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1
Veremos, posteriormente, porque Ricoeur escolheu essa tradução e veremos porque nós
escolheremos utilizar “enredo”, no lugar de “intriga”.
2
Meu esclarecimento da palavra “réparer”: 1. renovar = remete a um estado; reparar algo; consertar
algo. 2. Preencher, corrigir.
3
Meu esclarecimento da palavra primado: “condição do que está em primeiro lugar; prioridade.
Excelência, superioridade.”
4
Meu esclarecimento da palavra acrônico: “Cujas características não dependem da ação do tempo; que
não está sujeito à ação do tempo; atemporal.”
62] a mímesis de Aristóteles tem um único espaço de desdobramento: o fazer humano, as
artes de composição.” (p. 61-62)
-“A questão que não nos abandonará até o fim deste livro é saber se o paradigma de
ordem, característico da tragédia, é suscetível de extensão e de transformação, a ponto de
poder ser aplicado ao conjunto do campo narrativo.” (p. 68)
3. A discordância incluída
-“E, se traduzirmos mimèsis por representação, não deveremos entender por essa palavra
uma duplicação de presença, como ainda se poderia esperar da mimèsis platônica, e sim
o corte que abre o espaço de ficção. O artíficie de palavras não produz coisas, produz
apenas quase coisas, ele inventa o como-se.” (p. 82)
-“No entanto, a equação entre mímesis e muthos não esgota o sentido da expressão
mímesis práxeos. [...]. Mas o fato de o termo práxis pertencer tanto ao domínio real,
desenvolvido pela ética, como ao domínio imaginário, desenvolvido pela poética, sugere
que a mímesis não tem somente uma função de corte, mas também de ligação, que
estabelece precisamente o estatuto de transposição ‘metafórica’ do campo prático pelo
muthos. Se assim for, é preciso preservar na própria significação do termo mímesis uma
referência ao antes da composição grega. Chamo essa referência mímesis I, para distingui-
la de mímesis II – a mímesis-criação – continua sendo a função central. Espero mostrar
no próprio texto de Aristóteles os indicadores dispersos dessa referência ao antes da
composição poética. Isso não é tudo: a mímesis que é, como ele nos lembra, uma
atividade, a atividade mimética, não encontra o termo visado por seu dinamismo apenas
no texto poético, mas também no espectador ou no leitor. Há, assim, um depois da
composição poética, que chamo de mímesis III, cujas marcas também buscarei encontrar
no texto da Poética. Ao enquadrar assim o salto do imaginário pelas duas operações que
constituem o antes e o depois da mímesis-invenção, não penso enfraquecer, mas sim
enriquecer, o próprio sentido da atividade mimética investida no muthos. Espero mostrar
que ela tira sua inteligibilidade [p. 83] de sua função de mediação, que é a de conduzir do
antes do texto ao depois do texto por seu poder de refiguração.” (p. 82-83)
-“Em suma, para que se possa falar de ‘deslocamento mimético’, de ‘transposição’ quase
metafórica da ética para a poética, é preciso conceber a atividade mimética como ligação
e não apenas como corte. Ela é o próprio movimento de mímesis I para mímesis II.” (p.
84)
-“Reconheço que as alusões que a Poética faz ao prazer proporcionado por compreender
e ao prazer proporcionado por experimentar temor e piedade – que, na Poética, formam
um único gozo – constituem apenas o bosquejo de uma teoria de mímesis III. Esta só
ganha toda a sua envergadura quando a obra expõe um mundo de que o leitor se apropria.
Esse mundo é um mundo cultural. O principal eixo de uma teoria da referência depois da
obra passa portanto pela relação entre poesia e cultura. [...] [p. 92] A Poética de
Aristóteles não faz nenhuma incursão nesse terreno. Mas define o espectador ideal e,
melhor ainda, o leitor ideal: sua inteligência, suas emoções ‘depuradas’, seu prazer, na
junção da obra e da cultura que aquela cria.” (p. 91-92)
-“