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Ministério de Pequenos Grupos

Vinho Novo, Odres Novos

04
Guia de Estudo

Este Guia de Estudo refere-se ao quarto sermão da série


Vinho Novo, Odres Novos, pregado pelo Pr. Ed René Kivitz
em 11 de abril de 2010 e disponível em áudio para download
no site da Ibab (ibab.com.br). Ele foi elaborado para facilitar
a discussão em Pequenos Grupos.

IGREJA BATISTA DE ÁGUA BRANCA


Igreja: Resposta de Deus para o mundo

Não sei em que mundo você vive.

Talvez o seu mundo seja descrito com palavras como belo, maravilhoso, perfeito. Ou quem
sabe, palavras como caótico, assustador, injusto. Fiz a pergunta para uma jovem, e ela me
respondeu “eu vivo num mundo de cabeça para baixo”.

Em que mundo você vive? Como completaria a frase “eu vivo num mundo...”?

Não sei em que mundo você vive. Mas eu vivo em um mundo marcado pelo sofrimento
humano.

De todas as possibilidades de definição do mundo, o sofrimento humano é o que de maneira


mais contundente me interpela.

Com isso quero dizer que entre a admiração pela sua beleza e imensidão, a gratidão pelas
suas dádivas, o encantamento e o prazer diante de suas possibilidades, minha resposta
mais imediata à pergunta a respeito do mundo é o incômodo causado pelo sofrimento
humano. Quando penso no mundo em que vivo, meu primeiro insight é lembrar de alguém
que sofre.

Na verdade, confesso, posso lembrar e depois esquecer, numa fração de segundos, e, depois
de esquecer, buscar meu próprio prazer ou minha satisfação. Conviver com memórias e
imagens de um mundo que sofre e de pessoas específicas que esperam socorro e consolo
é uma experiência cansativa e pesada. Nossa tendência é negar ou disfarçar o sofrimento
e seguir vivendo, iludidos numa bolha de proteção que nos dá a falsa sensação de que o
sofrimento não baterá à nossa porta. Se é que ainda não bateu e invadiu a casa, o que é mais
provável.

Mundo, Deus e Igreja

A igreja é a resposta de Deus para um mundo marcado pelo sofrimento. Isso quer dizer
duas coisas. A primeira é que a resposta de Deus não é uma explicação teórica. A resposta
de Deus é uma ação. Primeiro, enviando Jesus.

Porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito para que todo o que nele
crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para
condenar o mundo, mas para que este fosse salvo por meio dele.
[João 3.16,17]

Mas depois de Jesus, Deus enviou a igreja. A igreja é agente da missio Dei, isto é, do Deus
que está em missão para o resgate do mundo.

Assim como me enviaste ao mundo, eu os enviei ao mundo.


[João 17.17]

Jesus disse: “Paz seja com vocês! Assim como o Pai me enviou, eu os envio”.
[João 20.21]

Mas dizer que a igreja é a resposta de deus para o mundo não significa apenas que Deus
responde agindo, mas também que a ação de Deus é (prioritariamente) por meio da igreja.

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Guia de Estudo 04 Vinho Novo, Odres Novos

Esta é a razão porque Jesus adverte seus discípulos a respeito da possibilidade da irrelevância
da igreja. É por meio da igreja que Deus atua no mundo que se decompõe e apodrece – a
igreja é sal da terra. É também por meio da igreja que Deus ilumina um mundo em trevas –
a igreja é luz do mundo. [Mateus 5.13-16].

Mais do que isso, a igreja é o testemunho da multiforme graça e sabedoria de Deus para
todo o universo.

A intenção dessa graça era que agora, mediante a igreja, a multiforme sabedoria de Deus
se tornasse conhecida dos poderes e autoridades nas regiões celestiais, de acordo com o
seu eterno plano que ele realizou em Cristo Jesus, nosso Senhor, por intermédio de quem
temos livre acesso a Deus em confiança, pela fé nele.
[Efésios 3.10-12]

A igreja é o sinal histórico do reino de Deus. Isto é, é através da igreja que Deus está presente
no mundo. Mas a igreja pode fracassar em sua vocação. Pode ser um sal que perdeu o sabor
e pode ser uma luz escondida. A advertência de Jesus é estímulo para a reflexão. A pergunta
que devemos fazer é: de que maneira a igreja se torna sinal do reino de Deus?

A presença cristã no mundo contemporâneo

A maneira como a presença cristã está configurada no mundo de hoje, especialmente no


movimento chamado evangélico no Brasil, indica que as pessoas vão à igreja em busca de
solução para seus problemas pessoais.

Já fui muito crítico desse movimento. Mas hoje vejo com outros olhos. Enxergo um
equívoco e uma intuição correta. O equívoco é duplo: a igreja promete o poder de Deus
para soluções de problemas pessoais. A ênfase está no poder de Deus. Isso isenta a igreja
de se comprometer na busca de solução para o sofrimento humano. A igreja se comporta
como se sua única responsabilidade fosse clamara a Deus, e depois Deus é quem fica com
ônus e a responsabilidade de agir para resolver os problemas que lhe são apresentados.
Nesse caso, a resposta para o sofrimento não é mais a igreja, mas o poder de Deus. Isso é
um equívoco, pois Deus já agiu em resposta ao sofrimento quando enviou Jesus e enviou a
igreja de Jesus, corpo do Cristo ressurreto, ungido pelo Espírito Santo para a missão.

O segundo aspecto do equívoco do atual modelo evangélico é o foco nos problemas


pessoais. A igreja não apenas “lava suas mãos”com a postura do “Deus resolve”, como
também incentiva uma espiritualidade egocêntrica e individualista: “Deus resolve a MINHA
vida, Deus resolve os MEUS problemas”.

Mas nessa busca da igreja para a solução de problemas pessoais enxergo também uma
intuição que considero correta, a saber, que a igreja é mesmo o lugar aonde as pessoas
devem ir em busca de ajuda. A explicação é simples: a igreja é o lugar que reúne pessoas
que se comprometeram a dedicar a vida a resolver os problemas dos outros.

A igreja é necessariamente uma comunidade de doadores. A igreja é a comunidade cujo


requisito essencial para ingresso é a conversão ao Evangelho de Jesus Cristo, ou, se preferir,
à própria pessoa de Jesus Cristo. Isso significa que a condição imprescindível para que
alguém faça parte da igreja é a experiência de negar a si mesmo. Isso significa que a igreja
é essencialmente a comunidade daquele tipo de gente que não vive mais para si mesma.

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Guia de Estudo 04 Vinho Novo, Odres Novos

Pois o amor de Cristo nos constrange, porque estamos convencidos de que um morreu por
todos; logo, todos morreram. E ele morreu por todos para que aqueles que vivem já não
vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou.
[2Coríntios 5.14,15]

Então Jesus disse aos seus discípulos: “Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si
mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá, mas
quem perder a sua vida por minha causa, a encontrará. Pois, que adiantará ao homem
ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou, o que o homem poderá dar em troca de
sua alma?
[Mateus 16.24-26]

Dois modelos de espiritualidade

Lucas, o evangelista, fez questão de registrar em seus escritos o contraste entre


as pessoas que vivem para si mesmas e as que vivem para Deus e, se vivem para Deus,
vivem para o mundo, isto é, vivem como resposta de Deus para um mundo marcado pelo
sofrimento. Em seu artigo entitulado O QUE HAVIA SIDO USURPADO (www.baciadasalmas.
com/2010/o-que-havia-sido-usurpado), Paulo Brabo discorre com extraordinária exatidão
esse contraste.

Na parábola do rico insensato [Lucas 12.13-21] Jesus desmascara a índole natural de


todo ser humano: o egoísmo. O rico da Parábola é uma denúncia dos pecados próprios do
egoísmo.

A ganância, que é idolatria, não é o desejo de acumular riquezas e não é o anseio pela
aparente liberdade que as riquezas podem comprar. O verdadeiro motor da ganância
é um fetiche mais profundo, mais oculto e mais raramente expresso em palavras, pois
trata-se do desejo pelo direito de não depender de ninguém, o vertiginoso direito de poder
viver sem qualquer consideração pela vontade e pelas necessidades dos outros.

Em última instância, a ganância é o anseio pelo distanciamento completo dos embaraços


do mundo, e seu impulso subjacente é uma completa negação do mundo. A seu modo,
portanto, a obsessão pela acumulação de bens é uma espécie de ascetismo, uma forma
de negar e afastar-se das complicações da vida.

Nosso sonho mais rigoroso é acumular bens e riqueza até que o mundo exterior não tenha
absolutamente qualquer modo de nos atingir, até que estejamos perfeitamente a salvo e
perfeitamente distintos do mundo.
[Paulo Brabo]

Na postura desse homem rico e egoísta enxergamos pelo menos quatro pecados:

1. Auto-suficiência: desejo pelo direito de não depender de ninguém;


2. Egocentrismo: desejo pelo direito de poder viver sem qualquer consideração pela vontade
e pelas necessidades dos outros;
3. Prepotência: anseio pelo distanciamento completo dos embaraços do mundo – acredita
estar numa bolha de proteção dentro da qual o sofrimento não existe, como se suas riqueza
fosse uma blindagem contra o sofrimento;

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Guia de Estudo 04 Vinho Novo, Odres Novos

4. Hedonismo: uma completa negação do mundo, uma forma de negar e afastar-se das
complicações da vida, uma entrega absoluta de si mesmo ao prazer: descansa, coma, beba
e divirta-se.

A ironia é que o jeito de viver desse homem o conduz à morte.

Na história, o protagonista deve morrer na mesma noite em que planeja sua independência
– porque, no fim das contas, já escolheu a morte. Estando plenamente suficiente, separado
das contingências da vida e das necessidades dos outros, já está morto. A completa
separação do mundo e das pessoas, embora seja o alvo ideal de toda a ganância, é uma
espécie muito literal de morte.
[Paulo Brabo]

Mas o livro de Atos descrê a comunidade dos discípulos fazendo o caminho inverso
do homem rico da parábola de Jesus.

Da multidão dos que creram, uma era a mente e um o coração. Ninguém considerava
unicamente sua coisa alguma que possuísse, mas compartilhavam tudo o que tinham.
Com grande poder os apóstolos continuavam a testemunhar da ressurreição do Senhor
Jesus, e grandiosa graça estava sobre todos eles. Não havia pessoas necessitadas entre
eles, pois os que possuíam terras ou casas as vendiam, traziam o dinheiro da venda e o
colocavam aos pés dos apóstolos, que o distribuíam segundo a necessidade de cada um.
[Atos 4.32-37]

Aqui está o registro de como vivem as pessoas que deixaram de viver para si mesmas
e encarnaram, não apenas em sua vida pessoal, mas também, e principalmente, comunitária,
o fato de serem resposta de Deus para um mundo marcado pelo sofrimento.

Quando escolhem neste ponto despojar-se de seus bens em favor de todos os outros, os
integrantes da comunidade do espírito estão fazendo precisamente o trajeto contrário,
isto é, abraçam sem intermediários, a vida e a morte, o mundo e as pessoas. O homem rico
da parábola decide construir para si celeiros que deveriam funcionar como barreira efetiva
contra a entrada do mundo; inversamente, ao despojar-se dos seus bens os romeiros de
Pentecostes estão baixando suas defesas, demolindo as muralhas que os protegiam.

Os novos discípulos dão testemunho de que acreditam que a vida partilhada vale todos os
riscos (de que a riqueza não salva) e se mostrará capaz de suprir todas as carências (que a
riqueza não satisfaz).
[Paulo Brabo]

O que está acontecendo aqui é uma experiência de libertação. Diante da


vulnerabilidade que é viver em mundo marcado pelo sofrimento, onde ninguém está
blindado contra a tragédia, as contingências e infortúnios da vida, a segurança possível não
está na posse de riquezas e na vida egoísta, individualista e centrada em si mesmo. Tolice é
confiar nas posses materiais e acreditar que muito dinheiro e estabilidade material podem
suprir as faltas do dia da dor.

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Guia de Estudo 04 Vinho Novo, Odres Novos

Ordene aos que são ricos no presente mundo que não sejam arrogantes, nem ponham
sua esperança na incerteza da riqueza, mas em Deus, que de tudo nos provê ricamente,
para a nossa satisfação. Ordene-lhes que pratiquem o bem, sejam ricos em boas obras,
generosos e prontos a repartir. Dessa forma, eles acumularão um tesouro para si mesmos,
um firme fundamento para a era que há de vir, e assim alcançarão a verdadeira vida.
[1Timóteo 6.17-19]

A segurança de que precisamos para viver em mundo marcado pelo sofrimento


está em Deus. Mas também está na comunidade dos seguidores de Jesus, aquele universo
de pessoas que vivem, não mais para si mesmas, mas para a comunhão, em que todos
se ajudam mutuamente a superar o mal e atravessar o dia do sofrimento com dignidade.
Na igreja, a comunidade dos seguidores de Jesus, encontramos socorro e consolo, pois
a igreja, a comunidade da solidariedade e da compaixão, é a resposta de Deus para um
mundo marcado pelo sofrimento.

© 2010 Ed René Kivitz

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