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Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

15 de março de 2017

2ª Câmara Cível

Apelação / Remessa Necessária - Nº 0054261-53.2010.8.12.0001 - Campo Grande


Relator – Exmo. Sr. Des. Marcos José de Brito Rodrigues
Apelante : Estado de Mato Grosso do Sul
Proc. do Estado : Renato Woolley de Carvalho Martins (OAB: 8054/MS)
Juízo Recorr. : Juiz ex officio
Apelado : Jorge Fernandes
Advogada : Neiva Isabel Guedes Garcez (OAB: 4595/MS)
Interessado : Procuradoria Geral do Estado de Mato Grosso do Sul

E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO


– AÇÃO DE COBRANÇA – POLICIAL MILITAR – FÉRIAS VENCIDAS E NÃO
GOZADAS – PRESCRIÇÃO AFASTADA – TERMO INICIAL – CONCESSÃO DA
APOSENTADORIA – MÉRITO – CONVERSÃO EM PECÚNIA – POSSIBILIDADE
– FERIAS NÃO USUFRUÍDAS E NÃO COMPUTADAS EM DOBRO POR
OCASIÃO DA PASSAGEM PARA A RESERVA REMUNERADA, CONFORME
PREVISÃO LEGAL INDENIZAÇÃO CABÍVEL – JUROS E CORREÇÃO
MONETÁRIA – SENTENÇA PARCIALMENTE MODIFICADA – RECURSOS
PROVIDOS EM PARTE.
O termo inicial da prescrição do direito de pleitear a indenização dos
períodos de férias não gozadas tem início com o ato de aposentadoria, quando o servidor
não poderá mais usufruí-las.
O servidor público que se aposenta sem ter gozado férias que lhe
eram devidas e não terem sido computadas em dobro por ocasião da passagem para a
reserva remunerada faz jus à indenização pecuniária correspondente a esse período, sob
pena de locupletamento indevido por parte da administração.
A controvérsia acerca do artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação
da Lei 11.960/2009, foi solucionada pelo Supremo Tribunal Federal, em 25.03.2015,
com a modulação dos efeitos das ações diretas de inconstitucionalidade ns. 4357 e 4425.
Em resumo, restou decidido que: se houverem parcelas a serem pagas anteriores a
29/06/2009, os juros de mora deverão incidir no percentual de 6% ao ano, nos termos da
redação original do art. 1º-F, da Lei n. 9.494/97, e a correção monetária pelo INPC; se
houverem parcelas a serem pagas após 29/06/2009 e até 25/03/2015, os juros de mora e
a correção monetária terão incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos
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índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art.
5º, da Lei n. 11.960/2009); e, por fim, se houverem parcelas a serem pagas após
25/03/2015, aos juros de mora deverão ser aplicados os mesmos índices da caderneta de
poupança e à correção monetária adotar-se-á o IPCA-E.
O percentual devido a título de honorários advocatícios, quando
ilíquida a sentença, somente restará fixado quando liquidado o julgado, conforme
disposição do artigo 85, § 4º, inciso II, do Código de Processo Civil.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da 2ª


Câmara Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos, por
unanimidade, dar parcial provimento ao recurso e retificar parcialmente a sentença em
reexame necessário, nos termos do voto do relator.

Campo Grande, 15 de março de 2017.

Des. Marcos José de Brito Rodrigues - Relator


Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
R E L A T Ó R I O
O Sr. Des. Marcos José de Brito Rodrigues.
Estado de Mato Grosso do Sul, nos autos de ação de cobrança de n.
0054261-53.2010.8.12.0001 em que contende com Jorge Fernandes, oferece recurso de
apelação.

O recorrente, em prejudicial, aduz que:

1 – a sentença merece reforma, reconhecendo-se a ocorrência da


prescrição quinquenal em favor da Fazenda Pública, pois o termo inicial para a
contagem deste prazo é a data da suposta negativa do gozo do direito a férias, já que
neste momento o requerente teve o seu direito preterido; e,

2 – somente em 25/06/2009 o autor requereu administrativamente


seu suposto direito ao gozo de férias ou, mais especificamente, a compensação pelo não
gozo das mesmas; assim, os períodos anteriores à 2004 estão prescritos.

No mérito, afirma que:

1 – a sentença deve ser reformada, pois, ao contrário do que restou


decidido, o apelado usufruiu das férias reclamadas e estas foram pagas a seu tempo e
modo, conforme se evidencia da cópia do processo administrativo n. 31/301994/09,
juntado aos autos;

2 – o conteúdo da certidão publicada à f. 23 (p. 22) pode ser


infirmado pelas provas existentes nos autos e é, no mínimo, pouco confiável, pois, além
de ser impossível que o autor tenha usufruído as férias referente ao ano de 1983 sem que
tenha, antes, gozado do ano de 1982, o autor não trouxe para o feito os atos
administrativos que hipoteticamente tenha suspendido o gozo de suas férias;

3 – para que se possa dar credibilidade ao conteúdo da referida


certidão, esta informação deve corresponder aos registros nos assentamentos funcionais
do autor, os quais, no caso, devem reconhecer alguma hipótese do § 4º do artigo 48 da
Lei Complementar n. 53, de 1990, para admitir a postergação do gozo das férias do
autor;

4 – também afasta a pretensão do autor o fato dele ter passado para


inatividade, porque, nos termos do artigo 58, § 2º, da LC n. 53/1990, o período de férias
não gozado é computado dia-a-dia, em dobro, no momento da aposentadoria do policial
militar; assim, se o autor não noticia qualquer aproveitamento de férias não usufruídas
em sua passagem para a inatividade, somente se pode concluir que ele não tinha férias
não gozadas para serem computadas;

5 – a lei de regência não prevê a possibilidade de conversão em


pecúnia de férias não gozadas;

6 – pelo princípio da legalidade, a Administração Pública somente


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deve fazer o que a lei assim permitir, sendo defeso praticar atos que não estejam
previamente estabelecidos na legislação;

7 – nos termos do enunciado n. 339, da Súmula do STF, não pode o


Poder Judiciário estender benefícios em nome do princípio da isonomia, como pretende
a parte autora;

8 – não se pode, por via judicial, estender ou determinar a inclusão


em folha de pagamento de vantagens que por lei não são outorgados a determinados
servidores, porquanto a outorga e inclusão de vantagens está sujeita ao princípio da
reserva legal, sob pena de afrontar os princípios constitucionais da legalidade e da
tripartição dos poderes, além do verbete sumular antes mencionado;

9 – a concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração


dependerá de Lei Específica, além de prévia dotação orçamentária;

10 – a sentença deve ser reformada para julgar improcedente o


pedido inicial; e,

11 – os juros e correção monetária devem observar o disposto no


artigo 1º-F, da Lei n. 9.494/97, o qual continua em pleno vigor, por não ter sido
impugnado nas ADIs 4.357 e 4.425.

Por fim, pugna pelo conhecimento e provimento do presente recurso,


nos termos arrazoados, prequestionando a matéria posta em discussão.

O recurso foi respondido, batendo-se a parte recorrida pelo


desprovimento do mesmo.

V O T O
O Sr. Des. Marcos José de Brito Rodrigues. (Relator)
Estado de Mato Grosso do Sul, nos autos de ação de cobrança de n.
0054261-53.2010.8.12.0001 em que contende com Jorge Fernandes, oferece recurso de
apelação.

Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação interposto contra


a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos
desta Comarca que, no feito em questão, julgou procedente o pedido inicial para
condenar o Estado a indenizar o autor, em pecúnia, pelas férias não gozadas, relativas
aos exercícios de 1980, 1981, 1982, 1985, 1986, 1999, 2002, 2003, 2004 e 2007,
acrescida do terço constitucional, incidindo correção monetária pelo IGPM/FGV, a
partir de quando a indenização deveria ter sido paga, e juros de mora de 0,5% ao mês,
desde a citação.

Inicialmente, observo que, embora o magistrado de primeiro grau


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não tenha determinado a remessa necessária dos autos a este Tribunal, faz-se necessário
o conhecimento, de ofício, da providência imposta pela lei, visto que a sentença não se
enquadra no rol dispensado do duplo grau de jurisdição, já que se trata de uma decisão
ilíquida (Súmula de n. 4901, do STJ).

Nesse contexto, presentes os requisitos de admissibilidade dos


apelos, recebo-os em seus efeitos devolutivo e suspensivo (arts. 1.012 e 1.013, do
CPC/15), por força do que dispõe o art. 1.010, §3º, do CPC/15, bem como passo a
apreciá-los em conjunto.

Prescrição.

Sustenta o recorrente que a pretensão inicial anterior à 2004 está


prescrita, uma vez que o autor efetuou o pedido administrativo em 2009 e ainda, que o
termo inicial para a contagem deste prazo, é a data da suposta negativa do gozo do
direito a férias.

Sem razão.

Como se sabe, o termo inicial do prazo prescricional para o


recebimento de indenização por férias não gozadas ocorre no momento em que é
efetivada a aposentadoria do servidor, pois foi a partir desta data que nasceu para o autor
a pretensão indenizatória, já que não recebeu em pecúnia as férias não gozadas, como
também não foram computadas como tempo de serviço para fins de aposentadoria,
conforme manda a lei.

Pouco importa o tempo transcorrido desde os períodos aquisitivos,


porque durante esse lapso temporal o apelado não perdeu a possibilidade de usufruí-las,
fato que ocorre somente com a passagem para a inatividade.

Nesse sentido:

“ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. FÉRIAS NÃO


GOZADAS. INDENIZAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA.
LEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO. PRESCRIÇÃO. O Município possui
legitimidade passiva para a ação de servidor da Câmara Municipal,
pleiteando a indenização de férias não gozadas, por ocasião da
aposentadoria. O termo inicial da prescrição do direito de pleitear a
indenização dos períodos de férias não gozadas tem início com o ato de
aposentadoria, quando o servidor não poderá mais usufruí-las.
Precedentes do STJ. Recurso especial do Município de São Paulo não
conhecido. Recurso especial de Francisco Moraes conhecido
parcialmente.” (5ª T, REsp nº 36.500/SP, rel. Min. Gilson Dipp, DJ de
22.02.99, p. 118).

Ainda:
1 A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a
sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas. (Súmula 490, CORTE ESPECIAL, julgado em
28/06/2012, DJe 01/08/2012). Destacado
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E M E N T A – REEXAME NECESSÁRIO E RECURSO
VOLUNTÁRIO – AÇÃO POPULAR – FÉRIAS VENCIDAS E NÃO
GOZADAS – PRESCRIÇÃO NÃO VERIFICADA – REFORMA DA
SENTENÇA LIMITADA AOS TERMOS DO RECURSO – EFEITO
DEVOLUTIVO – DIÁRIAS – ORDENS DE PAGAMENTO E NOTAS DE
EMPENHO – BIS IN IDEM – REEXAME REALIZADO – APELO
CONHECIDO E PROVIDO. É assente o entendimento no Superior
Tribunal de Justiça que somente com o desligamento do servidor, quer
pela aposentadoria, quer pela exoneração, é que se torna impossível o
gozo das férias, iniciando-se então o prazo prescricional para o
recebimento da indenização respectiva. (...). (TJMS - AC n.
0550156-60.2004.8.12.0041. Relator(a): Des. Sideni Soncini
Pimentel; Comarca: Ribas do Rio Pardo; Órgão julgador: 5ª Câmara
Cível; Data do julgamento: 07/02/2013; Data de registro: 14/02/2013)

Assim, considerando que o apelado passou para a reserva


remunerada em 17/04/2009 (p. 02) e a ação ajuizada em 16 de outubro de 2010, não
transcorreu o prazo quinquenal previsto no artigo 1º do Decreto 20.910/32.

Logo, afasta-se a prescrição suscitada pelo Estado recorrente.

Mérito.

Em resumo, requer o apelante a improcedência do pedido inicial, sob


o argumento de que (a) o apelado usufruiu das férias reclamadas e estas foram pagas a
seu tempo e modo, conforme se evidencia da cópia do processo administrativo n.
31/301994/09, juntado aos autos; (b) o conteúdo da certidão publicada à f. 23 (p. 22)
pode ser infirmado pelas provas existentes nos autos e é, no mínimo, pouco confiável;
(c) não computadas as supostas férias não gozadas no tempo para aposentadoria,
entende-se que não haviam férias a serem usufruídas; (d) não há previsão legal para a
conversão em pecúnia de período de férias não gozadas; (e) a atuação da Administração
Pública rege-se pelo princípio da legalidade; (f) a pretensão inicial encontra vedação na
Súmula 339, do STF; (g) deve ser observado o princípio da reserva legal e, ainda, a
necessidade de lei e dotação orçamentaria para a concessão de benefício ou aumento de
remuneração; e, ainda, (h), os juros e correção monetária devem observar o disposto no
artigo 1º-F, da Lei n. 9.494/97.

A pretensão recursal não prospera.

Com efeito, o artigo 58 e seus §§, da Lei Complementar nº 053/90,


estabelecem que:

Art. 58. As férias são afastamentos totais do serviço concedidos,


obrigatoriamente, aos policias-militares.
§ 1º. As férias deverão ser gozadas até o vigésimo quarto mês
subseqüente ao período aquisitivo.
§ 2º. Caso ocorra impossibilidade do gozo de férias ou haja
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interrupção pelos motivos previstos, o período de férias não gozadas será
computado dia-a-dia, em dobro no momento da passagem do
policialmilitar para a inatividade.

Portanto, conforme se observa, a legislação estadual militar não


prevê a conversão em pecúnia do período de férias não gozadas, com forma de
indenização mas, tão somente, o cômputo em dobro daquele no tempo de serviço do
policial, para todos os efeitos legais. É necessário esclarecer que, apesar de a legislação
estadual não dispor especificamente sobre o pagamento de indenização das férias não
gozadas pelo servidor público, ela também não o proíbe.

E, em que pese a legislação estadual silenciar a respeito, os direitos


assegurados constitucionalmente e insculpidos no inciso XVII do artigo 7º, c/c o artigo
39, § 3º, de nossa Magna Carta garantem aos trabalhadores urbanos e rurais, e, por
extensão, aos militares, o direito ao gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos,
um terço a mais do que o salário normal.

Assim, o servidor que deixar de usufruir férias, especialmente “por


extrema necessidade de serviço”, não perde o direito à indenização correspondente, nos
exatos termos do artigo 884 do atual Código Civil, prevendo: “Aquele que, sem justa
causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente
auferido, feita a atualização dos valores monetários.”

A lição de Diógenes Gasparini[1] não deixa dúvidas quanto ao dever


de indenização das férias não gozadas pelo servidor que preencheu os requisitos legais e
desligou-se do cargo, realçando que “...destinam-se ditos períodos à recuperação física
e mental dos servidores que permaneceram um ano à disposição da entidade a que se
ligam. Por essa razão, em princípio, não podem ser indenizadas. O servidor deve
desfrutá-las. [...] Após o primeiro ano, as férias devem ser indenizadas, quando do
rompimento do vínculo, à razão de um doze avos por mês trabalhado.”

Analisando caso semelhante, o Des. Rêmolo Letteriello teve a


oportunidade de se manifestar nos seguintes termos:

“Portanto impõe-se o dever de indenizar sempre que a


Administração, imbuída pelo princípio da manutenção do serviço público,
prejudicar direito subjetivo do servidor em prol do interesse público. Ou
seja, se o benefício das férias não é usufruído pelo servidor público, sob o
argumento de absoluta necessidade do serviço, impõe-se à indenização
correspondente, sob pena de enriquecimento indevido da administração.”

No caso em tela, não restam dúvidas quanto aos períodos de férias


não gozados pelo autor, porquanto, ainda que o recorrente tente fragilizar a certidão
emitida pela própria Polícia Militar (documento de página 22), há nos autos informação
de que o autor não usufruiu das férias referentes aos exercícios de 1980, 1981, 1982,
1985, 1986, 1999, 2001, 2002, 2003 e 2004.

Por oportuno, destaca-se:


Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
"5. BRASÃO. GOVERNO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO
SUL. SECRETARIA DE ESTADO DE JUSTIÇA E SEGURANÇA
PÚBLICA. QUARTEL DO COMANDO GERAL – POLÍCIA MILITAR.
DIRETOR DE PESSOA – CERTIDÃO Nº 012/DP – 1/2008. O DIREITO
DE PESSOAL DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MATO GROSSO
DO SUL, no uso de suas atribuições legais, CERTIFICA, para os devidos
fins, que JORGE FERNANDES – Coronel QOPM, Matrícula nº 202501-9,
é Policial Militar incluído em 16 de fevereiro de 1979, e levantamentos
feito em sua ficha funcional dão conta de que o mesmo deixou de gozar
férias referente aos seguintes exercícios: 1980, 1981, 1982, 1985, 1986,
1999, 2001, 2002, 2003 e 2004. Eu, ________, (assinatura ilegível),
Carlos Alberto Santos – Major QOPM, Chefe da Seção de Cadastro e
Avaliação da Diretoria de Pessoal da PMMS – DP-1 mandei pesquisar e
digitei. Por ser a expressão da verdade, firmo a presente certidão, que vai
devidamente assinadas pelo Sr. Direito de Pessoal e chancelada com o
carimbo da Corporação Policial Militar. (...)".

Logo, pela certidão emitida pelo Diretor da Polícia Militar do MS,


publicada no Boletim do Comando Geral n. 082, de 06/05/2008, resta cristalino que o
autor deixou de desfrutar dos períodos de férias destacados.

Ademais, é importante registrar que o processo administrativo


juntado aos autos não é suficiente para afastar o conteúdo da referida certidão, tampouco
é prova bastante de que o requerente tenha usufruído das férias em questão, pois, além
de constar que os registros funcionais dos servidores militares não fornecem dados
seguros e precisos quanto aos atos destes servidores (p. 33), em tal sistema não consta as
informações anteriores ao ano de 1999 (p. 36).

Assim, as alegações do requerido não são suficientes para afastar a


presunção de veracidade que paira sobre referida certidão.

Lado outro, o pedido inicial não encontra óbice no enunciado n. 339,


da súmula do STF, pois, na hipótese dos autos, não se está por aumentar os vencimentos
do policial militar, mas apenas indenizá-lo pelo período de férias não usufruído.

Pelo mesmo motivo, a tese do recorrente quanto à necessidade de


observância aos princípios da reserva legal, e, ainda, da necessidade de lei e dotação
orçamentária para a concessão de benefício ou aumento de remuneração também não
encontra amparo, eis que, como já dito, a condenação do Estado não tem como objetivo
implantar aumento ou conceder benefício ao policial militar, mas garantir o pagamento
de indenização pelo período de férias não gozado.

Destarte, tendo em vista que as férias consubstanciam uma garantia


do servidor, e apesar de à primeira vista prestarem-se apenas para o descanso do
trabalho, o seu caráter pecuniário não pode ser desconsiderado.

O fato é que os serviços prestados pelo autor beneficiaram a


Administração Pública, que não pode locupletar-se com o trabalho do servidor, sem
efetuar a devida indenização, sob o argumento de falta de amparo legal.
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Como bem estabelecido na sentença, o requerido deverá efetuar


apenas o pagamento do valor relativo ao período integral das férias vencidas e não
pagas, acrescidas do terço constitucional e de juros e correção monetária.

A propósito:

“E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – COBRANÇA – POLICIAL


MILITAR – FÉRIAS VENCIDAS E NÃO GOZADAS – NECESSIDADE DO
SERVIÇO – NÃO COMPUTADAS EM DOBRO NA OCASIÃO DA
PASSAGEM PARA A RESERVA REMUNERADA – INDENIZAÇÃO –
CABÍVEL – 1/3 CONSTITUCIONAL DEVIDO – JUROS MORATÓRIOS –
6% AO ANO – APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 9.494/97 –
INCIDÊNCIA A PARTIR DA CITAÇÃO VÁLIDA – CORREÇÃO
MONETÁRIA – APLICAÇÃO DO IGPM/FGV – ÍNDICE QUE MELHOR
REFLETE A INFLAÇÃO DO PERÍODO – SENTENÇA REFORMADA –
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
O servidor público que se aposenta sem ter gozado férias que lhe
eram devidas faz jus à indenização pecuniária correspondente a esse
período, sob pena de locupletamento indevido por parte da administração,
com incidência de mais 1/3 constitucional. (...)” (Apelação Cível -
Ordinário - N. 2007.012710-1, Relator Des. Rêmolo Letteriello, 4ª Turma
Cível, j. 11.3.2008).

Sobre a atualização do valor devido, anoto as seguintes


considerações.

Em razão da entrada em vigor da Lei n. 11.960, em 30 de junho de


2009, que deu nova redação ao art. 1º-F, da Lei n. 9.494/97, o débito contra a Fazenda
Pública sofrerá "incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais
de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança".

A orientação do Superior Tribunal de Justiça, firmada pela Corte


Especial no julgamento do EREsp 1.207.197/RS, era de que em todas as condenações
impostas à Fazenda Pública, para fins de atualização monetária, remuneração do capital
e compensação da mora, incidiria, uma única vez, até o efetivo pagamento, os índices
oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, consoante a
redação do artigo 1º-F da Lei 9.494/97, alterado pelo art. 5º da Lei 11.960/09,
disposições que devem ser aplicadas aos processos em curso à luz do princípio do
"tempo rege o ato", reconhecendo-se a natureza processual da norma.

Desta forma, a partir de 29/06/2009, em qualquer condenação


imposta à Fazenda Pública, aplicavam-se os ditames da Lei n. 11.960/09, ou seja, no
cálculo da correção monetária e dos juros das condenações proferidas contra a Fazenda
Pública, observando as alterações introduzidas pela norma acima, mas a partir da data
de sua vigência. No período anterior, tais acessórios seguem os parâmetros definidos
pela legislação então vigente.

Todavia, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no


Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
julgamento da ADIN n. 4.357/DF, declarou a inconstitucionalidade parcial, por
arrastamento, do artigo 5º, da referida Lei. Assim, o Plenário do Supremo Tribunal
Federal, ao apreciar, em julgamento conjunto, a ADI 4.357/DF, a ADI 4.372/DF e a
ADI 4.425/DF, o eminente Ministro Luiz Fux, julgou procedentes, em parte, em sessão
realizada no dia 14/03/2013, os pedidos então formulados, vindo a declarar a
inconstitucionalidade, entre outros dispositivos, da expressão "índice oficial de
remuneração da caderneta de poupança", contida no art. 100, § 12º, da Constituição
Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 62/2009.

Contudo, em recentíssima decisão do Supremo Tribunal Federal


foram modulados os efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei
9.494/97 em relação à correção monetária (ADINs 4425 e 4357).

O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar questão de ordem nos autos


das ADINs 4425 e 4357, conferiu eficácia prospectiva à declaração de
inconstitucionalidade, fixando como marco inicial, para que se deixe de aplicar a regra
do art. 1º-F da Lei 9.494/07, quanto à correção monetária, a data de conclusão do
julgamento da referida questão de ordem, ou seja, 25/03/2015. Veja-se:

"(...) fica mantida a aplicação do índice oficial de remuneração


básica da caderneta de poupança (TR), nos termos da Emenda
Constitucional nº 62/2009, até 25.03.2015, data após a qual (i) os créditos
em precatórios deverão ser corrigidos pelo Índice de Preços ao
Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) e (ii) os precatórios tributários
deverão observar os mesmos critérios pelos quais a Fazenda Pública
corrige seus créditos tributários; e 2.2.) ficam resguardados os
precatórios expedidos, no âmbito da administração pública federal, com
base nos arts. 27 das Leis nº 12.919/13 e Lei nº 13.080/15, que fixam o
IPCA-E como índice de correção monetária."

Desse modo, com a publicação da referida ata de julgamento no


Diário de Justiça - ATA Nº 7, de 19/03/2015. DJE nº 67, divulgado em 09/04/2015 - e
diante do efeito vinculativo de referida decisão, deve ser mantida a aplicação integral da
regra prevista no art. 1º-F da Lei 9.494/97, até 25/03/2015, seja em relação aos juros,
seja em relação à correção monetária, a qual passará a incidir pelo IPCA-E, somente
depois dessa data.

Em resumo, chega-se à seguinte conclusão: se houverem parcelas a


serem pagas anteriores a 29/06/2009, os juros de mora deverão incidir no percentual de
6% ao ano, nos termos da redação original do art. 1º-F, da Lei n. 9.494/97, e a correção
monetária pelo INPC; se houverem parcelas a serem pagas após 29/06/2009 e até
25/03/2015, os juros de mora e a correção monetária terão incidência, uma única vez,
até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à
caderneta de poupança (art. 5º, da Lei n. 11.960/2009); e, por fim, se houverem parcelas
a serem pagas após 25/03/2015, aos juros de mora deverão ser aplicados os mesmos
índices da poupança e à correção monetária adotar-se-á o IPCA-E.

Ainda, em reexame necessário, observo que os honorários


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advocatícios devidos pelo Estado devem ser fixados conforme a regra do o artigo 85, §
4º, inciso II2, do Código de Processo Civil "não sendo líquida a sentença, a definição
do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando
liquidado o julgado".

Logo, diante da ausência de liquidez da sentença, o percentual a que


ficará o Estado de Mato Grosso do Sul responsável pelo pagamento em favor do autor, a
título de honorários de sucumbência, somente restará fixado quando liquidado o
julgado.

Ainda, em se tratando de sentença publicada após a entrada em vigor


do Código de Processo Civil, há de ser observado o disposto em seu artigo 85, § 11:

"A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado


do vencedor.
(...)
§ 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados
anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau
recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2o a 6o, sendo
vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao
advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos
nos §§ 2o e 3o para a fase de conhecimento."

Portanto, cabível, ainda, a majoração dos honorários advocatícios


sucumbenciais.

Por fim, quanto ao prequestionamento, entendo que não é necessária


a manifestação expressa do julgador quanto a todos os dispositivos legais e argumentos
suscitados pelas partes para que esteja cumprido o requisito exigido pelas Cortes
Superiores para eventual interposição de recurso extremo, bastando que a matéria tenha
sido suficientemente debatida e esteja adequadamente fundamentada.

Diante do exposto, conheço dos recursos voluntário e obrigatório e


dou-lhes parcial provimento apenas para determinar, quanto à atualização do valor
devido, que, para as parcelas a serem pagas anteriores a 29/06/2009, os juros de mora
deverão incidir no percentual de 6% ao ano, nos termos da redação original do art. 1º-F,
da Lei n. 9.494/97, e a correção monetária pelo INPC; se houverem parcelas a serem
pagas após 29/06/2009 e até 25/03/2015, os juros de mora e a correção monetária terão
incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração
básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art. 5º, da Lei n. 11.960/2009); e, por
fim, se houverem parcelas a serem pagas após 25/03/2015, aos juros de mora deverão
ser aplicados os mesmos índices da poupança e à correção monetária adotar-se-á o IPCA-
E.

2 "Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.


(...)
§ 4o Em qualquer das hipóteses do § 3o:
(...)
II - não sendo líquida a sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente
ocorrerá quando liquidado o julgado;" (Destaquei)
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
Ainda, o percentual a que ficará o Estado de Mato Grosso do Sul
responsável pelo pagamento em favor da autora a título de honorários de sucumbência,
bem como os devidos a título de honorários recursais, somente restará fixado quando
liquidado o julgado.

D E C I S Ã O
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

POR UNANIMIDADE, DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO


RECURSO E RETIFICARAM PARCIALMENTE A SENTENÇA EM REEXAME
NECESSÁRIO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Presidência do Exmo. Sr. Des. Vilson Bertelli


Relator, o Exmo. Sr. Des. Marcos José de Brito Rodrigues.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Des. Marcos José de
Brito Rodrigues, Des. Vilson Bertelli e Des. Paulo Alberto de Oliveira.

Campo Grande, 15 de março de 2017.

eg

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