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ROTEIRO DE ATUAÇÃO

ATRIBUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL EM MATÉRIA DE


DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO – VERBAS REPASSADAS PELA
UNIÃO1
Augusto Carlos Rocha de Lima 2
Luiz Henrique Freitas3

A atribuição do Ministério Público para investigar eventual lesão ao Patrimônio


Público está, em regra, atrelada à competência do juízo que processará e julgará a causa. A
Constituição Federal distribuiu a competência em todo o Poder Judiciário Federal, sendo a
competência da Justiça Estadual residual. A competência da Justiça Federal é taxativamente
fixada nos arts. 108 e 109 da Constituição Federal.
Na seara cível, a Justiça Federal será competente se a União possuir interesse que
lhe permita atuar como parte (autora, ré, assistente ou oponente), nos termos do art. 109, I da
Constituição Federal, em razão da pessoa. Em matéria penal, o art. 109, IV, da CF estabelece
critérios mais amplos na fixação da competência da Justiça Federal, notadamente no que se refere
às infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de
suas entidades autárquicas ou empresas públicas.
Para efeitos de ações de responsabilização por improbidade administrativa,
demandas de natureza cível, aplicáveis as regras do art. 109, I, da Constituição Federal, a presença
do ente público é o fator delimitante da competência. Para tais efeitos, a mera presença do
Ministério Público Federal pode ser considerada apta a deslocar o feito para a Justiça Federal, pois
se trata de órgão da União. O interesse e a legitimidade deste órgão deverá ser firmado a partir da
afronta ou ameaça de afronta a algum interesse federal.

1 Roteiro de atuação adaptado de artigo do CAOP-PP, do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte.

2 Promotor de Justiça, Coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Defesa do Patrimônio Público
(CAOP-PP), do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte.
3 Assessor Jurídico do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Defesa do Patrimônio Público (CAOP-PP), do
Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte.
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Para fins de ação penal, a origem da verba é decisiva para a delimitação da
competência, e, portanto, de qual Ministério Público deve agir. Se a verba for federal, a infração
penal causa prejuízos a bens e interesses da União, caracterizando a competência da Justiça Federal,
e, portanto, a legitimidade do Ministério Público federal. Caso contrário, se a verba não for federal,
ou já tiver sido incorporada ao patrimônio local, a atribuição é do Ministério Público Estadual.
Abaixo quadro esquemático demonstrando a definição da competência da justiça
federal nas matérias afetas à proteção do Patrimônio Público:

JUSTIÇA FEDERAL
Arts. 108 e 109 da Constituição Federal
CÍVEL PENAL
(ratione personae) (ratione materiae)
Art. 109, I, CF – as causas em que a União, Art. 109, IV, CF – os crimes políticos e as
entidade autárquica ou empresa pública infrações penais praticadas em detrimento de
federal forem interessadas na condição de bens, serviços ou interesse da União ou de
autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto suas entidades autárquicas ou empresas
as de falência, as de acidentes de trabalho e as públicas, excluídas as contravenções e
sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do ressalvada a competência da Justiça Militar e da
Trabalho; Justiça Eleitoral;
Art. 109, VIII, CF – os mandados de Art. 109, VI, CF – os crimes contra a
segurança e os “habeas-data” contra ato de organização do trabalho e, nos casos
autoridade federal, excetuados os casos de determinados por lei, contra o sistema
competência dos tribunais federais; financeiro e a ordem econômico-financeira;

No tocante aos crimes contra o sistema financeiro e ordem econômico-


financeira, os únicos delitos contra o sistema financeiro com previsão em lei de competência
federal são os previstos na Lei nº 7.492/86. Nos termos do art. 26 da Lei nº 7.492/86, a ação penal,
nos crimes previstos nesta lei, será promovida pelo Ministério Público Federal, perante a Justiça
Federal.
Os demais delitos contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira,
especialmente, (a) crimes de concessão de empréstimos vedados, previsto no art. 34 da Lei nº
4.595/64; (b) crimes contra a ordem econômica do art. 1º da Lei nº 8.176/91; e (c) crimes contra a
ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, previstos na Lei nº 8.137/90, são, em
regras, julgados pela Justiça Estadual, em razão da lei não atribuir sua apuração à Justiça Federal,
salvo se afetarem bens, serviço ou interesse federal, hipótese na qual haverá competência da Justiça

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Federal com fundamento no inciso IV do art. 109 (e não no inciso VI).

1. COMPETÊNCIA EM CASO DE DESVIO DE VERBAS

Com base nos critérios acima estabelecidos foram editadas as súmulas 208 e 209 do
Superior Tribunal de Justiça, abaixo transcritas, que aludem expressamente à origem da verba como
critério de delimitação de competência em caso de desvio de verbas gerenciadas pelos municípios:

Súmula 208: Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de
verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal.

Súmula 209: Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba
transferida e incorporada ao patrimônio municipal.

Se uma verba repassada pelo ente federal ao município se incorporar ao patrimônio


deste, não mais poderá ser considerada como bem da União, de modo a atrair a competência da
Justiça Estadual, nos termos da súmula 209. Se, no entanto, a despeito da verba ter sido incorporada
ao Patrimônio Municipal, continuar presente sua sujeição a prestação de contas perante órgão
federal, aplica-se a súmula 208 que define o caso da competência da justiça federal.4
Ultimamente, o traço diferencial da jurisprudência tem sido a definição de qual
o órgão de controle interno ou externo que realiza a fiscalização das verbas. Caso exista, em
algum diploma normativo, preceito que preveja que a fiscalização da aplicação dos recursos ficará a
cargo de órgão ou pessoa jurídica da administração pública federal ou do Tribunal de Contas da
União, haverá interesse federal na investigação e, consequentemente, a competência será da Justiça
Federal.
Para melhor entendimento do tema, essencial a identificação dos diversos tipos de
transferências realizadas pela União Federal para os municípios. Vislumbram-se basicamente três
formas de transferências: a) constitucionais; b) legais e c) voluntárias.

2. TRANSFERÊNCIAS CONSTITUCIONAIS

As transferências constitucionais são aquelas arrecadadas por um ente, mas

4 FERREIRA FILHO, Roberval Rocha e VIEIRA, Albino Carlos Martins. Súmulas do Superior Tribunal de Justiça –
organizadas por assunto, anotadas e comentadas. Salvador: Juspodium, 2009. p.505
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transferidas a outros entes por disposição constitucional, resultantes da repartição constitucional das
receitas. O objetivo do repasse é amenizar as desigualdades regionais e promover o equilíbrio sócio
econômico entre Estados e Municípios.
Dentre as principais transferências da União para os Estados, o DF e os Municípios,
previstas na Constituição, destacam-se: o Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal
(FPE); o Fundo de Participação dos Municípios (FPM); o Fundo de Compensação pela Exportação
de Produtos Industrializados (FPEX); o Fundo de Manutenção e de Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF); e o Imposto sobre a Propriedade
Territorial Rural (ITR).

3. TRANSFERÊNCIAS LEGAIS

As transferências legais são resultantes de previsão em lei ou ato administrativo


(geralmente portarias dos Ministérios), destinadas a custear serviços públicos e programas, no mais
das vezes da área social. São as transferências efetuadas na área da saúde, educação, assistência
social, etc.5
A transferência legal tem um aspecto finalístico, os recursos são repassados para
acorrer a uma despesa específica. Em razão disso, as verbas oriundas desses programas não são
passíveis de incorporação pelo patrimônio do Município, uma vez que o gestor não possui
discricionariedade para gastá-las.
A sua efetivação independe da existência de convênio, ajuste, contrato ou outro
instrumento de formalização, bastando que o município tenha se habilitado junto ao Ministério
respectivo, mediante o preenchimento de certas condições.
Em se tratando de transferências legais, existe uma subclassificação entre
transferências automáticas, transferências fundo a fundo e transferências direto ao cidadão.
As transferências legais automáticas referem-se aos repasses de verbas mediante
depósito em conta-corrente específica do beneficiário. As transferências “fundo a fundo”, por seu
turno, são repasses diretos, realizados de fundos da União aos fundos dos Estados, Distrito Federal e
dos Municípios. Em tese, por integrarem um Fundo à parte da conta do Município as verbas

5 FONTES, Paulo Gustavo Guedes, em encontro realizado entre a Controladoria Geral da União, o Ministério Público
Federal e o Ministério Público Estadual, no estado de Sergipe, em junho de 2005. Acessível em:
http://www.prse.mpf.mp.br/artigos/arrazoado%20competencia%20programas%20federais.pdf
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referentes a essas transferências não integram o patrimônio da edilidade.6
Alheios a essa discussão da incorporação ou não ao patrimônio do Município/Estado,
os julgados recentes têm revelado que a existência de repasses de verbas federais, ainda que “fundo
a fundo”, evidenciam o interesse da União na sua fiscalização.

4. TRANSFERÊNCIAS LEGAIS DIRETAS AO CIDADÃO

As transferências diretas ao cidadão referem-se aos programas que concedem


benefício monetário mensal à população-alvo do programa. Nesta modalidade de transferência,
compete ao município a missão de operacionalizar os programas, por meio de ações como o
credenciamento junto ao Governo Federal e a manutenção do cadastro das pessoas beneficiadas e,
ainda, instituir os conselhos de controle social.7
Pode-se citar como programas vinculados a esta modalidade de transferência: o
Programa Bolsa Família e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI.

5. TRANSFERÊNCIAS VOLUNTÁRIAS

As transferências voluntárias são feitas mediante convênio, com formalização do


respectivo instrumento e incidem nas mais diversas áreas da atividade estatal. Aqui, inexiste
determinação legal, diferenciando-se pelo seu caráter cooperativo, auxiliar ou assistencial.
Segundo Régis Fernandes de Oliveira para a realização de uma transferência
voluntária, “é imprescindível dotação específica (inciso I do §1º do art. 25 da LRF), não podendo
ser para pagamento de pessoal, se descumpridos os limites legais (inciso III) e comprovação, por
parte do beneficiário de que: a) acha-se em dia quanto ao pagamento de tributos, empréstimos e
financiamentos devidos ao ente transferidor, bem como quanto à prestação de contas de recursos
anteriormente recebidos; b) cumprimento dos limites constitucionais relativos à educação e saúde;
c) observância dos limites das dívidas consolidada e mobiliária, de operações de crédito, inclusive
por antecipação da receita, de inscrição em Restos a Pagar e de despesa total com pessoal e; d)

6 COSTA, Aldo de Campos. Competência para julgar desvios de verbas federais. Disponível em
http://www.conjur.com.br/2013-jul-11/toda-prova-competencia-julgar-desvios-verbas-federais. Último acesso em 24
setembro 2014.
7 COSTA, idem.
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previsão orçamentária de contrapartida (alíneas a e d do inciso IV do art. 25 da LRF)”.8
Sem a comprovação desses requisitos, o ente não poderá receber recursos
voluntários, o que inviabiliza o seu desenvolvimento. A comprovação de todos esses requisitos é
feita através do Cadastro Único de Convênio – CAUC.
Assim, antes de firmar o instrumento que viabilizará a transferência de recursos para
de recursos para o ente beneficiário, o ente que faz a transferência consulta o CAUC para verificar a
existência de possíveis restrições. Na existência de restrições, o ente não receberá as transferências
voluntárias, conforme o art. 25 da LRF, com exceção para as transferências nas áreas de saúde,
educação e assistência social, nos termos do parágrafo terceiro do dispositivo citado.9
Os instrumentos utilizados para viabilizar as transferências voluntárias são: a) os
convênios; acordos ou ajustes que regulam a transferência de recursos financeiros de dotações
consignadas nos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União (IN STN nº. 01/1997); b) os
contratos de repasses; instrumentos utilizados para a transferência de recursos da União por
intermédio de instituições ou agências financeiras oficiais federais, destinados à execução de
programas governamentais nas áreas de habitação, saneamento e infraestrutura urbana, esporte, bem
como nos programas relacionados à agricultura(Decreto 1.819/96); e c) os contratos de parceria;
instrumento jurídico destinado voltado para transferência de recursos a entidades qualificadas como
organização da sociedade civil de interesse público para o fomento e a execução das atividades de
interesse público(Lei n° 9.790/99 e Decreto n° 3.100/99).10
Em se tratando das verbas transferidas voluntariamente, há a exigência de
prestação de contas perante o órgão federal concedente, por força do disposto na Instrução
Normativa 01/97, da Secretaria do Tesouro Nacional, que disciplina a celebração de convênios
de natureza financeira que tenham por objeto a execução de projetos ou realização de eventos.11

6. FUNDEB

No tocante às ações penais relativas a desvio de verbas do Fundeb,


independentemente de ter havido ou não complementação por parte da União, a competência para
julgar os crimes decorrentes de desvio de verba do FUNDEB é da Justiça Federal. Isso porque há

8 OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
9 LEITE, Harrison. Manual de Direito Financeiro. 2 ed. Salvador: Juspodium, 2013.
10 COSTA, 2013.
11 FONTES, 2005.
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interesse federal (art. 109, IV, da CF), considerando que o texto constitucional atribuiu à União
função supletiva e redistributiva em matéria educacional, bem como o interesse na universalização
de um padrão mínimo de qualidade do ensino, nos termos do §1º do art. 211 da CF/88.
Em relação à competência para julgar as ações de improbidade administrativa
será da Justiça Estadual ou da Justiça Federal, a depender se houve ou não complementação do
FUNDEB pela União. A Justiça Federal apenas será competente se a União possuir interesse que
lhe permita atuar como autora, ré, assistente ou oponente. Inexistindo complementação de verbas
federais ao FUNDEB, a ação de improbidade administrativa é de competência da Justiça Estadual,
considerando que, não estando envolvidas verbas federais, não se justifica a intervenção da União
como parte.
Essa dicotomia anômala entre a competência cível e criminal da Justiça Federal foi
instituída pelo Supremo Tribunal Federal:

Ementa: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÕES. CARACTERIZAÇÃO.


AUSÊNCIA DE DECISÕES DO PODER JUDICIÁRIO. COMPETÊNCIA DO STF. ART.
102, I, f, CF. FUNDEF. COMPOSIÇÃO. ATRIBUIÇÃO EM RAZÃO DA MATÉRIA.
ART. 109, I E IV, CF. […] 3. A sistemática de formação do FUNDEF impõe, para a
definição de atribuições entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual,
adequada delimitação da natureza cível ou criminal da matéria envolvida 4.A competência
penal, uma vez presente o interesse da União, justifica a competência da Justiça Federal
(art. 109, IV, CF/88) não se restringindo ao aspecto econômico, podendo justificá-la
questões de ordem moral. In casu, assume peculiar relevância o papel da União na
manutenção e na fiscalização dos recursos do FUNDEF, por isso o seu interesse moral
(político-social) em assegurar sua adequada destinação, o que atrai a competência da
Justiça Federal, em caráter excepcional, para julgar os crimes praticados em detrimento
dessas verbas e a atribuição do Ministério Público Federal para investigar os fatos e propor
eventual ação penal. 5. A competência da Justiça Federal na esfera cível somente se verifica
quando a União tiver legítimo interesse para atuar como autora, ré, assistente ou opoente,
conforme disposto no art. 109, inciso I, da Constituição. A princípio, a União não teria
legítimo interesse processual, pois, além de não lhe pertencerem os recursos desviados
(diante da ausência de repasse de recursos federais a título de complementação), tampouco
o ato de improbidade seria imputável a agente público federal. 6. Conflito de atribuições
conhecido, com declaração de atribuição ao órgão de atuação do Ministério Público
Federal para averiguar eventual ocorrência de ilícito penal e a atribuição do Ministério
Público do Estado de São Paulo para apurar hipótese de improbidade administrativa, sem
prejuízo de posterior deslocamento de competência à Justiça Federal, caso haja intervenção
da União ou diante do reconhecimento ulterior de lesão ao patrimônio nacional nessa
última hipótese. (ACO 1109, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão:
Min. LUIZ FUX (art. 38, IV, b, do RISTF), Tribunal Pleno, julgado em 05/10/2011,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-047 DIVULG. 06-03-2012 PUBLIC. 03-2012)

Segue abaixo quadro esquemático em relação à competência para processar e julgar


desvio de verbas transferidas pela União12:
12 http://s.conjur.com.br/dl/competencia-desvios-recursos-uniao.pdf
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JUSTIÇA ESTADUAL
Súmula 209 do STJ: Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba
transferida e incorporada ao patrimônio municipal.

Transferências Conceito Exemplos

FPM (STJ CC 15887) e FPE


São aquelas transferências (art. 159, CF);
resultantes da repartição
Transferências Constitucionais
constitucional das receitas. Não Transferências para Municípios
possuem vinculação na despesa. do ITR (art. 158, CF)

No âmbito cível, se não houver


complementação da União, a
competência é da Justiça
Estadual, já que não há verbas
federais que justifiquem a -
FUNDEB
intervenção da União como
parte.

Ver: STF – ACO 1109;TRF1 –


AC 200739000104144
O município possui
discricionariedade para definir a ROYALTIES
despesa correspondente ao
Transferências Legais
recurso repassado pela União. Art. 17, §1º, I, da Lei nº
desvinculadas
7.990/89
Ver: STF MS 24312; TRF1 –
AC 200633070013639

JUSTIÇA FEDERAL
Súmula 208 do STJ: Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por
desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal.
Transferências Conceito Exemplos
Transferências Automáticas A transferência legal tem um (a) PNAE (STJ - AgRg
Legais aspecto finalístico, os recursos são no AREsp: 30160 RS)
repassados para acorrer a uma
despesa específica. (b) PDDE (PDE –
São realizadas mediante o Escola, Programa Mais
depósito em Educação) - (TRF-5 –

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AG:710617201240500
00;TRF5 ACR
200405000132349)

(c) PNATE (TRF-2 –


AG:
201102010127622;
TRF-5 -
conta corrente específica o AC:200984000112063;
município deve se habilitar para TRF5 HC
receber recursos apenas uma vez 0003864212010405000
e, a partir da habilitação, passa a 0)
ter o direito aos recursos federais.
(d) PEJA (TRF5 INQ
200781010002366;
TRF1 – AC
200637020005520)

(e) FUNDESOLA (STJ


- HC: 62998 RO).

Fundo a Fundo As transferências “fundo a fundo” a) Fundo Nacional


são repasses diretos, realizados de de Saúde (TRF-4 Inq
fundos da 200404010290995):
União aos fundos dos Estados, SUS
Distrito Federal e dos Municípios. (STF RE 196982; STJ -
Em tese, por integrarem um AgRg no CC
Fundo à 129.386/RJ; STJ -
parte da conta do Município as AgRg no CC
verbas 122.555/RJ; STJ - CC
referentes a essas transferências 122.376/RJ; TCU -
não integram o patrimônio da AC-0622-08/14-P),
edilidade.
As transferências fundo a fundo PSF
são utilizadas nas áreas de (TRF5 - APN
assistência social e de saúde. 0008326162013405000
O SUS possui natureza convenial 0; TRF5 - EDACR
de acordo com decisões plenárias 20068300012119001);
do TCU
PAB
(Decisão 506/97 e 449/1998) e (TRF5 - AC
posicionamento do STF (RE 000102524201140582
196.982/PR) 01)

b) Fundo Nacional
de Assistência Social

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(TRF5 – AC
000007021201040583
00; TCU AC-3008-
53/09-P; TRF5 - AC
200983000147520;TRF
-1 AG 6866 AP
0006866-
73.2011.4.01.0000)

Bolsa Família (TRF-2 -


ACR
200551030006863;
São programas que concedem
TRF-1 - AC: 5371 BA
benefício monetário mensal à
0005371-
populações-alvo do programa. Os
98.2010.4.01.3307)
recursos do programa continuam
na esfera federal e sequer são
Minha Casa Minha
transferidos aos Municípios.
Vida (STF – ACO
Compete ao município a missão
Diretas ao Cidadão 2498/MT; STF – ACO
de operacionalizar os programas,
2456/MT; STF – ACO
por meio de ações como o
2289/BA; TRF-2 – AG
credenciamento junto ao Governo
201302010164238;
Federal e a manutenção do
TRF2 – AG
cadastro das pessoas beneficiadas
201402010054851)
e, ainda, instituir os conselhos de
controle social.
PETI (TRF-5 – Inq
200905001118012;)

São repasses de recursos correntes


ou de capital da União a título de
cooperação, auxílio ou assistência
financeira, que não decorram de
determinação constitucional,
Convênios, Repasses e
Transferências Voluntárias legal, ou os destinados ao Sistema
Contratos de Parceria
Único de Saúde.
Ver: Art. 25 da LRF; Arts. 29 e 38
da Instrução Normativa 01/97 da
Secretaria do Tesouro Nacional.

Cível Se houver
complementação da
União (TRF1 – AC
200739000104144;
TRF1 – AC
FUNDEB 200237000032193)

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Independentemente da
origem do recurso (STJ
Penal – CC: 123817 PB; STJ
– CC 119305 / SP; STF
- ACO 1109)

7. REPASSES FEITOS ATRAVÉS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS

Os julgados recentes sobre a matéria têm revelado que a existência de repasses de


verbas federais – sejam elas fundo a fundo, sejam por convênio – revela interesse da União na sua
fiscalização.
Nesse sentido decidiu o Supremo Tribunal Federal:

HABEAS CORPUS. DESVIO DE VERBAS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE --- SUS.


INTERESSE DA UNIÃO. ART. 109, IV DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. SECRETÁRIO DE ESTADO.
PRERROGATIVA DE FORO. ATRIBUIÇÃO DA PROCURADORIA REGIONAL DA
REPÚBLICA. Procedimentos administrativos criminais --- PACs --- instaurados para
apurar supostos desvios de verbas do Sistema Único de Saúde --- SUS. Verbas federais
sujeitas à fiscalização do Tribunal de Contas da União. Nítido interesse da União, a teor do
art. 109, IV da Constituição do Brasil. Envolvimento do Secretário de Saúde do Estado do
Piauí, a atrair a competência do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, bem assim a
atribuição da Procuradoria Regional da República. Ordem denegada.
(RHC n. 98.564⁄DF, Ministro Eros Grau, Segunda Turma, DJe 6⁄11⁄2009).

Isso se dá principalmente em razão de interpretação estrita do art. 33, §4º, da Lei n°


8.080/90 – que disciplina o Sistema Único de Saúde:

CAPÍTULO II
Da Gestão Financeira
Art. 33. Os recursos financeiros do Sistema Único de Saúde (SUS) serão depositados em
conta especial, em cada esfera de sua atuação, e movimentados sob fiscalização dos
respectivos Conselhos de Saúde.
§ 1º Na esfera federal, os recursos financeiros, originários do Orçamento da Seguridade
Social, de outros Orçamentos da União, além de outras fontes, serão administrados pelo
Ministério da Saúde, através do Fundo Nacional de Saúde.
§ 2º (Vetado).
§ 3º (Vetado).
§ 4º O Ministério da Saúde acompanhará, através de seu sistema de auditoria, a
conformidade à programação aprovada da aplicação dos recursos repassados a Estados e
Municípios. Constatada a malversação, desvio ou não aplicação dos recursos, caberá
ao Ministério da Saúde aplicar as medidas previstas em lei.

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O dispositivo transcrito revela que quaisquer recursos repassados – não importando a
que título – estarão sob o crivo da fiscalização do Ministério da Saúde e, consequentemente, da
União.
Além disso, a Lei nº 8.080/1990 previu, em seu inciso XIX do art. 16, e no § 4º do
art. 33, a criação de um Sistema Nacional de Auditoria – SNA – do SUS, efetivada no art. 6º da Lei
nº 8.689/199313 e regulamentada no Decreto nº 1.651/1995, mantido pela União, com a participação
de Estados, Distrito Federal e Municípios:

Art. 16. A direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) compete:


XIX - estabelecer o Sistema Nacional de Auditoria e coordenar a avaliação técnica e
financeira do SUS em todo o Território Nacional em cooperação técnica com os Estados,
Municípios e Distrito Federal. (Vide Decreto nº 1.651, de 1995).

Na mesma esteira segue o entendimento do Superior Tribunal de Justiça,


especialmente a partir de sua Terceira Seção – órgão ao qual cabe processar e julgar os feitos
relativos à matéria penal em geral:

PENAL. AGRAVOS REGIMENTAIS EM CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO


PENAL. CRIME DE LAVAGEM E OCULTAÇÃO DE BENS E VALORES. CONTRATO
FIRMADO ENTRE PESSOA JURÍDICA E ÓRGÃO ESTADUAL. RECURSOS, EM
PARTE, PROVENIENTES DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS).
INCORPORAÇÃO DA VERBA AO PATRIMÔNIO ESTADUAL. IRRELEVÂNCIA.
REPASSE SUJEITO AO CONTROLE INTERNO DO PODER EXECUTIVO FEDERAL
E DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. INTERESSE DA UNIÃO. PRECEDENTES
DA TERCEIRA SEÇÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Por estarem sujeitas à fiscalização dos órgãos de controle interno do Poder Executivo
federal, bem como do Tribunal de Contas da União, as verbas repassadas pelo Sistema
Único de Saúde - inclusive na modalidade de transferência "fundo a fundo" - ostentam
interesse da União em sua aplicação e destinação. Eventual desvio atrai a competência da
Justiça Federal para conhecer da matéria, nos termos do art. 109, IV, da Constituição
Federal.
2. Agravos regimentais improvidos. (AgRg no CC 129.386/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO
REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/12/2013, DJe 19/12/2013)

13 Art. 6º Fica instituído no âmbito do Ministério da Saúde o Sistema Nacional de Auditoria de que tratam o inciso XIX
do art. 16 e o § 4º do art. 33 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990.
§ 1º Ao Sistema Nacional de Auditoria compete a avaliação técnico-científica, contábil, financeira e patrimonial do
Sistema Único de Saúde, que será realizada de forma descentralizada.
§ 2º A descentralização do Sistema Nacional de Auditoria far-se-á através dos órgãos estaduais e municipais e de
representação do Ministério da Saúde em cada Estado da Federação e no Distrito Federal.
§ 3º Os atuais cargos e funções referentes às ações de auditoria ficam mantidos e serão absorvidos pelo Sistema
Nacional de Auditoria, por ocasião da reestruturação do Ministério da Saúde, de que trata o art. 13.
§ 4º O Departamento de Controle, Avaliação e Auditoria será o órgão central do Sistema Nacional de Auditoria.
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AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PROCESSO PENAL.
CRIMES DE QUADRILHA, FALSIDADE IDEOLÓGICA, PECULATO E CORRUPÇÃO
PASSIVA. DESVIO DE VERBAS PROVENIENTES DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
– SUS. CONTROLE DO PODER EXECUTIVO FEDERAL E DO TRIBUNAL DE
CONTAS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. SÚMULA 208/STJ.
1. Segundo o posicionamento do Supremo Tribunal Federal e desta Corte de Justiça,
compete à Justiça Federal processar e julgar as causas relativas ao desvio de verbas do
Sistema Único de Saúde - SUS, independentemente de se tratar de repasse fundo a fundo ou
de convênio, visto que tais recursos estão sujeitos à fiscalização federal, atraindo a
incidência do disposto no art. 109, IV, da Carta Magna, e na Súmula 208 do STJ.
2. O fato de os Estados e Municípios terem autonomia para gerenciar a verba financeira
destinada ao SUS não elide a necessidade de prestação de contas perante o Tribunal de
Contas da União, nem exclui o interesse da União na regularidade do repasse e da correta
aplicação desses recursos.
3. Portanto, a competência da Justiça Federal se mostra cristalina em virtude da existência
de bem da União, representada pelas verbas do SUS, bem como da sua condição de
entidade fiscalizadora das verbas federais repassadas ao Município.
4. Não trazendo o agravante tese jurídica capaz de modificar o posicionamento
anteriormente firmado, é de se manter a decisão agravada na íntegra, por seus próprios
fundamentos 5.Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no CC 122.555/RJ,
Rel. Ministro OG FERNANDES, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2013, DJe
20/08/2013)

PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO PENAL. IRREGULARIDADES EM


CONTRATO CELEBRADO POR ÓRGÃO ESTADUAL. RECURSOS PROVENIENTES
DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. TRANSFERÊNCIA AUTOMÁTICA OU "FUNDO A
FUNDO". INCORPORAÇÃO DA VERBA AO PATRIMÔNIO ESTADUAL.
IRRELEVÂNCIA. REPASSE SUJEITO AO CONTROLE INTERNO DO PODER
EXECUTIVO FEDERAL E DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. INTERESSE DA
UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Por estarem sujeitas à fiscalização dos órgãos de controle interno do Poder Executivo
federal, bem como do Tribunal de Contas da União, as verbas repassadas pelo Sistema
Único de Saúde - inclusive na modalidade de transferência automática ou "fundo a fundo" -
ostentam interesse da União em sua aplicação e destinação. Eventual desvio atrai a
competência da Justiça Federal para conhecer da matéria, nos termos do art. 109, IV, da
Constituição Federal.
2. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da 5ª Vara Criminal da
Seção Judiciária do Rio de Janeiro, o suscitante. (CC 122.376/RJ, Rel. Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe
22/08/2012).

O Tribunal de Contas da União tem precedentes afirmando ser sua a atribuição para
fiscalizar recursos transferidos fundo a fundo, o que revela óbvio interesse da União:

Número Interno do Documento: AC-0622-08/14-P Colegiado: Plenário


Relator: RAIMUNDO CARREIRO Processo: 017.012/2010-4
Sumário:AUDITORIA. MUNICÍPIO DE BOA VISTA/RR. FISCALIZAÇÃO DE
ORIENTAÇÃO CENTRALIZADA-FOC. AVALIAÇÃO DA APLICAÇÃO DOS
RECURSOS DO SUS TRANSFERIDOS NA MODALIDADE FUNDO A FUNDO.
DETERMINAÇÕES. MONITORAMENTO. DESCUMPRIMENTO DAS
DETERMINAÇÕES DESTE TRIBUNAL. AUDIÊNCIAS. RAZÕES DE
JUSTIFICATIVA PARCIALMENTE ACATADAS. APLICAÇÃO DE MULTA.

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REITERAÇÃO DE DETERMINAÇÃO. PEDIDO DE REEXAME. CONHECIMENTO.
PROVIMENTO. CIÊNCIA ÀS PARTES.

Número Interno do Documento: DC-0506-31/97-P Colegiado: Plenário


Relator: Iram Saraiva Processo: 022.427/1992-9 Número do acórdão: 506
Ano do acórdão: 1997 Data dou: 28/08/1997
Representação da Assembléia Legislativa de Santa Catarina, para apurar desvios de
recursos federais destinados ao Setor de Saúde do Estado. Diligência "in loco" na Secretaria
de Estado de Saúde/SC. Irregularidades constatadas. Proposta inicial de arquivamento do
processo e de conhecimento ao Presidente da Assembléia Legislativa e ao Tribunal de
Contas do Estado. Estudo para definir a competência do TCU para fiscalizar a aplicação de
recursos orçamentários do então INAMPS repassados a Estados, Distrito Federal e
Municípios para financiamento das atividades hospitalares e ambulatoriais vinculadas ao
Sistema Único de Saúde - SUS, com audiência do MP/TCU.
[…]
Decisão:
O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE:
1 - firmar entendimento sobre a matéria em questão, no sentido de que os recursos
repassados pelo Sistema Único de Saúde – SUS, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios, constituem recursos federais e que, dessa forma, estão sujeitos à fiscalização
desta Corte as ações e os serviços de saúde pagos à conta desses recursos, quer sejam os
mesmos transferidos pela União mediante convênio, quer sejam repassados com base em
outro instrumento ou ato legal; […]

Nada obstante, em nenhum dos precedentes pesquisados – como não poderia


deixar de ser – é afastada a competência da Justiça Estadual para processar e julgar ações
oriundas de investigações de recursos públicos exclusivamente estaduais e/ou municipais, que
não tenham sido alvo de repasse pela União.
Esses recursos, geralmente identificados sob a fonte 100, não interessam diretamente
à União e estão afastados, portanto, das regras do art. 109, incisos I e IV, da Constituição:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:


I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem
interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as
de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
[…]
IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou
interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as
contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; […]

É imperioso registrar ainda que existem decisões monocráticas de Ministros do STF


e do STJ que perfilham entendimento contrário, de que o interesse da União não estaria
comprovado pela mera fiscalização do TCU e do Ministério da Saúde, devendo ser cabalmente
comprovado:
CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 131.067 - MA (2013/0369538-4) RELATOR:
MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES Data da Publicação 07/02/2014

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PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO
ENTRE JUÍZOS FEDERAL E ESTADUAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA AJUIZADA PELO MUNICÍPIO CONTRA EX-PREFEITO.
SUPOSTAS IRREGULARIDADES NA UTILIZAÇÃO DE VERBAS FEDERAIS JÁ
INCORPORADAS À MUNICIPALIDADE. SÚMULA 209/STJ. PRECEDENTES DO
STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 126.896 - PA (2013/0048222-1) RELATOR:


MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, Data da Publicação 07/02/2014
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO
ENTRE JUÍZOS FEDERAL E ESTADUAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL EM FACE
DE MUNICÍPIO E OUTROS. SUPOSTAS IRREGULARIDADES NA UTILIZAÇÃO DE
VERBAS FEDERAIS JÁ INCORPORADAS À MUNICIPALIDADE. SÚMULA 209/STJ.
PRECEDENTES DO STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. [...] No âmbito
cível, a razão de agir estaria no interesse em recuperar os recursos públicos indevidamente
desviados e a punir o agente público pelo ato de improbidade a que deu causa. Dessa forma,
a União, neste caso, a princípio, não teria legítimo interesse em agir e, portanto, não
figuraria como autora, ré, assistente ou opoente, pois, como antes visto, além de não lhe
pertencerem os recursos, tampouco eventual irregularidade é imputável a agente público
federal. Nesse sentido, mutatis mutandis, decidiu esta Corte, no julgamento da ACO nº
1.156/SP, de relatoria do Ministro Cezar Peluso, em acordao assim ementado: “Conflito
negativo de atribuições. Ação civil de reparação de dano ao erário. Improbidade
administrativa. Desvio de recursos do FUNDEF. Inexistência de complementação de verbas
federais e de interesse da União. Feito da atribuição do Ministério Público estadual.
Conflito conhecido e acolhido, para esse fim. É atribuição do Ministério Público estadual
atuar em ação de reparação de dano ao erário, por improbidade administrativa concernente
a desvio de recursos do FUNDEF, quando não tenha havido complementação de verbas
federais” (DJe de 12/3/10). Por fim, a titulo de registro, conforme bem asseverou a
Procuradoria-Geral da República, “nao se mostra afastada a possibilidade da ocorrência de
problemas ligados à gestão municipal dos serviços, os quais seriam causadores da falta ou
atraso dos pagamentos a serem efetuados à noticiante. Nesse contexto, a atribuição para a
apuração de eventual ato de improbidade administrativa é do Ministerio Publico estadual”
(fl. 5). Com essas considerações, conheço do presente conflito para determinar a
atribuição do Ministério Público do Estado de São Paulo, para onde deverão ser
remetidos os presentes autos. Publique-se. Brasília, 18 de junho de 2012. Ministro Dias
Toffoli Relator Documento assinado digitalmente (ACO 1788, Relator(a): Min. DIAS
TOFFOLI, julgado em 18/06/2012, publicado em DJe-121 DIVULG 20/06/2012 PUBLIC
21/06/2012).

Diante do exposto, sugere-se que seja fixada a competência da Justiça Federal para
processar feitos que tenham por objeto verbas repassadas pela União aos Estados e aos Municípios
no âmbito do Sistema Único de Saúde.
Sugere-se ainda a necessidade de fixação da competência da Justiça Estadual para
processar e julgar Ações Civis Públicas e Ações Penais que tenham por objeto verbas estritamente
estaduais e/ou municipais, a exemplo das que tenham por fonte de recursos o código 100.14

14 Cf. Ementário de Receitas Públicas do Ministério do Planejamento. Disponível em


http://www.orcamentofederal.gov.br/informacoes-orcamentarias/arquivos-receitas-publicas/receitaspublicas
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