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KELSEN
Texto-base: KELSEN, Hans. Teoria pura do direito, 2012 (Capítulo VIII – A interpretação)
1.2. Fala, nesse sentido, em interpretação dos mais diversos textos normativos: i) da
lei – quando se fixa “o conteúdo que se há de dar à norma individual de uma
sentença judicial ou de uma resolução administrativa, norma essa a deduzir da
norma geral da lei na sua aplicação a um caso concreto” –; ii) da Constituição (no
processo legislativo); iii) do direito internacional; e, mesmo, iv) das normas
individuais (sentenças judiciais, ordens administrativas e negócios jurídicos).
1.3. Também os indivíduos, complementa, na medida em que têm não de aplicar, mas
de observar o Direito, precisam compreender e, destarte, determinar o sentido
da norma. Isto é, interpretá-la (p. 387).
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2. Distingue, então, duas espécies de interpretação:
ii) Interpretação não autêntica, “a interpretação do Direito que não é realizada por
órgão jurídico (órgão aplicador do Direito) mas por uma pessoa privada e,
especialmente, pela ciência jurídica” (p. 388).
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3.2. Determinação nunca é total/completa. Moldura:
3.3. Indeterminação pode ser intencional (p. 388-389) ou não intencional. Em relação
à indeterminação não-intencional do ato de aplicação do Direito. Menciona,
aqui, três situações:
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4. Direito a aplicar forma uma moldura dentro da qual existem várias
possibilidades de aplicação:
O Direito a aplicar forma, em todas estas hipóteses, uma moldura dentro da qual
existem várias possibilidades de aplicação, pelo que é conforme o Direito todo ato
que se mantenha dentro deste quadro ou moldura, que preencha esta moldura em
qualquer sentido possível (p. 390).
(...) a interpretação de uma lei não deve necessariamente conduzir a uma única
solução como sendo a única correta, mas possivelmente a várias soluções que (...)
têm igual valor, se bem que apenas uma delas se torne Direito positivo no ato do
órgão aplicador do Direito (...) Dizer que uma sentença judicial é fundada na lei não
significa, na verdade, senão que ela se contém dentro da moldura ou quadro que a
lei representa – não significa que ela é a norma individual, mas apenas que é uma
das normas individuais que podem ser produzidas dentro da moldura da norma
geral (p. 390-391);
5. Teoria tradicional.
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A interpretação deveria desenvolver um método que tornasse possível preencher
ajustadamente a moldura prefixada. A teoria usual da interpretação quer fazer crer
que a lei, aplicada ao caso concreto, poderia fornecer, em todas as hipóteses,
apenas uma única solução correta (ajustada), e que a “justeza” (correção) jurídico-
positiva desta decisão é fundada na própria lei. Configura o processo desta
interpretação como se se tratasse tão-somente de um ato intelectual de clarificação
e de compreensão, como se o órgão aplicador do Direito apenas tivesse que pôr em
ação o seu entendimento (razão), mas não a sua vontade, e como se, através de
uma pura atividade de intelecção, pudesse realizar-se, entre as possibilidades que
se apresentam, uma escolha correta (justa) no sentido do Direito positivo (p. 391)
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possibilidades em aberto, ou seja, não conterem ainda qualquer decisão sobre a
questão de saber qual dos interesses em jogo é o de maior valor, mas deixarem
antes esta decisão, a determinação da posição relativa dos interesses, a um ato de
produção normativa que ainda vai ser posto – a sentença judicial, por exemplo (p.
392).
(...) de um ponto de vista orientado para o Direito positivo, não há qualquer critério
com base no qual uma das possibilidades inscritas na moldura do Direito a aplicar
possa ser preferida à outra. Não há absolutamente qualquer método – capaz de ser
classificado como de Direito positivo – segundo o qual, das várias significações
verbais de uma norma, apenas uma possa ser destacada como “correta” – desde
que, naturalmente, se trate de várias significações possíveis: possíveis no confronto
de todas as outras normas da lei ou da ordem jurídica (p. 391).
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Diferença quantitativa entre legislação e jurisdição. Criação do direito
A tarefa que consiste em obter, a partir da lei, a única sentença justa (certa) ou o
único ato administrativo correto é, no essencial, idêntica à tarefa de quem se
proponha, nos quadros da Constituição, criar as únicas leis justas (certas). Assim
como da Constituição, através de interpretação, não podemos extrair as únicas leis
corretas, tampouco podemos, a partir da lei, por interpretação, obter as únicas
sentenças corretas.
De certo que existe uma diferença entre estes dois casos, mas é uma diferença
somente quantitativa, não qualitativa, e consiste apenas em que a vinculação do
legislador sob o aspecto material é uma vinculação muito mais reduzida do que a
vinculação do juiz, em que aquele é, relativamente, muito mais livre na criação do
Direito do que este. Mas também este último é um criador do Direito e também ele
é, nesta função, relativamente livre. Justamente por isso, a obtenção da norma
individual no processo de aplicação da lei é, na medida em que nesse processo seja
preenchida a moldura da norma geral, uma função voluntária (p. 393).
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Na medida em que, na aplicação da lei, para além da necessidade de fixação da
moldura dentro da qual se tem de manter o ato a pôr, possa ter ainda lugar uma
atividade cognoscitiva do órgão aplicador do Direito, não se tratará de um
conhecimento do Direito positivo, mas de outras normas que, aqui, no processo de
criação jurídica, podem ter a sua incidência: normas da Moral, normas de Justiça,
juízos de valor sociais que costumamos designar por expressões correntes como
bem comum, interesse do Estado, progresso, etc. Do ponto de vista do Direito
positivo, nada se pode dizer sobre sua validade e verificabilidade. Deste ponto de
vista, todas as determinações desta espécie apenas podem ser caracterizadas
negativamente: são determinações que não resultam do próprio Direito positivo.
Relativamente a este, a produção do ato jurídico dentro da moldura da norma
jurídica aplicanda é livre, isto é, realiza-se segundo a livre apreciação do órgão
chamado a produzir o ato (p. 393).
Este ato de vontade é o que distingue a interpretação jurídica feita pelo órgão
aplicador (autêntica), de toda e qualquer outra interpretação (em especial, a feita
pela ciência jurídica) (p. 394).
A propósito importa notar que, pela via da interpretação autêntica, quer dizer, da
interpretação de uma norma pelo órgão jurídico que tem de aplicar, não somente se
realiza uma das possibilidades reveladas pela interpretação cognoscitiva da mesma
norma, como também se pode produzir uma norma que se situe completamente
fora da moldura que a norma a aplicar representa (p. 394).
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(...) é pura determinação cognoscitiva do sentido das normas jurídicas.
Diferentemente da interpretação feita pelos órgãos jurídicos, ela não é criação
jurídica. A ideia de que é possível, através de uma interpretação simplesmente
cognoscitiva, obter Direito novo, é o fundamento da chamada Jurisprudência dos
conceitos, que é repudiada pela teoria Pura do Direito. A interpretação
simplesmente cognoscitiva da ciência jurídica também é, portanto, incapaz de
colmatar as pretensas lacunas do Direito. O preenchimento da chamada lacuna do
Direito é uma função criadora de Direito que somente pode ser realizada por um
órgão aplicador (...) (p. 395).
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(...) nenhuma vantagem política pode justificar que se faça uso desta ficção numa
exposição científica do Direito positivo, proclamando como única correta, de um
ponto de vista científico objetivo, uma interpretação que, de um ponto de vista
político subjetivo, é mais desejável do que uma outra, igualmente possível do ponto
de vista lógico. Neste caso, com efeito, apresenta-se falsamente como uma verdade
científica aquilo que é tão-somente, um juízo de valor político (p. 396).
(...) pode mostrar à autoridade legisladora quão longe está a sua obra de satisfazer
à exigência técnico-jurídica de uma formulação de normas jurídicas o mais possível
inequívocas ou, pelo menos, de uma formulação feita por maneira tal que a
inevitável pluralidade de significações seja reduzida a um mínimo e, assim, se
obtenha o maior grau possível de segurança jurídica (p. 397).
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