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revisão ISSN 2238-1589

TESTE DE ROTAROD: CONTRIBUIÇÕES NO ESTUDO DAS DOENÇAS


NEUROMUSCULARES, DAS SÍNDROMES EXTRAPIRAMIDAIS E DAS
ATAXIAS CEREBELARES
Wladimir Bocca Vieira de Resende Pinto1*; Gui Mi Ko2

RESUMO
1 Disciplina de Biologia Molecular, O uso de testes comportamentais e neurológicos é ferramenta essencial na caracterização
Departamento de Bioquímica - UNIFESP fenotípica de modelos animais para doenças neurológicas. O teste da barra rotatória ou
2 CEDEME - UNIFESP Rotarod é um dos mais antigos empregados na área de estudo dos efeitos motores indu-
zidos por uso de drogas em estudos pré-clínicos e na descrição do fenótipo de mutantes
* Autor para correspondência: induzidos geneticamente para doenças cerebelares, extrapiramidais e neuromusculares.
Wladimir Bocca Vieira de Resende Pinto
A quantidade de informação disponível referente à metodologia e às interpretações do
E-mail: wladimirbvrpinto@gmail.com
teste é muito ampla, contudo é muito limitada ainda a uniformidade nos testes empregados
Recebido para publicação: 16/01/2012 nos diversos estudos. O objetivo desta revisão é destacar as principais contribuições do
Aceito para publicação: 23/04/2012 teste para a Neurologia Experimental, a metodologia empregada na maioria dos serviços
e pelo nosso grupo e os aspectos atuais do emprego da avaliação motora em roedores.

Palavras-chave: Modelos animais. Rotarod. Barra rotatória. Miopatias. Neuropatias


periféricas. Transtornos de movimentos.

mais classes), podendo os mesmos ser indicados


1 Introdução diante de suspeita observada na rotina com os
2,3.

O número de modelos experimentais em ca- Por testes neurológicos motores, podem-se


mundongos para estudo de condições neuroló- -
gicas é bastante amplo e oferece a oportunidade te de fatores comportamentais e sensitivos que
de semelhanças bioquímicas e genéticas com os permita estabelecer o desempenho de um ou mais
correspondentes humanos1, o estabelecimento componentes do sistema motor (vias piramidais e
de correlações importantes no entendimento -

entretanto, que distúrbios de outros componentes


fenotípica dos modelos neurológicos (induzidos do sistema nervoso possam originar alterações no
geneticamente por transgenia ou por mutagênese fenótipo observado em tais testes. De um modo
química ou induzidos por efeitos temporários ou geral, os testes motores podem ser divididos em:
- (i) gerais, incluindo o teste do cilindro, os testes
-hereditário) envolve diversas etapas, como testes de rastreamentos genéricos, como SHIRPA (Smi-
thKline Beecham, Harwell, Imperial College and
testes comportamentais e neurológicos (motores, Royal London Hospital Phenotype Assesment)4, os
cognitivos, sensitivos ou combinando uma ou sistemas de escalas de movimentos involuntários

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anormais, dentre outros; (ii) de atividades locomo- geralmente desenhados para ratos, por exemplo,
toras, incluindo o teste de campo aberto em arena
circular ou quadrada, o rotômetro (automated a ratos, especialmente na performance inicial)5,7;
rotometer test bowls) e o teste da roda para correr
(wheel running velocidades pré-programadas constantes ou com
equilíbrio, incluindo o teste de Rotarod com ou sem
balance beam), a variam de 0 a 40 rpm em 5 minutos, apesar de bas-
análise da marcha por footprinting, o teste de nata- tante variável)5; componentes da superfície da bar-
grip strength; ra rotatória, como presença de frisos de aderência

incluindo o teste de Collins, o teste da escadaria e


o teste de alcance5 (Mouse Phenome Database). para evitar queda pelo animal); barra rotatória com
Alguns dos testes motores se sobrepõem como no
caso do conhecido protocolo SHIRPA, que inclui perpendicular entre placas verticais das divisórias
em sua segunda de três etapas de rastreamento em (ou das paredes) do aparelho; número de animais
mutagênese os testes motores no campo aberto, no
mínima capaz de gerar para as dimensões do ani-
espontânea. Outros testes podem fornecer dados mal o efeito de fall avoidance
indiretos sobre atividade locomotora (como o labi- gerar lesões físicas em caso de queda da barra (em
rinto em cruz elevado, o labirinto em zero elevado, geral valores entre 30 e 40 cm de altura)8. No inter-
o hole-board test e o labirinto aquático de Morris). valo entre os testes, é corriqueiro o uso de álcool
O teste de Rotarod representa junto com o cam- isopropílico a 70% na maioria dos estudos para
limpeza da plataforma de testes dentre um animal
fenotípica motora em modelos animais5. Apesar testado em uma divisória e o próximo. Contudo, há
evidências atualmente de que o uso de tal produto
50 anos6

formas anteriormente manuais e mecanicamente


comandadas pelo experimentador até as formas Fazendo analogia bastante grosseira, há diver-
mais modernas em que múltiplos animais podem sos autores que comparam o teste de Rotarod aos
ser testados simultaneamente, de forma automática, eventos esportivos humanos de “log rolling” ou
registrada eletronicamente e passível de progra- “birling”, mais difundidos como esporte no nordes-
te dos EUA e no Canadá, em que dois participantes
físicos do teste. Assim, é importante que se reca- se distribuem sobre uma tora ou barra rotatória co-
pitulem as principais indicações, metodologias e locada na superfície da água, em cada extremidade
da barra. Enquanto um deve permanecer o tempo
todo apenas se equilibrando, o outro deve deam-
bular sobre a barra em velocidades controladas
pela própria pessoa, de forma a obter equilíbrio e
2 metodologia do teste de rotarod
ambos permanecerem o maior tempo na barra sem

Ao se optar pelo teste da barra rotatória para roedores no Rotarod

devem-se avaliar as principais características do Os parâmetros avaliados no teste de Rotarod


aparelho: diâmetro da barra ou cilindro, em geral incluem: tempo de latência (ou de resistência para
por volta de 3 cm até 5 cm (em diâmetros maiores, queda), distância total percorrida (dependente da

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pré-teste, grande distância para transporte do animal

- plataforma entre as sessões, efeitos dispersivos de


dos), o fato do animal urinar ou defecar durante
-
mental ou neurológico, diferentemente do que se
observa para o teste de labirinto em cruz elevado possam alterar a resposta de genes modulados por
e do que outros grupos consideram9. Se o objetivo derivados estrogênicos); idade do animal submeti-
-
desmame médio com 21 dias, idealmente por volta
ser estudados nas repetições nos demais testes. de 8 a 10 semanas); comprimento e massa corpó-
Deve-se avaliar o número de repetições de sessões reos dos animais testados (animais mais pesados
para cálculo de média ou do total de latência, desde apresentam desempenho pior que os de massa re-
que realizados treinamento prévio dos animais em duzida), de preferência o mais homogêneo possível
dentre grupos de controles e mutantes (se possível);
de atividade locomotora espontânea por se tratar presença de doenças associadas ao cuidado e ao
de teste de performance forçado.
Ao interpretar o desempenho de um grupo de análise estatística5,11. Orienta-se nunca realizar
animais no Rotarod, devem-se considerar como o teste de Rotarod
possíveis vieses ou tendenciosidades: uso apenas casos de rastreamentos como teste em massa. Essa
de machos ou fêmeas; a espécie utilizada (desem- -
penho esperado para o teste em camundongos é dualmente deve ser feita rotineiramente já que é
muito distinto daquele observado em ratos); as li- possível detectar alterações funcionais da marcha
nhagens isogênicas utilizadas; diâmetro do cilindro, -
principalmente quando a diferença no tamanho de
barra ideal e a utilizada for de pelo menos 1,2 cm, entre registros eletrônico e manual do momento
10; da queda dos animais na base da plataforma. Do
fêmeas em fases distintas do ciclo estral (daí alguns mesmo modo, deve-se sempre posicionar o animal
autores darem preferência pela homogeneidade do com o dorso voltado para o examinador e nunca
teste apenas em machos); testes realizados em fases
de examinadores a apenas um por sala. Em caso
- -
tuante, conforme a fase do ciclo circadiano, além do portamental mais apurada, pode-se optar pelos
camundongo ser noctívago e predominantemente
inativo durante a fase clara do ciclo, daí alguns auto- eletrônica durante as sessões11. Devem-se avaliar
também os resultados de forma dependente no uso
para o novo regime de fase claro-escuro (de prefe-
rência por pelo menos 1 semana antes de iniciar os

que os dados obtidos em faixas de velocidades


contudo, fundamental, porém mínimo de 15 minu- independentes constantes5. É interessante sempre
tos); animais que logo ao posicionamento na barra
apresentem quedas (comportamento incompatível
com o teste); componentes do ambiente de teste cilindro rotatório.
(ruídos externos ao local de teste, luminosidade Um dos protocolos mais bem estabelecidos para
o teste de Rotarod é o de Carter9, da Universidade

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de Cambridge, o qual adotamos em nosso serviço


ao 1º dia inferior a 20%. Valorizou-se também a
utilizamos barra rotatória com diâmetro de 3,175 -
cm, com animais habituados por pelo menos 60 mas ninhadas de desempenho motor semelhante.
minutos na sala de testes, com caixas posicionadas Após estabelecimento de tais critérios de corte,
a distância inferior a 1 metro do aparelho, sempre observou-se que 11,25% de tais animais testados
após mudança de fase claro-escuro dos testados, (n=109) preenchiam critério de tempo de latência
com mesmas condições de testes para as cinco -
divisórias de teste simultâneo do aparelho, com
demais faixas de 10 segundos de intervalo até 60
segundos entre controles e animais F3. Dentre os
adotando períodos máximo de teste de 60 segun- 11% de F3, 5 grupos de ninhadas distintas foram
dos e entre sessões de 5 a 10 minutos. O número selecionadas, compreendendo 5,36% do total de
de sessões de treinamento, pré-treinamento e de animais F3 (47% dos F3 selecionados). Contudo,
em apenas uma ninhada viu-se 100% dos testados
em geral variando de 4-5 sessões por dias por 2 a selecionados, constituindo linhagem selecionada
4 dias. Outro protocolo que consideramos interes- de mutantes, apesar de infértil como observado
posteriormente. Todos estes animais F3 haviam
Cardiff12 sido rastreados em outros testes comportamentais
pelo nosso laboratório apontam que, mesmo em 10 e neurológicos previamente (labirinto em cruz
sessões diárias de treinamento simples em 2 dias
consecutivos (espaçada cada etapa da outra por
5 minutos, sem fase de pré-treino, e controlados
- Dentro do grupo de roedores, utilizam-se fun-
portamento observado em camundongos BALB/c damentalmente camundongos e ratos no teste de
controles no primeiro dia foi bastante semelhante Rotarod. Quando se considera cada uma das linha-
entre machos (n=13; média de 14,34 segundos) e gens de camundongos separadamente, observa-se
fêmeas (n=13; média de 13,72 segundos), sempre desempenho dependente das velocidades nos
testes12. O desempenho distinto entre linhagens se
tanto em machos quanto fêmeas (em fêmeas, 28,69 dá fundamentalmente em baixas velocidades no
segundos no 2º dia, e em machos, 34,37 segundos -
no 2º dia), e com melhora percentualmente maior rendo principalmente pelo desempenho ruim da
no grupo dos machos (239% em machos contra linhagem DBA/2, e com 6 e 10 semanas de idade,
209% em fêmeas) e isoladamente maior em mu- respectivamente, em intervalos de velocidade de
lheres (800 vezes em uma das fêmeas testadas). No 19 a 33 rpm e de 13 a 23 rpm. O desempenho no
protocolo empregado, com velocidades constantes Rotarod contínuo mostrou que o desempenho de
(5 rpm, por 1 minuto, em barra com diâmetro de BALB/c foi inferior ao de 129S2/Sv, de DBA/2, e
3,175 cm, IITC Life Science Rotarod®, California, destacadamente inferior ao de C3H/He, de CBA/
EUA), por ter se tratado de esquema de rastrea-
mento fenotípico após mutagênese química por inferior ao de BALB/c e de 129S2/Sv. Durante 5
semanas seguidas de treinamento, houve tendências
recessiva) (n=969, machos e fêmeas), adotou-se bem claras: melhora nas duas primeiras semanas
valor de corte de permanência (tempo de latência) na latência de CBA/Ca com piora nas duas últimas
na barra rotatória menor ou igual a 10 segundos semanas, em altas velocidades (mais entre 29 e 44
rpm); tendência a desempenho inferior ao das de-
neurológicas ou comportamentais durante o teste mais linhagens para DBA/2 entre 9 e 10 semanas

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belar ou extrapiramidal genericamente, é possível


de linhagem envolvida no estudo motor é deter- Rotarod
minante nos resultados observados12. As maiores -
taxas de aprendizagem motora foram encontradas
em linhagens CBA/J e C57Bl/6J e as piores em como núcleos denteados do cerebelo, pedúnculo
linhagens DBA/2J, A/J e FVB/NJ13, assim como o cerebelar médio, complexo olivar inferior, pars
desempenho motor de C57Bl/6J e de CBA/J foram compacta da substância negra, núcleos talâmicos
melhores como um todo em conjunto. Em outro ventro-laterais, ventro-mediais e centro-laterais,
estudo, o melhor desempenho foi observado em no segmento lateral do globo pálido e no segmento
dorso-medial do estriado15. Assim, regiões como
havia sido testada nos estudos anteriores14.
cerebelo, as vias coeruleus-cerebelares, o segmento
dorso-lateral do estriado e os córtices motor e parie-
tal posteriores igualmente importantes no sistema
3 interpretação de resultados obtidos
no teste
por outros testes motores15. Eventualmente lesões

Assim como qualquer teste de rastreamento e Rotarod,


de diagnóstico na área biomédica, o Rotarod está devendo-se diferenciar, por exemplo, dos padrões
lesionais descritos previamente16.

adequadas) e sua reprodutibilidade. Da mesma


4 APLICAÇÕES CLÁSSICAS E INDICAÇÕES
forma que com outros testes comportamentais, o
ATUAIS DO TESTE
uso da barra rotatória em série com a caracteriza-
-
Tradicionalmente o Rotarod vem sendo empre-
reduzir o número total de animais falsos-positivos gado em fases precoces nos estudos experimentais
selecionados em esquemas de rastreamento feno- pré-clínicos de drogas com o objetivo de identi-

como um todo. A idéia, portanto, deste teste em apenas tardiamente poderiam ser vistos na fase IV
caracterizações fenotípicas é o seu uso em série do estudo clínico, na etapa de fármaco-vigilância,
e em estudos experimentais para efeitos motores
adversos de drogas, como etanol e benzodiazepíni-
eliminatório para o outro. cos. Atualmente a barra rotatória representa forma
O tempo de latência, principal medida obtida na
modelos animais nocautes para genes associados

planejamento motor; (iv) aprendizagem motora; e estritamente eficiente para estudo de déficits
(v) condições físicas gerais (em especial desem- cerebelares e de núcleos da base do telencéfalo
penho cárdio-pulmonar e relações zoométricas) e (destacadamente o estriado) no desempenho motor
neuromusculares7. As quedas mais rápidas com em roedores e no estudo da aprendizagem motora7.
tempo de latência menor se associam em geral a Destacamos a seguir alguns modelos animais que
mostram a importância do emprego do teste de
muscular5 - Rotarod para doenças neurológicas.

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5 modelos animais para doenças gênica, apresenta fenótipo neurológico compatível


neuromusculares versus rotarod com a forma familiar da ELA e resulta em óbito na
maioria entre 5-6 meses de idade17
Já foram descritos modelos animais neuromus- fenotípica, na história natural do modelo, observa-
culares caracterizados em testes comportamentais
e no Rotarod para diversas condições neuroló- cerca de 3 semanas e nos estágios mais avançados

musculares, nas doenças da placa mioneural, nas do decúbito lateral em menos de 15 segundos e
neuropatias periféricas e nas doenças do neurônio incapacidade de grooming para limpeza de secre-
motor. Destacamos aqui o papel de um conheci- ções perioculares (existindo gap de sinais entre
do modelo transgênico para estudo da Esclerose fêmeas e machos de 4 a 7 dias). Como achado his-
17,18. topatológico, observaram-se acúmulo progressivo
A ELA representa doença neurodegenerativa de agregados protéicos ubiqutina-positivos com
progressiva, do grupo das Doenças do Neurônio SOD1 em neurônios, células da glia e neurópilo,
Motor junto com a Esclerose Lateral Primária, a

Progressiva, manifestando-se clinicamente por efeito neuroprotetor de exercícios físicos na ELA


sinais e sintomas progressivos de lesões dos neurô- e utilizando o modelo animal transgênico G93A
nios motores superior e inferior, seguindo os crité- comprovou-se tal efeito em diversos estudos,
rios revisados de El Escorial, da World Federation evidenciado por melhora na expectativa de vida
of Neurology19. Cerca de 10% do total de casos de 20.

Em estudo muito bem desenhado sobre atividade


- locomotora em exercícios físicos e abordagens
ções no gene da Cu/Zn SOD1 citosólica (superóxido terapêuticas para ELA, avaliaram-se os efeitos
dismutase-1, no locus 21q22.1) e por expansões sinérgicos entre exercício físico de livre-demanda
intermediárias de poliglutamina (27 a 33 unidades) na roda de corrida (running wheel) e no uso de ve-
no gene da ataxina-2 (ATXN2, no locus 12q24.12) tores virais de vírus associado ao adenovírus (AAV)
(OMIM: #105400). A SOD1 encontra-se envolvida
IGF-1 (insulin-like growth fator 1) e para GDNF
ânion superóxido em peróxido de hidrogênio, sendo (glial cell line-derived neurotrophic factor), ambos

terminal pré-sináptico através de todo axônio até o


- núcleo celular do neurônio correspondente, a partir
-
quadro clínico dominado por síndrome piramidal de morais dos mutantes 18

de tais medidas no desempenho motor no Rotarod


superior, associada a fasciculações musculares, em animais assintomáticos (60 dias de vida) e em
plenamente sintomáticos (90 dias de vida). Em ani-
achados sugestivos de doença do neurônio motor mais assintomáticos (60 dias de vida), observaram-
inferior. Da mesma forma que em outros casos de -se atraso no início da sintomatologia em 31 dias
para IGF-1 e em 16 dias para GDNF, comprovados
motoneurônios do corno anterior da medula espinal pelo tempo de latência em queda progressiva no
e os tratos córtico-espinais laterais. Rotarod, e aumento na sobrevida geral em 11 dias
O modelo transgênico G93A para SOD1 (back- para GDNF e em 37 dias para IGF-1. A expectativa
ground genético B6SJL-Tg(SOD1*G93A)1Gur/ de vida máxima para IGF-1 chegou quase ao dobro

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dias versus 140 dias). Em animais sintomáticos (90 83 repetições) apresenta cauda de poliglutaminas
dias de vida), observaram-se melhora da sobrevida expandida originando quadro de neurotoxicidade
geral em 7 dias para GDNF e em 22 dias para IGF-1
e atraso na piora motora (por queda no tempo de e de proteínas nucleares ligantes de poliglutamina,
latência total) no Rotarod 20 dias após o grupo con-
trole em IGF-1, por volta de 120-130 dias de vida modular a histona desacetilase 3 e o co-repressor
(para efeito comparativo simbólico, considerar 10 a silencing mediator of reti-
14 dias do camundongo na amostra como 3 meses noid and thyroid hormone receptors)22, gerando
de vida na espécie humana). Os efeitos motores grandes inclusões nucleares com subunidade 20S
observados no Rotarod acompanharam-se pelos da proteassoma e a chaperona HSJ2 da família
correspondentes moleculares e histopatológicos, Hsp40. O quadro clínico dominante é representado
- por ataxia cerebelar progressiva com início na 3ª
tores, menor índice de astrogliose, menor conteúdo -

de apoptose (via caspases-3 e -9, via Akt-PI3-K e genética, disartria, disfagia, alterações da marcha
quebra do DNA)18. Assim, neste estudo, o Rotarod e do equilíbrio, fala arrastada, síndrome das pernas

demonstrar e dimensionar os efeitos de uma nova


abordagem farmacológica.
bulbar, paralisia do olhar vertical para cima, alte-

dismetria e disdiadococinesia (OMIM: #164400).


5 modelos animais para ataxias
Diversos modelos animais já foram gerados
cerebelares versus rotaroD
para estudo da SCA1. Selecionamos modelo ani-
mal produzido por transgenia knock-in para 154
O número de ataxias cerebelares para as repetições de expansões de trinucleotídeos CAG no
quais modelos animais já foram desenvolvidos é locus do camundongo (com background genético
muito grande21 e possibilita uma série de novas de C57Bl6/J x 129Sv/Ev), apresentando fenótipo
abordagens em estudos fisiopatogênicos e em
desenvolvimento terapêutico. Será destacada aqui cognitivos e morte prematura, acompanhada por
a abordagem feita para o modelo para a ataxia espi-
nocerebelar do tipo 1 (SCA1) e os estudos motores 23.
Também foi
pelo teste de Rotarod após terapêutica direcionada. mostrado em tal modelo animal que a proteína
A SCA1 representa ataxia autossômica do-
(Vascular Endothelial Growth Factor, VEGFA)24,
trinucleotídeos CAG (semelhante ao que ocorre descrito classicamente como alterado em doenças
na síndrome do sítio frágil do cromossomo X,
no endotélio, nos neurônios, nas células de Purkinje
e na glia cerebelares. Assim, a abordagem adotada
foi acasalar tais animais atáxicos com camundongos
ataxias espinocerebelares) no gene ATXN1 (locus
ou ministrar VEGF recombinante para os animais

para resultados no estudo foi o desempenho prévio


Notch (OMIM: #164400). A ataxina 1 gerada a e após intervenções no teste de Rotarod24. O desem-

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em nenhum momento ao observado em animais Rotarod em


do grupo controle na idade de 13 semanas, apesar distúrbios de movimentos, vamos destacar o pa-
da nítida aprendizagem motora, se comparado ao
desempenho de piora dos mutantes para SCA1
após 4 dias de treinamento. Contudo, com a idade estudo do Parkinsonismo Juvenil Associado ao
de 6 meses, os parâmetros basais de desempenho PARK2 (Doença de Parkinson Juvenil tipo Parki-
pré e pós-treinamento equipararam-se ao desem- na). O modelo é muito distinto fenotipicamente do
penho apresentado por animais do grupo controle, PARK2 (locus 6q26), carac-
terizado fundamentalmente por parkinsonismo de
início precoce, lentamente progressivo, antes dos
possível melhora de desempenho motor. As me- 40 anos de idade (geralmente dos 20 aos 40 anos),
alterações da marcha, alterações do tipo parkinso-
com achados histopatológicos, corroborando os nismo (bradicinesia, rigidez, instabilidade postu-
importantes dados objetivos fornecidos pela barra
rotatória24. Assim, para este modelo, conseguiu-se com melhora sintomática após o sono, podendo

- e distonia de membros inferiores, acompanhadas


-intervenções experimentais. por perdas neuronais (na pars compacta da subs-
tância negra e no locus coeruleus), sem corpos de

#600116). De forma bastante interessante, o mode-


6 modelos animais para distúrbios de
-
movimentos versus rotaro

Dentre os principais modelos animais desenvol- em células-tronco embrionárias (em background


vidos para estudo das síndromes parkinsonianas e
de seus aspectos cognitivos e motores, destacam-
negra26 (diferentemente do modelo induzido por
ao complexo de E3 ubiquitina ligase que degrada MPTP) nem mudanças no conteúdo dopaminér-
proteínas tóxicas para neurônios dopaminérgicos gico do estriado (assim como no bulbo olfatório e
por via dependente da proteassoma e ao controle na medula espinal) nem fenótipo nítido de parkin-
- sonismo ou distúrbios de movimentos27, apesar
do upregulation de receptores de dopamina e da
autossômica recessiva da doença de Parkinson) e o 7.

modelo induzido quimicamente de forma seletiva


por MPTP (1-metil-4-fenil-1,2,3,6-tetrahidróxi- com camundongos controle C57Bl/6J, houve de-
pars
compacta da substância negra mesencefálica)7,25. utilizando-se protocolo alternativo recente com barra
Está comprovado que em roedores as alterações de 9 cm de diâmetro e 5 sessões de treinamento por

fásica ou degenerações do sistema nigroestriatal 10 rpm, por 4 dias consecutivos, para treinamento
e vias acessórias se encontram mais associadas 7. Viu-se que o

tempo de latência foi menor, de forma estatistica-


aprendizagem motora e na memória espacial do
7. testados com 4 meses de idade, desde o primeiro até

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o quarto dia de testes. Do mesmo modo, o índice total


de aprendizagem foi menor, obtendo pela média de- de PARK2 em humanos e na doença de Parkinson
sempenho na latência cerca de duas vezes menor que idiopática, fundamentalmente pelo uso de nova
o grupo controle, duas vezes e meia menor que grupo abordagem na barra rotatória, possibilitando o
estudo de novas abordagens terapêuticas baseadas
de noradrenalina e de dopamina) e semelhante a gru- nas alterações funcionais descritas.

-
6 conclusão
mento. Tais resultados sugerem a presença de distúr-

O teste de Rotarod, apesar de bastante semelhan-


-

distúrbio funcional da habilidade de aprendizagem sua utilidade na pesquisa biomédica. Trata-se de mé-
motora, já que outros estudos e testes neurológicos e
comportamentais (barra rotatória, grip strength, teste
de catalepsia, teste de geotaxia negativa, vertical pole
test modelos animais. A expectativa atual é ampliar o seu
cauda, teste de balance beam
desempenho semelhante27. Deste modo, o desem- desenvolvimento de novas drogas no tratamento de
penho motor do modelo animal para Parkina no condições clínicas raras, mas com modelos genéti-
teste de Rotarod cos disponíveis, possibilitando análise comparativa
possível mecanismo fisiopatogênico funcional de desempenho motor pré e pós-teste.

THE ROTAROD TEST: CONTRIBUTIONS TO THE STUDY OF


NEUROMUSCULAR DISEASES, EXTRAPYRAMIDAL SYNDROMES
AND CEREBELLAR ATAXIA

The use of behavioral and neurological testing is an essential tool in the phenotypic cha-
ABSTRACT

racterization of animal models for neurological diseases. The Rotarod test is one of the
oldest employed in the study of the motor effects induced by drugs in preclinical studies
and in the description of the phenotype of genetically induced mutants of cerebellar, ex-
trapyramidal and neuromuscular disorders. The amount of information available regarding
the methodology and interpretations of the test is very broad, yet the uniformity is still very
limited in the tests used in different studies. The purpose of this review is to highlight the
main contributions of the test for Experimental Neurology, the methodology used in most
services and by our group and current aspects of the use of motor assessment in rodents.

Keywords: Animal models. Rotarod. Myopathies. Peripheral neuropathies.


Movement disorders.

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TESTE DE ROTAROD: CONTRIBUIÇÕES NO ESTUDO DAS DOENÇAS NEUROMUSCULARES, DAS SÍNDROMES EXTRAPIRAMIDAIS E DAS ATAXIAS CEREBELARES

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