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Revista Crítica Histórica Ano VII, nº 14, dezembro/2016

Santos e orixás: sincretismo, estética e arte afro-brasileira na


estatuária da Coleção Perseverança

Saints and Orishas: syncretism, aesthetic and art african - Brazilian in Statuary
Collection Perseverança

Anderson Diego da S. Almeida∗

Maria de Lourdes Lima∗∗

Rossana Viana Gaia∗∗∗

Resumo: Este artigo trata do sincretismo cultural presente na Coleção Perseverança1 e


mostra como esse complexo processo de ressignificação de distintas perspectivas de
religiosidade se reflete na produção dos artefatos da referida coleção. É a partir desse
pressuposto que se enfatiza a plasticidade afro-brasileira, sob o viés da memória e da
representação cultural para a leitura de algumas peças catalogadas como estatuárias. A
estética da Perseverança traduz a relação que o seu faber estabeleceu com as religiões
africanas e brasileiras, principalmente o candomblé e a católica, com o intuito de
ressignificar suas tradições culturais. Através da identificação dos códigos inseridos nos
objetos selecionados e apresentados neste artigo, foi possível identificar aspectos do
contexto histórico e analisar a identidade visual e religiosa da coleção, o que possibilita um
registro sobre a história das religiões africanas em Alagoas.



Doutorando em Artes Visuais – História, Teoria e Crítica da Arte na Universidade Federal do Rio Grande do
Sul – UFRGS. E-mail: andersondiego.almeida@yahoo.com.br
∗∗
Doutora em Ciência da Informação pela Universidade Estadual de São Paulo – UNESP. Professora do
Programa de Pós-Graduação em História na Universidade Federal de Alagoas – PPGH/UFAL.
∗∗∗
Doutora em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Alagoas – UFAL. Professora no Instituto
Federal de Alagoas – IFAL.
1
Parte do acervo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas – IHGAL. Possui mais de 200 peças religiosas
oriundas do “Quebra do Xangô”. Este que culminou com a invasão de todos os terreiros de matriz africana no
Estado de Alagoas, em 1 de fevereiro de 1912.

Recebido em 29 de agosto de 2016 e aprovado para publicação em 6 de setembro de 2016


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Revista Crítica Histórica Ano VII, nº 14, dezembro/2016

Palavras-chave: estética; estatuária; sincretismo

Abstract: This article deals with the cultural syncretism in this collection Perseverança and
shows how this complex process of reframing different perspectives of religion is reflected
in the production of the said collection artifacts. It is from this assumption that emphasizes
the african-Brazilian plasticity, under the bias of memory and cultural representation for
reading some cataloged as statuary pieces. The aesthetics of Perseverance translates the
relationship that his faber established with African and Brazilian religions, especially
Candomblé and Catholic, in order to reframe their cultural traditions. By identifying the
codes entered in the selected objects, and in this article, it was possible to identify aspects
of the historical context and analyze the visual and religious identity of the collection,
which provides a record of the history of african religions in Alagoas.

Keywords: aesthetic; statuary; syncretism

Introdução

O grande mérito da Coleção Perseverança está justamente no


que se conseguiu reunir de documentos do homem alagoano,
portador dessa grande herança afro-negra e afro-islâmica. Ele
atesta como conhecedor dos deuses africanos, das elaboradas
técnicas artesanais de fazer objetos trabalhados em búzios,
metais, couro e madeira; onde está transparente esse ethos
africano. Essa é uma arte em que a comunidade assume a
autoria, onde a moral e a ética da sociedade estão
comprometidas com a memória, sendo decisivamente o viço
da identidade o grande alimento dos processos.
(Coleção Perseverança e a etnografia do xangô, LODY, 1985)

Com o advento da escravidão no Brasil, as tradições africanas tiveram que ser


recriadas e adaptadas a uma nova realidade, o que resultou em complexa poética,
denominada arte afro-brasileira. Nesta forma de perceber a vida estavam intrísecos os
seguintes elementos: fé, espiritualidade, criatividade, forma, cor, cheiros e sabores que se

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mesclaram a outros oriundos do Atlântico e que se somaram à tradição europeia implantada


no “País dos índios”.
Os africanos trazidos ao Brasil transferiram sua singularidade para diversos setores
da sociedade e participaram efetivamente da formação cultural do país. O resultado da
relação entre as diferentes etnias está no cotidiano da população e é representada nas
manifestações religiosas. Contudo, os africanos atravessaram toda a sociedade brasileira por
meio de formas associativas. Assim, tanto o território quanto a formação da cultura
brasileira ficaram marcados por instituições e estruturas sociais capazes de reelaborar a
herança africana. Sendo assim, a religiosidade pós-diáspora, sob os trilhos da colônia,
percorreu seu próprio caminho. Santos (1996) afirma que tal como na África Ocidental, a
religião impregnou todas as atividades, o que regulou e influenciou a vida cotidiana. Essa
forma de percepção conservou o sentido de comunidade e mais do que preservar,
ressignifiou e recriou a base cultural brasileira.
No decorrer da história e do processo de restruturação cultural, a religião
afrodescendente fora proibida e o cristianismo europeu foi determinante como ideal e
como lei na nova colônia, império e país pós-republicano. Desse impasse resultou o
sincretismo religioso afro-brasileiro: um exemplo disso foi a identificação de deuses
africanos com santos e virgens católicas feitas pelos escravos, forçados a se tornarem
cristãos no Brasil (SANTOS, 1996).
Corroborando com Santos, Mosquera (1996) lembra que no tempo atual, globalizado
e pós-colonial, os processos sincréticos indicam uma negociação entre poder e diferença
cultural e completa: “Não há sincretismo real enquanto a união de antagonismos não-
contraditórios, mas enquanto estratégia de participação, re-significação e pluralização anti-
hegemônicas” (MOSQUERA, 1996, p. 470).
É importante o esclarecimento de que a leitura de sincretismo cultural, neste artigo,
parte da construção de uma síntese de processos multiculturais sujeitos a embates,
contradições e conflitos. Onde a etimologia da palavra grega – sygkretismós - retém a
dimensão política como medida de possíveis estratégias. Logo, no âmbito deste artigo este
será o nosso entendimento de que o processo de colonização aliado à fase republicana nos
possibilitou esta síntese de elementos culturais agônicos e diversos. Portanto, a gênese da
Coleção Perseverança tem a sua inserção nesses processos históricos, culturais e políticos.
É sob tal perspectiva que este artigo dá continuidade a um diálogo construído,
inicialmente em pesquisa de mestrado em História, na Universidade Federal de Alagoas –
PPGH/UFAL, a respeito do Etnodesign afro-brasileiro e sua composição conceitual a partir

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da Memória (Jacques Le Goff) e da Representação Cultural (Chartier). Contudo, o recorte


desta narrativa, encontra-se na descrição de algumas peças da Coleção Perseverança que
fornecem subsídios estéticos para discutir a arte afro-brasileira e o sincretismo cultural
presentes na estética, em seus grafismos e no processo de fabricação.

O axé e a fé: uma relação de ressignificação

Desde o seu início, as religiões afro-brasileiras constituíram um processo sincrético


com o catolicismo e em grau menor com religiões indígenas. O culto católico aos santos,
de um catolicismo popular de molde politeísta, ajustou-se ao culto dos panteões africanos.
Embora o negro, escravo ou liberto, tenha sido capaz de manter no Brasil dos
séculos XVIII e XIX, e até hoje, muito de suas tradições religiosas, é fato que sua religião se
enfrentou desde logo com uma séria contradição: na origem, bantos, iorubás e fons são
religiões de culto aos ancestrais, que se fundam nas famílias e suas linhagens, mas as
estruturas sociais e familiares às quais a religião dava sentido aqui nunca se reproduziram.
Para Prandi (1996), o tecido social do negro escravo nada tinha relação com a
família, os grupos e os estratos sociais dos africanos nas suas origens. Assim, a religião
negra só parcialmente pôde se reproduzir no Novo Mundo. A parte ritual da religião
original mais importante para a vida cotidiana, constituída no culto aos antepassados
familiares e da aldeia, pouco se refez, pois, na escravidão, a família se perdeu, a tribo se
perdeu. Na África, era o ancestral do povoado (egungum) que cuidava da ordem do grupo,
resolvia os conflitos e punia os transgressores que colocavam em risco o equilíbrio
coletivo. Quando as estruturas sociais foram dissolvidas pela escravidão, os antepassados
perderam seu lugar privilegiado no culto, sobrevivendo marginalmente no novo contexto
social e ritual. As divindades mais diretamente ligadas às forças da natureza, mais
diretamente envolvidas na manipulação mágica do mundo, mais presentes na construção
da identidade da pessoa, os orixás, divindades de culto genérico, essas, sim, vieram a
ocupar o centro da nova religião negra em território brasileiro. Pois que sentido poderia
fazer o controle da vida social para o negro escravo? Fora de suas representações
religiosas, era o catolicismo do senhor a única fonte possível de ligação com o mundo
coletivo projetado para fora do trabalho escravo e da senzala.
Se a religião negra, acrescenta Ferreti (1995), ainda que em sua reconstrução
fragmentada, era capaz de dotar o negro de uma identidade negra, africana, de origem,
que recuperava ritualmente a família, a tribo e a cidade perdidas para sempre na diáspora,

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era por meio do catolicismo, contudo, que ele podia se encontrar e se mover no mundo
real do dia-a-dia, na sociedade do branco dominador, que era o responsável pela garantia
da existência do negro, ainda que em condições de privação e sofrimento, e que
controlava sua vida completamente. Qualquer tentativa de superação da condição
escrava, como realidade ou como herança histórica, implicava primeiro a necessária
inclusão no mundo branco. Assim, logo passava a significar o imperativo de ser, sentir-se e
parecer brasileiro. Os negros não podiam ser brasileiros sem ser ao mesmo tempo
católicos. Podiam preservar suas crenças no estrito limite dos grupos familiares, muitas
vezes reproduzindo simbolicamente a família e os laços familiares mediante a
congregação religiosa. Daí a origem dos terreiros de candomblé e das famílias de santo.
Mas a inserção no espaço maior exigia uma identidade nacional, por assim dizer, uma
identidade que refletisse o conjunto geral da sociedade católica em expansão (VALENTE,
1977).
Com o fim da escravidão, a formação da sociedade nacional, estruturada em
classes e o extravasamento das populações pelas amplitudes geográficas, com a criação de
oportunidades sociais as mais diferentes, só fizeram reforçar a importância do catolicismo
para as populações negras. As religiões afro-brasileiras sempre foram devedoras e
dependentes do catolicismo, ideológica e ritualmente. Só muito recentemente as religiões
de origem negra começaram a se desligar do catolicismo, retomando suas tradições, como
a grande e única fonte de transcendência que possa legitimá-la e fornecer-lhe os controles
valorativos da vida social.
Verger (2006) explica a questão do sincretismo no Brasil, citando seu amigo
Balbino, o pai de santo do Axé Opô Aganju, que comparava a relação entre o catolicismo e o
candomblé como água e azeite dentro de um cálice, e juntos, dentro de um mesmo
recipiente, mas mesmo assim não se misturam. A mesma coisa acontece com as duas
religiões, pois elas convivem lado ao lado; mas, não se misturam. A partir disso, o termo
mistura não quer dizer, em última instância, fusão completa, entretanto, coexistência,
contato.
Alguns autores, como Silva (2006) e Ferreti (1995), consideram que o sincretismo
sempre esteve marcado pela resistência e afirmação daquele que fora subordinado. Para
Silva (2006), o surgimento do candomblé teria sido gerado pela necessidade da asserção de
uma identidade social e religiosa, a qual precisou ser reelaborada sob condições
desfavoráveis, derivadas da escravidão e, posteriormente, do desamparo social. A partir
dessa lógica, é possível afirmar que a organização social e religiosa dos terreiros tenderia a

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ressaltar uma reinvenção da África no Brasil.


Se por um lado os africanos tiveram que se readaptar à nova forma de vida, os brancos
europeus também foram fortemente influenciados pela cultura do povo escravizado. De
acordo com Verger (2006), no início da colônia, da mesma forma que os escravos se
europeizavam, os senhores também se africanizavam, a partir do contato com seus escravos.
“Um exemplo disso eram as babás e amas de leite negras, muito comuns, que acabavam
passando mais tempo com as crianças do que os próprios pais” (VERGER, 2006, p. 101).
Desta forma, desde pequenos os filhos dos brancos absorviam a cultura e a tradição dos
negros.
Fica evidente que o sincretismo afro-brasileiro não se refere apenas a uma suposta
mistura entre religiões, mas também a incorporação de elementos negros pela cultura
branca, e vice-e-versa. De qualquer modo, Valente (apud. FERRETI, 1995, p. 74)
acrescenta:

Seja qual for o ângulo que se analise a questão do sincretismo religioso,


é importante ressaltar que o negro não permaneceu passivo ante este
processo, apesar da imposição, da obrigatoriedade e do papel
desempenhado pela religião católica como sustentáculo do projeto
colonial. Tudo leva a crer que a partir da realidade vivida naquela época
considerando as dificuldades, o negro recriou e reinterpretou a cultura
dominante, adequando-a à sua maneira de ser.

Sobre a tradição negra, Verger (2006, p. 101) considera que “é no campo da religiosidade
que mais se manifesta a fidelidade dos valores africanos”. Como exemplo desses valores
a arte traduz o processo de integração e trocas simbólicas que ocorreram na adaptação na
colônia. A história da África pode ser reconhecida nas formas artísticas desenvolvidas
pelos negros, a partir de uma perspectiva enraizada em técnicas de fabricação, nos relatos
dos mitos e na estética que fortemente evidencia um país colorido e cheio de contrates.
Para Santos (1996, p. 269),

a arte africana está fundamentalmente associada à religião. Não é


estranho, pois, que nas comunidades afro-brasileiras se repita esta
modalidade. A manifestação do sagrado expressa-se por uma simbologia
formal de manifestação estética.

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A partir desta perspectiva, por uma questão de lógica, infere-se que: se o sincretismo
integra a cultura e desta resulta a arte, sendo a arte afro-brasileira uma segmentação, a
religiosidade é inerente à arte afro-brasileira. Por sua vez, é naturalmente sincrética. E se a
tradição africana é em sua essência religiosa, então, a arte afro-brasileira tem grandes
chances de ser religiosa, cultural e política.
A arte e a religião sempre se influenciaram, desde os tempos remotos. Elkins
(2004) relata que há oito mil anos atrás Europa, Ásia e África já apresentavam esculturas de
deuses e animais em forma de toténs. Povos neolíticos deixavam oferendas, construíam
altares e utilizavam pedras e ossos para fazerem imagens de deuses. A arte já era religiosa,
pois era construída a partir de rituais às enchentes, à caça, à colheita etc, e assim,
permaneceu durante as primeiras civilizações, na Suméria, na Turquia, no Egito e na
Pérsia.
Bax (2008, p. 3) ainda acrescenta que a arte continuou a servir a religião durante a
Idade Média, em Bizâncio, e, de certa forma, durante o Renascimento. Porém, no decorrer do
século XIX, a paisagem religiosa cristã mudou drasticamente em toda a Europa. A
democratização, a individualização, a ascensão das ciências empíricas e o crescimento
econômico descreditou o cristianismo como base para a moralidade e a ética. No entanto, o
desencantamento da religião pela sociedade ocidentalizada deu lugar a novas formas de
religiosidade.
A tradição cristã foi secularizada, as formas tradicionais de pensamento foram diluídas
e as doutrinas foram reexaminadas. A combinação dos novos movimentos filosóficos
resultou em uma interpretação mais pluralista e idiossincrática, voltada para uma
experiência religiosa centrada nas necessidades espirituais do indivíduo.
Para Flusser (2002, pp. 13-21), as religiões tradicionais não são mais capazes de nos
satisfazerem, e temos uma “fome religiosa insatisfeita”.

Como indivíduos e como sociedade estamos buscando novas formas de


substituir as religiões tradicionais para suprir nossa “religiosidade latente”.
Neste sentido, nossas atividades criadoras (inclusive cientificas e artísticas)
seriam realizadas especialmente com o intuito de abrir caminho para uma
nova religiosidade.

Em uma sociedade moderna, especialmente nos países marcados pela miscigenação


pós-colonização, é natural que surjam novas formas de religiosidade, sincréticas, híbridas.
Como afirma Morais (1998, p. 6) “[...] tudo na América Latina tende à hibridização e à
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mestiçagem cultural. Entre nós, nada existe em estado puro, seja no plano da arte erudita
seja no plano da arte popular”. A partir do dicionário, a palavra hibridismo refere-se à
biologia, porém, já há algum tempo, o termo vem sendo utilizado pelas ciências humanas
para descrever processos sociais e culturais de miscigenação, mescla e união.
Para Burke (apud. KERN, 2004, p. 55-56), como consequência da globalização
planetária, os processos de hibridização cultural são inevitáveis. O conceito de hibridização
pode ser entendido como sentido de mistura, mas trata-se de um processo e não de um
estado, que existiu em todas as fases da história, sob diferentes denominações.
Corroborando com Burke, Santaella (2003, p. 30) também afirma que “na cultura, tudo é
mistura”, processo comum nas sociedades globalizadas, pós-industriais, pós-modernas,
lembrando ainda que Canclini (1997) discute a questão em Culturas Hibridas.
Através do processo de hibridismo, a arte afro-brasileira constituiu-se de formas
culturais diferenciadas com traços da cultura Africana, europeia e indígena. Os artistas
negros que desenvolveram sua arte no Brasil com intuito de sobrevivência, tanto cultural
com financeira, destituiram-se de seus padrões, para aperfeiçoarem-se em novas
concepções, levando em consideração as religiões: candomblé e o catolicismo.
Os santeiros são profissionais artesãos que se especializaram na arte afro-brasileira
em duas bases: 1. Pela alusão histórica de transportarem os nomes e traços dos seus orixás
para os santos católicos e vice-versa; 2. Por utilizarem técnicas manuais que permitem
manter viva a memória e os saberes adiquiridos pelos seus antecessores. É a circularidade
cultural, a troca de ideias que, segundo Ginzburg (1990), circulam, entre o popular e o
erudito, e criam novas formas de cultura. Nessa perspectiva, a estética dos santos, plural e
multiétnica, muito tem dos traços do candomblé, sejam nas cores, nas formas, e nas
atribuições ritualísticas. Isso se deve à relação que Verger (2006) menciona, e que já foi
citada anteriormente “as religiões não se misturam, mas, estão conectadas”.

Tabela 1: Relação de orixás com o sincretismo


Orixá Objetos Tabus dos filhos Sincretismo/ Correspondência
rituais
Santo católico Vodum Jeje Inquice Banto
Exu ogó: bastão com carregar objetos Diabo Elegbara Bombogira
(chamado Barano formato fálico na cabeça Bara Aluviá
batuque do Rio Eleguá
Grande do Sul)
Ogum espada embebedar-se Santo Gun Incáci
Antônio Doçu Roximucumbe
São Jorge

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Oxóssi ou Odé ofá: arco-e-flexa comer mel São Jorge Azacá Gongobira
de metal; eru: São Sebastião Mutacalombo
espanta-mosca
de rabo de
cavalo
Ossaim lança e três assobiar Santo Onofre Agué Catendê
cabaças
contendo as
folhas sagradas
Oxumarê espada e cobras rastejar São Dã Angorô
de metal Bartolomeu Bessém
Obaluaiê ou xaxará: cetro ir a funerais São Lázaro Acóssi- Cafunã
Omulu feito de fibras São Roque Sapatá Cavungo
das folhas do Xapanã
dendezeiro com
búzios
Xangô oxé: machado contato com São Jerônimo Badé Zázi
duplo; mortos e São João Queviosô
xere: chocalho cemitérios; vestir-
de metal se de vermelho
Oiá ou Iansã espada comer carneiro Santa Sobô Matamba
e eru (espanta- ou ovelha, comer Bárbara Bumburucema
mosca) abóbora
Obá espada e escudo comer Santa
circular cogumelos; usar Joana D'Arc
brincos
Oxum abebê: leque de comer peixe de Nossa Aziritobosse Samba
metal amarelo; escamas Senhora das Navê Quissambo
espada Candeias Navezuarina
Logun-Edé ofá e abebê usar roupa São Miguel Bosso Jara
marrom ou Arcanjo
vermelha
Euá espada e comer aves Santa Lúcia Euá
chocalho de fêmeas
matéria vegetal;
esfera
Iemanjá abano de metal comer Nossa Abê Dandalunda
branco e espada caranguejo; Senhora da Quissembe
matar camundon- Conceição
goou barata
Nanã ibiri: cetro em usar facas de Santana Nanã
forma de arco, metal
de fibras
das folhas do
dendezeiro com
búzios
Oxaguiã (Oxalá mão de pilão de comida com Jesus
Jovem) prata ou de dendê; vinho de (Menino)
material branco palma; usar
roupa colorida às
sextas-feiras

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Oxalufã (Oxalá opaxorô: cajado comida com Jesus Liçá Zambi


Velho) prateado com dendê; vinho de (Crucificado
pingentes palma; usar ou Redentor)
representando a roupa colorida às
criação do sextas-feiras
mundo
Fonte: PRANDI, 1991

Coleção Perseverança: história, sincretismo e plasticidade

O campo das artes religiosas afro-brasileiras apresenta múltiplas influências.


Destacam-se, entretanto, dois polos: a arte negra em sua pluralidade de expressões
provenientes dos vários grupos de africanos trazidos para o Brasil, e a arte de origem
portuguesa em seus vários desenvolvimentos ao longo de séculos de aclimatação e de
desenvolvimento autônomo no Brasil.
O catolicismo popular e cultos africanos, assim como as religiões afro-brasileiras e
as artes a elas associadas se desenvolveram como espaço de mediação, de confluências e
interpenetrações de ritos, liturgias e visões de mundo no qual o religioso e o artístico se
fundem e se desdobram em múltiplas faces. Existe muito de “igrejas” nos “terreiros”, e de
orixás nos santos católicos, e assim, ressoam entre eles muitas marcas de um jeito de pensar
e sentir o mundo elaborado pelas experiências dos terreiros e das devoções do catolicismo.
Na arte religiosa dos terreiros o continuum é mais amplo, pois os objetos litúrgicos
(presentes, por exemplo, em altares como os pejís dos candomblés ou os congás da
umbanda) podem derivar de uma influência da herança africana (como as esculturas em
madeira de orixás, peças de barro, ferramentas de ferro forjado, vestimentas litúrgicas, etc,
tal como encontramos, sobretudo no modelo do candomblé) ou da tradição católica
(imagens de santos, crucifixos etc, ao lado de imagens de orixás, tal como encontramos,
sobretudo na umbanda).
A arte religiosa afro-brasileira é uma arte conceitual que exprime valores coletivos,
mesmo quando os artistas que a praticam parecem se destacar como indivíduos com seus
estilos pessoais reconhecíveis. Essa arte produz, por meio de um conjunto de objetos
modelados, um sistema de ideias, de tal modo que conceitos e objetos possam se expressar
mutuamente enfatizando a inseparabilidade existente entre eles. A ideia religiosa não se
objetiva na peça artística e nem esta é uma mera função do religioso. São antes linguagens
diferentes que expressam planos complementares de significados, ou seja, são fatos sociais
estético-religiosos. Assim, ainda que apresente influência ocidental, a arte africana não

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pode ser entedida na perspectiva de arte “pura” ou “arte pela arte”, pois não distingue arte
pura da arte aplicada.
No imaginário e na expressão artística afro-brasileira, os orixás costumam serem
caracterizados com atributos de santos católicos, quase todos brancos, como por exemplo,
o guerreiro romano, pelo qual Ogum é representado em muitos candomblés.
A Coleção Perseverança integra esse contexto enviesado pelo sincretismo e seus
artefatos fazem parte do acervo, enviesado pelo sincretismo, que se apresenta a Coleção
Perseverança, que faz parte de acervo do Museu do Instituto Histórico e Geográfico de
Alagoas – IHGAL. Sua história, anterior a sua chegada ao museu, está conectada com a
existência da Sociedade Perseverança2 e ao ato conhecido como o “Quebra de Xangô”3
(LIMA JÚNIOR, 2001, p. 169).
A história da referida coleção traz consigo, além da perspectiva política, do qual
culminou no “Quebra do Xangô”, significados pertencentes às religiões de matriz Africana
no estado de Alagoas. Nas 215 peças que a formam podem ser vistas a presença do
candomblé e também do catolicismo, através da estética peculiar, das etnias que povoaram
o Estado e das nomeclaturas dos Santos da Igreja Católica atribuídas às esculturas.
No recorte de análise para este artigo, selecionou-se uma série de cinco esculturas
catalogadas na coleção e que referenciam um determinado santo católico. A análise está
centrada no sincretismo presente nas peças e que, a partir dele, entender o faber, não
identificado até o momento. A construção histórica da coleção é realizada a partir das
técnicas de produção, ou seja, considera-se a importância atribuída pelo artesão no
processo de esculpir e determinar símbolos religiosos. A partir deles, identificam-se as
religiões de matrizes africanas, em Alagoas, como o registro do negro e a sua contribuição
para à construção da identidade cultural e para à história das religiões no Estado.


2
Sociedade Perseverança e Auxílio dos Empregados no Comércio de Maceió (fundadda em 30 de março de
1879), atual Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Alagoas.
3
Na noite do dia 2 de fevereiro de 1912, um grupo de ex-combatentes, de Alagoas, decidiu invadir e destruir
todos os terreiros de xangô do Estado, principalmente os da capital, Maceió. A argumentação para tal intento
estava fundamentada na hipótese do Governador, em gestão na época, Euclides Malta, frenquentar terreiros
de xangô, principalmente o de Tia Marcelina, primeira negra a implantar a religião no Estado, e dele tirar
proveito para sua administração. Fato que nunca foi comprovado. O que ficou em evidência, mais tarde, foi
que a ideia era destituir o Governador do seu cargo (ANDRADE, 2014).
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Figuras 1-2: Xangô Dadá - Altura – 46 cm/ Profundidade 8cm;


Nª Senhora da Apresentação
Fonte: ANDRADE, 2014; GRÁFICA MOURA RAMOS, 2014

Esta escultura (Figura 1) é em madeira, pintada com tinta vermelha escura, seguindo
o motivo formal de Nossa Senhora da Apresentação4 (Figura 2) carregando o Menino Deus.
Observar a mão direita, que traz um acessório simbólico de cada religião, e a postura
apresentada pelas duas imagens; nas cabeças, veem-se os oxês.

A cabeça (Figura 1 – verificar detalhe na imagem à cima) protegida por gorro


branco, detalhado por fio de algodão branco e finalizado na frente por uma espécie de bico,
feito em miçangas douradas e transparentes. Próximo ao pescoço, ainda da escultura de
Xangô Dadá, um fio de miçangas marrons e brancas enfiadas alternadamente. Porta,
também, outro fio de contas marrons e brancas alternadas de contas maiores, também
brancas, uma vermelha, um búzio e uma conta alongada em madeira torneada. Vê-se,


4
A primeira paróquia dedicada a esta invocação mariana no Brasil ocorreu em 1599, na cidade de Natal, Rio
Grande do Norte. A cidade de Porto Calvo, em Alagoas, palco de diversas batalhas entre brasileiros e tropas
invasoras, durante a guerra holandesa, tem também como padroeira a Senhora da Apresentação (GRÁFICA
MOURA RAMOS, 2014).

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ainda, uma conta branca, rajada de azul escuro. A figura que vai ao colo porta um fio de
contas marrons e brancas junto com outras maiores, nas cores branca leitosa, vermelha e
branca rajada de azul marinho. Nas costas, a escultura tem por entalhe uma espécie de
escudo, onde centraliza uma meia-lua: é um oxê antropomórfico de Xangô (ANDRADE,
2014).

Figuras 3–4: Oxum Ekum - Altura – 38 cm/ Profundidade – 8


cm; Nª Senhora do Rosário
DUARTE, 1974; ANDRADE; 2014; DANTAS, 2014

A escultura (Figura 3) representa a imagem de Nossa Senhora dos Prazeres que leva
o Menino Jesus no braço, ou como é mais provável, Nossa Senhora do Rosário dos Pretos
ou Nossa Senhora da Conceição, que é a representação que possui maior afinidade com
Oxum. A escultura de Oxum Ekum é pintada em vermelho e pontilhada de tinta branca. As
cabeças têm o ápice detalhado por pintura, lembrando uma cabeça raspada, pronta para o
banho ritual ou axé de sangue-ixé.
Lody descreve a peça, com tombo 15, da seguinte maneira:

A figura principal porta um Oxê 5 encaixado, pintado como um corpo. Pelo


orifício no topo da cabeça, deduz-se que a figura da criança possuía Oxê.
Um fio de miçangas marrons e brancas enfiadas alternadamente está
junto ao pescoço da figura principal (LODY, 1985, p. 43).


5
Objeto de franca ocorrência nos terreiros de Candomblés e de Xangô. Oxê é o machado de duas lâminas,
machado de dois gumes, de dois gomos, ferramenta de propriedade de Xangô. Ora os machados são em
madeira, ora em folha-de-flandres, cobre ou latão, assumindo todos os mesmos significados (LODY, 1985).
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A escultura é vestida por duas peças de tecidos. A primeira, feita de algodão


vermelho como uma longa túnica adornada por búzios e a segunda, feita do mesmo
material e cor, apresenta bordados de ponto cheio em linha branca e búzios. Segundo Lody
(1985, p. 43), “essas peças têm forte similitude com paramentos da Igreja Católica”. O autor
ainda observa que os rostos e antebraços das figuras são as únicas partes não pintadas.
É conhecida a importância que determinados santos católicos tiveram no Brasil. A
popularidade de Santo Antônio até hoje é enorme entre a população negra de várias
regiões do país. Robert Sienes (1992, p. 64), inspirado em trabalho da historiadora Mari
Karash e outros, mostra que “Santo Antônio dos negros, oferecia um exemplo da
capacidade de pessoas da África Central interpretar símbolos e objetos rituais estrangeiros
nos termos básicos de sua cultura de origem”. Em virtude de sua capacidade de curar
doenças, encontrar objetos perdidos, trazer fecundidade, Santo Antônio era considerado
um bruxo poderoso, associado a Exú.
Sienes (1992) apresenta detalhes sobre Santo Antônio, (Figura 6), conhecido também
como santo guerreiro, para mostrar a presença de uma identidade africana-bantu ou
centro-africana no Brasil.

Figura 5-6: Ogum ou Xangô Onirê - Altura – 41


cm/Profundidade – 13 cm;
Santo Antônio
Fonte: LODY, 1985; ANDRADE; 2014; ENTALHES
EM MADEIRA, 2014

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A escultura da Figura 5 é feita em madeira lixada e envernizada. Lody (1985) ressalta


o trabalho do artesão com referência formal com os ex-votos feitos em madeira na região
nordeste.

Lody (1985, p. 19), acrescenta que a essa conjectura retoma uma leitura sobre a
produção de esculturas em madeira de africanos no Brasil, que, entre outras opções de
explicar seus conhecimentos de artesãos, encontram na forma colonizada e submissa de
fazer santos e ex-votos para o consumo das igrejas, um caminho de produção. Além disso,
mostra-se como uma resistência, já que alguns objetos destinados aos cultos afro-
brasileiros vindos de mãos de obra e de conhecimento temático de africanos e/ou seus
descendentes.
Verifica-se que existe uma elipse entalhada nas costas da imagem contendo
gravação de uma meia-lua. A figura principal e a do menino Deus tem orifícios na cabeça,
denotando o uso de adereços. “Atentar para o nome Xangô Nilê, sincretismo com Santo
Antônio e observar o constante sincretismo desse santo com o orixá Ogum” (LODY, 1985, p.
19). Ogum possui na África o título de Onin Irê (Nigéria), legado por corruptela Onirê, Nilê.

Figuras 7-8: Ogum Taió - Altura – 53 cm (sem base)/ Altura-base – 4 cm/ Profundidade – 21 cm; São Pedro;
ANDRADE, 2014; FERNANDES, 2016
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A peça de Ogum (Figura 7) feita em madeira representa a figura masculina em pé,


com o braço esquerdo simbolizando uma pedra de amolar e com o direito, a lâmina que
seria amolada nessa pedra. Isso revela, segundo Lody (1985, p. 34) “postura ritual,
característica de Ogum, eminentemente bélico, guerreiro que domina os metais, as armas e
as ferramentas agrícolas”.
Escultura em madeira (Figura 7) representa figura masculina em pé, braços
articulados, olhos de vidro. A corrente de metal amarelo envolve o braço e traz ao pescoço
uma chave de ferro. Identifica-se a representação de São Pedro (Figura 8) (ANDRADE,
2014). Será uma característica de Ogum Taió nos antigos terreiros de Maceió, com o braço
esquerdo simbolizando uma pedra de amolar e o direito, a lâmina que seria amolada nessa
pedra. Isso revela postura ritual, característica de Ogum, guerreiro, que domina os metais,
as armas e as ferramentas agrícolas.

A escultura é coberta por uma túnica de algodão vermelho riscado de preto, típico
pano da costa africana. Sua barra é debruada de algodão branco e a gola e os punhos, de
pontos brancos, em forma de gancho, parecidos com o crochê. Veste calça fofa do mesmo
tecido. No ombro direito, leva uma tira de pano em algodão vermelho, forrado e barrado
internamente de algodão branco como um alacá ou pano da costa, apresentando nas barras
O.G.S. (sigla não identificada) duas vezes.

Figuras 9-10: Xangô ou Iansã - Altura - 34,5 cm/


Profundidade – 6 cm; Santa Bárbara
ANDRADE, 2014; FERNANDES, 2016

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Escultura em madeira foi sincretizada, em Maceió e Pernambuco, como São


Jerônimo e também como Santa Bárbara, que é protetora por ocasião de tempestades, raios
e trovoadas e ilustra a locução interjetiva de espanto, admiração, horror, cabendo bem a
lembrança e associação com o Xangô. Notar na imagem a presença de vários colares
confeccionados em miçangas na cor vermelha enfiadas alternadamente. Vê-se, tanto na
figura principal, como no Menino Deus, a presença dos oxês, martelos de duas lâminas,
encaixados.
A escultura apresenta a cor avermelhada devido ao depósito de sangue e dendê
durante os rituais no peji. Atentar para os olhos de vidros presentes na face da figura
principal e do menino posicionado no braço esquerdo. Xangô e Iansã possuem arquétipos
que representam o fogo e são inseparáveis e, consequentemente, o sincretismo aos dois está
associado à Santa Bárbara.
Xangô é o orixá do trovão, do governo e da justiça. Foi sincretizado como São
Jerônimo, santo tradutor da Bíblia do hebraico e do grego para o latim, santo também
invocado para se pedir proteção contra os temporais. O poder sobre as intempéries fez de
São Jerônimo Xangô, e vice-versa. Iansã, uma das esposas de Xangô, divide com ele o
patronato das tempestades e é cultuada como orixá do raio, além de ser o orixá responsável
pela condução do espírito dos mortos ao outro mundo. Foi sincretizada com Santa Bárbara,
que também protege o homem do raio.

Considerações finais

O presente artigo não pretende esgotar ou superficializar o tema, mas ao contrário,


aproveitar o espaço e a visibilidade para apresentar e exemplificar referências estéticas e
religiosas na história da Coleção Perseverança.
O tema sincretismo religioso na arte afro-brasileira estimula uma discussão não
que não se esgote em si mesma. É preciso, ao abordar essas questões ainda pouco
pesquisadas a partir da Coleção Perseverança, aproveitar lacunas, divulgar e apresentar os
expoentes da arte e da cultura negra brasileiras, que precisam ser entendidas a partir de
um contexto mais amplo, onde sua história seja contada em meio aos seus códigos
culturais, e não meramente no campo religioso. O estético, aqui, permitiu constuir uma
narrativa mesclando-se ao campo religioso.
Dentro dessa perspectiva, a Perseverança traz a possibilidade de entendermos
como funcionou o processo de ressignificação cultural, elaborado pelos seus artistas, com
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o intuito de manter viva os rituais e as formas de representações cultural e religiosa de


orixás e de suas respectivas comunidades afro-descendentes. Além de trazer uma nova
possibilidade de entender o “Quebra de Xangô” de 1912, em Maceió, em parte, em razão
das disputas oligárquicas.
Esse estudo indica, pelo viés artístico, uma possibilidade de entender uma nova
maneira de entender as religiões de matriz africanas e sua relação com o catolicismo em
Alagoas, contribui com a história de um grupo a partir do seu processo de fabricação ou de
produção cultural. Sendo as esculturas o exemplo maior da ressignificação e das
referências ritualísticas utilizadas pelo faber/santeiro.
As esculturas da Coleção Perseverança fazem paralelismos com santos católicos, o
que se consta em diversos apelos estéticos. O estudo indicou que cores, formas e grafismos
são elementos potencialmente construtores de sentidos que traduzem significados repletos
intencionalidades que, ao primeiro olhar não detectadas, com um segundo olhar, mais
atento, permitem um constructo, a partir dos signos, na história das religiões,
principalmente o Candomblé e o Catolicismo Popular em Alagoas.

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