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Resenha: Política, os textos centrais (Mangabeira Unger)

Roberto Mangabeira Unger é um dos pensadores sociais mais originais da teoria


política contemporânea. Sua originalidade deriva de sua constatação do esgotamento
das teorias sociais clássicas, especialmente o marxismo, e de sua proposta de renovação
programática e estratégica para as correntes políticas de esquerda, expostas
detalhadamente de maneira pormenorizada e exaustiva em suas obras. Unger não
distingue o essencial do acessório, ele penetra em todos os campos da vida econômica,
política e social.
Deve-se levar em conta que Unger escreveu essas duas obras alguns anos depois
da queda do muro de Berlin e da derrocada do bloco soviético, com a consequente perda
de prestígio das ideias socialistas clássicas e desorientação dos movimentos de
esquerda.
Em sua obra Política: os textos centrais, ele constata e expõe a superação das
teorias sociais clássicas, que ele chama de teorias de estruturas profundas -
caracterizadas pela existência de grandes modelos explicativos, ortodoxos e
deterministas - pela sua Teoria Social Construtiva, baseada na plasticidade dogmática e
programática e no conhecimento empírico, focado na ideia principal de que o indivíduo
e não as estruturas são a força das mudanças e permanências históricas. Já em sua obra
O que a esquerda deve propor, o autor, diante da falta de alternativas provocadas pelo
esgotamento do socialismo e da socialdemocracia, propõe como opção para a esquerda,
uma reformulação de suas ideias e estratégias ortodoxas, a partir de reformas sociais
profundas, inovações institucionais no campo direito de propriedade, abandono de
políticas sociais compensatórias, maior aproximação entre Estado e Mercado, aumento
da arrecadação de impostos sobre consumo e implantação de uma política educacional
transformadora das novas gerações em agentes permanentes dessa referida mudança
social.
Embora se identifique com o pensamento político de esquerda, Unger constata o
esgotamento do modelo político e social historicamente proposto pelas esquerdas.
Primeiramente ele observa o colapso das teorias sociais de estrutura profunda,
especialmente o marxismo que, devido à sua ortodoxia e em vista da experiência
histórica tornou-se inadequado frente às transformações estruturais e institucionais por
que passaram as sociedades. É interessante notar que Unger não percebe a luta de
classes como fator de mudanças, mas sim as guerras e as crises como fatores de
mudanças na história; para ele os colapsos e as crises ensejam mudanças nos conjuntos
institucionais e ideológicos: assim foi com o liberalismo, com o socialismo e com a
socialdemocracia, que foi forjada a partir do colapso econômico dos anos 30 e da II
Guerra Mundial.
Uma característica singular de sua teoria social construtiva é que ela escapa ao
conhecimento especializado das ciências sociais e caracteriza-se pela plasticidade
dogmática e programática e no conhecimento empírico, focado na ideia principal de que
o indivíduo e não as estruturas são a força das mudanças e permanências histórica.
Outra característica é a riqueza de detalhes e a aspiração de empirismo a partir de
sugestões pormenorizadas de ingerência nos diversos campos da vida social, como
economia, educação, administração pública, relação entre mercado e economia, reforma
fiscal, etc.
Na obra Política: os textos centrais, o autor dedica-se a esclarecer a genealogia do
sua teoria social construtiva, a qual concebe a sociedade como um artefato, ou seja,
algo que pode ser feito e refeito pelos indivíduos, agentes históricos de mudança, e não
pelas estruturas, conforme apregoa o marxismo. Remontando aos primórdios da era
moderna, Unger observa já nos primeiros pensadores sociais antinaturalista embriões
sua teoria social construtiva; porém essa vertente de pensamento teria sido sufocada
pelo advento das teorias sociais que advogam o papel fundamental da estrutura. Nessa
obra o autor também se dedica a analisar a evolução do atual modelo jurídico,
institucional e gerencial em vigor nos países desenvolvido e em desenvolvimento;
analisa o desenvolvimento histórico das relações entre mercado, estado e a grande
indústria; elucida o processo de estabelecimento do status quo do direito privado, do
direito de propriedade e do direito de herança, ao longo dos últimos séculos.
Convém destacar que o autor é crítico relação à forma privilegiada como o estado e
a grande indústria, ou indústria de massa, se relacionam nas sociedades industriais – a
chamada via inglesa - em detrimento da pequena empresa. Unger defende um modelo
industrial baseado na pequena empresa, fundamentada em processos flexíveis de
produção.
A questão do direito privado e do direito de propriedade constitui-se num ponto
importante da teoria de Unger. Ele entende que o direito de propriedade vigente tem
sua fundamentação num momento histórico em que a institucionalização do direito
privado atendia a interesses das classe possuidoras dos meios de produção, isso num
contexto em que havia elos muito fortes entre privilégio social e poder governamental.
Em suma, em sua obra Política, os textos centrais, o autor concebe uma teoria
social inovadora, fluida e pragmática, a teoria social construtiva, que rompe com os
grandes modelos de teorias sociais do século XX ao defender mudanças sociais e
econômicas profundas em diversos campos da vida social, que não foram contempladas
pelas teorias antecedentes.

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