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Análise sobre a variação linguística em livro didático

O livro didático analisado trata da variação linguística ao longo de 13 páginas, em um


capítulo específico localizado na parte de estudos de língua e linguagem, sob o título de “A
língua como um conjunto de variedades”. A principal característica da abordagem que o livro
possui é que primeiro apresenta textos, de diversos gêneros. Em seguida, traz questionamentos
para que o aluno estude e compreenda o que o texto, em si, mostra. Somente após esse trabalho
os conceitos (conteúdos) são formulados e explanados na forma de quadros.
Este capítulo destinado à variação linguística trabalha conceitos como variação
histórica, variedades urbanas de prestígio, preconceito linguístico, variações fonológica,
morfossintática e lexical, grau de formalidade (formal/informal) e modalidades de língua
(oral/escrita), além de, em uma das atividades propostas, trazer a consciência de variação com
a reflexão de que usos o próprio aluno faria em determinadas situações comunicativas.

Na primeira página do capítulo é retomado o que o aluno já aprendeu em relação à


língua. É mencionado que, partindo da pesquisa sugerida no capítulo anterior sobre curiosidades
da língua portuguesa, o aluno reflita as seguintes questões: “Você acha que a língua portuguesa
que falamos hoje é igual à língua portuguesa falada tal como quando ela surgiu?” e “E, afinal,
falamos todos a língua portuguesa no mesmo jeitinho?”. Após, são apresentados três textos
publicados em épocas diferentes e são feitos questionamentos sobre as mudanças históricas
perceptíveis neles. Neste caso, a pluralidade de línguas é tratada somente pela perspectiva
histórica, ao decorrer do capítulo são abordadas variações pontuais não sendo consideradas
“outras línguas”.

Quanto ao tratamento das variedades, além de abordar a pronúncia (sotaque) e o léxico


regionalizado, inclusive com “um representante típico dos habitantes dos pampas – os gaúchos
[…]”, são explanados os sotaques urbanos com uma tirinha de humor, a qual mostra um paulista
e um carioca conversando sobre como esses sotaques, a partir de imitações de ambos, na visão
deles, são estranhos. Essas variações são tratadas a partir de tirinhas de humor que são seguidas
de questionamentos que levam, direcionadamente, o aluno a perceber a variação fonológica,
morfossintática e de vocabulário.
Além de exercitar a percepção da variação no sotaque e no léxico, também é abordada
a variação na morfologia e na sintaxe, como ao estudar o cordel “Ai! Se sesse...”, trazendo, por
exemplo, a comparação entre “Se um dia nois se gostasse” e “Se um dia nós nos gostássemos”
e a proposta de reescrever versos do poema com outra construção morfossintática.

Outra questão é que ele não apresenta exemplos de variedades prestigiadas, porém, em
um quadro, somente aborda sobre o que são as variedades urbanas de prestígio, assim: “[…]
faladas pelas classes sociais que vivem nas grandes cidades e que têm maior poder econômico
e grau de escolaridade.”. Além disso, por se enquadrarem erroneamente como padrões, geram
o preconceito linguístico.

Como o livro analisado se trata do manual do professor, ele traz notas com orientações
para o uso docente. Ao lado do quadro citado no parágrafo anterior, se encontra uma nota na
qual diz que “A expressão variedades urbanas de prestígio […] vem substituir a noção de
língua padrão ou norma culta. Estudos recentes nas ciências da linguagem vêm mostrando
que mesmo em se tratando do uso da variedade de prestígio há muita diferença entre o falar
‘culto’ das diferentes regiões do país. Daí o uso do termo no plural [...]”. Então, como diz que
“vem substituir”, leva-se a crer que as variedades urbanas de prestígio ocupam o lugar de norma
culta, assim são levadas em consideração como sinônimos, com a simples diferenciação da
quantidade - uso do plural na nomenclatura.
Após propor atividades sobre “o uso da língua e as situações de comunicação”, o livro
trata sobre linguagem formal e informal e, em seguida, sobre língua oral e escrita. Apresenta
que o grau de formalidade é variável conforme os objetivos que se pretende alcançar e
exemplifica com a suposição de envio de uma carta a uma diretora (usando a linguagem formal
na escrita). Em nenhuma parte fica claro sobre qual modalidade teria tendência a apresentar
maior probabilidade de erro, somente salienta que o que tendencia a variação é a situação
comunicativa em si.

O livro se divide em três grandes “cadernos de estudo”, o primeiro sobre leitura e


produção, o segundo, práticas de literatura e o último, estudos de língua e linguagem. Nas
unidades e capítulos a parte deste sobre variação linguística não são mencionadas nem
trabalhadas atividades e leituras sobre a mesma; ficando restrita somente a este capítulo no meio
da unidade de estudos de língua e linguagem, como citado anteriormente. Assim, por mais que
explore a variação, o livro mostra que preza, contraditoriamente, pela norma culta da língua.

Ao abordar a variação linguística em um único capítulo, ao longo de 13 das 285 páginas,


sem mencioná-la no resto do livro e que nas unidades seguintes, ainda nos estudos de língua e
linguagem, refere-se a “língua e gramática normativa” e a “ortografia e pontuação”, conclui-se
que sim, o que é valorizado é a norma-padrão e seus usos.

Referência do livro didático analisado:


FIGUEIREDO, Laura de. Singular & plural: leitura, produção e estudos da linguagem. 6º ano.
1ª ed. São Paulo: Moderna, 2012.

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