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A tutela inibitória nas ações coletivas

Raphael Sergio Rios Chaia Jacob |Gabriela Luciano Borri |Heitor Romero Marques

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A tutela inibitória coletiva será abordada especialmente no que diz respeito às tutelas
do meio ambiente e defesa do consumidor.

RESUMO: O advento das tutelas preventivas no ordenamento jurídico brasileiro trouxe


uma nova concepção de tutela jurisdicional. De fato, a tutela ressarcitória,
especialmente no que concerne à defesa dos interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos, não atende satisfatoriamente os escopos das ações
coletivas. A tutela inibitória coletiva, ponto nodal do presente trabalho, será abordada
especialmente no que diz respeito às tutelas do meio ambiente e defesa do
consumidor. Em conclusão, verificar-se-á que a tutela inibitória melhor atende aos
interesses coletivos, visto que os tutela antes de configurado qualquer dano, já que
atua contra o ilícito, prescindindo a prévia configuração de dano para que surja o
interesse de agir.

PALAVRAS-CHAVE: 1. Tutela inibitória. 2. Direitos difusos. 3. Ação civil pública.

INTRODUÇÃO

De tempos em tempos, o Direito se depara com novos desafios que parecem conferir-
lhe ainda mais importância em seu trabalho de pacificação social. Se outrora a defesa
das liberdades individuais – que hoje nos são tão caras – era o bastião dos grandes
constitucionalistas, hoje a realidade nos mostra que interesses outros estão em pauta,
quiçá mais ameaçados, pois carecem de instrumentos adequados à sua tutela. Os
direitos difusos, ante as suas peculiaridades, não são particulares, tampouco públicos.
Habitam, pois, a região pantanosa de direitos que concernem tanto ao particular
individualmente considerado, quanto à coletividade propriamente dita.

De fato, as tutelas processuais sempre se preocuparam em defender direitos quando


houvesse efetivas lesões. Com a evolução da doutrina processualista surgiu a tutela
inibitória como uma antítese à tutela ressarcitória. Como este estudo mostra, a tutela
inibitória é uma tutela de prevenção, a qual busca tutelar um direito antes mesmo de
que sua lesão seja levada a cabo pelo ofensor. Essa possibilidade ganha relevo
principalmente no que tange aos direitos extrapatrimoniais, aos quais não interessa
tão somente a reparação, que será sempre insatisfatória, mas sim um instrumento
realmente eficaz que os proteja de ofensivas quase sempre irreparáveis.

Como fácil é ver, o tema deste trabalho e justamente alinhar estes dois grandes
institutos de efetivação da tutela jurisdicional: as ações coletivas e a tutela inibitória.
Para alcançar aludido objetivo adotou-se como linha teórica o método dedutivo,
baseado nos procedimentos da pesquisa bibliográfica e da compilação.
1.A DEFESA DOS INTERESSES COLETIVOS EM JUÍZO

Os interesses coletivos, espécie de interesses que ultrapassam a esfera individual de


proteção, apesar de suscetíveis de postulação individual, são efetivamente
concretizados quando postulados em benefícios de todos seus titulares. Nesse
diapasão, desenvolveu-se no ordenamento jurídico brasileiro o denominado
microssitema processual coletivo o qual, precipuamente, objetiva efetivar a proteção
dos interesses da coletividade de modo célere e eficaz.

No presente capítulo, abordam-se, sem intuito de esgotar o tema, as principais


questões atinentes aos interesses metaindividuais, suas espécies e conceitos, bem
como o tema da legitimidade ativa para sua defesa.

1.1.INTERESSES METAINDIVIDUAIS

Primariamente os direitos subjetivos dos indivíduos eram divididos em públicos e


privados. Essa dicotomia, contudo, não resiste a uma análise mais aprofundada sobre
o tema. De fato, como nos ensina Hugo Nigro Mazzilli, foi a partir de 1974 que essa
dicotomia entre interesse público e interesse privado sofreu grande crítica.

Sobre a superação da divisão simplista no tema atinente aos direitos individuais,


Waldemar Mariz de Oliveira afirma:

A summa divisio encontra-se irremediavelmente superada na realidade social de


nossa época, a qual é infinitamente mais complexa, mais articulada e mais sofisticada
do que a expressa pela simplista dicotomia tradicional. Novos direitos e novos deveres
aparecem, os quais, sem ser públicos no sentido tradicional da palavra, são todos
coletivos. Pertencem eles, ao mesmo tempo a todos e a ninguém. Com efeito, tendo-
se em conta que pertencem a grupos, classes ou categoria de pessoas, deles
ninguém, é titular exclusivo, mas, ao mesmo tempo, todos os membros daqueles são
seus titulares. [01]

Demonstrou-se, inicialmente, a existência de uma categoria intermediária, na qual se


compreendiam interesses coletivos, ou seja, aqueles referentes a toda uma categoria
de pessoas (como os condôminos de um edifício de apartamentos, os sócios de uma
empresa, os membros de uma equipe esportiva, ou empregados do mesmo patrão).
São interesses metaindividuais, porque atingem grupos de pessoas que têm algo em
comum. Ora, o que as une é estarem na mesma situação de fato (por exemplo, as
pessoas lesadas pela explosão da mesma usina nuclear), ora é a circunstância de
compartilharem a mesma relação jurídica (como os consorciados que sofrem o mesmo
aumento ilegal das prestações). [02]

Mesmo dentro dessa categoria intermediária, contudo, foi possível estabelecer uma
distinção entre os interesses que atingem uma categoria determinada de pessoas (ou,
pelo menos, determinável) e os que atingem um grupo indeterminado de indivíduos
(ou de difícil determinação). [03]

Os condôminos, os sócios, os atletas e os empregados que foram acima


mencionados, são todos determinados ou possíveis de determinar, à vista da certidão
imobiliária, dos estatutos, dos registros cabíveis. O mesmo grupo de pessoas
compartilha interesses, pouco importa se encontrem reunidas pela mesma relação
jurídica (como os sócios e os condôminos invocados no exemplo) ou pela mesma
relação de fato (como os compradores concretamente lesados na compra do mesmo
produto). Convencionou-se a chamar estes interesses de coletivos (quando
indivisíveis, fundados na mesma relação jurídica) ou individuais homogêneos (quando
divisíveis, fundados na origem de fato comum). [04]

Os interesses difusos, por sua vez, se diferenciam dos interesses coletivos e


individuais homogêneos pelo fato de que são interesses que, embora pertençam a
uma categoria de pessoas, não se pode precisar com exatidão quais os indivíduos que
se encontram concretamente por eles unidos. São interesses cujos titulares são
indetermináveis, dispersos na coletividade. São, portanto, indivisíveis, porque não se
pode determinar ou quantificar com exatidão o prejuízo de cada um dos lesados. É o
que ocorre, por exemplo, quando há a veiculação de propaganda enganosa em um
determinado canal de televisão. O dano, inegavelmente, existe, mas não se pode
afirmar com precisão quais os consumidores em potencial que foram efetivamente
lesados.

Segundo o Código de Defesa do Consumidor, são direitos ou interesses difusos


transindividuais, de natureza indivisível, cujos titulares são pessoas indeterminadas e
ligadas por circunstância de fato. Difusos são, pois, interesses indivisíveis, de grupos
menos determinado de pessoas, entre as quais inexiste vínculo jurídico ou fático muito
preciso. São como um feixe de interesses individuais, com pontos em comum. [05]

Alguns interesses difusos, pela sua abrangência, podem ser classificados como
verdadeiro interesse púbico. A pretensão a um meio ambiente equilibrado e hígido,
embora seja de interesse indeterminável e indivisível de pessoas (interesses difusos),
é de interesse de toda a coletividade. Todavia, faz-se mister a necessária cautela, pois
as duas classificações doutrinárias nem sempre se confundem, já que é possível
haver interesses difusos de menos abrangência que o interesse público, com
eventuais conflitos entre os interesses difusos de um determinado grupo e da
coletividade como um todo.

Um exemplo desses interesses difusos pode ser a veiculação na mídia audiovisual,


por determinada empresa, de propaganda enganosa ou que induza o consumidor a
erro. A lesão é evidente, contudo, a determinação de quais seriam os potenciais
lesados é incerta.

Os interesses coletivos são, em sentido lato, os interesses ou direitos


transindividuais indivisíveis (assim como os interesses difusos) que, ao seu passo,
pertençam a um grupo, classe ou categoria de pessoas determinadas, ou ao menos,
determináveis.

Como exemplo, o aumento ilegal de prestações de um consórcio pode ser citado. Ora,
o interesse de se ter reconhecido a ilegalidade de um aumento abusivo das
prestações de um consórcio é partilhado indivisivelmente por todos os consorciados
de forma não quantificável. A ilegalidade do aumento não será maior para o
consorciado que possui inúmeras cotas, tampouco será menor para aquele que
apenas uma possui. A ilegalidade será a mesma para todos, de forma indivisível.
Evidentemente, se os eventuais prejuízos sofridos pelo grupo forem individualizáveis,
e seu ressarcimento seja justamente o escopo da tutela jurisdicional pretendida, estar-
se-ia diante de interesses individuais homogêneos, e não propriamente de interesses
coletivos de um determinado grupo.

Os interesses individuais homogêneos não deixam de ser também interesses


coletivos. Encontram-se reunidos nessa categoria de interesses as pessoas ou grupo
de pessoas determinadas ou determináveis que são titulares de interesses oriundos
de uma mesma relação de fato. Ocorre que os prejuízos compartilhados por essas
determinadas pessoas são divisíveis.

Exemplificativamente, pode-se citar como hipótese de interesses individuais


homogêneos envolvidos a compra por inúmeros consumidores de veículos de uma
mesma marca com o mesmo defeito de série.

1.2 .A LEGITIMAÇÃO PARA AGIR EM TEMA DE INTERESSES DIFUSOS

Seguindo a vetusta dicotomia tradicional entre os interesses individuais e coletivos, a


clássica maneira de defender interesses em juízo dá-se por meio da legitimação
ordinária. Ou seja, o próprio lesado defende os seus interesses que foram afetados.

No ordenamento jurídico pátrio, a chamada legitimação extraordinária, isto é, a


possibilidade de alguém, em nome próprio, defender interesse alheio, é limitada a
hipóteses excepcionais. Não se confunde, no entanto, com representação, que
consiste na defesa, em nome alheio,de interesse alheio.

Nas hipóteses de legitimação extraordinária configura-se verdadeira substituição


processual, que ocorre, por exemplo, quando o gestor de negócios defende interesses
de terceiros; quando o Ministério Público propõe ação reparatória ex delicto em favor
de vítimas pobres; ou quando o curador do ofendido oferece representação contra o
ofensor.

A legitimação extraordinária na defesa em juízo de interesses alheios são hipóteses


excepcionais, taxativamente previstas na legislação. Isso porque, até bem pouco
tempo, em regra a substituição processual destinava-se tão somente à defesa de
interesses individuais, não à tutela de interesses difusos ou coletivos. Ora, acertou o
legislador em restringir a legitimação extraordinária para a defesa em juízo dos
interesses individuais, pois, se assim não fosse, verdadeira balbúrdia se instalaria nas
demandas judiciais, posto a incerteza da legitimidade ad causam.

Com a evolução legislativa, especialmente com o advento da Lei nº. 7.347/85 (Lei da
Ação Civil Pública), passou-se a admitir a defesa dos interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos por meio da legitimação extraordinária. Nessa seara, a
doutrina divide-se. Há a tendência de realçar a legitimação ordinária quando alguém,
ainda que legitimado extraordinariamente, a par de defender em juízo interesses de
terceiros, também defende direito próprio. Mazzilli cita Trocker e Humberto Theodoro
Júnior, que defendem que "o grupo juridicamente organizado, mesmo quando deduz
em juízo um direito cuja titularidade pertence a outrem, está fazendo atuar, na
realidade, um interesse próprio que é o de reintegração da situação garantida". [06]

Segundo esse argumento, a defesa em juízo dos interesses coletivos de uma entidade
de classe, por exemplo, coincide com a defesa de interesse próprio da entidade,
conforme seus fins sociais. Desta forma, ao defender, em extensão, os seus próprios
interesses quando defende os interesses dos seus membros, a associação de classe
teria legitimação ordinária, e não extraordinária.

Hugo Mazzilli, porém, defende posição diversa:

Ainda que reconheçamos a procedência em parte dessa argumentação, mesmo assim


na defesa judicial de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos,
preferimos denominar o fenômeno de legitimação extraordinária ou substituição
processual, para distingui-lo das hipóteses em que o titular da pretensão
age apenas na defesa do interesse de que é titular. Nos casos de ação civil pública, de
ação coletiva ou de ação popular, o autor (o Estado, a associação ou o cidadão) não
está pedindo apenas dentro do campo de seu direito próprio, e sim busca um benefício
coletivo (nem sempre público, mas ao menos transindividual), que ele, por si só, não
estaria legitimado a defender a não ser por expressa autorização legal. Daí tratar-se
de legitimação extraordinária. [07]

De fato, a celeuma doutrinária que cerca a questão da legitimação (ordinária e


extraordinária) para a defesa dos interesses difusos e coletivos tinha grande
relevância antes do advento da Lei nº. 7.347/85. , de 24 de Julho de 1985. Afinal, a
legitimação extraordinária era a exceção, e não a regra. Com o advento da citada lei, o
legislador tratou de ampliar significativamente o rol de legitimados ativos para a defesa
dos interesses transindividuais.

Todos esses fatores somados contribuíram, indubitavelmente, para a maior proteção


de interesses de toda a coletividade, (coletivos, difusos ou individuais homogêneos),
seja pela maior legitimação do Ministério Público para atuação neste particular, seja
pela significativa ampliação do rol de legitimados extraordinariamente conferida pela
Lei nº. 7.347/85 e pela Constituição Federal de 1988.

2.AÇÃO CIVIL PÚBLICA

A ação civil pública é o instrumento adequado para a defesa de interesses que


envolvam o meio ambiente, os consumidores, dentre outros interesses difusos,
coletivos e individuais homogêneos em juízo.

A lei que disciplina a ação civil pública não a restringiu somente à iniciativa do
Ministério Público, tendência correta esta confirmada pelo legislador constituinte, que
impediu que esta instituição detivesse qualquer monopólio na propositura de ações
cíveis, ao contrário do que ocorre com a ação penal pública.

A rigor de terminologia a expressão ação coletiva é mais adequada para as ações


cíveis propostas por quaisquer dos co-legitimados em defesa de interesses difusos,
coletivos e individuais homogêneos, enquanto ação civil pública,ao seu turno, é
somente a ação promovida pelo Ministério Público.

2.1 O MINISTÉRIO PÚBLICO E A AÇÃO CIVIL PÚBLICA

O Ministério Público, antes de direito, possui o dever de agir quando se trata da


propositura de ação cuja titularidade o Parquet detenha. Por corolário, pode-se afirmar,
portanto, a obrigatoriedade e a conseqüente indisponibilidade da ação pelo Ministério
Público. Todavia, se não tem discricionariedade para agir ou deixar de agir quando
identifica a hipótese de atuação, ao contrário, tem liberdade para apreciar se ocorre
hipótese em que sua ação se torna obrigatória.

O artigo 9º da Lei da Ação Civil Pública prescreve que "se o órgão do Ministério
Público, esgotadas todas as diligências, se convencer da inexistência de fundamento
para a propositura da ação civil, promoverá o arquivamento dos autos do inquérito civil
ou das peças informativas, fazendo-o fundamentadamente". [08] Há, portanto, todo um
mecanismo de controle da não-propositura da ação civil pública pelo Ministério
Público, sem quebra alguma do princípio da obrigatoriedade.

Promovido o arquivamento, deverá o órgão ministerial, sob pena de incorrer em falta


grave, remeter os autos ou peças de informação ao Conselho Superior do Ministério
Público. Ademais, o fato de inexistir legitimação exclusiva do Ministério Público para
propor a ação civil pública, por si só, constitui outro mecanismo de controle da não-
propositura da ação civil pública.

No que se refere à indisponibilidade da ação civil pública o §3º do Art. 5º da Lei nº.
7.347/85 aduz, também, que cabe ao Ministério Público "assumir" a titularidade ativa,
em caso de desistência ou abandono da ação por associação legitimada.

2.2 INQUÉRITO CIVIL

Criado pela Lei nº. 7.347/85 [09] e depois consagrado pela Constituição Federal [10], o
inquérito civil é um procedimento investigativo promovido pelo Ministério Público para
colher elementos de convicção do órgão ministerial para a propositura de eventual
ação civil pública ou, fundamentadamente, promover seu arquivamento.

Embora co-legitimados para promover a ação civil pública, as associações civis e


demais entidades elencadas na Lei da Ação Civil Púbica não podem instaurar,
tampouco presidir o inquérito civil.

O inquérito civil não é pressuposto processual obrigatório para que o Ministério Público
compareça a juízo. É instrumento extremamente útil, porém, nem sempre necessário,
pois pode ser dispensado quando o órgão ministerial já disponha de elementos de
convicção suficientes para a propositura da ação principal.

Quanto à publicidade, o inquérito civil deve obedecer aos mesmos princípios


norteadores de todos os atos da administração pública. No mais, o inquérito civil será
instaurado por portaria ou despacho do membro do Ministério Público, aplicando-se na
disciplina da sua tramitação, subsidiariamente, as normas do Código
de Processo penal concernentes ao inquérito policial, sempre com as devidas cautelas
de conformidade com a Lei da Ação Civil Pública. Já no que tange ao seu
arquivamento, o Ministério o promove, não se exigindo manifestação judicial a
propósito.

O inquérito civil deve sempre terminar com a propositura da ação civil pública, ou,
noutra hipótese, com o seu arquivamento pelo Promotor de Justiça; neste último caso,
com a revisão do ato de arquivamento pelo Conselho Superior do Ministério Público.
Mas pode ocorrer que o inquérito civil investigue mais de um evento danoso
(pluralidade de objeto) ou mais de um envolvido (pluralidade de sujeitos)e o órgão
ministerial promova a ação civil pública em relação a apenas um dos objetos ou tão-
somente a um ou alguns dos envolvidos. Neste caso, a restrição quanto aos limites
objetivos e subjetivos da lide, sem fundamentação em relação aos outros possíveis
ilícitos ou seus autores nos leva à conclusão de que houve um "arquivamento
implícito".

O Ministério Público tem sua ação vinculada ao princípio da obrigatoriedade, desse


modo, o arquivamento do inquérito civil deverá ser sempre expresso. Assim sendo,
quando o órgão ministerial verificar a hipótese de proposição da ação em face de
somente alguns dos indiciados, ou se o objeto da ação a ser proposta for menor dos
que a totalidade dos fatos investigados no inquérito civil, deverá o Ministério Público
promover em separado o arquivamento do inquérito ou das peças de informação em
relação às pessoas investigadas que não incluiu no pólo passivo da relação
processual, ou em relação aos fatos que excluiu da causa de pedir ou aos pedidos que
entendeu de não fazer.

No que tange ao controle do arquivamento do inquérito civil, tem-se que esse é


feito, in casu, pelo Conselho Superior do Ministério Público. Sob pena de falta
funcional grave, deverá o membro do Ministério Público que promoveu o arquivamento
do inquérito civil encaminhar suas peças ao Conselho Superior do Ministério Público,
para que este órgão as aprecie. Neste caso, poderá o referido órgão colegiado, na
forma de seu regimento: a) homologar a promoção de arquivamento; b) reformar a
promoção de arquivamento, determinando que seja proposta a ação civil pública
cabível; c) determinar novas diligências. Em caso de reforma da promoção de
arquivamento, novo membro do Ministério Público será designado para o ajuizamento
da ação.

2.3 COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA

O compromisso de ajustamento de conduta foi introduzido na Lei nº. 7.347/85, pelo


Código de Defesa do Consumidor. A rigor, tratando-se de direitos indisponíveis difusos
na coletividade, coletivos ou individuais homogêneos, não se permite a hipótese de
transação de quaisquer de seus co-legitimados. Afinal, a defesa de tais direitos se faz
por meio da legitimação extraordinária. Contudo, o legislador, sensível aos aspectos
práticos que tal instituto traria ao interesse público, bem fez em positivá-lo em nosso
ordenamento jurídico, com benesses indiscutíveis para a melhor solução dos litígios
que versam sobre interesses metaindividuais.

Como se infere claramente na Lei nº. 7.347/85, nem todos os legitimados ativos à
ação civil pública ou coletiva podem tomar compromissos de ajustamento de conduta,
mas tão-somente os órgãos públicos legitimados. Ou seja, para os fins do Art. 5º, § 6º,
da Lei da Ação Civil Pública, estão autorizadas a tomar compromissos de ajustamento
as pessoas jurídicas de direito público interno e seus órgãos, excluídas as demais
entidades da Administração indireta ou que tenham regime jurídico próprio das
empresas privadas.

Em face da transação obtida, questão interessante que se impõe é a sua eficácia


perante terceiros titulares dos interesses em litígio, que não participaram efetivamente
da lide, mas que se viram substituídos processualmente. Em caso de discordância dos
co-legitimados quanto aos termos do compromisso de ajustamento celebrado entre o
órgão público e o autor do dano, ensina Hugo Nigro Mazzilli:

Versando interesses metaindividuais, o compromisso terá o valor de garantia mínima


em prol do grupo, classe ou categoria de pessoas atingidas; não pode ser considerado
como garantia máxima de responsabilidade do causador do dano, sob pena de
admitirmos que lesados, fragmentariamente dispersos na comunidade, fiquem sem
acesso jurisdicional. Entender-se o contrário seria dar ao compromisso extrajudicial
que versa interesses difusos ou coletivos a mesma concepção privatista que tem a
transação no direito civil, campo em que a disponibilidade é a característica principal. A
admitir esse entendimento, graves prejuízos adviriam à defesa social. Não sendo os
órgãos públicos referidos no dispositivo os verdadeiros titulares do interesse material
lesado, o compromisso de ajustamento que tomam passa a ter o valor de
determinação de responsabilidade mínima; não pode constituir limite máximo para a
reparação de uma lesão ao meio ambiente ou a qualquer outro interesse difuso,
coletivo ou individual homogêneo. [11]

O compromisso de ajustamento tomado extrajudicialmente não impede que quaisquer


dos co-legitimados possam ingressar em juízo para discutir seu mérito e defender
eventuais interesses individualmente considerados.

Quanto à necessidade de manifestação do Conselho Superior do Ministério Público


em face de uma transação realizada pelo promotor de justiça e o causador do dano, a
Lei da Ação Civil Pública é omissa, levando-nos a crer, em uma rápida leitura, que sua
homologação seria dispensável. Todavia, tal interpretação não merece prosperar.
Afinal, se até mesmo para não propora ação civil pública, o órgão ministerial é
obrigado a remeter os autos de inquérito civil para que o seu Conselho Superior
homologue o arquivamento, parece-nos natural que semelhantes cautelas sejam
tomadas pelo promotor de justiça quando este propõe um compromisso de
ajustamento.

Ora, se o órgão ministerial não pode, sem homologação do Conselho Superior,


"sequer promover o arquivamento do inquérito civil, com maior razão não poderá, de
forma incontrastável, concordar com a disposição do próprio conteúdo material do
litígio". [12]

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Direito Processual Civil

Autores

Raphael Sergio Rios Chaia Jacob

Possui graduação em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco (2002). Tem
experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal e Processual Penal,
Direito Ambiental, Direito Eletrônico e Linguagem Forense. Pós-Graduado em Direito
Ambiental pela Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do
Pantanal - UNIDERP (2008). Pós-Graduando em Direito Eletrônico. Mestre em
Desenvolvimento Local pela Universidade Católica Dom Bosco (2010).

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www.raphaelchaia.com.br

lattes.cnpq.br/8867797849762208

Gabriela Luciano Borri

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Londrina. Pós graduada em Direito


Público pela UNIDERP. Pós graduada em Direito Civil e Direito Processual Civil pela
UCDB.
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Heitor Romero Marques

Graduado em Ciências e Pedagogia, especialista em Filosofia e Historia, Mestre em


Educação (UCDB) e Doutor em Desarrollo Local y PlanteamientoTerritorial pela
Universidade Complutense de Madrid. Orientador do Trabalho de Conclusão de Curso
de pós-graduação lato sensu da UCDB/CPC Marcato.

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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)

JACOB, Raphael Sergio Rios Chaia; BORRI, Gabriela Luciano et al. A tutela inibitória
nas ações coletivas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n.
2984, 2 set. 2011. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/19921>. Acesso em: 1
abr. 2019.

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