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Supremo Tribunal Federal

SUSPENSÃO DE LIMINAR 828 SANTA CATARINA

REGISTRADO : MINISTRO PRESIDENTE


REQTE.(S) : EMPRESA DE NAVEGAÇÃO SANTA CATARINA
LTDA
ADV.(A/S) : DARCI NORTE REBELO
ADV.(A/S) : DARCI NORTE REBELO JR
ADV.(A/S) : NIKOLAI SOSA REBELO
REQDO.(A/S) : JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CÍVEL DA
COMARCA DE NAVEGANTES
REQDO.(A/S) : VICE-PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO
ESTADO DE SANTA CATARINA
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA
CATARINA
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
SANTA CATARINA
INTDO.(A/S) : DEPARTAMENTO DE TRANSPORTES E TERMINAIS -
DETER
ADV.(A/S) : NADJANARA RAQUEL DA CUNHA LEAL
SCHAEFER

Trata-se de pedido de suspensão de liminar concedida na ação civil


pública nº 0001905-92.2014.8.24.0135, em trâmite perante a 2ª Vara Cível
da Comarca de Navegantes, do Estado de Santa Catarina.

Consta dos autos que o Ministério Público do Estado de Santa


Catarina ajuizou ação civil pública contra o Departamento de Transportes
e Terminais de Santa Catarina – DETER e a Empresa de Navegação Santa
Catarina, questionando a autorização concedida a esta última para
prestar serviço de transporte fluvial entre os municípios de Navegantes e
Itajaí, serviço público essencial, e requerendo a concessão de liminar para
obrigar a DETER a dar início, em prazo pré-fixado, ao processo licitatório
para concessão do referido serviço, bem como obrigar a Empresa de
Navegação de Santa Catarina a dar continuidade à prestação do serviço
até o término da licitação.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O
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Interposto agravo de instrumento contra a decisão liminar, o


desembargador relator do Tribunal de Justiça do Estado de Santa
Catarina negou o pedido de efeito suspensivo (documento eletrônico 12).
Ademais, não conheceu do pedido de suspensão de liminar, apontando
que a empresa requerente buscava assegurar o seu interesse particular
próprio, de modo que não estaria caracterizado o requisito necessário
para a extensão da legitimidade ativa às empresas privadas prestadoras
de serviço públicos (documento eletrônico 13).

A Presidência do Superior Tribunal de Justiça houve por bem


indeferir o pedido suspensivo de liminar, sob o fundamento de que a
requerente busca assegurar o seu interesse particular de continuar a
explorar a atividade econômica de transporte fluvial, o que retiraria a sua
legitimidade para formular o pedido de contracautela. Além disso,
entendeu que os argumentos apresentados buscam demonstrar o
desacerto da decisão impugnada, o que não se admite no pedido de
suspensão (documento eletrônico 13).

Sobreveio, então, o presente pedido de suspensão a esta Corte


(documento eletrônico 2). Após afirmar ter legitimidade para pleitear a
medida, por se tratar de delegatária de serviços públicos que age em
nome da DETER, a empresa requerente assevera que a decisão
impugnada impõe grave risco de violação da ordem pública e da
segurança jurídica, sob os seguintes argumentos:

a) A Constituição Federal (art. 21, XII, d) e a legislação


infraconstitucional (art. 2º, § 3º da Lei nº 9.074/95 e art. 13, V, b,
da Lei nº 10.233/01) estabelecem a possibilidade de três regimes
jurídicos diversos para a execução dos transportes aquaviários –
autorização, concessão ou permissão. Assim, o Poder Judiciário
não poderia substituir-se à administração pública para eleger
um deles, uma vez que estaria invadindo área privativa da
discricionariedade do administrador público (em desrespeito à

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ordem pública da separação dos poderes) e ferindo a segurança


jurídica;
b) A determinação judicial, cujos efeitos serão suportados
pela requerente, feriria o valor constitucional da segurança
jurídica, pois eliminaria o direito à jurisdição ou a
inafastabilidade do controle judicial;
c) O juiz do primeiro grau, no julgamento de mérito da
ação, não teria observado o devido processo legal e a ampla
defesa, suprimindo o direito à plena jurisdição, garantido pelo
art. 5º, XXXV, da Constituição Federal; e
d) A defesa da ordem pública da separação dos poderes
ou da segurança jurídica não seria um interesse privado da
empresa-requerente, uma vez que quando postula a suspensão
da liminar, age na defesa dos interesses tutelados pelo art. 4º da
Lei nº 8437/92 e 12, § 1º, da Lei nº 7.347/85.

Por todas essas razões, pede a suspensão da medida liminar.

Em 3/10/2014 determinei a oitiva dos interessados e a manifestação


da Procuradoria Geral da República, com fundamento no art. 4º, § 2º, da
Lei nº 8.437/1992 (documento eletrônico 16).

Instados, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e o


DETER apresentaram suas manifestações. O primeiro indicou que a
requerente não comprovou a alegada violação à ordem pública e à
segurança jurídica, buscando a satisfação de interesses de caráter
eminentemente privado (documento eletrônico 20). O segundo apontou
como indevida a intervenção judicial no caso, acrescentando que o regime
escolhido, o da autorização, fora escolhido com base no art. 21, XII, 'd', da
Constituição Federal (documento eletrônico 29).

O Procurador-Geral da República reconheceu a ausência de


legitimidade para o pedido de suspensão, tendo em vista que a empresa
requerente não age na defesa de um interesse público coletivo, mas
eminentemente particular próprio, subjacente à própria exploração do

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serviço público. Ao final, opinou pelo não conhecimento do pedido de


suspensão.

Extraio do parecer da lavra do ilustre Procurador-Geral da


República o seguinte trecho :

“Assim sendo, não demonstrado o comprometimento da


própria atividade pública explorada pela empresa, mas, sim, o
interesse patrimonial na manutenção do contrato de autorização
pela autora, não se reconhece a sua legitimidade para postular a
medida excepcional de suspensão de liminar.
Cabe esclarecer, ainda, que, em sede de incidente de
suspensão, não cabe aquilatar o acerto ou desacerto da decisão
impugnada, não podendo essa medida ser utilizada como
sucedâneo dos recursos ou demais medidas judiciais cabíveis. O
presente instrumento, para ser acolhido, pressupõe a
demonstração inequívoca de graves ameaças ou lesões aos
valores da ordem, economia, segurança e saúde públicas, o que,
todavia, não se verifica nos autos” (páginas 5-6 do documento
eletrônico 33).

É o relatório necessário.

Decido.

Bem examinados os autos, pondero inicialmente que a suspensão


possui caráter excepcional e não serve como sucedâneo recursal, ou seja,
não deve ser manejada em substituição aos recursos próprios
taxativamente previstos na legislação processual para impugnar decisões
pela via ordinária ou extraordinária.

Em virtude da sua natureza de contracautela, a suspensão exige uma


análise rigorosa de seus pressupostos, quais sejam, a existência de
controvérsia de natureza constitucional e o risco de grave lesão aos
valores estimados na norma. Nesse sentido, confiram-se: SS 3.259-AgR/SP,

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Rel. Min. Ellen Gracie; SS 341-AgR/SC, Rel. Min. Sydney Sanches; e SS


282-AgR, Rel. Min. Néri da Silveira.

Ademais, a necessidade de a lide versar sobre matéria constitucional


é imprescindível na determinação da competência do Presidente do
Supremo Tribunal Federal para análise da suspensão.

Assim também o risco de grave lesão. Não se mostra suficiente a


mera alegação de ofensa à ordem, à saúde, à segurança ou à economia.
Somente o risco provável é capaz de abrir a via excepcional da
contracautela.

Nessa perspectiva, colaciono o entendimento firmado por esta Corte


nos autos da SS 846-AgR/DF, da lavra do Min. Sepúlveda Pertence:
I. Suspensão de segurança: natureza cautelar e
pressuposto de viabilidade do recurso cabível contra a
decisão concessiva da ordem. A suspensão de
segurança, concedida liminar ou definitivamente, é
contracautela que visa à salvaguarda da eficácia pleno do
recurso que contra ela se possa manifestar, quando a
execução imediata da decisão, posto que provisória, sujeita
a riscos graves de lesão interesses públicos privilegiados -
a ordem, a saúde, a segurança e a economia pública: sendo
medida cautelar, não há regra nem princípio segundo os
quais a suspensão da segurança devesse dispensar o
pressuposto do fumus boni juris que, no particular, se
substantiva na probabilidade de que, mediante o futuro
provimento do recurso, venha a prevalecer a resistência
oposta pela entidade estatal à pretensão do impetrante
(Grifos nossos) .

É forçoso reconhecer que, em última análise, a suspensão significa


retirar, ainda que temporariamente, a eficácia de uma decisão judicial
proferida em juízo de verossimilhança ou de certeza, na hipótese de
cognição exauriente.

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Inicialmente, reconheço que a controvérsia instaurada na presente


suspensão de liminar evidencia a existência de matéria constitucional,
especificamente quanto à incidência dos arts. 21, inc. XII, alínea d, e 175,
ambos da Constituição Federal.

Dessa forma, cumpre ter presente que a Presidência do Supremo


Tribunal Federal dispõe de competência para examinar questão cujo
fundamento jurídico é de natureza constitucional (art. 297 do RISTF,
combinado com o art. 25 da Lei 8.038/90), conforme firme jurisprudência
desta Corte, destacando-se os seguintes julgados: Rcl 475, rel. Min.
Octavio Gallotti, Pleno, DJ 22.04.1994; Rcl 497-AgR, rel. Min. Carlos
Velloso, Pleno, DJ 06.04.2001; SS 2.187-AgR, rel. Min. Maurício Corrêa, DJ
21.10.2003; e SS 2.465, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004.

Passo a analisar se a requerente, pessoa jurídica de direito privado e


autorizatária de serviços de transporte fluvial entre os Municípios de
Navegantes e Itajaí, possui ou não legitimidade ativa para postular a
medida a se referem os arts. 4º da Lei 8.437/92 e 297 do RISTF.

Examinando o tema, esta Corte firmou entendimento de que não é


sempre que se podem admitir, no polo ativo dos pedidos de
contracautela, entidades da administração indireta ou concessionárias de
serviço público. Nesse aspecto, colaciono as decisões proferidas na SS
1.308 (rel. Min. Celso de Mello), SL 34 (rel. Min. Maurício Corrêa), e SS
227/RJ (rel. Min. Rafael Mayer), entre outras.

Ademais, o Supremo também decidiu que têm legitimidade ativa as


pessoas jurídicas de direito privado
"quando, no exercício de função delegada do Poder Público,
como as concessionárias de serviço público, se encontrem investidas
na defesa do interesse público, por sofrer as conseqüências da decisão
concessiva da cautelar ou segurança, com reflexos diretos na ordem,
na segurança, na saúde ou na economia pública" (SL 111, Rel. Min.

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Ellen Gracie).

No caso dos autos, não obstante a relevância dos argumentos


invocados, percebe-se que, mais do que interesse público que se pretende
resguardar – cuja comprovação não obteve sucesso -, desponta interesse
de ordem exclusivamente patrimonial. A empresa requerente, pessoa
jurídica de direito privado, busca preservar a sua continuidade na
execução do serviço. Para que se caracterizasse a legitimidade da empresa
para pleitear a suspensão de liminar, os interesses em discussão teriam
que transcender o aspecto patrimonial.

Além disso, nada na narrativa da empresa requerente sugere que a


observância da decisão impugnada inviabilizará o serviço de transporte
fluvial entre os Municípios de Navegantes e Itajaí. Cabia à empresa
requerente ir além de ilações ou de conjecturas, com o objetivo de
demonstrar que os efeitos da decisão impugnada superam a simples
ausência, em um futuro próximo, da prestação do serviço pela própria
pessoa jurídica.

Nesse sentido, observo que a decisão impugnada, confirmada,


posteriormente por sentença sem trânsito em julgado, determina que a
empresa requerente continue a prestar o serviço até o término da licitação
concessiva do serviço de transporte fluvial, não havendo comprovação de
que essa decisão pudesse prejudicar a prestação dos serviços de
transporte fluvial entre os Municípios de Navegantes e Itajaí.

Não está, portanto, demonstrada a afetação da atividade confiada à


requerente, por autorização, pelo Poder Público, mas sim o efetivo
interesse da requerente quanto à eventual lesão sofrida ao patrimônio da
empresa, ante a perda do direito próprio de exploração dos serviços de
transporte fluvial entre os Municípios de Navegantes e Itajaí. Não há,
também, a demonstração da alegada violação da ordem pública e da
segurança jurídica.

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Isso posto, indefiro o pedido de suspensão (art. 38 da Lei 8.038/1999


e art. 21, § 1º do RISTF).

Publique-se.

Brasília, 3 de fevereiro de 2016.

Ministro RICARDO LEWANDOWSKI


- Presidente -

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