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As condições para se viver a qualidade de vida dos pescadores do


Perequê/Guarujá, São Paulo, Brasil: uma abordagem quali-quantitativa

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Natali Piccolo Ingrid Cabral Machado


Instituto de Pesca Instituto de Pesca
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AS CONDIÇÕES PARA SE VIVER E A QUALIDADE DE VIDA DOS
PESCADORES DO PEREQUÊ/GUARUJÁ, SÃO PAULO, BRASIL:
UMA ABORDAGEM QUALI-QUANTITATIVA
Ingrid Cabral Machado e Nátali Isabela Pierin Piccolo

RESUMO

O emprego da qualidade de vida nos estudos sobre susten- tral de São Paulo, Brasil, foi estudada por meio dos indica-
tabilidade pesqueira vem se mostrando uma promissora abor- dores IQV e IQCV. Foram utilizadas entrevistas estruturadas
dagem e o uso de indicadores possibilita a análise integrada, e abertas e observação direta da realidade da pesca local.
permitindo a inclusão aspectos subjetivos. Os indicadores Ín- As dimensões ambiental e governança receberam as piores
dice de Qualidade das Condições para se Viver (IQCV) e Ín- pontuações, tanto na avaliação dos membros da comunidade,
dice de Qualidade de Vida (IQV) proporcionam uma adequa- quanto do técnico. A dimensão econômica foi bem pontuada
da análise da proximidade ou distanciamento entre a visão por ambos, mas a dimensão social foi melhor pontuada pe-
de técnicos e dos próprios pescadores sobre a sua qualidade los pescadores, demonstrando o valor das conexões sociais
de vida e permitem a avaliação das políticas públicas desti- locais. O pequeno distanciamento entre IQV e IQCV revela
nadas ao setor. Estes indicadores, que vêm sendo aplicados a proximidade entre as duas visões sobre o que é prioritario
na agricultura e maricultura nas dimensões ambiental, so- no investimento de políticas públicas no local. Os resultados
cial e econômica estão sendo testados na pesca de pequena foram comparados com outros índices de qualidade de vida,
escala, acrescidos da dimensão de governança. A qualidade o IDHm e o índice de GINI, revelando o bom desempenho do
de vida na comunidade pesqueira de Perequê, no litoral cen- método utilizado.

Introdução pescadores e pescadoras arte- As evidências de sobrexplo- na vida torna-se matéria de


sanais, responsáveis por cerca ração dos recursos pesqueiros grande importância.
A pesca de pequena escala é de 45% da produção pesquei- em todo o mundo e dos im- Os desafios impostos aos
fundamental como geradora de ra no país (MPA, 2012). pactos à produtividade já são pescadores de pequena escala
renda e ocupação de mão-de- Pescadores artesanais apre- conhecidas e afetam mais du- dependentes dessa atividade
-obra em todo o mundo, sendo sentam, pela lida diária com a ramente os pequenos pescado- de baixo lucro os incitam a
responsável pela manuten- natureza e seus ciclos, profun- res: aqueles que convivem buscar alternativas estimulan-
ção de milhares de famílias. da familiaridade com o am- com condições socioeconômi- do à adaptação, distanciando-
Béné et al. (2010), citados em biente e um conhecimento cas precárias e que estão me- -os de boas condições de vi-
Britton e Coulthard (2013) refinado dos recursos que ex- nos providos de ativos sociais ver e facilitando a desarticu-
afirmaram a importância da ploram, o qual é de grande para conseguirem alternativas lação do modo de vida tradi-
pesca de pequena escala no utilidade nas propostas de para sua subsistência. cional, podendo afetar a sua
bem-estar social nos países gestão pesqueira (Berkes A preocupação com a sus- resiliência (Coulthard et al.,
pobres, pela redução das vul- et al., 2000; Thé e Nordi, tentabilidade dos recursos pes- 2011). No equacionamento
nerabilidades, incremento à 2006; Silvano e Begossi, queiros remete à questão da destes problemas, a considera-
segurança alimentar, renda e 2012). Este repositório de in- sustentabilidade e da reprodu- ção de aspectos de qualidade
direitos sociais. formações vai além da prática ção do modo de vida do pesca- de vida vem se mostrando
Segundo o Registro Geral da atividade em si; evoca um dor artesanal como sujeito so- uma nova e promissora abor-
da Atividade Pesqueira (RGP), saber que se repassa dentro e cial e cultural, provedor de dagem (Coulthard et al., 2011;
do antigo Ministério da Pesca entre gerações e um acervo alimentos de alto valor nutricio- Britton e Coulthard, 2013;
e Aquicultura do Brasil, exis- cultural que faz da pesca ar- nal. Neste contexto, o estudo Weeratunge et al., 2013;
te mais de um milhão de tesanal um modo de vida. de suas condições e satisfação Nunan, 2014; Coulthard, 2015).

PALAVRAS CHAVE / Bem-estar / Indicadores / Pesca Artesanal /


Recebido: 09/06/2017. Aceito: 29/12/2017

Ingrid Cabral Machado. Gra- em Ecologia e Recursos Natu- Ponta da Praia, CEP 11030- quita Filho, Brasil. Mestre em
duada em Medicina Vete- rais, Universidade Federal de 906, Santos-SP, Brasil. e-mail: Aquicultura e Pesca, Instituto
rinária e Mestre em Ciência e São Carlos, Brasil. Pesquisa- imachado@pesca.sp.gov.br de Pesca/SAA-SP, Brasil.
Tecnologia do Pescado, Uni- dora, Instituto de Pesca/SAA- Nátali Isabela Pierin Piccolo.
versidade Federal de Viçosa, SP, Brasil. Endereço: Avenida Graduada em Zootecnia, Uni-
Brasil. Doutora em Ciências Bartolomeu de Gusmão, 192, versidade Estadual Júlio Mes-

JANUARY 2018 • VOL. 43 Nº 1 0378-1844/14/07/468-08 $ 3.00/0 43


LAS CONDICIONES PARA VIVIR Y LA CALIDAD DE VIDA DE PESCADORES DEL PEREQUÊ/GUARUJÁ,
ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL: UN ABORDAJE CUALI-CUANTITATIVO
Ingrid Cabral Machado y Nátali Isabela Pierin Piccolo
RESUMEN
El empleo de aspectos de la calidad de vida en estudios dió por medio de los indicadores ICV e ICCV. Se utilizaron
sobre sostenibilidad pesquera revela un enfoque prometedor y entrevistas estructuradas y abiertas, y la observación directa
el uso de indicadores posibilita el análisis integrado, logran- de la realidad de la pesca local. Las dimensiones ambiental
do la inclusión de aspectos subjetivos. Los indicadores Índi- y gobernanza recibieron las peores puntuaciones, tanto en la
ce de Calidad de Condiciones para Vivir (ICCV) e Índice de evaluación de los miembros de la comunidad, como del técni-
Calidad de Vida (ICV) proporcionan un adecuado análisis de co. La dimensión económica estuvo bien puntuada por ambos,
la proximidad o distanciamiento entre la visión de técnicos pero la dimensión social fue mejor puntuada por los pesca-
y de los pescadores sobre su calidad de vida, y permiten la dores, demostrando el valor de las conexiones sociales loca-
evaluación de políticas públicas. Estos indicadores, que han les. El pequeño distanciamiento entre ICV y ICCV revela la
sido aplicados en agricultura y maricultura en las dimensio- proximidad entre las dos visiones acerca de lo prioritario en
nes ambiental, social y económica, se están probando en la inversión de políticas públicas locales. Los resultados fueron
pesca de pequeña escala, agregada la dimensión de la go- comparados con otros índices de calidad de vida, el IDHm y
bernanza. La calidad de vida en la comunidad pesquera de el índice de GINI, revelando el buen desempeño del método
Perequê, en la costa central de São Paulo, Brasil, se estu- utilizado.

QUALITY OF LIVING CONDITIONS AND QUALITY OF LIFE OF FISHERMEN FROM PEREQUÊ/GUARUJÁ,


SÃO PAULO STATE, BRASIL: A QUALITATIVE-QUANTITATIVE APPROACH
Ingrid Cabral Machado and Nátali Isabela Pierin Piccolo
SUMMARY
The use of aspects of quality of life in the studies of fishing zil, was studied through the LQI and QCLI indicators. Struc-
sustainability has shown to be a promising approach and the tured and open interviews were applied, as well direct obser-
use of indicators permits an integrated analysis, allowing the vation of the local fisheries’ reality. The environmental and
inclusion of qualitative and subjective aspects. The indicators governance dimensions received the worst scores, in both the
Quality of Conditions for Living Index (QCLI) and Life Quality assessments of community members and the technician. The
Index (LQI) provide an appropriate analysis of the proximity economic dimension was well scored by both, but the social
or distance between the technical and the fishermen’s views dimension was better scored by fishermen, demonstrating the
about their quality of life and allow the evaluation of public value of local social connections. The small gap between LQI
policies. These indicators, which have been applied in agricul- and QCLI reveals the closeness between the two views about
ture and mariculture, in environmental, social and economic the priorities in public policies investment in the community.
dimensions, are being tested in small-scale fisheries, with the The results were compared with other quality of life indices,
added governance dimension. The quality of life in the fishing IDHm and GINI index, revealing the good performance of the
community of Perequê, in the central coast of São Paulo, Bra- method used.

Estes trabalhos pressupõem compreende o alcance de pa- senvolveramos índices IQCV dições e a qualidade de vi-
que a sustentabilidade só é drões mínimos de vida, e a (Índice de Qualidade das Con- da comunidade pesqueira
possível quando o sistema pro- qualidade de vida, que consiste dições para se Viver) e IQV de Perequê, no município de
dutivo assegura aos seus usuá- na experiência de vivenciar tais (Índice de Qualidade de Vida). Guarujá-SP, e comparar a visão
rios condições de vida dignas e condições, ou seja, a satisfação Estes índices, que vêm sendo dos pescadores sobre a sua sa-
o alcance da satisfação de suas atingida ou não. A diferença utilizados principalmente na tisfação na vida (aspectos sub-
necessidades materiais, relacio- entre estes fatores é frequente- avaliação de sistemas produti- jetivos) com a do representante
nais e subjetivas; assim, o uso mente notória na distinção en- vos agrícolas e na maricultura do poder público junto à comu-
de indicadores objetivos a fim tre a visão dos técnicos que nas dimensões ambiental, so- nidade (aspectos objetivos),
de avaliar as necessidades sub- atuam junto aos setores produ- cial e econômica (Magro além de avaliar que dimensões
jetivas, que podem ser traduzi- tivos e a visão dos próprios et al., 2009; Saidy e D’Agos- são mais importantes na deter-
dos como a própria qualidade membros do setor. No sentido tini, 2011; Duarte, 2012; Alves minação do resultado, as quais
de vida, tem possibilitado aná- de proporcionar uma adequada et al., 2013), estão sendo testa- devem ser prioridades na cons-
lises integradas de dados per- análise da proximidade ou dis- dos, acrescidos da dimensão trução de políticas públicas.
mitindo a inclusão aspectos tanciamento das duas visões e de governança, junto à pesca
subjetivos. mais, permitir a avaliação do de pequena escala (Piccolo Materiais e Métodos
Na visão de D’Agostini e sucesso das políticas públicas et al., 2015).
Fantini (2008) existe um hiato em melhorara qualidade de O objetivo do presente traba- A comunidade do Perequê
entre a qualidade das condi- vida do público-alvo de suas lho é avaliar, por meio dos in- (23º56’S-46º10’O) localiza-se
ções para se viver, a qual ações, estespesquisadores de- dicadores IQV e IQCV, as con- no Município de Guarujá, per-

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tencente à Região Metropoli- A atividade pesqueira no Nesta pesquisa foram utiliza- condições de vida dos pescado-
tana da Baixada Santista e à Guarujá concentra-se principal- das entrevistas estruturadas, res do Perequê era funcionário
região central do litoral do mente no arrasto do camarão- feitas na comunidade de da Prefeitura Municipal do
Estado de São Paulo, Brasil. A -sete-barbas Xiphopenaeus Perequê, tendo como ponto de Guarujá e responsável pela
praia do Perequê, de 2,4km de kroyeri, existindo ~200 embar- apoio a sede da Associação dos Secretaria Municipal de Pesca,
extensão, e a comunidade con- cações arrasteiras de pequeno Pescadores do Perequê (ASPE). Aquicultura e Meio Ambiente.
tígua de mesmo nome estão na porte (de até 9m, sem casario), Foram entrevistados 18 pesca- Esta entrevista foi realizada no
porção leste da Ilha de Santo que operam sem refrigeração, dores da comunidade de seu local de trabalho, na cidade
Amaro, a cerca de 10km do efetuando viagens diárias e Perequê, correspondentes a cer- de Guarujá. Os trabalhos de
centro do município. O nome arrastos de ~1h, segundo Graça- ca de 15% do total de pescado- campo foram conduzidos entre
desta localidade, no idioma Lopes et al. (2002). De acordo res da localidade, sendo 17 do 2014 e 2015.
indígena tupi ‘Pira-Ike’, signi- com Souza et al. (2009a), a gênero masculino e apenas uma
f ica entrada de peixes para concentração de pescadores de pescadora. Os pescadores abor- Referencial teórico
alimentação ou desova, fazen- camarão sete-barbas na região dados foram indicados pelos
do alusão a um rio que desá- pode ser explicada observando- representantes da ASPE e orien- A pesquisa utilizou o referen-
gua na praia, o Rio do Peixe. -se os movimentos migratórios tados quanto aos objetivos do cial metodológico proposto por
O Perequê é a maior comuni- recorrentes, motivados princi- projeto, o caráter voluntário da D’Agostini e Fantini (2008).
dade pesqueira do Guarujá e é palmente pela facilidade de participação e o compromisso Foram definidos 54 aspectos ou
considerado um núcleo da cul- distribuição do produto para de não identificação dos infor- variáveis entre as dimensões
tura caiçara (cultura litorânea Santos e São Paulo, e pelo flu- mantes. O técnico convidado a social, ambiental, econômica e
do sudeste do Brasil). xo turístico no local. responder pela avaliação das governança (Tabela I), como

TABELA I
ASPECTOS AVALIADOS POR DIMENSÃO
Dimensão Tema/Aspectos
1. Saúde
1.1. Acesso ao atendimento de saúde; 1.2. Exposição às drogas e ao consumo de bebidas alcoólicas; 1.3. Penosidade do
trabalho;
2. Educação
Social

2.1. Acesso à educação formal; 2.2. Acesso à capacitação profissional para a atividade pesqueira.
3. Infraestrutura
3.1. Condições de Moradia; 3.2. Infraestrutura comunitária; 3.3. Segurança, medo da violência.
4. Cultura e sociabilidade
4.1. Conexões sociais, lazer/uso do tempo; 4.2. Prática religiosa; 4.3. Identificação com o estilo de vida da; profissão;
4.4. Relações de gênero; 4.5. Liberdade
1. Degradação dos recursos naturais
1.1. Poluição; 1.2. Produção pesqueira/produtividade pesqueira e diversidade de espécies pesqueiras; 1.3. Sistemas de
Ambiental

produção predatórios, práticas pesqueiras proibidas; 1.4. Rejeito de pesca; 1.5. Captura incidental de espécies não
pesqueiras; 1.6. Destinação de resíduos de pescado; 1.7. Destinação de resíduos de material de pesca; 1.8. Diversidade
biológica
2. Más condições de saneamento básico
2.1. Condições sanitárias do local onde vive
1. Renda insuficiente
1.1. Rendimentos, poder de compra e geração de riqueza; 1.2. Alternativas de renda.
Econômica

2. Cadeia produtiva ineficiente


2.1. Acesso aos insumos; 2.2. Autonomia na comercialização; 2.3. Logística; 2.4. Agregação de valor.
3. Crédito e Benefícios inacessíveis
3.1. Acesso ao crédito; 3.2. Acesso a programas sociais de renda mínima ou outros; 3.3. Acesso ao seguro-defeso.
1. Inserção da atividade na sociedade
1.1. Percepção da sociedade sobre a pesca e sobre o pescador; 1.2. Expectativa quanto ao futuro da atividade.
2. Representação Política/Institucional
2.1. Participação em entidades de classe; 2.2. Conhecimento e participação nas instâncias de Gestão pesqueira
Governança

3. Uso do espaço e conflitos


.1. Territórios de pesca X Unidades de Conservação; 3.2. Conflitos pelo uso do território pesqueiro; 3.3. Instituições
locais; 3.4. Legislação pesqueira; 3.5. Fiscalização pesqueira
4. suporte técnico-científico
4.1. Existência de serviços de extensão e/ou pesquisa pesqueira
5. Falhas na informação/comunicação
5.1. Informação/comunicação

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proposto no documento Indi- indicadores parciais e finais apenas um de >60 anos de ções estritamente objetivas e
cadores de Desenvolvimento foram calculados com base nas idade. A escolaridade entre os baseadas em parâmetros eco-
Sustentável (IBGE, 2015). Os fór mulas de D’Agostini e pescadores era baixa, sendo nômicos são insuficientes, ha-
aspectos foram apresentados Fantini (2008): que a maioria não estudou vendo necessidade de se con-
aos pescadores e ao técnico na além do ensino fundamental. siderar valores subjetivos, cul-
forma de perguntas, cujas res- 1−n/N
Sobre a pescaria praticada, 13 turais e os sentimentos coleti-
postas qualitativas eram anota-
ICi, ISi = 1− ( r
r
Σni=1 ( d i ) ⋅ Wi ) s
,
pescadores relataram trabalhar vos e individuais. Em concor-
das e pontuadas pelo entrevis- no arrasto do camarão sete- dância com esses autores, foi
tador no intervalo de 1 a 10. onde a quantidade de aspectos -barbas Xiphopenaeus kroyeri, verificado neste trabalho que a
Aos pescadores, as perguntas com grandes desvios em rela- demostrando a grande depen- qualidade de vida abrange
eram direcionadas à satisfação ção às condições ideais (n) era dência dessa comunidade da mais que os parâmet ros de
ou insatisfação de suas neces- dada pelos distanciamentos pescaria desta espécie. As pes- acesso à renda e recursos ma-
sidades nos vários aspectos das ≥0,7 em cada dimensão, ou carias alternativas (emalhe, es- teriais, envolvendo outros va-
dimensões e ao técnico, ao in- seja, pelos aspectos pontuados pinhel e esporte/recreio) foram lores e recursos, individuais e
vés da satisfação, eram qualifi- com valor <3. Não foi adotada citadas como complementares coletivos, que afetam a vivên-
cadas as condições de vida na diferença de importância (peso, ao arrasto, sendo que apenas cia da comunidade.
comunidade. A partir da pon- w) entre os aspectos avaliados, um pescador declarou praticar Sobre o escopo das avalia-
tuação atribuída, calculava-se a assumindo-se que todos têm a exclusivamente a pesca de es- ções de qualidade de vida, o
distância entre o valor pontua- mesma importancia para a qua- porte/recreio. Do grupo de pes- gr upo WeD (Wellbeing in
do e a situação desejável (nota lidade de vida; assim, conside- cadores entrevistados foram Developing Coutries) desenvol-
10), o que representa o lapso rou-se o r igual a 2. identificados três provenientes veu um protocolo de avaliação
existente entre a realidade e a do Estado de Santa Catarina, que está sendo aplicado à ativi-
satisfação, a partir da percep- IQV − ISS0,25 x ISA 0,25 x um do Ceará, um da Bahia e dade pesqueira (White, 2010;
ção do entrevistado. Foram um do Rio Grande do Norte, Britton e Coulthard, 2013;
calculados os indicadores par- ISE 0,25 x IGG 0,25 mostrando que a pesca na loca- Coulthard, 2015) e que abrange
ciais, relativos às dimensões, lidade abriga uma rica mescla as dimensões material (recur-
sendo para os pescadores: de migrantes. Esta característi- sos tangíveis e objetivamente
IQCV − ICS0,25 x ICA 0,25 x
Indicador de Satisfação Social ca ocorre, segundo Macedo- mensuráveis), subjetiva (nor-
(ISS), Indicador de Satisfação ICE 0,25 x ICG 0,25 Lopes et al. (2009) e Souza mas, pensamentos e sentimen-
Econômica (ISE), Indicador de et al. (2009a), pela facilidade tos acessados de forma quali-
Satisfação Ambiental (ISA) e Os indicadores parciais fo- de distribuição do pescado da tativa) e relacional (relaciona-
Indicador de Satisfação Insti- ram discutidos desde o ponto localidade para centros urbanos mentos sociais, formais ou in-
tucional/Gover nança (ISG), de vista dos aspectos, particu- como Santos e São Paulo, pela for mais que viabilizam ou
consolidados posteriormente no larmente nas dimensões onde frequência de turistas à comu- constrangem o bem-estar e a
Índice de Qualidade de Vida maiores carências e problemas nidade, pela infraestrutura re- qualidade de vida). No contex-
(IQV). A entrevista com o téc- foram identificados. Os indica- gional para a pesca e pelo me- to do projeto Voices of the
nico da Prefeitura Municipal dores finais foram comparados lhor preço do pescado em rela- Poor, do Millennium Ecosystem
do Guarujá, gerou os indicado- entre si e aos índices de desen- ção a outras regiões produtoras Assessment (www.millenniu-
res parciais: Indicador da volvimento humano municipal de camarão. massessment.org), a avaliação
Qualidade das Condições So- (IDHm) e de desigualdade so- Milner‐Gulland et al. (2014) de bem-estar é feita com base
ciais (ICS), Indicador da Qua- cial (Coeficiente de Gini). e Woodhouse et al. (2015), em em critérios materiais, saúde,
lidade das Condições Eco- trabalhos voltados para o im- relações sociais, segurança e
nômicas (ICE), Indicador da Resultados e Discussão pacto de projetos conservacio- liberdade de escolha e ação.
Qualidade das Condições nistas sobre o bem-estar de Observando essas referências,
Ambientais (ICA) e Indicador Os entrevistados, caracteri- comunidades, alertam que in- podemos considerar que os as-
da Qualidade das Condições de zados na Tabela II, eram em tervenções sempre impactam o pectos abordados na aplicação
Governança (ICG), os quais sua maioria, pessoas maduras, bem-estar das pessoas e não do método do IQV e IQCV
foram consolidados no Índice da faixa etária de 40 a 60 anos considerar esse impacto pode utilizado no presente trabalho
de Qualidade das Condições (11 pescadores), havendo seis comprometer os objetivos do abrangeram de maneira satisfa-
para se Viver (IQCV). Os pescadores de <40 anos e projeto. Nesse sentido, avalia- tória as dimensões e aspectos

TABELA II
CARACTERÍSTICAS SOCIAIS E PRODUTIVAS DOS PESCADORES ENTREVISTADOS
20 30 anos 31-40 anos 41-50 anos 51-60 anos >60 anos
Faixa etária
1 5 4 7 1
≤10 anos 11- 20 anos 21-40 anos >40 anos
Tempo na pesca
4 5 6 3
Não estudou Até 4 anos de estudo De 5 a 8 anos de estudo 11 anos de estudo Ensino superior
Anos de estudo
2 3 10 3 0
Arrasto de camarão
Tipo de pescaria Emalhe Espinhel Esporte e recreio Trabalho em peixaria
sete-barbas
que pratica
16 1 1 2 1

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que vêm sendo propostos nos Na visão dos pescadores, o teria a prática de despejar es- representação nas políticas
protocolos de avaliação de qua- aspecto ‘poluição’ foi o que goto sem tratamento no Rio do públicas.
lidade de vida. mais influenciou negativamente Peixe durante os meses de Em nível regional e local, o
A Figura 1 ilustra os valores a dimensão ambiental. Para o afluxo de turistas. Esta suposi- cenário é afetado também pe-
dos indicadores parciais de qua- técnico da prefeitura foram a ção, reforçada em uma reunião las dificuldades de integração
lidade de vida: ISS, ISA, ISE e ‘destinação de resíduos de pes- promovida para a devolutiva dos pescadores com instâncias
ISG, oriundos da percepção dos cado’ e ‘as condições sanitárias dos resultados da presente pes- de gestão pesqueira, sendo
pescadores sobre os aspectos de do local onde se vive’. quisa, realizada em novembro evidente o baixo interesse e a
cada dimensão e dos indicado- A má avaliação obtida na de 2015, motivou a propositura pouca fé na voz que tais ins-
res parciais da qualidade das dimensão ambiental, tanto pe- e execução de uma ação con- tâncias venham proporcionar
condições para se viver: ICS, los pescadores quanto pelo téc- junta para a limpeza do rio, ao pescador e nas perspetivas
ICA, ICE e ICG, oriundos da nico da prefeitura entrevistado, tipo de ação oriunda da cons- de solução dos problemas.
percepção do técnico entrevista- reflete a preocupação com os trução de um acordo entre as Associado diretamente a este
do. As dimensões: ambiental e impactos recorrentes à qualida- partes e apoiada pelo poder fator, identificou-se a precária
governança foram as que rece- de ambiental em toda a região. público, que é bastante benéfi- participação nas entidades re-
beram as piores avaliações, tan- A preocupação dos pescadores ca para o aprendizado coletivo presentativas. Especificamente
to dos pescadores quanto do do Perequê com a poluição, a e autoestima da comunidade, sobre a pesca no Perequê,
técnico da prefeitura, resultando qual reflete na redução da pro- no sentido de conferir crédito à Graça-Lopes e Silva (2010)
nos menores indicadores par- dutividade pesqueira, e a sua sua capacidade de modificar a atribuem a falta de resposta às
ciais de qualidade de vida e de associação à dragagem de realidade. inúmeras dificuldades enfren-
condições para se viver. A di- aprofundamento e manutenção Pressupõem Woodhouse tadas pela pesca à fragmenta-
mensão econômica foi a mais do canal do Porto de Santos et al. (2015) que o bem-estar ção das ações do poder públi-
bem avaliada pelas duas visões, também foi verif icada por depende das instituições huma- co, à ausência de uma política
sendo a única na qual o indica- Fagundes et al. (2013) quando nas e que estas afetam as pos- pública voltada para o setor e
dor parcial foi maior na visão entrevistaram 670 pescadores sibilidades de sucesso de proje- à visão quase que exclusiva
do técnico do que na visão dos atuantes na área possivelmente tos e a sustentabilidade. Isso das funções do estado como
pescadores. A dimensão social impactada pela dragagem do enfatiza a dimensão relacional agente fiscalizador e punidor,
foi a dimensão em que as duas canal do porto de Santos, o do bem-estar, defendido pelo destacando a necessidade do
visões mais se distanciaram. De que torna este tema uma séria grupo WeD, bem como a liga- extensionista pesqueiro como
uma maneira geral, com exce- demanda de atenção do poder ção entre bem-estar individual interlocutor e t radutor dos
ção da dimensão econômica, a público em nível regional e e coletivo. Neste trabalho, a acordos necessários.
avaliação dos pescadores foi nacional. dimensão governança aparece Na pesca são frequentemente
mais positiva do que a avalia- A questão da qualidade sani- entre as duas piores avaliação relatadas a resolução de confli-
ção do técnico. Os técnicos e tária na comunidade, particu- de satisfação, segundo a visão tos e a identificação da territo-
os usuários dos recursos não larmente relacionada ao lance dos pescadores do Perequê, rialidade de maneira informal,
precisam apresentar as mesmas de esgoto doméstico e também havendo vários aspectos nos onde os limites geográficos são
opiniões sobre os aspectos, no ao descarte de resíduos de pes- quais a pouca credibilidade das flexíveis e as decisões são to-
entanto, os promotores de mu- cado no Rio do Peixe revelou- instituições gestoras da pesca madas em escala individual,
dança e suas instituições preci- -se um assunto muito impor- ficou patente. Nesta dimensão, familiar ou comunitária, na
sam, a fim de ter coerência nas tante para a qualidade de vida os pescadores consideraram o ausência de instituições for-
suas ações, reconhecer no outro no local, sendo associado tanto aspecto ‘expectativa quanto ao mais (Begossi, 2001, 2004;
a condição de semelhante e, no às atitudes dos próprios mem- futuro da atividade’ como o Moura, 2012). Thé e Nordi
entanto, subjetivamente diferen- bros da comunidade, quanto à que mais comprometeu a ava- (2006) e Machado et al. (2011)
te na avaliação da distinção de interferência do Condomínio liação. Para o técnico da pre- discorrem sobre as instituições
significados em um sistema de Acapulco, um loteamento resi- feitura, a ‘deficitária presença locais como sendo o conjunto
interesses (D’Agostini e Fantini, dencial turístico contíguo ao de institutições locais’ e as de regras estabelecidas por
2008; Saidy e D’Agostini, 2011). Perequê, cuja administração ‘inadequações da legislação comunidades no uso de recur-
pesqueira’ foram os mais de- sos naturais. Tais regras, usual-
terminantes na má avaliação. mente informais e ágrafas, re-
A preocupação com o futuro presentam o saber local aplica-
da atividade pesqueira é uma do ao manejo, proporcionando
questão mundial, no contexto maiores garantias de adesão do
da crise em que a atividade se que a legislação formal, uma
encontra e da preocupação com vez que são baseadas no apren-
a sua sustentabilidade socioe- der-fazendo (Moller et al.,
cológica, expressa no Código 2004). Um aspecto da gover-
da Pesca Responsável da FAO nança que chama a atenção na
(1995). No Brasil, a política de comunidade do Perequê é a
gestão da pesca historicamente ausência de instituições infor-
privilegiou o desenvolvimento mais que orientem o comporta-
do setor industrial. Segundo mento dos pescadores, o que
Dias-Neto (2003), as comuni- pode contribuir para a perda de
dades pesqueiras artesanais no resiliência deste sistema socio-
Brasil se desenvolveram em ecológico pesqueiro.
Figura 1. Valores dos indicadores parciais de qualidade de vida e das um contexto histórico de defi- Por outro lado, Macedo-
condições para se viver na localidade de Perequê, Guarujá ciência e instabilidade de Lopes et al. (2009) associam a

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impossibilidade do uso de es- Verifica-se que ambos os aspec- condições, mas também de que obtido na base de dados do
tratégias locais e práticas de tos econômicos mais valoriza- as dimensões estejam em equi- Governo Federal (http://tabnet.
manejo tradicionais na gestão dos na avaliação remetem às valência pois enquanto houver datasus.gov.br/cgi/ibge/censo/
da pesca no Perequê a uma políticas públicas de apoio ao aspectos que dificultem atingir cnv/ginibr.def ), mede a desi-
“fraca coesão comunitária”, setor pesqueiro, demonstrando bons estados de satisfação, os gualdade na renda domiciliar
causada pelo intenso afluxo de como os pequenos pescadores demais que eventualmente se- per capita média, ou seja, a
migrantes com hábitos distin- ainda são dependentes do am- jam bem avaliados não poderão diferença entre a maior e o
tos. Lopes et al. (2009) identi- paro financeiro proveniente dos ser plenamente usufr uídos, menor nível de renda da locali-
ficaram a razão desse fenôme- órgãos do governo. uma vez que a manifestação dade estudada. O índice varia
no na questão da pesca do ca- Souza et al. (2009b) afir- desta boa qualidade é impacta- entre 0 e 1, sendo que quanto
marão ser uma atividade atra- mam que o seguro-defeso é da pelo que está ruim. No caso mais próximo de 0, menor é a
ente econômicamente. Porém, essencial para a sobrevivencia da pesca na comunidade de desigualdade de renda, ou seja,
os mesmos autores salientaram do pescador, destacando, po- Perequê verifica-se que as di- melhor a distribuição de renda
que a falha na adoção de mé- rém, inúmeros problemas veri- mensões governança e ambien- e quanto mais próximo do 1,
todos alternativos de gestão f icados na comunidade de tal são as que tendem a deses- maior a concentração de renda.
pode levar ao colapso desta Perequê, como atrasos, valores truturar o equilibrio das condi- O Índice de Gini, apesar de
comunidade, onde esta insatis- e o falho sistema de distribui- ções e qualidade de vida na bastante limitado, por abordar
fação já pode ser reconhecida ção do benefício. Mendonça e pesca do local, devendo ser unicamente o aspecto da renda,
nos indivíduos da comunidade Lucena (2013), em uma análise objeto de especial atenção na esteve bastante próximo do
mas ainda não de forma clara da política pública em nível construção das políticas públi- IQCV e do IQV. O IDHM
em discussões coletivas. Na nacional, descrevem vários pro- cas para a comunidade. (Índice de Desenvolvimento
revisão de Weeratunge et al. blemas adicionais, destacando A Figura 2 ilustra os valores Humano Municipal) foi obtido
(2014) o reconhecimento comu- as fraudes; ainda assim, reco- dos indicadores finais IQV e a partir da base de dados da
nitário do território pesqueiro e nhecem a importância do re- IQCV, mostrando que a proxi- Fundação SEADE (www.imp.
o poder sobre a gestão do re- curso para a pesca artesanal, midade das visões dos pesca- seade.gov.br/frontend/#/perfil) é
curso e acesso dos usuários alertando que o sistema deveria dores e do técnico, o que deno- calculado com base nos indica-
constituem direitos básicos e ser reformulado. ta um quase sempre adequado dores de renda, saúde (longevi-
essenciais atividade pesqueira Tanto para os pescadores entendimento por parte do po- dade) e educação do município.
para manutenção do bem-estar. quanto para o técnico entrevis- der público da realidade da Esse índice também varia entre
Os pescadores mostraram-se tado, o aspecto ‘identificação comunidade, sendo que a visão 0 e 1, sendo que, quanto mais
divididos em suas opiniões com o estilo de vida da profis- do técnico tendeu a ser um próximo do valor máximo, me-
sobre a legislação pesqueira; são’ é o que mais fortalece o pouco mais pessimista do que lhor é o desenvolvimento hu-
havendo tanto impressões posi- capital social da pesca na a dos pescadores. Estes resulta- mano na localidade. O IDHM
tivas quanto negativas e tam- localidade. dos são contrários aos encon- do Guar ujá em 2010 foi de
bém alegações de desconheci- A pesca artesanal, mais que trados por D’Agostini e Fantini 0,75 (classificação alta), apre-
mento das normas. Reportam uma atividade produtiva, é um (2008) e Saidy e D’Agostini sentando um valor bem acima
Souza et al. (2009a), sobre as modo de vida diferenciado. Os (2011), que registraram maio- do que o IQV e IQCV calcula-
leis pesqueiras incidentes sobre pescadores descrevem o estilo res valores de IQCV do que dos para os pescadores do
o Perequê, que estas nunca fo- de vida na pesca como o traba- de IQV, sugerindo que as con- Perequê, revelando uma a ina-
ram instituídas com uma real lho autônomo em contato com dições para se viver propostas dequação do IDHM como ex-
participação dos pescadores; ao a natureza, em liberdade e sem pelos técnicos não foram dire- pressão das condições de vida
contrário, sempre foram elabo- patrão, que proporciona uma tamente traduzidas como me- na localidade, e ressaltando o
radas por técnicos e pesquisa- satisfação não vivenciada em lhoria da qualidade de vida IQV como indíce mais adequa-
dores, o que tende a compro- empregos formais. Entretanto, dos usuár ios dos recu rsos do e detalhado na avaliação
meter sua eficácia. Britton e as transformações atuais, com avaliados. nos domínios que se estabele-
Coulthard (2013) observaram a desvalorização do pescador A Figura 2 compara, além cem a vida dos profissionais
em comunidades pesqueiras do artesanal e perda paulatina da disso, os indicadores IQV e pescadores desta comunidade.
Norte da Irlanda, elevada in- perspectiva de continuidade, IQCV aos índices de Gini e ao
fluência do Estado na atividade afetam a qualidade de vida e IDHM do município de Conclusões
pesqueira e discorreram sobre podem deturpar o estado de Guar ujá. O Índice de Gini,
o quanto é frustrante o proces- satisfação, havendo perda da A proximidade dos olhares
so top-down a que os pescado- identidade social que é valori- sobre a satisfação e sobre as
res estão submetidos. zada nesse aspecto. Paiola e condições de vida que com-
Sobre a dimensão econômica, Tomanik (2002) encontraram a põem o bem-estar individual e
o aspecto que pesou mais posi- mesma identif icação com o comunitário no Perequê, pode
tivamente na avaliação dos pes- estilo de vida na pesca em um configurar em uma oportunida-
cadores foi o ‘acesso ao seguro- estudo sobre as perspectivas de de para que haja uma produti-
-defeso’ (auxílio financeiro continuidade da pesca artesanal va integração de capacidades,
pago aos pescadores na época no Estado do Paraná e destaca- resultando no aprendizado co-
de proibição da captura em fun- ram as pressões que ameaçam letivo com a constr ução de
ção do período reprodutivo da este sistema, especialmente as Figura 2. Valores dos indicadores ações voltadas para o bem co-
espécie-alvo); enquanto que na de cunho ambiental. finais de qualidade de vida (IQV) mum. Entretanto, a fragilidade
e das condições para se viver
visão do técnico da prefeitura Para D’Agostini e Fantini (IQCV) de 2015 na localidade de das relações estabelecidas com
os aspectos mais positivos fo- (2008) e Alves et al. (2013), a Perequê e dos indicadores Índice as instâncias gestoras, a inexis-
ram o ‘acesso ao crédito’ e qualidade de vida depende não de GINI e IDHM (2010) para o tência de acordos locais para
‘acesso ao seguro-defeso’. somente de viver sob boas município de Guarujá. controle da atividade pesqueira

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