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Resumo
Dada a importância do turismo para São Luís (MA), um importante destino turístico nacional,
o presente trabalho objetiva analisar o design institucional da gestão atual do Conselho
Municipal de Turismo da cidade de São Luís (MA) - COMTUR/SLZ, a partir dos bens
democráticos da inclusão e transparência de Smith (2009), pois o COMTUR/SLZ, mesmo
durante a pandemia, representa um espaço que pode contribuir com o processo democrático
participativo. Assim, realizou-se pesquisa documental de leis, atas e normas internas do
conselho. E para análise qualitativa, empregou-se análise de conteúdo via categorias
fundamentas na inclusão (voz e presença) e transparência (interna e externa). Observou-se
que a gestão atual do COMTUR/SLZ comparada a gestão anterior, avançou na inclusão de
seus membros e ampliou a transparência interna e externa. Contudo, aprimoramentos
funcionais e regimentais ainda são necessários sobre a transparência das eleições, a
diversidade representativa e a participação de atores externos ao conselho. Logo, conclui-
se que a produção dos bens democráticos, que incluam os cidadãos e promovam a
transparência de informações e comunicação são desafios à atual gestão do COMTUR/SLZ.
São Luís é uma cidade localizada em uma ilha, ao norte do estado do Maranhão e
concentra a maior população do estado, estimada em 1.115.932 pessoas (IBGE, 2021).
Fundada em 8 de setembro de 1612, pelos franceses, invadida por holandeses em 1645 e
colonizada por portugueses (séc. XVII), a capital maranhense possui um histórico cultural
demonstrado em seu acervo urbanístico de caráter civil e tombado Patrimônio Mundial pela
Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura (Unesco) desde 1997 e
constitui um dos mais representativos e ricos exemplares do traçado urbano e da tipologia
arquitetônica produzidos pela colonização portuguesa no Brasil (IBGE, 2021; SETUR, 2021).
O turismo da cidade é caracterizado pela presença de visitantes que buscam lazer e
entretenimento associados ao turismo cultural e de sol e praia. A cultura gastronômica do
local é rica em arroz de cuxá, peixe frito, beiju e juçara, bem como de cultura natural e cultural,
como as praias, as ruelas e casarões do Centro Histórico, o bumba-boi e o tambor de crioula
(SETUR, 2021).
A cidade vem retomando gradualmente a atividade desde o início da pandemia, o que
se comprova através dos números sobre o fluxo de visitantes, que em 2020 apresentou
830.073 passageiros no Aeroporto de São Luís, enquanto em 2021, já ultrapassou esse
quantitativo, com 862.153 passageiros (OBSTURSLZ, 2021). O mercado hoteleiro também
demonstrou avanços, com o crescimento da taxa de ocupação de 55,99% em 2020 para
64,66% em 20211.
As informações revelam o potencial turístico de São Luís, bem como a retomada
gradual do turismo, o que desperta o interesse das políticas públicas, já que o turismo envolve
interações entre turista, cidadãos e Estado em um espaço geográfico e acaba afetando a
comunidade local (BASSANI, 2019). Necessita, portanto, de um conjunto de decisões e ações
integradas harmonicamente a serem desenvolvidas para o uso sustentável de recursos
naturais, culturais e históricos (BENI, 1998). Logo, a espaços democráticos e participativos,
como os conselhos municipais, permitem introduzir a questão da partilha do poder em uma
instituição híbrida, como também o resultado de diferentes negociações após o processo
constituinte (AVRITZER, 2008).
O COMTUR/SLZ foi criado em 1997 pela lei 3609 (SÃO LUÍS, 1997), fazendo parte
da extinta Fundação Municipal de Turismo - FUMTUR. Em 2002, com a extinção da FUMTUR
pela lei 4120 /02 (SÃO LUÍS, 2002) e a criação da Secretaria Municipal de Turismo-SETUR
pela lei 4129/02 (SÃO LUÍS, 2002), o COMTUR manteve suas atribuições preservadas
atreladas à SETUR, conforme Art. 9° da referida legislação.
A Lei Municipal n° 4038/02 (SÃO LUÍS, 2002) institui o COMTUR como “um órgão
deliberativo, consultivo, normativo e orientador das ações pertinentes às políticas de turismo
do Município de São Luís” (SÃO LUÍS, 2002). Conforme destacam Pessali e Gomes (2020),
as atribuições dos conselhos normalmente seguem essa classificação, tendo o poder de
decidir sobre a implantação de políticas e/ou administração de recursos relativos à sua área
de atuação (deliberativo), de orientar ações ou políticas sobre sua área de atuação
(consultivo); de estabelecer normas e diretrizes para as políticas e/ou administração de
recursos relativos à sua área de atuação (normativo) e de fiscalizar a implementação e
funcionamento de políticas e/ou a administração de recursos relativos à sua área de atuação
(fiscalizador). Observa-se que o COMTUR/SLZ conforme as leis 3609/1997 e 4038/2002,
1
Dados referentes a média do último trimestre (outubro, novembro e dezembro) de 2020 e 2021.
juntamente do regimento interno, não possui a atribuição de fiscalização, o que pode
representar uma limitação à produção dos bens democráticos referentes à transparência e ao
controle popular.
Na composição do COMTUR/SLZ deverá ter 16 titulares e 16 suplentes,
representantes da sociedade civil e do Poder Público, distribuídos de forma paritária conforme
apresentado a seguir (SÃO LUÍS, 2002):
- 6 (seis) representantes indicados pelo Chefe do Executivo Municipal;
- 1 (um) representante do pelo Chefe do Legislativo Municipal;
- 1 (um) representante indicado pelo órgão estadual responsável pelo Turismo;
- 8 (oito) representantes da sociedade civil (instituições representativas dos segmentos
de agências de viagem e empresas de turismo, de hotéis, bares, restaurantes e similares, de
transportes de passageiros (terrestre, aéreo e marítimo), instituições de ensino técnico e
científico ligadas ao turismo, instituições de profissionais ligados ao turismo, instituições
representativas dos setores comercial e industrial, Organizações Não-Governamentais e
Organizações Populares de caráter comunitário, agências públicas ou privadas de
financiamento e desenvolvimento).
Cabe ao Prefeito a indicação dos representantes (titulares e suplentes) do poder
público e contempla os órgãos municipais ligados aos seguintes setores da administração:
Turismo, Educação, Meio Ambiente, Cultura, Urbanismo e Planejamento, enquanto os
representantes da sociedade civil são escolhidos mediante eleições (SÃO LUÍS, 2002). Os
suplentes da sociedade civil são indicados na composição das chapas candidatas. O prazo
de cada mandato dos conselheiros estabelecido no Regimento Interno é de dois anos.
No quadro 1, apresentam-se os membros do COMTUR/SLZ da gestão atual
distribuídos por setores público e sociedade civil, conforme memorando publicado no Diário
Oficial do Município, em julho de 2021.
2ª reunião - Reformulação da lei municipal Lei 4108/2002, que institui o exercício da função
08/04/2021 do guia de turismo; elaboração do Plano Gerencial de Resíduos Sólidos.
O turismo, enquanto atividade econômica que impacta nas demais esferas da vida,
como educação, assistência, cultura, segurança e outras, necessita ser discutido dentro de
espaços democráticos que elaboram e implementam políticas públicas de turismo, uma vez
que tal atividade traz impactos positivos ou negativos para uma determinada localidade.
De acordo com Bassani (2019, p. 31), “o turismo possui múltiplos efeitos e não pode
ser reduzido a ideia simplista relacionada aos espaços ocupados apenas por turistas insípidos
e por populações locais agradáveis: o turismo é um ato político”. A autora ainda destaca que
a atividade turística ainda é usufruída e controlada pelas elites, sendo que os mais afetados -
os que vivem na localidade - não tem poder de voz e muitas vezes são excluídos dos
processos decisórios acerca da política pública (BASSANI, 2019). A esse respeito, Mediotte
(2017, p. 3) salienta que uma política pública de turismo para ser eficiente, deve primeiramente
ser inclusiva, permitindo a participação da comunidade no planejamento dessas políticas, já
que se faz necessário “garantir a melhoria da qualidade de vida local em primeira instância,
bem como na geração de empregos, distribuição de riquezas provenientes do turismo aos
moradores”.
A inclusão, enquanto bem democrático, refere-se a maneira pela qual a igualdade se
realiza dentro da política e como as dimensões presença e voz são estabelecidas. Segundo
Xavier, Silva e Braga (2020, p. 74-75)
5 CONCLUSÃO
2
Informações extraídas no site dos conselhos municipais, na área do COMTUR. Disponível em:
http://portaldosconselhos.curitiba.pr.gov.br/conselhos2.aspx?conselho=18. Acesso em: 10 jan. 2022.
Entretanto, por ter uma formação diferenciada dos demais conselhos de políticas públicas -
classe empresarial e setor governamental - a baixa promoção da presença de grupos
minoritários faz com que a voz para estes grupos seja comprometida.
Além disso, a não delimitação em regimento interno do percentual mínimo de presença
por segmentos pode incorrer desigualdades de força nas reuniões, prejudicando a promoção
da voz. Sugere-se que se tenha explicitado no regimento interno o percentual mínimo de
presença tanto para o setor público como da sociedade civil, para que não ocorram reuniões
com desequilíbrio de forças.
Ainda, no tocante ao bem democrático da inclusão, observa-se que o não cumprimento
da periodicidade das reuniões (estipulada em regimento interno) e ausências de membros do
conselho nestas, fragilizam a inclusão, na medida que o volume de temas a serem discutidos
se torna reduzido. Contudo, na gestão atual, a forma de interação entre conselheiros aparenta
ser adequada e cooperativa, com organização das pautas discutidas e o acompanhamento
de temas abordados ao longo dos encontros ordinários, o que demonstra avanços em relação
à gestão passada.
A arquitetura do desenho institucional do COMTUR/SLZ, estipula a presença de um
regimento, composição de mesa diretora, comissões permanentes (e grupos de trabalhos),
bem como a elaboração de atas das reuniões. Dito isso, a atual gestão (biênio 2021/2023)
vem sugerindo avanços para a transparência interna, como implementação de um modelo de
gestão, calendário de reuniões pré-definido e acompanhamento das ações promovidas pelo
conselho. Entretanto se tais avanços não estiverem formalizados via alteração do regimento
interno podem acabar se perdendo em gestões subsequentes.
Com relação a transparência externa, a produção deste bem democrático vem
ocorrendo de forma discreta, uma vez que o conjunto de informações pertinentes ao
COMTUR/SLZ está disperso em portais do site da prefeitura municipal de São Luís (MA), do
diário oficial e da SETUR, prejudicando assim a capacidade de escrutínio do conselho por
parte do público em geral. Outro ponto que reduz a produção de transparência externa é a
quantidade limitada de informações disponibilizadas no espaço destinado ao COMTUR/SLZ
dentro do site da prefeitura municipal de São Luís, contendo apenas atas dos biênios
2018/2020 e 2021/2023, regimento interno e composição do conselho atual.
Entende-se que a transparência externa dessas informações fica inviabilizada a partir
da falta de publicização do processo de habilitação de entidades aptas a se candidatarem ao
COMTUR/SLZ, canais de comunicação direta (com o conselho) e prestações de contas do
conselho (sendo que estas também não constam no portal da transparência do município).
Vale destacar que ao longo da pesquisa limitações foram frequentes devido à escassez e
dispersão de informações disponíveis, principalmente relacionadas às gestões anteriores.
Acredita-se que o estudo pode contribuir para a compreensão do funcionamento
recente do COMTUR/SLZ, bem como de seu design institucional, observando limitações e
potencialidades. De maneira que se recomenda que o percentual mínimo de presença tanto
para o setor público como da sociedade civil seja explicitado em regimento interno, pois foi
observado que em muitas reuniões a presença não foi paritária (entre setor público e
sociedade civil), também se recomenda que os procedimentos de habilitação de entidades
aptas a eleição do conselho seja melhor explicados em regimento interno e divulgados;
criação de vagas no conselho para grupos populares e minoritários; ampliação de
transparência (como a publicização das prestações de contas do conselho, criação de um
portal próprio centralizando informações e disponibilização de atas mais antigas);
criação/exposição de canais de comunicação com o conselho (como e-mail institucional) e
abertura das reuniões a interessados (reuniões podem ser transmitidas online).
Conclui-se que o Conselho Municipal de Turismo de São Luís (MA) representa um
importante marco para a democracia participativa na cidade de São Luís, cujo objetivo é
garantir o desenvolvimento local através da atividade turística.
Assim, espera-se que a pesquisa tenha contribuído para o entendimento dos bens
democráticos referentes a inclusão e transparência no Conselho Municipal de Turismo de São
Luís, que busque incluir os cidadãos nas discussões e tomadas de decisão e promover a
transparência nas informações e comunicações.
Por fim, tendo em vista que a temática não se esgota devido as limitações no design
institucional e em seu funcionamento, traduz a luz de novas perspectivas em relação ao
desafios a serem endereçados pela gestão atual (e futuras) do COMTUR/SLZ, no que tange
a produção dos bens democráticos, a incluir os atributos controle popular e julgamento
ponderado delimitados por Smith.
REFERÊNCIAS
BASSANI, C.P. Turismo, direito e democracia: uma análise dos bens democráticos nas
leis dos Conselhos Municipais. Dissertação (Mestrado em Turismo) - Universidade Federal
do Paraná, 2019.
PESSALI, H.F.; GOMES, B.M.A. Bens democráticos nos conselhos de Curitiba. In:
PESSALI, H.F.; GOMES, B.M.A. Instituições de democracia participativa: bens
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dá outras providências. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/ma/s/sao-luis/lei-
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SÃO LUÍS. Lei n. 4038 de 15 de janeiro de 2002. Altera o art. 3o da lei no 3609, de 21 de
julho de 1997, e institui o conselho municipal de turismo, previsto no art. 9o dos atos
das disposições transitórias da lei orgânica do município de São Luís e dá outras
providências. São Luís, 2002. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/ma/s/sao-
luis/lei-ordinaria/2002/404/4038/lei-ordinaria-n-4038-2002-altera-o-art-3-da-lei-n-3609-de-21-
de-julho-de-1997-e-institui-o-conselho-municipal-de-turismo-previsto-no-art-9-dos-atos-das-
disposicoes-transitorias-da-lei-organica-do-municipio-de-sao-luis-e-da-outras-
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SONTAG JÚNIOR, D.; GOMES, B.M.A. Bens democráticos e o turismo: uma análise do
conselho municipal de turismo de Curitiba. In: PESSALI, H.F.; GOMES, B.M.A. Instituições
de democracia participativa: bens democráticos nos conselhos de políticas públicas de
Curitiba. Curitiba: PUCPRESS, 2020.
UNESCO. Historic Centre of São Luís. United Nations Educational Scientific and
Cultural Organization. 2022. Disponível em: https://whc.unesco.org/en/list/821/. Acesso
em: 18 jan. 2022.