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CEM ANOS DE HISTÓRIA SOBRE A EVOLUÇÃO DAS ESQUADRIAS

NAS EDIFICAÇÕES DE CUIABÁ

Marta Cristina de J. A. Nogueira e Maria Carolina de Souza Barreto

RESUMO: Esta pesquisa visou obter informações sobre o desenvolvimento de um dos


principais elementos arquitetônicos: as esquadrias, tendo as edificações de Cuiabá, capital de
Mato Grosso como contexto principal. Foram feitos levantamentos bibliográficos sobre o
assunto e também visitas em edificações de áreas antigas e novas da cidade. No primeiro ano
de pesquisa foram analisados cinco bairros, no segundo ano foram incluídas mais cinco áreas,
que são de suma importância para caracterizar o desenvolvimento arquitetônico e urbanístico
da cidade de Cuiabá como um todo, logo, nos serve de referência para o nosso estudo da
evolução das esquadrias. Informações como tipos de materiais empregados (ex.: madeira), as
dimensões das esquadrias, seu estilo, seus mecanismos de abertura, foram essenciais para que
pudesse ser feito um estudo do desempenho térmico de cada esquadria. Após reunirmos todos
esses dados pôde-se indicar um modelo de esquadrias que certamente se adapta as
características climáticas da nossa região: a janela sanfonada. Este modelo é prático, ocupa
menos espaço interno ou externo e uma de suas principais características são as venezianas,
utilizadas no Brasil desde 1835. Elas permitem a passagem constante de ar mesmo quando a
esquadria está fechada. Este trabalho poderá ser utilizado também como fonte de pesquisa
para quem quiser obter informações e dados históricos sobre a evolução arquitetônica das
esquadrias de Cuiabá - MT.
Palavras – chave: Madeira, Conforto térmico, Habitação

ONE HUNDRED YEARS OF HISTORY ABOUT THE EVOLUTION OF WINDOWS


AND DOORS IN TO CONSTRUCTIONS OF CUIABÁ

ABSTRACT: This research aimed to get information about the development of one of the
main elements architectural: the windows and doors, having the constructions of Cuiabá,
capital of Mato Grosso as main context. Bibliographical surveys on the subject had been made
and also visit in constructions of old and new areas of the city. In the first year of research
five quarters was analyzed, in the second year five more areas had been included that are of
utmost importance to characterize the development architectural and urban of the city of
Cuiabá as a whole. So it bring to us some reference for our study of the evolution of the
windows and doors. Information as types of employed materials (former: wood), the
dimensions of the windows and doors its style, its mechanisms of aperture, had been essential
so that a study of the thermal performance of each windows and doors could be made. After
to congregate all these data could be indicated a model of windows and doors that certainly if
adapts the climatic features of our region: the pleated window. This model is practical,
occupies little internal space or external and one of its main features is the shutter, used in
Brazil since 1835. They allow the constant air pass exactly when the windows and doors are
closed. This work could also be used as source of research who want to get historical
information and data on the evolution architectural of the windows and doors of Cuiabá - MT
Keywords: Wood, thermal Comfort and Habitation
1 - INTRODUÇÃO

Cuiabá foi descoberta no ano de 1719, pelas bandeiras indígenas e auríferas.

As casas construídas na região do Porto, como consta no Jornal Folha do Estado


de 8 de abril de 1997, eram próximas umas das outras, dentro do padrão de arquitetura
bandeirista paulista. Eram casas implantadas sobre o alinhamento das ruas e dos limites
laterais do terreno, por isso não possuíam recuo lateral, eram umas coladas nas outras.
Possuíam telhados de 2 (duas) águas com caídas para a rua e para o quintal. As esquadrias
eram de madeira maciça, do tipo veneziana ou com gelosias, um dos elementos mais
característicos da arquitetura colonial brasileira.

Mas a cidade começou a crescer. Segundo o arquiteto FREIRE (1997), Cuiabá


teve 3 (três) ciclos de produção de espaço em sua história; ciclo da Mineração (1719 à 1820);
ciclo da Sedimentação Administrativa (1820 à 1968) e o ciclo da Modernização (1968 à
atualidade).É seguindo um esquema semelhante, que este trabalho pretende mostrar a
evolução das esquadrias das casas cuiabanas. Identificando seus estilos, suas principais
características, sua funcionalidade, sua estética e o material usado na sua fabricação. Dividiu -
se os períodos em Antigo (1897 à 1930), Período Intermediário (1931 à 1964) e Período
Antigo ( 1965 à atualidade).

2 - MATERIAIS E MÉTODOS

Neste ítem são feitas referências ao material utilizado no decorrer da pesquisa


sobre a evolução das esquadrias nas edificações de Cuiabá nestes últimos cem anos. Foram
dois anos de pesquisa. No primeiro ano, foi feito o levantamento dos dados em cinco bairros
selecionados e, no segundo foram, analisadas outras cinco área.

2.1 - Materiais

É indiscutível o fato de que na região a matéria prima mais abundante e de menor


custo, era a madeira. Desde o surgimento das primeiras casas de Cuiabá, este era o único
material utilizado na fabricação das esquadrias. As toras eram transportadas através do
principal rio que corta a cidade; o rio Cuiabá.

Porém, abundância de material não significava qualidade de produção. As


técnicas usadas na fabricação das esquadrias eram rudimentares e artesanais. Somente com o
passar dos anos, a madeira pôde ser melhor trabalhada nas esquadrias. Hoje são encontrados
os mais diversos modelos, e a madeira utilizada na fabricação, recebe todo um tratamento
especial; desde a extração da matéria prima, passando pelo corte, armazenamento, secagem,
até chegar ao tratamento contra ataque de insetos e microorganismos, fazendo com que a
madeira ganhe maior resistência à esses ataques.

É verdade que hoje em dia, a madeira perdeu parte do seu espaço na área de
esquadrias. Mas através do levantamento realizado, pôde-se observar que a madeira foi
empregada em todos os três períodos já citados anteriormente. Porém as esquadrias variavam
com as décadas em seu estilo. Hoje, surgiram novos materiais e com eles, toda uma
tecnologia em vedação, conforto térmico, acústico e segurança. Materiais como o ferro, aço,
alumínio e PVC, que ocupam cada vez mais espaço nos projetos de arquitetura.
2.2 - Métodos

Para um melhor desenvolvimento da análise, o trabalho foi dividido por bairros ou


regiões da cidade de Cuiabá. E dentro de cada uma dessa áreas são analisadas esquadrias de
três períodos; que chamamos de Antigo (1897 à 1930), Intermediário (1931 à 1964) e Novo (
1965 à atualidade).

O levantamento de dados foi realizado "in loco", seguido da identificação através de


registro fotográfico e catalogação das edificações dos últimos cem anos, nas regiões
selecionadas

Para realização da pesquisa, foi exigido também, um levantamento bibliográfico e de


dados históricos que pudessem auxiliar nas análises. Foram feitas também entrevistas com
técnicos e profissionais da área.

Na visita "in loco", os dados levantados sobre as esquadrias eram feitos através de um
questionário, como pode ser observado à seguir:

Questionário

1 – Qual o tipo de material usado na construção das esquadrias?

2 – É original?

3 – Caso seja madeira, que tipo de madeira?

4 – As peças são maciças, ou possuem algum detalhe como vidro, persiana e grade?

5- De que tipo é a esquadria? Modelo; guilhotina, duas folhas ?

6 – Como foi fabricada a esquadria? Na montagem das peças usou – se cola, pregos,
parafusos? Foi feita artesanalmente ou industrialmente?

7 – Como funciona o sistema de fechaduras e trancas das esquadrias?

8 – As esquadrias originais eram pintadas? E hoje?

9 – Receberam algum tratamento especial de proteção como: verniz?

10 – Qual a dimensão das peças? Incluindo madeiramento

11 - Qual a altura do peitoril?

3 - APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Segundo o Manual Técnico de Caixilhos/Janelas (1991) (ABCI – Associação


Brasileira da Construção Industrializada), as madeiras indicadas para o uso em esquadrias são
as seguintes:
Sem tratamento preservativo; Angico Preto, Cabriúva vermelha, Combaru, Coração de
negro, Guarantã, Ipê-roxo, Jatobá ou Jataí, Piquiarana, Sapucaia vermelha, Vinhático,
Cabriúva parda, Caviúna, Copaíba, Faveiro, Ipê - pardo, Mogno brasileiro, Piquiá,
Sacambu, Sapucaia amarela.

Com tratamento preservativo; Canafístula, Freijó, Pelada, Pindabuna, Caovi, Oiticica


amarela, Peroba rosa

Obs.: Embora não esteja na relação do IPT, o mercado tem demonstrado a adequação da
Imbuia na sua utilização em esquadrias. Fonte: IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas de
São Paulo.

Mas com uma pesquisa feita na marcenarias e carpintarias da cidade de Cuiabá,


pôde -se observar que há dois tipos de madeira muito procuradas na fabricação das
esquadrias; a cerejeira e o mogno.

Uma das dificuldades do projeto de pesquisa, é a identificação do tipo de madeira


utilizada nas antigas construções já que seus moradores, não podem dar esta informação. O
mesmo acontece nos lugares onde houve a restauração. Pois, todo o estilo e desenho das
esquadrias foram preservados, mas com um novo tipo de madeira. A mais utilizada tem sido o
mogno.

3.1 - Tipos de Esquadrias Analisadas

A mais famosa das esquadrias e uma das mais antigas, era a janela composta por
rótulas e gelosias (Ver Figura 1). De origem oriental, este tipo de esquadria foi trazida pelos
colonos portugueses. As rótulas, eram nada mais que treliças de madeira, por onde passava o
ar, mas pouca luz. Estas esquadrias que têm como referência as tradições mouriscas, foram
sinônimo de muitas críticas, levando até a publicação em 11/06/1809, de um edital do
Intendente Geral de Polícia, Paulo Fernandes Viana, que determinava a retirada das rótulas e
impondo que todas as gelosias fossem abertas para o interior, e não para a rua. Alegando que
eram um estorvo aos que passavam e que algumas vezes involuntariamente danificavam as
carroças. A intensão era de que fossem retiradas todas as gelosias, estas fossem substituídas
por vidros.

Porém esta lei demorou a chegar até Cuiabá, que na época se encontrava isolada
no meio do sertão. E as rótulas resistiram por muito tempo. Até mesmo pelo fato de não se
encontrar facilmente o material que as substituía; o vidro, cujo transporte era difícil na época.
Mas entre as antigas casas que resistiram em Cuiabá, poucas possuem esse tipo de janela, que
era usado somente nas residências mais ricas da época; rótulas na metade inferior e caixilharia
de vidro na parte superior.
Figura 1 – Janela de rótula com gelosia

Porém as janelas que mais caracterizam o período colonial são janelas bem mais
simples, de uma ou de duas folhas (Ver Figuras 2 e 3), e usadas pela maioria da população.
Eram todas de madeira maciça (folhas cegas), altas e largas. Algumas portas, por exemplo,
chegavam à 2.90 m de altura. Pode - se perceber através das figuras que as esquadrias eram
rústicas, isto é, não possuíam um bom acabamento, pois muitas eram lavradas no machado.

Figura 2 – Janela de uma folha Figura 3 – Janela de duas folhas


Figura 4 – Janela de duas folhas com gelosia

Na Figura 4, pode-se observar que os dois elementos, gelosia e folha cega, são
utilizadas na mesma janela. A folha cega impede totalmente a entrada de ar e luz quando
fechada.

Figura 5 – Porta de folha dupla de madeira

Outro tipo de esquadria muito usada no início do século era do tipo guilhotina. Este
tipo de esquadria, proporciona ventilação em 50% da sua área total, são fáceis de manobrar e
não ocupam áreas internas ou externas. Mas a maioria das janelas desse tipo, também
possuíam duas folhas de madeira inteiriça como segunda face e quando fechadas impediam
totalmente a passagem de luz ( Ver Figura 6)
Figura 6 – Janela Guilhotina

A partir da década de 40, o uso dessas folhas cegas se intensificaram ainda mais.
Porém um outro elemento utilizado nas esquadrias de Cuiabá desde o início do século XX,
também se tornou característico: as venezianas. Eram utilizadas tanto nas janelas quanto nas
portas internas. As esquadrias do tipo abrir, de duas folhas possuíam veneziana na parte
inferior e caixilharia fixa de vidro na parte superior. Podiam ser ou não acompanhadas de
folhas cegas (Ver Figura 7 e 8). Na década de 40, começaram a surgir venezianas, nas janelas
do tipo camarão, também acompanhadas das folhas cegas. À partir da década de 70, com o
auge do ferro em Cuiabá, as venezianas se tornaram ainda mais populares com as janelas do
tipo correr (Ver figura 9).

Figura 7 – Janela de duas folhas Figura 8 – Janela de duas folhas com


com veneziana venezianas e folha cega acoplada
Figura 9 – Janela de correr com veneziana

4. – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este projeto de pesquisa, teve como objetivo reunir informações sobre vários tipos de
esquadrias usadas em Cuiabá, durante os períodos estudados e nas áreas escolhidas para
análises.

Observou--se uma significante evolução das esquadrias na área tecnológica, no uso


dos materiais de fabricação e no desempenho térmico.

É preciso ressaltar que este trabalho refere-se à descrição dos vários tipos de
esquadrias encontradas (tipologia), analisando seu desempenho térmico, em relação às suas
dimensões, os materiais empregados, sistemas de abertura, vãos livres, entre outros elementos
que fazem parte das esquadrias como vidraças e venezianas. Isto significa que a pesquisa foi
desenvolvida através de um estudo pós - ocupação e não através de simulações.

Após reunirmos todos os dados pudemos indicar um modelo de esquadria que


certamente se adapta as características climáticas da nossa região: a janela sanfonada ( Ver
Figura 10). Este modelo é prático, ocupa menos espaço interno ou externo e uma de suas
principais características são as venezianas, utilizadas no Brasil desde 1835. Elas permitem a
passagem constante de ar mesmo quando a esquadria esta fechada.

Este trabalho poderá ser utilizado também como fonte de pesquisa para quem quiser
obter informações e dados históricos sobre a evolução arquitetônica das esquadrias de Cuiabá
- MT. Desta forma, resgata-se também antigas tradições já esquecidas, como as características
das antigas casa cuiabanas e a cultura do seu povo. Mostrando a possibilidade de se unir e
adaptar o "velho" ao "novo".
Figura 10 – Janela Sanfonada

5. AGRADECIMENTOS

Agradecemos às Instituições FAPEMAT, CNPq e a Pró-Reitoria de Pesquisa e Ensino de Pós-


Graduação da UFMT pelo apoio financeiro.

6. - BIBLIOGRAFIA

CAMELLO, J. A. C. (1727) Notícias Práticas das Minas de Cuyabá.

CORREA, V. F. (1969) História de Mato Grosso. Ministério da Educação e Cultura. Rio de


Janeiro 1969.

FONSECA, J. S. Viagem ao redor do Brasil. Artigo do Jornal Folha do Estado. Cuiabá, MT,
1997.

FREIRE, J. L. (1997) Por uma Poética Popular da Arquitetura. Cuiabá 1997, Ed. UFMT

___________. (1991) Manual técnico de caixilhos, janelas; aço, alumínio, vidros, PVC,
madeira, acessórios, juntas e materiais de vedação. ABCI – Associação Brasileira da
Construção Industrializada. São Paulo 1992, Ed. Pini.

JUCÁ, P. R. (1997) Especial 278 anos. Folha do Estado. Cuiabá 1997

NEUFERT, E. (1900) Arte de Projetar em Arquitetura: princípios, normas e prescrições sobre


construção, instalações, distribuição e programa de necessidades, dimensões de
edifícios, locais e utensílios. Tradução da 21. 5° ed. São Paulo, Gustavo Gili do Brasil,
1976. Ed Alemã.

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