.
Responsabilidade por transferência (sucessão tributária) – possui duas
vertentes: “inter vivos” e “causa mortis”. São os fatos supervenientes que
determinarão a transferência do débito do contribuinte originário (sucedido) a um
terceiro (sucessor). Pode ser visualizada segundo alguns aspectos:
- Multa – argúi-se se a multa acompanha o tributo na sucessão.
Formaram-se duas correntes:
o Não é devida a multa – ninguém pode ser penalizado por conduta que
não praticou. A responsabilidade do infrator é pessoal, não devendo
transcendê-lo (princípio da personalização da sanção).
o É devida a multa – podem ser arrolados dois argumentos: um político e
outro jurídico. Quanto ao primeiro, a execução é do crédito tributário,
sendo esse transferido integralmente ao sucessor, englobando o tributo
e a multa. É a tese pacificamente aceita pelo STJ. A separação da
cobrança implica na existência de duas execuções, as quais
apresentam um custo dobrado ao Estado. Se esse intentar o feito
dessa maneira, principalmente nas multas menores, o custo da
execução geralmente é maior que o próprio valor da sanção. A
procuradoria estatal não pode realizar a cobrança, porque se trataria de
irresponsabilidade fiscal (art. 14, § 3º, II, LRF). Ademais, o Judiciário
95
STF, ADIn 1851/AL.
96
STJ, AgRg no Ag 455.386-SP, DJ 4/8/2003; REsp 469.506-PB, DJ 28/4/2003; REsp 245.694-MG, DJ 11/9/2000; REsp
436.019-SP, DJ 10/3/2003; RMS 13.915-MG, DJ 24/6/2002; REsp 552.123-GO, 2ª T. rel. Min. João Otávio de Noronha,
julgado em 3/5/2007, Informativo do STJ nº 319.
69
estaria ainda mais onerado em sua prestação jurisdicional, já tão
abarrotado pelas demandas ajuizadas. Quanto ao segundo, o direito
penal tributário (atribuição punitiva do delito) não há de ser confundido
com o direito tributário “penal” (atribuição fiscal-administrativa). O
princípio da pessoalidade da pena na pessoa do criminoso é ditame
setorial97, restrito à seara punitiva do delito fiscal, não sendo estendido
à seara administrativo-tributário (poder de arrecadar e de polícia). A
multa é sanção administrativa e não criminal (pena). Persiste uma
infração tributária e não um crime tributário. Esse também tem sido o
entendimento do STF98.
O art. 131, I, CTN, trata da transferência “inter vivos” imobiliária. O art.
131, II e III, trata da transferência “causa mortis”. O art. 132, CTN, trata da
transferência empresarial, por incorporação, por fusão, por cisão ou
mesmo por extinção da empresa, desde que sócio remanescente continue
na atividade empresarial (art. 132, parágrafo único, CTN). Na esteira, o
art. 133, CTN, cuidou da operação de alienação de estabelecimento
comercial (trespasse). Somente o art. 130, “caput”, CTN, refere-se a
“crédito tributário” (tributos mais multas), enquanto os demais dispositivos
mencionam apenas “tributos”. Todavia, a linguagem imprópria do
legislador dá interpretação à incidência da multa somente quanto à
primeira espécie de transferência. À luz exclusivamente do texto frio da lei,
essas seriam as disposições normativas. O STJ poderia optar por uma
interpretação restritiva, aplicando-se somente a sucessão do crédito
tributário nas transferências imobiliárias “inter vivos”. Do contrário, a corte
poderia uniformizar o entendimento, asseverando que o rol do art. 130,
“caput”, CTN, é apenas sugestivo. Optou pela segunda linha.

Pergunta: Luciano Amaro, assentando suas colocações em Rubens


Gomes de Souza, coloca a responsabilidade tributária divida em três espécies:
por transferência, por substituição e por solidariedade. No entanto, essa última foi
estudada em tópico separado, durante as aulas do curso. Em suma, a
solidariedade foi analisada como instituto autônomo em relação à
responsabilidade. O modo de exposição da matéria do professor Amaro não
encontra guarida na doutrina majoritária? Em posição análoga, Eduardo Sabbag
coloca a responsabilidade por transferência dividida em três categorias: por
solidariedade, dos sucessores e de terceiros. Qual classificação mais de acordo
com o posicionamento das bancas de concurso?
Resposta: no momento do concurso é importante você citar estes três
institutos, seja a responsabilidade por transferência por substituição, e a
solidariedade ela pode estar tanto na transferência quanto na substituição. Assim,
a classificação utilizada por alguns doutrinadores configura, na verdade, melhor

97
Luis Roberto Barroso, em seu “Interpretação e Aplicação da Constituição”, divide os princípios em três categorias:
fundamentais, gerais e setoriais. Os primeiros são os basilares do Estado, elementares à sua própria existência. Os segundos
são aplicados a todas as matérias jurídicas, com conotações diversas em cada área específica. Os últimos somente se verificam
em determinados compartimentos jurídicos, com exclusividade, não sendo possível sua extensão a outros.
98
STF, RE 83.613-SP, RTJ 78/965.
70
modo por eles escolhido para exposição da matéria. Entendo mais coerente
como foi exposto na aula pela professora Tathiane estudar a solidariedade em
tópico separado.
Pergunta: o STJ, ao interpretar o art. 130, CTN, preceituou que seu rol de
disposições é simplesmente sugestivo. Nesse raciocínio, entendeu a corte que as
multas, componentes do crédito tributário (na realidade, obrigação tributária),
seriam transferidas ao sucessor também no caso dos arts. 131 e 132, CTN.
Entretanto, em sentido contrário, Luciano Amaro e Eduardo Sabbag afirmam que
a responsabilidade por transferência não se estende a multas, mormente quando
se trata de operações societárias (art. 132, CTN). Qual posição, afinal, é a
prevalente, conquanto os dois últimos autores invocam julgados menos hodiernos
do STF e do STJ respectivamente?
Resposta: infelizmente ou felizmente, dependendo do ponto de vista,
sofremos constantes mutações quanto às posições adotadas pelas Cortes
Superiores. Assim, em concurso público, precisamos adotar a posição mais
recente adequando com o tipo de concurso que você irá prestar, por exemplo,
AGU muitas vezes a posição é diferente da magistratura.
- Transmissão “inter vivos” de imóvel (IPTU) – as dívidas tributárias,
em tese, serão transferidas ao sucessor. Em verdade, a regra é de
obrigação “propter rem”. Entretanto, há exceções ao ditame:
o Aquisição de imóvel em hasta pública – o terceiro adquirente
(arrematante) do imóvel não arcará com os débitos tributários.
Pendendo exação sobre a coisa, antes de ser repassado o valor ao
exeqüente, a Fazenda Pública será intimada para se manifestar,
devendo indicar os valores dos tributos a incidir. Mesmo sendo uma
execução particular, o fisco percebe seus créditos antes do repasse do
numerário ao demandante (art. 130, parágrafo único, CTN). Caso a
autoridade fiscal deixe de acusar a dívida tributária no momento
oportuno, logo posteriormente à hasta, o valor não poderá ser cobrado
posteriormente do arrematante. Deverá recorrer ao antigo executado
para perceber seu crédito. Essa situação se defere à segurança
jurídica, mesmo porque, no momento da hasta, a Fazenda Pública
expediu certidão de dívida, a qual possui fé pública. Atualmente, as
procuradorias municipais têm erigido a tese de responsabilidade
subsidiária do agente público responsável pela omissão na emissão da
certidão. Essa idéia tem por fulcro uma aplicação, por analogia, do art.
134, VI, CTN, dispositivo pelo qual tabeliães e cartorários devem
responder por créditos tributários, a título subsidiário, pelos atos por ou
perante eles praticados.
o Emissão de certidão de débito pela autoridade fiscal – em alienação de
imóvel, o negócio fica perfeito mediante juntada do documento público.
Posteriormente, se a autoridade verifica que houve erro na emissão da
certidão, acusando outros débitos não indicados, o adquirente não
arcará com os débitos fiscais. A Fazenda Pública só poderá cobrar do
alienante, em homenagem à segurança jurídica. Quando, no ato de
71
aquisição do imóvel, o adquirente traz em mãos a certidão de dívida
negativa, não responde pelos débitos tributários. Qualquer ressalva
aposta no documento é cláusula ineficaz, considerada não escrita.
Pergunta: na aquisição de imóvel em hasta pública, o arrematante não
responde por débitos fiscais anteriores (art. 130, parágrafo único, CTN). Antes do
repasse do preço ao exeqüente, a Fazenda Pública se manifesta sobre eventuais
débitos do bem (IPTU). Uma vez que exare certidão negativa, não poderá,
posteriormente, vir a cobrar os valores do adquirente. No entanto, é possível
alcançar o executado e, subsidiariamente, o agente público que produziu o
documento público (analogia ao art. 134, VI, CTN). Nesse caso, seria possível
cobrar o débito também do exeqüente?
Resposta: cuidado, o imóvel posto em hasta pública representa a
garantia do pagamento. Caso haja certidão negativa de dívida, a Administração
Pública responde por tal informação, a não ser em caso de dolo do funcionário
que a expediu, conforme art. 208 do CTN.
- Transmissão de fundo de empresa – está disciplinado no art. 133,
CTN. Na operação de trespasse, havendo passivo fiscal sobre o
estabelecimento, decorrente da própria atividade empresarial, a
responsabilidade do adquirente oscilará, de acordo com a postura
posterior adotada pelo alienante (art. 133, “caput”, CTN). Será integral,
se o alienante não praticar qualquer atividade empresarial dentro em seis
meses do negócio (art. 133, I, CTN); será subsidiária, caso aquele
prossiga no comércio nos próximos seis meses, subseqüentes à
alienação (art. 133, II, CTN) – persiste indício de demonstração de
riqueza no novo elemento de empresa. Essa regra de sucessão tributária
colima a preservação do empresário, fonte de riqueza, de emprego e,
por conseguinte, de arrecadação fiscal, genuína engrenagem da
economia.
No caso da responsabilidade espelhada no art. 133, I, CTN, em que
pese ser integral, não foi esclarecida pelo legislador acerca do seu título.
A doutrina e a jurisprudência ficaram incumbidas de interpretar a
disposição. Surgiram três posições:
• Responsabilidade exclusiva do adquirente – a palavra “integral” quer
dizer “exclusiva”, perfilhando o postulado da sucessão “propter rem”
totalmente. O instituto tem por fim proteger primordialmente o credor
tributário. Não foi a tese vencedora.
• Responsabilidade preferencial do adquirente – o alienante responde
subsidiariamente pelas obrigações tributárias, caso o adquirente não
tenha capacidade de arcar com elas. Também não foi prevalente.
• Responsabilidade solidária com o alienante – é a tese majoritária,
perfilhada pelo STJ, por Machado (1993) e por Paul Erik. O postulado
se fundamenta no art. 124, I, CTN, porque a solidariedade não pode
ser presumida. Segundo asseveram os defensores dessa corrente, há
sim interesse comum entre alienante e adquirente em arcar com os
72
débitos tributários, considerando o negócio do trespasse. Com efeito,
a fórmula aberta do dispositivo legal favorece bastante a arrecadação,
porque a autoridade pode escolher qual o sujeito passivo em melhores
condições para arcar com os débitos fiscais.
Havendo falência ou recuperação judicial, as disposições seguem
comandos específicos. A Lei 11101/05 (nova Lei de Falências – LF)
provocou alguns reflexos na área tributária. Para adaptar o CTN à nova
realidade, foi promulgada a LC 118/05, a qual acresceu três parágrafos ao
art. 133 da codificação. Pela regra, há extinção da sucessão tributária ao
adquirente (art. 133, § 1º, CTN), caso esse não esteja ligado, de alguma
forma, ao alienante. O legislador optou por facilitar o trespasse nas
delicadas situações mencionadas, com o fito de favorecer o adquirente
que resolve celebrar o negócio. O legislador considerou mais importante a
preservação da empresa do que a satisfação dos credores, dada a função
sócio-econômica daquela. Do contrário, caso o adquirente não seja
pessoa estranha ao alienante, enquadrando-se naquelas do art. 133, § 2º,
CTN, impera normalmente a regra “propter rem” – persiste a sucessão
tributária nos termos do art. 133, I e II, CTN. O montante resultante da
alienação judicial do estabelecimento ou da empresa ficará depositado em
conta do juízo falimentar por um ano, só podendo ser levantado para
pagamento de credores extraconcursais ou daqueles precedentes aos
tributários (art. 133, § 3º, CTN).
- INSS – Sociedades Limitadas e Sócios – Solidariedade – a grande
maioria dos empresários domésticos são constituídos na forma de
sociedades limitadas, portanto constituindo elemento essencial à
mecânica macro-econômica. Não incorrendo nos caso anômalos de
desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, o eventual
adimplemento tributário, notadamente de contribuições sociais, não pode
levar à exigência do crédito sobre o patrimônio dos sócios. Dessarte, a
Lei 8620/93, no seu art. 13, “caput”, estabeleceu responsabilidade
ilimitada entre sócios e sociedade nas dívidas para com a seguridade
social, ausentando-se qualquer benefício de ordem (art. 124, parágrafo
único, CTN). Em verdade, o diploma criou uma situação esdrúxula de
solidariedade tributária, facilitando muito o ofício da PGFN (Lei
11457/06). Inicialmente, na década de 90, no REsp-AgRg 410.080, o
STJ se pronunciou sobre a matéria, afirmando que cabia a solidariedade
por maioria de votos. A decisão se fundou na existência de expressa
previsão legal, com fulcro no art. 124, II, CTN. Contudo, o voto vencido
do Ministro José Delgado fundou uma mudança jurisprudencial efetivada
em 200599, com base em três argumentos:
o O CC/02 revogou o art. 13, Lei 8620/93 – as disposições do CC/02, o
qual disciplinou as sociedades limitadas, são incompatíveis com o
diploma anterior. A revogação foi implícita, porque a estrutura desses
empresários não se harmoniza com o dispositivo em tela (art. 1052,

99
STJ, REsp 717.717-SP, AgRg no Ag 728.250-RS e REsp 638.755.
73
CC). Contudo, este fundamento não condiz com o Direito
Intertemporal, porquanto a Lei 8620/93 é especial, enquanto o CC,
geral.
o A matéria é de disciplina exclusiva de LC – haveria um vício formal no
art. 13, Lei 8620/93. Esta justificativa também não é própria, porque a
LC deve estabelecer normas gerais e não específicas, como bem
ventila o art. 146, III, CF/88. O que não pode o legislador ordinário é
extrapolar os limites do constituinte e do seu comparsa complementar.
Dessa feita, o CTN atende ao comando constitucional, bem como,
nesse passo, o próprio art. 13, “caput”, Lei 8620/93. Em nenhum
momento, o constituinte exigiu LC para determinar solidariedade. Pelo
contrário, o art. 124, II, CTN, autoriza o legislador ordinário a
estabelecer responsabilidade solidária. O próprio STJ tem postura
cristalizada no sentido de possibilidade de execução fiscal em face de
sócio que conste em CDA, invertendo-se o ônus da prova. Segundo a
corte, a certidão goza de presunção relativa de liquidez e certeza (art.
3º, “caput”, LEF). Por tal argumento, a tese da inconstitucionalidade
formal do art. 13, “caput”, Lei 8620/93, fica sufragada, uma vez que o
sócio conste da CDA.
o Violação do princípio da livre iniciativa – além desse gravame direto,
por via reflexa, toda a estrutura econômica positivada (arts. 1º, IV, e
170, “caput”, CF/88) fica prejudicada. O equilíbrio macro-econômico
fica comprometido com o tolhimento do sistema capitalista instalado,
mandamento construído pela Lei Maior. A constituição de sociedade
limitada, com seus benefícios legais, fica reprimida, lesionando por
demais a grande mola propulsora da circulação de riqueza. Este é o
argumento mais robusto para afastar a aplicação do art. 13, Lei
8620/93.
Há ADIn em trâmite no STF para contestar a constitucionalidade do art.
13, “caput”, Lei 8620/93, apesar de não haver qualquer decisão tomada.
Nesse caso, o comando continua válido, vigente e eficaz, porquanto goza
da presunção de constitucionalidade.
- Administrador – caso pratique atos em contrário à lei ou com excesso
de poder, haverá responsabilidade decorrente. É a teoria “ultra vires”,
também perfilhada pelo art. 135, III, CTN. Trata-se de responsabilidade
pessoal do sócio, excluindo-se a pessoa jurídica do pólo passivo. A
jurisprudência, principalmente pela pena do Ministro do STJ Garcia
Vieira, admitia a execução direta do patrimônio administrador pela mera
mora tributária. Não se tratava de desconsideração da personalidade
jurídica, mas sim responsabilização principal na pessoa do
administrador. Essa tendência, aduzida nos anos de 1992 e de 1993, foi
mudada hodiernamente100. A referência que se faz à infringência da lei,
contida no art. 135, “caput”, CTN, não abarcaria o simples atraso no
pagamento dos tributos. O STJ entende que a mora pode ser

100
STJ, REsp 441.898-DF e REsp 839.684-SE.
74
caracterizada por descumprimento de obrigações tributárias acessórias
ou por ocorrência de delito tributário, não por corriqueiro inadimplemento
de tributo. Esse pode decorrer de situações de mercado, de elementos
sazonais ou de circunstâncias que tornem a atividade
momentaneamente difícil, não dando azo à execução pessoal do
administrador. Ademais, a responsabilidade aqui mencionada deve ser
subjetiva, devendo ser caracterizada o dolo ou culpa do agente. São os
casos, por exemplo, de dissolução irregular de sociedade ou
descumprimento de obrigações acessórias. Contudo, não pode ser
confundida com a responsabilidade objetiva da empresa no mero
inadimplemento do tributo ou também no descumprimento de obrigações
acessórias.
- Denúncia espontânea – a maioria dos tributos depende de uma
atuação antecipada do contribuinte no adimplemento. Dessa forma, a
sonegação, mediante a efetiva ocorrência do fato gerador, é recorrente.
Para tentar corrigir, incidem multas pesadas sobre o ilícito, quer seja na
seara administrativa ou criminal. Mas a Fazenda Pública se preocupa
com o recebimento do tributo, sendo a multa somente instrumento de
coerção sobre o ânimo do sujeito passivo. Na tentativa de extrair a
ocorrência do fato gerador e evitar a decadência tributária, foi criado
instituto da denúncia espontânea, pela qual ficam excluídas as sanções
pecuniárias. Visa primordialmente favorecer o Estado, mesmo porque o
sujeito passivo deve se apresentar à autoridade fiscal antes desse
chamá-lo. Nessa seara, é necessário levantar quatro questionamentos:
o Tecnicamente, até que momento se considera efetivamente
espontânea a confissão feita pelo sujeito passivo para fins de se aplicar
o benefício do art. 138, CTN? Inicialmente, advogava-se a possibilidade
de aplicação da denúncia espontânea até a citação válida. Esse
entendimento não condiz com o espírito do instituto, porque, nesse
momento, o fisco já estaria cobrando. Uma segunda tese estabelecia
como marco o início de qualquer procedimento administrativo de
fiscalização tributária. Restringindo um pouco mais, a tese prevalente
preconiza o lançamento como fator a elidir a denúncia espontânea, tal
qual a disposição do art. 138, parágrafo único, CTN. Essa última
posição só cabe nos tributos sujeitos a lançamento por homologação,
com antecipação do pagamento. Nesse sentido, a apresentação
posterior da declaração de tributos já caracteriza o ato de lançamento,
o qual pode ensejar diretamente a inscrição em dívida ativa. Essa
prática objetiva evitar que o contribuinte declare e não pague e, quando
for percebido nessa prática, invoque a denúncia espontânea para
afastar multa sancionatória. É o entendimento esposado pelo STJ101.
o Havendo denúncia espontânea, para que se conceda o benefício
previsto no art. 138, “caput”, CTN, a confissão deve ser
necessariamente acompanhada de pagamento ou cabe tal vantagem

101
STJ, Ag Rg no EDcl do REsp 826.133-PR; EREsp 690.628-PR; AgRg no AgRg no AgRg do REsp 611.681.
75
quando a denúncia é seguida a simples parcelamento? Somente o
pagamento dá azo à denúncia espontânea, porquanto o parcelamento
incluirá a multa sancionatória. Deveria caber no parcelamento, com o
objetivo de atrair contribuintes para saldar sua dívida, em que pese não
ser a tese vencedora. A benesse da exclusão da multa não deve ser
estendida àquele que parcela, porquanto o contribuinte em atraso não
é inocente. O parcelamento, como vantagem, não pode ser cumulado
com o afastamento da sanção, segundo a jurisprudência do STJ. Essa
posição foi corroborada pela LC 104/2001, diploma que integrou o
parcelamento como espécie de suspensão do crédito tributário (art.
151, VI, CTN). Nesse sentido, o legislador seguiu a interpretação
jurisprudencial anteriormente dada, tal qual o art. 155-A, § 1º, CTN.
o Havendo denúncia espontânea acompanhada de pagamento, a
exclusão da penalidade tem que alcance? Atinge a multa moratória, a
sancionatória ou ambas? E quanto aos juros? O art. 138, “caput”, CTN,
não distingue qual a natureza da multa, o que deu abertura à exclusão
de todas as sanções. Foi a tese prevalente durante muito tempo na
jurisprudência. No entanto, o entendimento foi alterado. As
procuradorias fazendárias passaram a defender o não-cabimento da
exclusão da multa sancionatória, porque o Estado não pode fomentar,
indiretamente, o inadimplemento tributário. A Administração Tributária
deve combater a frustração ao poder de polícia fiscal. Dessa feita,
somente a multa moratória deverá ser afastada pela denúncia
espontânea, na leitura realizada pelo STJ102. Na mesma esteira, os
juros são mantidos “ex vi” da própria redação do art. 138, “caput”, CTN.
o Qual a diferença entre denúncia espontânea e anistia, se em ambos os
institutos ocorre dispensa de penalidade? A denúncia espontânea é ato
de confissão de dívida, aduzido pelo devedor. Do contrário, a anistia é
ato efetivado pelo credor, pelo qual perdoa uma receita, pressupondo
lei específica para tal. A primeira independe de qualquer norma, sendo
certo que o ato administrativo de exclusão do crédito é vinculado. De
acordo com a jurisprudência supra mencionada, a denúncia
espontânea só afasta a multa moratória, enquanto o legislador, na
anistia, pode afastar qualquer espécie de penalidade, de acordo com
sua conveniência e oportunidade.

Lançamento
Está disciplinado nos arts. 142 a 150, CTN.
O art. 142, “caput”, CTN, conceitua lançamento. Nesse sentido, a natureza
jurídica do instituto gera divergência: é ato ou procedimento? É declaratório ou
constitutivo? Ato é uma conduta isolada, enquanto procedimento, um conjunto
interativo de atos entrelaçados por uma seqüência lógica, com o fim de atingir um
objetivo maior e derradeiro. “Data venia”, lançamento é um procedimento (na
102
STJ, REsp 831.278-PR, DJU 30/6/2006; 1ª Seç., EREsp 760.290-PR, rel. originário Min. Castro Meira, rel. para acórdão
Min. Denise Arruda, j. 13/6/2007, Informativo do STJ n° 323.
76
visão do legislador), porque engloba vários atos em cadeia: identificação do
sujeito passivo, caracterização do fato gerador, determinação da matéria a ser
tributada, cálculo do montante a ser pago, incluindo eventual penalidade,
terminando com a notificação do contribuinte. Essa posição não é unânime na
doutrina, pois alguns entendem que o lançamento é um ato único, materializado
pela notificação. Todos os demais são prévios e preparatórios para tal. Quanto à
segunda pergunta, foram erigidas três correntes:
o Lançamento é constitutivo do crédito e declaratório da obrigação
tributária – lançamento é o procedimento pelo qual se cria crédito
tributário (Rubens Gomes de Souza). Com base na doutrina
estruturalista alemã, o citado mestre defendeu essa posição clássica.
Não é o entendimento mais aceito hodiernamente.
o Lançamento é declaratório da obrigação e do crédito tributário – o
lançamento constitui a exigibilidade do crédito tributário, criado esse por
força da lei. Esse entendimento contesta a posição clássica supra
exposta, muito pela existência de três argumentos:
• Incidindo a lei a qualificar o fato gerador, já existe relação jurídica
obrigacional tributária e, conseguintemente, o crédito já está
caracterizado – não pode haver obrigação sem credor. No entanto,
pode ser que a exigibilidade do montante só seja possível mediante
determinado procedimento, chamado lançamento. Dessa feita, o
crédito nasce a partir da previsão abstrata da lei e não do procedimento
administrativo.
• Ao se considerar o lançamento como constitutivo do crédito (art. 142,
“caput”, CTN), haveria incompatibilidade com a previsão de extinção do
crédito tributário “ex vi” da decadência (art. 156, V, CTN), porquanto
essa é a perda do direito de lançar. Na teoria em tela, não há consenso
entre as duas disposições – como é possível extinguir algo que ainda
não foi criado? Alargando um pouco mais o raciocínio, o art. 156, V,
CTN, ao prever que a prescrição extingue o crédito tributário, errou. O
que é extinta é a pretensão, não o crédito. O credor não terá mais o
direito de exigir em juízo o crédito, mas o devedor continua no direito
de pagar, ainda que por meio de ação de consignação. Na esteira,
analogamente, a decadência também não extingue o crédito, mas sim
o direito potestativo de lançar – o crédito continua persistindo, não
sendo possível mais sua exigência pela via reflexa, porque o
lançamento é pressuposto para tal.
• Como terceiro fundamento, o pagamento do tributo no prazo e forma
previstos não enseja qualquer procedimento administrativo. Não houve
lançamento, em que pese ter havido extinção do crédito tributário.
Dessa feita, não é possível que o lançamento crie o crédito. No
diapasão, a mora pressupõe crédito, isto é, sem esse aquela inexiste.
o Lançamento é declaratório da obrigação e do crédito tributário, sendo
constitutivo da exigibilidade do crédito somente em alguns casos – essas
hipóteses se restringem aos tributos lançados de ofício, porque o fato
77
gerador está às vistas da autoridade fiscal. Nos demais casos, a
simples ocorrência do fato gerador já possibilita a exigência do crédito
tributário, uma vez que não haja pagamento por parte do sujeito passivo.
Ademais, o lançamento constitui dever-poder da Administração, sob pena
de falta funcional da autoridade atribuída (art. 142, parágrafo único, CTN).
Pergunta: o professor Pedro Barreto, em comentários feitos em aula,
desconstruiu a teoria clássica da constituição do crédito tributário pelo
lançamento, tese essa erigida sob a pena de Rubens Gomes de Souza e
perfilhada com impropriedades pelo CTN. Na esteira de Ricardo Lobo Torres e
outros, o professor trouxe à baila o postulado da natureza declaratória do
lançamento, aplicável ao crédito e à obrigação. Nesse passo, o mestre afirmou
que o crédito tributário, assim como sua correspondente obrigação, nasce a partir
da qualificação jurídica do fato gerador, aduzida pela lei. Contudo, no raciocínio
de Paulo de Barros Carvalho, o momento do nascimento da obrigação – e, por
conseguinte, do crédito tributário – não seria a efetiva ocorrência do fato gerador,
desde que anteriormente previsto na norma?
Resposta: sim, os autores refletem sobre o assunto e apontam seus
peculiares entendimentos pautados em premissas científicas diferentes, daí a
razão de serem, também, opiniões diferentes.
Modalidades de lançamento – para identificá-las, é necessário levar em
conta dois critérios:
o Necessidade ou não da participação do sujeito passivo declarando o
fato gerador;
o Necessidade ou não de pagamento pelo sujeito passivo antes da
cobrança (pagamento antecipado) – deve ser aferido quem deve
interpretar a legislação para apurar o momento devido: o sujeito
passivo ou a autoridade tributária.
Os critérios serão verificados à luz do tipo do fato gerador, de sua
natureza. Ex.: no ICMS, o fisco não tem como saber qual o montante a ser pago,
devendo ser aduzido pelo contribuinte; no IPTU, o fisco sabe de antemão o valor,
cobrando diretamente do contribuinte.
O legislador previu três diferentes espécies:
o De ofício ou direto – o sujeito passivo não precisa declarar a ocorrência
do fato gerador. A autoridade administrativa interpreta a legislação e
cobra ou retifica lançamento ou declaração anteriormente aduzidos (art.
148 e 149, I a IX, CTN). Não há dever de pagamento antecipado pelo
sujeito passivo. Ex.: IPTU, autos de infração, taxas, contribuições de
melhoria, etc.
o Por declaração, misto ou híbrido – o fisco não conhece o fato gerador,
devendo o sujeito passivo declarar sua ocorrência. Após tal ato, a
autoridade administrativa interpreta a legislação e determina o
montante a ser adimplido, cobrando. Após a cobrança, o sujeito
passivo paga. Ex.: ITBI, ITR, II e IE. O lançamento por declaração está
78
previsto no art. 147, “caput”, CTN. O sujeito passivo deve ofertar
declaração na qual há informações essenciais ao lançamento. Com
base nesse documento, a Administração tributária realiza o ato,
fazendo nascer a exigibilidade da obrigação principal (pagamento do
tributo).
o Por homologação ou autolançamento – essa modalidade contraria a
criação do crédito pela ocorrência do fato gerador juridicamente
qualificado. O legislador criou-a para levar a cabo a idéia de
constituição do crédito mediante lançamento. Trata-se de ficção
jurídica. Corresponde à maioria das exações. Ex.: ICMS, IPI, IR, etc. O
sujeito passivo precisa declarar o fato gerador, interpretando a
legislação, calculando o montante devido e pagando antes de ser
cobrado (pagamento antecipado). Posteriormente, o fisco homologa o
valor recolhido (art. 150, “caput”, CTN), constituindo a quitação como
meio de prova. Havendo diferença entre o devido e o pago, haverá
lançamento de ofício posterior. Em verdade, os tributos aqui incluídos
não são passíveis de qualquer lançamento originário – o lançamento
“ex officio” só será posterior, a cobrar eventual diferença.
Não existe decadência do lançamento por homologação, mas todo tributo
pode ser alvo de decadência, inclusive os lançados por homologação. O que
caduca é o direito potestativo ao lançamento de ofício, havendo qualquer
diferença de valores entre o declarado e o devido.

Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário


Introdução e modalidades – a suspensão de exigibilidade do crédito
tributário está regulada por seis artigos do CTN (arts. 151 a 155-A, CTN).
Lançado o crédito tributário, por qualquer uma de suas formas, ele passa
a ser exigível. Contudo, é amplamente possível a instalação do contraditório para
contestar o procedimento de obtenção dos valores, não sendo sempre obrigatório
o pagamento “incontinenti” do tributo. Dessa forma, o sujeito passivo pode
levantar questões prejudiciais à exigibilidade do crédito. Nessa seara, o legislador
erigiu duas idéias mestras dentro da suspensão da exigibilidade:
- Tutela do contraditório – é um direito garantido constitucionalmente (art.
5º, LV, CF/88), seguindo o princípio do devido processo legal e
convertendo o procedimento em verdadeiro processo de discussão.
Permite a ampla defesa dentro do feito, sendo certo que ninguém poderá
ser executado enquanto discute o objeto do litígio. O CTN listou quatro
modalidades de suspensão da exigibilidade do crédito tributário dentro
dessa categoria:
o Recurso administrativo (art. 151, III, CTN), dentro de um PAF, o qual
é regido pela Lei 9784/99 (Lei do Processo Administrativo Federal) no
âmbito federal, com as devidas peculiaridades do D. 70235/72;
o Mandado de segurança com liminar (arts. 5º, XXXV e LXIX, CF/88, e
151, IV, CTN), quando se invoca direito líquido e certo a ser
79
demonstrado por prova pré-constituída, devendo ser revelado
relevante fundamento e ineficácia da medida na manutenção do ato
impugnado (art. 7º, II, Lei 1533/51);
o Ação judicial com liminar ou tutela antecipada (arts. 5º, XXXV,
CF/88, e 151, V, CTN)103, desde que presentes a verossimilhança das
alegações e o “periculum in mora” (art. 273, “caput” e I, CPC);
o Depósito do montante integral (art. 151, II, CTN), a qual retira do
credor o interesse de agir para execução em face do devedor, não se
confundindo com consignação em pagamento (CHIMENTI, 2002, p.
207). Com efeito, enquanto na consignação fica patente a intenção do
devedor em pagar, no depósito integral, é caracterizada a finalidade de
obstar a exigibilidade do crédito tributário, mormente com o intuito de
discutir a dívida. O depósito em tela é exigível nas ações declaratórias
de inexistência de débito (anteriores ao ato de lançamento) e
anulatórias de lançamento (obviamente posteriores a esse). Caso
alguma dessas demandas seja extinta sem resolução do mérito, o fisco
faz jus à conversão do depósito em renda, porquanto a exigibilidade do
crédito tributário só fica dissolvida mediante a incidência de alguma
causa de extinção ou de suspensão, como já disse o STJ104.
- Negociação da forma de pagamento – o devedor concorda com o valor
lançado e exigido, mas não tem condição de pagar o tributo à vista.
Nesse caso, em tese, deveria haver inscrição em dívida ativa, dando azo
à execução forçada. No entanto, o legislador percebeu que seria melhor
abrir uma fase intermediária. A negociação entre sujeito passivo e credor
permite o pagamento em situação mais razoável, visto que está presente
o “animus solvendi”. Com efeito, o escopo em tela se dá em homenagem
à economicidade, à razoabilidade e à eficiência. É o caso, por exemplo,
da postergação da mora com consentimento do Estado, instituto
denominado moratória (art. 151, I, CTN). É melhor à Administração
tributária perceber o valor depois de um prazo determinado que nunca
receber. A moratória pressupõe crédito lançado ou em vias de
lançamento, salvo disposição legal em contrário (art. 154, “caput”, CTN).
Do mesmo modo, o parcelamento (art. 151, VI, CTN), em verdade, é
uma espécie do gênero moratória, em que há fracionamento da dívida
tributária ao longo do tempo. Alguns autores equiparam o instituto a uma
novação objetiva, instituto constante do Direito Privado (art. 360, I, CC).

103
O legislador não previu expressamente a ação anulatória de débito fiscal ou de lançamento no art. 151, V, CTN. É a
situação mais comum, mas não a única. Previamente à cobrança do débito fiscal, o sujeito passivo pode ingressar com ação
declaratória preventiva de inexistência de débito, tida antes do lançamento. Dessa forma, ao contrário da primeira, não objetiva
desconstituir o crédito tributário. Mas o ajuizamento “per se” de declaratória não obsta o direito de lançar. Para impedir seus
efeitos, o devedor tem dois caminhos: aduzir pedido subsidiário de tutela antecipada incidentalmente para suspender a
exigibilidade do crédito, caso haja lançamento durante o curso do processo; ou requerer, também a título de tutela antecipada
na inicial, a suspensão do crédito tributário, se houver eventual lançamento. Apesar de qualquer das referidas medidas ter o
condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário, procedimento fiscal já instaurado não ficará obstado caso já tenha
sido disparado, em que pese ficar impedido de ser iniciado se ainda não o foi (art. 62, “caput” e parágrafo único, D. 70235/72).
104
EREsp 479.725-BA, DJU 26/9/2005; REsp 490.641-PR, DJU 3/11/2003; REsp 258.752-SP, DJU 25/2/2002; REsp
251.350-SP, DJU 12/3/2001; 1ª Seç., EREsp 215.589-RJ, rel. Min. José Delgado, j. 12/9/2007, Informativo do STJ n° 331.
80
Efeitos da suspensão – suspensa a exigibilidade, pendem alguns
efeitos:
- Impedimento da ação de execução fiscal – processualmente falando,
equivaleria a “embargos à execução preventivos”, considerando que
esses tenham o condão de obstar a demanda fiscal105.
- Impedimento de inscrição em dívida ativa – o recurso administrativo
tempestivamente interposto implica em inexistência de mora. No entanto,
a discussão judicial implica em mora, argüindo a possibilidade ou não de
inscrição em dívida ativa. Foram erigidas duas teses, sem unanimidade
na doutrina e na jurisprudência:
o Não é possível – porque a extração de CDA se presta à ação executiva
fiscal, a qual está obstada pela suspensão de exigibilidade do crédito
tributário. O procedimento de ativação da dívida é uma conclusão
interna da Administração tributária, que apurou a legalidade do fato,
verificou o inadimplemento do devedor e declarou que pende dívida
para com o Estado. Essa atividade é inútil em face da impossibilidade
de promover a ação correspondente.
o É possível – porque a extração de CDA e a inclusão em cadastro de
inadimplente (CADIN)106 não têm o único condão de promover a
execução. Ao requerer documento de situação, o devedor terá como
resposta certidão positiva de débito fiscal com efeito negativo. Não
haverá qualquer restrição ou constrangimento quanto ao exercício de
direitos. Ex.: pode participar de licitação ou prestar concurso público.
Contudo, deverá ser dada publicidade a interessados de que o sujeito
passivo é entendido como devedor pela Administração. Por exemplo,
no caso de alienação de imóvel, o adquirente deverá conhecer a
situação fiscal do alienante, conquanto, se a demanda for infrutífera, o
fisco poderá exigir tributos relativos ao bem futuramente (art. 130,
“caput”, CTN).
- Suspensão ou impedimento do curso da prescrição à pretensão
executória – a prescrição decorre de inércia por parte do credor
tributário, o que, na realidade, não ocorreu. A prescrição em comento só
começa a correr após o prazo para interposição do recurso
administrativo. Antes, ela não incide. Por conseqüência, antes do
decurso, impede-se a prescrição; depois, suspende-se a prescrição.
A prescrição é um instituto que pressupõe lesão a um direito subjetivo do
credor, fazendo surgir a pretensão concreta de exigir a prestação devida.
105
Não é demais lembrar que há doutrinadores a defender a não suspensão da execução fiscal em face do mero oferecimento e
recebimento dos embargos do executado. Essa leitura advém de uma interpretação analógica dos arts. 736, “caput”, e 739-A,
CPC, aplicáveis à execução fiscal (art. 1º, “in fine”, LEF). Por todos, protestam, além de Luiz Wambier, Luiz Guilherme
Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, Curso de Processo Civil: Execução, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, v. 2.
106
O Cadastro Informativo (CADIN) dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais pelos órgãos da Administração
Pública Federal para a concessão de incentivos fiscais e financeiros, a realização de operações de crédito e a celebração de
convênios, acordos, ajustes ou contratos que envolvessem a utilização de recursos públicos foi instituído pela MP 1442/96, a
qual contou com sucessivas reedições. Foi legislado sob a forma da Lei 10522/02, ficando peremptoriamente na ordem jurídica
posta. O CADIN teve alguns de seus efeitos contestados quanto à constitucionalidade (ADI 1454-DF, rel. Min. Ellen Gracie,
Informativo do STF n° 472), mas o Supremo extinguiu o feito sem resolução do mérito, conquanto o autor não promoveu o
aditamento da exordial na conversão da citada MP em texto de lei.
81
O momento hábil a iniciar o lapso prescricional é exatamente a
existência da lesão. Em melhores termos, nos 30 dias para o recurso
administrativo, inexiste infringência ao direito subjetivo do credor
tributário, não sendo exigível o crédito nesse período. Dessa feita, se a
exigibilidade não está presente, não corre a prescrição, isto é, a
interposição de recurso administrativo impede a incidência dessa nesse
momento, não a suspende.
Recurso administrativo – o prazo para a interposição de recurso
administrativo é o mesmo do pagamento (art. 160, “caput”, CTN), segundo
disposição unânime do legislador em todos os níveis estatais (União, Estados, DF
e Municípios). Vencido o lapso para impugnação ou para pagamento sem
atuação do devedor tributário nesse sentido, tem vez a mora (“ex re”), reputando-
se como definitivamente constituído o crédito, segundo a linguagem própria
do CTN. Preclui o direito a recurso administrativo, caracterizando-se sua
intempestividade desde então.
A via administrativa é mais vantajosa que a impugnação judicial,
segundo alguns fundamentos:
- Prescindibilidade de advogado – o contribuinte poderá defender-se sem
pagar honorário;
- Inexistência de custas processuais – o contencioso administrativo é
gratuito, ao menos na primeira instância administrativa107;
- Maior celeridade – em relação ao processo judicial;
- Desnecessidade de demonstrar fundamentos para liminar ou tutela
antecipada – a mera interposição do recurso já obsta a exigibilidade,
sem necessidade de qualquer demonstração extraordinária;
- Maior probabilidade de sucesso – havendo maior especialização técnica
do órgão administrativo julgador e verdadeiro bom direito alegado, a
chance de provimento é muito maior.
Tais argumentos só serão válidos se os órgãos administrativo-fiscais de
apreciação atuarem de acordo com os princípios da Administração, mormente
previstos no art. 37, “caput”, CF/88, o que, por vezes, não ocorre.
A resposta negativa administrativa não é condição de procedibilidade
para o ajuizamento de ação judicial, segundo pronunciamento pacífico do STF.
Entretanto, essa máxima deve ser vista “cum grano salis”. O fundamento
apriorístico seria a inafastabilidade do Judiciário (art. 5º, XXXV, CF/88), direito
individual e cláusula pétrea. Antes de tudo, não existe direito absoluto, pelo qual
qualquer um deles pode ser relativizado. Se houvesse previsão de esgotamento
da via administrativa antes do juízo, não se estaria negando acesso à jurisdição,
mas sim o condicionando. Acesso à jurisdição não implica necessariamente em
acesso ao Judiciário. Por exemplo, a arbitragem, de certa feita, detém jurisdição,

107
O STF já declarou inconstitucional a necessidade de depósito recursal na via administrativa, leitura referendada pelo STJ
(STF, AC 1.566-MG, DJ 27/4/2007; STJ, 1ª T., REsp 943.116-SP, rel. Min. José Delgado, j. 19/6/2007, Informativo do STJ n°
324). A exigência do depósito viola a ampla defesa (art. 5º, LV, CF/88), além do que a garantia do direito de petição (art. 5º,
LXXIV, “a”, CF/88) não exige o pagamento de taxas.
82
em que pese o órgão arbitral não ser componente do Poder da Justiça. Em
verdade, regra “de lege ferenda” nesse sentido teria o condão exatamente de
prestigiar o Judiciário e não de restringir sua atuação. A Justiça não consegue
conferir uma prestação adequada ao jurisdicionado, porque a celeridade não é
seguida (art. 5º, LXXVIII, CF/88). Dessa feita, caso houvesse insucesso na seara
administrativa, a máquina jurisdicional ainda poderia ser acionada
subsidiariamente, não causando prejuízo ao administrado.
Posição mais radical apregoa a impossibilidade do art. 5º, XXXV, CF/88,
em matéria fiscal, porque a tecnicidade da decisão administrativa é muito mais
precisa e adequada que aquela a ser proferida pela revisão jurisdicional.
Ademais, todos os princípios processuais já foram seguidos no PAF, não
assistindo razão para recorrer à via judicial. Nessa vertente, a Administração
deveria investir nos órgãos administrativos julgadores fiscais, para que esses
ganhem confiabilidade e, por conseguinte, legitimidade.
A decisão administrativa positiva imodificável em favor do contribuinte,
dentro de um PAF, teria o condão de obstar o ajuizamento de ação pelo fisco? O
STF já pacificou a jurisprudência dizendo que faz coisa julgada material. A
Fazenda Pública não pode pleitear sua revisão jurisdicional, porque, ao revés,
não haveria razão de existência do próprio procedimento administrativo. Para a
doutrina processualista, careceria a ação do fisco por inexistir interesse de agir.
Se houver vício no PAF, cabe anulação por parte da própria Administração pelo
seu poder de autotutela (Súmulas 346 e 473 do STF)108, o que não se liga ao
mérito da questão.
Assunto que se encontrava em pauta no STF é a constitucionalidade do
depósito para recurso voluntário em segunda instância administrativa. Até poucas
décadas atrás, tal impugnação só era possível mediante depósito do montante
integral, disposição essa rechaçada pela jurisprudência por entendê-la, na
realidade, como antecipação de penhora. Essa condicionante de procedibilidade
não pode ser refutada com base no duplo grau de jurisdição. A garantia não
provém de disposição constitucional, mas sim legal. Não há litígio jurisdicional
instalado, mas tão-somente discussão perante a autoridade tributária. Porém, o
legislador do CTN conferiu o duplo grau para o sujeito passivo, não obstante
poder determinar condicionantes para tal. Mas o depósito de todo montante fere a
razoabilidade e a proporcionalidade. Segundo o STF, tal quantitativo financeiro
pode obstar o acesso ao recurso voluntário administrativo, inviabilizando a
continuidade do PAF. Dentro dessa idéia, a jurisprudência tem entendido que um
valor razoável seria de 30% sobre o total do débito. Os advogados dos
contribuintes passaram a postular que essa proporção é relativa, uma vez que
pode haver valores em jogo muito altos. Dessa feita, o Excelso Pretório, em
recente decisão, considerou o depósito recursal como inconstitucional, posição

108
Súmulas 346 do STF: “A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”. Súmula 473 do STF: “A
administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam
direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos
os casos, a apreciação judicial”.
83
109
corroborada pelo STJ . Na esteira, eles também começaram a questionar o
arrolamentos de bens a final, em eventual execução futura, caso em que a
penhora poderia incidir sobre bens indicados pelo devedor110. Dentro desse
contexto, o art. 33, § 2º, D. 70235/72, que regula o processo administrativo fiscal,
alterado pela Lei 10522/02, permitiu a indicação de bens para a subida do
recurso administrativo para segunda instância. “In verbis”:
Art. 33. (...).
§ 2º. Em qualquer caso, o recurso voluntário somente terá
seguimento se o recorrente arrolar bens e direitos de valor
equivalente a 30% (trinta por cento) da exigência fiscal definida
na decisão, limitado o arrolamento, sem prejuízo do
seguimento do recurso, ao total do ativo permanente se
pessoa jurídica ou ao patrimônio se pessoa física.
(...).
Esse dispositivo não se aplica os débitos previdenciários, segundo
entendimento estipulado pelo STJ, porque as leis previdenciárias são especiais
em relação às disposições genéricas do D. 70235/72. Devido à recente mudança
de composição do STF, o percentual de 30% foi novamente contestado, tendo
sido declarado como inconstitucional111. Segundo a corrente, o depósito recursal
impede o prosseguimento do PAF, infringindo o contraditório, a ampla defesa e a
garantia ao devido processo legal, frustrando o direito à revisão do processo
administrativo na primeira instância. Foi exatamente o que decidiu recentemente
o Excelso Pretório em sede de controle difuso de constitucionalidade112.
Depósito do montante integral – geralmente se atrela a uma ação de
depósito combinada com ação anulatória de débito fiscal. Doutrinariamente, a
natureza jurídica é híbrida, porquanto representa uma garantia em favor do
cidadão e do credor simultaneamente. É vantajoso para o devedor porque
inibe ação de execução e livra o contribuinte dos encargos moratórios. Em
contrapartida, para a Administração Tributária, há certeza de que, sendo
improcedente o feito, o montante será apto a tornar a solvência do devedor
perfeita, eliminando o custo da execução judicial e da eventual hasta pública.
É entendido como montante integral corresponde ao total cobrado pela
Fazenda, sob pena do depósito não ser idôneo à suspensão de exigibilidade. Isso
significa que o depósito a menor, valor entendido pelo contribuinte, não obsta a
execução, tendo o ato efeito de consignação em pagamento. A presunção se

109
STF, RE 311.023-3/RJ, DJU 26/10/2001; ADIn 1.976-7-DF, DJU 5/6/2007; AC 1.566-MG, DJU 27/4/2007. STJ, 1ª T.,
REsp 943.116-SP, rel. Min. José Delgado, j. 19/6/2007, Informativo do STJ n° 324; AgRg no RMS 14.030-RJ, DJU 9/9/2002;
2ª T., AgRg no Ag 829.932-SP, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
110
Nos termos do art. 64, “caput”, Lei 9432/97, a autoridade fiscal poderá realizar descrição minuciosa de todo o patrimônio
do devedor, quando o crédito tributário for superior a 30% do seu total, com piso de R$ 500.000,00 (art. 64, § 7º, Lei 9432/97).
Nesse caso, o arrolado não poderá alienar, transferir ou gravar seus bens sem prévio conhecimento da autoridade fiscal (art. 64,
§ 3º, Lei 9432/97). A infringência dessa norma pode ensejar a medida cautelar fiscal (art. 64, § 4º, Lei 9432/97), prevista nas
hipóteses do art. 2º, I a IX, Lei 8.937/92.
111
STF, ADIn 1976/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, Informativo do STF nº 461, no qual o relator afirmou que a substituição
do depósito por arrolamento de bens não descaracteriza o gravame intransponível para o contribuinte-recorrente, na medida em
que ambas as medidas importam em bloqueio de patrimônio.
112
STF, RE 388.359, rel. Min. Marco Aurélio, j. 9.4.2007.
84
encontra em favor do credor, já que pende ato administrativo vinculado do
agente público. O ônus da prova se defere ao contribuinte. Na consignação,
como lembra Chimenti (2002, p. 207), a subordinação, imposta pelo fisco, no
sentido de condicionar o pagamento de um tributo ao recebimento de outro, é
lícita, porquanto se trata de autêntica imputação (art. 163, II, CTN).
A Súmula 112 do STJ113 preceitua que o depósito deve ser em dinheiro,
não cabendo indicação de bens. Como já fora mencionado, a suspensão da
exigibilidade do crédito tem autêntica natureza de “embargos antecipados”. Nos
embargos à execução, é possível indicar bens à penhora ou constituir fiança
bancária (art. 9º, II a IV, LEF). Conseguintemente, seria possível outra espécie de
garantia da referida suspensão. É nesse sentido que a doutrina critica o
entendimento do STJ, por haver um contra-senso para com o sistema de
execução fiscal positivado.
O levantamento do depósito antes do trânsito em julgado da ação judicial
não é permitido ao depositante, pois passa a ser “res in judicia”. A titularidade do
bem não pertence mais ao autor da demanda, ficando sob a guarda da Justiça
até a decisão final. Em contrário, estaria sendo frustrada totalmente a “ratio
essendi” do instituto previsto no art. 151, II, CTN, esvaziando-o. Dessa forma, o
depósito de montante integral deve ser a última saída para o contribuinte. A priori,
por uma questão de lógica, o fisco também não poderia fazer o levantamento
antecipado do depósito. Destarte, a Lei 9703/98 veio a autorizar que a União
utilize o dinheiro, a ser administrado pela CEF através da Conta Única do
Tesouro Nacional. Uma vez que o autor da demanda seja vencedor, o juiz
expede o alvará de levantamento para que, em 24 horas, a CEF pague o
primeiro. O legislador acolheu a presunção de legitimidade da exigibilidade do
crédito tributário lançado. Ademais, visou à manutenção do Estado com o
numerário em depósito, sob pena de impossibilidade da realização do bem
comum pela Administração, afetando sobremaneira a governabilidade. Esse
óbice ao exercício da atividade estatal é chamado pela doutrina de “periculum in
mora” inverso (Ricardo Lobo Torres). Sob os auspícios do Direito Financeiro, o
levantamento antecipado do depósito integral constitui autêntica entrada
temporária, não consubstanciando receita em sentido estrito. No plano
orçamentário, a verba será incluída no Anexo de Riscos Fiscais, adendo
componente da LDO (art. 4º, § 3º, LC 101/00). O conceito de “periculum in mora”
inverso já foi usado pelo STF em outra situação. Em sede de controle difuso de
constitucionalidade, por meio de ação cautelar, empresa do setor tabagista
pleiteava a declaração de inconstitucionalidade do art. 2º, II, DL 1593/77, com
redação dada pela Lei 9822/99, comando que permite à SRFB cancelar
autorização de funcionamento de pessoa jurídica do ramo que esteja em débito
com o fisco federal. A demandante teve seu pleito indeferido cautelarmente,
porquanto o Supremo reconheceu que sua produção viola o direito à saúde de
plano. Dessa feita, por meio do poder geral de cautela (art. 798, “caput”, CPC), o
plenário da corte manteve a medida executiva da SRFB, reconhecendo
expressamente hipótese de “periculum in mora” invertido114. Consoante o voto do

113
Súmula 112 do STJ: “O depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro”.
114
STF, AC 1657 MC/RJ, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, rel. p/ o acórdão Min. Cezar Peluso, j. 27.6.2007, Informativo do STF n° 473.
85
relator para o acórdão, Ministro Cezar Peluso, a carga tributária do IPI, com a
maior alíquota existente, constitui autêntica intervenção estatal por indução, com
vista a desencorajar o empresário do segmento. Ocorre que o tabagismo é
problema gravíssimo de saúde pública, constituindo o recolhimento inexato da
exação como fator de desequilíbrio da concorrência e do mercado. Ademais, o
eminente julgador salientou que o ato administrativo, previsto no comando
impugnado, reveste-se de razoabilidade, constituinte atuação acertada da
autoridade fiscal, muito pela situação ímpar apresentada. Em sendo assim, não
se aplicam as Súmulas 70, 323 e 547 do STF115 “in casu”. Na esteira, a
apreensão de mercadorias desacompanhadas de documentação fiscal pertinente
não é medida desarrazoada e que infringe a liberdade profissional (art. 5º, XIII,
CF/88) e a vedação à circulação por meio de tributos (art. 150, V, CF/88)116.
Parcelamento – só passou a existir no CTN a partir da LC 104/01. Antes
do diploma, havia posição que defendia a impossibilidade de suspensão do
crédito em face de parcelamento concedido por lei ordinária, com fulcro na
inexistência de previsão expressa no rol do então art. 151, I a IV, CTN. Em
realidade, emprestando o raciocínio do Direito Privado, o parcelamento é um
autêntico contrato administrativo com novação objetiva, valendo o “pacta sunt
servanda”, em que não cabe execução no curso do parcelamento adimplido. Mais
ainda, pois ele é espécie do gênero moratória, expressamente prevista no art.
151, I, CTN. A LC 104/01 veio justamente para acabar com a controvérsia ao
acrescer o inciso VI no art. 151, CTN. O parcelamento deve ser vislumbrado no
que tange o direito tributário, penal e empresarial.
Aspectos tributários – há óbice ao curso prescricional e impedimento da
execução fiscal, como efeitos naturais da suspensão da exigibilidade do crédito
tributário. Contudo, é sabido que a denúncia espontânea só é possível, para a
exclusão de multas moratórias, se acompanhada de pagamento, não cabendo no
caso de parcelamento. Nesse sentido, o art. 155-A, § 1º, CTN, prevê que o
parcelamento virá acompanhado de multas (sancionatórias) e de juros de mora,
salvo se o legislador ordinário previr de modo diverso. A MP 1699-41/98 permitia
o parcelamento de qualquer débito com a Fazenda Pública em até 30 parcelas
mensais, cabendo à autoridade tributária decidir pela sua concessão ou não de
acordo com sua discricionariedade. O diploma estava sendo impugnado por meio
da ADIn 1922/DF, a qual alegava que o parcelamento é um direito subjetivo do
contribuinte, desde que preenchidos os requisitos legais. Com a conversão do
comando no art. 10, “caput”, Lei 10522/02, o STF julgou prejudicada a demanda
por ausência de aditamento por parte do autor (Conselho Federal da OAB).
Aspectos penais – discute-se sobre a suspensão da pretensão punitiva
nos crimes contra a ordem tributária, em face de parcelamento firmado entre
contribuinte e fisco. O art. 34, Lei 9249/95, dispõe que o pagamento, realizado
antes do recebimento da denúncia, extingue a pretensão punitiva estatal em
crimes fiscais. O art. 83, parágrafo único, Lei 9430/96, repetiu tal tipo permissivo,
115
Súmula 70 do STF: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo”.
Súmula 323 do STF: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos”. Súmula
547 do STF: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas
alfândegas e exerça suas atividades profissionais”.
116
STF, ADIn 395, rel. Min. Cármen Lúcia, DJU 17.8.2007, Informativo do STF n° 467.
86
mas também silenciou quanto ao parcelamento. Para preencher a lacuna, parte
da jurisprudência entendia que o parcelamento antes do recebimento da
denúncia suspendia a pretensão punitiva, permanecendo assim durante o
adimplemento das obrigações de trato sucessivo. Destarte, outra vertente
jurisprudencial refutava tal entendimento, por inexistência de previsão legal
expressa. Para pacificar a controvérsia, o art. 15, “caput”, Lei 9964/00 (Lei do
REFIS 1) veio a ratificar expressamente a suspensão da pretensão punitiva pelo
parcelamento.
A Lei 9983/00 criou os tipos penais previdenciários no CP. Sendo
sonegação tributária não previdenciária, recorre-se ao art. 1º, Lei 8137/90; sendo
previdenciária, aplica-se a disposição do art. 337-A, CP. Ambas possuem penas
iguais (reclusão de 2 a 5 anos). A apropriação indébita tributária genérica está
tipificada no art. 2º, II, Lei 8137/90, enquanto a previdenciária, no art. 168-A, CP.
Naquela, as penas são bem menos severas (detenção de 6 meses a 2 anos), ao
passo que nessa, a reprimenda é maior (reclusão de 2 a 5 anos), porque
inviabiliza o custeio da Previdência Social e todas suas prestações sociais
essenciais. Havendo crime previdenciário, o parcelamento, para suspender a
pretensão punitiva, deveria ser iniciado antes do procedimento de fiscalização
(arts. 337-A, § 1º, e 168-A, § 2º, CP). Em melhores termos, é necessário que o
infrator realize denúncia espontânea (art. 138, “caput”, CTN) para ter sua
responsabilidade penal suspensa. Contudo, a Lei 10684/03 (Lei do Parcelamento
Especial – PAES – ou do REFIS 2), em seu art. 9º, dispôs que o pagamento
extingue a punibilidade e o parcelamento suspende a pretensão punitiva,
incluindo tanto os tipos previdenciários quanto os fiscais genéricos. No diapasão,
como o legislador não exigiu termo final para pagamento ou parcelamento (início
da fiscalização ou recebimento da denúncia), a qualquer tempo, o réu ou mesmo
condenado pode pleitear a extinção ou a suspensão da punibilidade. Como a lei
penal mais benéfica retroage, aplica-se aos processos em curso e aos eventuais
condenados117. Ressalta-se, porém, que a falsificação de documento público (art.
297, “caput”, CP) pode ficar absorvida pelo tipo do art. 2º, I, Lei 8137/90, qual o
seja de prestar declaração falsa para eximir-se de pagamento do tributo, desde
que haja, no caso concreto, exaurimento da potencialidade lesiva da conduta
dentro da teleologia do recolhimento fiscal. Caso haja possibilidade de
desdobramento mais complexo, o delito de falso fica caracterizado, não havendo
de se falar em princípio da consunção, segundo preceitua o Supremo118.
Uma vez que haja impugnação administrativa do auto de infração
lavrado pela fiscalização tributária, o MP não pode prosseguir em ação penal
tributária, caso o delito seja material. Inicialmente, o STF afirmou que a decisão
administrativa negativa é condição objetiva de procedibilidade119. Posteriormente,
retificando a terminologia adotada, o Excelso Pretório estabeleceu que o
exaurimento da via administrativa é prejudicial em relação à justa causa para
ação penal120. Dessa feita, por aplicação analógica do art. 116, I, CP, o STF
preceitua que há suspensão da pretensão punitiva. Contudo, se há delito formal,
117
STF, HC 85048-RS.
118
STF, 2ª T., HC 91542/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, j. 18.9.2007, Informativo do STF n° 480.
119
STF, HC 81611, rel. Min. Sepúlveda Pertence.
120
STF, HC 84345-PR.
87
não cabe óbice ao prosseguimento do processo criminal, inclusive oferecimento
de denúncia. O MP vinha apregoando a promoção da ação penal sempre,
independentemente da natureza formal ou material do crime fiscal, porque estava
correndo o prazo prescricional da pretensão punitiva. Essa idéia contraria a
presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF/88), porque a simples condição de réu
em processo crime leva a várias restrições jurídicas. Por fim, importante lembrar
que não é permitido à Administração Tributária remeter ao Ministério Público
representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária
praticados por particulares, definidos nos arts. 1º e 2º, Lei 8137/90, antes de
proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do
crédito tributário correspondente (Arts. 1º, I, e 2º, I, D. 2730/98).
Perguntas: todo recurso administrativo que impugna o lançamento tem
efeito suspensivo (art. 151, III, CTN)? Em caso positivo, a previsão do art. 151,
IV, CTN, não ficaria condicionada ao exaurimento da via administrativa, em face
do art. 5º, I, Lei 1533/51?
Respostas: a previsão do art. 151, III, CTN, estabelece o recurso
administrativo e, portanto, não caberá, para essa hipótese, o MS.
Perguntas: estava verificando a posição de Luciano Amaro e parece que
o autor, ao interpretar o art. 162, § 2º, CTN, preceitua que o ajuizamento de ação
de consignação em pagamento teria o condão de suspender a exigibilidade do
crédito tributário. Ao que parece, o citado mestre afirma que esse feito opera
“ipsu jure”, independentemente de tutela antecipada ou de medida liminar. É um
entendimento minoritário ou relevante na jurisprudência, visto que não foi extraída
qualquer idéia semelhante na doutrina?
Respostas: cuidado! A consignação em pagamento é hipótese de
extinção do crédito tributário (art. 156, VIII do CTN). O autor, em momento algum,
em sua obra, afirma ser hipótese de suspensão. A doutrina de Luciano Amaro é
muito respeitada no meio tributário.
Perguntas: com referência ao art. 151, V, CTN, o professor Pedro
Barreto, em sala de aula, elencou duas formas de aduzir a suspensão da
exigibilidade do crédito (ou da obrigação) tributária, ambas mediante tutela
antecipada: ação anulatória de débito fiscal ou de lançamento (após o
lançamento) e ação declaratória de inexistência de débito (antes do lançamento).
Além dessas vias, seria possível demandar por meio de cautelar inominada com
pedido liminar?
Respostas: sim, Sempre que houver fundado receio de grave lesão a
direito subjetivo, o contribuinte poderá intentar uma medida cautelar inominada ou
atípica, com base nos arts. 798 a 803 do CPC.
Aspectos empresariais – a Lei 11101/05 estabelece as regras sobre
falência e recuperação judicial. Contudo, diplomas específicos dos Estados ou
Municípios podem estatuir condições muito onerosas às empresas em
recuperação no tocante à tributação. Para corrigir e inibir tal prática, o legislador
complementar resolveu incluir o art. 155-A, juntamente com seus parágrafos,
CTN, para tornar mais elásticos os prazos de parcelamento quanto aos tributos.
Em um primeiro plano, o art. 155-A, § 4º, CTN, previu que os decursos de
88
parcelamento a serem concedidos por E, DF e M, mediante lei específica,
devem ser maiores ou iguais que aqueles previstos em lei federal. Em que pese a
boa intenção do legislador, parece que o dispositivo fere a autonomia federativa,
constituindo caso de parcelamento heterônomo. Existe ADIn no STF contestando
o dispositivo em tela. Mais ainda: o art. 155-A, § 4º, “in fine”, CTN, colocou a
expressão “lei federal específica” – mas como essa não existe, o legislador quis
dizer “lei geral”, isto é, houve impropriedade lógica.

Prescrição e Decadência
Introdução e conceituação – antes de tudo, é cediço dizer que
prescrição e decadência não extinguem o crédito tributário, errando o legislador
na redação do art. 156, V, CTN. Aquela termina com a pretensão de direito,
enquanto essa, com o direito potestativo de lançar. Houve clara confusão de
institutos e impropriedade técnica por parte do CTN. A decadência é tratada
genericamente nos arts. 156, V, 173 e 150, § 4º, CTN; a prescrição contra a
Fazenda está especificada nos arts. 174, CTN, e 40, LEF; a prescrição que corre
contra o contribuinte, nos arts. 168 e 169, CTN.
Tanto prescrição quanto decadência revelam perda de algo, da
titularidade, em face de inércia, em que o direito utiliza o tempo como instrumento
letal de algum instituto. A distinção entre eles reside exatamente no ponto a que
se reveste o objeto da extinção.
O Direito Civil é o que melhor informa a diferenciação entre prescrição e
decadência. Perfilhando Agnelo Amorim Filho121, com base em Pontes de
Miranda, o CC/02 diferenciou os institutos em comento segundo critérios
científicos. O primeiro deles advém da natureza jurídica do direito a que se refere:
a prescrição se refere a “facultas agendi”, entendidos como direitos subjetivos
“stricto sensu”; a decadência se refere a “normas agendi”, entendidos como
direitos potestativos.
Nesse passo, o negócio jurídico, principalmente os contratos, revelam
direitos subjetivos, sendo a maior parte desses de caráter bilateral. A doutrina os
reputa como direitos frágeis, sujeitos à lesão. A satisfação de uma das partes
depende fundamentalmente da vontade da outra.
No outro pólo, estão os direitos potestativos, em que não se depende de
qualquer outro para sua satisfação. É um direito robusto, que não comporta
lesão, porque altera a situação jurídica independentemente da atuação de
outrem. A esse, só cabe sujeição. Os direitos potestativos lesivos, os quais
podem causar grande comoção sócio-jurídica, são só resolúveis no tempo,
estabelecendo o legislador uma limitação temporal. Ao revés, aqueles que não
muito incomodam não estão sujeitos a tal baliza de interregno. Os limites ao qual
se referiu a lei são chamados de prazo decadencial.
Os titulares de ambos ficam sujeitos à sua extinção pela não exigência ou
não exercício ao longo de determinado lapso temporal, levando exatamente à
prescrição e à decadência respectivamente. Dessa feita, as ações condenatórias
121
RT’s 300/7 e 744/725.
89
dizem respeito a direitos subjetivos, sujeitos à prescrição das correspondentes
pretensões; as ações constitutivas – positivas ou negativas – estão ligadas a
direitos potestativos, sujeitos à decadência; as ações meramente declaratórias,
por comportarem direitos potestativos não lesivos, não se sujeitam ao decurso do
tempo, sendo imprescritíveis.
Em verdade, a prescrição e a decadência são institutos que prezam pela
segurança jurídica, os quais buscam a pacificação das relações sociais. Não há
de ser razoável que qualquer pessoa seja “escravizada” para todo o sempre em
detrimento de certa relação jurídica. Por conseqüência, o Estado há de perdoá-la
em decorrência da inação do titular de um direito, quer seja ele subjetivo ou
potestativo.
Trazendo de volta o raciocínio ao Direito Tributário, é possível dizer que o
direito (poder) do fisco realizar o lançamento é potestativo. O CTN estabelece
que o decurso decadencial para tal é de cinco anos (art. 173, “caput”, CTN). A
partir do lançamento, cria-se a exigibilidade do crédito – para o CTN, “cria-se o
crédito” –, devendo o sujeito passivo pagar o tributo ou interpor recurso
administrativo. Adotando o prazo geral do CTN, essas ações devem ser
implementadas em trinta dias. Durante tal interregno, não corre prazo de
prescrição, porque não persiste lesão ao direito subjetivo do sujeito ativo. De
outra sorte, esse último também não está inerte, porque não pode promover a
ação competente para cobrança. Depois do decurso, o inadimplemento do
devedor configura lesão ao direito do credor, surgindo pretensão desse ao
exercício em juízo. A partir daí, começa a correr o prazo prescricional da
demanda executória, o qual também é de cinco anos (art. 174, “caput”, CTN).
Decadência – três temas mais controversos delineiam o instituto e
suprem as querelas mais significativas:
• Qual é o termo “a quo” da decadência nos tributos lançados de ofício;
• Como se conta a decadência nos tributos sujeitos a “lançamento por
homologação”;
• O que é a interrupção da decadência tributária.
Termo “a quo” da decadência nos tributos lançados de ofício –
tecnicamente, a decadência só é tratada, no CTN, em um só dispositivo: o art.
173. Os incisos do dispositivo estabelecem os termos iniciais da contagem da
decadência:
I. 1º dia do exercício seguinte ao que já se podia lançar – de acordo com a
natureza do direito potestativo, o termo “a quo” do prazo decadencial é
sempre quando aquele surge, quando é adquirido. No entanto, o
legislador posterga essa baliza, para permitir que o fisco tenha uma
garantia maior na satisfação de seus débitos futuramente. Dessa
forma, no primeiro ano civil em que se podia lançar, o decurso
decadencial fica “suspenso”, começando a correr somente no primeiro
dia do ano seguinte. Por imperativo lógico, a decadência SEMPRE
ocorre em um 1º de janeiro.
90
II.Do dia em que foi anulado o lançamento por vício formal – essa
disposição não encontra maiores desdobramentos no momento,
passando a ser delineada no item sobre interrupção da decadência.
Decadência nos tributos sujeitos a “lançamento por homologação” – nessa
espécie de exação, cabe ao sujeito passivo interpretar a lei, calcular o montante e
recolher antecipadamente, não devendo, a priori, o fisco lançar. Nesse âmbito, o
contribuinte pode:
• Pagar a mais – há extinção do crédito tributário, ocorrendo confirmação
pela homologação expressa ou tácita. Nesse sentido, quitação é meio
de prova e não o pagamento em si. O que extingue o crédito tributário é
o pagamento, não a homologação. Não subsiste qualquer direito
potestativo do fisco em realizar lançamento, não se falando em
decadência.
• Pagar exatamente o que deve – da mesma forma, há extinção do crédito
tributado, persistindo os mesmos desdobramentos e conseqüências do
anterior.
• Pagar a menos – o crédito tributário é bem divisível. O credor tem
parcial crédito para com o devedor, descontando-se o valor já
recolhido. Quanto a esse, persiste pagamento parcial, e, por
conseqüência, extinção parcial do crédito tributário. Nesse montante, a
confirmação ocorre pela homologação expressa ou tácita. No tocante à
diferença, nasce o direito potestativo do fisco realizar o lançamento
complementar de ofício, ficando sujeito à decadência, desde que a
declaração do contribuinte também tenha sido errônea. De outra parte,
o STJ considera o termo “a quo” para o lançamento por homologação o
oferecimento da declaração correta feita pelo sujeito passivo, quando
esse paga a menor. Nesse caso, a corte entende que o crédito está
constituído e o tributo lançado, já podendo a Fazenda Pública inscrevê-
lo em dívida ativa e executá-lo a qualquer momento, desde que antes
do decurso prescricional.
• Não pagar – seguindo o mesmo raciocínio anterior, não há qualquer
extinção do crédito tributário nem homologação expressa ou tácita. O
direito potestativo de realizar o lançamento do montante integral nasce,
passando a se sujeitar à decadência. Dessa feita, não existe
decadência da homologação, mas sim do direito de realizar o
lançamento do tributo sujeito à homologação.
Não existe decadência do lançamento por homologação, mas todo tributo
pode ser alvo de decadência, inclusive os lançados por homologação. O que
caduca é o direito potestativo ao lançamento de ofício, havendo qualquer
diferença de valores entre o declarado e o devido. O lançamento de ofício é o
único sujeito à decadência.
A contagem do prazo da decadência é feita de acordo com três teses:
• Corrente restritiva – leva em conta tão-só o art. 173, I, CTN, único
dispositivo idôneo a prever a contagem da decadência. Não se perquiri
91
se o lançamento está sujeito à homologação, é realizado de forma
híbrida ou de ofício, mesmo porque só esse último está sujeito à
decadência. Tomando por base as considerações supra sobre o termo
“a quo”, contam-se cinco anos para se operar a decadência (art. 173,
“caput”, CTN). Nota-se que o tempo previsto pelo legislador se refere
tanto para o lançamento em si (art. 173, “caput”, CTN) quanto para
homologação tácita (art. 150, § 4º, CTN), correndo os decursos
simultaneamente.
• Tese 5 mais 5 anos – por razões administrativas, o fisco não consegue,
no prazo decadencial de cinco anos, promover o lançamento de ofício
dos débitos fiscais, principalmente daquelas exações sujeitas à
antecipação do pagamento (tributos sujeitos a lançamento por
homologação). Com o crescimento da população, a gama de fatos
geradores, quantitativa e qualitativamente, foram por demais
majorados, não seguindo o necessário crescimento da estrutura de
fiscalização. Para mitigar a sonegação, foi erigido o postulado em
relevo, mesmo porque o legislador não permitiu alteração no CTN para
um prazo decadencial de dez anos. Dessa feita, a construção
jurisprudencial em comento (STJ) teve por fim exatamente possibilitar
maiores poderes à fiscalização tributária. Por interpretação sistemática
do próprio CTN, foi deferida a extensão do decurso. Com efeito, o
tempo de cinco anos, a partir do fato gerador, para realizar a
homologação tácita (art. 150, § 4º, CTN) não corre concomitantemente
com o interregno decadencial de cinco anos para o lançamento (art.
173, “caput”, CTN). A homologação tácita e o lançamento de ofício
seriam atos distintos, correndo primeiramente o lapso para
homologação e posteriormente, para o lançamento (decadencial).
Conseguintemente, a tese não alterou o prazo decadencial, mas
postergou o termo inicial de sua contagem. Para Amaro (2006), o art.
150, § 4º, CTN, traz uma exceção à regra espelhada pelo art. 173, I,
CTN. No diapasão:
Afronta o princípio da não-contraditoriedade das
normas jurídicas aplicar a uma mesma hipótese a regra e a
exceção, em conjunto. Isso representa uma impossibilidade
lógica e jurídica, qual seja, a de o prazo para o lançamento
começar a correr quando já não seja mais lícito lançar
(AMARO, 2006, p. 413).
• Tese da LC 118/05 – os advogados dos contribuintes passaram a
postular a aplicação do mesmo raciocínio para permitir repetição de
indébito, na contrapartida da decadência. Pior: os causídicos passaram
a requerer compensação e não restituição por precatórios. Dessa
forma, o custo jurídico para a Fazenda Pública passou a ser muito alto
e, em face de uma questão política de isonomia, o STJ passou a
aceitar esse entendimento. O art. 3º, LC 118/05 veio a fulminar a “Tese
do 5 mais 5 anos”, não permitindo tal interpretação pró-contribuinte. Os
92
advogados postularam o mesmo tratamento quanto ao fisco, o qual
foi plenamente acolhido pelo STJ.
O STJ desdobrou sua nova leitura em duas instâncias122: havendo
pagamento a menor, aplica-se o art. 150, § 4º, CTN; não havendo
qualquer pagamento, aplica-se o art. 173, I, CTN. O segundo é bem
evidente, porque o art. 150, § 4º, CTN, prevê que haja algum pagamento,
o qual inexiste. Dessa feita, o inadimplemento completo leva à primeira
corrente supra exposta (“corrente restritiva”). Para o inadimplemento
parcial, com pagamento de parte do montante devido, o STJ preceitua que
a contagem da decadência será concomitante à homologação tácita.
Porém, sua Primeira Seção de Direito Público se equivocou, porque está
considerando o termo inicial do interregno decadencial o fato gerador e
não a data devida para o pagamento. Dessa forma, o lapso de decadência
está diminuído, em clara afronta à previsão legislativa.
Interrupção de decadência – em regra, a decadência não fica sujeita a
causa de impedimento, de interrupção ou de suspensão (art. 207, CC).
Entretanto, a decadência legal pode ser afetada por tais institutos, desde que o
legislador expressamente preveja123. A priori, o ato de lançamento implica em
afastamento da decadência. Contudo, eventual recurso administrativo ou ação
judicial pode contestar o lançamento por vício formal – cálculo errôneo do tributo,
por exemplo –, porquanto peticiona pela sua revisão. Sendo procedente o
procedimento, o ato é definitivamente anulado, devolvendo-se integralmente o
prazo decadencial para a Fazenda Pública realizar novo lançamento (art. 173, II,
CTN). A doutrina tratou esse fato como causa de interrupção de decadência.
Pergunta: de acordo com atual orientação jurisprudencial do STJ, nos
tributos sujeitos à homologação, a contagem do prazo decadencial se faz de
acordo com a espécie de inadimplemento por parte do contribuinte. Com efeito,
tratando-se de inexistência de qualquer pagamento, o decurso para exercício do
direito de lançar é contado nos termos do art. 173, “caput” e I, CTN; caso haja
pagamento parcial, a contagem se faz nos moldes do art. 150, § 4º, CTN. Quanto
à primeira hipótese, parece fácil compreender devido ao critério da exclusão:
impossível utilizar a forma do art. 150, § 4º, CTN, porque essa pressupõe a
existência de algum pagamento. No entanto, a segunda situação parece carecer
de fulcro mais sólido, mesmo porque o STJ propicia um interregno decadencial
menor que o previsto pelo legislador complementar para se operar a decadência.
O termo inicial, ao invés de ser no primeiro dia do ano seguinte àquele em que se
passou a poder lançar (art. 173, I, CTN), é fixado na ocorrência do fato gerador.
Por acaso, o STJ não teria se fundado no art. 3º, LC 118/05, para construir o
raciocínio da segunda hipótese?
Resposta: cuidado, seu raciocínio parte de premissa errada. Há certa
confusão entre os institutos da prescrição e decadência. De acordo com o CTN e
122
ED no REsp 101.407/SP (98.88733-4), DJU 8.5.2000; REsp 276.142/SP (2000/0090249-7), DJU 17.2.2003; REsp
289.181/MG (2000, 0123113-8), DJU 30.6.2003.
123
A doutrina aponta duas possibilidades de decadência interrompida: o art. 26, CDC, e o art. 173, II, CTN. O entendimento de
que o primeiro comando se refere à interrupção decadencial é minoritário nos meandros jurídicos, cuja corrente prevalente
assente a existência de autêntica suspensão do interregno de decadência. No entanto, quanto ao segundo dispositivo, não paira
dúvida sobre sua verdadeira função interruptiva do decurso.
93
a atual orientação jurisprudencial do STJ, a contagem decadencial se faz de
acordo com o tipo de lançamento e, portanto, de acordo com a participação do
Agente Fiscal em face do ato de lançar. Só poderemos falar em prazo
decadencial (findo) se não houver presença (via presencial ou por meio de
notificação) do Agente no exercício de formalização do lançamento que lhe cabe.
1) Com efeito, tratando-se de lançamento direto ou de ofício, havendo
inexistência de qualquer pagamento (supõe-se que o lançamento já ocorreu), o
prazo a ser observado será o prescricional, já que a Administração Pública
Tributária fez o que deveria e o contribuinte não pagou. A partir daí só caberá
Execução Fiscal, regulado pelo art. 174 do CTN.
2) Caso haja pagamento parcial, a Administração Pública Tributária, no
exercício de fiscalização, irá lançar “de ofício” o valor faltante e autuar quanto às
penalidades pelo descumprimento da obrigação. (Lembre-se que o contribuinte
deveria ter “pago antecipadamente” e cumprido obrigações acessórias). Caso
não tenha feito corretamente, o Fisco, no momento de “homologar”, não poderá
fazê-lo, já que incompleta esta fase. Deverá então lançar e autuar, caso seja
necessário. Surgirá então, ao final deste ato, mais uma vez, o direito de cobrar e
portanto submetido ao prazo prescricional do art. 174 do CTN.
No que diz respeito ao texto do artigo 3º da LC 118/05, cuidado, pois ele é
afeto ao teor do art. 168 do CTN, ou seja, direito de o contribuinte pleitear valores
pagos a maior.
“Art. 3o Para efeito de interpretação do inciso I do art.
168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código
Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no
caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no
momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art.
150 da referida Lei”.
Pergunta: a disciplina de decadência e prescrição se aplica integralmente
às obrigações acessórias não adimplidas e, conseqüentemente, transmudadas
em principal (multas)?
Resposta: sim. Os institutos da decadência e da prescrição são
fenômenos que retratam limites de tempo incidentes no direito. Isto quer dizer
que ambos, cada qual com sua peculiaridade, fixam prazos para o exercício de
determinadas ações no campo tributário. É a implementação do princípio da
segurança jurídica, previsto no sistema jurídico brasileiro.
Prescrição – sua conceituação segue o já explanado, devendo ser
analisados alguns desdobramentos.
Para que a Fazenda Pública possa promover a cobrança judicial de seus
débitos, por meio de execução fiscal, é necessário que tenha relação jurídica com
sujeito passivo, na qual fica configurada obrigação líquida, certa e exigível.
Previamente à constituição do sujeito passivo como devedor, é necessário
apurar, mediante procedimento administrativo vinculado, o teor do crédito
tributário. Essa atuação da Administração Tributária é tida por meio do
lançamento.
94
Depois de lançado o crédito tributário, o fisco confere prazo para o
contribuinte pagar ou oferecer defesa administrativa. Permanecendo inerte o
sujeito passivo ou sendo infrutífero seu recurso, é repetido o decurso para o
pagamento. Não efetivando o inadimplemento, a Administração toma
providências para a cobrança do débito. De fato, a inscrição na dívida ativa é o
ato que consubstancia o contribuinte como devedor. Além dessa dívida
constituída, é necessário extrair certidão da dívida ativa, o qual se valerá como
título executivo idôneo a promover a referida demanda executiva (art. 585, VII,
CPC), nos termos da LEF.
Termo “a quo” da prescrição – a partir do lançamento, como já
mencionado, o sujeito passivo tem um lapso para realizar o pagamento ou para
interpor recurso administrativo. Nesse intervalo, não corre prescrição, pois não
existe ainda lesão ao direito subjetivo do fisco. O CTN prevê, no silêncio de lei
ordinária específica, que esse decurso é de 30 dias (art. 160, “caput”, CTN). A
partir do 31º dia, com o inadimplemento do devedor, surge a lesão e, por
conseguinte, a pretensão para a exigência judicial – é a tese da “actio nata”124,
materializada pela ação de execução fiscal. Mas o legislador foi infeliz na redação
do art. 174, “caput”, CTN, porque previu o termo inicial do prazo prescricional a
partir da “constituição definitiva” do crédito tributário. Em verdade, o codex
acolheu o postulado de que a constituição do crédito se dá com o lançamento,
posição atualmente refutada pela doutrina. Dentro dessa discussão, destacam-se
duas hipóteses: uma em que inexiste impugnação administrativa e outra, em que
há sua interposição.
Mesmo considerando a construção do legislador, o lançamento constitui o
crédito, mas não definitivamente, porque o sujeito passivo ainda tem um período
para interpor o recurso administrativo, o qual poderá modificar o ato. Somente
depois desse decurso ou sem impugnação administrativa, é que o crédito estaria
“definitivamente constituído”. Ao invés de dizer que a prescrição corre da mora,
do inadimplemento ou da lesão, o legislador fez coincidir o termo “a quo” com sua
construção de crédito tributário definitivamente constituído.
Entretanto, supõe-se que haja impugnação administrativa por parte do
devedor. Sendo improcedente o recurso administrativo tempestivamente
interposto, o crédito estaria definitivamente constituído. No entanto, abre-se novo
prazo para pagamento, sobre o qual não incide a prescrição. Há um contra-
senso, porque o crédito está constituído definitivamente – na linguagem do
legislador – mas a prescrição não está correndo. Para fins de entendimento
majoritário, porém, a prescrição corre da decisão definitiva do recurso
administrativo e não do fim do novo prazo para pagamento. Por incrível que
pareça, o legislador previu situação insólita, em que o interregno prescricional
corre ainda que inexista lesão ao direito subjetivo correspondente. De acordo
com o art. 2º, § 3º, LEF, a prescrição fica suspensa por 180 dias a partir da
inscrição em dívida ativa. No entanto, o STJ entende que essa suspensão não é
cabível, porquanto matéria atinente à LC (art. 146, III, “b”, CF/88). O ajuizamento
da execução fiscal em si não interrompe a prescrição, fato que só será efetivado
124
Na tese da “actio nata”, o prazo prescricional para ação condenatória começa a correr a partir do conhecimento da lesão do
direito subjetivo por parte do lesionado.
95
pelo despacho do juiz que determina a citação do executado (art. 174,
parágrafo único, I, CTN, com redação dada pela LC 118/05).
Prescrição intercorrente – a Fazenda Pública procedeu ao lançamento,
dando prazo para pagamento ou interposição de recurso administrativo. Passado
o decurso “in albis”, surgindo a lesão ao direito do fisco, caracteriza-se o crédito
definitivamente constituído, termo inicial da prescrição qüinqüenal. A partir daí, a
fiscalização aduz título de dívida ativa (termo de dívida ativa) e extrai sua
certidão. Esse documento instruirá a petição inicial da ação de execução fiscal.
No despacho citatório do processo, interrompe-se a prescrição tributária (arts.
174, parágrafo único, I, CTN, e 8º, § 2º, LEF). A partir da citação, o demandado
tem algumas opções:
 Pagamento – com a satisfação do direito do demandante e extinção da
execução e do crédito tributário.
 Embargos do devedor – o juízo deverá ser garantido pelo depósito do
montante integral da dívida (nomeação de bens próprios ou indicação
de outros de terceiros, depósito em dinheiro ou oferecimento de fiança
bancária – art. 9º, I a IV, LEF), o qual permitirá a discussão da dívida
em sede de cognição.
 Exceção (objeção) de pré-executividade – aplicável nos casos em que o
executado detém prova pré-constituída (documental), ou seja, que não
depende de dilação probatória. E verdade, o oferecimento dessa
defesa atípica só e possível quando persiste liquidez e certeza da
prova, em sede de cognição sumária. Não encontra previsão legal,
sendo instrumento criado pela doutrina e amplamente aceito pela
jurisprudência, justamente pelo princípio da celeridade processual. Não
tem natureza de ação, mas sim de mera defesa inominada em sede de
processo executório. Prescinde de garantia do juízo. Acolhendo a
defesa, o juiz julgará a execução extinta.
 Revelia do executado – enseja a penhora ou arresto dos bens do
demandado, desde que encontrado patrimônio em condições de
responder pela dívida fiscal. Não encontrando qualquer bem
penhorável, a execução fica suspensa. Depois de um ano, o juiz deve
proferir despacho de arquivamento do feito. Desse ponto, a doutrina
construiu a denominada prescrição intercorrente, a qual ocorrerá
dentro dos cinco anos seguintes, não sendo mais permitido o
desarquivamento do processo. A execução estará extinta.
A prescrição intercorrente não tinha previsão legal até 2004 (Lei
11051/04), muito pelo qual a LEF, como diploma protetivo do credor fiscal,
permitia o desarquivamento da execução a qualquer tempo (art. 40, § 3º, LEF). A
tese pró-contribuinte, fundando-se no art. 174, parágrafo único, CTN, passou a
considerar que, se a prescrição foi interrompida, creia-se que voltará a correr a
partir de certo momento. O termo apontado foi justamente o despacho de
arquivamento da execução, para permitir harmonia entre o CTN e a LEF. A idéia
foi albergada pelo STF em homenagem à segurança jurídica.
96
Questão se pôs quando o juiz e a secretaria deixam de efetivar o
arquivamento. Para solver o entrave, o STJ entendeu que a prescrição
intercorrente começa a correr um ano após a suspensão da execução,
independentemente do ato formal de arquivamento da execução (Súmula 314 do
STJ)125. O termo “a quo” da prescrição intercorrente ocorre automaticamente,
pelo simples decurso do tempo.
Em razão da Lei 11280/06, a prescrição reconhecida de ofício passou a
vigorar no processo civil (art. 219, § 5º, CPC). Entretanto, a Lei 11051/04, além
de positivar a prescrição intercorrente no âmbito tributário, permitiu seu
reconhecimento de ofício pelo julgador, desde que ouvida previamente a Fazenda
Pública (art. 40, § 4º, LEF), sob pena de nulidade absoluta do ato. Nota-se que se
trata de faculdade do juízo, não configurando direito subjetivo do contribuinte. A
salvaguarda do legislador se deve à potencialidade do instituto em tela, o qual
tem o condão de liquidar a pretensão do credor, mesmo porque há interesse
público em jogo.
Havendo conflito entre CPC e LEF, aplica-se a segunda pelo princípio da
especialidade, mesmo porque o primeiro (lei geral) só terá vez na execução fiscal
em caráter supletório (art. 1º, “in fine”, LEF). Isso não significa que a prescrição
não-intercorrente – podendo ser chamada de ordinária – não possa ser
reconhecida de ofício pelo magistrado sem prévia oitiva do fisco. Nesse caso, o
juiz poderá vislumbrar a prescrição já no despacho citatório da execução fiscal,
porque versará sobre a modalidade ordinária da prescrição, não sobre a
intercorrente. Isso também não quer dizer que o juízo deverá prescindir de
manifestação do executado, porque prescrição é matéria de defesa disponível126.
Sendo assim, sempre deverá ser aberto o contraditório para o demandado-
contribuinte, porque é possível sua renúncia por razões outras. Não se
manifestando nesse sentido ou silenciando sobre a matéria, o juiz então estará
autorizado a reconhecer “ex officio” a morte da pretensão pelo decurso do tempo.
Prescrição nas ações de repetição de indébito – está prevista no art. 168,
CTN, no lapso de cinco anos. Além dessa, existe a prescrição bienal do art. 169,
CTN, a qual versa sobre ação de anulação de decisão administração que denega
a restituição. Ambas correm contra o sujeito passivo da obrigação tributária, vindo
a favorecer o fisco.
O direito ao ressarcimento no indébito também não pode perdurar pela
eternidade, fato que sugere o instituto da prescrição. Em que pese alguns autores
defenderem natureza decadencial ao decurso em tela, de fato, trata-se de
interregno prescricional. Quando o fisco aceita um pagamento a maior, nasce
lesão127 ao direito do sujeito passivo tributário, surgindo a pretensão desse para
125
Súmula 314 do STJ: “Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o
qual se inicia o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente”.
126
Pela perpetuação da prescrição como matéria disponível, mesmo sob o regime da Lei 11280/05, manifesta-se a doutrina
majoritária. Nesse sentido, Rodrigo Mazei e Câmara, Lições de Direito Processual Civil, 13 ed., Rio de Janeiro, Lumen Júris,
2006, v. 2, cujo pensamento pode ser traduzido pelo Enunciado 295 do CJF: “Art. 191. A revogação do art. 194 do Código
Civil pela Lei n. 11.280/2006, que determina ao juiz o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a
possibilidade de renúncia admitida no art. 191 do texto codificado”. Em contrário, afirmando que a prescrição passou a ser
matéria de ordem pública, advogam Roberto Senize Lisboa e Nelson Nery Júnior.
127
Na verdade, segundo bem aponta parte da doutrina, há uma autolesão. Apesar de ser factível em tributos lançados de ofício
ou por declaração, a maior parte das pretensões ao indébito surge de erro de interpretação do próprio sujeito passivo, dentro
97
se ressarcir mediante o exercício do direito de ação. Observe que a demanda
será condenatória, o que justifica a natureza prescricional do lapso ora em
comento.
O termo “ad quo” da prescrição da repetição de indébito comporta certa
complexidade. O art. 168, I, CTN, estabelece que a referida prescrição corre a
partir da extinção do crédito tributário nos casos do art. 165, I e II, CTN. Esse
dispositivo diz respeito às exações sujeitas, respectivamente, a lançamento de
ofício e por homologação. Em raciocínio simplista, a causa de extinção referida
pelo legislador seria o pagamento, desde que indevido (a mais). Quanto a tributo
lançado de ofício, não persiste qualquer dúvida. Destarte, nos tributos sujeitos à
homologação, a controvérsia se instalou, porque existem dois momentos lógicos:
o recolhimento antecipado do tributo (a maior) e a homologação desse
pagamento pelo fisco (art. 150, § 4º, CF/88). Por óbvio, o primeiro é aquele que
extingue o crédito. Porém, essa proposição só foi reafirmada recentemente pelo
STJ, muito pelo qual a corte acolhia a “Tese do Cinco Mais Cinco” até pouco
tempo atrás, consoante já supra comentado. Dentro dessa perspectiva, era
adotado o segundo momento lógico como termo inicial da prescrição da repetição
de indébito, entendimento atualmente não mais vigorante. A questão ficou
pacificada depois da LC 118/05, a qual previu expressamente, em seu art. 3º, o
termo inicial no pagamento do tributo (antecipado).
Em recente decisão, o STF deu parcial provimento a RE interposto pela
AGU para contestar a posição do STJ quanto ao caráter não-retrospectivo da LC
118/05. O Supremo entendeu que a interpretação nesse sentido, operada por
órgão fracionário do STJ, viola a cláusula da reserva de plenário (art. 97, CF/88),
porquanto implica em verdadeira declaração de inconstitucionalidade do diploma,
mormente quanto aos seus arts. 3º e 4º, “in fine”. Nesse passo, o Excelso
Pretório devolveu a causa ao STJ para o julgamento pelo seu órgão especial, a
teor do que definira o constituinte128.
O STJ, respeitando comando dado pelo Supremo, declarou
inconstitucional o caráter interpretativo da LC 118/05, determinando que o prazo
prescricional da repetição de indébito é de cinco anos, contados do
pagamento129. Segundo a leitura da corte, o decurso de cinco anos, contados a
partir do fato gerador, implica em diminuição do lapso, o qual, mal ou bem, era de
dez anos para os tributos sujeitos à homologação de lançamento. Pois bem, o
STJ disse que o lustro se aplica para os fatos ocorridos após a vigência da LC
118/05, salvo se o decurso prescricional decenal, iniciado sob a égide da
interpretação anterior, ultrapasse o limite de cinco anos após a promulgação do
diploma130.
CONFINS, faturamento, receita e LC 118/05 – a Lei 9718/98 instituiu a
COFINS, contribuição previdenciária sobre a receita dos empregadores, com
base no art. 195, I, “b”, CF/88. Até a EC 20/98, a redação do dispositivo
das exações sujeitas ao lançamento por homologação. Nesse caso, não é o terceiro que lesa o direito alheio, mas sim o próprio
contribuinte dá causa, aproveitando-se o fisco dessa situação.
128
STF, RE 544246/SE, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 15.5.2007, Informativo do STF nº 467.
129
STJ, Corte Especial, EREsp 644.736-PE, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 6/6/2007, Informativo do STJ n° 322.
130
STJ, EREsp 435.835-SC, DJU 4/6/2007; EREsp 644.736-PE, DJU 27/8/2007; 2ª T., REsp 955.831-SP, rel. Min. Castro
Meira, j, 28/8/2007, Informativo do STJ n° 329.
98
constitucional não falava em empregador, bem como não versava sobre receita.
A COFINS sobre faturamento já era autorizada pela LC 70/91. O art. 195, § 4º,
CF/88, já permitia outras contribuições não cominadas, residuais, desde que
instituída por LC. Nesse passo, a COFINS sobre receita, criada por MP e
convertida em LO, padecia de inconstitucionalidade formal. Para revestir o
diploma de constitucionalidade, a EC 20/98 operou a mudança, passando a se
discutir se emenda teria a capacidade de sanar inconstitucionalidade de lei
anterior. À guisa do debate, veio a LC 110/01 para resolver a querela. Entretanto,
as contribuições cobradas entre a Lei 9718/98 e a LC 110/01 passaram a ser
objeto de ação de repetição de indébito, a qual chegou no STF por via de RE, a
ser julgado pelo seu pleno. Com fulcro na doutrina alemã (tese da sanatória geral
das emendas em face das leis anteriores), o relator, Gilmar Mendes, votou pela
constitucionalidade, sendo vencido (Informativo 408 do STF). Para solver o caos
no âmbito do fisco, o Executivo fez aprovar a LC 118/05, a qual passou a previr a
extinção do crédito no pagamento (art. 3º, LC 118/05), dentro da discussão da LF
(Lei 11101/05). Entretanto, devido à vacância do diploma em 120 dias, houve
uma enxurrada de demandas para a repetição de indébito, ficando a prescrição
obstada a partir de então. Para fazer a prescrição atingir essas ações em curso,
com efeito retroativo, a Fazenda Pública alegou que a LC 118/05 é interpretativa
(art. 106, I, CTN), tal qual a própria redação dos arts. 3º e 4º, LC 118/05. Essa
tese chegou ao STJ por embargos de divergência em REsp, não sendo acolhida.
O STJ, guardião da lei federal, não permitiu o caráter interpretativo da LC 118/05
ao afirmar que ela é inovadora (modificativa)131, prestigiando a segurança jurídica
da “Tese dos Cinco Mais Cinco”, justamente por ele erigida. Foi uma decisão de
extremo bom senso, reforçando a confiabilidade do jurisdicionado para com a
corte.
A partir do pagamento indevido, além da ação judicial de repetição de
indébito, é possível ao sujeito passivo aduzir pedido na via administrativa
(processo administrativo fiscal). Na segunda opção, caso a decisão definitiva seja
denegatória, o administrado poderá recorrer ao Judiciário para anulá-la. Todavia,
a prescrição para o exercício da ação é menor que aquela afeta diretamente à
Justiça, restringindo-se a dois anos (art. 169, “caput”, CTN). Nesse sentido, o
legislador foi tecnicamente impróprio na redação do art. 169, “caput”, CTN,
quanto às expressões “prescrição da ação” e “anulatória”. Com efeito, a
prescrição se restringe à pretensão ao ressarcimento, bem como a ação tem
natureza dúplice: anulação da decisão administrativa e condenação do fisco à
restituição.
Pergunta: qual foi a LC de janeiro de 2000 que constitucionalizou a
COFINS sobre receita das empresas, dando origem à enxurrada de ações de
repetição de indébito no primeiro semestre de 2005? Pergunto isso em face da
declaração de inconstitucionalidade da Lei 9718/98 pelo STF em 2005.

131
STJ, EREsp 327043-DF e AgRgREsp 727200-PB. Segundo o tribunal, a LC 118/05 alterou a estrutura do CTN, porque,
antes daquela, esse tinha duas margens interpretativas e, depois dela, passou a existir somente uma. Em verdade, essa posição é
contestável, mesmo porque o sentido interpretativo de um diploma presta-se justamente a tal faina, característica inerente à
inovação da ordem jurídica. O argumento mais abalizado para refutar a retroatividade da LC 118/05 encontra-se no art. 5º,
XXXVI, CF/88, pois o ato jurídico perfeito (interrupção da prescrição com o despacho de recebimento da inicial) não pode ser
maculado por norma posterior.
99
Resposta: a Lei Complementar 101/00 em seu art. 4º parágrafo 2º, II
estabeleceu apenas um impacto na Lei Diretrizes Orçamentárias relacionada à
mudança na forma de tributação do setor de combustíveis e do pagamento por
substituição no setor automotivo em relação à Contribuição para Financiamento
da Seguridade - COFINS.
Pergunta: a doutrina processualista costuma diferenciar a exceção de
pré-executividade da objeção de não-executividade. Segundo Daniel Assumpção,
a primeira se adstringe a matérias debatidas em embargos, devendo ser oposta
antes da penhora (“pré-executividade”); a segunda versa sobre matéria de ordem
pública (norma cogente de interesse público), a qual não preclui, pode ser
acusada de ofício e reconhecida em qualquer tempo e grau de jurisdição. Essa
diferenciação também existe na execução fiscal?
Resposta: em matéria de execução fiscal, o termo Exceção de Pré-
Executividade tem prevalecido em face da margem de matéria que podem ser
alegadas e que não estão restritas àquelas de ordem pública. Precisam atacar
sim, as condições da ação.
Pergunta: antes de reconhecer de ofício a prescrição, quer seja
intercorrente (art. 40, § 4º, LEF), quer seja ordinária (arts. 174, “caput”, CTN, e
219, § 5º, CPC), o juiz é obrigado a ouvir previamente ambas partes na execução
fiscal?
Resposta: não, tendo em vista o assunto estar afeto à matéria de direito.
Mas ele possui o poder de fazê-lo caso queira.
Pergunta: os impostos que podem ensejar a penhora do imóvel familiar
(art. 3º, IV, Lei 8009/90) são somente o ITR e o IPTU? Outra espécie,
indiretamente ligado ao bem de família, não permitiria o ato de apreensão judicial
(ex.: ISS cobrado em razão de modificação na estrutura do edifício)?
Resposta: cuidado, a lei torna penhorável o ‘bem de família’ tratando-se
de impostos, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar, isso
quer dizer que o imóvel fará às vezes de garantia da dívida decorrente de tributo.
O ISS está afeto à prestação de serviços e, portanto, fora da previsão legal.

Exclusão do Crédito Tributário


Há dois posicionamentos para o termo “exclusão”, presente no capítulo V
do Título III, CTN:
1º) Exclui-se um crédito que deveria nascer e não vai nascer.
2º) dentre as obrigações da Administração na elaboração do orçamento,
existe a previsão das receitas, sendo incluído tudo o que se imagina arrecadar.
No momento em que uma legislação permite o não recolhimento de algum tributo,
deve-se retornar à previsão orçamentária inicial e EXCLUIR a respectiva receita.
Ambos os conceitos são jurídica e semanticamente vagos, levando-se ao
raciocínio de que o legislador complementar atuou com impropriedade
terminológica. Para Sabbag (2004, p. 205), a exclusão do crédito tributário
comporta “causas inibitórias do lançamento”, visto que “ocorrem antes do
100
lançamento e após o surgimento da obrigação tributária”. Em verdade, o
equívoco semântico do texto legal se deve à sua visão míope sobre a
constituição do crédito tributário, cuja ocorrência se dá com a previsão da
hipótese de incidência na lei tributária132. Respeitando o respeitável mentor do
CTN, Rubens Gomes de Souza, essa imperdoável posição extraída da doutrina
estruturalista germânica e adotada na letra da norma gera contra-sensos dessa
monta.
Celeumas à parte, o art. 175, CTN, prevê que a exclusão do crédito
tributário adstringe-se à isenção (dispensa de tributo) e à anistia (dispensa de
penalidade). Neste diapasão, há de se ressaltar “que o poder de isentar ou
anistiar é correlato ao poder de criar tributos” (SABBAG, 2004, p. 205), devendo
ser respeitados os mesmos parâmetros diretivos desses (limitações ao poder de
tributar, isto é, imunidades e princípios).
A norma que exclui o crédito tributário sempre afasta a obrigação
principal, mas não as acessórias (art. 175, parágrafo único, CTN). Desta feita,
não há elementos suficientes e legais para “constituir um crédito tributário” em
face de um fenômeno isento, pois, neste, não existe a OBRIGAÇÃO PRINCIPAL
(art. 139 c.c. art. 175, parágrafo único, CTN). Não há de se formalizar a relação
jurídica para torná-la exigível, conquanto se afasta a obrigação principal das
hipóteses de isenção.
ISENÇÃO é chamada de endonorma pelos doutrinadores. A norma cria
uma exigência e o legislador faz surgir uma gama de casos particulares dentro
dela, de modo a dispensar o contribuinte da obrigação principal. Linha
minoritária assevera que qualquer hipótese abrangida pela isenção não pode se
denominar fato gerador. Neste raciocínio, Ricardo Lobo Torres (apud
NOGUEIRA, 1999), assevera que a isenção suspende a eficácia da norma
impositiva tributária, isto é, o fato abstrato deixa de existir e assim não pode surgir
uma obrigação tributária. A posição MAJORITÁRIA afirma que, por ser uma
endonorma, a isenção não tem o condão de anular os efeitos da norma
maior. Todos os fenômenos abrangidos são fatos geradores, admitindo-se a
dispensa da obrigação principal para os isentos. Essa é a posição perfilhada pelo
Excelso Pretório, o qual entende a isenção como disposição legal de incidência
tributária.
Sempre decorrente de lei, a isenção engloba os fenômenos havidos a
partir de sua instituição, tendo por fulcro metajurídico elementos de cunho sócio-
econômico e sócio-político (SABBAG, 2004). Como se sujeita à reserva legal, “ex
vi” dos arts. 150, § 6º, CF/88, e 176, CTN, resolução legislativa que aprova
convênio não pode concedê-la, salvo se houver consenso de todas as unidades
federadas no caso de ICMS (art. 155, § 2º, XII, “g”, CF/88)133. Todavia, a isenção
não alcança as exações nascidas depois de sua criação, pela PROIBIÇÃO legal
da chamada isenção em branco (art. 177, II, CTN). O art. 176, parágrafo único,
CTN, confere permissivo às chamadas isenções geográficas (NOGUEIRA, 1999,
p. 171), com o objetivo de “compensar desigualdade em função de condições
132
Indo um pouco mais fundo, consoante comentário já realizado, Paulo de Barros Carvalho assevera que a constituição do
crédito tributário se dá com a realização do fato gerador, à luz da previsão abstrata legal (fato imponível descrito na norma).
133
STJ, 2ª T., REsp 723.575-MG, rel. Min. Eliana Calmon, j. 26/6/2007, Informativo do STJ n° 325.
101
peculiares”. É importante também dizer que as isenções só alcançarão os
tributos não vinculados (impostos), não se aplicando às taxas e às contribuições
de melhoria em razão da necessária contraprestação direta, indireta ou
indenizatória dessas exações, como bem ventila o art. 177, I, CTN (NOGUEIRA,
1999). Porém, essa disposição pode ser excepcionada pelo legislador
concedente, versando inclusive sobre a mencionada isenção em branco (art. 177,
“caput”, parte inicial, CTN).
Em termos classificatórios, a isenção pode ser geral ou específica,
incondicional ou condicional. A geral é aquela decorrente diretamente de lei, não
cabendo qualquer análise por parte da Administração Tributária. A específica é
aquela que depende de verificação, pelo fisco, da situação apresentada pelo
contribuinte, mediante requerimento, cabendo-lhe exarar despacho concessivo
(art. 179, “caput”, CTN). A INCONDICIONAL é isenção que não estipula qualquer
requisito especial para sua concessão. Neste caso, pode ser revogada a qualquer
tempo, por diploma de igual hierarquia àquele concessório, desde que observada
a anterioridade originária (art. 178 c.c. art. 104, III, CTN). Ex.: revogação do art.
8º, DL 8031/45 (isenção de II e de IPI para equipamentos integrados ao ativo da
Companhia Hidrelétrico do São Francisco – CHESF), pela Lei 8032/90 – o
primeiro comando não pode conferir um direito adquirido à beneficiária, o qual
não poderia ser desfeito nem mesmo por lei superveniente, configurando
verdadeira “fossilização” do ordenamento134. Entretanto, como observam Sabbag
(2004) e Nogueira (1999), a jurisprudência não tem reconhecido a aplicação da
anterioridade à revogação das anistias incondicionais135. A condicional é
irrevogável, por expressa manifestação legislativa (art. 178, CTN, em contrário
senso) e jurisprudencial (Súmula 544 do STF136).
Na ANISTIA, há certas diferenças para com a isenção. Ela é o
PERDÃO, a retirada da sanção tributária pecuniária, sendo aplicada às penas
anteriores à sua instituição. Segundo Sabbag (2004, p. 208), é o “perdão legal
das penalidades pecuniárias antes da constituição do crédito tributário”137. Para
Nogueira (1999), a anistia encontra fulcro maior no “indulgentia principis” do
Direito Penal, ou seja, opera causa de extinção da punibilidade. Decorre de
razões de política fiscal e atendimento de certas conjunturas e circunstâncias não
só econômicas, como é o caso de calamidades (NOGUEIRA, 1999). Para
Sabbag (2004), a finalidade principal é retirar a situação de impontualidade do
inadimplente da obrigação.
Qualquer penalidade, nos termos da legislação, pode ser passível de
anistia, desde que devidamente prevista em diploma competente. A vontade do
legislador vai determinar os limites de abrangência, bem como um prazo para o
aproveitamento dos benefícios. A pena pode ainda não existir no plano formal,
mas a infração, no campo concreto, já existe. Mesmo assim, a anistia alcançará

134
STJ, REsp 575.806-PE, rel. Min. Herman Benjamin, j. 11/9/2007, Informativo do STJ n° 331.
135
Cf. Súmula 615 do STF: O princípio constitucional da anualidade (§ 29 do art. 153 da CF de 1969) não se aplica à
revogação de isenção do ICM.
136
Súmula 544 do STF: isenção tributária concedida sob condição onerosa não pode ser livremente suprimida.
137
Apesar da posição pessoal do autor, o qual coaduna com a tese da constituição do crédito tributário pela hipótese de
incidência, preferiu ele manter o uso da visão codificada do legislador tributário, justamente para não causar ainda mais
confusão na explanação didática dos institutos em análise.
102
tais fenômenos. Desta feita, a anistia retroage a fatos já ocorridos,
apresentando espectro amplo quanto às sanções (cometidas, impostas ou
formalizadas), NÃO ATINGINDO os valores referentes ao crédito tributário
(obrigação principal)138. Contudo, não abrange as sanções já lançadas, ou seja,
havendo notificação do contribuinte, não há de se cogitar a anistia (SABBAG,
2004)139, porque a benesse cabível seria a remissão (art. 156, IV, CTN). Também
não alcança os atos cometidos com dolo, simulação ou fraude, bem como os
crimes e as contravenções (art. 180, I, CTN) e as demais infrações tributárias
cometidas em concurso de pessoas (art. 180, II, CTN). O contribuinte fica
dispensado do cumprimento de certa penalidade, mas continua com a obrigação
principal e outras acessórias dela decorrentes.
O procedimento para a isenção e para a anistia se dá à luz do comando
diretivo do CTN. O legislador ordinário determina-lo-á, baseado na citada LC, os
parâmetros de aplicação dos institutos em tela (art. 97, VI, CTN).

Garantias do Crédito Tributário


Não são inconstitucionais, porque colimam a isonomia. A natureza de
receita pública, direcionada ao custeio das funções públicas, requer um
tratamento desigual relegado ao fisco, fazendo-se merecer especialidade na sua
regulação.
As garantias da Fazenda Pública quanto ao crédito tributário estão
elencadas em rol exemplificativo nos arts. 183 a 193, CTN, podendo o legislador
inovar nesse sentido.
Inoponibilidade de garantias reais ao fisco (art. 184, CTN) – as
estipulações entre particulares no tocante aos gravames reais não atingem a
exigência de crédito tributário. Dessa feita, cláusulas de inalienabilidade, de
incomunicabilidade ou de impenhorabilidade140 não produzem efeito quanto ao
fisco. As disposições só são válidas entre particulares, não tendo vez frente aos
preceitos de ordem pública da norma tributária (função social dos contratos).
Dessarte, se a impenhorabilidade for legalmente instituída, o comando
prevalece sobre a lei tributária (art. 184, “in fine”, CTN). Ex.: art. 1º, “caput” e
parágrafo único, Lei 8009/90 (bem de família); art. 649, I a X, CPC (bens
impenhoráveis). Caso a própria lei excepcione a impenhorabilidade, essa
colocação também se aplica ao fisco, permitindo a penhora da coisa. Ex.: art. 3º, I
e IV, Lei 8009/90 – créditos previdenciários e trabalhistas decorrentes de relação
empregatícia em função do imóvel e tributos relativos ao próprio bem (em
138
Neste aspecto, a anistia não se confunde com a remissão (art. 156, IV, CTN), porque esta se refere ao crédito tributário “per
se”, enquanto aquela, à imposição de penalidade tributária. Depois de “constituído o crédito” pelo lançamento – em outras
palavras, pela notificação –, não há mais de se falar em anistia, mas sim em remissão. Essa linha, apoiada pela maioria da
doutrina, como Sabbag, op. cit., Ricardo Cunha Chimenti, Direito Tributário, 4ª ed., São Paulo, Saraiva, 2002, v. 16, Coleção
Sinopses Jurídicas, e outros, encontra resistência em doutrina isolada. Com efeito, Amaro, op. cit., conclui que o lançamento
não tem o condão de impedir a concessão de anistia, admitindo o autor a sua incidência mesmo em crédito já lançado.
139
Sabbag, op. cit., é adepto da corrente que entende o lançamento como perfeito em um só ato (a notificação), ao contrário do
que apregoa a doutrina prevalente e a própria redação do art. 142, “caput”, CTN, ao tê-lo como procedimento (sucessão de
atos).
140
A cláusula de inalienabilidade engloba também a incomunicabilidade, de acordo com a Súmula 49 do STF: “A cláusula de
inalienabilidade inclui a incomunicabilidade dos bens”.
103
decorrência da propriedade – ITR e IPTU – e do poder de polícia estatal – taxa
do lixo141, de esgoto, de eletricidade, etc.).
Fraude à “execução fiscal” (art. 185, CTN) – depois da citação válida,
dentro do processo civil, os atos de alienação que tendem à insolvência do
devedor, desde que provado o “eventus damni” (insolvência – elemento objetivo),
importam em fraude à execução. No âmbito tributário, essa é mais profunda,
porque sua presunção não está adstrita ao chamamento válido do demandado ao
processo, mas sim pela inscrição da dívida ativa (art. 185, “caput”, CTN). A
presunção de certeza e liquidez do crédito tributário se devem ao controle
cognitivo interno administrativo, procedimento e ato dotado de presunção de
legalidade e de legitimidade. A certidão de dívida ativa, como título executivo
extrajudicial, instruirá a inicial da execução fiscal. Depois de ajuizada a demanda,
o juiz exara o despacho citatório do sujeito passivo. Todo esse trâmite demanda
muito tempo, o que sensibilizou o legislador a presumir fraude a partir da
inscrição da dívida ativa. Trata-se de presunção absoluta, sendo ineficaz a
alienação entre sujeito passivo e terceiro adquirente. Como esse evento
prescinde de execução ajuizada, Câmara (2006) afirma que surgiu um novo
instituto: fraude à administração fiscal.
Fraude à administração fiscal e bem de família – supondo que o devedor
tenha débito fiscal de $70 e possua dois imóveis, cada um de $100. Depois de
inscrita a dívida ativa, o sujeito passivo aliena um desses. Para responder se há
ou não fraude ao fisco, o fato depende da natureza do crédito fiscal da Fazenda
Pública: caso a exação originária seja do imóvel de propriedade do contribuinte,
não existe fraude, porque a impenhorabilidade do bem de família é excepcionada,
tornando-o passível de penhora (art. 3º, I e II, Lei 8009/90); do contrário, se o
tributo a ser cobrado não assim se manifesta, incide a mencionada fraude,
porque o único bem idôneo a solver a dívida foi alienado em contrário ao art. 185,
“caput”, CTN. Como o imóvel restante não é penhorável, a Fazenda Pública pode
alcançar a ineficácia da alienação feita pelo contribuinte.
“Penhora on-line” (art. 185-A, CTN) – o juiz da vara de execuções fiscais
pode declarar a indisponibilidade de bens do executado em face de dívida fiscal
não adimplida, muito pelo que não são encontrados bens aptos à penhora (art.
185-A, CTN). Para tal, exige-se regular citação do executado. Para ficar
submetido à indisponibilidade, o devedor não paga no prazo legal, não nomeia
bens nem é verificado, pelo meirinho, patrimônio apto a satisfazer o crédito
tributário. Em que pese não haver um sistema informatizado totalmente
abrangente, já existe o ambiente jurídico para tal, porque o legislador previu
abrangência em todo território nacional, em qualquer órgão, entidade ou
instituição, pública ou privada, apta a registrar patrimônio (art. 185-A, § 2º, CTN).
Ex.: indisponibilidade sobre imóvel é cabível, mesmo que sobre um montante
maior que o débito fiscal, porque, depois da hasta pública, o saldo será restituído
ao devedor (art. 185-A, § 1º, CTN). O que se discute é a possibilidade ou não de
incidir a indisponibilidade sobre faturamento e renda de empresa, o que ainda
não é pacífico.
141
A jurisprudência não admite a cumulação entre taxa do lixo e taxa para limpeza de logradouros públicos, porquanto ambos
decorrem do mesmo poder de polícia sanitária do Município.
104
Dentro da idéia de excesso de penhora, existe também a argüição de
excesso de indisponibilidade. Nesse caso, essa deve ser limitada ao valor da
dívida em discussão, sob pena de suscitar mandado de segurança pela diferença
e, possivelmente, de indenização por dano moral, dada a situação concreta
submetida ao sujeito passivo. Essa disposição só cabe se divisível o bem,
porque, ao revés, ele vai à hasta pública, devolvendo-se o saldo ao devedor.
Nessa última hipótese, não há de se retirar a salvaguarda da Fazenda Pública
com fulcro em excesso de indisponibilidade.
Crédito tributário na falência (arts. 186 e 188, CTN) – a relação de
preferência no concurso de credores está determinado na LF (Lei 11101/05).
Nesse passo, o fisco não precisa se habilitar no processo falimentar, visto que o
efeito atrativo do juízo universal não se lhe aplica (art. 187, “caput”, CTN). O feito
permanece no seu juízo privativo. Quando a execução fiscal fora instaurada antes
da ação falimentar, sua penhora é realizada no rosto do processo da quebra.
Todavia, o produto da arrematação é entregue à massa, respeitando a ordem de
prevalência estabelecida na LF. Essa situação também vige se a penhora
precede ao ajuizamento da falência, caso em que o montante da arrematação
será deferido ao juízo universal.
O fisco pode receber antes do detentor de crédito trabalhista, desde que
aquele tenha crédito extraconcursal (depois da decretação da falência), de
acordo com o arts. 84, LF, e 188, CTN, e o segundo seja anterior à falência (arts.
83, LF, e 186, CTN). No mesmo raciocínio, é perfeitamente possível crédito
quirografário ter preferência sobre tributário.

Administração Tributária
Introdução – a fiscalização tributária é assunto deferido ao legislador
ordinário, específico de cada ente ou relativo a cada exação instituída. Todavia, a
norma geral será o CTN, nos termos de seu art. 194, “caput”. Essa atribuição é
de suma importância para a função arrecadatória do fisco, cuja atuação é
imprescindível inclusive para o próprio recolhimento de alguns tributos, mormente
aqueles dependentes de lançamento (AMARO, 2006, p. 479). Secundando o
legislador do CTN, Sabbag (2004, p. 241) assevera que a atribuição de
administrar tributos importa em três funções:
 Procedimentos fiscalizatórios adequados;
 Cobrança judicial dos importes tributários inscritos em dívida ativa;
 Medidas de controle e verificação da realidade fiscal do contribuinte.
A administração de tributos é realizada pela Fazenda Pública, a qual
abrange os entes políticos (art. 209, CTN). São a União, os Estados, o DF e os
Municípios, na dicção do art. 41, I a III, CC. Sabbag (2004, p. 255) ensina que os
Territórios Federais não se constituem dessa forma, porquanto sua competência
e sua capacidade tributárias são deferidas à União (art. 147, 1ª parte, CF/88). Em
verdade, Inexiste qualquer competência tributária deferida aos Territórios,
porquanto sequer possuem Fazenda Pública (art. 209, CTN). O constituinte dá
indício dessa assertiva, porquanto estatui que os impostos estaduais
105
correspondentes são incumbência da União (art. 147, 1ª parte, CF/88). Em
verdade, a expressão “impostos” pode ser interpretada como tributos. Essa regra
só é excepcionada se o Território for dividido em Municípios, quando cada um
deles exercerá plenamente sua capacidade tributária própria (art. 147, 2ª parte,
CF/88).
Destinatários – usando a terminologia do codex, a legislação tributária é
dirigida tanto à autoridade administrativa tributária quanto aos administrados.
Quanto a esses, é abrangente as determinações do legislador, podendo abarcar,
além dos sujeitos passivos da relação jurídico-tributária (contribuintes e
responsáveis), terceiros alheios. Nesse ponto, o art. 194, parágrafo único, CTN,
deixa claro que até mesmo os imunes e isentos devem se render aos comandos
normativos tributários, mormente no que concerne às obrigações acessórias,
disposição que é reforçada pelo art. 175, parágrafo único, CTN. Mesmo outras
pessoas podem ser objeto de fiscalização pela autoridade, quando devam prestar
informações, praticar atos ou abster-se de fatos em nome do poder de polícia do
fisco (art. 78, “caput”, CTN).
A atuação dos agentes de fiscalização deve observar o princípio da estrita
legalidade, aplicável à Administração Tributária. Sabbag (2004, p. 245) avança
um pouco mais, postulando pela aplicação integral de todos os princípios
administrativos: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
(art. 37, “caput”, CF/88). Mesmo que não haja configuração de crime, os agentes
do fisco poderão requisitar força policial para levar a cabo seu ofício, uma vez se
afigure embaraço ou desacato tal ao exercício que torne impossível sua
efetivação (art. 200, CTN).
Amaro (2006, p. 480) lembra que o Senado tem competência exclusiva
para avaliar periodicamente o desempenho da fiscalização tributária de todos os
entes federados, assim como a funcionalidade do próprio Sistema Tributário
Nacional (art. 52, XV, CF/88).
Consulta – o art. 161, § 2º, CTN, refere-se ao procedimento de consulta,
pelo qual o contribuinte pode submeter uma dúvida sobre cumprimento de
obrigação tributária à autoridade fazendária. É matéria regulamentada pelo D.
70235/72, diploma que também trata do procedimento administrativo fiscal.
Quando pende consulta, não é possível aplicação de penalidades nem
ajuizamento de execução fiscal (art. 48, “caput”, D. 70235/72), apesar de não ser
permitida quando tais expedientes já foram iniciados (art. 52, III e IV, D.
70235/72). Também não é possível imposição de medidas de garantia nem
incidência de juros moratórios, apesar de vigorar correção monetária. No entanto,
na resposta, a autoridade poderá compelir o consulente a cumprir determinada
obrigação, bem como considerar a consulta ineficaz ou incabível (arts. 52, I a VIII,
e 55, D. 70235/72), o que talvez afastasse o interesse do jurisdicionado pelo
instituto (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 76). Apesar disso, a resposta dada pela
autoridade tributária e favorável ao contribuinte vincula a Administração
Tributária. Assim como no PAF, a consulta permite recurso administrativo e
reapreciação da matéria por instância superior, nos termos dos arts. 54, II, 56, D.
70235/72 (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 76). Da resposta proferida, nenhuma
medida pode ser tomada em desfavor do consulente em até trinta dias (art. 48, I e
106
II, D. 70235/72). Além dos próprios sujeitos passivos da relação jurídico-
tributária, entidades econômicas e profissionais e órgãos da Administração
Pública têm legitimidade para aduzir consulta (art. 46, parágrafo único, D.
70235/72. Nessa hipótese, o julgamento da dúvida será feito por instância única,
cuja autoridade competente é o coordenador do Sistema de Tributação da atual
SRFB (art. 54, III, “b” e “c”, D. 70235/72).
Sigilo fiscal – sigilo é aquilo que representa o selo que lacra o que não
pode ou não deve ser divulgado, colocando desta forma um manto sobre o
segredo, para torná-lo indevassável, como ensina Robson Baroni. No ambiente
tributário, o sigilo bebe na fonte dos Direitos Fundamentais, muito pelo qual é
decorrência do véu que se abate sobre a privacidade e sobre os dados pessoais
(art. 5º, X e XII, CF/88). No entanto, a autoridade tributária tem prerrogativa sobre
os segredos de cada pessoa, desde que atinentes à sua função fiscalizatória.
Apesar de a legislação comum proteger a exibição de livros e de
documentos contábeis do empresário (art. 1190, CC), os arts. 195, “caput”, CTN,
33, § 1º, Lei 8112/91, e 1193, CC, asseguram o exame amplo e genérico no
processo de fiscalização. Qualquer disposição normativa que venha a limitar a
atuação do fisco está em desacordo com a norma geral tributária,
consubstanciada pelo CTN (CHIMENTI, 2002, p. 119), sendo considerada
ineficaz (SABBAG, 2004, p. 242). Porém, a verificação deve guardar nexo com o
objetivo do procedimento, sob pena de importar em abuso de autoridade (Súmula
439 do STF)142. Esse arcabouço probatório é composto por livros comerciais e
fiscais, além de documentos relativos a lançamento. Deve ser preservado pelo
fiscalizado até o decurso de prescrição ou de decadência a ele relativas (art. 195,
parágrafo único, CTN), apesar do legislador não ter falado na segunda (AMARO,
2006, p. 481).
O próprio dever de prestar informações e de apresentar documentos para
fins fiscalizatórios se constitui como obrigação tributária acessória (art. 197,
“caput”, CTN). O art. 197, I a VII, CTN, arrola vários obrigados nessa faina. No
entanto, “ninguém pode ser obrigado a prestar informações sobre os negócios de
outrem só porque eventualmente mantenha com ele relações de amizade ou de
parentesco, ou mesmo negócios aos quais sejam alheias as informações
demandadas” (AMARO, 2006, p. 483). O legislador exigiu pertinência temática
entre o objeto da fiscalização e o ato fiscalizatório, a teor do que já disse a citada
Súmula 439 do Supremo. O rol do comando considerado é fechado nos seus
termos, em que pese o legislador poder ampliá-lo “de lege ferenda” (art. 197, VII,
CTN). Havendo conflito entre o dever de guardar segredo (dever legal de sigilo) e
o interesse da Administração Tributária, o legislador deu prevalência ao primeiro
(art. 197, parágrafo único, CTN). Ex.: advogados, psicólogos, sacerdotes,
médicos e outros. No entanto, como rememora Chimenti (2002, p. 120), quando o
causídico estiver exercendo função atípica, como inventariante ou como
administrador judicial em falência, por exemplo, tem o dever de prestar
informações ao fisco.

142
Súmula 439 do STF: “Estão sujeitos à fiscalização tributária, ou previdenciária, quaisquer livros comerciais, limitado o
exame aos pontos objeto da investigação”.
107
Em regra, os agentes da Fazenda Pública não têm vênia para divulgar
dados sobre situação econômica ou financeira de fiscalizados (art. 198, “caput”,
CTN). Entretanto, o próprio legislador excepcionou o mandamento em algumas
situações (art. 198, I e II, §§ 1º a 3º, CTN):
 Requisição de autoridade judicial;
 Solicitações e autoridade administrativa acerca de infração disciplinar
praticada por servidor público, desde que haja PAD instalado para
investigar o sujeito passivo tributário;
 Repartição mútua de dados entre diferentes órgãos estatais no interesse
da fiscalização tributária, inclusive entre entes políticos diversos,
mediante lei ou convênio (art. 199, “caput”, CTN), desde que haja
processo administrativo fiscal instaurado;
 Representação fiscal para fins criminais;
 Necessidades materiais para ativação de dívida da Fazenda Pública;
 Concessão de parcelamento ou de moratória;
 Requisição de CPI (art. 58, § 3º, CF/88).
Na terceira hipótese supra aduzida, houve preocupação na entrega
pessoal do cabedal de informações, a ser efetivada mediante recibo. A
prevalência do sigilo quanto a terceiros deve ser colimada na formalização do ato.
Enfim, importante ressaltar que o compartilhamento de dados fiscais com outros
órgãos estatais pode ser feito até mesmo no âmbito internacional, na
conformação que lhe der tratado entre a União e outros Estados (art. 199,
parágrafo único, CTN). Sabbag (2004, p. 247) professa que a inexistência de
convênio não impede a troca de dados sigilos fiscais entre órgãos públicos,
porquanto o art. 199, “caput”, CTN, colimou restringir o compartilhamento de
informações entre Estado e particular.
A LC 105/01, que está tendo sua constitucionalidade contestada, perante
o STF, em face do art. 5º, X e XII, CF/88, assegura a quebra de sigilo bancário
pelas autoridades tributárias, independentemente de vênia judicial. O permissivo
só é aplicável se houver PAF ou procedimento de fiscalização regularmente
instaurado (art. 6º, “caput”, LC 105/01). Antes do referido diploma, a
jurisprudência era pacífica em proibir a prática por parte da Administração. Com
fulcro no art. 58, § 3º, CF/88, a mesma lei conferiu idêntica prerrogativa às CPI’s,
por intermédio do BACEN ou da CVM, desde que autorizada pelo plenário da
Casa Legislativa ou da própria comissão. Na esteira do diploma, as instituições
financeiras deverão remeter à SRFB informações para identificação de
contribuintes e de valores relativos à CPMF, tributo que possui finalidades
concomitantes de arrecadação e de fiscalização. No diapasão, a Lei 9613/98
confere poder ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) para
requisitar informações bancárias e fiscais, com o intuito de evitar e reprimir crimes
de lavagem de dinheiro. A AGU pode requisitar informações ao BACEN e a CVM
para instruir processos em que esteja atuando (art. 3º, § 3º, LC 105/01).
108
A autorização judicial para a quebra de sigilo bancário e fiscal, quando
da apuração de crimes contra a Administração, pode ser decretada em IP ou em
ação judicial (art. 1º, § 4º, LC 105/01).
Em contrapartida à mencionada ADIn, Chimenti (2002, p. 122), entende
que a LC 105/01 e outras normas no mesmo sentido não são inconstitucionais,
porquanto assentadas no art. 145, § 1º, “in fine”, CF/88. Segundo o autor, o que
se deve rechaçar são os abusos e o vazamento de informações, não a
fiscalização em si. O Ministério Público, a teor do que se posiciona a
jurisprudência, não tem prerrogativa de requisitar informações bancárias e fiscais
por força própria. No entanto, presentes indícios de crime de ação penal pública,
o BACEN e a CVM são obrigadas a representar perante o Parquet para as
medidas julgadas cabíveis (art. 9º, “caput”, LC 105/01).
A infringência das regras sobre quebra de sigilo bancário e fiscal, bem
como a prática de atos que importem omissão, retardamento injustificado ou
prestação de informações falsas constituem ilícitos penais, apenados com
reclusão de um a quatro anos e multa (art. 10, “caput” e parágrafo único, LC
105/01). Se houver prejuízo em decorrência do vazamento de dados, o servidor
público responsável arcará civil e funcionalmente pelo seu ato comissivo ou
omissivo. Todavia, se ficar provado que agiu de acordo com a orientação da
instituição, essa responderá objetivamente (art. 11, LC 105/01).
Fiscalização – circundando o conceito de fiscalização dado pelo CTN, é
possível extrair seu sentido ontológico. De fato, o legislador lhe fez referência
como procedimento, porquanto fala em fixação de termo inicial e final (art. 196,
“caput”, CTN), cuja lavratura também encontra previsão nos arts. 8º, D. 70235/72,
e 6º, “caput”, LC 105/01. Sabbag (2004, p. 241) a define como sendo “atos de
verificação do cumprimento de obrigações tributárias, quer sejam principais, quer
sejam acessórias”. Como postula Amaro (2006, p. 482), a fiscalização é dirigida
pelo princípio documental, em que todos os atos devem ser reduzidos a termo, os
quais comporão autos.
O termo inicial da análise fiscal deve ser preferencialmente registrado em
livro especial, o qual será apresentado ao inquirido. Não sendo possível, quando
é confeccionado documento apartado, cópia deve ser entregue, mediante recibo,
ao fiscalizado (art. 196, parágrafo único, CTN). A lavratura do início do
procedimento fiscalizatório influencia na apreciação da decadência (porque seu
termo inicial é a notificação do procedimento de fiscalização – art. 173, parágrafo
único, CTN) e garante a defesa do investigado (CHIMENTI, 2002, p. 120). É
importante também para caracterizar ou não denúncia espontânea. Nos termos
do art. 138, “caput” e parágrafo único, CTN, só será assim considerada a
confissão de dívida tributária havida antes de documentado o ato. Depois desse
momento, a denúncia não é válida, comportando efeitos diversos na relação entre
sujeito passivo e Administração Tributária.
A prévia fixação do término da investigação é um dos mais relevantes
pressupostos para a regular tramitação do exame tributário. Essa assertiva
advém diretamente da segurança jurídica, expressamente esculpida no art. 5º,
109
“caput”, CF/88. com efeito, ninguém pode ficar submetido eternamente ao
crivo da Administração, porquanto todos têm direito ao sossego público.
Inscrição em dívida ativa – Sabbag (2004, p. 250) define dívida ativa
como crédito tributário inscrito. Ocorre somente depois de instaurado e concluído
processo administrativo fiscal (PAF). Esse é iniciado por auto de infração, por
notificação de lançamento ou por apreensão de livros e mercadorias (FÜHRER e
FÜHRER, 2001, p. 77). Notificado da instauração do procedimento, no decurso
assinalado, geralmente de 30 dias (art. 14, D. 70235/72), o interessado pode
pagar ou apresentar defesa, também chamada de impugnação ou de reclamação
(CHIMENTI, 2002, p. 171). No primeiro caso, extingue-se o crédito tributário; no
segundo, prossegue o PAF, suspendendo-se a exigibilidade do crédito tributário
(art. 151, III, CTN). Segundo Chimenti (2002, 171), várias legislações, escoradas
no art. 38, “caput”, LEF, prevêem depósito recursal para a discussão
administrativa (cláusula “solve et repete”). Essa exigência, mesmo em sede
recursal, é considerada inconstitucional pelo STF, entendimento secundado pelo
STJ143. Esse entendimento já estava consolidado na Súmula 247 do extinto
TFR144. O julgamento da pretensão geralmente é realizado por delegado
fazendário ou por órgão especializado. Dessa decisão, cabe recurso hierárquico
à instância administrativa de superposição, representada geralmente pelo
Conselho de Contribuintes (na seara federal – DL 1438/45) ou por Tribunal de
Impostos e Taxas (no âmbito estadual e distrital). Caso o contribuinte seja
vencedor na primeira instância administrativa, descabe reexame necessário pela
própria Fazenda Pública, porquanto a decisão é tangida pela imutabilidade do
trânsito em julgado, como já se posicionou o STF. De outra parte, formada a
coisa julgada administrativa, com decisão desfavorável ao sujeito passivo, o
crédito tributário (não suspenso, não excluído e não extinto) é lançado em livro
próprio (atualmente, cadastro eletrônico), caracterizando a ativação da dívida da
Fazenda Pública (art. 201, “caput”, CTN). No apontamento, devem ficar perfeitos
vários dados, sob pena de nulidade do ato (art. 203, CTN): identificação do
devedor e co-responsáveis, valor devido, fundamento legal, data de inscrição e
identificação do PAF, com o livro e a folha de inscrição (art. 202, I a V, e
parágrafo único, CTN). O ajuizamento de qualquer demanda judicial implica na
renúncia ao recurso administrativo interposto, nos termos do art. 38, parágrafo
único, LEF. Segundo o STF, esse comando não ofende o direito de petição e a
inafastabilidade do Judiciário (art. 5º, XXXIV e XXXV, CF/88), porque se trata de
aplicação do art. 503, “caput” e parágrafo único, CPC, o qual trata da desistência
tácita a recurso judicial145.
Uma vez perfeita a inscrição, o ato administrativo goza de presunção
relativa de liquidez e de certeza quanto ao crédito representado (art. 204, “caput”,
CTN). Exatamente por essa razão, o legislador emprestou-lhe o valor de título
executivo extrajudicial (art. 585, VII, CPC), aliás, o único formado unilateralmente
143
STF, AC 1.566-MG, DJ 27/4/2007, como precedente na ADI 1.073-DF, DJ 28/5/2001.
143
STJ, 1ª T., REsp 943.116-SP, rel. Min. José Delgado, j. 19/6/2007, Informativo do STJ n° 324, com precedentes no AgRg
no Ag 112.789-PA, DJ 30/6/1997, e no RMS 240-SP, DJ 1º/6/1992.
144
Súmula 247 do TFR: “Não constitui pressuposto da ação anulatória do débito fiscal o depósito de que cuida o art. 38 da Lei
nº 6.830, de 1980”.
145
STF, Plenário, RE 233582/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, j. 16.8.2007,
Informativo do STF n° 476.
110
pelo credor (ASSIS apud CÂMARA, 2006, p. 212). A partir da ativação, pode
ser extraída certidão de dívida ativa, a qual necessariamente deverá estar
anexada na exordial de execução fiscal (art. 6º, § 1º, LEF). A presunção ora em
comento é relativa, pois pode ser elidida por prova em contrário (art. 204,
parágrafo único, CTN). De outra sorte, a fluência de juros não afeta a liquidez do
título (art. 201, parágrafo único, CTN).
Eventual nulidade no ato de inscrição da dívida ativa pode ser elidida pela
autoridade tributária. Nesse sentido, os arts. 203, CTN, e 2º, § 8º, LEF,
conferiram a prerrogativa de fazê-lo até a decisão de primeira instância
jurisdicional, a qual se liga à decisão nos embargos à execução fiscal, como já
está pacificado na jurisprudência. Esse é o termo final para eventual emenda ou
substituição da CDA de ofício, sendo certo que qualquer alteração do seu
conteúdo faz os prazos dos embargos serem devolvidos ao executado, naquilo
que concerne à parte modificada. O STJ ainda adverte que a correção deve ater-
se a erro material ou formal, não atingindo inexistência de requisito essencial da
certidão, a qual, pela gravidade, implica em vício insanável, sujeito à nulidade
absoluta146. Vale ressaltar que a corte também já assentou entendimento no
sentido da desnecessidade de novo ato de lançamento para simples retificação
aritmética da CDA, salvo se a alteração a ser efetivada comportar total mudança
no seu teor, urgindo escrituração contábil totalmente nova147.
Certidão negativa – o direito de certidão é remédio constitucional
assegurado pelo art. 5º, XXXIV, “b”, CF/88. Para celebração de determinados
negócios, realização de certos atos ou participação em algumas situações, é
exigida prova da quitação de tributos. A certidão negativa de débito (CND) para
com a Fazenda Pública vem exatamente nesse sentido, como meio de erigir uma
presunção absoluta em prol do administrado. Por esse motivo, há doutrina que
defende, nesse ponto, a existência de autêntica imunidade tributária (SABBAG,
2004, p. 252). Trata-se de documento de expedição obrigatória por parte da
autoridade solicitada, a qual deverá aduzi-lo em até 10 dias, contados do
requerimento (art. 205, parágrafo único, CTN).
A inobservância do interregno pode ensejar a impetração de mandado de
segurança, por estar consubstanciado abuso da autoridade competente
(SABBAG, 2004, p. 253). O art. 206, CTN, afirma que a certidão positiva que
ateste crédito vincendo, com execução garantida ou com exigibilidade suspensa
(art. 151, I a VI, CTN) produz os mesmos reflexos jurídicos da CND. Nessa
hipótese, a Fazenda Pública expede certidão de regularização ou certidão
negativa com efeitos de negativa.
Todavia, mesmo ante o breve decurso assinalado pela lei para a
expedição da CND, pode ocorrer que a urgência não permita a espera. Nessa
situação, o art. 207, CTN, dispensa a exibição do documento, apesar de fazer
com que os participantes do ato respondam pela integridade do débito, incluindo
principal, juros, correção e eventuais penalidades. Amaro (2006, p. 486) diz que o

146
STJ, AgRg no REsp 932.402-RS, DJU 26/6/2007; 1ª T., AgRg no REsp 942.982-RS, rel. Min. José Delgado, j. 20/9/2007,
Informativo do STJ n° 332.
147
STJ, 1ª Seç., EREsp 602.002-SP, rel. Min. Humberto Martins, j. 27/6/2007, Informativo do STJ n° 325; REsp 196.663-SP,
DJU 13/3/2000.
111
legislador concedeu uma benesse ao contribuinte para evitar a caducidade de
um direito, mas cobrou-lhe alto preço em contrapartida.
Quando o servidor expedir CND com inobservância de preceitos formais,
por dolo ou fraude, responderá pessoalmente pelos valores decorrentes e
eventuais acréscimos (art. 208, “caput”, CTN), sem prejuízo de responsabilidade
penal e administrativa (art. 208, parágrafo único, CTN). Quando atua com culpa,
em contrário senso, não responderá civilmente pelos prejuízos ao erário, mas a
CND terá efeito liberatório geral, como bem vem aventando a jurisprudência. No
último caso, o agente público responderá pelo ato na esfera criminal e penal.

“Super Receita”
A Lei 11457/07 instituiu a SRFB. A sujeição ativa tributária e a
parafiscalidade foram modificadas pelo diploma. A SRF foi unificada à Secretaria
da Receita Previdenciária (SRP), formando um só órgão.
A competência tributária é indelegável, sendo detida pelas pessoas
políticas. No entanto, a capacidade tributária ativa (arrecadar e fiscalizar tributos)
pode ser delegada (art. 7º, “caput”, CTN). É essa que caracteriza o sujeito ativo
da relação jurídico-tributária. A referida delegação não necessariamente implica
em parafiscalidade. Essa se verifica quando há delegação de fiscalização,
arrecadação e administração de tributos, sendo instituto mais abrangente que a
mera capacidade tributária ativa.
Em relação à SRFB, a discussão tangencia exatamente a capacidade
ativa e a parafiscalidade. Com efeito, o art. 2º, “caput”, Lei 11457/07, confere
capacidade tributária ativa à SRFB no tocante às contribuições sociais, instituídas
atualmente ou “de lege ferenda”. No entanto, o art. 2º, § 1º, Lei 11457/07,
direciona os valores decorrentes ao Fundo da Previdência Social. Dessa forma,
não implica em parafiscalidade das contribuições sociais em relação à SRFB.

Prazos no CTN
A teor do art. 210, “caput”, CTN, os decursos são contados exatamente na
forma do processo civil, excluindo-se o dia de início e incluindo-se o termo final.
“Os prazos serão contínuos, sem interrupção, pelos sábados, domingos ou
feriados” (SABBAG, 2004, p. 255). Entretanto, vale lembrar a colocação do autor,
no sentido de que os termos (final e inicial) só serão considerados quando houver
expediente regular na repartição (art. 210, parágrafo único, CTN). Em
decorrência, ponto facultativo e meio expediente não são computados como tais,
valendo como dias sem funcionamento.

Impostos em Espécie
Introdução – o art. 155 da CF/88 estabelece os impostos de competência
dos Estados federados. Antes de tudo, é precípuo destacar que toda a tributação
da alçada estadual deve levar em consideração dois elementos: o local onde se
deu o fato gerador e a regência da LEGISLAÇÃO ESTADUAL sobre tal. Ex.: o
112
ITCMD leva em conta o local onde estão os bens do “de cujus” e não onde
este veio a falecer.
Em face das diferentes normas dos 27 Estados brasileiros, há tratamento
tributário diferenciado, o que pode gerar conflitos de legislação. Ex.: há unidades
da federação que exigem o porte da GARE de recolhimento do IPVA junto com o
RENAVAM (BA, ES e PE), enquanto outras não148. Para solver tais entraves, foi
criado o CONFAZ – Conselho Nacional Fazendário (27 secretários de Fazenda
dos Estados e alguns membros da Receita Federal e Previdenciária). O órgão
tem por escopo padronizar os procedimentos tributários, de modo a dirimir
eventuais disparidades para com as exações regionais e federais. Entretanto,
ainda se está muito longe de uma harmonização razoável entre as legislações
vigentes. O trabalho efetivo do CONFAZ resume-se, hodiernamente, de modo
concreto, à padronização de alguns documentos fiscais, como notas,
conhecimentos de transporte e guias de recolhimento.
Para tentar dirimir tal entrave, as Receitas Estaduais, dada a dificuldade
de fiscalizar os fatos geradores, passaram a adotar um modo operante
simplificador, a arrepio da Constituição. Passaram a exigir dos transportadores o
ICMS integral das mercadorias que entram em seus Estados, quando a exação
seria devida no emissor. Esta medida é efetivada nas fronteiras estaduais, para
tornar mais eficaz o recolhimento. A prática é totalmente inconstitucional.
II (Imposto sobre Importação de Produtos Estrangeiros) e IE (Imposto
sobre Exportação, para o Exterior, de Produtos Nacionais ou
Nacionalizados) – o art. 153, CF/88, indica os impostos de competência da
União. Seu inciso I fala do II. O inciso II fala do IE. Para entendê-los, é
necessário, preliminarmente, DIFERENCIAR PRODUTO E MERCADORIA.
Produto é gênero, do qual mercadoria é espécie. Aquele resulta da atividade
humana, envolvendo tudo que ela consegue produzir. Pode ser natural ou
totalmente artificial. Dentro deste universo, mercadoria é aquele OBJETO DE
MERCÂNCIA, ou seja, que está no trajeto indústria-comércio. Ex.: a geladeira,
uma vez adquirida e utilizada pelo consumidor, não é mercadoria, porquanto não
se encontra no caminho entre a produção e o comércio; ela consubstancia
somente um bem móvel de uso doméstico. O que diferencia o produto da
mercadoria é a destinação.
Alguns países não tributam produtos importados para uso próprio do
consumidor. Já nosso sistema tributário não alcança tal beneplácito, vez que o II
incide sobre PRODUTOS, NÃO SOBRE MERCADORIAS. Nesse contexto, até a
EC 33/01, o ICMS, em operações de importação, incidia sobre mercadorias,
porquanto da sua natureza jurídica. Depois da reforma constitucional, o Supremo
passou a referendar a exação sobre produtos importados (art. 155, IX, “a”,
CF/88). Essa mutação constitucional, muito criticada pela doutrina, permitiu, em
sede de exceção, a bitributação do mesmo fato gerador, qual o seja a entrada de
produtos importados em território nacional. Fechando o ciclo, consoante
comentário já realizado, a EC 42/03 determinou que o importador fosse

148
Por meio de recente resolução, o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) decidiu que o porte da guia de recolhimento
de IPVA não é obrigatório ao condutor por ocasião de fiscalização de trânsito.
113
contribuinte para o financiamento da seguridade social, dando azo à instituição
do PIS-importador e da COFINS-importador, os quais possuem exatamente a
mesma hipótese de incidência do II e do ICMS.
Quanto ao II, a natureza do produto, para o art. 153, I, CF/88, deve ficar
adstrita a um país estrangeiro, isto é, a confecção do produto deve situar no
estrangeiro. Neste sentido, remessas de produtos para repontecialização,
manutenção, troca, etc. a outro país não configuram exportação e, por
conseqüência, nem importação. É a construção jurisprudencial e doutrinária
dominante, porque há TEMPORARIEDADE na operação. Aliás, esse fenômeno,
conhecido como “drawback” é considerado incentivo à exportação. Admite
diversas formas:
 Suspensão do pagamento dos tributos exigíveis na importação de
mercadoria a ser exportada após beneficiamento ou destinada a
fabricação, complementação ou acondicionamento de outra a ser
exportada;
 Isenção dos tributos exigíveis na importação de mercadoria, em
quantidade ou qualidade equivalente à utilizada no beneficiamento,
fabricação, complementação ou acondicionamento de produto
exportado;
 Restituição, total ou parcial, dos tributos pagos na importação de
mercadoria exportada após beneficiamento, ou utilizada na fabricação,
complementação ou acondicionamento de outra exportada.
Portanto, em contrário senso ao conceito e ao desdobramento do
“drawnback”, IMPORTAÇÃO é a aquisição de produtos estrangeiros em caráter
definitivo, quer seja para consumo, quer seja para operações de mercância,
incluindo, insumos, equipamentos, produtos naturais ou industrializados, etc.
O conceito de exportação, para países estrangeiros, é análogo ao
anterior149. O termo “nacionalizado” (ou internado) refere-se a operações
anteriores à importação, as quais implicam em posterior distribuição por
intermédio do Brasil. Estes produtos podem ou não sofrer modificações
domésticas. Já a palavra “nacional” diz respeito àqueles produzidos integralmente
no país. Tanto uns quanto os outros refletem o objeto material da hipótese de
incidência. Dessa feita, nacionalização segundo entendimento doutrinário, dá-se
por atos procedimentais, nos quais se transfere o produto ou mercadoria
estrangeira para a economia nacional. Produtos não despachados, ou
abandonados, revertem-se em favor da Fazenda Nacional. É possível identificar
duas espécies de operação de exportação:

149
A CF/88 foi categórica, em seu art. 153, II, ao prescrever a “exportação, para o exterior, de produtos”. À primeira vista, sob
o enfoque semântico, pareceria que se trata de uma redundância. Porém, a terminologia empregada reside na melhor técnica
jurídica de redação. O vocábulo “exportação” foi (e é) utilizado também para designar o fluxo de coisas entre os Estados da
Federação. Neste sentido, fala-se em exportação para o Estado de São Paulo, por exemplo. Essa nomenclatura é utilizada em
vários diplomas do Sistema Tributário, os quais foram recepcionados pela Carta de 88. O próprio CTN faz referência à
conotação apontada. Desta feita, o constituinte originário resolveu especificar “ipse litre” a atividade, com o fim de constituir
perfeitamente a hipótese de incidência do IE.
114
 Direta – quando o estabelecimento industrial ou produtor emite a nota
fiscal de venda endereçada diretamente ao destinatário no exterior, com
base em contrato.
 Indireta – quando o estabelecimento industrial ou produtor emite nota
fiscal de venda para destinatário comprador no Brasil, que funciona
como interveniente comercial, que por sua vez emitirá outro documento
de venda endereçado ao comprador estrangeiro. Nessa hipótese, será
considerada indireta para o fabricante e direta para o interveniente
exportador.
O “drawback” também é aplicável quanto ao IE. Há isenção do tributo
quando há importação de matéria prima, produtos intermediários e componentes
destinados à fabricação, no país, de máquinas e equipamentos a serem
fornecidos, no mercado interno, em decorrência de licitação internacional, contra
pagamento em moeda conversível proveniente de financiamento concedido pela
instituição financeira internacional da qual o Brasil participe.
O II e o IE incidem, por conseguinte, sobre o SETOR DE ATIVIDADES
(base econômica). Desta feita, não se deduz a capacidade contributiva, vez que
ambos são proporcionais, reais e indiretos.
A operação de comércio exterior é regida por competência legislativa
privativa da União (art. 22, VIII, CF/88). São impostos eivados de
EXTRAFISCALIDADE, porquanto se prestam à intervenção na atividade
econômica interna. O controle é realizado por meio de alíquotas diferenciadas, a
serem majoradas ou diminuídas, de acordo com a situação presente. O comércio
exterior reflete-se na indústria interna, na balança de pagamentos do país, no
consumo interno. A importação e a exportação não podem ser realizadas a bel
prazer do empresário, pois há interesses nacionais em jogo. Conseguintemente,
o constituinte permitiu que a fixação da alíquota de tais exações não se sujeita à
reserva legal, à anterioridade ordinária nem à noventalidade (arts. 153, § 1º, e
150, § 1º, CF/88).
No estabelecimento de ALÍQUOTAS, principalmente no que concerne às
suas constantes alterações, o Fisco, por vezes, vem a ferir o princípio da
ISONOMIA, pois a autorização contida no art. 153, § 1º, CF/88, deve ser usada
sistemicamente, em consonância com os demais princípios e direitos essenciais
contidos na Carta Política. Também ocorrem dissidências jurídicas quanto a
imunidades de certas ENTIDADES, principalmente com referência àquelas de
cunho religioso.
Em relação às operações de mercado exterior, os Ministérios da Fazenda,
da Indústria e Comércio e das Relações Exteriores são coordenados por um
arcabouço interministerial: o Sistema de Comércio Exterior (SISCOMEX), cujo
gestor principal é a Receita Federal (CASSONE, 2004). É ele quem regula as
atividades inerentes ao II e ao IE. Além disso, a União é a única que tem
personalidade jurídica de Direito Internacional. Portanto, o negociador no
comércio externo – e, em última análise, o eventual devedor – sempre será a
União. Esta é sempre a AVALISTA INTERNACIONAL dos demais entes públicos
ou das empresas privadas brasileiras. Daí decorre o conceito de Dívida Externa.
115
Desta forma, é necessário uma autorização prévia do governo federal para
todas as operações no setor.
O interessado no comércio exterior deve, antes de tudo, tecer um estudo
fundamentado sobre o produto a ser importado ou exportado, endereçando-o,
eletronicamente, ao órgão competente do SISCOMEX (SRFB). Esse analisará o
pedido e poderá autorizar a operação. Uma vez AUTORIZADA, o interessado
poderá, então, efetivar o negócio. De posse dos dados fornecidos pelo
interessado, o Fisco poderá fiscalizar, fisicamente, os conteúdos a serem
comercializados, mediante a declaração de importação (DI). Esta fiscalização é
denominada desembaraço aduaneiro150, o qual consubstancia o FATO
GERADOR do II. Já para o IE, fica configurado a partir da expedição da GUIA DE
EXPORTAÇÃO (CASSONE, 2004).
O aspecto material do II é representado, portanto, pela entrada do produto
no território nacional (art. 19, CTN). Espacialmente, por conseqüência, a exação
contempla o que se conhece como território aduaneiro, o qual pode ser dividido
em zona primária e secundária. Segundo o art. 33, I, DL 37/66, zona primária
compreende as faixas internas de portos, aeroportos, recintos alfandegados e
locais habilitados nas fronteiras terrestres, bem como outras áreas nas quais se
efetuam operações de carga e descarga de mercadorias ou embarque e
desembarque de passageiros. Zona Secundária compreendendo a parte restante
do território nacional, nela incluídos as águas territoriais e o espaço aéreo
correspondente (art. 33, II, DL 37/66).
No critério temporal, em regra, o momento de ocorrência do fato imponível
coincide com a data do registro da DI no tocante ao produto despachado para
consumo. Despacho para consumo é o conjunto de atos procedimentais
(desembaraço aduaneiro), cujo objetivo consiste em colocar a mercadoria
nacionalizada à disposição do adquirente estabelecido no Brasil, para seu uso ou
consumo.
Mas há regimes aduaneiros especiais, os quais permitem a suspensão
total ou parcial da exigibilidade do II:
Trânsito aduaneiro – é o que permite o transporte de mercadoria, sob o
controle aduaneiro, de um ponto a outro do território aduaneiro, com a
suspensão do pagamento de tributos;
Admissão temporária – é o que permite a importação de bens que
devam permanecer no Pais durante prazo fixado, com suspensão total
do pagamento dos tributos, ou com suspensão parcial, no caso de
utilização econômica;
Admissão temporária para aperfeiçoamento ativo – é o que permite o
ingresso para permanência temporária no país, com suspensão do
pagamento de tributos, de mercadorias estrangeiras ou
desnacionalizadas, destinadas a operações de aperfeiçoamento ativo e
posterior reexportação;

150
O atual Regulamento Aduaneiro é veiculado pelo D. 91030/85.
116
Outros acontecimentos, por questão de não-subsunção ao tipo
tributário do II, escapam à incidência da exação. De fato, o DL 37/66 e o D.
2472/88 confirmaram essa premissa. Segundo entendimento da análise dos atos
normativos em comento, a incidência não ocorrerá nas seguintes situações:
 Mercadoria enviada em consignação e não vendida no prazo
autorizado;
 Mercadoria devolvida por motivos de defeito técnico, para reparo ou
substituição;
 Mercadoria devolvida por modificações na sistemática de importação
por parte do país importador;
 Por outros fatores alheios à vontade do exportador.
Destarte, o art. 5º, D. 2434/88, assevera que bens importados com
alíquota zero do II estão sujeitos aos demais tributos, nos termos das respectivas
legislações. No diapasão, a Súmula 576 do STF151 autoriza a cobrança do ICMS
sobre produtos importados sob regime da alíquota zero.
Em referência ao II, a BASE DE CÁLCULO pode ser estabelecida
basicamente de duas formas (art. 20, I e II, CTN). Quando a hipótese de
incidência traz um percentual fixo sobre o valor da transação, tem-se a exação
proporcional (art. 20, I, CTN). Neste sentido, a quantificação expressa na DI
(valor do produto mais despesas de alfândega) seria a base de cálculo. Do
contrário, quando o fisco determina um “quantum” somado ao inicial, tem-se o
conceito “AD VALOREM”. Como a tributação de importação é dotada de
extrafiscalidade, o segundo critério é comumente utilizado para o II, de modo a
não prejudicar o setor produtivo nacional, pois produtos importados, os quais
alcancem valores ínfimos na chegada ao país, podem elidir a concorrência dos
similares brasileiros. As alíquotas são geralmente constantes do GATT. A
alfândega é a encarregada de verificar quais os valores a serem acrescidos, de
acordo com o critério do art. 20, II, CTN, chegando-se a uma base de cálculo
atribuída. Este comando decorre dos arts. 153, § 1º, CF/88 e 21 do CTN, os
quais conferiram possibilidade para o Executivo alterá-la, não precisando
observar propriamente os ditames da anterioridade original e da noventalidade,
consoante comentário supra aduzido (art. 150, § 1º, CF/88). Os valores irrisórios,
atribuídos a mercadorias em trâmite entre empresas do mesmo grupo econômico
transnacional, também são objeto da base de cálculo “ad valorem”, para evitar a
mera evasão de divisas. Na mesma esteira, o legislador assim previu para o IE
(art. 214, § 2º, D. 4543/02). Nesse passo, em que pese a previsão do art. 24, II,
CTN, atualmente para o IE, a base de cálculo é sempre fixada, nunca “ad
valorem”, de acordo com a previsão do art. 214, “caput”, D. 4543/02 (CASSONE,
2004). Terceira forma de determinar a base de cálculo do II se dá pelo valor da
arrematação, quando o produtos é adquirido em leilão de bens provenientes de
descaminho (art. 20, III, CTN).
As alíquotas são fixadas na Tarifa Externa Comum (advinda do GATT) ou
determinadas na legislação federal. De acordo com o ditame da

151
Súmula 576 do STF: “É lícita a cobrança do ICMS sobre produtos importados sob regime da alíquota zero”.
117
ESSENCIALIDADE, quanto mais vital é o produto, menor será a alíquota
incidente. Tal critério é o primeiro elemento que o legislador observa ao estipular
as alíquotas. Todavia, se há produção interna de algum bem, em quantidade
suficiente para suprir o mercado interno, as alíquotas do II serão maiores, a
despeito da essencialidade. É o mecanismo denominado BARREIRA
ALFANDEGÁRIA, a qual representa palco de conflitos entre os interesses de
produtores, de consumidores e de importadores. Esta equação não se resolve
facilmente, porquanto fica atrelada especificamente a CADA TIPO DE
PRODUTO. Além das considerações tributárias, há conotações de ordem política
para o estabelecimento das alíquotas do II e do IE.
Para o IE, a alíquota, via de regra, é de 30% sobre o valor do produto (art.
215, “caput”, D. 4543/02), podendo ser reduzida (art. 215, § 1º, D. 4543/02) e
majorada até o percentual máximo de 50% (art. 215, § 2º, D. 4543/02),
competindo à Câmara de Comércio decidir sobre tais alterações. A prerrogativa,
portanto, pertence ao Executivo, dada a previsão constitucional do art. 153, § 1º,
CF/88.
O desembaraço aduaneiro, como configurador do fato gerador, ainda
encontra outro elemento complicador: a fiscalização de produtos importados que
levantem suspeitas sobre ilicitude. Ex.: importação de naftalina para fabricação
de produtos de limpeza, a qual pode ser confundida com entorpecente. Para
otimizar as operações, a ALFÂNDEGA adota critérios diferenciados de
fiscalização, partindo de um patamar de menor para outro de maior rigor, de
acordo com os canais enquadrados (verde, cinza, vermelho e preto). País de
origem, freqüência do importador, notícias da imprensa, tipo de produto são
elementos que servem para que a autoridade alfandegária decida sobre o
enquadramento do lote em um ou em outro canal de fiscalização.
O desembaraço para a exportação também segue o mesmo trâmite da
importação, com conseqüentes facilitações. Há certificações de órgãos ou
entidades públicas que resolvem parte da burocracia para a exportação.
Para o II, o sujeito passivo é o importador ou o arrematante152 (art. 22, I e
II, CTN); para o IE, é o exportador ou quem a ele se equiparar (art. 27, CTN). O
sujeito ativo é sempre a União (Fisco) para ambos, dado o comando contido no
art. 153, I e II, CF/88.
IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) – está previsto no art.
153, IV, CF/88. O constituinte determinou algumas características, estabelecidas
no art. 153, § 3º, I a IV, CF/88. As alíquotas serão fixadas de acordo com a
essencialidade do produto, sendo menores aquelas de produtos mais essenciais.
O comando determina também que será não-cumulativo, adotando-se o sistema
de compensação com a operação posterior. Serão imunes as operações com
produtos industrializados destinados ao exterior, no que tange à exação em tela.
De acordo com o estabelecido pelo legislador ordinário, a carga de IPI será
reduzida sobre bens de capital. A normatização do IPI é dada pelo D. 2637/98,

152
O arrematante é aquele que adquire produtos importados em um leilão, os quais são objeto do delito de descaminho (art.
318, CP). Nesta situação, aquele, mediante a declaração de arremate, arcará com a obrigação tributária do imposto de
importação.
118
modificado pelo D. 4544/02. Vale lembrar também que não pende a regra da
anterioridade ordinária (art. 150, § 1º, CF/88), mas incide a noventalidade (art.
150, III, “c”, CF/88) sobre o imposto em relevo.
Conceito de produto industrializado – deve-se tomar, de início, o produto
“in natura”, até que venha a converter-se em produto consumível. Tanto para o
IPI quanto para o ICMS, a atividade de transformação de produtos naturais em
bens consumíveis não pode ser enxergada somente por cada uma de suas
etapas, de modo estanque. O caminho, desde a natureza até o consumidor, deve
ser verificado: recurso natural, extrativismo industrial, indústria de base, indústria
de transformação, indústria de montagem, etc. A partir do primeiro estágio, o
produto passa a constituir um semi-elaborado, até que possa chegar ao
consumidor final. Portanto, partindo do PRIMEIRO PASSO DE
PROCESSAMENTO, já incide o IPI, porquanto se configura um produto
industrializado. Enquanto pender uma ação humana que venha a adaptar um
produto para o consumidor final, a atividade estará no campo de incidência do
tributo explicitado no art. 153, IV, CF/88. É o que diz o art. 46, parágrafo único, “in
fine”, CTN, consubstanciando os estabelecimentos equiparados à indústria.
Modificação no produto implica em atividade industrial para fins tributários. Desta
feita, a exação citada somente exclui a extração da natureza. Na esteira, a seara
do IPI engloba a transformação, o beneficiamento, o acondicionamento, a
montagem e o recondicionamento (recuperação de um produto obsoleto ou
inservível em algo aproveitável para a aplicação humana), como prescreve o art.
3º, I a V, D. 4544/02 (Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados –
RIPI).
Objeto – está no art. 46, parágrafo único, CTN. Para os ALIMENTOS, os
quais seriam englobados pelo IPI – como o caso de tomates embalados em
bandejas para o supermercado ou de pescados que são beneficiados com a
retirada de escamas para o comércio – são agraciados pelo legislador pela
isenção de imposto. Outro ponto interessante é a desigualdade entre o
estabelecimento equiparado à indústria e o prestador de serviço. Para diferenciá-
los, é necessário recorrer à produção em série no primeiro e o “artesanato” no
segundo153. Ex.: indústria de ternos e alfaiate.
Características – o art. 153, § 3º, CF/88, traça o alinhamento geral para
que o legislador infraconstitucional trabalhe a regulamentação do IPI.
O inciso I refere-se a alíquotas diferenciadas de acordo com o caráter
essencial ou não do produto. É a SELETIVIDADE EM FUNÇÃO DA
ESSENCIALIDADE, oscilando de 0 a 363,5%, do mais básico ao mais supérfluo.
A Tabela do IPI (TIPI) estabelece todas as alíquotas. Neste sentido, o imposto
possui certa extrafiscalidade quanto ao fumo, pois se trata da maior alíquota
existente, a qual desencorajaria o consumo de um produto não recomendável
devido a razões de saúde pública (PAULSEN, 2001). Para Ricardo Lobo Torres
153
Para Leandro Paulsen, Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Juripsrudência, Porto Alegre, Livraria do
Advogado, 2001, p. 95, “o beneficiamento realizado em um bem do cliente ou mesmo a produção mediante encomenda não
podem configurar fato gerador do IPI”. Nesta situação, incide sim o Imposto Sobre Serviços (ISS), consoante precedente da 1ª
Turma do TRF/4. Para o citado autor, o IPI tem por base econômica as operações com produtos industrializados e, como fato
gerador, a saída do produto industrializado do estabelecimento industrial, em proveito da organização e não de terceiros. Em
sentido contrário, demonstra Cassone, op. cit., com fulcro em jurisprudência do STJ.
119
(apud PAULSEN, 2001), o critério da seletividade pela essencialidade,
aplicável coercitivamente ao IPI pelo legislador, constitui atendimento ao
PRINCIPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA, mesmo se tratando de exação
indireta.
O inciso II expressa a não-cumulatividade. Para evitar o “efeito cascata”,
a cada nova agregação do processo industrial, desconta-se o valor anteriormente
incorporado no novo recolhimento de IPI. O ICMS, a PIS e a COFINS também
seguem o mesmo raciocínio. Nesse sistema, o estabelecimento industrial ou
equiparado não é o contribuinte de fato, mas o contribuinte de direito
(responsável), que deve cobrar o IPI do consumidor e repassá-lo à União. A partir
da Lei 8866/94, o responsável passou a ser definido como depositário da União.
Caso não recolha aos cofres públicos o valor cobrado a título de IPI, passa a ser
depositário infiel. Havendo venda de produto industrializado por qualquer valor
(preço negociado entre o vendedor e comprador), a lei determina que sobre o
preço seja calculado o IPI, seguindo a seguinte sistemática de recolhimento:
1) Deve ser destacado na Nota Fiscal e cobrado do comprador por
ordem e conta da União;
2) O vendedor (responsável) torna-se depositário desse IPI cobrado
do comprador (contribuinte de fato) nos termos da Lei 8866/94;
3) Não pode ser contabilizado como despesa ou custo pelo vendedor,
já que não é ônus seu, mas sim do comprador.
Existe a possibilidade, na quinzena de totalização, de haver mais imposto
de crédito que de débito. O procedimento é denominado apuração do imposto em
conta gráfica. Entretanto, podem existir saídas em que não incide o IPI. Em tese
erigida pelo legislador (a partir do art. 153, § 3º, III, CF/88), o crédito do IPI só
seria devido ao contribuinte que não for consumidor final do produto (contribuinte
de fato). Desta forma, o crédito de IPI somente terá vez se o produto compor a
saída do estabelecimento, desde que a fase anterior seja tributada. Em outras
palavras, o direito a compensar o IPI só é devido aos produtos que terão
exação correspondente na saída. Essa questão passou a ser controvertida nos
tribunais.
A cada operação de circulação, incide a exação, conquanto se caracteriza
o fato imponível. No entanto, a sistemática de recolhimento do imposto é
particular, computando-se débitos e créditos da pessoa jurídica. Todas as vezes
que houver saída de um bem, haverá débito; toda vez que houver entrada do
bem, persistirá um crédito. O IPI será apurado mensalmente, fazendo valer
compensação entre débitos e créditos do sujeito passivo. Dessa feita, o imposto
devido em um mês será igual a todos os débitos, abstraindo-se os créditos
referentes ao mesmo período, realizando o princípio da não-cumulatividade do IPI
(art. 153, § 3º, II, CF/88). Além disso, a exação possui repercussão do encargo
financeiro, uma vez que é repassado no preço da mercadoria. De fato, o
adquirente do bem recebe a carga tributária do alienante dentro da cadeia
comercial.
Quando o alienante realiza a venda, escritura o débito em seu livro de
registro cabível. Na seqüência, o adquirente escritura o crédito decorrente e o
120
débito da saída, assim como todos os demais componentes da cadeia de
consumo. Ex.: alíquota de 4% sobre o produto que sai de “A”, cujo valor é de R$
100; “B”, o adquirente, processou o bem e o vendeu por R$ 200; na primeira
etapa, o IPI devido será de R$ 4; “A”, então, realiza a venda por R$ 104,
repassando o tributo para “B” e escriturando o débito correspondente (R$ 4); “B”
escritura o crédito consectário (R$ 4); supondo que “B” venda o produto
processado a “C”, com alíquota também de 4%; “B” aplica o preço completo de
R$ 208, escriturando R$ 8 como débito; consequentemente, “C” escritura crédito
decorrente (R$ 8); na compensação, “A” recolhe R$ 4, “B”, R$ 4 (8-4); “C” só teve
crédito de R$ 8, não devendo nada ao fisco, ficando acumulado para o próximo
mês.
Querela relevante se coloca quanto à alíquota zero atribuída ao IPI em
determinadas operações. O ICMS usa, atualmente, as mesmas regras de não-
cumulatividade do IPI (art. 155, § 2º, I, CF/88). No entanto, o constituinte
expressamente determinou que a isenção ou não-incidência de ICMS, ressalvada
previsão contrário do legislador, não implicará em crédito para operação seguinte,
quando houver isenção ou não-incidência na entrada (art. 155, § 2º, II, “a”,
CF/88). Em melhores palavras, a operação de saída, quando isenta ou quando
não haja incidência de ICMS, não levará a direito ao crédito correspondente na
próxima etapa da cadeia. O crédito está condicionado à incidência integral da
exação na operação anterior. Nesse contexto, a Constituição de 1988 nada
dispôs sobre o IPI, suscitando dúvida sobre a aplicação analógica ou não da
mesma regra. Os contribuintes passaram a defender que o direito a crédito é
incondicionado, independentemente da incidência ou não nas operações
posteriores e anteriores, já que, no ICMS, o constituinte expressamente falou, e
no IPI, silenciou. Por volta de 1998 e 2000, o Pleno do STF firmou entendimento
a favor do sujeito passivo, fundando-se na ausência de ressalva expressa, ao
contrário do que fez o constituinte quanto ao ICMS. Em meados de 2005, a
querela foi trazida à baila novamente. Ao revés da orientação anterior, o STF, no
início de 2007, operou mutação constitucional154. Segundo o Excelso Pretório,
para produtos tributados com alíquota zero (espécie de isenção, segundo o
próprio Supremo) ou não tributados, inexiste direito a crédito na operação
seguinte dentro da cadeia comercial. Na ocasião, em questão de ordem (QO), o
Ministro Ricardo Lewandowski, em nome da segurança jurídica, propôs a
aplicação prospectiva do novo entendimento, operando efeitos “pro futuro”. Por
dez votos a um, a QO foi rejeitada, conferindo efeitos “ex tunc” à interpretação.
No entanto, o STF nada falou sobre produtos imunes e isentos “em sentido
estrito”, pairando querela sobre a matéria. Advogando em prol da União, a PGFN
levanta interpretação literal do art. 153, § 3º, II, CF/88, uma vez que o constituinte
fala em compensação de créditos mediante “montante cobrado” nas operações
anteriores. Não havendo cobrança, não há de se falar em crédito na operação
seguinte de saída.
Quando ocorre situação inversa, em que há crédito na entrada (matéria-
prima, material de embalagem ou intermediário), mas o produto é isento ou
contemplado com alíquota zero na saída, o art. 11, Lei 9779/99, autoriza a
154
STF, RE’s 370682 e 353657.
121
manutenção do crédito em IPI (adquirido na entrada), bem ao inverso do que
ocorre no ICMS (art. 155, § 2º, II, “b”, CF/88). Descabe analogia na aplicação do
comando em tela, não atingindo produto, na saída, imune ou não tributado. Da
mesma forma, o bem da entrada deve ser matéria-prima, material de embalagem
ou intermediário, não alcançando qualquer outro. Ocorrendo qualquer dessas
hipóteses, em face da interpretação restritiva do dispositivo legal em tela, o
crédito anterior deve ser anulado. Essa visão decorre do que já disse
analogamente o STF, quanto às entradas com alíquota zero ou não tributados.
Em verdade, o precedente do STF tem o condão de dar o mesmo tratamento
entre ICMS e IPI, o que permite postular em favor da Fazenda federal155.
O inciso III estabelece que não haverá incidência de IPI na exportação156.
Deste modo, a legislação permite que o contribuinte mantenha um crédito
tributário para com o fisco federal, com o fim compensar em outros tributos de
competência da União. O dispositivo tem por fim incentivar a atividade de
exportação.
Crédito prêmio – era dirigido àqueles industriais que desejassem adquirir
novas tecnologias em produtos industrializados importados, a título de melhoria
do maquinário. Eles teriam isenção de IPI. Previa assim, o legislador, que os
apontamentos desta conta gráfica fossem lançados à parte. Todavia, a despeito
de conceder um benefício para a economia, haveria uma majoração grande na
ponta da linha, incidente sobre o consumidor final, porquanto houve incremento
dos custos. Entretanto, o legislador extinguiu o respectivo crédito sem a
necessária contraprestação por parte do governo. As empresas, então, foram a
juízo para requerer o devido. A ação encontra-se em trâmite no STF.
Fato gerador – o IPI incide no momento do desembaraço aduaneiro de
produto industrializado importado, da saída de produtos industrializados do
estabelecimento manufatureiro (emissão da nota fiscal) e da arrematação de
produtos industrializados abandonados ou apreendidos, acordo com o art. 46, I a
III, CTN. Em verdade, as operações delineadas trazem a lúmen os sujeitos
passivos do imposto.
Aspecto subjetivo – o SUJEITO PASSIVO será o importador, os
estabelecimentos industriais, os comerciantes e o arrematante, além dos
equiparados (art. 51, I a IV, CTN). Em melhores palavras, os contribuintes do IPI
são o arrematante em hasta pública, os industriais (ou equiparados) e o
importador, bem como o comerciante de produtos sujeitos ao imposto, que os
forneça aos industriais contribuintes. Equiparação tributária instrumento
meramente fiscal que só pode ser determinado em lei. O fato de um comerciante
ser equiparado, não significa que se tornou industrial, mas que passa a ser
tratado da mesma forma que este.
O comerciante atacadistas de insumos (matérias-primas, produtos
intermediários e material de embalagem) são equiparados, facultativamente, aos
industriais (art. 11, I, RIPI). Se optarem pela equiparação, nos termos do art. 14, I,
155
STF, RE 353657/PR, rel. Min. Marco Aurélio, j. 25.6.2007, Informativo do STF nº 473; RE 370682/SC, rel. Min. Ilmar
Galvão, j. 25.6.2007.
156
Para alguns autores, o dispositivo é entendido como imunidade. Em contrário senso, para a maioria da doutrina, é caso de
não incidência.
122
“a” a “c”, RIPI, destacarão o IPI relativo à saída na nota fiscal. Tal equiparação
objetiva possibilitar o crédito do IPI pelos estabelecimentos industriais que
adquirirem insumos de comerciantes atacadistas. Se o comerciante atacadista
não optar pela equiparação industrial, mesmo assim é possível ao adquirente
efetuar o crédito do IPI mediante a aplicação de alíquota a que estiver sujeito o
produto sobre 50% do valor constante na nota fiscal (art. 165, RIPI/02)
Base de cálculo – na importação, o valor da operação, acrescido de
eventuais taxas aduaneiras, será a base de cálculo (art. 47, I, CTN). Na saída da
indústria, é o valor do produto acabado (art. 47, I, “a”, CTN). Sendo este
desconhecido, será tomado o seu valor da praça local de um produto similar (art.
47, I, “b”, CTN), isto é, no mercado atacadista. No arremate, será o valor da
arrematação (art. 47, III, CTN). Em resumo, com relação à base de cálculo do IPI,
temos:
• Na importação = valor de base para o II (preço livre do produto + frete +
seguro) + II + taxas de entrada + encargos cambiais157.
• Nas operações internas = valor da operação158 ou do produto na praça.
O ICMS é parte integrante do preço de saída do produto, sendo que o
seu destaque na nota fiscal é meramente indicativo do valor que o
comprador, se contribuinte do ICMS, pode creditar-se.
• Na arrematação = valor do arremate.
Alíquotas – atendendo o critério constitucional (art. 153, § 3º, I, CF/88) e
legal (art. 48, CTN) da seletividade pela essencialidade, a Tabela do Imposto
sobre Produtos Industrializados (TIPI) apresenta duas regras de hermenêutica
para sua aplicação: a posição mais específica na tabela prevalece sobre as mais
genéricas; os produtos misturados e compostos, cuja classificação não possa ser
efetivada, serão considerados segundo a matéria ou o artigo que lhe confira
característica essencial.
Prazo de pagamento – o decurso para recolhimento do referido tributo tem
algumas características relevantes:
É decendial, ou seja, é apurado e recolhido a cada dez dias;
Admite venda de produtos com prazo de pagamento dilatado;
Quando existe pagamento de duplicata pelo comprador, só no efetivo
adimplemento é que o empresário receberá o total do crédito do IPI
contido na nota fiscal/fatura extraída da duplicata.

157
No desembaraço aduaneiro, a base de cálculo do IPI é complexa, sendo formada por vários componentes. O seu preço em
moeda estrangeira, mais seguro e frete, ou seja, o preço CIF (Cost, Insurance and Freight) convertido em moeda nacional, pela
cotação do câmbio fiscal divulgada pela SRF mediante ato declaratório do Executivo (ADE), acrescido de II, taxas exigidas na
entrada do produto (taxa de armazenagem, capatazias, serventias, etc.) e de encargos cambiais efetivamente pagos pelo
importador ou dele exigíveis (variação cambial entre a data da emissão da licença de importação e o efetivo desembaraço
aduaneiro) a compõe. O montante resultante da soma de todos os itens é, portanto, a base de cálculo do IPI, sobre a qual se
aplicará a alíquota para apurar o imposto devido.
158
Para Paulsen, op. cit., a desconsideração de descontos concedidos no momento da operação e a estipulação de pautas fiscais
pela Secretaria da Receita Federal do Brasil não coadunam com a disposição do art. 47, CTN, conquanto não se observa o
ditame da legalidade tributária (art. 97, CTN) e da hierarquia de diplomas normativos. De igual forma, o referido autor cita
decisões do STJ e do TRF/4 no sentido de não reconhecer a inclusão de juros – na venda realizada a prazo – e de frete por
empresa coligada na base de cálculo da exação do art. 153, IV, CF/88.
123
Se o sujeito passivo do IPI deve pagar em 10 dias e receberá, por
exemplo, em média, em 60 dias, na verdade ele (o responsável tributário) está
antecipando o imposto e financiando o governo federal. Logo, não existe a
possibilidade de enquadrar o responsável como depositário infiel (Lei 8866/94) ou
apropriação indébita antes que seja recebido pelo contribuinte o valor do IPI.
Portanto, apurar o imposto pela data do recebimento das duplicatas é contrário
à lei do IPI. Por essa razão, muitos artigos da Lei 8866/94 estão suspensos por
ADIn.
Lançamento – o IPI é um imposto que se sujeita ao lançamento por
homologação, cabendo ao contribuinte realizar todas as obrigações acessórias
impostas por lei. O Fisco só atuará de ofício no não-recolhimento da exação ou
no seu pagamento a menor. A partir de 1º de janeiro de 2005, a apuração passou
a ser mensal, devendo-se recolher o tributo até o último dia útil da quinzena
subseqüente ao mês de ocorrência dos fatos geradores.
IOF (Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou Relativas
a Títulos ou Valores Mobiliários) – o objeto incide sobre crédito, câmbio, seguro,
títulos ou valores mobiliários. O crédito é sempre representado por títulos. É
imprescindível, para o seu estudo, o conhecimento prévio do universo da
mercancia de títulos. A receita para o Fisco é quase que irrelevante. Toda vez
que o Estado disponibiliza ao cidadão uma utilização de crédito (disponibilidade
imediata para pagamento futuro) oficial, incide o IOF. Trata-se de uma ferramenta
de controle gerencial do meio circulante, assim como é a taxa SELIC,
estabelecida pelo Comitê de Política Monetária (COPOM), o que caracteriza
autêntica finalidade extrafiscal, porém sem perder de vista a função arrecadatória
(SABBAG, 2004, p. 329). A sociedade, por meios contratuais, consegue expandir
tal base oficial. A arrecadação do IOF forma um fundo que visa garantir, de um
modo geral, o sistema financeiro nacional, a ser tutelado pelo próprio BACEN.
Não se confunde com o crédito comercial, tido através de operações de compra e
venda a prazo. O IOF está regulamentado pelo D. 4494/02.
O sujeito passivo pode ser:
o As pessoas físicas ou jurídicas tomadoras de crédito (art. 4º, “caput”, D.
4494/02);
o Os compradores e vendedores de moeda estrangeira,nas operações
referentes à transferência financeira para o exterior (art. 12, “caput”, D.
4494/02);
o As pessoas físicas e jurídicas seguradas (art. 20, D; 4494/02);
o Os adquirentes de títulos ou valores mobiliários, incluindo instituição
financeiras (art. 26, I e II, D. 4494/02).
O fato gerador será:
 Operação de crédito – será a efetiva entrega, total ou parcial, do
montante ou do valor que constitua o objeto da obrigação, bem como a
colocação à disposição do mutuário interessado (art. 3º, “caput”, D.
4494/02), lembrando-se que saque em caderneta de poupança não é
124
159
fato imponível da exação em comento (Súmula 664 do STF) ,
apesar do “factoring” sê-lo160;
 Operação de câmbio – entrega ou colocação à disposição de
moeda nacional, de moeda estrangeira ou de documento
representativo, como é o cheque de viagem, por exemplo, entendo-se
como efetivado o negócio no momento da liquidação do contrato ou
câmbio (art. 11, “caput” e parágrafo único, D. 4494/02);
 Operação de seguro – emissão da apólice ou recebimento do
prêmio (art. 19, “caput” e § 2º, D. 4494/02);
 Operação com títulos e valores mobiliários – é a emissão,
transmissão, pagamento ou resgate deles (art. 25, “caput” e § 1º, D.
4494/02), devendo incidir somente um a vez se ocorrer simultaneidade
entre elas (MACHADO, 1993). Sabbag (2004, p. 331) deixa claro que a
mera posse dos documentos mencionados não é fato gerador do IOF.
A base de cálculo e as alíquotas do IOF são dadas por diversos
dispositivos do D. 4494/02, a depender da hipótese de incidência (SABBAG,
2004, p. 333):
 Operação de crédito – a base de cálculo é o principal mais os juros
efetivos (art. 7º, I a VII, D. 4494/02). O art. 6º, “caput”, D. 4494/02,
determina que a alíquota máxima diária será de 1,5%.
 Operação de câmbio – a base de cálculo será montante da operação em
moeda nacional, recebido, entregue ou posto à disposição do
contratante (art. 13, “caput”, D. 4494/02). A alíquota será de 25% (art.
14, “caput”, D. 4494/02).
 Operação de seguro – a base de cálculo é o prêmio efetivamente pago
(art. 21, D. 4494/02), com alíquota de 25% (art. 22, “caput”, D. 4494/02).
 Operação com títulos e valores mobiliários – a alíquota máxima é de
1,5% ao dia (art. 28, “caput”, D. 4494/02. Para a base de cálculo,
distinguem-se três situações, na conformação do que der a lei (art. 27, I
a IV, D. 4494/02):
Na emissão – é o valor nominal, computando-se o ágio ou deságio;
Na transmissão – será o preço, valor nominal ou valor da cotação em
bolsa;
No pagamento ou no resgate – é o preço.
O ouro é um valor de referência mundial. Ele tem um valor cambiário, em
que pese sua natureza de mercadoria. Desta feita, enquanto ativo financeiro, o
ouro não se sujeita à tributação sobre produto ou mercadoria, sendo entendido
como objeto de incidência do IOF (art. 153, § 5º, CF/88). Trata-se de imunidade
parcial, esculpida em contornos especiais pelo constituinte, sob os auspícios da

159
Súmula 664 do STF: “É inconstitucional o inciso V do art. 1º, da Lei n° 8.033/90, que institui a incidência do imposto nas
operações de crédito câmbio e seguros – IOF, sobre saques efetuados em caderneta de poupança”. O verbete ficou cristalizado
a partir de reiterada jurisprudência do Supremo: STF, RE 232467, j. 29.9.1999, rel. Min. Ilmar Galvão.
160
STF, ADI-MC 1763/DF, j. 20.08.98, rel. Min. Sepúlveda Pertence.
125
unicidade – incidência uma única vez na origem, na extração, em que pese o
fato imponível ser sua negociação posterior (SABBAG, 2004, p. 336). Será
incidente na extração da matéria-prima, segundo alíquota mínima de 1%, a ser
divida de acordo com o art. 150, § 5º, I e II, CF/88: 70% para o Município de
origem e 30% para o Estado de origem (ou DF). Atualmente, a alíquota é
exatamente de 1%, tal qual estabelece o art. 41, D. 4494/02, tendo como base de
cálculo o preço de aquisição do ouro por instituição financeira (arts. 39 e 40,
“caput”, D. 4494/02). No entanto, se o ouro for importado, a base de cálculo será
arbitrado, tendo como referência o valor de mercado doméstico no desembaraço
aduaneiro, calculado em moeda nacional (art. 40, parágrafo único, D. 4494/02).
Em contrário senso, uma vez que o metal seja extraído da natureza e utilizado
em uma escala de produção diversa da atividade exclusivamente financeira,
entender-se-á como objeto material de outra tributação (IPI, ICMS, ISS, etc.). A
disciplina do ouro, como ativo financeiro, está na Lei 7766/89. Antigamente, todo
meio circulante tinha lastro metálico, cotado em outro depositado em agências
oficiais (Casa da Moeda). Hodiernamente, isto continua ocorrendo em parte,
porquanto somente parcela da reserva metálica equivale ao numerário circulante.
A doutrina qualifica o IOF como gravame “flexível”, conquanto suas
alíquotas podem ser estabelecidas pelo Executivo sem observância da
anterioridade ordinária e da noventalidade, a teor dos arts. 153, § 1º, e 150, § 1º,
CF/88 (SABBAG, 2004, p. 335). Sobre o IOF, recai a imunidade recíproca do art.
150, VI, “a”, CF/88. Ademais, a Súmula 185 do STJ161 determina sua não-
incidência no caso de depósitos judiciais.
IR (Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza) – renda e
proventos são espécies do gênero acréscimo patrimonial. Renda é resultante do
capital (aluguéis, lucros, rendimentos financeiros, “royalties”, etc.), do trabalho
(remuneração do labor humano) ou da combinação de ambos (honorários
advocatícios, pagamento pela prestação de serviços, etc.), como prevê o art. 43,
I, CTN. Já os proventos são todos os outros acréscimos não previstos na
categoria anterior. O critério residual também foi adotado pelo constituinte
originário de 1988, dada a UNIVERSALIDADE162 e a GENERALIDADE163 do IR
(art. 153, § 2º, I, CF/88). Para Cassone (2004, p. 373), “a tributação do IR alcance
[sic!] a tudo e a todos, sem ater-se ao critério da seletividade ou distinção entre
pessoas ou profissões”. Todavia, NEM TODA RENDA OU PROVENTO
implicará em IR, posto que ficou relegado ao legislador infraconstitucional a
conferência de alíquota zero, de isenções, de não-incidência, etc., isto é, a seara
de abrangência da hipótese de incidência do IR não é total. Outrossim, a
jurisprudência tende a extrair do manto do fato imponível algumas condutas,

161
Súmula 185 do STJ: “Nos depósitos judiciais, não incide IOF”.
162
A universalidade é um critério do IR que se refere à extensão da base de cálculo, a qual englobará todas as rendas e
proventos, independentemente de origem, considerando-as como unidade, desde que se subsumam à hipótese de incidência.
163
Segundo Difini e Renck, citados por Paulsen, op. cit., a generalidade é um critério que diz respeito à sujeição passiva da
exação. Por ela, o IR abrange todos os contribuintes que pratiquem os atos previstos na hipótese de incidência, de modo
indistinto e “geral”, não se admitindo tratamento diferenciado. Contudo, deve-se observar a progressividade, o que permite,
de certa feita, atingir o ideário da capacidade contributiva individual (alíquotas por classe e restituição do IR), segundo a
previsão do preâmbulo constitucional tributário (art. 145, § 1º, CF/88). Com efeito, a progressividade pode permitir que alguns
– os menos capazes economicamente – não fiquem abrangidos pela incidência do IR, o que relativiza a princípio da
generalidade, previsto no art. 153, § 2º, I, CF/88.
126
como o pagamento de indenização por férias não gozadas (Súmula 125 do
STJ)164 e a licença-prêmio indenizatória não gozada por necessidade do serviço
(Súmula 136 do STJ)165. Também não se deve confundir renda ou provento com
entrada pecuniária. De fato, em regra, não é o movimento de caixa o fato gerador
do IR, porque não se aplica o regime de caixa na exação em comento. O que o
legislador vislumbrou atingir é o regime de competência, em que a aquisição de
disponibilidade jurídica é suficiente para configurar a hipótese abstrata de
incidência do imposto. Na espécie, aplica-se o disposto no art. 116, II, CTN, de
sorte a configurar a renda ou o provento auferido desde a constituição da
situação jurídica tributável. Ex.: em venda à prazo, o fato gerador do IR se
aperfeiçoa desde a celebração do negócio, não havendo qualquer relação entre o
pagamento do tributo e o recebimento das parcelas avençadas.
Excepcionalmente, o legislador permite que o IR se sujeite ao regime de caixa,
quando se dá o recolhimento pelo lucro presumido. No contexto, a hipótese de
incidência e a base de cálculo do IR não se confundem com aqueles afetas à
CONFINS e ao PIS-PASEP, os quais tributam o faturamento e a receita, apesar
de haver autêntico “bis in idem” com a CSLL das pessoas jurídicas, referendada
pela jurisprudência do Supremo166.
Não existe mais que um IR, porque ele é único. Para cada tipo de fato
gerador, há uma incidência diferenciada. Este tratamento diverso para cada um
deles determinará a forma de incidência do IR, dado o fenômeno econômico
tributável (salário, grande capital, operação financeira, etc.). Portanto, a natureza
do acréscimo patrimonial determinará o modo da exação denominada IR.
Entretanto, uma renda não englobada na legislação extravagante poderia
ser tributada pelo IR, dada a regra geral do art. 150, § 1º, I, CF/88, uma vez que é
impossível ao legislador prever todos os fenômenos de acréscimo patrimonial? A
resposta para o quesito é bem mais complexa. Por força do princípio da
legalidade, é possível observar que quase todas as situações estão abarcadas na
legislação infraconstitucional, inclusive no Regulamento do Imposto de Renda
(RIR), veiculado pelo D. 3000/99. Todavia, uma vez que a hipótese de incidência
não esteja abarcada pela estipulação do legislador, há de se perguntar se incide
ou não o IR. Ex.: participação real nos lucros e resultados (PLR) da empresa,
distribuída aos empregados pelo patrão (art. 7º, XI, CF/88, regulamentado pela
Lei 10101/01). O resultado de uma empresa é gênero do qual implica duas
espécies: lucro e prejuízo. Quando a organização tivesse prejuízo, deveria ela
repassá-lo aos obreiros. Isto, de fato, não acontece, persistindo somente os
lucros. Para fins de IR, não há previsão de incisão, apesar de poder ser
classificada como renda (concorrência de capital e trabalho). Outro exemplo:
plano de demissão voluntária (PDV). A empresa abre a oportunidade para a
demissão voluntária de seus empregados, mediante corresponde estímulo
pecuniário ou congênere (plano de saúde estendido, por exemplo). Esta também
não está prevista em leis ordinárias relativas a IR. Algumas empresas recolhem o

164
Súmula 125 do STJ: “O pagamento de férias não gozadas por necessidade do serviço não está sujeito à incidência do
Imposto de Renda”.
165
Súmula 136 do STJ: “O pagamento de licença-prêmio não gozada por necessidade do serviço não está sujeito ao imposto de
renda”.
166
STF, RE 146.733-9/SP.
127
IR, alegando o instituto da responsabilidade; alguns contribuintes contestam
judicial ou administrativamente (por ocasião da declaração anual). Neste sentido,
faltam as hipóteses de incidência perfeitamente delineadas, dado que o Fisco não
pode subsumir o caso concreto a um delineamento incompleto da norma,
realizada de modo genérico. Em regra, a JURISPRUDÊNCIA É VACILANTE,
salvo o caso de PDV, em que a indenização respectiva não fica sujeita à
tributação pela via do IR (Súmula 215 do STJ)167. Entretanto, em face de
julgamento realizado pelo próprio STJ recentemente168, parece que o verbete
poderá ser remodelado pela 1ª Seção da corte, o que ainda resta nebuloso por
ausência de pronunciamento peremptório. Questão de ordem foi suscitada e, por
conseguinte, remetida à apreciação do órgão competente169. Desta feita, o art.
150, § 1º, I, CF/88, e o art. 43, § 1º, CTN, são apenas instrutores da legislação
infraconstitucional objetiva, conquanto evidenciam os critérios da universalidade e
da generalidade. É cediço que o legislador especifique o caso concreto, sob
pena de não-incidência do IR.
Sujeito passivo – é aquele que recebeu o acréscimo patrimonial, tendo
sua definição dirigida pelo princípio da generalidade. Na impossibilidade de se
identificar perfeitamente o devedor, aplica-se o art. 45, “caput”, CTN. É um
comando também genérico, o qual pode ser estendido por lei ordinária. Uma vez
que se observe o acréscimo patrimonial, incide o IR, cabendo ao contribuinte a
prova em contrário. A dificuldade reside em se identificar quem é o verdadeiro
contribuinte. Inclusive, aquele que auferir renda ou proventos de natureza ilícita
também será tributado pelo fisco, dado o desiderato “non olet”, o qual confere
uma interpretação objetiva do fato imponível (art. 118, I e II, CTN). Para Godoy
(apud PAULSEN, 2001), as pessoas físicas que recebam renda ou proventos
acima dos limites de isenção da tabela do IR, devem recolher o tributo por meio
de carnê-leão, aconselhando-se o uso de livro caixa para abater as deduções.
Também serão considerados passivos, na relação jurídico-tributária, aqueles que
tenham ganhado renda ou proventos no exterior – pessoas físicas ou jurídicas
– desde que tenham sua residência ou seu domicílio tributário, respectivamente,
estabelecidos em território nacional170. É o que se denomina de
EXTRATERRITORIALIDADE. Para rendimentos de pessoas físicas, pagos por
pessoas jurídicas (o que inclui o salário), a retenção será mensal e realizada na
fonte (art. 7º, § 1º, Lei 7713/88), o que faz nascer outra espécie de sujeito passivo
da obrigação tributária: o responsável (art. 45, parágrafo único, CTN).
Fato gerador – o momento de sua ocorrência vem especificado no art. 43,
“caput”, CTN. A expressão “disponibilidade econômica ou jurídica” da renda

167
Súmula 215 do STJ: “A indenização recebida pela adesão a programa de incentivo à demissão voluntária não está sujeita à
incidência do imposto de renda”.
168
STJ, 1ª T., AgRg no REsp 883.678-SP, DJU 29/6/2007.
169
STJ, 1ª T., REsp 940.759-SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 18/9/2007, Informativo do STJ n° 332. O argumento maior para a
edição do verbete 215 do STJ foi a aplicação analógica do art. 14, Lei 9468/97, no caso do PDV. Contudo, a 1ª Turma firmou
entendimento de que o diploma regula situação referente a servidores públicos civis, insertos no Programa de Desligamento
Voluntário de servidores civis do Poder Executivo Federal, o que não coaduna com a generalidade conferida pela posição
sumulada.
170
No cômputo no lucro, os rendimentos auferidos no exterior serão computados na determinação do lucro real da pessoa
jurídica correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano. Devem ser convertidos em reais de acordo com
a taxa de câmbio para a venda e caso a moeda não tiver cotação no Brasil, será convertida em US$ e, em seguida, em R$.
Prejuízos e perdas decorrentes de operações não serão compensados com lucros auferidos no Brasil.
128
ou do provento representa o cerne da querela. Estando disponível a riqueza
para o contribuinte, perfaz-se o fato gerador. A disponibilidade econômica é
facilmente identificável. Já a jurídica, pode antecedê-la. Ex.: salário de um
empregado; no dia 10 do mês seguinte, ele recebe seu pagamento referente ao
mês anterior (disponibilidade econômica); porém, ao longo desse período, ele já
tem o direito ao pagamento a cada jornada de trabalho completa (disponibilidade
jurídica).
Disponibilidade jurídica é direito de usar a renda definitivamente
constituído na forma da lei, alcançando os atos e operações colhidos pelo direito,
inclusive resultantes da aplicação de capital. Ex.: lucro nas operações imobiliárias
ou mobiliárias. Disponibilidade econômica é situação de fato irrelevante ao direito
ou até mesmo a atividade lícita. Ex.: jogos, contrabando, juros usurários,etc. A
disponibilidade jurídica sempre será econômica, mas nem sempre a econômica
será jurídica. Destarte, lembra-se que disponibilidade econômica não pode ser
confundida com a financeira. Disponibilidade financeira é o ingresso de dinheiro
no patrimônio particular, independentemente do acréscimo patrimonial.
Dependendo do fenômeno de renda ou provento a ser tributado, o
legislador estabeleceu se o momento da ocorrência do fato gerador será da
disponibilidade jurídica ou econômica. Ex.: salário (econômica); capitalização de
rendimentos mensais, com permanência do montante até um período estipulado
(jurídica); antecipação do 13º salário integral (econômica). A disponibilidade
econômica ou jurídica diz respeito ao aspecto TEMPORAL do IR.
O fato gerador complessivo (formado por vários atos) será regulado
também por estipulação do legislador. Por exemplo, para rendimentos de
pessoas físicas, pagos por pessoas jurídicas (o que inclui o salário), a retenção
será mensal e realizada na fonte (art. 7º, § 1º, Lei 7713/88). Aliás, como bem
assevera Paulsen (2001), o IR apresenta um fato gerador complessivo, em que
se deve determinar, via legislativa, o exato momento de sua ocorrência. Assim
sendo, será possível fazer incidir a exação nesse ínterim. Apesar da idéia de fato
complessivo ser recorrente e bastante prevalente na doutrina, a jurisprudência do
STF não a acolhe. Consoante comentário supra aduzido, o Supremo, por meio de
sua Súmula 584 (já comentada), perfilha a chamada Teoria da Retrospectiva, a
qual provém do estruturalismo alemão. Com efeito, para a corte, o fato gerador
do IR é pontual, ocorrendo no último dia útil do exercício considerado, aplicando-
se a legislação tributária vigente à época da declaração, não aquela atinente ao
momento de efetivação da hipótese de incidência.
Com referência às importações, a parcela dos custos que exceder ao
valor determinado como referência fiscal deverá ser adicionada ao lucro líquido,
para determinação do lucro real. Somente serão dedutíveis ou custos, despesas
e encargos até o valor que não exceda o preço determinado por um dos
seguintes métodos (arts. 241, I a III, RIR, e 18, I a III, Lei 9430/96):
PIC (Método dos Preços Independentes Comparados) – é a média
aritmética dos preços dos bens, serviços ou direitos, idênticos aos
similares apurados no mercado brasileiro ou de outros países, em
operações de compra e venda.
129
PRL (Preço de Revenda Menos Lucro) – é a média aritmética dos
bens ou direitos dos quais são deduzidos os descontos incondicionais
concedidos, os impostos, as contribuições incidentes na venda, a
comissão de corretagem paga e a margem de lucro de 20%, calculada
sobre o preço da revenda.
CPL (Custo de Produção Mais Lucro) – é o custo médio de produção de
bens, serviços ou direitos idênticos aos similares no país onde tiverem
sido originalmente produzidos, acrescido dos impostos e taxas cobrados
pelo referido país na exportação, com margem de lucro de 20% calculada
sobre o custo apurado.
Administração tributária (controle de rendas e proventos) – a primeira
preocupação do legislador foi dividir os contribuintes em dois grupos: pessoas
físicas e jurídicas. Estas duas categorias são incluídas em dois cadastros
unificados: CPF e CNPJ respectivamente. Nenhuma transação, no Brasil, pode
ser realizada sem a inclusão nos mencionados bancos de dados, o que, aos
olhos de alguns juristas, constitui uma ferramenta totalitária de controle social.
Por meio da instituição da Contribuição Provisória de Movimentação Financeira
(CPMF), ficou possível ao Fisco erigir um sistema eficaz na perfeita fiscalização
das rendas e proventos, dado o declarado anualmente para com o recolhido do
citado tributo no mesmo período (art. 1º, § 3º, III, LC 105/01). Caso seja
identificada uma discrepância entre os dados apresentados e aferidos, a SRFB
chama o contribuinte para prestar esclarecimentos administrativamente, cujo
procedimento é vulgarmente conhecido como “malha fina”. Se convincentes os
argumentos exprimidos, não há nenhuma conseqüência jurídica. Do contrário,
recolher-se-á a diferença entre o declarado e o levantado pelo órgão (lançamento
de ofício), incidindo uma multa de 75% sobre tais valores. Ademais, é
encaminhado expediente ao Ministério Público, com o fim de oferecimento de
denúncia pelo delito de evasão de divisas. Por fim, lembra-se que quaisquer
documentos de prova perante o Fisco devem ser guardados por, no mínimo, seis
anos para fins de comprovação do IR.
Base de cálculo – é exprimida, de modo geral, pelo art. 44, CTN.
Entretanto, há três categorias possíveis de renda ou proventos a serem
tributados: real, arbitrado ou presumido. O primeiro é o “quantum” preciso,
dimensionado, CALCULADO. O legislador ordinário vai dar os critérios para sua
aferição. No terceiro, o legislador ordinário criou mecanismos para substituir a
impossibilidade de aferição da renda ou provento real pela metodologia
tradicional. O fisco deve seguir rigorosamente o estabelecido para medir a base
de cálculo presumida, sendo, portanto precisamente legal. Não sendo possível,
aos olhos do poder tributante, a aferição REAL OU PRESUMIDA – as quais cabe
ao contribuinte (lançamento “por homologação”) – o fisco, nos estritos ditames
da norma positiva, arbitra a renda ou o provento do sujeito passivo (lançamento
de ofício). O fisco, então, recusa todo o procedimento operado pelo contribuinte
de modo justificado, ficando o seu arbítrio legal como disposição válida para a
base de cálculo. Na aferição do lucro presumido ou arbitrado, a base de cálculo
é substitutiva da base de cálculo primária (XAVIER apud PAULSEN, 2001). De
fato, como bem diz o citado autor, em um primeiro momento, por opção do
130
contribuinte, afere-se a base de cálculo pelo lucro real. Ainda por opção do
sujeito passivo ou ante a impossibilidade de apurar daquela maneira, recorre-se,
em um segundo momento, ao lucro presumido, tomando-se por referência a
receita bruta (faturamento). Ante a inexistência deste último dado, recorre-se ao
arbitramento fiscal da base de cálculo (lançamento de ofício), levada a cabo, pela
autoridade tributária, por meios indiciários.
O contribuinte do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) pode optar
pelo modelo simples ou completo para a declaração anual. Optando pelo
segundo, a partir da renda tributável, operam-se as DEDUÇÕES, encontrando a
base de cálculo. Sobre esta, incide ALÍQUOTA ZERO, DE 15% OU DE 27,5%, de
acordo com a tabela progressiva estipulada. Já no primeiro, sobre a renda,
subtraímos-se 20% por presunção (guardado o limite máximo estipulado
anualmente), encontrando-se a base de cálculo. A partir daí, segue-se o mesmo
trâmite da declaração completa. Nas deduções do modelo completo, deve-se
comprová-las documentalmente. No simplificado, PRESCINDE-SE desta
exigência. Uma vez que o contribuinte optante pelo completo caia na “malha fina”,
ele deverá apresentar os documentos comprobatórios das deduções. Não
conseguindo fazê-lo, o fisco arbitrará a base de cálculo. Ex.: contribuinte que
declara não ter renda, mas é proprietário de vários imóveis, sobre os quais pende
comodato para com amigos em dificuldade – o fisco arbitra a base de cálculo da
renda, tomando por paradigma o aluguel a ser eventualmente auferido com o
aluguel. O IRPF não incide sobre diversos rendimentos brutos, como ajuda de
custo, indenização de férias ou de licença-prêmio não-gozadas por necessidade
do serviço (Súmulas 125 e 136 do STJ, já mencionadas), alienação de bens de
pequeno valor, alienação de um único imóvel, alimentação, bolsas de estudo,
poupança, etc.
Para as PESSOAS JURÍDICAS, a renda corresponde ao lucro. O lucro
operacional é o faturamento menos custos e despesas operacionais. Para efeitos
do IR, os custos e as despesas que excederem os limites contábeis serão
adicionados ao lucro contábil, através de registro, cálculo e demonstração no
Livro de Apuração do Lucro Real (LALUR) para fins puramente tributários (art.
262, IV, RIR). Com outros resultados, forma o resultado final, chamado de lucro –
quando positivo – ou de prejuízo – quando negativo. A escrituração contábil
deve ser rigorosamente observada. Havendo lucro, esta será a base de cálculo.
O critério temporal é o lapso de 12 meses, referente ao exercício financeiro e
coincidente com o ano civil. Toda vez que o lucro anual da pessoa jurídica
ultrapassa R$ 240.000,00, cobra-se 15% sobre este valor e 10% sobre o
excedente (tabela progressiva). Caso o contribuinte opte pelo LUCRO
PRESUMIDO, o legislador criou um mecanismo análogo ao simples da pessoa
física. É aplicado um percentual sobre o faturamento171, chegando-se à base de
171
Lucro presumido consiste em presumir ou estimar o lucro como um percentual sobre a receita bruta, sendo que tal
percentual varia de acordo com o tipo de atividade. A regra geral determina uma alíquota de 8% sobre a receita bruta. Há
atividades com percentuais específicos: 1,6%: receita proveniente de revenda, para consumo, de combustíveis derivados de
petróleo, álcool etílico carburante e gás natural; 8%: serviços hospitalares e transportes de carga; 16%: atividades de prestação
de serviços de transporte, excetos os de carga, e para as prestadoras de serviço com receita bruta anual não superior a R$
120.000,00; 32%: para atividades de prestação de serviços em geral, intermediação de negócios, administração, locação ou
cessão de bens móveis ou imóveis; 32%: profissões regulamentadas, relacionadas no art. 647 RIR, mesmo com receita bruta
anual não superior a R$ 120.000,00.
131
cálculo. O fisco sempre prefere a declaração por lucro presumido, porque,
nesta modalidade, sempre haverá recolhimento de tributo, independentemente da
sorte financeira da empresa (lucro ou prejuízo). Além disso, a fiscalização é
materialmente mais facilitada, bastando meros cálculos matemáticos. A opção
por lucro real, em contrário, favorece sempre o contribuinte. Na realidade, o
empresário deve planificar o lucro real primeiramente, para, logo depois, decidir
por qual modo de declaração do IR lhe é mais favorável. Ainda mais: por até 30%
de prejuízo, o empresário pode abater de lucro nos exercícios seguintes(art. 42 e
ss., Lei 8981/95). Entretanto, instituições financeiras, empresas com capital
estrangeiro ou que possuam sócios residentes no exterior devem sempre fazer a
declaração pelo lucro real. De fato, o art. 246, I a VI, RIR, determina que as
seguintes pessoas jurídicas são obrigadas a recolher o IRPJ pelo sistema de
lucro real: com receita superior ao limite de R$ 48 milhões, bancos comerciais,
bancos de investimento, sociedades de crédito imobiliário, empresas de
arrendamento mercantil, empresas de seguros, as que tiverem lucros,
rendimentos ou ganhos do exterior, “factoring”, etc.. A declaração do IRPJ deve
ser optada no primeiro mês do exercício financeiro, ao contrário do IRPF, que
será feito no ano seguinte. Neste sentido, valem as consultorias, o histórico da
empresa e as projeções para o futuro.
Antecipação do IR – o carnê-leão é uma forma de retenção de IRPF na
fonte. Em qualquer dos casos de incidência, o período de apuração do IR é de 12
meses. Esta determinação decorre da dificuldade em se precisar o exato instante
da majoração patrimonial (renda), quer seja em uma empresa, quer seja quanto a
uma pessoa natural. Como o fato gerador do IR é complessivo, é possível dividir
a obtenção de acréscimo patrimonial em vários momentos. Desta feita, o Fisco
passou a determinar que a APURAÇÃO fosse ANUAL. Todavia, o erário
necessita de entradas regulares ao tempo de suas necessidades. Para resolver o
entrave, o legislador criou o sistema de antecipação mensal do IR. Só depois do
exercício financeiro anual, então, será feita a apuração e a prestação de contas
correspondente. É também uma forma de amortizar as dívidas e de diminuir a
inadimplência (sonegação) para com o poder tributante. Em face do Direito
Tributário, esta obrigação não é facultativa, mas decorre de lei (“ex lege”). Na
prestação de contas anual, há OBRIGATORIEDADE para todos os contribuintes
(pessoas físicas e jurídicas), de modo a ser apurado um eventual saldo positivo
(restituição do IR) ou negativo (pagamento do IR) para eles.
No tocante ao IRPF, a retenção na fonte é uma obrigação jurídica de
quem é fonte pagadora (necessariamente uma pessoa jurídica). Entretanto,
quando se tem fonte pagadora pessoa física, esta não tem a obrigação de fazer o
recolhimento. Neste caso, o beneficiário desses rendimentos deve fazer o
recolhimento de uma maneira específica, por meio do CARNE-LEÃO. Ele
configura uma obrigação mensal para o IR. Desse modo, o contribuinte calcula o
seu imposto mensalmente, preenche o DARF e recolhe a quantia aduzida. Nesta
situação, além de deduzir os custos de previdência, de dependentes (também
previstos para as fontes pagadoras pessoas jurídicas) e de empregados, o
contribuinte pode incluir os quesitos educação e saúde, os quais só serão
aplicáveis – no primeiro caso – por ocasião da prestação de contas anual. Vale
132
ressaltar também que a forma de contribuição por carnê-leão cabe quando
há mais de uma fonte de renda e somente é aplicável à pessoa física, sendo
fonte pagadora pessoa jurídica ou pessoa física.
O carne-leão não é possível para a pessoa jurídica. Para ela, a
antecipação é diversa. O recolhimento pelo lucro real pressupõe contabilidade
referente a um trimestre, com a correspondente antecipação neste período. Pelo
lucro presumido, a aferição e, por conseguinte, a antecipação são MENSAIS. O
fisco deu uma terceira alternativa, ainda pelo o lucro real: o recolhimento
antecipado dar-se-ia por LUCRO ESTIMADO, fazendo os ajustes necessários
por ocasião da declaração anual. O modo como se estima é idêntico ao lucro
presumido. Uma vez que, em um balanço parcial do ano (seis meses), caso a
pessoa jurídica verifique que há prejuízo no período, ela poderá solicitar a
SUSPENSÃO DAS ANTECIPAÇÕES POR LUCRO ESTIMADO no semestre
posterior.
ICMS (Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e
sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação) – o ICMS é um imposto de grande magnitude normativa e
econômica, consubstanciando um tributo importantíssimo para o Fisco.
Estatisticamente, é a principal fonte de receita derivada das unidades federadas.
Regência legal – a lei instituidora advém de diplomas estaduais, porque o
constituinte deferiu ao legislador decorrente a competência para tal. Ademais,
encontra regulamentação geral nas LC’s federais 24/75 e 87/96 (Lei Kandir,
alterada posteriormente pelas LC’s 92/97, 99/99, 102/00 e 114/02). O DL 406/68
traz normas gerais de natureza financeira para a referida exação. A MP 2199-
14/01, traz comandos sobre a isenção e redução quanto a fundos de
investimentos regionais.
Obs.: qualquer isenção a ser concedida por lei estadual ou distrital deverá
ser precedida de convênio no âmbito das demais unidades parciais da federação,
nos termos do art. 1º, “caput”, LC 24/75 (art. 155, § 2º, XII, “g”, CF/88). Lei ou ato
normativo estadual que venha a contrariar, direta ou indiretamente, a norma
constitucional mencionada é tido como inconstitucional pelo STF172.
Hipóteses de incidência – ele não incide propriamente sobre “venda de
mercadorias”, exclusivamente. Desta feita, o art. 155, II, CF/88, comporta vários
núcleos do tipo tributário (hipóteses de incidência):
- circulação de mercadorias – implica em mudança de titularidade ou em
alteração física da mercadoria. Liga-se à atividade de mercância, ou seja,
produtos que estão na linha da circulação. Portanto, o ATO DE MERCÂNCIA173 é
o que genuinamente caracteriza o ICMS. Nesse sentido, pode haver mudança
física de mercadoria sem a alteração de titularidade ou vice-versa, incidindo o

172
STF, ADIn 2747/DF, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 17.8.2007; ADI 1247 MC/PA, DJU 8.9.95; ADI 2021 MC/SP, DJU
25.5.2001; ADI 3936 MC/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 19.9.2007, Informativo do STF n° 480; ADI 3389/RJ, rel. Min.
Joaquim Barbosa, j. 6.9.2007, Informativo do STF n° 478; ADI 3673/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 6.9.2007, Informativo
do STF n° 478; ADI 2377 MC/MG, DJU 7.11.2003; Plenário, RMS 17949/ES, DJU de 27.9.68.
173
Para Sabbag, op. cit., p. 291, a “circulação de mercadorias (...) [compreende] o trajeto de mercadoria da produção até o
consumo”. No diapasão, Cassone, op. cit., p. 450, arremata o conceito pelo termo “habitualidade”, elemento essencial para
concretizar a atividade mercantil.
133
ICMS, desde que se trate de operação de mercado. A mudança da
titularidade é jurídica e independe de movimentação física do bem (SABBAG,
2004). Ex.: fabricante de roupas movimenta suas mercadorias para participação
de uma exposição do setor em outra cidade – não há mercância, não há
transmissão da titularidade, apesar de haver movimentação de mercadoria; neste
caso, o empresário emite a nota fiscal e registra-a com suspensão do ICMS,
porquanto os produtos retornarão para o estabelecimento original do
comerciante; é o mesmo caso da movimentação física de bens entre matriz e filial
(Súmula 166 do STJ)174. Nesse passo, a aplicação do verbete independe de as
coisas pertencerem ao ativo fixo da empresa, de haver alto valor envolvido ou do
fato do translado não ser habitual, segundo leitura do próprio STJ acerca de seu
posicionamento sumulado175. Outro exemplo: o agricultor vende antecipadamente
sua safra inteira de milho, apesar da plantação ainda não estar completamente
maturada; incide o ICMS, porque há mudança de titularidade, apesar de, no
momento do negócio jurídico, não existir a movimentação física do produto,
aplicando-se o art. 116, II, CTN. É também cediço definir “mercadoria”, tal qual já
se fez no capítulo sobre IPI. Diz-se que é toda coisa ou bem móvel, considerado
produto, o qual destina-se ao comércio (SABBAG, 2004)176. Desta feita, segundo
entendimento do STF, a alienação de bens do ativo imobilizado de empresa não
configura o fato gerador do ICMS (SABBAG, 2004)177. De outra sorte, o comodato
de máquinas e equipamentos não caracteriza fato gerador da exação em tela
(Súmula 573 do STF)178. A atividade comercial só é dispensada no caso de
importação de produtos ou de prestação de serviços no exterior, situações em
que fazem incidir o tributo em tela mesmo que não haja habitualidade por parte
do adquirente ou do prestador (art. 155, § 2º, IX, “a”, CF/88). O ICMS é devido na
saída da mercadoria do estabelecimento, perfilhando a regra geral da não-
cumulatividade pela compensação – “a cada saída, um débito; a cada entrada,
um crédito”.
- prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal – para
Cassone (2004, p. 452), o conceito de serviço, ínsito no art. 155, II, CF/88,
pressupõe a existência de dualidade de figuras: um prestador e um tomador. Está
fora o transporte intramunicipal, o qual será objeto de tributação pela via do
ISSQN (CASSONE, 2004, p. 452). O núcleo do tipo independe da natureza do
que está sendo transportado (passageiro – transporte regular; carga; ou pessoa –
fretamento). Havido o transporte mediante pagamento, consuma-se o fato
gerador. Não importa se há efetivamente o transporte. Basta que o serviço seja
prestado. O fato gerador está ligado ao SERVIÇO DE TRANSPORTE. Ex.:

174
Súmula 166 do STJ: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento da mercadoria de um para outro
estabelecimento do mesmo contribuinte”.
175
STJ, 2ª T., REsp 756.612-RJ, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 18/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
176
A jurisprudência do STF já assentou entendimento sobre os conceitos de produto e de mercadoria, perfilhando as lições de
Carvalho de Mendonça e Fran Martins, citados por Cassone, op. cit., p. 449: “a coisa, enquanto se acha na disponibilidade do
industrial, que a produz, chama-se produto manufaturado ou artefato; passa a ser mercadoria logo que é objeto de comércio
do produtor ou do comerciante por grosso ou a retalho, que a adquire para revender a outro comerciante ou a consumidor;
deixa de ser mercadoria logo que sai da circulação e se acha em poder do consumidor (RE 79.951-SP, RTJ 78/215)”.
177
STF, 2ª T., RE 200379-4/SP, rel. Min. Marco Aurélio, v.u., j. 19.5.1998, DJU 7.8.1998, p. 34; 1ª T., RE 194.300-9/SP, rel.
Min. Ilmar Galvão, v.u., 29.4.1997, DJU 12.9.1997, p. 43.737, RJ/IOB 1/11.633.
178
Súmula 573 do STF: “Não constitui fato gerador do ICM a saída física de máquinas, utensílios e implementos a título de
comodato”.
134
transportadora é contratada para fazer a mudança de uma família; por alguma
razão, a movimentação é obstada; incide o ICMS, pois houve contrato,
pagamento e emissão do “conhecimento de transporte”. É interessante também
destacar que a prestação deve ser onerosa, pois se gratuita for, não há incidência
da exação (SABBAG, 2004). Não estarão incluídos nos fatos geradores os
transportes por dutos e por vácuos. Caso a própria empresa disponha de frota
para fazer a distribuição de suas mercadorias, não há prestação de serviço de
transporte, desde que a empresa não se volte a esta atividade como principal.
Neste caso, o VALOR DO FRETE ESTARÁ EMBUTIDO NO PREÇO da
mercadoria, fato este que acaba não reduzindo a receita do Fisco. Além disso, o
serviço de transporte deve ser efetivado por empresa que o preste em favor de
terceiro. Geralmente, as alíquotas sobre o frete são menores que aquelas para a
operação de circulação de mercadorias. No critério espacial, incide o ICMS onde
a operação começou a ser prestada. Quando a prestação se dá em parcelas,
com transporte de várias peças ou componentes, o fato gerador se configura com
o efetivo transporte da primeira parte. Graças ao art. 2º, II, LC 87/96179, o
transporte aéreo também pode ser abrangido pelo ICMS, referendando a
previsão do Convênio ICMS 66/88 (SABBAG, 2004).
- prestação de serviço de comunicação, ainda que iniciado no exterior – o
exemplo mais comum versa sobre a telefonia. Emissoras radiofônicas e de
televisão abertas não estão sujeitas à tributação do ICMS, porque são
consideradas essenciais e de utilidade pública pela Constituição (art. 155, § 2º, X,
“d”, CF/88, acrescida pela EC 42/03). Nesse caso, não importa que a
comunicação se dê no âmbito de um só município, conquanto o legislador não a
distinguiu, como o fez no transporte interestadual e intermunicipal (CASSONE,
2004, p. 454). Apesar da Lei 8977/95 falar em serviços de TV a cabo, o trabalho
da produtora de programas para a emissora paga (televisão fechada), desde que
não propague o sinal por qualquer meio, não pode ser tributado pela via do ICMS,
cabendo tão-só a exação do ISSQN municipal180.
Incidências (elemento objetivo) – o imposto incide sobre (art. 2º, I a V, e §
1º, I a III, LC 87/96):
I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o
fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e
estabelecimentos similares;
II – prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal,
por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores;
III – prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio,
inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a
repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza;
IV – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não
compreendidos na competência tributária dos Municípios;

179
A LC 87/96 é conhecida como “Lei Kandir”.
180
STJ, 2ª T., REsp 726.103-MG, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 26/6/2007, Informativo do STJ n° 325.
135
V – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos
ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei
complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto
estadual.
VI – a entrada de mercadoria importada do exterior, por pessoa física ou
jurídica, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo
permanente do estabelecimento;
VII – o serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no
exterior;
VIII – a entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo, inclusive
lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia
elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização,
decorrentes de operações interestaduais, cabendo o imposto ao Estado onde
estiver localizado o adquirente.
A energia elétrica é atualmente tributada pelo ICMS, apesar de não
constar do rol do art. 155, II, CF/88. Alguns a consideram insumo de produção,
porquanto seria intrínseca no preço final de todos os produtos. Todavia, quanto
ao consumo residencial, pende uma dúvida, ao considerá-la como mercadoria,
mesmo porque é tida como essencial e vital para as condições mínimas de
dignidade humana, sendo chamada de insumo público. O legislador
infraconstitucional, de fato, utilizou-se da regra prevista no art. 155, § 3º, CF/88,
pois faz parte de um preceito secundário, à exceção do art. 155, II, CF/88. O
constituinte derivado foi “atroz” ao instituir o citado dispositivo, em contrário à
vontade do constituinte originário. Este não incluiu a energia elétrica no rol dos
núcleos dos tipos tributários do ICMS, mas aquele o fez, por intermédio da EC
33/01.
Controvérsia também se estabelece sobre o art. 2º, § 1º, II, LC 87/96:
Art. 2º O imposto incide sobre:
(...).
§ 1º. O imposto incide também:
(...);
II - sobre o serviço prestado no exterior ou cuja
prestação se tenha iniciado no exterior;
(...).
Para Cassone (2004, p. 453), a primeira parte do dispositivo em comento
é inconstitucional, porquanto estabelece regra de incidência tributária
extraterritorial, não prevista no texto do art. 155, II, CF/88.
Características – o ICMS apresenta não-cumulatividade (art. 155, § 2º, I,
181
CF/88) , seletividade em função da essencialidade (de acordo com o arbítrio do

181
Ao contrário do IPI, em que a não-cumulatividade foi determinada diretamente pelo constituinte (art. 153, § 3º, II, CF/88), o
ICMS prescinde de LC regulamentadora para tal (art. 155, § 2º, XII, “c”, CF/88), como não deixa de se ressaltar o mestre
Sabbag, op. cit., p. 298.
136
legislador estadual – art. 155, § 2º, III, CF/88) e alíquotas variáveis de Estado
para Estado, devendo ser observados os limites mínimos estabelecidos em
Resolução do Senado (art. 155, § 2º, V, “a”, CF/88). Atualmente, a Resolução
22/89 estabelece as alíquotas para operações interestaduais, enquanto a
Resolução 95/96, para transporte aéreo. Nas palavras de Sabbag (2004, p. 288),
o imposto em questão pode ser classificado como gravame plurifásico (incide
sobre o valor agregado), real (as condições pessoais do contribuinte são
irrelevantes para o cálculo do devido), proporcional (não há progressividade nas
alíquotas) e fiscal (não é exação regulatória da economia).
O ouro é um valor de referência mundial. Ele tem um valor cambiário, em
que pese sua natureza de mercadoria. Desta feita, enquanto ativo financeiro, o
ouro não se sujeita à tributação sobre produto ou mercadoria, sendo entendido
como objeto de incidência única do IOF (art. 153, § 5º, CF/88). Será incidente na
extração da matéria-prima, segundo alíquota mínima de 1%, a ser divida de
acordo com o art. 150, § 5º, I e II, CF/88: 70% ao Município de origem e 30% ao
Estado de origem ou ao DF. Em contrário senso, uma vez que o metal seja
extraído da natureza e utilizado em uma escala de produção diversa da atividade
exclusivamente financeira, entender-se-á como objeto material de outra
tributação (IPI, ICMS, ISSQN, etc.).
Os programas de computador sofrem dupla disciplina. Em se tratando
de licença ou cessão do direito de uso (propriedade imaterial), não incide o ICMS.
De outra feita, caso haja destinação da produção em massa para o comércio
(“software de prateleira”), cabe a tributação por via do ICMS (CASSONE, 2004, p.
458-480)182. Rememora-se que a primeira hipótese constituirá fato gerador da
CIDE-remessas para o exterior (Lei 10168/01) caso a cessão, a licença ou
transferência de tecnologia se dê em proveito de adquirente, licenciado ou
contratante localizado no estrangeiro.
Caso o produto a ser comercializado também seja objeto de IPI, esse não
integrará a base de cálculo do ICMS (art. 155, § 2º, XI, CF/88). Nesse caso,
devem ser preenchidos três pressupostos cumulativos para que isso ocorra: a
operação de circulação deve ser realizada entre contribuintes; o produto deve ser
destinado ao comércio ou à industrialização; há configuração do fato gerador de
ambas exações.
Não-incidências (isenções) – o imposto não incide sobre (art. 3º, I a IX, LC
87/96):
I – operações com livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua
impressão (art. 150, VI, “d”, CF/88);
II – operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias,
inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou
serviços (art. 155, § 2º, X, “a”, CF/88);
II – operações interestaduais relativas a energia elétrica e petróleo,
inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, quando
destinados à industrialização ou à comercialização (art. 155, § 2º, X, “b”, CF/88);

182
STF, RE’s 176.626-3/SP e 199.464/SP.
137
IV – operações com ouro, quando definido em lei como ativo financeiro
ou instrumento cambial (art. 155, § 2º, X, “c”, CF/88);
V – operações relativas a mercadorias que tenham sido ou que se
destinem a ser utilizadas na prestação, pelo próprio autor da saída, de serviço de
qualquer natureza definido em lei complementar como sujeito ao imposto sobre
serviços, de competência dos Municípios, ressalvadas as hipóteses previstas na
mesma lei complementar;
VI – operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de
propriedade de estabelecimento industrial, comercial ou de outra espécie;
VII – operações decorrentes de alienação fiduciária em garantia, inclusive
a operação efetuada pelo credor em decorrência do inadimplemento do devedor;
VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda
do bem arrendado ao arrendatário;
IX – operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de
bens móveis salvados de sinistro para companhias seguradoras.
Equipara-se às operações de que trata o item II a saída de mercadoria
realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a (art. 3º,
parágrafo único, I e II, LC 87/96):
a) empresa comercial exportadora, inclusive “tradings” ou outro
estabelecimento da mesma empresa;
b) armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.
Contribuinte (elemento subjetivo passivo) – contribuinte é qualquer
pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que
caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou
prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior (art.
4º, “caput”, LC 87/96).
É também contribuinte a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem
habitualidade (art. 4º, parágrafo único, I a IV, LC 87/96):
I – importe mercadorias do exterior, ainda que as destine a consumo ou
ao ativo permanente do estabelecimento;
II – seja destinatária de serviço prestado no exterior ou cuja prestação se
tenha iniciado no exterior,
III – adquira em licitação de mercadorias apreendidas ou abandonadas;
IV – adquira lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos derivados de
petróleo e energia elétrica oriundos de outro Estado, quando não destinados à
comercialização ou à industrialização.
Cálculo do ICMS – no caso de saída de mercadoria, a alíquota incidirá
sobre o total da operação (art. 3º, § 1º, I, LC 87/96, com base no art. 2º, § 7º, DL
406/68). É o que a doutrina denomina ICMS “por dentro”, segundo dizem Sabbag
(2004, p. 306) e Cassone (2004, p. 462). Ex.: mercadoria custa R$ 500, com
alíquota de ICMS de 12%; do total da operação (100%), deve ser abatida a
138
alíquota (12%), obtendo-se a percentagem real (88%); obtém-se o coeficiente
dividindo-se o total (100%) pela percentagem real (88%), ou seja, 1,13636;
multiplica-se o valor da mercadoria (R$ 500) pelo coeficiente (1,13636), obtendo-
se o valor total (mercadoria + imposto), isto é, R$ 568,18: o contribuinte de fato
paga esse valor, ficando R$ 500 para o comerciante e R$ 68,18 (12% de 568,18)
para o fisco. Essa ginástica aritmética foi considerada constitucional pelo STF183.
Segundo o art. 13, § 1º, II, “a”, LC 87/96, os descontos concedidos sob
condição (pagamento a prazo, por exemplo), integram a base de cálculo do
ICMS. Essa disposição não atinge o preço da mercadoria no caso de desconto
concedido diretamente no momento da operação, à vista do adquirente
(CASSONE, 2004, p. 462). No mesmo comando, o legislador complementar
determinou que os juros devem integrar a base de cálculo também. Tratando-se
de frutos decorrentes de financiamento, a própria jurisprudência não encontra
melhor pacificação. Julgados menos hodiernos do STF propugnavam pela sua
inclusão no montante para o cálculo da exação, com fulcro no art. 13, § 1º, II, “a”,
CF/88. Ex.: financiamento de parte do preço por meio de cartão de crédito,
considerando a base de cálculo o valor total da nota fiscal184. Em contrário senso,
julgados mais recentes do STJ determinam a exclusão dessa espécie de juros da
base de cálculo, pelo fato do financiamento constituir operação distinta daquela
relativa à mercância (Súmula 237 do STJ)185, sendo tributada por meio do IOF
(art. 64, I, CTN).
Local da operação ou da prestação (elemento espacial) – o local da
operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do
estabelecimento responsável, é (art. I a IV, LC 87/96):
I – tratando-se de mercadoria ou bem:
a) o do estabelecimento onde se encontre, no momento da ocorrência do
fato gerador;
b) onde se encontre, quando em situação irregular pela falta de
documentação fiscal ou quando acompanhado de documentação inidônea, como
dispuser a legislação tributária;
c) o do estabelecimento que transfira a propriedade, ou o título que a
represente, de mercadoria por ele adquirida no País e que por ele não tenha
transitado;
d) importado do exterior, a do estabelecimento onde ocorrer a entrada
física;
e) importado do exterior, o do domicílio do adquirente, quando não
estabelecido;
f) aquele onde seja realizada a licitação, no caso de arrematação de
mercadoria importada do exterior e apreendida;

183
STF, RE 212209/RS, j. 30.6.1999, Informativo do STF n° 154.
184
STF, RE 101103-3/RS.
185
Súmula 237 do STJ: “Nas operações com cartão de crédito, os encargos relativos ao financiamento não são considerados no
cálculo do ICMS”. No mesmo sentido, STJ, 1ª T., REsp 67947/MG, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, RJ/IOB 1/9.826.
139
g) o do Estado onde estiver localizado o adquirente, inclusive
consumidor final, nas operações interestaduais com energia elétrica e petróleo,
lubrificantes e combustíveis dele derivados, quando não destinados à
industrialização ou à comercialização;
h) o do Estado de onde o ouro tenha sido extraído, quando não
considerado como ativo financeiro ou instrumento cambial;
i) o de desembarque do produto, na hipótese de captura de peixes,
crustáceos e moluscos;
II – tratando-se de prestação de serviço de transporte:
a) onde tenha início a prestação;
b) onde se encontre o transportador, quando em situação irregular pela
falta de documentação fiscal ou quando acompanhada de documentação
inidônea, como dispuser a legislação tributária;
c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese da utilização,
por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha iniciado em outro Estado e
não esteja vinculada a operação ou prestação subseqüente;
III – tratando-se de prestação onerosa de serviço de comunicação:
a) o da prestação do serviço de radiodifusão sonora e de som e imagem,
assim entendido o da geração, emissão, transmissão e retransmissão, repetição,
ampliação e recepção;
b) o do estabelecimento da concessionária ou da permissionária que
forneça ficha, cartão, ou assemelhados com que o serviço é pago;
c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese da utilização,
por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha iniciado em outro Estado e
não esteja vinculada a operação ou prestação subseqüente;
d) o do estabelecimento ou domicílio do tomador do serviço, quando
prestado por meio de satélite;
d) onde seja cobrado o serviço, nos demais casos.
IV – tratando-se de serviços prestados ou iniciados no exterior, o do
estabelecimento ou do domicílio do destinatário.
Ocorrência do fato gerador (elemento temporal) – considera-se ocorrido o
fato gerador do imposto no momento (art. 12, I a XIII, LC 87/98):
I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que
para outro estabelecimento do mesmo titular;
II – do fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias por
qualquer estabelecimento;
III – da transmissão a terceiro de mercadoria depositada em armazém
geral ou em depósito fechado, no Estado do transmitente;
140
IV – da transmissão de propriedade de mercadoria, ou de título que a
represente, quando a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento
transmitente;
V – do inicio da prestação de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal, de qualquer natureza;
VI – do ato final do transporte iniciado no exterior;
VII – das prestações onerosas de serviços de comunicação, feita por
qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a
retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza;
VIII – do fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:
a) não compreendidos na competência tributária dos Municípios;
b) compreendidos na competência tributária dos Municípios e com
indicação expressa de incidência do imposto da competência estadual, como
definido na lei complementar aplicável,
IX – do desembaraço aduaneiro das mercadorias importadas do exterior;
X – do recebimento, pelo destinatário, de serviço prestado no exterior;
XI – da aquisição em licitação pública de mercadorias importadas do
exterior apreendidas ou abandonadas;
XII – da entrada no território do Estado de lubrificantes e combustíveis
líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica oriundos de outro
Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização;
XIII – da utilização, por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha
iniciado em outro Estado e não esteja vinculada a operação ou prestação
subseqüente.
Substituição tributária – a Lei estadual poderá atribuir a contribuinte do
imposto ou a depositário, a qualquer título, a responsabilidade pelo seu
pagamento, hipótese em que o contribuinte assumirá a condição de substituto
tributário (arts. 5º e 6º, “caput”, LC 87/96).
A responsabilidade poderá ser atribuída em relação ao imposto incidente
sobre uma ou mais operações ou prestações, sejam antecedentes,
concomitantes ou subseqüentes, inclusive ao valor decorrente da diferença entre
alíquotas interna e interestadual nas operações e prestações que destinem bens
e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, que seja contribuinte do
imposto (art. 6º, § 1º, LC 87/96).
A atribuição de responsabilidade dar-se-á em relação a mercadorias ou
serviços previstos em lei de cada Estado (art. 6º, § 2º, LC 87/96).
É assegurado ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor do
imposto pago por força da substituição tributária, correspondente ao fato gerador
presumido, que não se realizar (art. 10, “caput”, LC 87/96).
Não-cumulatividade, crédito e estorno de ICMS – o imposto é não-
cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à
141
circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas
anteriores pelo mesmo ou por outro Estado (art. 19, LC 87/96). É assegurado ao
sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em
operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no
estabelecimento (art. 20, “caput”, LC 87/96). Exemplo: total do ICMS devido pelo
sujeito passivo – R$ 50.000,00; valor do imposto anteriormente cobrado,
decorrentes de entradas de mercadorias – R$ 10.000,00; valor do ICMS a pagar
– R$ 50.000,00 - R$ 10.000,00 = R$ 40.000,00.
Com efeito, a LC 87/96, com as devidas alterações da LC 102/00, permitiu
o crédito de ICMS em favor do contribuinte a partir da escrituração de entrada de
ativo financeiro no estabelecimento – “a cada entrada, um crédito”. Sendo o ativo
alienado em até cinco anos, o crédito será definitivo. Do contrário, o contribuinte
deverá estornar à Fazenda o valor à razão de 20% ao ano ou proporcionalmente
em 1% ao mês (art. 21, § 1º, LC 87/96). Entretanto, caso a operação for isenta ou
não tributada, diga respeito à operação estranha à empresa, seja consumida em
processo que leve a produto não tributo pelo imposto ou venha a deteriorar-se,
perecer ou perder-se, o crédito não vige, devendo o contribuinte também realizar
o estorno (art. 21, I a IV, LC 87/96). Quando a operação subseqüente for de
exportação, não haverá estorno do crédito à Fazenda em qualquer hipótese (art.
21, § 2º, LC 87/96). Crédito semelhante é garantido quanto à energia elétrica
consumida pelo estabelecimento (art. 33, II, LC 87/96). No creditamento de ICMS,
a jurisprudência tranqüila apregoa que descabe incidência de correção monetária,
o que não configura violação da não-cumulatividade e da isonomia.
O direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco anos
contados da data de emissão do documento (art. 23, parágrafo único, LC 87/96).
De outra sorte, o art. 155, § 2º, II, “a” e “b”, CF/88, não permitiu a
compensação na cadeia mercadológica se alguma de suas fases goza de alguma
espécie de não-incidência ou de isenção. Nessas hipóteses, não há de argüir a
regra da não-cumulatividade. De fato, não dão direito a crédito as entradas de
mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações
isentas ou não-tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à
atividade do estabelecimento (art. 20, § 1º, LC 87/96). Salvo prova em contrário,
presumem-se alheios à atividade do estabelecimento os veículos de transporte
pessoal (art. 20, § 2º, LC 87/96).
É vedado o crédito relativo à mercadoria entrada no estabelecimento ou a
prestação de serviços a ele feita (art. 20, § 3º, I e II, LC 87/96):
I – para integração ou consumo em processo de industrialização ou
produção rural, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver
isenta do imposto, exceto se se tratar de saída para o exterior;
II – para comercialização ou prestação de serviço, quando a saída ou a
prestação subseqüente não forem tributadas ou estiverem isentas do imposto,
exceto as destinadas ao exterior.
142
O sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto de que se tiver
creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no
estabelecimento (art. 21, I a IV, LC 87/96):
I – for objeto de saída ou prestação de serviço não tributada ou isenta,
sendo esta circunstância imprevisível na data da entrada da mercadoria ou da
utilização do serviço;
II – for integrada ou consumida em processo de industrialização, quando a
saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto;
III – vier a ser utilizada em fim alheio à atividade do estabelecimento;
IV – vier a perecer, deteriorar-se ou extraviar-se.
No entanto, não se estornam créditos referentes a mercadorias e serviços
que venham a ser objeto de operações ou prestações destinadas ao exterior (art.
20, § 2º, LC 87/96). Quando houver incorporação do bem ao ativo permanente do
contribuinte antes de passados cinco anos contados da aquisição, o estorno
deverá ser feito à razão de 20% ao ano ou fração que faltar para completar o
lustro (art. 20, § 1º, LC 87/98).
O Convênio 115/96, versando sobre ICMS, confere prerrogativa para os
Estados estabelecerem redução da base de cálculo do tributo no tocante a
serviço de radiochamada (cláusula 2ª, parágrafo único, Convênio 115/96). A
prestação em comento, popularmente conhecida como “pager”, geralmente
também envolve a comercialização de aparelhos, fato esse que não está
abarcado expressamente pela norma. Com base nessa interpretação, o STJ
pronunciou o descabimento de não-creditamento nas operações que envolvam a
mercância dos equipamentos mencionados, porquanto não abrangidos pela
norma convencional esculpida186.
Formulado o pedido de restituição e não havendo deliberação no prazo de
noventa dias, o contribuinte substituído poderá se creditar, em sua escrita fiscal,
do valor objeto do pedido, devidamente atualizado segundo os mesmos critérios
aplicáveis ao tributo (art. 10, § 1º, LC 87/96). Sobrevindo decisão contrária
irrecorrível, o contribuinte substituído, no prazo de quinze dias da respectiva
notificação, procederá ao estorno dos créditos lançados, também devidamente
atualizados, com o pagamento dos acréscimos legais cabíveis (art. 10, § 2º, LC
87/96).
As obrigações consideram-se liquidadas por compensação até o montante
dos créditos escriturados no mesmo período mais o saldo credor de períodos ou
períodos anteriores (art. 24, “caput”, 2ª parte, e I, LC 87/96), se for o caso. Se o
montante dos créditos superar os dos débitos, a diferença será transportada para
o período seguinte (art. 24, III, LC 87/98).
A Lei estadual poderá, nos casos de saldos credores acumulados, permitir
que (art. 25, § 1º, I e II, LC 87/96):
I – sejam imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu
no Estado;
186
STJ, 2ª T., REsp 805.795-RJ, rel. Min. Eliana Calmon, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
143
II – sejam transferidos, nas condições que definir, a outros contribuintes
do mesmo Estado.
Desembaraço aduaneiro – mesmo antes da LC 87/96, o STF entendia
como legítima a cobrança de ICMS no desembaraço aduaneiro, decorrente de
operação de importação de mercadoria187. A posição ficou sedimentada por meio
de outros julgados188, dando azo à edição da Súmula 661 do STF189, em
substituição ao seu enunciado 577, o qual tinha por fulcro a CF/69 e o art. 1º, II,
DL 406/68. Tratando-se de diferença cambial na cobrança do imposto em
comento, o STJ entende que há de se tomar como balizas referenciais a data do
registro da importação e a entrada da mercadoria no território nacional190. Nas
operações de importação, a alíquota a incidir é a interna, não aquela determinada
para operações interestaduais, segundo já disse o Supremo191.
Construção civil – é fato gerador de ISSQN, não ficando abarcada pelo
ICMS. Dessa feita, em face de previsão de empreitada com o emprego de
materiais a serem fornecidos pelo empreiteiro (art. 610, “caput”, “in fine”, e § 1º,
CC), esses não sofrerão tributação pela via do ICMS quando adquiridos de outro
Estado, no tocante ao diferencial de alíquotas da exação. Os insumos devem ser
utilizados na atividade-fim do administrado para não sofrerem a incidência do
tributo. Com essa idéia, a jurisprudência do STJ fixou entendimento192.
Operações com salvados de sinistros – o art. 3º, IX, LC 87/96, determina a
não-incidência de ICMS em operações de aquisição de salvados por
seguradoras, bens decorrentes de sinistro. Todavia, quando a adquirente
realizava a alienação deles, incidia a referida exação, nos exatos termos de
jurisprudência até então dominante (Súmula 152 do STJ)193. Em que pese a
cristalina e consentânea disposição das cortes, o STF vinha entendendo
diferente. O Pretório Excelso passou a acatar como inaplicável o ICMS também
na operação de alienação dos salvados pela seguradora194. Com base no
entendimento do Supremo, o STJ resolveu alterar sua posição, cancelando o
referido verbete195.
Apreensão de mercadorias – nada obsta que o fisco empreenda a
apreensão de bens sujeitos a ICMS e desacompanhados da correspondente nota
fiscal. Dessarte, essa atuação se presta à identificação do contribuinte, à
materialidade do fato, lavrando-se o auto de infração devido. Não pode a
autoridade tributária permanecer “ad eternum” com as coisas, fato que sugere a
apreensão como modo de coerção para o pagamento da exação. Essa prática é
187
STF, RE 192711/SP, rel. Min. Ilmar Galvão, RJ/IOB 1/11.084.
188
STF, RE 193817/RJ, rel. Min. Ilmar Galvão, m. v., j. 23.10.96.
189
Súmula 661 do STF: “Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do
desembaraço aduaneiro”.
190
STJ, 1ª T., REsp 23533/SP.
191
STF, RE 172282-7/SP.
192
STJ, EREsp 149.946-MS, DJU 20/3/2000; REsp 564.223-MT, DJU 16/8/2004; RMS 12.062-GO, DJU 1º/7/2002; 2ª T.,
REsp 919.769-DF, rel. Min. Castro Meira, j. 11/9/2007, Informativo do STJ nº 331.
193
Súmula 152 do STJ (CANCELADA): “Na venda pelo segurador, de bens salvados de sinistros, incide o ICMS”. Também
TJRJ, RT 726/383.
194
STF, ADInMC 1648/MG, Pleno, rel. Min. Néri da Silveira, v. u., DJU 28.05.99, j. 13.08.97; ADI 1648/MG, rel. Min.
Gilmar Mendes, j. 6.9.2007, Informativo do STF n° 478, com julgamento ainda pendente até a data indicada, mas contando
com cinco votos pela exclusão das operações com salvados da incidência do ICMS.
195
STJ, 1ª Seç., REsp 73.552-RJ, rel. Min. Castro Meira, j. 13/6/2007, Informativo do STJ n° 323.
144
196
repudiada pela jurisprudência , sendo objeto de posição firme na própria
corte máxima (Súmula 323 do STF, já citada).
ICMS – inclusão na base de cálculo da COFINS – STF – interpretação do
art. 2º, “caput”, LC 70/91. Veja, na íntegra, o voto do Min. Marco Aurélio sobre a
matéria, o qual fixou a jurisprudência do Supremo no sentido de não fazer incidir
o ICMS sobre a base de cálculo da COFINS:

24/08/2006 TRIBUNAL PLENO


RECURSO EXTRAORDINÁRIO 240.785-2 MINAS GERAIS
RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO
RECORRENTE : AUTO AMERICANO S/A DISTRIBUIDOR DE PEÇAS
ADVOGADO : ROQUE ANTONIO CARRAZZA
ADVOGADOS : RAQUEL CRISTINA RIBEIRO NOVAIS E OUTROS
RECORRIDA : UNIÃO
ADVOGADA : PFN - ELYADIR FERREIRA BORGES
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – o recurso
extraordinário foi interposto, com alegada base na alínea “a” do permissivo
constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da
3ª Região que implicou a manutenção de entendimento sufragado em
sentença, no sentido da harmonia da contribuição prevista na Lei
Complementar nº 70/91 com a Carta (folha 88 a 90).
Exsurgiram sucessivos embargos de declaração, nos quais a
contribuinte pretendeu ver examinado o pedido sucessivo formulado na
ação, relativo à exclusão da base de cálculo da Cofins do Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços. Ambos foram desprovidos
mediante os acórdãos de folhas 99 a 101 e 115 a 118. O Colegiado
consignou ter sido a matéria amplamente analisada e discutida no âmbito
desta Corte quando do julgamento da Ação Declaratória de
Constitucionalidade nº 1-1/DF, “inclusive no que tange à previsão de se
incluir o ICMS na base de cálculo do tributo, consoante disposto no artigo
2º da Lei Complementar nº 70/91, lei esta, reafirme-se, cuja
constitucionalidade foi declarada e que, por força do artigo 102, § 2º, da
Constituição Federal, não é mais passível de discussão por órgãos
jurisdicionais ou administrativos” (folha 116).
Nas razões do recurso, articula-se com a ofensa ao artigo 195,
inciso I, do Diploma Maior, insistindo-se na inconstitucionalidade do artigo
2º, parágrafo único, da citada lei complementar, no que autorizada a
inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços na base

196
TJDF, MS 38.631-96, rel. Des. Getúlio Moraes Oliveira, j. 02.12.96, DJU 3 30,04.97, p. 8078 – ementa oficial. STJ: REsp
493.316-DF, DJU 2/6/2003; REsp 513.543-PR, DJU 15/9/2003; REsp 789.781-RS, DJU 1º/3/2007; 2ª T., REsp 700.371-CE,
rel. Min. Eliana Calmon, j. 7/8/2007, Informativo do STJ n° 326.
145
de cálculo da Cofins, questão que não teria sido apreciada na ação
declaratória de constitucionalidade. Salienta-se que se desvirtuou o
conceito técnico de faturamento, ao incluir-se o referido tributo na base de
cálculo. Noutro passo, assevera-se que, acaso esta Corte conclua pela
falta de prequestionamento, deverá, antes, declarar a nulidade do julgado
por ofensa aos princípios da ampla defesa e do devido processo legal
(incisos LIV e LV do rol das garantias constitucionais), em face da recusa
do Tribunal de origem de analisar a controvérsia (folha 120 a 134).
A União apresentou as contra-razões de folha 137 a 140,
ressaltando o envolvimento de matéria legal e a harmonia da conclusão
adotada com a “jurisprudência de nossos Tribunais”.
O Juízo primeiro de admissibilidade disse da natureza
infraconstitucional da discussão (folha 140), decorrendo o processamento
do recurso do provimento dado a agravo, oportunidade na qual consignei:
Quando do julgamento da Ação Declaratória de
Constitucionalidade nº 1, o Relator, ministro Moreira Alves, apontou para o
envolvimento, na espécie, apenas dos artigos 1º, 2º, 9º, 10 e 13 da Lei
Complementar nº 70, de 30 de dezembro de 1991. Por isso mesmo, não
foi objeto de deslinde a circunstância de o artigo 2º, parágrafo único, da
mencionada lei englobar, na base do cálculo da COFINS, o ICMS. A
referência feita no voto do ministro Sepúlveda Pertence ganhou contornos
de simples opinião de Sua Excelência a respeito da matéria, no que,
aludindo a memoriais distribuídos, afirmou estar a definição de
faturamento no âmbito da legislação infraconstitucional.
Confira-se com o acórdão publicado na Revista Trimestral de
Jurisprudência nº 156, página 722 a 755. Por outro lado, o tema está a
merecer o crivo de Colegiado desta Corte, definindo-se o alcance do
inciso I do artigo 195 da Constituição Federal.
A Procuradoria Geral da República emitiu o parecer de folha 166 a
169, preconizando o não-conhecimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) – Na
interposição deste recurso, foram observados os pressupostos de
recorribilidade. Os documentos de folhas 33 e 135 revelam a regularidade
da representação processual e do preparo. A recorrente indicou o
permissivo constitucional à folha 120, nos termos do artigo 321 do
Regimento Interno da Corte. Quanto à oportunidade, o acórdão proferido
na apelação restou publicado no órgão oficial de imprensa do dia 27 de
setembro de 1994 (folha 91), terça-feira. A recorrente protocolou
embargos de declaração em 4 de outubro de 1994 (folha 92), terça-feira,
já que o dia 3, segunda-feira, foi feriado forense. As conclusões do
acórdão prolatado nos embargos foram veiculadas no Diário da Justiça de
23 de maio de 1995 (folha 102), terça-feira. Em 29 imediato, segunda-
146
feira, a recorrente interpôs novos embargos de declaração (folha 104),
sendo que o acórdão daí resultante foi publicado no Diário da Justiça de
22 de agosto de 1995 (folha 119), terça-feira. Protocolou-se o
extraordinário em 4 seguinte (folha 120), segunda-feira. Portanto, exsurge
a tempestividade deste recurso, considerada a interrupção instituída pela
Lei nº 8.950/94, que deu nova redação ao artigo 538 do Código de
Processo Civil. Resta examinar o específico, ou seja, a violência ao artigo
195, inciso I, da Constituição Federal.
Sob o ângulo do prequestionamento, não procede o óbice
apontado pela Procuradoria Geral da República. Se é certo que o acórdão
inicialmente prolatado mostrou-se de simplicidade franciscana, apenas
consignando que esta Corte assentou a constitucionalidade da Cofins,
isso ao apreciar a Ação Declaratória nº 1-1/DF (folha 88 a 90), não menos
correto é que a recorrente, atenta ao passo que se avizinhava, no sentido
de adentrar a sede extraordinária, protocolou os embargos declaratórios
de folha 92 à 94, reclamando manifestação sobre a inconstitucionalidade
de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o ICMS (folha 92 a 94).
Pois bem, analisando estes embargos, o Colegiado concluiu que
seria de se presumir o exame do tema no julgamento da declaratória de
constitucionalidade, aludindo à eficácia vinculante do pronunciamento. Já
aqui entendeu, portanto, a Turma julgadora pela inexistência da pecha
quanto à inclusão combatida (folha 99 a 101). Mesmo assim, voltou a
empresa a protocolar novos embargos declaratórios, mais uma vez
reclamando prequestionamento explícito do tema (folha 104 a 112). Aí, a
Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, na forma do
acórdão de folha 115 a 117, refutou a argüição de inconstitucionalidade,
tudo a partir, é certo, da premissa de que assim o teria feito este Plenário
ao apreciar a Declaratória nº 1. Portanto, tem-se como prequestionada a
matéria. A defesa sustentada pela recorrente foi rechaçada pela Corte de
origem, consagrando-se, destarte, a óptica de que a Cofins incide sobre o
ICMS. Sob o ângulo do prequestionamento, exigir mais do que isso é
adotar o fetichismo da forma, a utilização de formas sacramentais. A Corte
já assentou que o prequestionamento, a encerrar o debate e a decisão
prévios do tema jurígeno explorado, nas razões do recurso, como causa
de pedir, a viabilizarem o cotejo, prescinde de referência a artigo,
parágrafo, inciso e alínea – Recurso Extraordinário nº 128.519-2/DF.
Também não vinga o óbice relativo ao envolvimento, na espécie,
de interpretação de norma estritamente legal. O que sustenta a recorrente
é que o decidido pela Corte de origem discrepa da tipologia do tributo, tal
como prevista no artigo 195, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal,
considerado o teor primitivo do preceito, ou seja, anterior à Emenda
Constitucional nº 20/98, no que, na citada alínea, fez inserir como base de
incidência da contribuição devida pelo empregador, juntamente com o
faturamento, a receita, utilizando a adjuntiva “ou”. Há de se examinar,
assim, se a conclusão a que chegou a Corte de origem, refutando a
defesa sobre a inconstitucionalidade de ter-se a incidência do tributo sobre
147
o ICMS, incluindo este no que se entende como faturamento, conflita,
ou não, com o dispositivo constitucional. A tríplice incidência da
contribuição para financiamento da previdência social, a cargo do
empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei,
foi prevista tendo em conta a folha dos salários, o faturamento e o lucro.
As expressões utilizadas no inciso I do artigo 195 em comento hão de ser
tomadas no sentido técnico consagrado pela doutrina e
jurisprudencialmente. Por isso mesmo, esta Corte glosou a possibilidade
de incidência da contribuição, na redação primitiva da Carta, sobre o que
pago àqueles que não mantinham vínculo empregatício com a empresa,
emprestando, assim, ao vocábulo “salários”, o sentido técnico-jurídico, ou
seja, de remuneração feita com base no contrato de trabalho – Recurso
Extraordinário nº 128.519-2/DF.
Jamais imaginou-se ter a referência à folha de salários como a
apanhar, por exemplo, os acessórios, os encargos ditos trabalhistas
resultantes do pagamento efetuado. Óptica diversa não pode ser
emprestada ao preceito constitucional, revelador da incidência sobre o
faturamento. Este decorre, em si, de um negócio jurídico, de uma
operação, importando, por tal motivo, o que percebido por aquele que a
realiza, considerada a venda de mercadoria ou mesmo a prestação de
serviços. A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo,
sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela
percebida com a operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento
diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem
procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando,
por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende
como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins
faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a
beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrá-
lo. A conclusão a que chegou a Corte de origem, a partir de premissa
errônea, importa na incidência do tributo que é a Cofins, não sobre o
faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência de unidade
da Federação. No caso dos autos, muito embora com a transferência do
ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o que decidido, a
incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição
sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção
constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência
da Cofins, o valor devido a título de IPI.
Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma
vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a
um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente
a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir
à incidência da Cofins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela
expressão contida no preceito da alínea “b” do inciso I do artigo 195 da
Constituição Federal. Cumpre ter presente a advertência do ministro Luiz
Gallotti, em voto proferido no Recurso Extraordinário nº 71.758: “se a lei
148
pudesse chamar de compra e venda o que não é compra, de
exportação o que não é exportação, de renda o que não é renda, ruiria
todo o sistema tributário inscrito na Constituição” - RTJ 66/165. Conforme
salientado pela melhor doutrina, “a Cofins só pode incidir sobre o
faturamento que, conforme visto, é o somatório dos valores das operações
negociais realizadas”. A contrário sensu, qualquer valor diverso deste não
pode ser inserido na base de cálculo da Cofins. Há de se atentar para o
princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional
mostre-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e de vocábulos,
ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado
pela doutrina e pela jurisprudência.
Por isso mesmo, o artigo 110 do Código Tributário Nacional conta
com regra que, para mim, surge simplesmente pedagógica, com sentido
didático, a revelar que:
Art. 110. A lei tributária não pode alterar a
definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e
formas de direito privado utilizados, expressa ou
implicitamente, pela Constituição Federal, pelas
Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios para definir ou limitar
competências tributárias.
Da mesma forma que esta Corte excluiu a possibilidade de ter-se,
na expressão “folha de salários”, a inclusão do que satisfeito a
administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão maior,
entender que a expressão “faturamento” envolve, em si, ônus fiscal, como
é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo constitucional,
adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição,
relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante
quer de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS. Se
alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor da
mercadoria. Admitir o contrário é querer, como salientado por Hugo de
Brito Machado em artigo publicado sob o título “Cofins - Ampliação da
base de cálculo e compensação do aumento de alíquota”, em
“CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS – PROBLEMAS JURÍDICOS”, que a lei
ordinária redefina conceitos utilizados por norma constitucional, alterando,
assim, a Lei Maior e com isso afastando a supremacia que lhe é própria.
Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de
cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou
do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os
parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação
geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal
a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso efetivo de
qualquer valor, a cobrança considerado, isso sim, um desembolso.
Por tais razões, conheço deste recurso extraordinário e o provejo
para, reformando o acórdão proferido pela Corte de origem, julgar
parcialmente procedente o pedido formulado na ação declaratória
149
intentada, assentando que não se inclui na base de cálculo da
contribuição, considerado o faturamento, o valor correspondente ao ICMS.
Com isso, inverto os ônus da sucumbência, tais como fixados na sentença
prolatada.
Pergunta: por que o legislador ainda não estabeleceu ICMS sobre
combustíveis e minerais, dado o permissivo do art. 155, § 3º, CF/88?
Resposta: quando não destinado à comercialização ou à industrialização,
o ICMS incide sobre combustíveis, inclusive lubrificantes, derivados de petróleo e
energia elétrica (art. 2º, § 1º, III, LC 87/96). Não tendo tal destino, o legislador
complementar erigiu uma não-incidência legal sobre tais produtos (art. 3º, III, LC
87/96). A partir da disposição do art. 155, § 4º, I a III, CF/88, as situações
abrangidas pela primeira hipótese (de incidência do ICMS) serão assim definidas
quanto ao direito de cobrança do tributo: em se tratando de combustíveis e
lubrificantes derivados de petróleo, o ICMS é devido no local onde houve o
consumo; em se tratando de gás natural, seus derivados e outros combustíveis
não derivados do petróleo, em operações entre contribuintes do ICMS, o imposto
será dividido entre o Estado de origem e de destino, na mesma proporção de
outras mercadorias; na situação anterior, quando o destino comportar não-
contribuinte do ICMS, a exação será devida ao Estado de origem.
Pergunta: quanto aos combustíveis derivados de petróleo, não há
incidência de ICMS somente nas operações interestaduais (art. 155, § 2º, X, “b”,
CF/88)?
Resposta: consoante resposta do item anterior, o imposto em tela incide
quando não for destinado à comercialização ou industrialização, nos termos do
art. 2º, § 1º, III, LC 87/96.
Pergunta: as regras do art. 155, § 2º, X, CF/88 configuram não-incidência
ou imunidades, segundo entendimento doutrinário?
Resposta: são regras de “não-incidência constitucional”, porquanto o
ICMS não inclui os fatos geradores referidos no dispositivo. É o que a doutrina
chama de imunidade, na qual o constituinte erige um “muro de contenção” fora do
universo de incidência do tributo, como diz Rui Barbosa Nogueira.
Pergunta: o art. 155, § 2º, IV, CF/88, determina que resolução do Senado
deve estipular alíquotas nas operações interestaduais. Entretanto, tal diploma
inexiste. Atualmente, quem as determina então?
Resposta: errado, pois a Resolução 22/89 do Senado Federal estabelece
as alíquotas para operações interestaduais. A Resolução 95/96 do Senado
Federal estabeleceu alíquota para prestação de transporte interestadual aéreo.
Pergunta: no caso do art. 155, II, 1ª parte, CF/88 (“circulação de
mercadorias”), por que o contribuinte é aquele do estabelecimento de destino, se
o fato gerador é a saída de mercadoria do estabelecimento de origem, consoante
art. 1º, I, DL 406/68?
Resposta: o ICMS segue um sistema de não-cumulatividade por
compensação entre créditos e débitos tributários. Essa regra, bem próxima do
150
que existe no IPI, seguem um mandamento geral: a cada entrada, um crédito;
a cada saída, um débito. Dessa feita, um dos fatos geradores realmente é a saída
da mercadoria do estabelecimento, a qual implicará em um débito fiscal por parte
do empresário. No entanto, quando ele realizar o recolhimento, deverá abater o
crédito decorrente da entrada do insumo tributado pela mesmo imposto. Assim, a
hipótese de incidência é a saída, mas contribuinte de direito é o empresário que
recebeu o insumo. Além do comando geral da substituição tributária por
compensação, o sistema congrega outras regras, como o não-creditamento da
operação anterior quando a subseqüente é isenta ou acobertada pela não-
incidência, além do cancelamento do crédito de operações anteriores quando
houver quaisquer das intributalidades citadas (art. 155, § 2º, II, “a” e “b”, CF/88).

ITCMD (Impostos sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação de


Quaisquer Bens ou Direitos) – segundo Sabbag (2004, p. 314), o ITCMD
encontra suas raízes na antiguidade clássica romana, onde era aplicada a
chamada “vigésima” sobre heranças e doações. No Brasil, o tributo passou a
existir desde a vinda da família real lusa para o Brasil, em 1810 (CASSONE,
2004, p. 431). Sua constitucionalização, no entanto, só ocorreu a partir da Carta
de 1891, estando presentes em todas suas subseqüentes. A Constituição de
1967, assim como sua EC 1/69, previam o impostos de transmissão como único,
válido para atos “inter vivos” e “mortis causa”. Com o advento da atual CF/88, o
constituinte houve por bem cindi-lo em duas outras exações: o ITCMD, previsto
no art. 155, I, CF/88, a incidir sobre transmissão de quaisquer bens ou direitos,
por fato “causa mortis” ou por ato gratuito (doação), sendo de competência dos
Estados e do DF; o ITBI (art. 156, II, CF/88), o qual tem por base a transmissão
onerosa de bem imóvel, sendo de competência dos Municípios. Trata-se do
mesmo imposto do art. 23, I, CF/67, desdobrado em duas espécies (SABBAG,
2004, p. 314, e CASSONE, 2004, p. 432).
Sujeito passivo – deverá ser estipulado pela LO estadual ou distrital
competente. Nos termos do art. 42, CTN, o obrigado fiscal pode ser: herdeiro ou
legatário (na transmissão “mortis causa”); doador ou donatário (nas doações
“gratuitas”). Dessarte, como bem lembra Sabbag (2004, p. 314), o legislador
estadual pode optar pelo sistema de responsabilidade tributária, atribuindo
subsidiariedade de algumas pessoas no caso de inadimplemento do tributo por
parte do contribuinte originário. É o caso, por exemplo, do notário que não
verificar o recolhimento dos tributos, como previsto no art. 134, VI, CTN, já que
tem essa incumbência “ex vi” do art. 289 da Lei 6015/73. No entanto, no seu
mister, o oficial registrador não deve perquirir sobre o quantitativo recolhido, mas
sim pela efetivação do ato197. Dessa feita, a norma estadual pode eleger qualquer
dos sujeitos passivos como responsáveis pelo recolhimento do ITCMD. Ex.:
doador, caso o donatário não recolha a exação; possuidor, no caso do
cessionário não arcar com o imposto; do oficial de registro, caso não verifique
corretamente o recolhimento dos tributos antes de efetivar o ato de transcrição,
como é o caso do art. 6º, I, III e IV, Lei 8927/88 do Paraná.

197
TJSP, CSM, m.v., j. 11-5-95, DOE-PJ 23-6-95, p. 53-4.
151
Fato gerador – é a transmissão de quaisquer bens ou direitos a título
do falecimento de alguém ou em decorrência de ato gratuito (SABBAG, 2004, p.
315). Entende-se por transmissão a passagem de propriedade de bens ou
direitos sob o aspecto jurídico. Esse fato deve se dar de forma não-onerosa, quer
em decorrência da morte, quer por ato de liberalidade. Observa-se, em que pese
a previsão expressa do constituinte no art. 155, I, CF/88, que a LC hábil a
estabelecer o fato gerador (art. 146, III, “a”, CF/88) ainda é o CTN, visto que
inexiste outro diploma específico. Nesse caso, o legislador de 1966 só previu a
incidência do ITCMD para bens imóveis, não contemplando os móveis e demais
direitos correlatos (art. 35, “caput”, CTN). Nesse caso, em posição minoritária,
Cassone (2004, p. 433) defende que o legislador não poderia inovar na ordem
jurídica sem a competente LC autorizadora, na medida em que estipula a exação
em tela para bens móveis e seus respectivos direitos. Não é o que vem fazendo
os Estados, com autorização judiciária das cortes. Nesse passo, o autor até
mesmo admite que as unidades federadas possam instituir o ITCMD para móveis
e direitos consectários internamente situados, não atingindo outros situados além
de sua competência territorial. Por derradeiro, impõe-se ressaltar que, no caso de
transmissão por fato “causa mortis”, haverá tantos fatos geradores quanto forem
os herdeiros e legatários, nos termos do art. 35, parágrafo único, CTN. Vale
também lembrar que o recebimento de honorários pelo advogado em ação de
inventário não perfaz fato gerador do ITCMD (Súmula 115 do STF)198. Quando a
operação implicar em incorporação de patrimônio à pessoa jurídica, decorremnte
de capital anteriormente subscrito, ou quando houver incorporação ou fusão de
empresas, não incide a exação em comento (art. 36, I e II, CTN). Na primeira
hipótese, caso haja reversão do valor da integralização por liquidação de cota ou
por extinção da pessoa jurídica, também não haverá incidência do ITCMD (art.
36, parágrafo único, CTN). No entanto, as isenções referidas não são aplicáveis
se a atividade da pessoa jurídica for preponderantemente venda, compra, cessão
e locação de imóveis (art. 37, “caput”, CTN). Ademais, tratando-se de morte
presumida (art. 7º, I e II, CC) ou de ausência (arts. 22 e 23, CC), o ITCMD é
exigível (Súmula 331 do STF)199.
Elemento espacial – o imposto será devido ao Estado ou DF onde se
situam os bens imóveis (e respectivos direitos) ou onde se procede a ação de
partilha de bens (art. 155, § 1º, I e II, CF/88). Entretanto, se o doador tiver
domicílio ou residência no exterior; ou se o autor da herança tinha bens, era
residente ou domiciliado ou teve o inventário aberto no estrangeiro, LC deve
estabelecer os critérios de competência tributária (art. 155, § 1º, III, “a” e “b”,
CF/88). No caso de doações feitas por sociedades por ações, cabe ao Estado de
sua sede o recolhimento do ITCMD respectivo (Súmula 435 do STF)200.
Elemento temporal – estatui o art. 35, “caput”, CTN, que o imposto deverá
ser recolhido na ocorrência do fato imponível, isto é, no momento da transmissão

198
Súmula 115 do STF: “Sobre os honorários do advogado contratado pelo inventariante, com a homologação do juiz, não
incide o Imposto de Transmissão Causa Mortis”.
199
Súmula 331 do STF: “É legítima a incidência do Imposto de Transmissão, Causa Mortis no inventário por morte
presumida”.
200
Súmula 435 do STF: “O Imposto de Transmissão Causa Mortis pela transferência de ações é devido ao Estado em que tem
sede a companhia”.
152
(CASSONE, 2004, p. 436). Nota-se que o legislador complementar autorizou
seu similar estadual a estatuir de outra forma, podendo prever o fenômeno da
substituição tributária (art. 150, § 3º, CTN), quer seja ela para frente ou para trás.
Segundo Sabbag (2004, p. 316), parte da doutrina entende que o fato gerador da
transmissão se dá mediante um complexo de atos, operando-se desde o ajuste
de vontades na doação ou a morte do inventariado no fato “mortis causa”. Para
essa linha de pensamento, o ITCMD deveria ser recolhido desde tal momento,
porquanto o registro do imóvel é o último ato da complexidade citada. Não é o
que apregoa o referido autor. Com fulcro no art. 1245, “caput”, CC, e em
jurisprudência do STJ201, a exigibilidade da exação só se perfaz no momento do
registro imobiliário, ocorrência a caracterizar o fato gerador do ITCMD.
Elemento quantitativo – a base de cálculo é o valor venal do bem ou
direito, tido no momento da transmissão (art. 38, CTN), sobre o qual o cálculo do
ITCMD deve ser feito (Súmula 113 do STF)202. Aliás, antes da homologação
judicial do cálculo, não cabe recolhimento do tributo por ocasião do inventário
(Súmula 114 do STF)203. Aplica-se, “in casu”, o art. 1034, CPC, pelo qual o foro
para discussão da dívida tributária não é a ação de arrolamento, mas sim a via
administrativa. Contudo, apesar de homologados e transitados os cálculos, o
formal ou a carta de adjudicação só será expedida com a prova de quitação de
todos os tributos, oportunidade em que a correção deve incidir sobre todos os
bens do espólio, entendimento ressonante no STJ204. Nesse caso, a decisão
judicial é interlocutória, atacável por agravo e não por apelação205. A alíquota
será fixada pela LO do Estado ou DF, observado o limite máximo de Resolução
do Senado Federal (arts. 39, CTN, e 155, § 1º, IV, CF/88). Atualmente, o diploma
competente é a Resolução 9/92, a qual estipula o percentual teto de 8%. Assim
como a base de cálculo, a alíquota aplicável é aquela vigente à época da
abertura da sucessão, tratando-se de transmissão “causa mortis” (Súmula 112 do
STF)206.
Obs.: havendo multa fiscal a ser rocada aos herdeiros, a jurisprudência
prevalente tem entendido que ela é transmitida, muito pelo qual o princípio da
intranscendência (art. 5º, XLV, CF/88) é setorial, tendo vez somente no terreno do
Direito Penal.
Lançamento – é feito na forma mista, no qual são exigidas informações
por parte do contribuinte e a atuação do fisco para calculá-lo (art. 147, “caput”,
CTN).
IPVA (Impostos sobre Propriedade de Veículos Automotores) – nos
termos do art. 155, III, CF/88, o indigitado tributo tem como fato gerador a
propriedade de veículo automotor de qualquer natureza, englobando meios de
transporte terrestre, aéreos e aquáticos, desde que dotados de força motriz
própria. O domicílio do proprietário é indiferente ao aspecto espacial do gravame,
201
STJ, 1ª T., REsp 12.546-RJ, 21.10.92, e REsp 253.3540-DF, 13.02.01.
202
Súmula 113 do STF: “O Imposto de Transmissão Causa Mortis é calculado sobre o valor dos bens na data da avaliação”.
203
Súmula 114 do STF: “O Imposto de Transmissão Causa Mortis não é exigível antes da homologação do cálculo”.
204
STJ, 2ª T., EDcl no REsp 927.530-SP, rel. Min. Castro Meira, j. 21/8/2007, Informativo do STJ n° 328.
205
TJSP, 1ª C. de Direito Privado, Ap. Civ. 245.777-1/6, v.u., j. 9.4.96.
206
Súmula 112 do STF: “O Imposto de Transmissão Causa Mortis é devido pela alíquota vigente ao tempo da abertura da
sucessão”.
153
porquanto vale o local de registro do bem. Não se incluem os veículos
movimentados por tração animal. É tributo de competência estadual e distrital,
devendo ser regulado por LC (art. 146, III, “a”, CF/88). Na ausência do referido
diploma federal, os Estados e o DF exercem a competência plena (art. 24, § 3º,
CF/88), nos exatos termos do comando do art. 34, § 3º, ADCT. É a posição
assentada no Pretório Excelso207.
No tocante ao conceito de veículo, há de ter força-motriz própria, ainda
que complementar ou alternativa à natural, incluindo-se os veículos conectados à
linha elétrica (Anexo I da Lei 9503/97, Código de Trânsito Brasileiro – CTB).
Quanto à aeronaves, questão polêmica se coloca sobre sua natureza jurídica.
Segundo Sabbag (2004, p. 311), sua definição, dada pelo art. 106, “caput”,
Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA, Lei 7565/86) não coaduna perfeitamente
com o desenhado pelo CTB, porquanto não fala em força motora própria.
Art. 106. Considera-se aeronave todo aparelho
manobrável em vôo, que possa sustentar-se e circular no
espaço aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a
transportar pessoas ou coisas.
Ademais, o art. 38, “caput”, CBA define que os aeroportos, locais onde
elas manobram, são de propriedade da União. Com efeito, as aeronaves são
veículos destinados a circular entre Estado e Municípios, falecendo competência
estadual para a tributação. Não foi o que acolheu o STF, entendendo ser
constitucional a cobrança do IPVA sobre aeronaves208.
O sujeito passivo é o proprietário do veículo automotor, pessoa natural ou
jurídica, ou seja, aquele do qual consta o título de registro do bem (SABBAG,
2004, p. 310). O fato gerador é a propriedade do bem e não o mero uso ou
detenção. É provado por meio do CRLV (Certificado de Registro e Licenciamento
de Veículo).
No aspecto temporal, a partir de 1º de janeiro, a lei estadual pode
estabelecer a cobrança da exação em tela. O momento de aquisição do veículo
também pode ser objeto do IPVA, tratando-se de veículo novo, bem como o
desembaraço aduaneiro é o fato imponível hábil para veículos importados. A
partir desses critérios objetivos, é possível que o legislador estadual estabeleça a
forma temporal de recolhimento do tributo.
No tocante à base de cálculo, a lei instituidora do IPVA pode optar entre o
valor venal ou o preço de mercado, a ser estabelecido em tabela oficial fiscal. É
possível também recorrer a órgãos especializados particulares, como jornais e
revistas que militam na área. O preço estabelecido na nota fiscal ou no formulário
de importação é hábil a determinar a base de cálculo. Acerca da alíquota, em
essência, o IPVA é de base proporcional (SABBAG, 2004, p. 312), cujo valor
mínimo há de ser estabelecido por Resolução do Senado Federal (art. 155, § 6º,
I, CF/88). Visto que esse atualmente falece à existência, o legislador estadual fica
livre para estabelecê-la, desde que observe a vedação ao confisco (art. 150, IV,
CF/88). No entanto, o constituinte derivado, por meio da EC 42/03, quis imprimir
207
STF, AG (AgRg) 167777/DF, DJU 9-5-97; RE 236.931-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, j. 10.8.1999.
208
STF, RE 134509/AM, rel. Min. Marco Aurélio.
154
progressividade facultativa ao IPVA (art. 155, § 6º, II, CF/88), desde que o
legislador estadual assim acate. Dessa feita, pode a lei ordinária instituidora
determinar a diferenciação de alíquotas em função do tipo e utilização do veículo,
o que lhe dá um certo ar de extrafiscalidade.
O lançamento é feito por homologação, cabendo a modalidade “ex officio”
caso o contribuinte falte à sua obrigação. Na repartição de receitas, metade fica
com o Estado e a outra com o Município onde está registrado o bem (art. 158, III,
CF/88).
Veículos de interesse socioeconômico específico, como agroindústria,
transporte público de passageiros e terraplenagem, podem gozar de isenção
(SABBAG, 2004, p. 313). Estarão imunes os veículos de pessoas jurídicas de
Direito Público, de templos, de partidos políticos (inclusive suas fundações), de
entidades sindicais de trabalhadores, de instituições de ensino e assistência
social, sem fins lucrativos, nos exatos termos do art. 150, VI, “a” a “c”, e § 2º,
CF/88. Chimenti (2002, p. 148) assevera que o IPVA é exação eminentemente
fiscal, apesar de comportar viés extrafiscal quando possui alíquotas diferenciadas
pelo tipo de combustível.
Quanto à taxa de licenciamento, Sabbag (2004, p. 313) entende ser
inconstitucional, porque limita indevidamente a circulação de pessoas (art. 150,
VI, CF/88). Na realidade, é exação que decorre do poder de polícia da autoridade
de tráfego e tributária.
Impostos dos Municípios – o art. 156, I a III, CF/88, elenca os impostos
municipais, isto é, aqueles cuja instituição foi conferida aos municípios: IPTU,
ITBI, ISS (de qualquer natureza). Trata-se de comando reduzido, porque abrange
só atribuição de competência. Por imperativo lógico-jurídico, a legislação do caso
concreto é aquela instituída pelo município, a qual terá o condão de instituir e de
disciplinar cada uma das exações.
O Brasil comporta hodiernamente cerca de 5564 leis municipais, cada
uma correspondente a um dos diferentes municípios do país. Pelo grande
número, fica impossível analisar cada um. Mesmo assim, é interessante destacar
que o legislador municipal (infraconstitucional) não pode colidir com a CF, sob
pena de inconstitucionalidade.
No inciso I do art. 156, CF/88, reporta-se ao chamado IPTU: Imposto
sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana. O fato gerador é a propriedade,
posse ou domínio útil de bem imobiliário dentro do limite urbano do município (art.
32, “caput”, CTN). Para Sabbag (2004), podem ser sujeitos passivos do IPTU: o
proprietário, o titular do domínio útil (enfiteuta ou usufrutuário) – de acordo com a
Súmula 326 do STF209 – e o possuidor “ad usucapionem”, não se englobando o
mero detentor (comodatário e locatário). Diz-se que seu fato gerador é
continuado: enquanto houver a posse do bem, incide a exação. Usucapião e
desapropriação, por serem formas de aquisição originária da propriedade, não
pressupõem pagamento de ITBI, exação que exige transmissão, como já disse o
STF210. É cobrado ano a ano. Caso o proprietário transmita a propriedade, o ato
209
Súmula 326 do STF: “É legítima a incidência do imposto de transmissão inter vivos sobre a transferência do domínio útil”.
210
STF, RDA 73/160 e RTJ 117/652.
155
deve ser averbado para que, no ano subseqüente, o novo senhor receba o
carnê fiscal. Já o ITBI só é aplicável para transmissões onerosas (predomínio de
venda).
Em tese, a definição de zona urbana deve encontrar guarida em no
mínimo dois dos melhoramentos previstos no art. 32, § 1º, I a V, CTN, de acordo
com o que dispuser a norma municipal: meio-fio ou calçamento, com canalização
de águas pluviais; abastecimento de água; sistema de esgotos sanitários; rede de
iluminação pública, com ou seu postes para distribuição domiciliar; escola
primária ou posto de saúde a uma distância máxima de três quilômetros do
imóvel considerado. Contudo, é possível o estabelecimento de zona equiparada à
urbana, descontínua a esta, nos termos do art. 32, § 2º, CTN. Em verdade, até a
CF/88, a disposição do CTN era tida como residual em relação ao critério da
finalidade do bem imóvel, a teor do que dispõe o Estatuto da Terra (Lei 4504/64).
Uma vez que se destine a fins agrários, pecuários, extrativistas vegetais ou
agroempresariais, inclusive a ocorrência de mais de um deles, o imóvel será
considerado rural. Com a promulgação da atual Carta, o legislador houve por
bem alterar o referencial. Com efeito, nos termos do art. 182, “caput” e § 1º,
CF/88, será urbana a propriedade incluída no plano diretor, o qual é determinado
por lei local. A norma constitucional foi efetivada por meio do Estatuto da Cidade
(Lei 10527/01), o qual ainda abriu a possibilidade do plano estabelecer distrito
rural dentro do perímetro urbano (art. 4º, V, “f”, Lei 10257/01). No entanto, a
instituição de plano diretor é obrigatória somente para municípios com mais de
vinte mil habitantes, integrantes de regiões metropolitanas ou de aglomerações
urbanas, quando se intente usar instrumentos para assegurar a função social da
propriedade, integrantes de área de interesse turístico ou ambiental (art. 41, I a V,
Lei 10257/01). Em conseqüência, onde existe o plano, aplicam-se os critérios de
diferenciação entre imóvel urbano e rural atinentes ao Estatuto da Cidade e à
própria Constituição; onde inexiste, permanecem os referenciais anteriores
(Estatuto da Terra e CTN).
Tanto o IPTU quanto o ITBI possuem base de cálculo igual: o valor venal
do imóvel (arts. 33 e 38, CTN, respectivamente). Neste sentido, valor venal não é
valor de venda. Por deficiência da Administração Pública, ficou conhecido pelo
valor do cadastro. Na maioria das vezes, o valor venal não tem nenhuma relação
com o correspondente no comércio, pois não existe aferição para corrigir a planta
dos valores venais do imóvel. No IPTU, a base de cálculo não abrange as
benfeitorias, pertenças e móveis atinentes ao prédio, computando-se tão-só as
acessões (art. 33, parágrafo único, CC). Para o ITBI, a base de cálculo é o valor
venal ou o valor da operação, elegendo-se sempre o maior. Ex.: na cidade de
Paraibuna, há uma discrepância entre valor venal (maior) e valor de mercado.
Relevante também ressaltar que as pertenças e as benfeitorias, seja quais forem,
não integram a base de cálculo do IPTU (art. 33, parágrafo único, CTN), o que
não ocorre com o ITBI.
Alguns prefeitos aumentam o valor da base de cálculo por decreto,
atribuindo índice para a atualização, para permitir o aumento da arrecadação.
Todavia, o art. 150, I, CF/88, preconiza que só se poderá aumentar ou instituir
tributos por lei, esculpindo o princípio da legalidade. Se isto for feito por decreto
156
administrativo, há inconstitucionalidade, como bem ventila a Súmula 160 do
STJ211. Na prática, ocorre que a diferença majorada por ato administrativo não é
tão expressiva, ficando mais barato e simples pagar que discuti-la nos tribunais.
Ex.: o ITBI normalmente tem alíquota de 4%. Entretanto, a atualização monetária
regular do valor imobiliário – mera correção monetária – pode ser efetivada por
decreto, consoante o disposto no art. 97, § 2º, CTN, como lembra Sabbag (2004).
Com relação à possibilidade de estabelecer duas bases de cálculo
diferenciadas para o ITBI, surge uma polêmica. Alguns doutrinadores falam que a
hipótese de incidência deve ser precisa, incisiva, não podendo haver dispositivo
que preconize uma ou outra base de cálculo, considerando sempre a maior.
Desta feita, é cediço verificar se o valor da operação e o valor venal estão
consoantes. De uma forma geral, os tribunais locais não têm admitido a
existência de mais de uma base de cálculo para o ITBI – a exação incide sobre o
valor real da venda, não se restringindo ao valor venal do imóvel. Não há
consenso nem pronunciamento dos tribunais superiores.
É importante também destacar algumas particularidades do IPTU. Sua
alíquota pode oscilar entre 0,5 a 1,5%. O art. 156, § 1º, CF/88, estabelece
princípios a serem seguidos. O inciso I afirma que o IPTU deve ser progressivo.
Essa progressividade é diferente daquela prevista pelo art. 145, § 1º, CF/88
(princípio da capacidade contributiva). Diz respeito sim à sua forma de incidência,
não propriamente à adequada capacidade econômica do proprietário. O
constituinte quis permitir variação crescente de imposto em relação ao bem, não
havendo qualquer relação com o potencial tributário do sujeito passivo. Ex.:
posse de imóvel, por herança. O novo proprietário não pode vendê-lo se não
possui condições de recolher o ITBI. O Poder Público não pode simplesmente
conferir capacidade contributiva ao possuidor em razão do imóvel. Por
conseguinte, a progressividade do art. 156, § 1º, I, CF/88 não se refere à
capacidade contributiva do preâmbulo constitucional tributário. O inciso II constitui
ferramenta para o administrador diferenciar as alíquotas, isto é, elas dependem
do critério a ser usado, de acordo com a localização e o uso do imóvel. Ex.:
Fulana tem um imóvel de R$ 200 mil; o valor de seu IPTU será maior em relação
àquele de Cicrano, com quatro imóveis de R$ 50 mil cada. O STF já dizia que
poderia ser progressivo nesse sentido, ou seja, o Pretório Excelso garantia a
competência para isso. Na cidade de São Paulo, estava em julgamento a
constitucionalidade dessa progressividade em função do uso e da localização,
aplicada ao ITBI. O extinto 1º TAC denegou a progressividade, por
inconstitucionalidade, dada a inexistência de previsão para tal na CF/88. O STF
corroborou com a posição, editando a Súmula 656212. É necessário, entretanto,
concordar com as posições de Sabbag (2004), porquanto este aponta uma
flagrante incongruência entre um princípio inerente a exações pessoais aplicado
a um tributo de clara base real, consoante reiterado posicionamento do Excelso
Pretor. Esta assimetria fere os princípios da igualdade tributária, da vedação ao
confisco e da capacidade contributiva, uma vez que pode vir a estabelecer
211
Súmula 160 do STJ: “é defesa ao Município atualizar o IPTU mediante Decreto, em percentual superior ao índice oficial de
correção monetária”.
212
Súmula 656 do STF: “é inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o ITBI com base no valor venal do
imóvel”.
157
gravames incompatíveis com a situação do contribuinte. É o caso do exemplo
retro sobre aquele que recebeu um imóvel a título de herança. Segundo o autor, o
constituinte originária estabelecera a possibilidade de IPTU progressivo para lhe
conferir fundo extrafiscal, forçando o proprietário a adequar seu imóvel à função
social (art. 182, § 4º, II, CF/88). “Ex vi” da EC 29/00, o constituinte derivado
estabeleceu outros três critérios para permitir a progressão da exação: o valor,
localização e uso do imóvel. Nessa situação, não houve autêntica intenção
extrafiscal, mas sim de aumento de arrecadação. Em que pese o Supremo ter
declarado inconstitucional a progressividade para o ITBI por ausência de previsão
legal, acabou corroborando com o constituinte reformador quanto ao IPTU,
lamentavelmente permitindo majoração da carga tributária ao já tão combalido
contribuinte.
O ITBI incide sobre transmissão onerosa de bem imóvel, como alienação,
caução, troca, etc. O art. 156, § 2º, I, CF/88, elenca as chamadas “não-
incidências constitucionais”, tratando-se de autênticas imunidades, nas palavras
de Chimenti (2002, p. 128) e Sabbag (2004). A primeira parte do dispositivo visa
preservar os negócios de pessoas jurídicas em que há transmissão de imóvel,
desde que não penda um efetivo lucro por parte dos adquirentes, subsistindo
somente o aumento do capital imobilizado. Ex.: sócio “A” e sócio “B” de uma
empresa; o sócio “A” tem sala comercial no valor de R$ 50 mil; ele a utiliza para
integralizar seu montante no capital social; “A” passa, então, a ter cota com a
sociedade no valor do imóvel. A segunda parte diz respeito à transmissão de bem
imóvel nos casos de incorporação, cisão, fusão ou extinção de empresa. Na
extinção da pessoa jurídica, o remanescente é dividido entre os sócios. Se
houver, nessa devolução, um imóvel, há transmissão onerosa, mas não há
incidência de ITBI. Ex.: empresa “A” e empresa “B” formam a empresa “C”; o
capital constitui-se de um imóvel e R$ 500 mil; ao se separar a pessoa jurídica,
cada um fica com sua parte. A norma em comento não implica em não-incidência
de ITBI sobre toda operação desta natureza entre pessoas jurídicas. O próprio
art. 156, § 2º, I, CF/88, na sua parte final, estipula uma exceção à não-incidência
constitucional: se a pessoa jurídica tiver como atividade principal compra e venda
de imóveis213, há incidência do ITBI. Ex.: empresa que opera no mercado
imobiliário. Um resumo pode ser aduzido pelo seguinte esquema:

Regra – houve transmissão de forma onerosa, há


incidência de ITBI.
Não incidência – casos do Direito Comercial.
Empresa que opera no mercado imobiliário – há
incidência da exação.

O art. 136, CTN, prevê que a responsabilidade por infrações tributárias


independe do “animus” do agente. Nesta situação, caso o sujeito passivo não

213
Preponderância da atividade, de acordo com a exegese do art. 156, § 2º, I, “in fine”, CF/88, deve englobar mais de 50% da
receita operacional da empresa, nos dois anos anteriores e nos dois subseqüentes, como lembra Sabbag, op. cit.
158
esteja englobado pelas não-incidências constitucionais, deve ele recolher o
ITBI, desde que haja o fato gerador da obrigação. Não assim agindo, fica sujeito
à cobrança pela exação e à imposição de sanção pecuniária.
O imposto sobre serviço de qualquer natureza (ISSQN) está previsto no
art. 156, III, CF/88. Seu fato gerador é a efetiva prestação de serviço, desde que
este não esteja compreendido na competência do Estado (eletricidade, transporte
intermunicipal e interestadual, telefonia), tal qual o art. 155, II, e § 3º, CF/88.
Aliás, o art. 155, § 2º, IX, “b”, CF/88, determina que os serviços tributados por via
do ICMS são residuais em relação ao ISSQN, salvo aqueles expressamente
previstos pelo constituinte como hipótese de incidência do primeiro. O sujeito
passivo é o prestador (empresa ou profissional autônomo) ou tomador do serviço
(contratante dos serviços), não sendo abrangidos os empregados, os avulsos e
os membros de conselhos fiscais e consultivos de sociedades – arts. 2º, III, e 5º,
LC 116/03, e 10, “caput”, parágrafo único, D. 406/68 (SABBAG, 2004). É possível
que a lei local institua o sistema de responsabilidade tributária por substituição
(art. 6º, “caput”, LC 116/03). No entanto, sempre será responsável o tomador ou
intermediário de serviços quando (art. 6º, § 2º, I e II, LC 116/03):
 Seja proveniente do exterior ou a prestação tenha lá se iniciado;
 Ainda que isento ou imune, com referência a serviços de construção
civil em geral, de coleta e reciclagem de detritos, inclusive esgotos, de
limpeza e conservação de imóveis e logradouros públicos, de vigilância
e segurança patrimoniais, de terceirização de mão-de-obra ou de
organização de eventos.
A base de cálculo é o valor do serviço prestado (art. 7º, “caput”, LC
116/03), sendo fixa para os profissionais liberais (vide comentários infra, no
tocante à atividade dos advogados). Desta feita, segundo entendimento do STF,
a prestação de serviços a título gratuito não enseja a incidência do ISSQN
(SABBAG, 2004). No caso de subempreitadas, essas não integram a base de
cálculo (art. 9º, § 2º, “b”, DL 406/68), sob pena de configurar “bis in idem”.
Segundo o STF, o comando é constitucional, não havendo ofensa à isonomia
tributária (art. 150, II, CF/88) nem isenção heterônoma (art. 151, III, CF/88)214. As
alíquotas, enquanto não vier LC específica (art. 156, § 3º, I, CF/88), oscilam entre
2 e 5% (art. 8º, LC 116/88).
Com referência ao ISSQN, existem alguns aspectos polêmicos. O DL
406/68 lista 101 itens de serviços. Já a LC 116/03 reestruturou diversos conceitos
do ISSQN, não contidos no DL, contemplando a modernidade, com o intuito de
prever situações que não existiam na época. O rol abrange cerca de 230
serviços, divididos em 40 itens. Ex.: avanços tecnológicos. A lista é taxativa,
conforme reiterados julgados do STF e do STJ, mas admite interpretação
analógica naqueles itens complementados com a expressão “congêneres”, não
se aplicando a disposição do art. 108, § 1º, CTN. Alguns opinam que a situação
acabou piorando.

214
STF, 1ª T., RE 262598/PR, rel. Min. Ilmar Galvão, j. 14.8.2007, Informativo do STF n° 476.
159
O art. 146, I, CF/88, reza que compete à LC dispor sobre conflitos ou
critérios gerais da legislação tributária. Entre a vigência do DL 406/68 até a
promulgação da CF/88 e, nos casos por ela abarcados, até a LC 116/03, não
havia competência dos municípios para legislar sobre a matéria. Portanto, depois
do último diploma, eles devem editar leis municipais correspondentes, adaptando-
se à LC 116/03. Neste mister, a regra da anterioridade originária (vigência
possível só no exercício seguinte) há de ser observada. Logo, somente em 2004,
o ISSQN poderia ser arrecadado segundo a nova legislação. Os municípios que
não editaram suas normas de adaptação, só puderam iniciar a arrecadação com
os novos critérios em janeiro de 2005. Ademais, ressalta-se que o DL 406/68,
segundo já disse o STF, foi recepcionado como LC.
Qual é o município competente para instituir e cobrar o ISSQN? O DL
406/68 tinha uma regra e uma exceção. A primeira previa o recolhimento do
tributo no domicílio ou no estabelecimento do prestador (art. 12, “a”, DL 406/68).
A segunda preconizava que o ISSQN de empresa construtora seria devido no
município da construção (art. 12, “b”, DL 406/68). A LC 116/03, em seu art. 3º,
“caput”, criou três possíveis alternativas, a serem observadas necessariamente
nesta ordem:
- Domicílio do prestador ou do seu estabelecimento;
- Local da prestação do serviço (art. 3º, II a XXII, LC 116/03);
- Domicílio do tomador (art. 3º, I, LC 116/03).
Em face do rol taxativo, alguns municípios abaixaram suas alíquotas
relativas ao ISSQN. Assim, prestadores de outras regiões abriram sede nesses
locais. Entretanto, podem surgir dúvidas acerca do local onde deverá ser
recolhida a exação. Havendo a obrigação em mais de um lugar, o contribuinte
deve recorrer à consignação em pagamento (“depósito” em juízo).
Portanto, é possível afirmar que a LC 116/03 não revogou expressamente
todo o DL 406/68. Ela regulou de forma diversa alguns dispositivos deste e tornou
outros incompatíveis com suas disposições. Mas acabou não retratando todos.
Com referência especificamente a estes, o DL 406/68 continua em vigência,
sendo, por conseguinte, ab-rogado nos demais. A LC 116/03, do contrário, está
em vigor integralmente, convivendo com a parte “viva” do citado DL.
Por último, é precípuo esclarecer que os advogados e as respectivas
sociedades pagam o imposto do art. 156, III, CF/88. A base de cálculo para os
serviços prestados por tais profissionais – assim como médicos e dentistas – é
estabelecida por um valor único periódico, chamado de “ISS fixo” (SABBAG,
2004). Segundo Carrazza (1991), tal estipulação é inconstitucional, conquanto
viola o princípio da capacidade contributiva.

Execução Fiscal
Legislação aplicável – é a Lei 6830/80, conhecida como LEF (Lei de
Execução Fiscal), tendo o CPC função subsidiária (art. 1º, “in fine”, LEF). Outra
observação importante diz respeito à alteração de disciplina na execução,
160
mormente operada pelas Leis 11280/05 e 11382/06. O legislador, ao que
parece, preservou incólume a regência da execução fiscal, porquanto se trata de
procedimento executório especial. Nesse passo, insiste a doutrina em afirmar que
o rito foi mantido, sem demais considerações. A LEF é claramente pró-
fazendária, redigida para favorecer a arrecadação fiscal por parte do Estado.
Segundo Chimenti (2002, p. 208), a execução fiscal tem por objetivo conferir ao
Estado um instrumento célere de cobrança de seus créditos, outrora
denominados dívida ativa.
Definição – execução fiscal encontra delineamento pelo próprio legislador
da LEF:
Art. 2º. Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela
definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17
de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui
normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle
dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos
Municípios e do Distrito Federal.
§ 1º - Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei
às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado Dívida
Ativa da Fazenda Pública.
Por conseguinte, a execução fiscal é o processo idôneo a que a Fazenda
Pública satisfaça seus créditos decorrentes de dívida ativa, tenham eles natureza
tributária ou não, desde que seja formado previamente um título executivo
extrajudicial específico: a certidão de dívida ativa (art. 585, VII, CPC). Segundo
Câmara (2006, p. 211), em coro com a melhor doutrina, o que constitui o título em
tela, na realidade, é o ato jurídico de lançamento do crédito (inscrição em dívida
ativa) e não o documento que o materializa (respectiva certidão)215. Assis (apud
CÂMARA, 2006, p. 212) ainda lembra que esse é o único título executivo formado
unilateralmente pelo credor.
A certidão de dívida ativa (CDA) goza de certeza e liquidez como
presunções relativas, sendo formada unilateralmente, sem participação do
devedor. Conseguintemente, não necessita, para sua validade, da concordância
ou aceitação do sujeito passivo da obrigação, bastando existência de prévio
procedimento administrativo com contraditório.
Uma vez inscrita a dívida, o prazo prescricional para a propositura da
demanda executória fica suspenso por 180 dias (art. 2º, § 3º, LEF). Essa
prerrogativa material, assim como outras processuais, decorre do poder de
“imperium” do Estado, manifestando a potestade administrativa e a presunção de
legalidade de seus atos (GRECO FILHO, 2003, p. 101). Em paralelo, Câmara
(2006, 269) assevera que os privilégios da Fazenda Pública são inegáveis e
irretorquíveis, como será demonstrado no delineamento da execução fiscal.

215
Cf. Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, 20ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1997, v. 2, p. 130, e
Vicente Greco Filho, Direito Processual Civil Brasileiro: Processo de Execução a Procedimentos Especiais, 16ª ed., São
Paulo, Saraiva, 2003, v. 3, p. 101, e Chimenti, op. cit., p. 208, para quem a certidão de dívida ativa em si é o título hábil a
aparelhar a execução fiscal.
161
O art. 2º, § 8º, LEF, fala em “decisão de primeira instância”, a qual se
liga à decisão de embargos de execução fiscal, como já está pacificado na
jurisprudência. Esse é o termo final para eventual emenda ou substituição da
CDA de ofício, sendo certo que qualquer alteração do seu conteúdo faz os prazos
dos embargos serem devolvidos ao executado. No tocante às exações reais,
quando há sucessão processual em decorrência da mudança de propriedade do
bem tributado (arts. 41, CPC, e 2º, § 8º, LEF), é lícito à Fazenda promover a
substituição da CDA, adequando-a ao novo senhor da coisa. Dessa feita, é feita
nova citação ao atual proprietário, não havendo de se falar em qualquer
ilegalidade nessa prática216.
Legitimidade – a ativa pertence aos entes federados, com correlata
distribuição de competência do poder de tributar, ou a autarquia especialmente
criada para tal fim, por meio de outorga da capacidade tributária ativa. Por
exclusão, empresas governamentais não têm legitimidade para ajuizar execução
fiscal. No entanto, os conselhos de profissões regulamentadas têm natureza
autárquica, posição essa reforçada pelo Supremo na ADIn 1717. Nessa
demanda, ficou patente não ser possível pessoa jurídica de Direito Privado
exercer poder de polícia. Sendo assim, as referidas instituições poderiam ajuizar
execução fiscal, pois foi ratificada sua natureza autárquica. Apesar desse
raciocínio, há precedentes no STJ, concernentes à OAB, de que essa não possui
dívida ativa, falecendo-lhe legitimidade para demandar no modelo da LEF. O
STF, por meio da ADIn 3026, seguiu os precedentes do STJ, afirmando descaber
execução fiscal em face de débitos da contribuição de seus filiados.
De outra sorte, os legitimados passivos estão expressamente elencados
no art. 4º, I a VI, LEF: devedor, fiador, espólio, massa (falida ou da insolvência
civil), responsável e sucessor (“causa mortis” ou “inter vivos”, universal ou
singular). Nesse ponto, Câmara (2006, p. 369) faz interessante observação (art.
2º, § 5º, I, LEF):
 Obrigatoriedade de constar o nome no título – para sucessor singular e
responsável;
 Prescindibilidade em constar no título – para sucessor universal, fiador,
massa e espólio.
A posição do autor é, de certa forma, ampliada pela jurisprudência, a qual
entende ser prescindível que conste o nome do responsável na CDA. No ponto,
os tribunais aceitam que o fisco se volte contra responsáveis pelo pagamento do
crédito independentemente de expressa menção no título217.
Segundo entendimento prevalente na jurisprudência, se um Estado
demandar autarquia estadual da mesma unidade federativa, por débitos fiscais, o
rito a ser seguido não será da LEF, mas sim da execução contra a Fazenda
Pública (arts. 730 e 731, CPC).
Competência – de acordo com a redação do art. 578, “caput”, CPC,
competente para processar a execução fiscal será o juízo:

216
STJ, 1ª T., REsp 840.623-BA, rel. Min. Luiz Fux, j. 6/9/2007, Informativo do STJ n° 330.
217
RT 697/131, 721/290, 737/340.
162
1º) Do foro de domicílio do executado (foro comum);
2º) Do foro da residência ou do lugar onde o demandado for encontrado,
se não tiver domicílio fixo (foros subsidiários).
No entanto, o art. 578, parágrafo único, CPC, determina que a Fazenda
Pública tem a prerrogativa de escolher o foro, no aspecto espacial, entre os
seguintes (foros eletivos concorrentes):
• Foro de qualquer dos devedores, quando houver mais de um;
• Foro de qualquer dos domicílios do demandado, quando esse apresentar
mais de um;
• Foro do local onde se deu o fato ou foi praticado o ato que fez originar a
dívida, ainda que o demandado não mais tenha residência ali;
• Foro da situação dos bens, se o crédito fiscal dele se originar.
Em verdade, a linha traçada pelo CPC segue a esteira do art. 127, I a III,
CTN, o qual define o domicílio tributário. Em tese, o contribuinte ou responsável
pode elegê-lo (art. 127, “caput”, CTN), desde que não implique em claro
embaraço à atividade da autoridade tributária (art. 127, § 2º, CTN). Nessa
hipótese, o domicílio será definido por essa, constante do lugar de situação dos
bens do sujeito passivo ou onde se deu o ato ou fato gerador da obrigação fiscal.
Entretanto, na ausência da eleição, será considerada residência habitual das
pessoas naturais ou, quando desconhecida ou incerta, o centro de suas
atividades (art. 127, I, CTN). Quanto às pessoas jurídicas de Direito Público, o
domicílio será qualquer de suas repartições no território da pessoa política, a qual
detém competência tributária (art. 127, III, CTN). No tocante às pessoas jurídicas
de Direito Privado, incluindo empresários individuais, o domicílio será aquele de
sua sede ou, quanto a outros estabelecimentos, o lugar onde se deu origem às
obrigações respectivas (art. 127, II, CTN). Quando insuscetíveis de aplicação os
parâmetros do art. 127, I a III, CTN, o domicílio será o da situação dos bens ou da
ocorrência dos atos ou fatos geradores de obrigação tributária (art. 127, § 1º,
CTN).
Quando os tributos forem de competência da União, a execução fiscal
será proposta na Vara Federal. Inexistente essa no domicílio estabelecido, a
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) poderá propor a demanda no
juízo estadual (Súmula 40 do extinto TFR)218. Não importa a natureza do tributo,
se imposto ou contribuição social (arts. 109, § 3º, CF/88, e 15, I e III, Lei
5010/66). Os recursos serão dirigidos ao TRF enquadrante (arts. 108, II, e 109, §
4º, CF/88).
Alteração de domicílio do executado posterior à propositura da ação fiscal
não tem o condão de deslocar a competência do juízo, muito pelo qual o princípio
da “perpetuatio jurisdiciones”, esculpido no art. 87, CPC, incide na execução
fiscal (Súmula 58 do STJ)219.
218
Súmula 40 do TFR: “A execução fiscal da Fazenda Pública Federal será proposta perante o juiz de direito da Comarca do
devedor, desde que não seja ela sede da Justiça Federal”.
219
Súmula 58 do STJ: “Proposta a execução fiscal, a posterior mudança de domicílio do executado não desloca a competência
já fixada”.
163
Caso o exeqüente não tenha conhecimento sobre o paradeiro espacial
do executado, Carmona (2004, p. 1700) apregoa que não poderá propor a
demanda no seu domicílio, por aplicação analógica do art. 94, § 2º, “in fine”, CPC,
porque se trataria de um exagero em favor do Estado. Nesse caso, cristalina é a
lei em determinar o foro ao menos pelos parâmetros do art. 578, parágrafo único,
CPC.
O legislador arremata a questão da competência por intermédio dos arts.
5º, e 29, “caput”, LEF, pelos quais a “vis attractiva” de outros juízos não se opera
perante a execução fiscal. Com efeito, o fisco tem preferência no seu juízo
privativo – quer seja na Justiça Federal para União e respectivas autarquias, quer
seja nas varas da Fazenda Pública para as demais entidades públicas – e não se
submete a concursos de credores, como no juízo falimentar e de recuperação de
empresas, de liquidação, de insolvência civil ou de inventário.
Sendo a execução fiscal promovida mediante carta precatória, a defesa
típica (embargos do executado) será oferecida no juízo deprecado e remetida
para o juízo deprecante, competente esse para resolver as questões ali
suscitadas (art. 20, “caput”, LEF). Dessarte, se a matéria trazida à baila disser
respeito a vício ou a irregularidade atinente ao juízo deprecado, será ela aí
julgada (art. 20, parágrafo único, LEF). Nesse passo, o juiz recepiendário tem
autonomia majorada para resolver as querelas a ele atinentes, solução mais
consentânea que aquela adotada pelo art. 747, CPC, pelo qual aquele só pode
decidir sobre penhora, avaliação ou alienação de bens na execução ordinária.
Ação cautelar fiscal – interessante trazer a definição dada pela doutrina:
Instituída pela Lei 8.397/92, a ação cautelar fiscal pode
ser proposta antes da execução fiscal ou no curso desta. O
objeto da ação é tornar indisponíveis os bens do contribuinte
que apresente situação que pode colocar em risco o
recebimento do crédito fiscal (art. 2º da Lei n. 8.937/92)
(CHIMENTI, 2002, p. 207).
Por óbvio, a medida requerida tem por fundamentos o perigo na demora e
os indícios do direito alegado pelo autor, assim como qualquer outra cautelar (art.
798, “in fine”, CPC). Nesse sentido, não é necessário que a exigibilidade do
crédito fiscal esteja perfeitamente plausível, pois, se dessa forma fosse, a
Fazenda Pública já poderia propor diretamente a execução fiscal e, por
conseguinte, a penhora de bens do patrimônio do executado. “Pela ação cautelar
fiscal (L. 8397/92), a Fazenda pode obter a declaração de impenhorabilidade dos
bens do devedor, no limite do crédito tributário” (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p.
78). A medida só pode ser ajuizada após o lançamento (art. 2º, “caput”, Lei
8397/92), antes ou depois da ação de execução fiscal. No entanto, é permitida,
excepcionalmente, a cautelar fiscal sem constituição definitiva do crédito, nos
termos do art. 1º, parágrafo único, Lei 8397/92 (art. 2º, V, “b”, e VII, Lei 8397/92).
São as hipóteses em que o devedor, uma vez notificado para pagar ou submetido
a arrolamento de bens (Lei 9532/97), intenta aliená-los.
164
O objeto da restrição é o total da dívida ativada, não podendo ir além
disso. Os requisitos da medida cautelar fiscal estão inscritos no art. 2º, I a IX, Lei
8397/92.
Como se trata de medida cautelar, a regra de competência segue o
comando do art. 800, “caput”, CPC, devendo ser requerida ao juízo “virtual” da
futura execução fiscal. De fato, o juízo competente para conhecer a
correspondente execução fiscal é o mesmo apto a apreciar o pedido de cautelar
fiscal (art. 5º, “caput”, Lei 8397/92), podendo a medida ser preparatória ou
incidental ao feito principal. Em regra, o foro ou a subseção judiciária competente
é do domicílio eletivo do devedor (art. 127, “caput”, CTN). Sendo tributo federal,
competente será a Justiça Federal (art. 109, I, CF/88), em sua vara de execução
fiscal ou mesmo anexo fiscal, quando existentes. Tratando-se de tributo estadual
ou municipal, competente é a Justiça Estadual, mais especificamente a vara de
execução fiscal ou da Fazenda Pública, quando presentes. Supondo que haja
tributo federal e inexista vara federal no domicílio do devedor (em princípio, o foro
da matéria), a PGFN deverá ajuizar a cautelar fiscal (e a conseqüente execução
fiscal) perante o juiz de direito (arts. 109, § 3º, CF/88, e 15, I e III, Lei 5010/66, e
Súmula 40 do TFR, já mencionada). Na execução fiscal (e na medida cautelar
fiscal), prevalece a regra do domicílio do contribuinte até mesmo sobre outros
critérios, inclusive quanto à competência da Justiça Federal. Isso não aplica nas
ações ordinárias fiscais, como declaratória negativa de débito, de repetição de
indébito, etc.
No aspecto formal, a petição deve indicar e caracterizar uma das
hipóteses do art. 2º, I a IX, Lei 8397/92, porquanto há situação de risco para o
Estado em não receber seu crédito. Além da prova do perigo na demora (art. 3º,
II, Lei 8397/92), o art. 3º, I, Lei 8397/92, exige que haja prova literal e documental
do crédito fazendário. Prova-se a exigência pela constituição do crédito tributário.
No direito, o pleiteante deverá demonstrar, além dos fatos, exatamente o
lançamento definitivo do tributo. No pedido, o demandante deve solicitar a
concessão da respectiva medida cautelar fiscal. O efeito da concessão pelo juiz é
a indisponibilidade dos bens do requerido até o limite do crédito indicado (art. 4º,
“caput”, Lei 8397/92).
Poderá haver extensão da constrição sobre os bens pessoais de
administrador ou de sócio controlador da empresa (atual ou passado), quando
houver fundada razão de inadimplência da pessoa jurídica devedora (art. 4º, §§
1º e 2º, Lei 8397/92). O STJ não concorda com esse comando, afirmando que a
desconsideração da personalidade jurídica depende dos requisitos esculpidos no
art. 135, III, CTN. Nesse ponto, é interessante que o demandante afirme e prove
que o sócio controlador ou o administrador pode frustrar o recebimento do crédito
fazendário, justificando seu pedido nos termos do comando legal mencionado. De
fato, é possível pedir a indisponibilidade de bens da pessoa jurídica e de sócio,
mediante medida cautelar fiscal (art. 4º, §§ 1º e 2º, Lei 8397/92). A norma não
requer má-fé, dolo ou culpa do acionista controlador, do administrador ou de
qualquer um que tinha obrigação contratual ou estatutária de cumprir as
obrigações tributárias. Note que os dispositivos permitem até mesmo atingir bens
165
daqueles que já foram sócios. O STJ interpreta o dispositivo à luz do art. 135,
III, CTN, aplicando-o restritivamente.
Ainda no tocante ao art. 4º, § 1º, Lei 8397/92, o STJ relativiza a exigência
de que a indisponibilidade de bens recaia sobre patrimônio ativo permanente do
executado. De acordo com a interpretação da corte, quando o devedor não indica
bens suficientes e aptos a garantir a execução, a constrição pode abater-se sobre
bens do ativo não-permanente da empresa, porquanto a legitimidade do crédito
tributário, a supremacia do interesse público e o princípio de que a execução por
quantia certa deve ser em benefício do credor justificam, excepcionalmente, o
rigor da medida. Exemplo desse entendimento está na autorização judicial de
penhora de subsídios governamentais a serem repassados ao executado220.
É também plausível o pedido de liminar, porquanto o diploma em tela a
possibilita (art. 7º, “caput”, Lei 8397/92). Para tal, deve estar presente o requisito
do receio de frustração da eficácia da medida, caso o requerido trave
conhecimento com a demanda.
Concedida ou não a medida “inaldita altera pars”, o devedor será citado
(art. 8º, “caput”, Lei 8397/92). Se o devedor contesta, o juiz vai designar audiência
de instrução e julgamento, com o objetivo de colher provas sobre o processo (art.
9º, parágrafo único, Lei 8397/92). Depois da produção probatória, tem-se a
decisão. De outra parte, não havendo contestação, os fatos alegados pela
Fazenda são considerados verdadeiros, proferindo o juiz decisão de mérito no
lapso impróprio de 10 dias (art. 9º, “caput”, Lei 8397/920). Na contestação ou a
qualquer tempo, o devedor pode requerer a substituição da medida cautelar por
uma das garantias previstas no art. 9º, I a IV, LEF, observada a ordem de
preferência do dispositivo (art. 10, “caput”, Lei 8397/92).
O art. 6º, I a IV, Lei 8397/92, traz os requisitos formais da exordial:
endereçamento, qualificação e endereço do requerido, requerimento para citação,
provas a serem produzidas.
Dificilmente a Fazenda conseguia fazer prova das hipóteses do art. 2º, I a
IX, Lei 8397/92, fazendo com que a medida cautelar fiscal fosse praticamente
ineficaz. Para suprir a deficiência, a LC 118/05 trouxe o art. 185-A, “caput”, CTN,
o qual previu que o juiz deverá decretar “ex officio” a indisponibilidade de bens do
devedor citado (sem perder de vista que o despacho que determina a citação
suspende o curso prescricional – art. 174, parágrafo único, I, CTN), quando esse
não pagar nem oferecer bens a penhora em execução fiscal, dentro do decurso
legal de cinco dias (art. 8º, “caput”, LEF). Essa atuação é feita por meio
eletrônico, através do convênio BACEN-Jud. Entretanto, a medida não é
efetivada de plano. Quando o devedor não cumpre o despacho judicial inicial, o
meirinho se dirige ao domicílio dele para tentar penhorar bens. Sendo infrutífera a
diligência, fica autorizado o magistrado a perpetrar a indisponibilidade do
patrimônio do executado, nos termos do art. 185-A, “caput”, CTN. Nesse âmbito,
a medida cautelar fiscal pode ser requerida entre a “constituição do crédito”
(lançamento) e a execução fiscal ou após essa última, diante da não localização

220
STJ, 1ª T., REsp 841.173-PB, rel. Min. Luiz Fux, j. 18/9/2007, Informativo do STJ n° 332.
166
e conseqüente não citação do devedor. Fora essas hipóteses, não é adequada
a cautelar, porque a indisponibilidade será decretada de ofício pelo julgador.
Com efeito, a não citação do devedor não permite o decreto de
indisponibilidade patrimonial e, não sendo encontrados bens para o arresto, o art.
40, “caput”, LEF, diz que o feito e a prescrição ficam suspensos por um ano (art.
40, § 2º, LEF). Não sendo frutíferas novas tentativas, o juiz manda arquivar o
processo. Depois do decurso de um ano, independentemente de manifestação do
juízo ou da secretaria, começa a correr o prazo do lustro para prescrição
intercorrente (art. 40, § 4º, LEF, e Súmula 314 do STJ, já mencionada). A
suspensão e a declaração de ocorrência da morte da pretensão do fisco pelo
decurso do tempo são declaradas de ofício pelo magistrado, desde que haja
prévia manifestação da Fazenda Pública (art. 40, § 4º, LEF). O não cumprimento
dessa formalidade importa em invalidade na decretação da prescrição
intercorrente. É nesse sentido que se presta a medida cautelar fiscal, justamente
para evitar a aplicação integral do comando mencionado, garantindo o
prosseguimento da execução fazendária, sua não suspensão, não arquivamento
ou não ocorrência da prescrição intercorrente.
Arrolamento fiscal – nos termos do art. 64, “caput”, Lei 9532/97, a
autoridade fiscal poderá realizar descrição minuciosa de todo o patrimônio do
devedor, quando o crédito tributário for superior a 30% do seu total, com piso de
R$ 500.000,00 (art. 64, § 7º, Lei 9532/97). Nesse caso, o arrolado não poderá
alienar, transferir ou gravar seus bens sem prévio conhecimento da autoridade
fiscal (art. 64, § 3º, Lei 9532/97). O ato de arrolamento é perfeito mediante
notificação ao devedor, cujo recebimento marca o termo inicial para a restrição
administrativa em comento (art. 64, § 3º, Lei 9532/97). A infringência dessa
norma pode ensejar a medida cautelar fiscal supra delineada (art. 64, § 4º, Lei
9532/97). A reboque do registro da penhora na execução fiscal (art. 14, I a III,
LEF), o arrolamento será averbado em todas as repartições onde haja banco de
dados continente dos bens do devedor (art. 64, § 5º, I a III, Lei 9532/97). Essa
restrição poderá, futuramente, servir de base para a indicação de bens à penhora
pelo exeqüente, bem como deverá ser cancelada se garantido o juízo da
execução fiscal de outra forma (art. 64, §§ 8º e 9º, Lei 9532/97).
Procedimento – o rito especial segue as seguintes fases:
 Petição inicial – deve conter endereçamento, pedido e requerimento de
citação do executado (art. 6º, I, LEF). Por óbvio, não é composta tão-só
por esses elementos, devendo revestir-se de formalidades mínimas,
comuns a qualquer exordial. Entretanto, não é necessário trazer à baila
fatos e seus sucedâneos, porque estão presumidos na CDA. A peça
vestibular da execução fiscal é um pedido de meios executórios ao
Estado-juiz, prescindindo de requerimento para produção de provas e
não se sujeitando a custas e emolumentos. Entretanto, a Súmula 190
do STJ221 determina que devem ser pagas as despesas do oficial de
justiça. Com efeito, não se exige o requerimento genérico de prova, tal

221
Súmula 190 do STJ: “Na execução fiscal, processada perante a Justiça Estadual, cumpre à Fazenda Pública antecipar o
numerário destinado ao custeio das despesas com o transporte dos oficiais de justiça”.
167
qual se depreende do confronto entre os arts. 282, VI, CPC, e 6º, §
3º, LEF (GRECO FILHO, 2003, p. 102). Ademais, deverá ser instruída
com a certidão de dívida ativa, contendo: nome do devedor e dos co-
responsáveis; domicílio e residência deles – se possível; valor inicial da
dívida; termo inicial e forma de calcular juros e demais encargos;
origem, fundamento e natureza da dívida; correção monetária e forma
de cálculo – se incidente; data e número de inscrição da dívida ativa;
número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles
expresso o valor da dívida (art. 2º, § 5º, I a VI, LEF). O legislador
permite que a exordial e a CDA consubstanciem documento único,
sendo lícita sua emissão inclusive por meio eletrônico (art. 6º, § 2º,
LEF). O cancelamento da inscrição da dívida ativa implica em extinção
da execução sem ônus para as partes (art. 26, LEF), fazendo jus o
executado, segundo entende a jurisprudência, aos honorários
advocatícios (GRECO FILHO, 2003, p. 102).
 Despacho inicial – o art. 7º, I a V, LEF, preceitua o que o juiz deve dizer
na recepção da exordial:
o Recebimento da peça, se estiver em termos;
o Citação do executado, nos termos do art. 8º, I a IV, e §§ 1º e 2º, LEF,
devendo ser expedido correspondente mandado;
o Determinação da penhora, caso não seja paga a dívida no decurso
estabelecido (cinco dias – art. 8º, “caput”, LEF) ou não seja garantido
o juízo (pelo depósito);
o Efetivação de arresto (pré-executivo – art. 653, “caput”, CPC), se o
executado não tiver domicílio ou dele se ocultar;
o Registro da penhora, sem embargo das custas e demais despesas;
o Avaliação dos bens constritos.
 Citação – a lei assina prazo de cinco dias para o pagamento judicial, sob
pena de penhora imediata (art. 8º, “caput”, CPC). O mandado será
remetido ao executado por via postal, com o devido aviso de
recebimento (AR), salvo se o exeqüente requerer de outra forma, não
prevalecendo o estatuído no art. 222, “d”, CPC, por ser esse norma
geral e não especial.
O legislador considera perfeita a citação se a carta for entregue ao
próprio executado no endereço indicado222 ou 10 dias depois de retornado
o aviso de recebimento na agência postal, caso não haja indicação da
data do recebimento (art. 8º, II, LEF). Greco Filho (2003, p. 102) faz uma
crítica à ficção da citação por correspondência, pois o legislador não
exigiu que a carta com mandado seja recebida pelo executado. Não sendo
encontrado o demandado pelos Correios até 15 dias depois, a citação
deverá ser feita por oficial de justiça ou por edital (art. 8º, III, LEF). Se
escolhida a forma editalícia, seus requisitos formais e temporais

222
Cf. Theodoro Júnior, op. cit., o qual não admite essa colocação feita pelo legislador.
168
(publicação por 30 ou 60 dias, se o executado, no segundo caso,
encontrar-se no exterior – art. 8º, § 1º, LEF) estão delineados no art. 8º,
IV, LEF.
A intimação da Fazenda Pública é pessoal em favor do procurador (art.
25, “caput”, LEF). No entanto, se não houver órgão da procuradoria na
comarca, a intimação da Fazenda poderá ser feita por correspondência
com AR223.
Citação e prescrição – a citação tem o condão de interromper a
prescrição a partir do despacho do juiz que o determina (arts. 8º, § 2º,
LEF, e 174, parágrafo único, I, CTN). Sobre o tema, formaram-se duas
correntes:
 O termo inicial da interrupção retroage à data da propositura da ação
– nos exatos termos do art. 219, § 1º, CPC, é a posição defendida
por Câmara (2006, p. 371) e por Silva Pacheco (apud CÂMARA,
2006, p. 371).
 Não há retroação – porque a LEF é diploma especial, segundo
Theodoro Júnior (apud CÂMARA, 2006, p. 371).
Não havendo bens a serem penhorados, a execução ficará suspensa,
assim como o decurso prescricional (art. 40, “caput”, LEF). Caso a
situação permaneça assim por mais de um ano, os autos serão
arquivados (art. 40, § 2º, LEF). O desarquivamento só será possível se
surgirem novos bens passíveis de constrição, sendo certo que o legislador
utilizou a expressão “a qualquer tempo” para a efetivação desse ato. A
melhor doutrina, representada por Theodoro Júnior (apud CÂMARA, 2006,
p. 372) e por Câmara (2006, p. 372) apregoa que, a partir do
arquivamento do feito, volta a correr o decurso prescricional de cinco anos
da Fazenda Pública (art. 174, “caput”, CTN), sob pena de tornar a
obrigação fiscal imprescritível. Em sentido contrário, haveria autêntica
mácula à isonomia, porque nenhum outro credor goza de
imprescritibilidade de seu crédito. A prescrição intercorrente aqui
mencionada encontra fulcro em uma hermenêutica sistemática,
recorrendo-se ao direito processual comum e aos princípios gerais de
direito para resolver a querela (GRECO FILHO, 2003, p. 103).
A prescrição intercorrente não tinha previsão legal até 2004 (Lei
11051/04), muito pelo qual a LEF, como diploma protetivo do credor fiscal,
permitia o desarquivamento da execução a qualquer tempo (art. 40, § 3º,
LEF). A tese pró-contribuinte, fundando-se no art. 174, parágrafo único,
CTN, passou a considerar que, se a prescrição foi interrompida, creia-se
que voltará a correr a partir de certo momento. O termo apontado foi
justamente o despacho de arquivamento da execução, para permitir
harmonia entre o CTN e a LEF. A idéia foi albergada pelo STF em
homenagem à segurança jurídica.

223
STJ, REsp 914879/SP, e EmbDiv no REsp 743867/MG.
169
Questão se pôs quando o juiz e a secretaria deixam de efetivar o
arquivamento. Para solver o entrave, o STJ entendeu que a prescrição
intercorrente começa a correr um ano após a suspensão da execução,
independentemente do ato formal de arquivamento da execução (Súmula
314 do STJ, já mencionada). O termo “a quo” da prescrição intercorrente
ocorre automaticamente, pelo simples decurso do tempo.
Em razão da Lei 11280/06, a prescrição reconhecida de ofício passou a
vigorar no processo civil (art. 219, § 5º, CPC). Entretanto, a Lei 11051/04,
além de positivar a prescrição intercorrente, permitiu seu reconhecimento
de ofício pelo julgador, desde que ouvido previamente a Fazenda Pública
(art. 40, § 4º, LEF), sob pena de nulidade absoluta do ato. Nota-se que se
trata de faculdade do juízo, não configurando direito subjetivo do
contribuinte. A salvaguarda do legislador se deve à potencialidade do
instituto em tela, o qual tem o condão de liquidar a pretensão do credor,
mesmo porque há interesse público em jogo. O reconhecimento “ex
officio” da prescrição, como norma processual, é aplicada imediatamente,
atingindo os feitos em curso, como já disse o STJ.
Havendo conflito entre CPC e LEF, aplica-se a segunda, pelo princípio
da especialidade, mesmo porque o primeiro (lei geral) só terá vez na
execução fiscal em caráter supletório (art. 1º, “in fine”, LEF). Isso não
significa que a prescrição não intercorrente (art. 269, IV, CPC) – podendo
ser chamada de ordinária – não possa ser reconhecida de ofício pelo
magistrado (art. 219, § 5º, CPC), sem prévia oitiva do fisco. Nesse caso, o
juiz poderá vislumbrar a prescrição já no despacho citatório da execução
fiscal, porque versará sobre a modalidade ordinária da perda da
pretensão, não sobre a intercorrente. Isso não significa que o juízo deverá
prescindir de manifestação do executado, porque prescrição é matéria de
defesa disponível. Sendo assim, sempre deverá ser aberto o contraditório
para o demandado-contribuinte, porque é possível sua renúncia por
razões outras. Não se manifestando nesse sentido ou silenciando sobre a
matéria, o juiz então estará autorizado a reconhecer “ex officio” a morte da
pretensão pelo decurso do tempo. Apesar de parte da doutrina entender
que a prescrição, a partir da Lei 11280/06, tornou-se matéria de ordem
pública, a disponibilidade do direito correspondente é flagrante para o
entendimento majoritário (CÂMARA, 2006), como é possível aduzir do
Enunciado 295 do Conselho da Justiça Federa (CJF)224.
Indisponibilidade de bens – feita a citação e não encontrados bens à
penhora, o magistrado decreta a indisponibilidade patrimonial “futura” do
executado, oficiando todos os órgãos de registro de patrimônio sobre a
medida, os quais deverão responder ao comando com relação completa
dos bens indisponíveis (art. 185-A, “caput” e § 2º, CTN). Observa-se que o
ato pode ser efetivado inclusive por meio eletrônico (“penhora on-line”), o
que o agiliza e o torna mais eficaz. Nesse caso, deverá ser veiculado o

224
Enunciado 295 do CJF: “Art. 191. A revogação do art. 194 do Código Civil pela Lei n. 11.280/2006, que determina ao juiz
o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a possibilidade de renúncia admitida no art. 191 do texto
codificado”.
170
valor da dívida, tendo o decreto limite exatamente nele. Caso seja
ultrapassado o teto, o julgador deve determinar o levantamento do
excedente (art. 185-A, § 1º, CTN). Vê-se que o excesso de
indisponibilidade só pode ser invocado se a constrição recair sobre bem
divisível. Em contrário senso, não há de se argúi-la, pois o saldo
resultante da hasta pública será restituído ao executado. Ex.:
indisponibilidade sobre imóvel é cabível, mesmo que sobre um montante
maior que o débito fiscal, porque, depois da hasta pública, o saldo será
revertido ao devedor. O que se discute é a possibilidade ou não de incidir
a indisponibilidade sobre faturamento e renda de empresa, o que ainda
não é pacífico, muito pelo qual o art. 655-A, § 3º, CPC, trouxe tal previsão
na execução ordinária. Em princípio, não há óbice à sua efetivação, pelo
fato do instituto harmonizar-se com a regência e com o espírito da LEF. A
doutrina ainda não se posicionou sobre o tema, apesar do STJ ter
apontado nesse sentido.
 Opções do executado – recebido o mandado de citação, o executado
tem algumas alternativas durante o interregno dos cinco dias
subseqüentes (art. 8º, “caput”, LEF):
o Pagar a dívida – nesse caso, deverá adimplir totalmente o débito,
somando-se o principal, juros, correção, multa de mora, encargos e
custas judiciais (art. 8º, “caput”, LEF).
o Garantir o juízo – a fim de propiciar a discussão da dívida por meio de
embargos do executado, podendo ser feito de várias formas (art. 9º, I
a IV, LEF):
1. Depósito em dinheiro em estabelecimento oficial de crédito, desde
que incidente correção monetária225;
2. Fiança bancária;
3. Nomeação de bens próprios à penhora, de acordo com a ordem
sugestiva do art. 11, I a VIII, LEF;
4. Indicação de bens de terceiros à penhora, desde que previamente
aceitos pela Fazenda Pública.
Obs. 1: caso seja oferecido bem imóvel, o cônjuge do executado ou
do terceiro proprietário deverá anuir ao ato (arts. 9º, § 1º, LEF, e 1647,
I, CC).
Obs. 2: o legislador do CPC, na nova redação do art. 655, I a XI, dada
pela Lei 11382/06, preferiu, de uma forma geral, móveis a imóveis, no
diapasão da Lei 6830/80.
Uma vez que o executado ofereça bens à penhora e haja recusa por
parte da Fazenda exeqüente, não há dever processual em fazê-lo
novamente. No ponto, a inação do executado não impede a
225
O depósito do montante integral é causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário (art. 151, II, CTN). Segundo
Greco Filho, op. cit., é “conditio sine qua non” para a propositura de ação anulatória de débito fiscal, desde que essa tenha por
objetivo impedir ou suspender execução fiscal, como bem vem entendendo a jurisprudência. Não tendo tais finalidades, não há
de se requisitar o depósito em comento, sob pena de macular a inafastabilidade do Judiciário (art. 5º, XXXV, CF/88).
171
qualificação de sua conduta, nos termos do art. 600, I a IV, CPC,
conquanto já atuará por ordem do juiz na primeira oportunidade.
Conseguintemente, não há de se lhe aplicar as sanções contidas no
art. 601, “caput”, CPC, apesar de ficar sujeito a outras medidas
constritivas, como indisponibilidade de bens, quebra de sigilo bancário
e fiscal e penhora de patrimônio. Com esse entendimento, a
jurisprudência do STJ firmou posição226.
o Oferecer exceção de pré-executividade ou objeção de não-
executividade – ver comentários abaixo.
o Permanecer inerte – nessa hipótese, dar-se-á a penhora ou o arresto,
dependendo da situação encontrada. A primeira será efetivada de
sorte a abranger tantos bens quanto sejam necessários para cobrir o
total da dívida e todos seus consectários financeiros e judiciais (art.
4º, § 3º, LEF), valendo a avaliação do oficial de justiça como
parâmetro preliminar (art. 13, “caput”, LEF). Essa lição foi bem
entendida pelo legislador de 2006, inspirando a nova redação do art.
652, 1º, CPC. Em ambos os regimes, não sendo possível a avaliação
pelo meirinho devido a aspectos técnicos complexos, será solicitado,
pelo juiz, laudo de avaliador judicial, sobre o qual decidirá o julgador
(arts. 13, 2º, LEF, e 680, CPC). O prazo legal para tal é de 15 dias
para execução fiscal e de 10, para a ordinária. Nesse contexto,
qualquer das partes pode impugnar o valor da avaliação até o edital
da hasta pública (art. 13, § 1º, LEF), como bem indica Chimenti (2002,
p. 208). O arresto, consoante comentário supra já feito, terá vez
quando o executado não tiver domicílio ou se furtar à citação, apesar
de o agüazil encontrar bens suscetíveis de constrição judicial.
 Execução provisória e definitiva – o art. 587, CPC, fala em execução
provisória ou definitiva. A rigor, provisório ou definitivo são os títulos,
porque o regime do procedimento é o mesmo na execução civil
ordinária. Se os embargos forem recebidos com efeito suspensivo e, ao
final, julgados rejeitados, a execução prossegue nos moldes
provisórios, caso a apelação seja recebida no efeito devolutivo. Nesse
passo, como a Fazenda não pode oferecer caução pela
impenhorabilidade de seus bens, a execução fiscal ficará obstada,
aguardando o trânsito em julgado, visto que transferência de bens do
executado e depósito de dinheiro exigem a garantia.
 Fraude à execução fiscal (art. 185, CTN) – depois da citação válida,
dentro do processo civil, os atos de alienação que tendem à insolvência
do devedor, desde que provado o “eventus damni” (insolvência –
elemento objetivo), caracterizam fraude à execução. No âmbito
tributário, essa é mais profunda, porque sua presunção não está
adstrita ao chamamento válido do demandado ao processo, mas sim
pela inscrição da dívida ativa (art. 185, “caput”, CTN). A certeza e a
liquidez do crédito tributário se devem ao controle cognitivo interno

226
STJ, 2ª T., REsp 787.339-SP, rel. Min. Eliana Calmon, j. 19/6/2007, Informativo do STJ n° 324.
172
administrativo, procedimento e ato dotados de presunção de
legalidade e de legitimidade. A certidão de dívida ativa, como título
executivo extrajudicial, instruirá a inicial da execução fiscal. Depois de
ajuizada a demanda, o juiz exara o despacho citatório do sujeito
passivo. Todo esse trâmite demanda muito tempo, o que sensibilizou o
legislador a presumir fraude a partir da inscrição da dívida ativa. Trata-
se de presunção relativa227, sendo ineficaz a alienação entre sujeito
passivo e terceiro adquirente. Como esse evento prescinde de
execução ajuizada, Câmara (2006) afirma que surgiu, à guisa das
fraudes contra credores, à execução (ordinária) e de bem judicialmente
constrito, um novo instituto: fraude à administração fiscal.
 Penhora – uma vez efetivada, o executado deverá ser intimado,
mediante publicação em diário oficial, da juntada aos autos do
processo executivo do auto ou termo de penhora (art. 12, “caput”, LEF).
A intimação só será pessoal caso a citação feita por aviso de
recebimento contenha assinatura de terceiro, ou seja, qualquer um que
não seja o próprio executado ou seu representante legal (art. 12, § 3º,
LEF). Nesse caso, dispensa-se a publicação exigida pelo art. 12,
“caput”, LEF (Súmula 190 do extinto TRF)228. Havendo constrição sobre
bem imóvel, o cônjuge também deverá ser informado (art. 12, § 2º,
LEF). É perfeitamente possível a penhora de faturamento de empresa
em execução fiscal, a teor do que vinha apontando a jurisprudência do
STJ e do art. 655, VII, CPC. Em hipótese de concurso de credores
fazendários, o direito de preferência na penhora se defere àquele que
primeiro obteve a penhora ou o arresto executivo, aplicando-se o art.
612, CPC, na execução fiscal (art. 1º, LEF).
Registro – lavrado o termo ou auto de penhora229, o oficial de justiça
deverá fornecer cópia a repartições e órgãos encarregados do registro do
bem constrito. Dessa feita, o art. 14, I a III, LEF, determina que seja
averbada a penhora dos seguintes bens:
1. se imóvel, no CRI;
2. se estabelecimento comercial, na Junta Comercial;
3. se valores mobiliários, na Bolsa de Valores, sociedade comercial e
Junta Comercial;
4. se veículo, no DETRAN.
No caso da execução ordinária, o próprio exeqüente pode averbar a
demanda (não a penhora), de forma a tornar o ato eficaz “erga omnes”,
erigindo uma presunção absoluta de conhecimento por terceiros. De fato,

227
Cf. Câmara, op. cit., para quem ao art. 185, “caput”, CTN, erige uma presunção absoluta de fraude à execução.
228
Súmula 190 do extinto TRF: “A intimação pessoal da penhora ao executado torna dispensável a publicação de que trata o
art. 12 da Lei das Execuções Fiscais”.
229
Termo de penhora é lavrado quando o próprio executado ofereça a garantia da execução, quer seja por meio de depósito
integral do valor, de fiança bancária ou de indicação de outros bens. Auto de penhora é lavrado pelo meirinho, quando esse
executa o ato em si ou quando converte o arresto nele. Ambos documentos são idôneos, a partir intimação de sua juntada aos
autos, a abrir prazo para o oferecimento de embargos por parte do executado, bem como a permitir a averbação da constrição
nos órgãos responsáveis pelo registro do bem.
173
o art. 615-A, “caput”, CPC, traz a possibilidade de averbação da
execução em órgãos de registro de bens do executado. É medida
plausível para preservar a eficácia de futura expropriação. A partir do
registro, erige-se presunção absoluta de fraude à execução. Essa
disposição é plenamente aplicável à execução fiscal, não se confundindo
com a presunção relativa de fraude na expedição de CDA.
A ordem de preferência do art. 11, I a VIII, LEF, há de ser observada
dentro do possível. O juiz deverá balancear o interesse do credor fiscal
com a satisfação do débito e o princípio do menor gravame ao executado.
Nesse passo, a jurisprudência tem entendido que, uma vez seguida a
gradação legal, a Fazenda Pública exeqüente não pode recusar título da
dívida pública líquido, certo e exigível (art. 11, II, LEF).
Se o executado não aceitar a avaliação feita pelo meirinho, sua recusa
é entendida como requerimento de perícia. No caso, deverá arcar com os
custos da produção probatória, consoante entendimento do STJ230.
 Defesa – como defesa típica, uma vez garantido o juízo por alguns dos
meios do art. 9º, I a IV, LEF, ou pela própria penhora “ex officio”, o
executado poderá oferecer embargos no prazo de trinta dias, contados
do depósito, da juntada da prova da fiança bancária ou da intimação da
penhora judicial (art. 16, I a III, LEF). Câmara (2006, p. 373) aponta
diferença entre os embargos na execução de título extrajudicial e
aqueles oferecidos em sede de execução fiscal, porquanto o interregno
e o termo inicial são diferentes naquele: 15 dias contados da juntada
aos autos do mandado de citação (art. 738, “caput”, CPC). Ademais, o
oferecimento de embargos, na execução ordinária, não obsta o
prosseguimento do feito nem requer garantia do juízo (arts. 736,
“caput”, e 739-A, “caput”, CPC), salvo se houver expresso requerimento
do embargante, relevância na fundamentação, perigo de lesão de difícil
reparação e a própria garantia do juízo (art. 739-A, § 1º, CPC). Marinoni
e Arenhart (2007) e Luiz Wambier defendem que esse fenômeno
também se dá na execução fiscal, posição não pacificada na doutrina.
Como matéria de defesa, não se admite compensação, bem como é
inaplicável reconvenção (art. 16, § 3º, LEF). No demais, as alegações do
embargante não são restritas a um rol taxativo de defesa (art. 16, § 2º,
LEF). Recebidos os embargos, a Fazenda Pública é intimada para se
manifestar em trinta dias, seguindo-se audiência de instrução e
julgamento, se houver prova oral a ser produzida (art. 17 e parágrafo
único, LEF). Não havendo essa última, o procurador público manifesta-se
pelo teor da garantia do juízo (art. 18, LEF). Resolvidas as questões, o juiz
deverá proferir sentença no prazo impróprio de 30 dias (art. 17, parágrafo
único, LEF).
Como defesas atípicas231, há dois tipos admitidos jurisprudencialmente
pelo sistema do CPC e da própria LEF:

230
STJ, 2ª T., REsp 729.712-SP, rel. Min. Eliana Calmon, j. 26/6/2007, Informativo do STJ n° 325; REsp 130.500-RS, DJU
29/11/1999, e REsp 611.970-SP, DJU 18/4/2005.
174
• Objeção de não-executividade – como trata de matérias de ordem
pública, não há preclusão, podendo ser alegadas a qualquer tempo e
em qualquer grau de jurisdição. A mera invocação pela parte obriga o
juiz a decidir, não podendo rejeitá-la “in limine”. Caso haja
acolhimento, há extinção do processo sem resolução do mérito,
podendo ser contestado por apelação ou por embargos infringentes
(causas de alçada). Havendo rejeição, por se tratar de decisão
interlocutória, pode ser atacável por agravo de instrumento, o que
configura exceção à irrecorribilidade das interlocutórias na execução.
• Exceção de pré-executividade – engloba matérias que deveriam ser
ventiladas em defesa típica (embargos do executado ou infringentes).
O juiz não as pode conhecer de ofício. Há um prazo preclusivo
representado pela penhora, porque o executado fará uso das defesas
típicas a partir de então. A perda do prazo dos embargos também
pode sugerir o oferecimento da peça. Da exceção de pré-
executividade, o juiz poderá adotar três diferentes decisões:
 Acolher a exceção – o processo é extinto com resolução de mérito.
O acolhimento depende de prova pré-constituída e de não
impugnação por parte do exeqüente. Desafia apelação ou
embargos infringentes (causas de alçada).
 Rejeitar a exceção – como decisão interlocutória, pode ser atacada
por agravo.
 Negar-se a decidir – o juiz alega que não pode decidir sem
instrução probatória, remetendo decisão para os embargos. Como
interlocutória, cabe agravo de instrumento.
Obs.: tanto a objeção quanto a exceção não ensejam a suspensão do
processo. Contudo, o efeito poderá ser deferido se o excipiente solicitá-
lo expressamente, provando a relevância da alegação e demonstrando
o perigo de lesão grave irreparável ou de difícil reparação. Ambas
também não comportam dilação probatória, como entende a
jurisprudência, devendo o excipiente demonstrar seu direito mediante
prova pré-constituída.
 Hasta pública – não sendo oferecidos embargos, sendo esses
inadmitidos “in limine” ou rejeitados no mérito, segue-se hasta pública
para venda dos bens penhorados (art. 23, “caput”, LEF). O leilão ou
praça será precedido de publicação de edital em diário oficial
gratuitamente e por uma única vez, com antecedência de dez a trinta
dias, e de fixação no átrio do fórum por igual decurso (art. 22, “caput” e
1º, LEF). Durante esse interregno, o representante da Fazenda Pública
deverá ser pessoalmente intimado (art. 22, § 2º, LEF). A Súmula 121

231
Chimenti, op. cit., p. 209, leciona que parte da doutrina refuta a admissão de exceção de pré-executividade e de objeção de
não-executividade. É a linha seguida por Alcides de Mendonça Lima, em seu Ação Executiva – Necessidade da Penhora para
Discutir a Exigibilidade dos Títulos, in: Processo de Conhecimento e Processo de Execução, Rio de Janeiro, Forense, 1992,
p. 275-290, segundo citação de Câmara, op. cit., p. 466.
175
232
do STJ determina que o executado também deve ser
pessoalmente intimado do dia, hora e local do ato. A arrematação
deverá ser feita nos moldes do CPC (THEODORO JÚNIOR apud
CÂMARA, 2006, p. 374), por lanços, sendo que, na segunda hasta
(Súmula 128 do STJ)233, não é necessário observar o piso da
avaliação, desde que não haja preço vil (arts. 691 e 692, “caput”, CPC).
Nesse caso, cabem embargos à arrematação (art. 746, “caput”, CPC).
Sendo insuficiente o numerário obtido com a venda judicial, é permitida
nova penhora, sem outra oportunidade de embargos ao executado.
A melhor doutrina entende que a alienação por iniciativa particular (art.
647, II, CPC), promovida pela Fazenda Pública, não é possível, porque o
legislador exigiu a expropriação por leilão público (art. 23, “caput”, LEF).
No caso de empresa governamental, em princípio, não há impedimento
para alienação por iniciativa particular. Não há infringência ao princípio da
licitação (art. 37, XXIV, CF/88), porque a impessoalidade e a isonomia
ficam garantidas pelo juiz, ao estabelecer as condições do ato (art. 685-C,
§ 1º, CPC). O art. 689-A, “caput”, CPC, permite a realização de hasta
pública eletrônica, o que se aplica sem maiores problemas à execução
fiscal.
Parcelamento – o art. 745-A, “caput”, CPC, permite faculdade de
parcelamento ao executado, uma vez que reconheça o débito e renuncie
ao direito de embargar. Para pagar, o demandado deve depositar, no
decurso dos embargos, 30% do montante total (incluindo custas e verbas
sucumbenciais), pagando-se o restante em seis parcelas mensais,
incidindo juros de 1% ao mês. Atrasando qualquer mensalidade, incidem
juros de 10% e a execução prossegue. Tratando-se de dívida não-
tributária, não há qualquer entrave à aplicação na execução fiscal.
Havendo débito tributário, recorre-se ao art. 155-A, “caput”, CTN, o qual
se reporta a eventual lei especial em termos de parcelamento. O art. 146,
II, “b”, CF/88, estabelece que a norma geral há de definir, dentre outros, o
regime de parcelamento. Como o legislador complementar (do próprio
CTN) deferiu a competência para o legislador ordinário, não haveria
qualquer problema em aplicar o direito esculpido no art. 745-A, “caput”,
CPC, à execução fiscal tributária, desde que a taxa de juros seja aquela
atinente à lei tributária aplicável (art. 161, § 1º, CTN).
Adjudicação – em favor da Fazenda Pública, tem preferência sobre a
arrematação, ocorrendo nas seguintes hipóteses (art. 24, I e II, LEF):
1. Antes da hasta – pelo preço da avaliação, caso os embargos não
tenham sido oferecidos, tenham sido rejeitados “in limine” ou
desacolhidos no mérito.
2. Depois da hasta – pelo valor da avaliação (caso não haja licitante
depois da 2ª hasta) ou pelo valor oferecido pelo maior lançador (em

232
Súmula 121 do STJ: “Na execução fiscal o devedor deverá ser intimado, pessoalmente, do dia e hora da realização do
leilão”.
233
Súmula 128 do STJ: “Na execução fiscal haverá segundo leilão, se no primeiro não houver lanço superior à avaliação”.
176
igualdade de condições), devendo ser oferecido em até 30 dias da
arrematação.
Obs.: se o crédito fazendário for inferior ao preço da avaliação ou do
maior lanço, a adjudicação só será deferida se o exeqüente depositar
previamente a diferença em 30 dias da decisão judicial (art. 24, parágrafo
único, LEF).
 Recursos – além do sucedâneo recursal dos embargos (que também
admitem a modalidade deferida a terceiros e os de declaração – art. 34,
“caput”, “in fine”, LEF), o sistema de execução fiscal acolhe a apelação
dos embargos e os embargos infringentes nas causas de alçada, bem
como os recursos extraordinários à disposição do sucumbente.
Observa-se que o prazo recursal para o exeqüente é contado em
dobro, conquanto se trate da Fazenda Pública (art. 188, CPC).
Recurso de alçada – se o valor da causa não exceder 50 OTN’s
(283,43 UFIR’s)234, o recurso contra decisão de primeira instância, no juízo
cognitivo (embargos do executado), não é apelação, mas embargos
infringentes ao próprio magistrado “a quo” (art. 34, “caput” e § 2º, LEF).
Como bem indica Câmara (2006, p. 375), ausentam-se o efeito devolutivo
e o duplo grau de jurisdição235. Os embargos infringentes devem ser
opostos em dez dias a partir da intimação da sentença dos embargos do
executado, devendo o “ex adverso” ser ouvido no mesmo lapso e, em
seguida, o julgador profere decisão no decurso impróprio de 20 dias (art.
34, §§ 2º e 3º, LEF). O interregno recursal para a Fazenda Pública será de
20 dias, conquanto se aplica o art. 188, CPC (CHIMENTI, 2002, p. 209).
Nessas hipóteses de menor monta, a decisão do referido recurso pode
desafiar RE para o Excelso Pretório (art. 102, III, “a” a “d”, CF/88), mas
não REsp (THEODORO JÚNIOR apud CÂMARA, 2006, p. 375)236, muito
pelo qual a decisão não é prolatada por tribunal, de acordo com a
exigência do art. 105, III, “a”, CF/88 (CHIMENTI, 2002, p. 211). Nessa
linha, perfilhada por Chimenti (2002, p. 210), já se pronunciou o STJ
quanto às decisões de turmas recursais dos JEC’s (Súmula 203 do
STJ)237.
Agravo e duplo grau de jurisdição – não tem sido admitido agravo das
interlocutórias ao longo da execução fiscal, muito pelo qual os embargos
procedentes se sujeitam ao reexame necessário (art. 475, II, CPC). É
solução que favorece a celeridade, diferentemente do que ocorre na
Justiça Laboral, por meio do seu agravo de petição (art. 897, “a”, CLT).

234
Carlos Henrique Abrão et al., Lei de Execução Fiscal Comentada e Anotada, São Paulo, RT, 1997, p. 225, lembra que,
atualmente, o valor gira em torno de R$ 553,00.
235
Na concepção de Barbosa Moreira e da doutrina prevalente, o duplo grau de jurisdição corresponde à reapreciação de uma
decisão judicial por órgão hierarquicamente superior. Trata-se de princípio constitucional implícito, que pode ser flexibilizado
pelo legislador infraconstitucional. Em contrário à posição explanada, Nelson Nery Júnior considera que o mero reexame por
outro órgão, independentemente do grau hierárquico na estrutura do Judiciário, já configura o duplo grau. Ademais, Câmara
(2006, p. 93) nega a natureza de preceito constitucional ao duplo grau de jurisdição, afirmando-o como simples disposição do
legislador ordinário e complementar, quando for o caso.
236
No mesmo sentido, vem Greco Filho, op. cit., p. 103.
237
Súmula 203 do STJ: “Não cabe recurso especial contra decisão proferida, nos limites de sua competência, por órgão de
segundo grau dos Juizados Especiais”.
177
Exceção deve ser feita no caso de não acolhimento de exceção de pré-
executividade ou de objeção de não-executividade. Quanto ao duplo grau
no sentido estrito, não cabe sua incidência nas causas de alçada. De fato,
como lembra Câmara (2006, p. 375), se aplicado literalmente o art. 475, II,
CPC, na execução fiscal, haveria bizarra infringência à isonomia:
enquanto o executado vencedor nos embargos infringentes teria o
reexame perfeito pelo magistrado “a quo”, a Fazenda Pública faria jus à
reapreciação por tribunal “ad quem”238.

238
No mesmo sentido, Chimenti, op. cit., p. 209, defende que, nas causas de alçada, não deve haver o reexame necessário.
178
DIREITO FINANCEIRO
Introdução – durante o caminhar da evolução estatal, a perspectiva
financeira sempre caminhou ao lado, vez que constitui o sustentáculo material do
país. Até o Estado absolutista, o soberano era único nas decisões acerca das
finanças públicas. Tudo lhe pertencia e a idéia de propriedade particular era
sempre relativa. À medida que a sociedade foi construindo a possibilidade de
influir nos parâmetros financeiros estatais, a ordem jurídica foi sendo erigida em
paralelo. No século XIII, na Inglaterra, permitiu-se que o cidadão listasse as
necessidades básicas da sociedade. Foi a primeira idéia de despesa pública. Os
institutos da propriedade e da liberdade, entretanto, ainda eram praticamente
inexistentes.
Esse afã estatal sobre a acumulação de divisas decorre de sua própria
razão de existência: a consecução do bem comum, da coisa pública.
Mas, de uma forma ou de outra e seja qual for o conceito
de necessidade pública no momento, é fato que para prestar os
seus serviços o Estado necessita de recursos financeiros.
Consta que, de início, os recursos utilizados eram do próprio
ente estatal [receitas originárias], mas com o aumento das
necessidades foi necessário avançar no patrimônio particular,
cobrando tributos e tarifas ou confiscando bens [receitas
derivadas].
Ou seja, foi necessário o desenvolvimento pelo Estado
da atividade financeira, buscando dinheiro para atender às
necessidades públicas.
O direito financeiro trata justamente do regramento
jurídico da atividade financeira do Estado (FÜHRER e FÜHRER,
2001, p. 16).
As finanças públicas dizem respeito à forma como o Estado,
monetariamente, obtém suporte para exercer suas atividades, as quais se volta
eminentemente ao interesse público (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 23).
Finanças é termo que vem do latim “finis”, o qual designa fim, termo. No ponto,
refere-se ao fim de uma operação que se desenvolve pelo pagamento. Em
verdade, como lembram Oliveira e Horvath (2003, p. 24), a atividade financeira
extrapola a seara jurídica, aderindo-se à ciência econômica. Envolve fenômenos
de ordem social, econômica, estatística e política. Dessa feita, é pré-jurídica,
porque preparar a feitura de normas aplicáveis. No dizer da teoria geral do direito,
as finanças pertencem ao plano realeano dos fatos (REALE, 1996).
O Direito Financeiro é a disciplina jurídica da atividade financeira.
Distingue-se do Direito Tributário, nem mesmo havendo entre eles relação de
conteúdo e continente (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 29).
A competência para legislar sobre direito tributário, financeiro e
orçamentário é concorrente entre a União, Estados e DF (art. 24, I e II, CF/88).
No ponto, valem todas as regras quanto a normas gerais, normas específicas e
capacidade legislativa supletiva das unidades-parciais (art. 24, parágrafo único,
179
CF/88). Em tese, os Municípios podem legislar sobre tributos de sua
competência (art. 30, III, CF/88), suplementando as leis gerais e regionais naquilo
que afeta o interesse local (art. 30, I e II, CF/88). A norma geral traz princípios
para solução de entraves entre os diversos legisladores dentro da matéria de
competência comum. Dentro da distribuição de competência, devem ser
diferenciados os conceitos de lei federal e de lei nacional. Com efeito, o âmbito
espacial de validade e o âmbito pessoal de incidência das normas, inclusive de
Direito Financeiro, são diferentes, no dizer de Kelsen (1998).
No quadro da ciência jurídica, o Direito Financeiro, assim como qualquer
outro ramo, tem alicerce fim na CF/88. Entretanto, sua ligação com o Direito
Constitucional é particular, uma vez que há normas específicas contidas no
próprio Texto Maior. Relaciona-se também com o Direito Tributário – apesar de
guardar campo próprio, conforme supra mencionado –, Administrativo,
Processual Civil e Penal.
Receitas públicas – receita pública representa uma entrada definitiva de
valores nos cofres públicos. Todavia, nem todos os ingressos no erário podem
ser considerados como receitas, o que faz excluir o movimento de caixa ou
ingressos (fluxos de entrada “temporária”, simplesmente entrada provisória ou
ingresso)239. Ex.: depósito judicial, o qual pode ser feito em um MS e, sendo
integral, obsta a exigibilidade do crédito tributário (art. 151, II, CTN); o valor será
transferido para a conta do Tesouro Nacional (TN) “incontinenti”, mas não figurará
aí como entrada definitiva (receita pública); deve ser convertido em renda para
configurá-la, sendo certo que essa conversão só é possível se sucumbente o
demandante. Em melhores palavras, as entradas (movimento positivo de dinheiro
para os cofres públicos) comportam duas espécies: receitas públicas (entradas
definitivas) e movimentos de caixa (entradas temporárias). Outros exemplos de
entradas provisórias citados por Führer e Führer (2001, p. 17) são caução, fiança
e empréstimos em geral.
Doutrinariamente, as receitas podem ser classificadas, quanto à origem,
em:
o Originárias – correspondem às entradas definitivas não decorrentes do
poder de imposição do ente de público. Por esse motivo, Führer e Führer
(2001, p. 17) as chamam de facultativas. São extraídas quando o próprio
Estado explora seu patrimônio, de pare em passo com o particular
(contratação em regime de Direito Privado, com as derrogações de
Direito Público). Resultam, na maioria das vezes, da atuação estatal
como agente privado. Há uma relação de coordenação estabelecida
entre Estado e particular, não fazendo uso, o primeiro, de seu poder de
imposição. Preço público e tarifa são formas de receita originária, não se
confundindo com taxa.
o Derivadas – são aquelas que advêm do poder de “imperium” do ente
público, sendo portanto compulsórias (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p.

239
Apesar de admitirem haver doutrina que considera o ingresso como entrada provisória, Régis Fernandes de Oliveira e
Estevão Horvath, Manual de Direito Financeiro, 6ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2003, têm o primeiro como
sinônimo de entrada simplesmente.
180
17). São obtidas a partir de coerção sobre o patrimônio do particular,
não cabendo a esse autonomia perante o Leviatã. O exemplo típico é o
tributo, assim como o são as penalidades, as quais têm origem no poder
de polícia estatal. Dentre os exemplos mais corriqueiros, a taxa é
considerada receita derivada. No contexto, Oliveira e Horvath (2003, p.
65) consideram o art. 149-A, “caput”, CF/88, acrescido pela EC 39/02,
como inconstitucional. Segundo os autores, o constituinte derivado não
teria vênia para alargar os fatos geradores já expressos na CF/88. Não
poderia criar mais exações, ressalvadas as hipóteses anterior e
originalmente previstas pelo próprio Texto Magno. São os casos dos
impostos residuais e das contribuições residuais, por exemplo (arts. 154,
I, e 195, § 4º, CF/88).
o Transferidas – resultam de transferências entre os entes federados. Ex.:
repartição da arrecadação tributária, nos moldes dos arts. 157 a 162,
CF/88. Podem ser obrigatórias (previstas em Constituição, lei ou
destinadas ao SUS – art. 25, “caput”’, “in fine”, LRF) ou voluntárias (por
exclusão às anteriores). Oliveira e Horvath (2003) dizem que as receitas
transferidas se resumem nas transferências correntes, podendo ser
tributárias (na sua maior parte) ou não-tributárias. Ao contrário dos
empréstimos (ou créditos) públicos, as transferências correntes não
implicam em contraprestação pelo tomador.
Obs.: só será derivada a receita se o poder de imposição for exercido pelo
próprio ente que a recebe, sob pena de configurar receita transferida. Ex.: apesar
de ter origem tributária, o repasse de metade da renda de IPVA, proveniente de
veículos licenciados no Município, a esse pertencem (art. 158, III, CF/88), porque
o tributo em comento é de competência do Estado (art. 155, III, CF/88); na
esteira, metade do ITR recolhido em Município continente de seus imóveis,
perfazendo receita transferida, dada a competência tributária deferida pelo art.
153, VI, CF/88 – no caso de delegação de capacidade tributária ativa para o
Município, de acordo com o 153, § 4º, III, CF/88 (acrescido pela EC 45/04), a
receita continua sendo classificada como transferida, porquanto a titularidade do
tributo é atinente à União.
Quanto aos EMPRÉSTISMOS COMPULSÓRIOS, pende um grande
paradoxo. Sob o aspecto do Direito Tributário, a doutrina majoritária tem-nos
como tributos, consoante a disposição do art. 148, I e II, CF/88, encontrar-se
exatamente no capítulo sobre a ordem tributária. Fatia considerável dos
jurisconsultos os qualifica como imposto. Em contrário senso, o próprio STF, por
meio de sua Súmula 418240, pronunciou-se em sentido contrário, apesar de seu
teor não ter mais aplicação em face da atual ordem constitucional vigente. No
entanto, adotando a natureza dada diretamente pelo constituinte originário, o
caráter tributário colocar-los-ia, dentro do Direito Financeiro, na classificação de
receitas derivadas. Como lembram Oliveira e Horvath (2003, p. 37), receita não
podem ser, porquanto o crédito decorrente será resgatado. Seriam qualificados
como entradas temporárias, o que desvirtua, em parte, sua essência de tributo.
240
Súmula 418 do STF: “O empréstimo compulsório não é tributo, e sua arrecadação não está sujeita à exigência constitucional
da prévia autorização orçamentária”.
181
A doutrina ainda classifica as receitas em gratuitas, contratuais e
obrigatórias (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 17). As primeiras não implicam em
qualquer contrapartida por parte do Estado. Ex.: herança jacente deferida ao
Município (art. 1844, CC). As segundas advêm de ajuste em que o Estado
participa na condição de contratante, como em uma compra e venda. As terceiras
são estatuídas e arrecadadas de forma vinculada, como nos tributos.
Oliveira e Horvath (2003) falam em outras classificações das receitas.
Quanto ao critério da periodicidade, poderiam ser enquadradas em ordinárias –
aduzidas nos momentos de normalidade – e extraordinárias – incidentes em
momentos de guerra ou na sua iminência, como se afigura no art. 154, II, CF/88
(imposto especial de guerra).
Tarifas, taxas e preços públicos – tarifa é um item obrigatório a figurar em
contrato de concessão, sendo único nessa espécie de avença administrativa. Não
tem natureza tributária, ao contrário da taxa, porque não se reverte com
exclusividade para o erário. Também não deve ser confundida com preço público,
porque esse é determinado conforme o valor do serviço prestado, de acordo com
o mercado, sendo revertido para o próprio Estado. Preço público não leva a lucro.
Seu valor se deve ao custeio da atividade praticada em favor do usuário. Ex.:
preço do selo de correspondência. A tarifa deve ser fixada no menor valor
possível, destinando-se tanto ao custeio do concessionário quanto a seu lucro, de
sorte a garantir, dentro de um patamar razoável, a atualidade do serviço. No
raciocínio, deverá ser módica também, tendo em conta os preços praticados no
mercado. A tarifa ainda permite reversão aos cofres públicos, desde que haja
previsão contratual (ou legal) nesse sentido. Ex.: cobrança por serviço de água e
esgoto constitui tarifa, segundo entendimento do STJ e do STF241.
Taxas e preços públicos – para que persista um conflito dessa natureza,
considera-se a prestação de serviço público específico e divisível em
contrapartida à remuneração por parte de usuário. Isso porque os serviços
públicos universais e indivisíveis (“uti universi”) recebem como contraprestação
impostos. A querela se coloca segundo três orientações teóricas. Uma primeira
corrente, olhando a figura do prestador, entende que haverá preço público se
aquele for ente de Direito Privado, existindo taxa se for de Direito Público. Uma
segunda corrente observa a compulsoriedade no pagamento da contraprestação:
sendo obrigatório, a natureza será de taxa, a teor do art. 3º, CTN; sendo
facultativo, haverá preço público, por exclusão. Terceira posição assevera que o
parâmetro é a compulsoriedade na utilização do serviço: sendo de uso
obrigatório, ainda que potencial, persistirá taxa; sendo de fruição facultativa,
existiria preço público. Essa compulsoriedade estaria prevista em lei. Ademais, a
existência de um preço público teria como pressuposto adesão a um contrato,
presente a autonomia das partes. A taxa não respeita esse mecanismo,
entendendo que não há escolha pelo usuário. O STJ adota a última corrente,
porque a coerção no uso concreto ou potencial do serviço só pode ser
remunerado por meio de taxa242. Essa obrigatoriedade da taxa só é

241
STF, RE 54491-PE, DJU 15/10/1963. STJ, 1ª T., REsp 802.559-MS, rel. Min. Luiz Fux, j. 14/8/2007, Informativo do STJ
n° 327.
242
STJ, REsp’s 848.247 e 167.489.
182
excepcionada, segundo a doutrina, em três situações: emissão de passaporte,
custas judiciais e licenciamento ambiental. Ademais, a natureza do prestador é
irrelevante para a determinação da forma de contraprestação, conquanto fato
irrelevante à diferenciação entre preço público e taxa. Destarte, a Súmula 545 do
STF (já comentada) materializa, a priori, o segundo entendimento. Mas como foi
erigida antes da leitura feita pelo STJ, deve ser interpretada à luz da época de
sua edição. A obrigatoriedade é realmente da fruição do serviço e não do
pagamento, porque esse é sempre devido quando há prestação. No contexto, o
valor cobrado em pedágio pode ter natureza de taxa ou preço público,
dependendo da existência ou não de alternativa na via de acesso. De fato, o art.
150, V, “in fine”, CF/88, dá margem à cobrança de pedágio por meio de taxa,
porque se refere especificamente à tributação. O STF, nesse passo, o define
como tributo da espécie taxa243. A cobrança de pedágio por concessionária é
lícita, mesmo que inexista rodovia alternativa, a qual não é obrigatória, salvo se o
legislador dispuser de forma diferente244.
Em suma, a natureza da personalidade jurídica da entidade da
Administração Indireta não tem o condão de desnaturar os valores cobrados
pelos serviços públicos por ela prestados. Executando serviço público próprio de
Estado ou exercendo poder de polícia, a pessoa sempre receberá taxa como
contraprestação (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 53).
LC 101/00 – Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)
OBJETO (abrangência) – cumprimento de metas sobre receitas e
despesas e observância de limites e condições quanto à renúncia de receita,
despesas com pessoal, seguridade social, dívidas consolidada e mobiliária,
operações de crédito (incluindo antecipação de receita), concessão de garantia e
restos a pagar (art. 1º, § 1º, LRF). Juntamente com a Lei 8429/92, a LRF erige
presunções legais de ao erário, implicando em responsabilidade objetiva por
parte do administrador e do agente político. No entanto, o STF, em recente
julgamento, entendeu que esses últimos não são atingidos pela Lei 8429/92,
porquanto configura “bis in idem” com a Lei 1079/50245.
ASPECTO SUBJETIVO (abrangência) – União, Estados, DF, Municípios,
Tribunais de Contas, Judiciário, fundos, autarquias, empresas governamentais e
MP (art. 2º, §§ 2º e 3º, I a III, LRF).
CONCEITOS (art. 29, I a V, LRF):
• Dívida pública fundada – obrigações totais de mais de 12 meses;
precatórios não pagos; obrigações cujo prazo para pagamento é menor
que 12 meses e estão previstas no orçamento. A dívida pública fundada,
ao contrário da flutuante, é aquela de médio ou longo prazo (FÜHRER e
FÜHRER, 2001, p. 23). Tecnicamente, não coincide com o conceito de
dívida consolidada, ou seja, aquela considerada perpétua, cujo principal
não é resgatável, valendo os pagamentos tão-só aos juros. Apesar disso,

243
STF, RE 181475.
244
STJ, 1ª T., REsp 617.002-PR, rel. Min. José Delgado, j. 5/6/2007, Informativo do STJ 322.
245
STF, Rcl 2138/DF, rel. orig. Min. Nelson Jobim, rel. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 13.6.2007, Informativo do STF
n° 471.
183
o art. 29, I, Lei 101/00, trata a dívida fundada e a consolidada como
sinônimos.
• Dívida mobiliária – decorrente da emissão de títulos pela União, Estados
e Municípios.
• Operações de crédito – mútuo, abertura de crédito, aquisição financiada
de bens, etc.
• Concessão de garantia – um ente garante outro.
• Refinanciamento de dívida mobiliária – emissão de novos títulos para
pagamentos anteriores (novação objetiva – art. 360, I, CC).
• Receita de capital – é aquela derivada da alienação de patrimônio
público. Não pode ser destinada ao pagamento de despesas correntes
(art. 44, “caput”, LRF).
Receitas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF, LC 101/01) – o diploma
estabeleceu regras sobre a elaboração do orçamento público, orientando o
estabelecimento de receitas e despesas públicas. O art. 11, “caput”, LRF, dispõe
que os entes da federação são obrigados a instituir e arrecadar todos os tributos
de sua competência constitucional. A infringência desse comando com referência
a impostos impede as receitas por transferências voluntárias (art. 11, parágrafo
único, LRF). O estabelecimento dessa sanção acaba por retirar da competência
tributária a facultatividade do seu exercício, característica intrínseca daquela. No
ponto, à luz do dispositivo em apreço, a não instituição do imposto sobre grandes
fortunas pela União vai de encontro à realidade (art. 153, VII, CF/88). A
constitucionalidade do art. 11, “caput”, LC 101/00, é debatida pela doutrina à luz
do pacto federativo (art. 1º, “caput”, CF/88), em que pese não haver
pronunciamento judicial sobre a celeuma. Oliveira e Horvath (2003, p. 47)
defendem que o art. 11, “caput”, LC 101/00, é inconstitucional quanto à
obrigatoriedade de Estados, DF e Municípios na instituição de todos os tributos,
porém constitucional na sanção esculpida no art. 11, parágrafo único, LC 101/00.
De fato, usando a terminologia aduzida por Leon Duguit (apud OLIVEIRA e
HORVATH, 2003, passim), trata-se de ato-condição, ou seja, condicionante para
que os mencionados entes recebam transferências voluntárias.
A definição de transferências voluntárias está no art. 25, “caput”, LRF:
todas aquelas não previstas em Constituição, lei ou destinadas ao SUS.
Receita corrente líquida – total de “receitas tributárias, de contribuições,
patrimoniais, industriais, agropecuárias, de serviços, transferências correntes e
outras receitas também correntes”, dada a classificação do art. 11, § 4º, Lei
4320/64, menos (art. 2º, II, “a” a “c”, LRF)
• Repasses constitucionais e legais;
• Contribuições previdenciárias;
• PIS/PASEP;
• Repasse aos municípios e Estados;
• Contribuições para RPPS e compensações.
184
Na receita corrente líquida, estão incluídas (art. 2º, § 1º, LRF):
• Receitas e despesas com ensino (parcela obrigatória para fundo – art.
60, ADCT);
• Receitas de ICMS (LC 87/96).
A renúncia de receita ocorre basicamente nas hipóteses de isenções
tributárias, de reduções de base de cálculo, de benefícios fiscais, etc. (art. 14, §
1º, LRF), ou seja, representa qualquer evento jurídico que gere a redução das
entradas nos cofres públicos. Sua implementação depende do cumprimento das
condições explicitadas no art. 14, “caput”, I ou II, LRF:
o Projeção do impacto econômico-financeiro no orçamento do mesmo
exercício e nos dois posteriores;
o Previsão na LDO;
o Inexistência de prejuízo aos resultados previstos no Anexo de Metas
Fiscais (objetivos de arrecadação), mediante expressa consideração na
lei orçamentária; ou
o Compensação por adoção de outras medidas (aumento de receita),
como elevação de base de cálculo, de alíquotas ou criação de impostos
ou contribuições.
Essas exigências não se aplicam em se tratando de renúncia de II, IE, IPI
e IOF (art. 14, § 3º, I, LRF), para garantir a extrafiscalidade na União na economia
nacional, como lembram Führer e Führer (2001, p. 25). Também não têm vez no
caso de cancelamento de débito perante a Administração pelo baixo valor (art.
14, § 3º, II, LRF). A medida que importe em renúncia em receita só entra em vigor
depois que a medida compensatória já tiver sido implementada (art. 14, § 2º, LC
101/00).
Despesas públicas – representam todo gasto ou dispêndio público.
Apresentam algumas características:
- Previsão em lei específica;
- Documentação, de sorte a provar sua origem e destinação;
- Contrapartida em receita suficiente, não podendo o ente gastar mais que
pode.
A regra geral para a determinação da despesa é da não-afetação
orçamentária (art. 167, IV, CF/88). Mas há esceções:
o Saúde e ensino (arts. 77, ADCT, e 212, “caput”, CF/88);
o Pagamento de servidores públicos (despesa corrente de custeio);
o Serviço da dívida (cumprimento de obrigações adquiridas em
empréstimos públicos);
o Formação de fundos especiais constitucionais (erradicação e combate à
pobreza, educação básica, FPE, FPM, fundo para desenvolvimento do
N, NE e CO, social de emergência).
185
A parte de despesas com pessoal está desenhada nos arts. 19 e 20,
LRF.
DESPESA COM PESSOAL – definição está no artigo 18, “caput”, LRF,
incluindo terceirização de mão-de-obra (art. 18, § 1º, LRF).
• Para cálculo, somar despesa do mês corrente com os 11 anteriores (art.
18, § 2º, LRF).
• Limites: 50% para União e 60% para Estados e Municípios (art. 19, I a
III, LRF).
• Estão excluídos do limite (art. 19, § 1º, I a VI, LRF):
o Indenização por demissão ou voluntária;
o Convocação extraordinária do Congresso Nacional;
o Precatórios relativos a exercícios anteriores;
o Gastos com pessoal do DF e dos Territórios;
o Inativos com contribuição em RPPS.
• Percentuais por órgãos (art. 20, I a III, LRF):
o Federal: 2,5% para Legislativo, 6% para Judiciário, 40,9% para
Executivo e 0,6% para MPU;
o Estadual: 3% para Legislativo, 6% para Judiciário, 49% para
Executivo e 2% para MPE;
o Municipal: 6% para Legislativo e 54% para Executivo.
AUMENTO DE DESPESA NULO – 180 dias antes do término do mandato
no Poder ou em órgão (art. 21, parágrafo único, LRF). O texto do art. 21, “caput”,
LRF, fala em ato que importe em aumento de gastos com pessoal sem observar
os ditames legais. No ponto, será considerado nulo. No magistério de Oliveira e
Horvath (2003, p. 89), o termo “ato”, exprimido pelo legislador, diz respeito aquele
concreto. O ato legislativo em sentido estrito (lei, decreto legislativo, resolução,
etc.) aqui não se enquadra, porquanto não tem o condão de gerar despesa
materialmente. Nesse passo, a criação de cargo, por meio de lei, não importa em
majoração de gastos com pessoal. O que provocará o dispêndio é seu
provimento, a partir do qual o agente público fará jus a seu vencimento.
SE PERCENTAL COM PESSOAL CHEGAR A 95% DO LIMITE – não
pode aumentar vencimentos, criar cargos, mudar carreira, contratar mais agentes
públicos (salvo educação, segurança, saúde e sessão extraordinária do CN) ou
contratação em regime de hora extraordinária (art. 22, parágrafo único, I a V,
LRF). Quando o percentual ultrapassar 90%, cabe ao TC alertar o Poder ou
órgão sobre a temeridade da situação (art. 59, § 1º, II, LRF).
NÃO CUMPRIMENTO DO LIMITE – nos dois quadrimestres seguintes, o
administrador deverá levar a cabo as seguintes medidas:
• Extinção de cargos e funções ou redução dos vencimentos respectivos;
186
• Redução da jornada de trabalho, com respectiva redução de
vencimentos;
• Redução de despesas com cargos em comissão e funções de
confiança, não sendo possível a redução de jornada atrelada à
diminuição de vencimento246;
• Exoneração de servidores não-estáveis;
• Exoneração de servidores estáveis, com extinção dos respectivos
cargos, sendo essa medida autorizada somente depois das anteriores
(art. 169, § 4º, CF/88), fazendo jus o exonerado a uma indenização de
um mês de vencimento por ano de serviço (art. 169, § 5º, CF/88) – o
cargo não poderá ser recriado nos próximos quatro anos (art. 169, § 6º,
CF/88). A escolha dos estáveis a serem exonerados se dá de acordo
com os critérios da Lei 9801/99: menor tempo de serviço, maior
remuneração, menor idade, etc. (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 92).
A lei ainda permite, como medida alternativa, a redução de valores de
pagamento ou a redução temporária da jornada de trabalho com a
conseqüente diminuição de vencimentos temporariamente (art. 23, §§
1º, “in fine”, e 2º, LRF), no entanto esses comandos estão suspensos
por cautelar ajuizada no STF247.
Se ainda o ente não conseguir se adequar às balizas legais, não pode
receber transferência voluntária, garantia de outro ente ou contratar operações de
crédito (art. 23, § 3º, I a III, LRF), salvo refinanciamento da dívida mobiliária e
financiamento de gastos com redução de despesas com pessoal. O art. 169, § 2º,
CF/88, ainda fala em impedimento de recebimento de receitas transferidas
obrigatórias.
O art. 15, LRF, considera a geração de despesas ou assunção de
obrigação pelo Estado em desacordo com as condicionantes mínimas dos arts.
16 e 17, LRF, como ato ilícito.
O aumento de despesa por criação, expansão ou aperfeiçoamento de
ação governamental depende do cumprimento de alguns requisitos (art. 16, I e
II, LRF):
 Demonstração do impacto econômico-financeiro no exercício atual e nos
dois seguintes;
 Demonstração da existência de receita suficiente a custeá-las;
 Compatibilidade com a LDO e com plano plurianual, mediante
declaração do ordenador de despesas.
A regra do art. 16, I e II, LRF, não se aplica paras despesas públicas
irrelevantes, entendidas como aquelas que não oferecem impacto considerável,

246
Na ADIn 2238, rel. Min. Ilmar Galvão, o STF suspendeu a eficácia do art. 23, § 1º, “in fine”, e 2º, LC 101/00, com base na
irredutibilidade de salários e de vencimentos (art. 37, XV, CF/88).
247
STF, Plenário, ADI 2238 MC/DF, rel. orig. Min. Ilmar Galvão, rel. p/ o acórdão Min. Carlos Britto, j. 8.8.2007, Informativo
do STF n° 475.
187
de acordo com a LDO (art. 16, § 3º, LRF). Ex.: aquelas que podem ser
realizadas sem licitação.
Aumento de despesa do RGPS que importe concessão legal de benefício,
expansão quantitativa das prestações e reajuste de valores pagos não precisa
ser compensada (art. 24, § 1º, I a III, LC 101/00), o que se aplica em toda
seguridade (art. 24, § 2º, LC 101/00).
O art. 17, “caput”, LRF, trata das despesas obrigatórias de caráter
continuado (despesa corrente ou operacional de mais de um exercício), isto é,
aquelas decorrentes de lei, de MP ou de ato administrativo normativo que fixe sua
realização em interregno superior a dois anos. Devem atender aos seguintes
pressupostos (art. 17, §§ 1º e 2º, LRF):
 Estimativa de impacto econômico-financeiro pelo exercício presente e
dois subseqüentes;
 Demonstração da existência de receita suficiente a custeá-las;
 Estar de acordo com os resultados preconizados no Anexo de Metas
Fiscais;
 Compensação por outras medidas a amortizar o débito nos exercícios
posteriores, como aumento de tributo ou redução permanente de
despesa.
Não se aplicam as condicionantes do art. 17, §§ 1º e 2º, LRF, quando se
trate de reajuste de vencimento de servidor público ou de despesa relativa ao
pagamento da dívida pública (art. 17, § 6º, LRF).
Despesas emergenciais ao setor privado só são possíveis mediante:
• Prévia autorização legal;
• Compatibilidade com a LDO;
• Previsão em orçamento ou em crédito suplementar;
• Não abrangência de instituições financeiras, incluindo empréstimos para
recuperação e troca de controle acionário, salvo operações de
desconto e empréstimos realizados pelo BACEN com prazo inferior a
360 dias – nesse último caso, os demais requisitos não precisam ser
observados (art. 26, § 1º, LRF).
LIMITAÇÃO DE EMPENHO – a cada bimestre, ultrapassado o limite
estabelecido no anexo de metas fiscais, deve haver diminuição de gastos na
forma da LDO (art. 9º, “caput”, LRF). No entanto, transferências e despesas
constitucionais e legais não poderão ser afetadas, o pagamento da dívida pública
e outras despesas especificadas na LDO. Se o Judiciário, o Legislativo e o
Ministério Público não observarem a limitação de despesas, o Executivo tem
franquia para tomar a frente e limitar os repasses de duodécimos (art. 9º, § 3º,
LRF). Porém, esse último comando está com a eficácia suspensa pelo STF em
sede de cautelar248.
248
STF, Plenário, ADI 2238 MC/DF, rel. orig. Min. Ilmar Galvão, rel. p/ o acórdão Min. Carlos Britto, j. 8.8.2007, Informativo
do STF n° 475.
188
• Não serão limitados os gastos constitucionais, legais e previstos na
LDO (art. 9º, § 2º, LRF).
Oliveira e Horvath (2003, p. 91) admitem transação dos débitos da
Fazenda Pública com condenação transitada em julgado, mesmo que sejam
incluídos uns e excluídos outros credores. O fulcro seria a vantagem, porque
haveria concessões recíprocas. No ponto, os autores admitem até mesmo a
negociação no período eleitoral, ou seja, seis meses antes do término do
mandato eletivo, desde que haja um juízo de razoabilidade e de que não exista
razão de fundo eleitoreiro.
VEDADA TRANSFERÊNCIA VOLUNTÁRIA – a ente estatal que não
tenha previsão e execução de todas receitas tributárias cabíveis (art. 11,
parágrafo único, LRF).
• Receitas de operações de créditos devem ser menores ou iguais às
despesas de capital previstas em LO anual (art. 12, § 2º, LRF). No
entanto, esse dispositivo encontra-se com a eficácia suspensa pelo
Supremo249.
TRANSFERÊNCIAS VOLUNTÁRIAS – têm como pressuposto o
atendimento dos seguintes requisitos (art. 25, § 1º, I a IV, LRF):
• Condições estabelecidas na LDO;
• Existência de dotação específica na LO anual;
• Proibição de transferências para pagamento de pessoal da ativa,
inativos ou pensionistas dos Estados, DF e Municípios (art. 167, X,
CF/88);
• Contas em dia com o órgão transferidor, inclusive com referência a
recursos anteriormente recebidos;
• Aplicação dos percentuais constitucionais quanto à saúde e à educação;
• Observância dos limites em operações de crédito (inclusive antecipação
de receita), restos a pagar, total da dívida mobiliária e consolidada e
despesa total com pessoal;
• Contrapartida na LO orçamentária.
Obs.: é vedada destinação diferente da pactuada, cujas sanções não se
aplicam à saúde, educação e assistência social (art. 25, §§ 2º e 3º, LRF).
CAIXA DOS RPPS – não pode ser aplicado na compra de valores
mobiliários do próprio ente (Estados e Municípios) nem para empréstimos de
qualquer natureza aos segurados e ao Poder Público, incluindo empresas
controladas (art. 43, § 2º, I e II, LRF). O art. 24, “caput”, LC 101/00, repete a regra
da contrapartida quanto à seguridade social (art. 195, ° 5º, CF/88). Os Municípios
com fundo previdenciário de RPPS devem observar o limite de 12% sobre a
receita líquida nos gastos com inativos. Quando o percentual for ultrapassado, o
TCE (ou TCM) deve alertar (art. 59, § 1º, IV, LC 101/00).

249
STF, Plenário, ADI 2238 MC/DF, rel. orig. Min. Ilmar Galvão, rel. p/ o acórdão Min. Carlos Britto, j. 8.8.2007, Informativo
do STF n° 475.
189
FISCALIZAÇÃO ORÇAMENTÁRIA (órgãos) – é feita pelo Legislativo
(com auxílio do TC) e pelo controle interno de cada órgão (arts. 59, “caput”, LRF,
70, “caput”, e 71, “caput”, CF/88), sem embargo do controle popular ou privado
(art. 74, § 2º, CF/88).
LO DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS – poderão estabelecer limites
menores para dívida fundada, mobiliária, operações de crédito e concessão de
garantia (art. 60 LRF).
CALAMIDADE PÚBLICA, ESTADO DE DEFESA OU DE SÍTIO – prazos
suspensos para atendimento dos resultados fiscais; limitação de empenho fica
dispensada (art. 65, I, II e parágrafo único, LRF).
PIB MENOR QUE 1% – prazos para adequação da despesa com pessoal
e da dívida consolidada são duplicados (art. 66, “caput” e § 1º, LRF).
Lei do Orçamento (Lei 4320/64) – também traz regras orçamentárias,
sendo aplicável no que não conflita com a LRF.
RECEPÇÃO – em decorrência da disposição do art. 165, § 9º, I e II,
CF/88, a Lei 4320/64, foi recepcionada pela ordem constitucional de 1988 como
LC.
DESTINATÁRIOS – o diploma em relevo deve ser observado por todos os
entes políticos: União, Estados, DF e Municípios (art. 1º, Lei 4320/64).
DEFINIÇÕES:
• Tributo – está definido no art. 9º, Lei 4320/64. Sua exigência, dentre
outros princípios, deve observar a legalidade estrita (art. 51, Lei
4320/64). Todavia, a anualidade na sua instituição não foi ditame
observado pelo constituinte nas limitações ao poder de tributar (art. 150,
I a VI, CF/88).
• Dívida ativa tributária e não-tributária – a primeira engloba todos os
tributos, multas e créditos da Fazenda Pública lançados e não recolhidos
ou cobrados no exercício de origem; a segunda compreende as dívidas
para com o Estado não sujeitas a lançamento ou não lançadas até então
(art. 39, “caput” e parágrafo único, Lei 4320/64).
• Lançamento – é o ato de verificação da procedência do crédito tributário
e a designação da pessoa devedora, inscrevendo-se o débito na
chamada dívida ativa da Fazenda Pública (art. 53, Lei 4320/64).
• Receitas correntes – são aquelas de origem tributária, patrimonial,
industrial, etc., ou proveniente de repasse de outras pessoas, desde que
destinadas a despesas correntes (art. 11, § 1º, Lei 4320/64).
• Receitas de capital – são aquelas decorrentes do pagamento de dívidas,
da conversão de bens e direitos em renda ou de repasse de outras
pessoas para o pagamento de despesas de capital (art. 11, § 2º, Lei
4320/64).
• Despesas de custeio – destinadas a manter serviços anteriormente
criados (art. 12, § 1º, Lei 4320/64).
190
• Transferências correntes – são dotações de despesas das quais não
decorra contraprestação direta em bens ou serviços (art. 12, § 2º, Lei
4320/64).
• Subvenções – são dotações destinadas a cobrir despesas de custeio de
entidades beneficiadas (art. 12, § 3º, Lei 4320/64), podendo ser sociais
ou econômicas (art. 12, § 3º, I e II, Lei 4320/64). As primeiras são
repasses de verbas destinados a entidades prestadoras de serviços
públicos essenciais (sociais – saúde, educação e assistência social),
enquanto as segundas são dirigidas a empresas governamentais ou
particulares (arts. 16, “caput”, e 18, “caput”, Lei 4320/64). Em qualquer
caso, as subvenções não implicam em contraprestação da entidade
beneficiada, visto que sua principal finalidade é cobrir seus déficits.
• Investimentos – são dotações para o planejamento e a execução de
obras, inclusive as destinadas à aquisição de imóveis considerados
necessários à realização destas últimas, bem como para os programas
especiais de trabalho, aquisição de instalações, equipamentos e material
permanente e constituição ou aumento do capital de empresas que não
sejam de caráter comercial ou financeiro (art. 12, § 4º, Lei 4320/64). Os
investimentos representam dotação orçamentária para entidade para
maximizar a prestação de serviços públicos, ficando evidente o caráter
social. Não pode dizer respeito ao custeio do beneficiário, porque aí
constituiria subvenção social.
• Inversões financeiras – compreendem aquisição de imóveis e bens de
capital ou repasse da verba da Administração Direta para Indireta (art.
12, § 5º, I a III, Lei 4320/64), desde fique patente o caráter econômico da
operação. As inversões, ao contrário dos investimento, não têm cunho
social de atendimento do interesse público na prestação de serviço
também público. Tem por finalidade majorar os meios das entidades
estatais de fins econômicos, ressalvado o custeio de suas atividades, as
quais serão arcadas mediante subvenções econômicas.
Obs.: não haverá subvenção econômica a empresa de fim lucrativo,
salvo menção expressa em lei (art. 19, Lei 4320/64); no mesmo raciocínio,
é vedado auxílio financeiro para investimentos em empresas lucrativas
(art. 21, “caput”, Lei 4320/64).
• Transferências de capital – são empréstimos entre entes da federação
(art. 12, § 6º, Lei 4320/64).
• Créditos adicionais – são as autorizações de despesa não computadas
ou insuficientes na Lei de Orçamento (art. 40, Lei 4320/64), podendo ser
suplementares (para reforço), especiais (não constantes do orçamento)
e extraordinárias (para despesas urgentes e imprevisíveis, como
guerra, comoção intestina ou calamidade pública) – art. 41, I a III, Lei
4320/64. Os especiais e suplementares dependem de prévia autorização
legislativa e de recursos disponíveis, sendo abertos por meio de decreto
do chefe do Executivo (art. 42, Lei 4320/64). Já os extraordinários seriam
abertos diretamente por decreto executivo, comunicando-se
191
posteriormente o Legislativo (art. 44, Lei 4320/64). No entanto, a teor
do que dispõe o art. 62, “caput”, CF/88, o Presidente da República (e os
governadores e prefeitos que têm vênia legal para tal) deve abri-lo por
meio de MP.
• Unidade orçamentária – é a unidade de bens e serviços subordinada ao
mesmo órgão ou repartição (art. 14, “caput”, Lei 4320/64).
• Elemento – é a unidade mínima a ser discriminada na planilha
orçamentária (art. 15, “caput” e § 1º, Lei 4320/64).
• Empenho (art. 58, Lei 4320/64) – ato de autoridade competente que cria
obrigação de pagamento para o Estado, devendo se restringir ao limite
de crédito correspondente (art. 59, “caput”, Lei 4320/64). Toda despesa
depende de prévio empenho (art. 60, “caput”, Lei 4320/64). Mediante
previsão em despesa mensal, o gasto público fica facultado para o
administrador. Cada categoria de despesa é prevista, dentro da lei
orçamentária anual, segundo dotações de orçamento específicas.
• Empenho por estimativa – é permitido quando não for possível
determinar o valor preciso da despesa (art. 60, § 2º, Lei 4320/64).
• Empenho global – é aquele sem discriminação de itens, sendo permitido
para obrigações contratuais de trato sucessivo (parcelamento) – art. 60,
§ 3º, Lei 4320/64.
• Nota de empenho – documento que expressa o ato de assunção da
obrigação de pagamento da Fazenda Pública para com credor, contendo
nome desse, natureza e valor da despesa, bem como a dedução do
saldo disponível (art. 61, Lei 4320/64). É documento que certifica a
origem do gasto, de sorte a enquadrá-lo dentro da despesa mensal.
• Liquidação de despesa – é a verificação do crédito para com a Fazenda
Pública, sendo “conditio sine qua non” para o pagamento (arts. 62 e 63,
“caput”, Lei 4320/64). Tem por finalidade dar certeza à Administração
acerca da despesa, com identificação do credor, do objeto (motivo) e da
quantia a ser paga.
• Pagamento de despesa – é o despacho de autoridade competente com
ordem para pagar a despesa (art. 64, “caput”, Lei 4320/64). O
documento é elaborado pelo setor de contabilidade (art. 64, parágrafo
único, Lei 4320/64). É efetivado pela tesouraria ou órgão congênere (art.
65, Lei 4320/64).
• Fundo especial – é aquele cuja receita decorre de vinculação prevista
em lei (art. 71, Lei 4320/64), a qual é o único meio hábil instituí-lo
(reserva legal).
• Dívida fundada (ou consolidada) – é obrigação estatal com exigibilidade
maior que 12 meses (art. 98, “caput”, Lei 4320/64). “Ex vi” dos arts. 29, §
3º, e 30, § 7º, LRF, a dívida com prazo menor que 12 meses, desde que
prevista no orçamento, além dos precatórios não pagos, estão incluídos
192
na dívida consolidada. Führer e Führer (2001, p. 23) a definem com
dívida de médio e longo prazo.
• Dívida flutuante – é formada por restos a pagar (dívidas não pagas até
31 de dezembro do exercício de geração), serviço da dívida a pagar,
depósitos e débitos de tesouraria (art. 92, I a IV, Lei 4320/64). Trata-se
de dívida de curto prazo (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 23).
• Dotação – é a quantia prevista no orçamento para determinado tipo de
despesa.
• Regime orçamentário – pode ser de competência (que observa apenas a
data do fato gerador da despesa – empenho –, independentemente do
efetivo pagamento, o qual poderá ocorrer no exercício seguinte) ou de
caixa (em que a despesa é considerada somente no exercício em que for
efetuado o pagamento). O Brasil adota um sistema misto: regime de
competência para despesas e de caixa para receita.
• Resultado primário – é a diferença entre receita e despesa, excluindo-se
a dívida pública (principal e juros).
• Resultado nominal – é o resultado único das receitas menos as
despesas, incluindo a dívida pública.
O orçamento é tido como instrumento de intervenção estatal na economia.
Historicamente, era mera peça contábil, com caráter politicamente neutro
(OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 99). Posteriormente, passa a ser político e
extrafiscal (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 101). No início, vigorava a
irresponsabilidade do governante (rei), fazendo com que o orçamento se limitasse
a uma “peça de ficção”. O Estado de Direito e o princípio republicano mudaram o
cenário.
O orçamento não pode ser mera peça financeira, nem
apenas simples plano de governo, mas representa o
compromisso político de cumprimento de promessas sérias
levadas ao povo (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 105).
Para exemplificar a colocação, citando Genro, os mesmos autores
mencionam a concretização do orçamento participativo municipal, à luz dos arts.
4º, III, “f”, e 44, Lei 10257/01250. Com efeito, a consulta popular orçamentária,
como decorrente da democracia participativa (SILVA, 1996, passim), não constitui
simples fato opinativo, sob pena de inefetividade do instituto (OLIVEIRA e
HORVATH, 2003, p. 106). Para Ricardo Lobo Torres (apud OLIVEIRA e
HORVATH, 2003, p. 107), o orçamento é instrumento de efetivação da dignidade
humana e da justiça distributiva (arts. 1º, III, e 3º, I e III, CF/88), valores magnos
da democracia atual. Passa de diploma a colimar somente equilíbrio financeiro,

250
Oliveira e Horvath, op. cit., asseveram que há três ordens de mecanismos precípuos a tornar legitimo e efetivo o orçamento
participativo: critérios firmes para aferir a verdadeira vontade popular; vinculação do governante às decisões tomadas; controle
de sua execução também pelo povo. Nesse passo, dentro da idéia de democracia participativa, talhada por Silva, Curso de
Direito Constitucional Positivo, 11ª ed., São Paulo, Malheiros, 1996, os autores afirmam a existência de dois centros de poder:
um residente no exercício do voto pelo povo; outro, por meio de instituições populares. É exatamente nessa segunda seara que
estaria incluído o orçamento participativo.
193
porque é através dele que se concretizam as prestações inerentes aos direitos
sociais.
Oliveira e Horvath (2003, p. 10-103) advogam pela natureza de lei em
sentido formal do orçamento, de cunho temporário e de “status” ordinário. Quanto
às receitas, os autores aceitam a tese da lei em sentido material; quanto às
despesas, seria autêntico ato administrativo.
A Lei 4320/64 traz a classificação legal de receitas e despesas nos seus
arts. 11 e 12. As receitas podem ser correntes ou de capital, assim como as
despesas.
Receitas correntes são aquelas que resultam da atividade do Estado de
uma forma ampla, decorrente do seu poder de imposição ou de sua atuação
como ente privado.
Receitas de capital são aquelas que têm origem na assunção de dívida.
Despesas correntes são realizadas no custeio do Estado, com o intuito de
manter a “máquina estatal”.
Despesas de capital são relacionadas com investimentos do Estado em
certo setor ou perante determinada necessidade pública.
Receitas correntes são as seguintes (art. 11, § 4º, Lei 4320/64):
 Patrimoniais;
 Tributárias;
 Agropecuárias;
 Transferidas;
 Industriais;
 Serviços;
 COntribuições.
As receitas de capital são as seguintes (art. 11, § 4º, Lei 4320/64):
- Operações de crédito;
- Alienações de bens;
- Amortização de empréstimos;
- Transferências de capital (empréstimo a fundo perdido).
As despesas correntes são as seguintes (art. 12, “caput”, Lei 4320/64):
 De custeio;
 Resultantes das transferências correntes.
As despesas de capital são as seguintes (art. 12, “caput”, Lei 4320/64):
• Investimentos;
• Transferências de capital.
194
Orçamento – é uma lei em sentido formal, vinculando o ente público.
Ao mesmo tempo, consubstancia documento programático, estabelecendo o
comportamento da Administração perante o dinheiro público.
Orçamento é a peça técnica que demonstra as contas
públicas para um período determinado, contendo a
discriminação da receita e da despesa, demonstrando a política
econômico-financeira e o programa de trabalho do Governo,
obedecidos os princípios de unidade, universalidade e
anualidade (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 18).
Há três tipos de lei que o compõem: plano plurianual, LDO e lei
orçamentária anual (art. 165, I a III, CF/88).
Plano plurianual – o plano plurianual estabelece um planejamento macro,
objetivando as intenções da Administração por um período de quatro anos. É um
desdobramento do planejamento programa, fixando as atividades
governamentais pelo decurso indicado. São previstas somente despesas de
capital (investimento) e obrigatórias de duração continuada (art. 17, “caput”, LRF),
as quais serão realizadas em prazo superior a dois exercícios. Por conseqüência,
qualquer despesa que perdure por mais de um exercício depende de previsão ou
compatibilidade com o plano plurianual, sob pena de responsabilização do
administrador (arts. 167, § 1º, CF/88, e 5º, § 5º, LRF). O plano plurianual é
composto por despesas de capital e decorrentes de programas de duração
continuada. As despesas de capital abarcam os investimento (obras realizadas
pelo Poder Público), as inversões financeiras (injeção de capital em empresas
governamentais, as quais executam atividade econômica “stricto sensu” – art.
173, “caput”, CF/88) e as transferências de capital (receitas transferidas
excepcionalmente para outras entidades da Administração, como auxílios e
subvenções). Deve ser apresentado pelo chefe do Executivo até o dia 30 de abril
do primeiro ao de governo, com devolução pelo CN até o fim da sessão
legislativa (art. 35, § 2º, I, ADCT).
Lei de diretrizes orçamentárias – a LDO estabelece as metas e
prioridades da Administração pelo decurso de um ano, correspondente à
anualidade do orçamento estabelecido pela lei orçamentária anual. Configura um
planejamento mais imediato que o plano plurianual, estabelecendo as formas
como esse será implementado ao longo do exercício seguinte. Ademais, a LDO
estabelece diretrizes para a elaboração do orçamento (lei de orçamentária anual),
tal qual estabelece o art. 165, § 2º, CF/88. O art. 4º, I, §§ 1º, 3º e 4º, LRF, traz
outros elementos da LDO. Dentre eles, ressalta-se a previsão do art. 4º, § 1º,
LRF, qual seja o Anexo de Metas Fiscais.
Anexo de metas fiscais – metas anuais em despesas, receitas, resultados
nominal e primário e montante da dívida pública nos três anos seguintes; metas
do ano anterior; comparativo com os três anos anteriores quanto ao patrimônio
líquido; situação dos fundos, do RGPS, do RPPS e do FAT; demonstrativo de
renúncia de receita (art. 4º, §§ 1º e 2º, I a V, LRF).
Obs.: faz parte da Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 4º, § 1º, LRF).
195
De uma forma geral, é um documento que estipula as metas em
receitas, despesas, resultados e montante da dívida pública para o exercício de
referência e os dois próximos, além de analisar o realizado nos três anteriores.
Traz, simultaneamente, uma previsão e um diagnóstico em relação a seus itens
constitutivos. O Anexo acompanha o projeto de LDO (art. 4º, § 1º, LRF), cuja
competência exclusiva é do chefe do Executivo (art. 165, “caput”, CF/88). O
projeto de LDO deve ser apresentado pelo chefe do Executivo até dia 15 de abril
do ano anterior à sua vigência, com devolução até o fim do período legislativo
correspondente (art. 35, § 2º, II, ADCT). Podem ser destacados os seguintes
elementos componentes:
- Consonância com o plano plurianual, ou seja, consubstancia a realização
desse no exercício seguinte, de sorte a orientar a elaboração da lei
orçamentária anual;
- Anexos de metas e de riscos fiscais;
- Limitação de empenho, na verdade, de obrigação contraída;
- Definição de despesas irrelevantes;
- Critérios para transferências voluntárias (inversões financeiras e
transferências de capital);
- Parâmetros das políticas monetária, creditícia e cambial, incluindo metas
de inflação, item atinente somente à União.
- Previsão de restos a pagar.
- Créditos adicionais: especiais, suplementares e extraordinários.
Obs.: não é possível a previsão de crédito com finalidade imprecisa ou
ilimitado.
COMPOSIÇÃO DA PROPOSTA ORÇAMENTÁRIA (art. 22, I a IV, Lei
4320/64):
o Mensagem do chefe do Executivo contendo:
 Exposição da situação econômico financeira (dívida fundada,
flutuante, saldos de crédito especial, restos a pagar e outro
compromissos);
 Exposição e justificação da política econômico-financeira;
 Justificativa das despesas e receitas.
o Projeto de lei do orçamento, o qual deve incluir a reserva de
contingência, a teor do que determina o Anexo de Riscos Fiscais e
outros fatos imprevistos no decorrer do exercício de execução.
o Tabelas explicativas, contendo receita dos três exercícios anteriores, do
ano da proposta e do ano da aplicação, além de despesa do exercício
anterior, do ano da proposta e do ano da aplicação.
o Especificação dos programas especiais de trabalho a figurarem como
dotação global (investimentos).
196
Obs.: o não envio da proposta orçamentária no prazo legal (art. 35, §
2º, I a III, ADCT)251 leva à adoção do compêndio atualmente em vigor (art. 32, Lei
4320/64). Oliveira e Horvath (2003, p. 137) lembram que devem existir
atualizações monetárias para os valores, além de guardar-se juízo lógico quanto
a créditos exauridos ou não previstos, contidos no orçamento anterior. Nessas
hipóteses, aplica-se a previsão do art. 166, § 8º, CF/88, autorizando-se as
despesas uma a uma, por meio de créditos especiais e suplementares.
O projeto de orçamento anual deve ser apresentado até o final de agosto
do ano anterior à sua execução (art. 35, § 2º, III, ADCT), devendo ser aprovado
até o fim da sessão legislativa, por imperativo lógico. A inexistência de
deliberação do CN pode suscitar convocação extraordinária do Legislativo. De
outra parte, quando não houver aprovação e o ano de execução já se inicia, tem-
se aplicado, por analogia, o art. 32, Lei 4320/64, ou seja, usa-se o orçamento
anterior até a aprovação do atual.
QUADRO DE RECURSOS E DE APLICAÇÃO DE CAPITAL – descreve as
receitas e despesas de capital para um triênio ou mais (art. 23, “caput”, Lei
4320/64). A cada ano, o quadro deve ser atualizado, tendo em conta o realizado
e o saldo restante, considerando o estimado na proposta inicial.
VEDAÇÕES A EMENDAS À LEI DE ORÇAMENTO (art. 33, “a” a “d”, Lei
4320/64):
• Alteração de dotação para despesa de custeio já aprovada, salvo erro
material (art. 166, § 3º, III, “a” e “b”, CF/88);
• Concessão de dotação para início de obra não aprovada pelos órgãos
competentes;
• Concessão para instalação ou funcionamento de serviço não criado
anteriormente;
• Concessão de dotação superior àquelas fixadas anteriormente por
resolução do Legislativo.
Além dessas previsões, o constituinte estatuiu outros requisitos para
emenda à LO anual (art. 166, § 3º, I e II, CF/88):
 Concordância com o plano plurianual e com a LDO;
 Indicação da correspondente receita a custear a despesa, só sendo
possível mediante a anulação de outro gasto;
 Que trate de serviço da dívida, dotação de pessoal e correspondentes
encargos, de transferências constitucionais da União aos demais entes
federados.
251
O projeto do plano plurianual, a viger durante os quatro anos do mandato eletivo, deve ser apresentado pelo chefe do
Executivo até quatro meses antes do final do primeiro exercício, devendo ser devolvido para sanção até o final da
correspondente sessão legislativa (art. 35, § 2º, I, ADCT). A proposta da LDO deve ser encaminhada ao CN até oito meses e
meios antes do exercício financeiro ao anterior de sua vigência, devendo ser restituído pelo Legislativo até o final do primeiro
período legislativo – 17 de julho, de acordo com o art. 57, “caput”, CF/88, com redação dada pela EC 50/06 (art. 35, § 2º, II,
ADCT). O projeto da LO anual deverá ser apresentada ao Poder Legiferante até quatro meses antes do encerramento do
segundo período legislativo referente ao exercício anterior de sua vigência, sendo certo que o Parlamento deverá encaminhá-lo
para sanção presidencial até o final do decurso considerado – 22 de dezembro, a teor do mesmo dispositivo já mencionado (art.
35, § 2º, III, ADCT).
197
EMENDAS À LDO – devem observar o plano plurianual (art. 166, § 4º,
CF/88).
RESTOS A PAGAR – são as despesas empenhadas até 31 de dezembro
do exercício previsto, mas não liquidadas até tal data (art. 36, “caput”, Lei
4320/64). Deverão estar previstas e serem pagas no orçamento posterior. Caso
se refira a despesa de plano plurianual, será liquidada no seu último ano de
vigência (art. 36, parágrafo único, Lei 4320/64). Havendo receita específica
disponível, a despesa poderá ser saldada no exercício posterior, desde que
conste em campo apartado dentro do orçamento e seja observada, dentro do
possível, a ordem cronológica, tudo dentro de cada elemento (art. 37, Lei
4320/64).
Conteúdo da LO anual – compatibilidade com o anexo de metas fiscais,
demonstrativo de medidas de compensação para renúncia de receita e para
aumento de despesa, reserva de contingência de acordo com o anexo de riscos
fiscais, demonstrativo de impacto regionalizado de despesas e receitas,
observância do plano plurianual e da LDO (art. 5º, “caput”, I a III, LRF).
A atualização monetária da dívida pública tem como teto a variação
preços prevista na LDO ou em lei específica (art. 5º, § 3º, LRF). Na LO, são
vedados crédito não específico e dotação ilimitada (art. 5º, § 4º, LRF), sendo
incluída despesa do Banco Central do Brasil (BACEN – art. 5º, 6º, LRF).
Ademais, dotação de despesa em LO não pode ultrapassar exercício, salvo se
incluído no plano plurianual (art. 5º, § 5º, LRF).
AUTORIZAÇÃO PARA O EXECUTIVO – a lei orçamentária anual poderá
conter autorização para a Administração abrir créditos suplementares e realizar
operações de crédito para antecipação de receita, dependendo, nesse último
caso, de déficit de caixa. Nas operações de crédito, o próprio orçamento indicará
as fontes de receita, sendo certo que a alienação de imóveis depende de prévia
autorização legislativa (art. 7º, I, II e § 2º, Lei 4320/64).
A lei orçamentária anual é regida por princípios, dentre os quais se
destacam:
 Universalidade – todas as receitas e despesas devem estar previstas no
orçamento. Esse ditame não se aplica integralmente às receitas
tributárias, visto que a instituição ou majoração de tributos não obedece
mais, desde a promulgação da CF/88, à anualidade (Súmula 66 do
STF, já comentada).
Pela universalidade, há abrangência de todas as despesas e receitas
dentro do ente político considerado (arts. 2º “caput”, 3º, 4º e 57, Lei
4320/64). Entretanto, não se incluem no orçamento anual as operações de
crédito por antecipação de receita, as emissões de papel-moeda e outras
entradas compensatórias (art. 3º, parágrafo único, Lei 4320/64). Também
não se baliza pela universalidade os tributos instituídos durante o
exercício de execução do orçamento, porquanto o princípio da anualidade
foi excluído do rol das limitações constitucionais ao poder de tributar (art.
150, I a VI, CF/88). Pelo desiderato em tela, o orçamento incluirá a
elaboração de três peças distintas: o orçamento fiscal (da Administração
198
Direta e Indireta de todos os Poderes); o orçamento de investimentos
(transferências de capital para empresas governamentais); o orçamento
da seguridade social (inclusive entidades mantidas pelo sistema).
Obs.: deve haver discriminação da destinação da despesa, não se
admitindo dotações globais (art. 5º, Lei 4320/64), salvo no caso de
investimentos em projetos de obras, em outras aplicações e em
programas especiais de trabalho (art. 20, “caput” e parágrafo único, Lei
4320/64) – despesas pertencentes à categoria econômica investimento
(art. 12, § 4º, Lei 4320/64).
 Exclusividade – no orçamento, somente estarão previstas receitas e
despesas. Não haverá, nele, matéria estranha à sua essência. Em
melhores termos, o orçamento não pode conter matéria diferente
daquela atinente à sua essência. Essa regra é excepcionada no
tocante à autorização para concessão ou obtenção de créditos
suplementares (art. 165, § 8º, CF/88). Esses são aqueles que visam a
redistribuição entre as categorias de despesas, de sorte a corrigir uma
dotação orçamentária deficiente ou insuficiente. A implementação de
créditos suplementares depende de pedido do administrador e
autorização legislativa. Essa vênia prévia pode ser incluída na lei
orçamentária anual, de sorte a fazer uma projeção estimada desses
gastos.
 Unidade – a peça orçamentária é única, englobando todos órgãos e
entidades do Estado e aqueles a ele ligados. É princípio que diz
respeito ao aspecto formal do orçamento. A lei orçamentária anual,
segundo o art. 165, § 5º, CF/88, irá tratar dos orçamentos da
seguridade social, fiscal e de investimento. Esse comando não ofende
a unidade, porque, em que pese o orçamento ser único, há sua divisão
em três contas diversas. O orçamento de investimento compreende a
conta de todas as despesas e receitas das empresas que o Estado
detenha a maioria de capital com direito a voto. O orçamento da
seguridade social engloba todas despesas e receitas relacionados ao
sistema, incluindo a saúde, a assistência social e a previdência social
referente ao RGPS (art. 194, “caput”, CF/88). O orçamento fiscal inclui
todas as despesas e receitas da União e de suas entidades correlatas,
excetuando-se a seguridade social.
De acordo com a unidade, o orçamento é um só diploma que regula
toda a matéria. Entretanto, a peça orçamentária deverá ser dividida em
três contas: de investimento (referente às empresas controladas pelo
Estado), da seguridade social (relativa às ações de saúde, assistência
social e previdência social) e fiscal (da Administração Direta e Indireta) –
art. 165, § 5º, I a III, CF/88.
 Anualidade – é lei de vigência temporária, a incidir no exercício
financeiro, ou seja, de 1º de janeiro a 31 de dezembro (art. 34, Lei
4320/64). O silêncio do constituinte no art. 150, I a VI, CF/88, fez o
199
desiderato não alcançar a instituição de tributos no exercício de
execução do orçamento.
 Não-afetação – o art. 167, IV, CF/88, determina que as entradas
definitivas decorrentes de impostos não podem se vincular previamente
a despesa, fundo ou programa. No entanto, o mesmo dispositivo
ressalva a máxima em estudo:
o Repartição constitucional de receitas – estatuída nos arts. 157 a 159,
CF/88;
o Gastos mínimos com saúde – estabelecidos pelo art. 198, § 2º, II e III,
CF/88, e no art. 77, ADCT;
o Gastos mínimos com educação – 18% para a União e 25% para os
Estados, DF e Municípios, nos termos do art. 212, “caput”, CF/88,
bem como na formação do FUNDEB (art. 60, II e VII, CF/88).
o Gastos com a administração tributária – de acordo com o previsto no
art. 37, XXII, CF/88;
o Garantias em operações de crédito por antecipação de receita – nos
termos do art. 165, § 8º, CF/88. Podem integrar essa garantia receitas
de impostos estaduais e municipais, verba de repasse do FPE e do
FPM e percentual de transferência do IPI sobre expo’tações' (art. 167,
§ 4º, CF/88). Devem ser obedecidos os parâmetros estatuídos na LRF
para a constituição de crédito público.
De outra parte, Oliveira e Horvath (2003, p. 142) lembram que não seria
possível a vinculação de receitas transferidas.
Apesar de a execução de despesa (e sua previsão em orçamento) ser ato
discricionário, verdadeira decisão política, há balizas que relativizam a atuação do
administrador: saúde, educação, serviço da dívida, pagamento de servidores, etc.
Além disso, há dever jurídico do buscar-se o interesse público. Tanto é assim que
Oliveira e Horvath (2003, p. 108-109) chamam o orçamento de Lei de Meios.
Cediço concluir que a proposta orçamentária e sua consectária vênia legislativa
acabam vinculando o administrador, o qual deverá atuar dentro das
condicionantes que se apresentam no plano fático.
Oliveira e Horvath (2003, p. 116) destacam duas classes de despesas
consideradas coercitivas ao administrador: as continuadas de caráter obrigatório
– incluindo as incumbências previstas no art. 23, I a XII, CF/88 (serviços públicos
essenciais) – e o custeio da máquina administrativa. Em sede de exceção,
quando existe situação premente, o administrador pode deixar de executar as
despesas vinculadas, de sorte a demonstrar sua total impossibilidade. Porém a
discricionariedade do administrador na proposta e na execução do orçamento se
baliza pela legalidade em sentido amplo, incluindo os ditames do sistema posto,
como a razoabilidade e a proporcionalidade. Aliás, essa colocação tem
autorizado o Judiciário intervir na seara do Executivo, muito pela
jurisdicionalização de políticas públicas, tal qual já delineado pelo STF na ADPF
45.
200
A lei orçamentária observa a LDO e o plano plurianual
concomitantemente (art. 5º, “caput”, LRF), além de outros requisitos (art. 5º, I a
III, LRF):
• Demonstrativo do cumprimento do Anexo de Metas Fiscais (previsão e
diagnóstico), porquanto componente do projeto da LDO;
• Estabelecimento das medidas de compensação relativas à renúncia de
receita (aumento de tributos) e às receitas obrigatórias de duração
continuada;
• Demonstrativo regionalizado sobre o impacto de receitas e despesas
(art. 165, § 6º, CF/88);
• Reserva de contingência para cobrir passivo contingente de ricos
eventuais e fiscais imprevistos (Anexo de Riscos Fiscais, componente
da LDO – art. 4º, § 3º, LRF), como foi o caso da declaração de
inconstitucionalidade da majoração da base de cálculo da
PIS/CONFINS.
Os projetos de lei da peça orçamentária são de competência exclusiva do
chefe do Executivo (art. 165, “caput”, CF/88). O não exercício desse dever-poder
no prazo assinado leva ao estatuído no art. 32, Lei 4320/64: a lei orçamentária
vigente é a aplicável. Até 30 dias antes de encaminhar o projeto de lei do
orçamento anual, o Executivo deve deixar à disposição do MP, Legislativa e
Judiciário a estimativas de receitas, para que esses elaborem proposta
orçamentária própria.
O art. 59, § 2º, Lei 4320/64, veda que prefeito assuma compromissos
financeiros para serem cumpridos após o término do mandato, assim como
empenhar mais que o duodécimo da despesa prevista no orçamento vigente (art.
59, § 1º, Lei 4320/64). No entanto, a jurisprudência tem flexibilizado os
percentuais constitucionais obrigatórios em despesas com educação (art. 212,
“caput”, CF/88) e saúde (art. 198, § 2º, II e III, CF/88, e 77, ADCT), como lembra
Führer e Führer (2001, p. 21). A vedação foi estendida aos demais mandatários
das demais esferas estatais pela LC 101/00. Na esteira, ficam proibidas
operações de antecipação de receita no último ano do governo.
A doutrina se debate acerca de um possível projeto de orçamento
rejeitado na integralidade pelo Legislativo, já que inexiste LC reguladora da
situação. Parte dos jurisconsultos entende que se aplicaria, por analogia, o art.
32, Lei 4320/54, isto é, o orçamento vigente prorrogar-se-ia para o exercício
subseqüente, operando autêntica ultratividade (OLIVEIRA e HORVATH, 2003).
No entanto, forte corrente, capitaneada por Silva (1996), defende que cada
despesa deveria ser autorizada mediante lei específica, na linha do que
determina o art. 166, § 8º, CF/88 (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 20). O STF
equipara a não-devolução à rejeição total, conferindo-lhes os mesmos efeitos.
Depois de apresentado os PL’s das leis do orçamento (PP, LDO e LO
anual), é designada comissão mista do CN para analisá-lo e emitir parecer. Antes
do início da votação para deliberação no colegiado, o chefe do Executivo pode
enviar mensagem aditiva para alterá-los, naquilo que ainda não foi
201
peremptoriamente decidido (art. 166, § 5º, CF/88). Emendas aos PL’s,
apresentadas na comissão mista, não poderão versar sobre dotações de pessoal
e seus encargos, sobre serviço da dívida e sobre transferências voluntárias a
outros entes federados (art. 166, § 3º, I a III, CF/88). Terminada a análise pela
comissão, o PL é levado à apreciação pelo plenário das Casas Legislativa em
sessão conjunta. O poder de emenda, mesmo dentro de projetos de lei de
iniciativa exclusiva do Executivo, como é o caso das leis orçamentárias, é amplo,
devendo ser observados os limites constitucionalmente previstos na Carta
Magna, dentro da leitura que o STF do art. 166, §§ 3º e 4º, CF/88252.
Obs.: a previsão orçamentária de auxílio ou de subvenção a certa
entidade não lhe garante direito subjetivo à exigência do crédito correspondente,
como já disse o STF, apesar de ser admissível eventual discussão em sede de
responsabilidade civil do Estado – art. 37, § 6º, CF/88 (OLIVEIRA e HORVATH,
2003, p. 147).
EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO – em vigor a LO anual, o Executivo abre
“incontinenti” os créditos às respectivas unidades orçamentárias de forma
trimestral, podendo adequá-lo na medida de sua execução (arts. 47 e 50, Lei
4320/64).
CONTROLE DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA – compreende três
aspectos (art. 75, I a III, Lei 4320/64):
• Legalidade – com controle “prévio”, concomitante e subseqüente (art. 77,
Lei 4320/64)253;
• Fidelidade dos agentes públicos responsáveis por bens e valores do
erário;
• Cumprimento do programa de trabalho orçamentário – atribuição da
controladoria interna.
O constituinte usou terminologia análoga para estabelecer os parâmetros
de controle do orçamento: legalidade, legitimidade e economicidade (art. 70,
“caput”, CF/88).
Espécies de controle – existem o interno, o externo e o popular. O
segundo pode ser concomitante ou subseqüente (art. 77, Lei 4320/64, com a
ressalva de que não mais existe o controle prévio). O Executivo remete ao
Legislativo a prestação de contas no prazo constitucional ou estabelecido na Lei
Orgânica municipal, exarando-se parecer prévio do TC (art. 82, “caput” e § 1º, Lei
4320/64). Câmara dos Vereadores pode submeter o documento à perícia prévia
de contadores nomeados (art. 82, § 2º, Lei 4320/64), pois, em regra, não existe
TC nos Municípios, salvo São Paulo e Rio de Janeiro (art. 31, § 4º, CF/88).
CONTABILIDADE – diz respeito a cinco tipos:
• Orçamentária – preocupa-se exclusivamente com a execução do
orçamento, sendo objeto do balanço orçamentário (art. 102, Lei
4320/64). Refere-se à aplicação da lei orçamentária.

252
STF, ADIn 1.050-MC, rel. Min. Celso de Mello, j. 21-9-94, DJU de 23-4-04.
253
O controle prévio orçamentário foi tacitamente excluído pelo constituinte, porquanto esse não o previu expressamente.
202
• Financeira – inclui débitos e créditos incluídos ou não no orçamento,
consubstanciando o balanço financeiro (art. 103, “caput”, Lei 4320/64).
Em melhores termos, olha a entrada e a saída de dinheiro do erário.
• Patrimonial – traz o registro analítico de todos os bens permanentes,
sendo materializada pelo balanço patrimonial e pelo demonstrativo de
variação patrimonial (arts. 104 e 105, I a V, Lei 4320/64). O primeiro
inclui o ativo/passivo financeiro (que independe de orçamento) e
permanente (cuja mobilização ou alienação dependente de autorização
legal), assim como o saldo patrimonial (art. 105, §§ 1º a 4º, Lei 4320/64).
É uma análise da execução do orçamento quanto à evolução do
patrimônio público.
• Industrial – engloba a atividade econômica exercida pelas entidades da
Administração Indireta, comportando o balanço industrial (art. 99, Lei
4320/64). Oliveira e Horvath (2003) substituem essa previsão legal pela
fiscalização operacional, a qual é mais abrangente. Com efeito, trata-se
de exame formal das contas públicas, mormente quanto ao seu trâmite
legal.
• Contábil – é o meio instrumental para realizar a verificação das contas
públicas, não sendo propriamente uma espécie de fiscalização.
ENTIDADES PARAESTATAIS (Administração Indireta) – terão
orçamentos e balanços aprovados por decreto do chefe do Executivo, salvo se lei
expressamente determinar sua vinculação à ordem do Legislativo (art. 107,
“caput” e parágrafo único, Lei 4320/64). Tais documentos seguirão o padrão de
confecção da própria Lei 4320/64 (art. 110, “caput”, Lei 4320/64) e serão
remetidos às contadorias centrais dos entes políticos de vinculação no prazo
legal.
PRECATÓRIO – as EC’s 30/00 e 37/02 alteraram a redação dos
parágrafos do art. 100, CF/88, dando nova conformação ao sistema de
pagamento de débitos judiciais da entidades públicas. Para Oliveira e Horvath
(2003, p. 160), o constituinte derivado exorbitou sua competência reformadora,
porque contrariou o art. 60, § 4º, CF/88. Com base em pronunciamento do STF, é
possível o exame de constitucionalidade de EC254.
Precatório é o ofício em que o juiz de primeira instância requer, ao
respectivo chefe do Judiciário enquadrante, requisição para pagamento de
débitos judiciais da Fazenda Pública (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 161).
Oliveira e Horvath (2003, p. 164) defendem que o precatório alimentar, assim
como a requisição de pequeno valor (RPV), deve ser pago imediatamente e com
correção, porque o constituinte nada falou sobre lapso de adimplemento, ao
contrário das verbas não alimentares (art. 100, § 1º, CF/88). No diapasão, não
haveria qualquer termo final para apresentação do requerimento para requisição
(ofício precatório).
Na RPV, o próprio juiz da execução expede o ofício requisitório à
autoridade encarregada do pagamento (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 191),
254
STF, ADIn 4662-600, rel. Min. Celso de Mello, DJU 10.5.2001.
203
não havendo de se falar em qualquer interferência ou controle por parte do
tribunal enquadrante. No âmbito da União, o prazo para adimplemento de RPV é
de 60 dias a partir do recebimento do ofício pela Procuradoria da AGU (art. 17,
“caput”, Lei 10259/01). “De lege ferenda”, os legisladores locais e regionais
poderão estatuir decurso e montantes diferentes daqueles constantes no art. 87, I
e II, ADCT. Oliveira e Horvath (2003, p. 192) entendem que o decurso razoável
seria de trinta dias.
O precatório alimentar tem definição no art. 100, § 1º-A, CF/88, cujo rol
pode ser considerado “numerus appertus”. No ponto, Oliveira e Horvath (2003, p.
193) defendem a inclusão da verba honorária sucumbencial na relação. De fato, o
art. 649, IV, CPC, com redação dada pela Lei 11382/06, reforça a tese
apresentada, incluindo os honorários dentro dos alimentos impenhoráveis.
O seqüestro é autorizado quando existe preterição na ordem de
pagamento, não alcançando a mera inadimplência do Poder Público, com já disse
o STF. Nesse sentido, a jurisprudência entende que, em primeiro plano, a verba
deve ser buscada no patrimônio do beneficiário indevido. Não sendo possível, a
medida pode recair sobre numerário estatal. Ademais, a constrição engloba
qualquer quantia pública, não só aquela objeto da infração constitucional
(OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 166). O art. 100, § 2º, CF/88, autoriza o
seqüestro de quaisquer verbas públicas, porque fora da ordem de apresentação
dos precatórios. Trata-se de comando absoluto, descabendo qualquer tentativa
de justificar a preterição da seqüência, mesmo que à pretensa vantagem da
Fazenda em obter descontos. Nesse passo, qualquer preterido, no exercício do
múnus público de autêntico de fiscal da lei na ordem de pagamento, pode
requerer a cautelar em comento. Dessarte, com a receita seqüestrada, será pago
o primeiro da fila, não necessariamente o requerente da medida, conquanto não
se trata de tutela satisfativa, mas sim de cautelar (OLIVEIRA e HORVATH, 2003,
p. 202). O seqüestro não pode ser decretado “ex officio”, haja vista a cristalina
determinação do art. 100, § 2º, CF/88 (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 202) e a
própria inércia da jurisdição, como já cristalizou entendimento a jurisprudência da
Corte Máxima255. Nos créditos sujeitos à moratória do art. 78, “caput”, ADCT, o
seqüestro fica autorizado, além de pela inobservância na ordem de pagamento,
pelo não-adimplemento do décimo anual no lapso legal ou pela não-inclusão da
dotação no orçamento. Por fim interessante rememorar que os credores
alcançados pelo art. 33, “caput”, ADCT, têm preferência sobre o primeiro décimo
devido àqueles abarcados pelo art. 78, “caput”, ADCT. Mas ambos deverão ser
pagos até o fim do exercício, sob pena de seqüestro (OLIVEIRA e HORVATH,
2003, p. 204). No entanto, qualquer crédito alimentar continua preferindo a
ambos, como já disse o STF.
Oliveira e Horvath (2003, p. 177), na linha do entendimento do Excelso
Pretório, reconhecem a constitucionalidade da moratória estabelecida no art. 33,
“caput”, ADCT, para pagamento de precatórios, porque é norma decorrente do
Poder Constituinte originário. No entanto, superado o interregno assinalado de
oito anos sem qualquer adimplemento, o precatório deveria ser pago em parcela

255
STF, IF 139-1/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence.
204
única, por seu saldo restante (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 196). Ao
contrário do anterior, a disposição do art. 78,, “caput”, ADCT, por ser obra da
competência constitucional derivada, viola a coisa julgada, o direito adquirido, a
isonomia, o princípio do pagamento dos débitos judiciais fazendários pela via do
precatório, a justa indenização e a própria segurança jurídica, segundo os arts.
5º, “caput”, XXIV, XXXVI, e 100, “caput”, CF/88 (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p.
184).
Controle orçamentário – está previsto, inicialmente e de forma ampla, no
art. 70, “caput”, CF/88. A fiscalização poderá ser interna (pelo próprio órgão) ou
externa (pelo CN, com auxílio do TCU – art. 71, “caput”, CF/88). Além desses,
pode haver controle privado ou popular, previsto no art. 74, § 2º, CF/88, pois o
administrado pode denunciar irregularidades perante TC.
O controle interno baseia-se na hierarquia. Cumpre à
autoridade superior verificar a legalidade dos atos, a fidelidade
funcional dos agentes da Administra, o cumprimento do prgrama
de trabalho (art. 75, Lei 4320/64) (FÜHRER e FÜHRER, 2001,
p. 22).
O controle leva em conta os critérios da legitimidade da receita, legalidade
e economicidade. A primeira se relaciona ao atendimento do interesse público. A
segunda diz respeito à previsão legal, observância de documentação e demais
formalidades normativas. A terceira determina que o administrador deve realizar a
despesa de forma mais otimizada em relação ao custo-benefício.
O controle externo é realizado durante e após a realização da despesa,
isto é, concomitante e posterior. No sistema doméstico, não há controle prévio,
não podendo ser obstada a despesa antes do início de sua realização. No ponto,
o art. 77, Lei 4320/64, deve ser lido à luz do ordenamento vigorante, não cabendo
mais a colocação da fiscalização anterior ao gasto, ressalvado o sistema de
controle interno (FÜHRER e FÜHRER, 2001, p. 22).
Controle externo – o TCU é órgão auxiliar do CN, gozando de um “status”
semelhante ao Parquet em relação ao Executivo. Analisa as contas dos
administradores públicos, realizando o conseqüente julgamento. Dessa forma,
acaba proferindo decisões, apesar dessas não ter natureza jurisdicional (Súmulas
6 e 347 do STF)256. Elas podem ser reapreciadas pelo Judiciário, porquanto o
legislador optou pela jurisdição una (art. 5º, XXXV, CF/88). Apesar de não deter
jurisdição (força definitiva de decisão), o TC pode adentrar ao mérito dos atos por
ele fiscalizados, uma vez que o constituinte fala em controle de legitimidade da
despesa – art. 70, “caput”, CF/88 (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 213). Essa
prerrogativa não alcança o Judiciário.
O órgão é formado por nove ministros, com prerrogativas inerentes aos
congêneres do STJ (art. 73, “caput” e § 3º, CF/88), mediante o preenchimento
dos requisitos do art. 73, § 1º, I a IV, CF/88. Um terço deles é escolhido pelo

256
Súmula 6 do STF: “A revogação ou anulação, pelo Poder Executivo, de aposentadoria, ou qualquer outro ato aprovado pelo
Tribunal de Contas, não produz efeitos antes de aprovada por aquele Tribunal, ressalvada a competência revisora do
Judiciário”. Súmulas 347 do STF: “O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade
das leis e dos atos do poder público”.
205
Presidente da República, mediante lista tríplice elaborada pelo próprio TCU e
com prévia aprovação pelo SF, e o restante, pelo CN (art. 73, § 2º, I e II, CF/88).
Os TCE’s (e TCM’s, quando existentes) observam a composição e formação do
TCU, sendo formado por sete conselheiros (art. 75, “caput” e parágrafo único,
CF/88). Trata-se de norma central, a ser obrigatoriamente reproduzida pelo
constituinte decorrente (Súmula 653 do STF)257. O STF já disse que 1/3 dos
conselheiro são escolhidos pelo Governador, dois dentre auditores e membros do
MP junto ao tribunal, alternadamente, e 2/3 pela Assembléia Legislativa. Os
requisitos subjetivos do art. 73, § 1º, CF/88, devem ser preenchidos por todos
(OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 224), mas as indicações do chefe do Executivo
estadual não precisam ser submetidas à sabatina do Legislativo.
No âmbito municipal, os TCE’s limitam-se a prestar auxílio técnico às
Câmaras Municipais e a analisar as contas dos prefeitos, não podendo proferir
determinações à Municipalidade (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 224). Apesar
de haver vedação à criação de órgão, conselho ou tribunal de contas municipal
após a promulgação da CF/88 (art. 31, § 4º, CF/88), o STF posiciona-se
favoravelmente que TCE crie repartição específica para atuar perante
determinado Município, inclusive na plenitude das atribuições. Ademais, lembra-
se que os TCM’s instituídos antes de 1988 permanecem em funcionamento,
atualmente correspondendo às cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro.
As funções do TC estão enumeradas no art. 71, I a XI, CF/88,
destacando-se as seguintes:
• Competência para julgar contas de administradores de dinheiro público,
com exceção do Presidente da República, cuja gestão será analisada
pelo plenário do CN (art. 82, “caput”, Lei 4320/64). Nessa última
hipótese, o TCU emite parecer, o qual poderá rejeitar ou aprovar a
contabilidade (art. 82, § 1º, Lei 4320/64). Em tese, o prazo é de 60 dias
para emissão do parecer pelo TC, podendo CE ou lei orgânica municipal
dispor de forma contrária (art. 57, “caput”, LRF). No entanto, essa
disposição encontra-se obstada por cautelar deferida pelo Supremo258.
Na mesma cautelar, o art. 56, “caput”, LRF, o qual determina que as
contas dos demais Poderes (Legislativo e Judiciário) e do MP sejam
apresentadas conjuntamente com o Executivo, também se encontra com
a eficácia suspensa. O documento será encaminhado ao Parlamento,
que irá acatá-lo ou não. A discordância exige quorum de 2/3 do
Legislativo para aprovação. Segundo o STF, quanto ao chefe do
Executivo, o TCU tem função meramente opinativa. Se o Presidente,
Governador ou Prefeito não apresentar as contas no interregno
assinalado (60 dias a partir do início da sessão legislativa, no caso da
União – art. 84, XXIV, CF/88), cabe ao TC comunicar ao Presidente do
Legislativo para medidas cabíveis (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p.
216). Nota-se que o exame realizado pelo TC é técnico e administrativo,
257
Súmula 653 do STF: “No Tribunal de Contas estadual, composto por sete conselheiros, quatro devem ser escolhidos pela
Assembléia Legislativa e três pelo Chefe do Poder Executivo estadual, cabendo a este indicar um dentre auditores e outro
dentre membros do Ministério Público e um terceiro a sua livre escolha”.
258
STF, Plenário, ADI 2238 MC/DF, rel. orig. Min. Ilmar Galvão, rel. p/ o acórdão Min. Carlos Britto, j. 8.8.2007, Informativo
do STF n° 475.
206
não político, como lembram Oliveira e Horvath (2003, p. 217). Nessa
faina, não mais existe o controle prévio de despesa, só havendo de se
falar em fiscalização posterior e concomitante. Não é mais necessário
registro anterior de ato ou de contrato para a realização do gasto público.
• Controle sobre atos de admissão de pessoal e de concessão de
inatividade remunerada (aposentação, reforma ou pensão), com
respectivo registro.
• Realizar auditorias a pedido de órgãos ou entidades públicas. Trata-se
da fiscalização propriamente dita. Essas inspeções e auditorias
contábeis, financeiras, orçamentárias, operacionais e patrimoniais se
realizam em qualquer unidade administrativa (UA), sempre sob os
auspícios da legalidade, da legitimidade e da economicidade das
despesas (art. 70, “caput”, CF/88). Se o TC encontrar entraves,
comunica o Poder enquadrante da UA irregular. Deve assinar decurso
para retificação da ilegalidade. Para Oliveira e Horvath (2003, p. 219),
nessa hipótese, deve haver prática de novo ato com efeitos “ex tunc”, de
sorte a ratificar aqueles passíveis de revalidação. Não sendo possível a
convalidação, o TC susta a execução, em um típico controle
concomitante, comunicando o Legislativo em seguida (art. 71, X, CF/88).
• Fiscalização sobre verbas repassadas a outros entes federados e
entidades públicas ou privadas, mormente por intermédio de auxílios e
de subvenções.
• Atendimento a qualquer solicitação do Legislativo, porque seu órgão
auxiliar (art. 71, “caput”, CF/88). Ademais, deve prestar contas de sua
atuação ao próprio Poder enquadrante (art. 71, § 4º, CF/88).
• Sustar atos que não observem legalidade, legitimidade e economicidade,
sendo certo que contratos devem ser obstados, em princípio,
diretamente pelo Legislativo ou pelo próprio Poder fiscalizado. Se
qualquer desses não se pronunciar a respeito em 90 dias, partir da
comunicação do tribunal, a decisão se defere a esse.
• Aplicar sanções, como multas, embargo de obras, etc., quando da
responsabilidade de agentes públicos por ilegalidade ou por
irregularidade, dentro da esfera de atribuições do próprio TC. As
medidas impostas devem estar previstas em lei. As multas implicarão em
título executivo extrajudicial, prescindindo-se de inscrição em dívida
ativa.
• Emitir parecer sobre despesa constante do PL de orçamento anula,
quando houver solicitação pela comissão mista de orçamento e finanças
no âmbito do Legislativo (art. 72, § 1º, CF/88).
As decisões do TCU que impliquem em imputação de débito ou de sanção
terão eficácia de título executivo (art. 71, § 3º, CF/88).
A Súmula Vinculante 3 do STF trata do TCU, preconizando que, em um
processo administrativo em que possa haver reforma de ato administrativo,
aquele que se beneficiava poderá se defender perante o órgão, com todos os
207
sucedâneos do contraditório e da ampla defesa. Esse comando não se aplica
quando o ato se refira à legalidade de concessão inicial de aposentadoria ou
benefício, pois, nessa hipótese, o TCU se limita a aplicar à lei. Trata-se de
matéria de direito e não de fato, falecendo direito ao contraditório e à ampla
defesa ao beneficiário.
No seu mister fiscalizatório, o TC tem autorização para quebrar sigilo
bancário e fiscal por força própria, segundo advogam Oliveira e Horvath (2003, p.
223).
Ainda dentro do sistema de controle externo, cumpre destacar o relevante
papel desempenhado pelo Ministério Público. Com efeito, como lecionam Führer
e Führer (2001, p. 22), a partir do art. 129, III, CF/88, o Parquet é órgão que tem
incumbência de velar pelo patrimônio público de modo amplo. Goza de vários
instrumentos extrajudiciais e meios judiciais para fazer recompor o erário e para
responsabilizar aqueles que o maculam. Dentre eles, além das demandas penais,
especial atenção deve ser dada à ação civil pública, ao inquérito civil e à própria
ação por improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º, CF/88, e da Lei
8429/92.
A cada bimestre, é publicado o Relatório Resumido da Execução
Orçamentária (RREX), o qual contém o balanço orçamentário e outros
demonstrativos do período. A cada quatro meses, é publicado também o
Relatório de Gestão Fiscal, o qual demonstrará a observância dos limites legais
da dívida pública, dos gastos com pessoal, das concessões de garantias, das
operações de crédito realizadas e eventuais medidas corretivas levadas a cabo.
Esse balanço quadrimestral embasará eventuais ações de contenção de gastos,
disparando os diversos sistemas de alerta e de restrição financeira previstos na
LRF.
Os limites da dívida pública são verificados a cada quadrimestre. Se
ultrapassados, podem ser sanados nos três quadrimestres seguintes, desde que
haja redução de 25% no primeiro deles. Nesse contexto, fica autorizada limitação
de empenho e proibida operação de crédito, excetuando-se refinanciamento do
principal da dívida mobiliária. Depois do período legal para saneamento, a
existência de situação desfavorável não permite que o ente receba transferências
voluntárias.
Instrumentos de transparência da gestão fiscal (inclusive em meio
eletrônico) – art. 48, “caput”, LRF:
• Planos;
• Orçamentos;
• LDO;
• Prestação de contas e parecer prévio;
• Relatório de execução orçamentária e de gestão fiscal;
• Participação popular e audiências públicas.
208
DEMONSTRATIVOS – deverá haver separação entre órgãos, fundos,
Administração Indireta e previdência (art. 49, parágrafo único, LRF), de acordo
com a tríade das contas orçamentárias (art. 165, § 5º, I a III, CF/88).
MUNICÍPIOS E ESTADOS – deverão encaminhar, entre 30 de abril e 31
de maio, demonstrações do exercício anterior (art, 51, § 1º, I e II, LRF).
NÃO APRESENTAÇÃO DO RELATÓRIO DA EXECUÇÃO DO
ORÇAMENTO OU DA GESTÃO FISCAL – ente fica passível de sanções
diferentes daquelas previstas para inobservância dos limites legais, ou seja, não
pode receber transferências voluntárias e contratar operações de crédito, exceto
as destinadas ao refinanciamento do principal atualizado da dívida mobiliária
(arts. 51, § 2º, 52, § 2º, e 53, § 3º, LRF).
Créditos adicionais – são autorizações de despesas, previstas no art. 40,
Lei 4320/64. Podem ser de três tipos (art. 41, I a III, Lei 4320/64):
- Suplementares – a previsão de despesa foi insuficiente. O crédito
correspondente deve ser reforçado, fazendo surgir a categoria em
comento.
- Especiais – inexiste previsão de certa despesa no orçamento.
- Extraordinários – são destinados a despesas urgentes e imprevistas,
como guerra, comoção intestina ou calamidade pública.
Os créditos especiais e suplementares dependem de autorização
legislativa específica. Os extraordinários poderão ser obtidos por meio de MP,
justamente porque presentes os requisitos de relevância e urgência (art. 62,
“caput”, CF/88). Nesse caso, a MP deve ser “incontinenti” submetida ao
Legislativo. De outra parte, Estados ou Municípios que eventualmente não
tenham competência para elaborar MP pode autorizar créditos extraordinários por
meio de decreto, seguindo o reexame imediato pelo Poder Legiferante
correspondente (Assembléia Legislativa ou Câmara Municipal). Apesar do
exposto, todos os créditos adicionais, mormente os suplementares, atualmente
são obtidos por MP. Essa situação corrente não encontra guarida na Carta
vigente, pendendo inconstitucionalidade.
Créditos públicos – além das receitas originárias, derivadas ou
transferidas, o Estado pode obter entradas por meio de endividamento. Fá-lo-á
por meio de empréstimos, configurando operações de crédito público (captação
externa de recursos). O resultado do crédito público é a dívida pública e a
captação de recursos. Apresentam as seguintes características: obrigação
bilateral; previsão orçamentária, ao menos por meio de autorização genérica;
vênia legislativa específica quanto à operação a ser realizada; finalidade pública
devidamente comprovada. O Senado controla as operações de crédito, podendo
estabelecer limites inclusive para o montante da dívida pública consolidada e
mobiliária de Estados, DF e Municípios, autorizando operação de crédito externas
e dispondo sobre garantias para a realização dessa última. Os limites da dívida
mobiliária da União são estabelecidos por meio de lei de iniciativa exclusiva do
Presidente da República.
209
Excluindo-se os empréstimos compulsórios, que têm autêntica
essência tributária à luz do art. 148, I e II, CF/88, a natureza dos empréstimos
públicos é motivo de celeuma na doutrina, sendo possível distinguir três
correntes:
 É ato unilateral de um Estado – decorrente de sua soberania, não
poderia ser objeto de execução específica. É a doutrina do argentino
Drago (apud OLIVEIRA e HORVATH, 2003), sendo posição atualmente
ultrapassada.
 É contrato privado – existem dois momentos para a consubstanciação
de crédito público. O primeiro é a autorização legislativa para contraí-lo,
ato de soberania do Estado. O segundo é a celebração do contrato em
si, o qual seria regido pelo Direito Privado. É a idéia da doutrina
majoritária francesa e de Cretella Júnior (apud OLIVEIRA e HORVATH,
2003, p. 231), apesar de não vigorante no âmbito doméstico. Oliveira e
Horvath (2003, p. 243) defendem que as operações de antecipação de
receita não são empréstimos públicos, porque se balizam pelo direito
comum, a teor dos contratos privados.
 É contrato administrativo – dentro da mesma idéia anterior dos dois
momentos de formação do empréstimo, a avença celebrada, referente
ao segundo momento, seria regido pelo Direito Público, inclusive com
cláusulas exorbitantes previstas na lei de autorização. É a posição
prevalente, segundo Oliveira e Horvath (2003, p. 232). Sob o aspecto
financeiro, o empréstimo público seria movimento de caixa, conquanto
formam-se crédito e débito co-respectivos (OLIVEIRA e HORVATH,
2003, p. 234). De outra feita, o contrato administrativo de empréstimo
tem suas cláusulas elementares exprimidas pela lei autorizadora. Dessa
forma, o princípio da autonomia da vontade cede lugar à autonomia
privada, isto é, impende a liberdade de contratar, não propriamente a
liberdade contratual (ao contratar, em contratar, em estabelecer as
cláusulas, em autêntico ajuste consensual), como disse Geraldo Ataliba
(apud OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 233). Ademais, necessário
afirmar que os ditames do “pacta sunt servanda” e da boa-fé objetiva
estão presentes nos contratos de empréstimos públicos, como lembrar
Oliveira e Horvath (2003, p. 234).
Léon Duguit (apud OLIVEIRA E HORVATH, 2003, p. 238) classificou os
atos estatais em três categorias: ato-regra, o qual estabelece a regência para
determinada situação jurídica; o ato-condição, que estatui condicionantes para a
ocorrência jurídica do fato; ato-subjetivo, o qual seria a efetiva ocorrência do fato
à luz dos dois anteriores. O mecanismo dos empréstimos públicos, segundo
Oliveira e Horvath (2003, p. 238), enquadrar-se-ia perfeitamente na classificação
aduzida pelo mestre francês:
* O ato-regra é a lei a disciplinar os empréstimos públicos (art. 22, VII,
CF/88);
* O ato-condição é a Resolução do Senado (art. 52, V a VII, CF/88), a
qual autoriza, limita, restringe e regula as operações de crédito.
210
* O ato-subjetivo é a celebração do contrato administrativo pela
entidade pública.
Amílcar de Araújo (apud OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 228) lembra
que a execução específica e a recorrência a meios militares não mais têm vez
para cobrar débitos de operações de crédito externas hodiernamente, muito pelas
quais as fontes do Direito Público Internacional vedam tais práticas. Moratória e
bancarrota são meios unilaterais que o Estado devedor tem para mitigar o
pagamento da dívida, as quais sempre deverão ser secundadas por
renegociação do “debitum”. De outro lado, os Estados e organizações
internacionais credoras podem usar sanções indiretas por força própria, como o
embargo comercial. Na via jurisdiciona internacional, geralmente os entraves são
resolvidos por arbitragem, em que pese a existência da Corte Internacional de
Justiça e de órgãos da ONU com atribuições correlatas, como o próprio FMI e a
OMC.
A forma mais corriqueira de operação de crédito se dá através de emissão
de títulos da dívida pública. Essa operação em particular produz uma categoria
específica de dívida pública: a mobiliária. Os títulos são colocados à venda,
recebendo o Estado a contraprestação pecuniária. Eles podem ser usados para
quitação de tributos, desde que haja previsão legal. Além disso, é permitido
indicá-los como garantia em execução fiscal uma vez que tenham cotação em
bolsa de valores.
O art. 32, “caput”, LRF, diz que o Ministro da Fazenda controlará os limites
e condições para realização de operações de crédito dos entes federados,
inclusive das empresas públicas a eles atreladas. Realizará essa fiscalização por
meio de verificação se os patamares foram observados, emitindo parecer. O
agente não tem o poder de impor sanção pelo descumprimento do estabelecido
normativamente. O documento tem um caráter técnico, não sendo vinculante em
relação à autoridade ou órgão que tem incumbência sancionadora. A instituição
financeira, pretensa credora do ente público, deverá verificar se as
condicionantes legais foram observadas, à luz do parecer do Ministro da
Fazenda. Não atendidos os requisitos da lei, a despesa é considerada nula,
devolvendo-se o valor ao credor sem qualquer acréscimo (juros, correção, taxa
administrativa, etc.), o que pode sugerir grave prejuízo à financeira. No ponto,
Führer e Führer (2001, p. 30) lecionam que o legislador criou um sistema difuso
de controle das operações de crédito, a ser operado pelas próprias instituições
financeiras credoras.
O art. 35, “caput”, LRF, veda operação de crédito entre os entes
federados, direta ou indiretamente, por meio de entidades a eles ligadas. No
ponto, não se imiscui operação de crédito com transferência voluntária, a qual é
realizada a fundo perdido. Uma pessoa política não pode fazer empréstimos a
outra, visando garantir equilíbrio e harmonia no âmbito da federação. Não se
encontra na proibição empréstimo por meio de instituição financeira estatal e ente
federado, incluindo outras pessoas públicas de Direito Público a ele vinculadas
(art. 35, § 1º, LRF). Essa permissão não será aplicada quando o crédito for
destinado a pagamento de despesas correntes (custeio) nem a refinanciamento
211
com outra concedente (art. 35, § 1º, I a II, LRF). Por fim, premente lembrar que
dívidas contraídas anteriormente à LRF podem ser objeto de refinanciamento.
É possível, nas operações de crédito, que o ente público ofereça receita
pública futura como garantia. São aquelas decorrentes de repasses
constitucionais e legais (art. 40, § 1º, II, LRF). Para Führer e Führer (2001, p. 31),
“a disposição se afigura inconstitucional no que se refere à parte das
transferências cujo fim é vinculado”.
As operações de crédito dependem do atendimento dos seguintes
pressupostos (art. 32, § 1º, I a VI, LRF):
o Requerimento do interessado, com demonstração contábil e jurídica da
viabilidade na relação custo-benefício e no atendimento do interesse
social e econômico.
o Expressa autorização em LO orçamentária, em crédito adicional ou lei
específica.
o Contrapartida em receita prevista na LO ou em crédito adicional, salvo
antecipação de receita.
o Observância de limites e condições estatuídas pelo SF, com autorização
específica desse no caso de operação de crédito externo.
o Não superação do valor em despesa de capital, salvo autorização do CN
por maioria absoluta para inclusão em crédito suplementar ou especial
para o caso específico (art. 167, III, CF/88).
o Outras restrições estabelecidas pelo legislador complementar.
Obs. 1: é vedada a realização de operação de crédito (art. 35, “caput”,
LRF).
Maiores que as despesas de capital (art. 167, III, CF/88), excluindo
REFIS (art. 35, § 3º, I, LRF);
Entre entes federados (inclusive na Administração Indireta) e entre ente
e sua instituição financeira (inclusive o BACEN), salvo entre aquela e
ente federado distinto (art. 35, § 1º, LRF);
Obs. 2: é proibida antecipação de receita no último ano de mandato do
Executivo (art. 38, IV, “b”, LRF);
GARANTIA pode vir de contragarantia de transferência constitucional
(consignada) pelo garantidor (art. 40, § 1º, II, LRF). Se for prestada pela União
em relação a instituições internacionais de financiamento e fomento, deverão ser
observadas, além das condições para garantia interna, os requisitos para o
recebimento de transferências voluntárias – art. 25, § 1º, I a IV, LRF (art. 40, § 2º,
LRF).
As garantias podem ser:
• Pessoais – é o caso de aval de banco ou da União em favor de Estados
ou de Municípios;
212
• Reais – podem ser constituídas de diversas formas, como: hipoteca
sobre bens públicos dominiais; vinculação de receitas de impostos de
competência própria do tomador ou decorrente de transferências
obrigatórias (art. 167, § 4º, CF/88); emissão de títulos da dívida pública
mobiliária; etc.
A correção monetária a ser aplicada nos empréstimos públicos depende
da lei autorizadora e da disposição do instrumento do ajuste. Pode ser índice
oficial legal, moeda forte estrangeira, cotação do ouro, etc.
Classificações – quanto ao aspecto subjetivo (característica do devedor),
os créditos públicos podem ser federais, estaduais ou municipais. No tocante à
praça de pagamento (ou à localização do credor), os empréstimos públicos
podem ser externos (aduzidos por Estados ou por organizações internacionais)
ou internos. Com referência ao prazo de pagamento, classificam-se em:
o Flutuante – o pagamento é previsto para ser feito em curto prazo, menos
que 12 meses. Nesse passo, a dívida deve ser contraída até 10 de
janeiro e o adimplemento, realizado até 10 de dezembro do mesmo
exercício (art. 38, I e II, LC 101/00).
o Fundada – o pagamento é feito em longo prazo, envolvendo mais de um
exercício.
o Consolidada – não existe pagamento do principal, só incidindo sobre
juros. Observa-se, consoante comentário já feito anteriormente, que a
LRF trata de dívida fundada e consolidada como sinônimos, o que, em
tese, caracteriza uma discrepância técnica.
Intervenção e dívida fundada – é permitida pelo não pagamento do
débito nas seguintes condições:
 Da União nos Estado – quando esse estava pagando e suspendeu por
decurso maior que dois anos (art. 34, V, “a”, CF/88);
 Dos Estados nos Municípios – quando não pagou a dívida contraída por
dois anos consecutivos (art. 35, I, CF/88).
A decretação da intervenção não será feita se houver motivo de força
maior, a ser demonstrada pela unidade intervinda. Os motivos espelhados nos
arts 34, V, “a”, e 35, I, CF/88, ensejam decreto “ex officio” do chefe do Executivo,
apesar de constituir ato discricionário, como já disse o STF. Nesse contexto,
mesmo que haja vênia judicial, o mandatário não está coagido a exarar a medida,
porquanto é prerrogativa funcional e política de seu cargo a decisão sobre a
oportunidade e conveniência a efetivação. Oliveira e Horvath (2003, p. 244),
comentando essa última hipótese, não concordam com a leitura feita pelo
Excelso Pretório. Para eles, o ato seria vinculado.
Extinção do crédito público – pode se dar de quatro formas diversas:
- Por resgate – o qual pode ser à vista ou por amortizações, pagando-se
devidamente o devido.
- Por conversão – há opção do credor em receber o montante com juros
menores ou manter a dívida para recebimento futuro, com mais
213
vantagens. Não há de ser imposta pelo devedor, sob pena de
constituir verdadeira moratória.
- Por consolidação – trata-se, em verdade, de novação objetiva, em que
se transforma dívida flutuante em fundada (OLIVEIRA e HORVATH,
2003, p. 249). Deve ser feita efetivada por opção do credor, não
podendo ser imposta pelo tomador.
- Por prescrição – a pretensão do credor em receber os valores é perdida
em decorrência do decurso temporal, tornando inexigível seu direito de
crédito.
Execução do crédito público – segue o rito ordinário ou o procedimento
para títulos executivos extrajudiciais, sem perder de visa que o pagamento se dá
na forma de precatórios (art. 100, “caput”, CF/88). No ponto, qualquer credor,
interno ou externo, aduz sua pretensão no Judiciário doméstico (art. 88, I a III,
CPC).
Pergunta: por deter autonomias orçamentárias, financeiras e
administrativas, a Defensoria Pública não deveria estar incluída expressamente
no art. 1º, § 3º, LC 101/00?
Resposta: cuidado, a Defensoria Pública não possui autonomia
financeira, apenas funcional e administrativa. Em âmbito federal está vinculada
ao Ministério da Justiça.
Pergunta: existe a comissão prevista no art. 166, § 1º, CF/88? Ela
realmente atua? E nos Estados e Municípios?
Resposta: sim, tendo em vista estar inserida na Seção “Dos Orçamentos”
na Constituição Federal e ser esta Comissão aquela apta a praticar a fiscalização
externa orçamentária. Nos Estados, Distrito Federal e Municípios, ocorrerá da
mesma forma, seguindo respectivamente a Constituição Estadual, a Lei Orgânica
e, subsidiariamente, o Texto Constitucional.
Pergunta: o que é considerada despesa irrelevante (art. 16, § 3º, LC
101/00)? Qual o valor?
Resposta: os ensinamentos de Régis Fernandes de Oliveira apontam que
este critério criado pela lei está inserido ao lado de dois outros: as despesas
poderão ser (i) adequadas, (ii) compatíveis e (iii) irrelevantes. As aferições serão
estabelecidas pelas pessoas políticas em face dos valores de despesas
apontados pelas leis (orçamentárias) anteriores. Cada orçamento definirá qual
modalidade de classificação a despesa incorrerá.
Pergunta: a proposta constante dos arts. 30, I, LC 101/00, e 52, VI,
CF/88, não fere o pacto federativo?
Resposta: não. A doutrina não cogita de nenhum ferimento. Para
entender essa questão é necessário lembrar que o Poder Executivo é aquele que
sabe como irá gastar o dinheiro público. Ele transporta para um documento
escrito – ‘um projeto de lei’ que precisará sofrer a aprovação do Poder Legislativo
para que, com a devida legitimidade, possa prevalecer. Lembre-se que o povo,
titular do poder, ao escolher seus representantes também entrega aos mesmos
214
poderes de gerenciamento da atuação do Presidente da República. Nesse
contexto, o art. 52, VI da CF explicita que o “P. Legislativo – Senado Federal –
disporá sobre limites globais e condições para operações de crédito interno e
externo das pessoas políticas, autarquias e demais ‘longa manus’”, no dizer de
Celso Antonio Bandeira de Melo. O Presidente precisará encaminhar a sua
proposta de gastos, para que o P. Legislativo aprove. Essa é uma das
fiscalizações orçamentárias que acontece em face do Direito Financeiro. Para
interpretar esse questionamento, deve-se levar em conta o harmonioso
relacionamento entre os três poderes.
Pergunta: a não aplicação da restrição do art. 43, § 2º, LC 101/00, à
União não gera um contra-senso? Por que os Estado e Municípios não podem e
a União pode?
Resposta: Texto da LC 101/2000:
Art. 43. As disponibilidades de caixa dos entes da Federação
serão depositadas conforme estabelece o § 3º do art. 164 da
Constituição.
§ 1º As disponibilidades de caixa dos regimes de previdência
social, geral e próprio dos servidores públicos, ainda que
vinculadas a fundos específicos a que se referem os arts. 249
e 250 da Constituição, ficarão depositadas em conta separada
das demais disponibilidades de cada ente e aplicadas nas
condições de mercado, com observância dos limites e
condições de proteção e prudência financeira.
§ 2º É vedada a aplicação das disponibilidades de que trata o
§ 1º em:
I - títulos da dívida pública estadual e municipal, bem como em
ações e outros papéis relativos às empresas controladas pelo
respectivo ente da Federação;
II - empréstimos, de qualquer natureza, aos segurados e ao
Poder Público, inclusive a suas empresas controladas.
Os ensinamentos do Prof. Régis Fernandes de Oliveira apontam que este
parágrafo 2º foi muito bem vindo, já que proíbe a aplicação das disponibilidades
da previdência em títulos da dívida pública municipal e estadual. Assim, a
providência, aplicável a todos os entes da Federação, evita o risco e aplicação do
dinheiro público em títulos de menor expressão e impede que os recursos sejam
aplicados em ‘empréstimos de qualquer natureza, aos segurados’, a teor do art.
43, § 2º, I e II, LC 101/00.
Pergunta: em face do art. 165, § 9º, I e II, CF/88, é possível dizer que a
Lei 4320/64 foi recepcionada pela ordem constitucional vigente como lei
complementar?
Resposta: sim, esta lei foi recepcionada como lei complementar.
Pergunta: as subvenções econômicas devem ser ressarcidas pelas
entidades beneficiadas ou são consideradas como empréstimo a fundo perdido?
215
Resposta: inicialmente, é importante frisar que subvenção econômica
é a alocação destinada à cobertura dos déficits de manutenção das empresas
públicas de natureza autárquica ou não, assim como as dotações destinadas a
cobrir a diferença entre os preços de mercado e os preços de revenda. Nesse
sentido, se o orçamento estabelecer este benefício pecuniário a alguma entidade,
ela deverá utilizá-lo dando cumprimento de sua finalidade, não se falando assim
em devolução posterior.
Pergunta: quando define subvenção econômica, o legislador se refere
expressamente a empresas governamentais e particulares como beneficiárias em
potencial (art. 12, § 3º, II, Lei 4320/64), incluindo também as autarquias que
exercem atividade econômica (art. 18, “caput”, Lei 4320/64). Poderiam aí também
ser enquadradas as fundações que venham a realizar atividade econômica?
Resposta: lembre-se que todas essas figuras apontadas, conforme art. 5º
e incisos do Decreto 200/67, configuram estruturas da Administração Pública
Indireta – como ensina Celso Antonio Bandeira de Mello, são “longa manus” do
Estado. Essa é a razão pela qual podem receber subvenções. No que diz
respeito às fundações, elas não podem ter caráter econômico. O Novo Código
Civil restringe a criação de fundações a apenas quatro áreas (para fins religiosos,
morais, culturais ou de assistência), vinculando-as a fins não-econômicos. Nesse
sentido, a doutrina tem apontado uma certa dificuldade relacionada às fundações
no que diz respeito à captação de recursos e eventuais autorizações para
recebimento de subvenção econômica. O Ministério Público poderá, por meio de
sua fiscalização, exercer um importante e decisivo papel em face da fundação,
referendando o caráter lídimo e escorreito que esta possui para o eventual
recebimento de subvenções.
Pergunta: o art. 39, § 2º, Lei 4320/64, reza que crédito decorrente de
empréstimo compulsório é classificado como dívida ativa não-tributária. Em face
da localização topográfica do art. 148, CF/88, e segundo a melhor doutrina e a
jurisprudência pacífica, o dispositivo legal em comento não teria sido
recepcionado pela ordem de 1988, correto?
Resposta: a CF em seu artigo 148 definiu a natureza jurídica desta
exigência fiscal como tributo. A leitura do art. 39 § 2º, Lei 4320/64 deve desprezar
esta menção, já que a CF foi publicada em 1988, ou seja, esta disposição não foi
recepcionada pelo Texto Maior.
Pergunta: caso exista sobra de caixa referente aos meses anteriores do
exercício, o prefeito não poderia gastar mais do que o previsto no art. 59, § 1º, Lei
4320/64, no último mês de seu mandato?
Resposta: essa é uma hipótese de superávit, ou seja, é o lucro resultante
de, em um orçamento, ter mais ganhos do que gastos. Tal orçamento é chamado
de superavitário. Também pode ser a denominação do que corresponderia ao
lucro, em balanços de empresas não econômicas ou "sem fins lucrativos". O
oposto seria "déficit". Régis Fernandes de Oliveira ensina que a despesa deve
encontrar respaldo legal ou constitucional para ser gerada. Assim, qualquer
despesa deve, para ser gerada, refletir um benefício ao Poder Público, seja como
aumento patrimonial, seja como retribuição a serviços prestados ou compra de
216
bens ou serviços. Caso não cumpram este perfil, serão consideradas ‘não
autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou
assunção de obrigação que não atendam o disposto nos artigos 16 e 17 da Lei
Complementar 101/00.
Pergunta: o órgão previsto no art. 111, “caput”, Lei 4320/64 (Conselho
Técnico de Economia e Finanças do Ministério da Fazenda) ainda continua
existindo ou foi substituído pela Secretaria de Orçamento e Finanças? E a
Controladoria-Geral da União?
Resposta: não. O Conselho Técnico de Economia e Finanças era um
órgão técnico e consultivo do Ministério da Fazenda, sendo criado em 25 de
novembro de 1937. Foi extinto em 1971. No que diz respeito à Secretaria de
Orçamento e Finanças, essa nomenclatura está atrelada à Administração Direta
dos Estados-membros, como por exemplo, Pará e Paraíba. Em âmbito federal,
temos a Secretaria de Orçamento Federal, vinculada ao Ministério do
Planejamento, Orçamento e Gestão. No que diz respeito à Controladoria-Geral da
União (CGU), este é o órgão do Governo Federal responsável por assistir direta e
imediatamente o Presidente da República quanto aos assuntos que, no âmbito do
Poder Executivo, sejam relativos à defesa do patrimônio público e ao incremento
da transparência da gestão, por meio das atividades de controle interno, auditoria
pública, correição, prevenção e combate à corrupção e ouvidoria. A CGU também
deve exercer, como órgão central, a supervisão técnica dos órgãos que compõem
o Sistema de Controle Interno e o Sistema de Correição e das unidades de
ouvidoria do Poder Executivo Federal, prestando a orientação normativa
necessária.

Repartição de Receitas Tributárias


“Prima facie”, precípuo reavivar que a repartição (ou discriminação) de
receitas tributas é relação jurídica diferente daquela erigida pelo exrecício da
competência tributária (OLIVEIRA e HORVATH, 2003, p. 71), podendo ser
denominada “relação jurídica financeira”. É matéria constante dos arts. 157 a 162,
CF/88, além de outros dispositivos esparsos, principalmente contidos no ADCT.
1. Receitas repassadas da União para Estados e DF– são as seguintes:
 IR na fonte sobre rendimentos pagos pelos Estados (e DF), suas
autarquias e fundações públicas (art. 157, I, CF/88);
 25% dos impostos residuais instituídos (arts. 154, I, e 157, II, CF/88);
 10% do IPI sobre exportações realizadas no território do beneficiário
(art. 159, II, CF/88)259;
 29% da CIDE-combustíveis (art. 177, § 4º, CF/88), distribuídos na forma
de LO federal, sendo destinados à infra-estrutura de transportes (arts.
177, § 4º, II, “c”, e 159, III, CF/88);

259
O percentual destinado a um só Estado não pode ultrapassar de 20% do total, devendo o restante ser rateado pelos demais
(art. 159, § 2º, CF/88).
217
 30% do IOF sobre ouro vindo de seu território, quando considerado
ativo financeiro exclusivamente (art. 153, § 5º, I, CF/88).
2. Receitas repassadas da União para os Municípios
o IR na fonte sobre rendimentos pagos pelos Municípios, suas autarquias
e fundações públicas (art. 158, I, CF/88);
o ITR, segundo o seguinte comando:
 Regra geral – 50% do tributo cobrado de imóveis localizados em seu
território;
 Parafiscalidade – 100% do tributo cobrado de imóveis localizados em
seu território, quando houver delegação de capacidade ativa (arts.
153, § 4º, III, e 158, II, CF/88).
o 70% do IOF sobre ouro vindo de seu território, quando considerado ativo
financeiro exclusivamente (art. 153, § 5º, II, CF/88).
3. Receitas repassadas dos Estados para os Municípios
 50% do IPVA sobre veículos licenciados em seu território (art. 158, III,
CF/88);
 25% do ICMS, sendo (art. 158, IV e parágrafo único, CF/88);
- 3/4, no mínimo, sobre o valor adicionado260 nas operações realizadas
em seu território,
- Até ¼, de acordo com a lei estadual (tratando-se de Estado) ou
federal (tratando-se de Território).
 25% da renda recebida da CIDE-combustíveis (art. 159, § 4º, CF/88),
desde que exista LO federal regulamentando (art. 93, ADCT);
 25% da rende recebida do IPI sobre importações (art. 159, § 3º, CF/88),
valendo as mesmas regras do repasse de ICMS.
4. Fundos de Distribuição – nesse contexto, podem ser destacados os
fundos de participação e os programas de fomento e desenvolvimento das
regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
 Fundo de Participação dos Estados e do DF (FPE) – 21,5% do IR (art.
159, I, “a”, e § 1º, CF/88), não contando o desconto na fonte já
realizado pela unidade federada (art. 157, I, CF/88).
 Fundo de Participação dos Municípios (FPM) – 21,5% do IR (art. 159, I,
“b”, e § 1º, CF/88), não contando o desconto na fonte já realizado pela
pessoa em questão (art. 158, I, CF/88).
 Programas de financiamento do setor produtivo do Nordeste, Norte e
Centro-Oeste – 3% do IR (art. 159, I, “c”, CF/88):

260
O valor adicionado é definido exclusivamente por via de LC federal (art. 161, I, CF/88), segundo já se pronunciou o STF
(RE 253906/MG, DJU 18.2.2005; ADI 3262/MT, DJU 4.3.2005; ADI 2728/AM, DJU 2.2.2004; ADI 1423/SP, rel. Min.
Joaquim Barbosa, j. 16.5.2007, Informativo do STF n° 467). O montante do ICMS, considerado como base de cálculo para o
repasse constitucional em tela, não considera eventual acréscimo de 2% destinado a Fundo de Combate à Pobreza do Estado ou
do DF (art. 82, § 1º, ADCT).
218
 De acordo com o plano regional de desenvolvimento (previsão em
plano plurianual);
 Fomento de instituições financeiras de caráter regional, como ADAM,
ADENE, etc.;
 O semi-árido nordestino receberá 50% do total destinado à região NE,
nos termos de LO federal.
5. Repasse e fiscalização – em regra, é vedada restrição ou retenção de
verbas destinadas a repasses constitucionais (art. 160, “caput”, CF/88). Contudo,
podem ser apontadas duas exceções, nas quais é possível que a União e os
Estados condicionem a repartição de receitas (art. 160, parágrafo único, I e II,
CF/88):
• Ao pagamento de seus créditos, incluindo das autarquias;
• À aplicação dos recursos mínimos na saúde, cujos percentuais mínimos
devem ser fixados por LC, a ser revisada a cada lustro (art. 198, § 2º, II e
III, CF/88), permanecendo aqueles estatuídos no art. 77, ADCT,
enquanto o legislador complementar for inerte.
O FPE e o FPM são regulados pela LC 62/89 (art. 161, II, CF/88). O
repasse de verbas dos Estados e Municípios é disciplinado pela LC 63/90 (art.
161, III, CF/88).
No tocante à fiscalização, o TCU é responsável por calcular os valores de
repasses do FPE e do FPM (art. 161, parágrafo único, CF/88). A União, os
Estados, o DF e os Municípios deverão publicar mensalmente, até o último dia do
mês subseqüente, um relatório com os seguintes dados (art. 162, “caput”, CF/88):
o Total da arrecadação tributária;
o Recursos não-tributários recebidos;
o Valores tributários repassados e recebidos;
o Expressão numérica dos critérios de rateio, decorrente de repasse.
6. Desvinculação de receitas da União (DRU) – de acordo com o art. 76,
“caput”, ADCT, entre 2003 e 2007, 25% da receita tributária da União não está
vinculada a qualquer órgão, fundo ou despesa. Essa regra não abrange os
seguintes repasses (art. 76, §§ 1º e 2º, ADCT):
 Base de cálculo de:
 IOF sobre ouro, considerado como ativo financeiro (art. 153, § 5º,
CF/88),
 IR arrecadado por Estados, DF e Municípios (arts. 157, I, e 158, I,
CF/88),
 FPE e FPM (art. 159, I, “a” e “b”, CF/88),
 Programas de financiamento do setor produtivo do Norte, Nordeste e
Centro-Oeste (art. 159, I, “c”, CF/88);
 Arrecadação e destinação do salário-educação (art. 212, § 5º, CF/88).
219
7. Fundo Social de Emergência – presta-se a fazer frente a
imprevistos sociais. É formado pelas seguintes receitas (art. 72, I a VI, ADCT):
o Parcela do IR na fonte sobre rendimentos pagos pela União, incluindo
suas autarquias e fundações;
o Parcela do IR e do IOF decorrente do Plano Real;
o Parcela da CSLL, atualmente em 30%;
o 20% do total das receitas de impostos e contribuições sociais da União,
excluindo-se as hipóteses do art. 72, I a III, e §§ 3º e 4º, ADCT:
 As três situações anteriores,
 Percentual dos Estado, DF, Territórios e Municípios, decorrente do
IOF sobre ouro como ativo financeiro (art. 153, § 5º, CF/88),
 Repasse do ITR aos Municípios (art. 158, II, CF/88),
 Percentuais mínimos destinados à educação (18% para União e 25%
para Estados, DF e Municípios – art. 212, “caput”, CF/88),
 Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT – Lei 7998/90), o qual financia
o seguro-desemprego e o abono salarial anual decorrente do
PIS/PASEP (art. 239, “caput”, CF/88);
o 0,75% sobre o PIS/PASEP;
o Outras receitas previstas em lei específica.
8. Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza – tem previsão no art.
80, “caput”, ADCT, sendo regulado pela LC 111/01. É formado pelas seguintes
receitas (art. 80, I a VI, ADCT):
 0,08%, dos 0,38% da CPMF;
 5% do IPI sobre produtos supérfluos, definidos nos termos de LO federal
(art. 83, ADCT);
 Produto do ITR;
 Provenientes de dotações orçamentárias específicas;
 Advindas de operações de crédito;
 Outras, definidas na LC 111/01.
Obs.: os recursos do citado fundo não se sujeitam a duas regras
tributário-financeiras (art. 80, § 1º, ADCT):
1º) Não-vinculação de impostos (art. 167, IV, CF/88);
2º) Formação do FPE e do FPM; financiamento de programas a setores
produtivos do Norte, Nordeste e Centro-Oeste; repasse de IPI sobre exportações;
repasse da CIDE-combustíveis (art. 159, I a III, CF/88).
9. Fundo da Educação Básica (FUNDEB) – de acordo com a EC 53/06
(arts. 23, parágrafo único, 206, VII, 211, § 5º, CF/88, e 60, ADCT).
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