MEMÓRIA MÚSICA TELEVISÃO

O Museu da Imagem e do Som (MIS) O grupo Fundo de Quintal lança novo disco, Pela Pode pintar um amor homossexual em Prova
apresenta hoje a coleção de álbuns com Hora, o 23º da carreira, que traz 14 composições de Amor, novela da Record. Amizade entre as
fotos históricas de Goiás pertencentes ao inéditas. Partido-alto, samba-canção e miudinho personagens Janice (Fernanda Nobre) e Raquel
seu acervo que foram restauradas. [2 são alguns do ritmos presentes no trabalho. [7 (Maria Ribeiro) pode virar romance. [8

Magazine Goiânia,
3 de maio de 2006

QUARTA-FEIRA

fVocê atualmente está envolvida

e m um t ra ba lh o qu e re sga ta a memó -
r ia d as mu lh e re s n a h is t ó ri a d o p e n sa -
> ENTREVISTA Ana Míriam Wuensch fundamental, intelectual ou prática, entre
os gêneros masculino e feminino. E pela
história da filosofia afora podemos obser-
m e n t o . Qu a l f o i a co n t r i b u i ç ã o f e m in i - var nas entrelinhas dos textos o quanto
na nesse campo? alguns filósofos insistiram em distinguir e

SÁBIAS
Surpreendo-me que tenha sido tão mesmo diminuir ou excluir as mulheres
vasta e diversificada. Não apenas na filo- das “coisa importantes” e mais “eleva-
sofia, mas nas artes, nas ciências, na teo- das” da civilização, construindo mitos co-
logia e nos movimentos políticos e religio- mo o do “eterno feminino” e gerando ar-
sos. E não é recente, como imaginamos a gumentos francamente misóginos e legi-
partir das informações (ou falta de infor- timadores da superioridade dos homens
mações) que temos, nem são exceções. O sobre as mulheres e o direito (deles) de

que ocorre é que alguns contextos e al-
guns períodos da história antiga, medie-
val, moderna e contemporânea foram
mais favoráveis que outros, como se pode
perceber quando empreendemos uma
busca neste sentido. Vamos encontrar
muitas referências e material em outras
fontes que não os manuais ou histórias da
ciência ou filosofia canônicos. É preciso
MULHERES
submetê-las aos seus caprichos, enquan-
to outros filósofos se ocupavam em pen-
sar e propor formas de convivência mais
colaborativas e solidárias e a melhoria de
condições básicas para todos.
Acervo pessoal Que autoras você considera que es-
ROSÂNGELA CHAVES É justamente com o intuito de creveram obras decisivas para a história
divulgar, no Brasil, a contribuição da filosofia?
filósofo alemão Arthur feminina à história do pensamento que

procurar em outras fontes. Daí que uma
primeira aproximação deste assunto nos
leva à história do pensamento e da cultu-
ra, de uma maneira mais ampla, para de-
pois localizarmos as filósofas, de um mo-
do mais específico. Isto é necessário por-
que a noção de filosofia, as formas e lo-
cais de prática filosófica mudam ao longo
da história. O que faziam as sábias da An-
tigüidade, do que tratavam, onde e como
exerciam a sua sabedoria é um pouco di-
ferente do que fazem professoras de filo-
sofia ou filósofas profissionais de hoje, não
só pelo método e campo de investigação,
mas pelo próprio sentido de “profissão”,
de trabalho intelectual remunerado que
temos hoje. Na Antigüidade, a filosofia
era antes de tudo um modo de vida, dedi-
cado à busca da sabedoria e do conheci-
mento em geral, ao lado de outras formas
de vida reconhecidas, como a estética, a
política e a guerra. A filosofia não era um
tipo de conhecimento especializado. Mas
as evidências apontam para o fato de que
as mulheres participaram da produção
cultural em todas as áreas, em todos os
tempos, de muitas formas, ao logo da his-
tória do Ocidente - mesmo em contextos
não favoráveis.
Na Grécia Antiga, o berço da filosofia,
várias mulheres se destacaram como
pensadoras, embora a sua obra permane-
ça até hoje desconhecida do grande pú-
O
Schopenhauer disse certa vez
que as mulheres são seres de
“cabelos longos e idéias curtas”. Para
Aristóteles, o sexo feminino era “por
natureza” inferior ao masculino. Ao
longo da história da filosofia, não foram
poucas as vezes que o preconceito se
travestiu de “verdade científica” para
justificar a discriminação contra a
mulher. O que não impediu que muitas mulheres,
desde a Grécia Antiga, tenham se dedicado à filosofia,
produzindo obras de indiscutível valor, mas que,
infelizmente, são ainda pouco conhecidas do público.
blico. Que impacto o resgate da obra des-
sas mulheres teria para a história da filo-
sofia e como ele poderia influenciar na
própria interpretação que se faz da obra
dos filósofos?
Para existir, cultural e intelectualmen-
te falando, é preciso ser lembrado, pensa-
do, comentado, lido, conhecido e cons-
tantemente ressignificado. Este é o esfor-
ço de memória de uma geração para ou-
tra. Sócrates ou Pitágoras, que nada es-
creveram, existem para nós porque são
lembrados através daqueles que os regis-
traram e estes são lidos e comentados
até hoje. Isto não acontece com a grande
maioria das mulheres que existiram e cul-
tivaram a sabedoria. Isto faz as filósofas
foi idealizado o projeto Pró-Memória
das Filósofas, coordenado pela
professora Ana Míriam Wuensch, do
Departamento de Filosofia da UnB.
Co-autora do livro Pensando Melhor -
Iniciação ao Filosofar e co-
coordenadora da coleção Filosofia e
Crianças e Filosofia na Escola, da
Editora Vozes, Ana Míriam atualmente
cursa doutorado em filosofia na PUC-Rio e tem
realizado diversos cursos e palestras sobre mulheres
filósofas. Confira a seguir a entrevista que a
professora concedeu ao POPULAR por e-mail:
“inexistirem”, se tornarem esquecidas, in- tes do que o tipo de sujeito que se dispõe
visíveis, não lidas ou pensadas. Parece a filosofar. Agora, imagine ler Platão ou
que a história da filosofia conserva em si Aristóteles à luz destas considerações.
a disputa entre tradições, modos de en- Para Aristóteles, a “natureza” da mulher é
tender a humanidade e as condições pa- incompatível com o espaço público, com
ra ser filósofo ou fazer filosofia. Quem são o logos, com a palavra e, portanto, com a
os filósofos? Quem pode fazer filosofia? política e com a filosofia. Já para Platão,
Quais são as condições? Gênero, origem o que vale é a “natureza” da alma, e não
(etnia e classe social), idade, escolarida- do corpo. Para ele, os indivíduos se dis-
de, certas disposições intelectuais e pas- tinguem pelo tipo de alma e de educação
sionais específicas parecem ser alguns que têm, não pelo gênero e sexo. Pode-
pré-requisitos subliminares de uma certa mos criticar o dualismo psicofísico de
tradição, que vou chamar de excludente. Platão e toda a sua teoria política, mas
Em outra tradição, que vou chamar de in- parece razoável considerar que as dife-
clusiva, parece que a própria disposição renças podem ser estabelecidas em ou-
individual e as condições sociais ofereci- tras bases, e sejam mais relevantes intra-
das para esta prática são mais importan- gêneros do que insistir em uma diferença
Para que tipo de história da filosofia?
Pois estou descobrindo que a história da
filosofia são muitas histórias, algumas
contadas, outras não... O curioso é que
naquelas histórias que conhecemos, to-
das as mulheres são excluídas, enquanto
alguns filósofos são mais ou menos valo-
rizados. Então, por um lado, poderia ser
feita uma história geral das filósofas, uma
antologia das pensadoras de todos os
tempos, e por outro lado, poderíamos re-
ver cada história específica ou área da fi-
losofia (filosofia da ciência, da religião, da
arte, da existência, política, linguagem, ló-
gica, etc.) e incluir nelas as pensadoras,
em diálogo com aqueles pensadores já
estabelecidos. Mas o importante é que
suas vidas e obras sejam conhecidas, dis-
cutidas, pensadas, a fim de inspirar outras
reflexões - pois para que serve o conheci-
mento da história da filosofia senão para
inspirar-nos a pensar, nós mesmos, ani-
mados pelos exemplos dos demais? Nes-
te sentido, vou destacar aquelas obras
que foram decisivas para mim e têm con-
tribuído para que eu repense a filosofia: A
Condição Humana, de Hannah Arendt; O
Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir; e
mais recentemente Filosofia e Poesia,
Confesión: Género Literário, de Maria
Zambrano, e La Ciudad de las Damas, de
Cristina de Pizán.
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