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Rio de Janeiro
2003
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II
Rio de Janeiro
2003
III
Examinadores:
Profº Drº_____________________________________________
Rio de Janeiro
2003
IV
Ficha Catalográfica
Agradecimentos
apresentações dos eventos acadêmicos de que participei e, fez junto com o profº Ciro
Cardoso(UFF-CEIA), as avaliações pertinentes à pesquisa quanto ao exame de
qualificação. Devo lembrar-me da profª Regina Cândido, a qual concedeu-me a
oportunidade de fazer um curso preparatório de Teoria e Método em História
Antiga(UERJ-NEA), visando os exames de seleção de Mestrado. Lembro-me também,
do auxílio prestado pelas professoras Lenice Gomes e Mônica Selvatici que
contribuíram nas traduções das línguas estrangeiras. A todos os amigos do LHIA,
minha gratidão pelo encorajamento prestado durante todo o curso.
RESUMO
ABSTRACT
ÍNDICE
INTRODUÇÃO, 1
5. CONCLUSÃO, 95
6. BIBLIOGRAFIA, 101
1
INTRODUÇÃO
1
(s/a. In: Padres Apologistas, 1995: 19-30). Esta epístola é integrada ao gênero literário da apologética
cristã. Segundo H. I. Marrou, é provável que tenha sido escrita no final do séc. II por volta dos anos 190-
200 d.C., destinada a um pagão culto.
2
Segundo os registros neotestamentários(A.D.), os discípulos de Cristo foram chamados de
cristãos(Cristianou,j ) pela primeira vez, na cidade de Antioquia(Atos dos Apóstolos, 11: 26).
3
4
Ao fazermos menção às condições de aparecimento não es tamos nos referindo à origem, mas sim,
tomando por referência as proposições defendidas por Foucault quanto à análise do discurso, nas séries de
formações discursivas, quando efetivamente se constituem, nas margens de sua contingência, o “lugar” de
acontecimento. Conferir em A ordem do Discurso. São Paulo: Edições Loyola, 2001.
3
“O Império Romano teve na cidade o foco essencial para difundir uma forma de vida
comum que integrasse a comunidade. A cidade foi a célula -base do sistema imperial romano,
tanto no plano político, econômico, social, cultural e religioso. (...) A religião oficial era um
componente importante da vida cívica pois o culto público sedimentava a solidariedade entre a
comunidade. Uma forma de expressão de fidelidade a Roma era a observância das práticas
religiosas, que faziam parte integrante da civilização romana. (BUSTAMANTE, R. 1999: 326).
5
É assim que determinado grupo se enxerga, identificando-se e marcando a diferença para que exista;
pressupõe o não reconhecimento de nunhuma partilha de elementos identitários com o outro, oposto.
Utilizaremos neste trabalho, o termo politeísmo em relação às múltiplas divindades reverenciadas pelas
distintas manifestações religiosas presentes no Império Romano e, politeísta, aos adoradores dessas
múltiplas divindades. Esses termos serão empregados em substituição ao paganismo e pagão(paganus),
expressões utilizadas pejorativamente, segundo P. Brow, só a partir do IV século d.C. na litertura
cristã(1997: 41)
4
Dentro deste contexto do Império Romano do IIº ao IIIº século d.C, pretendemos
focalizar o conflito entre monoteístas e politeístas. Por outro lado, no seio deste
conflito pretendemos identificar pela análise dos discursos apologéticos aqueles que
passaram a ser chamados ou se auto denominaram de cristãos, construindo sistema de
representações de uma identidade diferenciada que se contrapunha àquela
institucionalizada e legitimadora do status quo6 .
6
Principalmente nos referimos as elites dominantes que afirmavam uma moral distanciadora entre os
“superiores” e seus “inferiores”.
5
Fazemos uso das construções teóricas na perspectiva dos estudos culturais acerca da
identidade e diferença, categorias consideradas interdependentes 7 . Kathryn Woodward
e Tomaz Tadeu da Silva(2000: 9; 74) defendem que a própria definição de identidade se
complementa na diferença, pois toda identidade se define pelo o que ela não é. Essa
diferença é sustentada pela exclusão, pressuposto que já inclui a análise das relações
sociais vividas num contexto cultural específico. No interior dessas relações as
identidades assumidas operam o processo de incluir/excluir, demarcando fronteiras
entre nós/eles e classificando, o que significa dividir e ordenar o mundo social em
grupos e hierarquizar, privilégio de atribuir diferentes valores aos grupos assim
classificados(SILVA, T. 2000: 82). Identidade e diferença são resultado de um
processo de produção simbólica e discursiva, onde se operam relações de poder. Para
Stuart Hall essa operação se efetiva à medida em que “as identidades são construídas
dentro do discurso, produzidas em locais históricos e institucionais específicos, no
interior de formações e práticas discursivas específicas, por estratégias e iniciativas
específicas”(2000: 109).
7
Temos como base conceitual as análises teóricas desenvolvidas por três pesquisadores reunidos em uma
só obra: Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. SILVA, T. T.(org), HALL, S., e
WOODWARD, K. Petrópolis,RJ: Vozes, 2000.
8
Haja vista as discussões diferenciadas operadas por distintas tendências dogmáticas no cristianismo.
6
Outra consideração teórica a ser feita diz respeito ao papel da linguagem neste
processo de produção simbólica, uma vez que, interpretaremos a identidade e diferença
como resultados de atos de criação lingüística, como produtos do mundo cultural e
social; identidades têm que ser nomeadas, compreendidas dentro de sistemas de
significação nos quais adquirem sentido(SILVA, T. 2000: 76,77). Todo esse esforço se
traduz num trabalho discursivo que procura dar uma unidade, uma forma construída de
fechamento. A construção da identidade cristã em Orígenes, será analisada neste
processo de elaboração discursiva. Isto corresponde à elaboração de uma representação
social, que segundo Moscovici, se verifica através de dois processos: o da objetivação9 ,
em que se concede um contorno à determinadas idéias ou noções; o da ancoragem que
visa assegurar a vinculação social da representação entre os membros de um mesmo
grupo, operando a atribuição de um valor funcional a seu conteúdo específico, uma vez
que “as representações integram, com efeito, conhecimentos essenciais, do ponto de
vista instrumental e no nível do sentido comum, com a finalidade de que todos os
membros de um determinado grupo recorram a um mesmo capital
cognitivo”(MOSCOVICI, S. apud CARDOSO, C. 2000: 9, 10). Por conseguinte, as
representações sociais têm entre suas características a de facilitar a comunicação,
justamente por assegurar este capital cognitivo comum entre seus membros(Ibid.,
2000: 23). De fato identificamos nas narrativas de Orígenes em Contra Celso, a
vontade de esclarecer seu público, principalmente ao dirigir-se aos débeis na fé, para
9
Para o autor compreende três fases: da construção seletiva, da esquematização estruturante e da
naturalização(MOSCOVICI, S. apud CARDOSO, C. 2000: 9).
7
familiarizá- los com a doutrina cristã 10 , a fim de que os mesmos não se deixem levar por
falsos discursos, e ao mesmo tempo se identifiquem com todo o conteúdo simbólico
correspondente à fé cristã.
10
“nosso empenho principal é familiarizar, no possível, a todos os homens com a totalidade das
doutrinas cristãs.” (Contra Celso, VIII, 52).
8
Nosso recorte temático, incide sobre uma série de narrativas, dando ênfase ao
lugar das palavras, ou melhor, do discurso na história, produzindo efeitos de sentido.
Averil Cameron (1986) situa esta necessidade entre os pesquisadores do cristianismo e
paganismo, de irem além de um aspecto puramente religioso ainda cercado de
concepções gibbonianas que identificam o Império Romano cercado de superstição e
credulidade. A autora propõe uma exp lanação mais centrada deste fenômeno histórico
ressaltando que “as origens sociais do cristianismo primitivo teve um longo percurso; é
tempo de retornar à sua interpretação” (1986: 270). A. Cameron assim louva os
esforços contemporâneos em voltarem sua atenção para a linguagem, seja quanto à
textualidade, ou mesmo no sentido mais amplo de Foucault, o discurso. Este último é o
sentido por nós adotado nesta pesquisa. Foucault relaciona o discurso à noção de
11
Proposta de análise que se aproxima à escola de discurso francesa, cujos nomes mais influentes foram
Michel Foucault e Michel Pêcheux, em PINTO, M. J. Comunicação e discurso: introdução à análise de
discursos. São Paulo: Hacker Editores, 1999. Conferir nos próximos parágrafos uma maior aplicação
conceitual do discurso.
9
12
Para Pêcheux, significa se remeter a uma formação discursiva, à configurações específicas, dentro de
condições sócio-históricas dadas. (In: ORLANDI, E. 2001 ; BRANDÃO, H. 1996).
13
Para uma delimitação mais precisa do nosso objeto de estudo discutiremos sobre
um campo de posições historiográficas firmadas nas décadas de 80 e 90 do século
passado, que na medida do possível têm tentado abarcar o cristianismo como processo
histórico, sob diferentes formas e tendências. Estabelecemos um diálogo entre as
abordagens históricas, sociólogicas e antropológicas, a fim de que nossas análises não
ficassem restritas à interpretação da religião cristã apenas como um sistema fechado de
crenças. As abordagens a seguir procuram observar a inserção histórica deste fenômeno
religioso no Império Romano, as interações sociais mantidas com diferentes
representações, e como os cristãos propõem agir sobre essa realidade. As antigas
representações que identificavam o indivíduo na ordem do social, foram contrapostas às
representações que tendiam a valorizar a pessoa com Deus. Esses pressupostos
colocaram novas significações simbólicas em debate. Frente a este conjunto de análise
nos aproximaremos de certos pressupostos conceituais, como também nos
distanciaremos à sua medida. Problematizamos estes enfoques, a partir do seguinte
enunciado:
“Há uma nova raça de homens nascida ontem, sem pátria, nem tradições,
unidos contra todas as religiões e instituições civis, perseguidos pela justiça,
universalmente notórios por sua infâmia, mas gozando de uma execração
comum: são os cristãos” 14
14
Para os pesquisadores, esses enunciados constituem o início do Prefácio da suposta obra de Celso, a
“Doutrina Verdadeira” (In: ROUGIER, L. 1999: 39).
16
15
KEE, H. C. “Identidade social e pessoal em uma nova comunidade”. In: As origens cristãs em
perspectiva sociológica. São Paulo: Paulinas, 1983.
16
BEAUDE, P. “L’Identité Chrétiénne”. In: Premiers chrétiens, premiers martyrs. Paris: Gallimard,
1993.
17
DUARTE & GIUMBELLI. “As concepções cristã e moderna da pessoa: paradoxos de uma
continuidade”. In: Anuário Antropológico. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993.
17
paradoxos, com tensões. Os cristãos então subordinam sua vida no mundo a um ideal
supremo. Vejamos de forma mais pormenorizada cada uma delas.
18
KEE, H. C. op. cit.
19
BEUADE, P. M. op. cit.
18
a sua definição no Ocidente moderno. A noção cristã de Pessoa é analisada por esses
antropólogos, como que desenvolvendo-se justamente por paradoxos. Três princípios
estruturantes são então expostos: verdade, interioridade e vontade. Segundo Duarte e
Giumbelli, a religião cristã fez dessa tríade estruturante um imperativo de
necessidade(1993: 70).
20
Esta categoria é analisada por Dumont no capítulo “Do Indivíduo-fora-do-mundo ao Indivíduo-no-
mundo”, in: O Individualismo: uma perspectiva antropológica da ideologia moderna. Rio de Janeniro:
Rocco, 1985.
20
Ampliando nossas leituras, queremos nos referir a um quarto estudo que suscita
um debate interessante sobre o tema, surgido na historiografia atual, de uma leitura
diferenciada que se apresenta num trabalho recentemente publicado por Richard
Sennett, em Carne e Pedra: o corpo e a cidade na civilização ocidental(1997).
Percebendo a singularidade do fenômeno social e religioso que analisamos, Sennett
indica dois fundamentos sociais do cristianismo que envolvem a questão da construção
da identidade, a saber: a doutrina da igualdade entre os seres humanos (homem e
mulher) e a aliança com os corpos vulneráveis: os pobres, os desamparados e os
oprimidos. Com este olhar, foi capaz de identificar os elementos que formaram o
alicerce da religião cristã, principalmente quanto aos seus valores essenciais, estando
atento à sua especificidade. Tecendo comparações com a celebração da nudez, do corpo
pelos gregos e com as fórmulas olhar e acreditar, olhar e obedecer dos romanos, Sennett
defende que a cristandade abala esses pilares e desafia-os (pressupostos que se
aproximam das considerações de Duarte e Giumbelli de forma mais categórica) . A sua
forma de abordagem do problema é altamente significativa, já que expõe a quebra de
modelos então vigentes pelos praticantes da religião cristã, vivenciando uma nova
moral, sob novos valores, desafiando as regras do espaço urbano, a cidade, e
defendendo uma divisão entre política e religião. O autor indica a construção de uma
outra representação, da subjetividade vivida no social que se contrapunha à
21
mencionados aqui, a nosso ver trazem uma grande contribuição para a aná lise do nosso
objeto, uma vez que:
Ainda Marc Augé, ratifica que a distância entre cristianismo e politeísmo passa
na realidade, pelas diferentes representações da vida, do homem, e, mais precisamente,
do indivíduo, examinado dentro dos diversos aspectos da vida social21 . Portanto com
esta dissertação pretendemos identificar os cristãos na rede de relações, de interações
recíprocas entre o individual e o social, verificando a interdependência que mantiveram
com as comunidades, com as Igrejas, o lugar onde desenvolveram a “comunhão”, a
aceitação, a identificação, o reconhecimento da devoção que particularizava este
agrupamento religioso.
21
ENCICLOPÉDIA EUNAUDI, “Religião”, 1994: 208.
22
Nos referimos ao apologista Orígenes como representante de toda a culminância do movimento
apologético no IIIº d.C. , bem como outros por nós selecionados como referências neste gênero literário
que correspondem ao IIº século d.C.: Aristides de Atenas, Teófilo de Antioquia, Atenágoras, a “Carta a
Diogneto” e Hermias o filósofo.
23
Este pequeno texto nos introduz na complexidade das relações sociais frente à
diversidade dos sistemas religiosos no mundo romano colocando em relevo as questões
de identidade e conflitos surgidos entre politeísmo e monoteísmo, e suas distintas
representações. Uma vez que a identidade cultural é construída no social, ela participa
da complexidade, historicamente variável, das estruturas sociais. Faz-se necessário
contextualizar a entidade sócio-política que possibilitou a emergência deste contexto de
interações marcado pela diversidade.
romano, numa dinâmica de não exclusão das diversidades culturais locais, mas também,
criando espaços de ambigüidades.
23
J. Sheid observa que para participar ativamente nas decisões públicas e para intervir nos destinos do
povo romano, uma divindade devia inicialmente ser apreendida formalmente pelos magistrados
(1998: 123-142). Imaginemos essa peculiaridade em relação à investida do imperador como Pontífex
Maximus, “o augusto” pleno de força sobrenatural que regia as prerrogativas cultuais. Nesse
entendimento tanto magistrados, como sacerdotes e imperadores estavam envolvidos nos ritos cultuais
públicos e demonstram acompanhar este modelo comunitário, uma vez que os deuses não se
manifestavam de forma pessoal.
24
“crer” nos deuses é traduzido de maneira prática, isto é, uma prática social e política enquanto costume
da cidade, onde os membros do grupo social lhes oferecem sacrifícios, freqüentam seus altares;
reconhecem sua presença por meio do conjunto do que lhe é devido: sacrifício, canto, danças, preces,
purificações, “ritos”; “crer” nos deuses é também uma forma de dizer que se têm relações com eles, que
se têm comércio com eles, que se procura a sua companhia(SISSA,G. e DETIENNE,M. 1990: 203-215).
26
Religio, não era um sistema objetivo de seres, de coisas, de crenças que foram
impostas aos homens segundo uma revelação. Definia uma atitude humana na
observância rigorosa a um conjunto de rituais e cultos, os quais ligavam os homens aos
deuses. Tal prática reforçava a coesão social e a preservação da memória do passado à
medida em que era transmitido pela família. Faz-se necessário perceber que religio não
designava o elo sentimental, direto e pessoal do indivíduo com uma divindade, mas um
conjunto de regras formais e objetivas, legadas pela tradição(SHEID, J. 1998: 22-28).
Nas apologias encontramos como uma das questões em debate a alusão feita pelos
defensores do politeísmo à memória reproduzida por séculos de história com relação à
antiguidade de seus mitos fundadores25 , à tradição religiosa como sinal de legitimidade
da prática politeísta e podemos até dizer de identificação, em contraposição ao
monoteísmo cristão. O filósofo neoplatônico Celso, por exemplo, inquietava-se com o
discurso cristão e teceu esforços no sentido de desacreditá- lo argumentando o
25
Esse aspecto ém bem discutido em Eustáquio Salor,Polémica entre cristianos y paganos, pp. 31-136.
27
aparecimento repentino do cristianismo, “nascido como que de golpe”, alegando ser este
uma espécie de plágio da doutrina judaica, senão “bárbara”26 .
26
Todo o livro primeiro de Contra Celso, por Orígenes é destinado a contra-argumentar este pensamento
de Celso.
28
Por outro lado, o seu cerimonial era um fator de integração social. Era um
momento para a exibição e afirmação da hierarquia social local, pois o colégio dos
Augustales, sacerdotes encarregados dos empreendimentos do culto socializou os
libertos e integrava os pobres. Além disto, o cerimonial do culto incluía a distribuição
de presentes , alimentos e vinho, algo que pode ser interpretado como uma tentativa de
se buscar a unanimidade de participação das diferentes classes sociais municipais.
27
Este termo é bastante esteriotipado, convêm atentar para sua reinterpretação, na qual aponta estes cultos
provenientes de regiões e civilizações independentes e bastante disitintas entre si, como o Egito, Anatólia,
Pérsia e Síria. Portanto os diversos cultos não podem ser entendidos de forma homogênea.
29
Dominam a cena religiosa do século I ao III d.C., caminhando para alterações com a
crise política sofrida pelo império no século III d.C. Esta dive rsidade marca a
efervescência de cultos que se projetam e adaptam-se ao panteão romano ou mesmo
sobrepondo-se e modificando o sistema religioso tradicional.
relação aos companheiros de crença que não tinha em consideração as barreiras sociais,
como por exemplo, a admissão de indivíduos provenientes de vários extratos da
sociedade, de meios populares, porém conservando certa hierarquização em seus
quadros litúrgicos.
28
Contra Celso, I, 26,27,59; V,62, etc. Refere-se a gregos, a bárbaros,etc.
31
29
Questão que será mais desenvolvida no quarto capítulo.
32
forças divinas sob a hegemonia de um deus sobre outros deuses ou a acumulação dos
símbolos e imagens dos deuses mais poderosos em um santuário privilegiado(BAYET,
J. 1984: 254). Tal foi o caso do imperador Heliogábalo (218-222 d.C.) com a adoração
ao deus Sol e que transferiu ao seu templo antigos protetores mágicos do poderio
romano(BAYET, J. 1984: 264). O culto público do Sol representou o símbolo de
divindade suprema, fonte de vida física e de iluminação intelectual. Essas expressões
religiosas marcaram as cidades greco-orientais, regiões originárias e impulsionadoras de
todas essas tendências. As condições de produção da identidade cristã atravessam este
contexto de mudanças e transformações, e acompanha a demanda de cultos que tinham
se estruturado em sistemas passíveis de adaptação fora da sua comunidade de origem.
30
As mesmas ideologias estão presentes em Atenágoras de Atenas, Petição em favor dos cristãos, 4;
Teófilo de Antioquia, A Autólico, 11.
31
É interessante este tipo de discurso porque projeta-se um autor fisicamente inexistente, porém é
interpelado ideologicamente, como se estivesse de viva voz ali presente, em função de construir posições
distintas, de remarcar essas diferenças e afirmar conhecimentos, reconhecer identidades e alteridade.
32
A particularidade cristã será enfaticamente analisada no último capítulo. No momento sua aferição será
de caráter introdutório.
34
33
Segundo H. C. Kee, a conversão envolve todo um processo de transição das “trevas” para a “luz”, do
caos para o sentido. Nessa experiência, atesta-se um novo ambiente de vida e a nova identidade que por
meio dela se estabelece. Isto se dá pelas ações da comunidade, pelas quais essa apóia e acolhe o iniciado.
O autor discute toda esta questão no capítulo, “Identidade social e pessoal em a nova comunidade”,
conforme mencionamos na introdução, nos debates historiográficos.
35
34
Na interpretação politeísta o termo superstitio poderia significar uma crença em que o adorador no ato
de culto apelava a todos os excessos, cujo comportamento destinava-se atrair a benevolência divina.
Plínio, o Jovem, assim interpretou, tendo em vista ter verificado entre os cristãos rituais como a prática
da Ceia, acompanhadas de preces e hinos(Carta a Trajano, X – sobre os cristãos de Bitínia). Com o
cristianismo a mesma palavra, designaria as religiões dos falsos deuses, considerados como demônios.
35
Plínio, Suetônio e Tácito, foram escritores contemporâneos que teceram suas críticas aos cristãos, pelos
quais se identifica o julgamento de aristocráticos que interpretavam o cristianismo como um dos
múltiplos degradados cultos estrangeiros. Associaram um número de características negativas ao nome
de cristão, e por associá-lo a uma nova superstição, o cristianismo perdia a sanção de antiguidade,
elemento este, tão arraigado na religião dos romanos (BENKO, S. 1985: 21).
36
36
Os pesquisadores chamam atenção também para a produção dos escritos judaicos de séculos passados
que também focalizaram essa questão.
37
Para Emilio Mitre, a crise do Império Romano provocou distintas tendências: os estratos mais altos da
sociedade romana se orientaram até doutrinas eminentemente filosóficas como o estoicismo, o
pitagorismo, etc. (1980: 111)
38
Percebe-se que além dos cristãos, os epicuristas também receberam esta interpretação. Porém
diferentemente da interpretação epicurista, o cristão Orígenes argumentaria a favor da “lei da natureza”
princípio que remete a idéia de prederteminação de tudo que existe por Deus. Nada acontece sem essa
lei, que ordena o curso do mundo e dos homens. (Contra celso, V, 37,40)
39
39
Não negavam a existência dos deuses, porém os via como degradados vivendo nos espaços
interestelares completamente fora do mundo e sem contato com ele. Nada se explicava pelo atuar
divino(In: LOZANO, A. 2001: 28)
40
Verificamos que embora os filósofos tenham sido muitas vezes motivos de zombaria, por esconder seus
apetites e ambições, indicando uma certa ambigüidade em sua “arte de viver”, sua figura ou a do Sábio,
de forte cunho moralista, são sobrevalorizadas tanto por ditos representantes pagãos como por mestres
cristãos. Estes últimos intensificaram em suas prédicas com deslocamentos específicos a prática de uma
vida de autênticos filósofos, como a ascese e austeridade sexual a partir de “um sentimento novo da
presença de Deus”(expressão utilizada por Peter Brown em “Antiguidade Tardia”, p.240).
41
LOZANO, A. “La religiosidad griega en época helenística”. In: História: Questões e Debates,
Curitiba, n.33, 2001, p.30. Editora da UFRJ.
42
Teólogos, polemistas cristãos também chamariam atenção para a prática da virtudes como um caminho
de maior proximidade com a divindade, na busca da imagem e semelhança do homem com Deus.
40
43
Foucault sinaliza os cuidados para com o corpo, regimes de saúde, exercícios físicos sem excessos,
meditações, leituras, anotações, etc. (1985: 56,57).
44
Verifica-se que os homens do Mediterrâneo na antiguidade tardia tendiam para aceitar que o poder
divino não mais concentrava-se em instituições estabelecidas, com ênfases crescentes para um caráter
41
mais pessoal. Haja vista as incursões das religiões mistéricas e suas práticas que incidiam sobre a mesma
necessidade, como vimos no ítem 2.1.
45
Tudo indica que também tenha fechado seu círculo entre as famílias patrícias romanas.
42
e das coisas para subir, numa ascensão gradual até o Princípio Universal de todas as
coisas”(BRUN, J. 1991:34,35). Essa busca ao princípio universal tem relação com o
Uno e para alcançá- lo deve-se percorrer a via da contemplação. Para Plotino não é algo
que transcende a natureza humana, mas concernente a volta ao homem interior, o qual
deve através de exercícios espirituais reconhecer o seu eu mais profundo, a sua
dimensão divina. Há um verdadeiro itinerário de progresso espiritual: 1) a moral e a
ética, que visava assegurar a purificação inicial da alma; 2) a física que buscava mostrar
a inutilidade das coisas sensíveis; 3) a metafísica, que dirigia a alma até a contemplação
do divino(BRUM, J. T., 2001:6).
Para nós essas reflexões são significativas, pois envolvem o diálogo entre
neoplatonismo e o cristianismo, assim como lutas de poder quanto aos discursos, as
posições assumidas por quem fala, de um lugar, representando uma determinada
conformação social e religiosa, um direito reconhecido institucionalmente. Como
vimos o caminho para se identificar com Deus(Supremo, Superior, o Maior) vem do
conhecimento contemplativo para afastar-se do mal, permitindo ao indivíduo
empreender uma auto-purificação, num trajeto ascencional até o alcance da Verdade.
Diferentemente desta visão, o cristianismo daria toda ênfase a transcendência de Deus
com o acréscimo de que “não é o homem que sobe em direção a Deus até conseguir
identificar-se com ele, mas é Deus que desce para o homem por meio da Revelação e da
Encarnação”(BRUN, J. 1991:107). Mais um elemento de distinção se apresenta para J.
Brun: o cristianismo fala mais à pessoa do que ao indivíduo, em termos gregos, como
parte de um Todo. A pessoa está num plano superior à espécie, possui em si esse
caráter sagrado ao qual liga a idéia de que foi criado à imagem de Deus(Ibidem, p.108).
No entanto, para os cristãos os homens jamais serão deuses, mas encontrarão a
felicidade num outro mundo se agirem em busca da perfeição. O cristão encontrará a
sua máxima realização na ressurreição, na vida futura, no céu. Em contrapartida, para
os neoplatônicos, a perfeição que a alma procura não está fora, em um outro mundo,
mas dentro, em um eu mais profundo. Esse é um diferencial entre neoplatonismo e
cristianismo.
46
Posição desenvolvida por Porfírio(neoplatônico) anos à frente, na segunda metade do III século.
44
47
Brown considera a mais profunda revolução do período clássico tardio foi a democratização
surpreendentemente rápida da contracultura dos fiósofos da classe superior pelos dirigentes da Igreja
cristã. “Antiguidade tardia”, pp. 240,241.
48
Se tomarmos as cartas paulinas como exemplo, dirigidas às várias comunidades da Ásia percebemos de
fato esta realidade. Várias questões morais foram trabalhadas em suas epístolas que deveriam ser
partilhadas por toda comunidade, com diversas recomendações aos relacionamentos entre os seus
membros , de socorro mútuo, benevolência, de orientações quanto ao viver diário, aos bens desta vida,
etc. Para Brown, a especificidade cristã diz respeito à aplicação de caráter universal dessa modalidade de
ação e seus efeitos sobre a vida privada do crente. Ibidem, pp. 248-252.
45
49
Citamos como exemplo: encratistas, ebionitas, marcionitas, docetas, sibilitas, etc. Só Celso enumera
mais de dez (Contra Celso, V, 61-65). A maioria apresenta combinações gnósticas em sua composição.
50
No século II d.C. seus representantes foram Valentim, Basílides e Carpócrates em Alexandria.
Segundo Eusébio de Cesarea “Ambrósio, adepto da da heresia de Valentim, deixou-se convencer acerca
da verdade proposta por Orígenes; e com a mente iluminada por certo fulgor, aderiu à doutrina ortodoxa
da Igreja”(História Eclesiástica, VI, 18). Segundo os pesquisadores Orígenes pôs fim à ameaça gnóstica
feita contra a Igreja.
51
NUNES, R. 1978: 106.
52
Neste trabalho iremos interpretar as heresias, como grupos dissidentes que divergiam quanto às
posições majoritárias da Igreja oficial. Ao mecionarmos o termo heresia será em face de assim
47
O Docetismo – um dos mais antigos desvios da fé em Cristo, já combatido por São João
e por Inácio de Antioquia. Sob formas muito diversas, umas nascidas mais de uma
piedade mal inspirada, outras de uma doutrina ponderada, é uma forma tanto de reduzir
como até negar a realidade humana da encarnação do Verbo, especialmente sua
encontrarmos nos textos cristãos, no qual interpretamos como forte indicador de uma postura que já em
si demonstra marcar as diferenças, num processo que demanda incluir e excluir elementos por uma certa
liderança cristã que acredita ser representante da ortodoxia.
53
Este esquema foi reproduzido de LIÉBART, Jacques. Os Padres da Igreja: sécs. I-IV. v.I São Paulo:
Edições Loyola, 2000. p. 82.
48
54
No ítem 2.2., identificamos as articulações estabelecidas entre as escolas filosóficas que discutiram
essa questão, imbuídas de argumentações éticas, morais.
49
“o homem sente-se extraviado, dividido entre bem e mal, matéria e espírito, corpo
e alma, cindido em sexos distintos, disperso no tempo(...) a salvação consiste em
se libertar da matéria e de todas as dualidades que ele gera; é evasão e retorno
ao mundo perfeito e unificado do espírito. O caminho da salvação está no
conhecimento, que é simultaneamente percepção inata da condição do espírito
neste mundo e aquisição da ciência perfeita que desenvolve essa percepção. Pelo
conhecimento o homem toma consciência de sua verdadeira natureza de ser
espiritual; a gnose é o retorno do espírito a si mesmo, unindo-se ao velho adágio:
<conhece-te a ti mesmo>”(LIÉBART, 2000: 60).
Em oposição a este dualismo pessimista de certa forma, os ditos representantes da
ortodoxia(reta doutrina) da Igreja, para citar Irineu de Lião 55 , apresentariam outra
leitura para o mesmo objeto: a valorização do ser humano na totalidade de sua natureza
e do universo, incluídos na história da revelação bíblica, com referências a um plano de
Deus e da salvação em seu Filho. Nesta confluência situam o homem e o exaltam como
criatura em relação ao ser divino, seu Criador, a Deus.
55
Escreveu um tratado Contra as Heresias(182-188 d.C.) em grego. Irineu viveu neste ambiente
florescente de idéias e posicionamentos, porém originário da Ásia Menor, região fortemente cristianizada
de legado da pregação apostólica, diante da alteridade, defendeu veementemente discursos majoritários
conforme as posições tradicionalistas da Igreja.
50
56
Essa mesma interpretação dada ao cristianismo verifica-se em Guy Palmade no qual argumenta que
postula-se um campo de experimentação de uma nova concepção antropológica do mundo e sua projeção
escatológica: “não sem riscos e confusão, a entrada do cristianismo no mundo da sabedoria antiga
tendia a convencer mais profundamente os homens da dimensão histórica da sua condição de homens,
vivendo no tempo” (“Teologia da História: elucidação global do sentido da história”. In: (vvaa) História
e Historicidade – Panfletos. Lisboa: Gradiva, 1988. p.81).
57
Fortemente combatida pelo teólogo latino Tertuliano, a exemplo de seu predecessor Irineu, que adota
uma postura crítica em relação à filosofia e contra a gnose especificamente escreveu “Contra Marcião”.
58
“os gnósticos, baseados nessa palavra nêpioi sustentavam a existência de duas espécies bem diferentes
de cristãos, os imperfeitos e perfeitos. Só estes últimos é que conheceriam os segredos da salvação e
seriam os verdadeiros gnósticos, pairando bem acima da turbamulta ignara e imperfeita.” NUNES, R.
1987:77.
59
A tradição cristã dos padres da Igreja consideraram perigosa a posição que tanto Orígenes e Clemente
adotaram no sentido de induzir a uma possível síntese entre cristianismo e filosofia grega, passando-se a
considerar o cristianismo como um simples sincretismo de filosofia grega e teologia bíblica. No entanto
reconhecem o valor de suas obras na exposição sistemática do cristianismo. In: CAIRNS,Earle E. O
51
Cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. Trad. Israel Belo de Azevedo. São Paulo:
Edições Vida Nova, 1990. pp.90,91.
52
60
O batismo, por si só incluia a confissão de fé, que reconhecia o Cristo humano e divino. Prática
identificadora de pertencimento às comunidades cristãs, enfatizada em outros tipos de gênero literário
cristão.
61
Princípio fortemente polemizado pelos escritores de época imperial e aplicado em referência às
releituras da cultura clássica.
62
Nas proposições de Eusébio percebe-se a sua imensa admiração pelo mestre Orígenes, entretanto não
podemos enquadrá-lo como um fiel partidário da ortodoxia, devido ao seu sistema alegórico de
interpretação no qual identifica por exemplo Cristo subordinado ao Pai, visão polêmica para a tradição
apostólica. Nossas considerações nesta pesquisa levam em conta esse cuidado diante da figura ambígüa
de Orígenes perante os estudiosos da história da Igreja quando analisam os seus trabalhos. Nosso
direcionamento se limita à análise quanto a contraposição estabelecida do monoteísmo cristão frente ao
politeísmo, no qual diante das perseguições e da diversidade os escritores cristãos tentaram evitar trazer à
superfície as interpretações teológicas distintas.
63
Momigliano identifica esta pauta, defendendo que o debate com os cristãos foi cada vez mais um
debate dentro dos termos de referência da cultura clássica, tendo sido uma característica notadamente
cristã, tendo em vista que os judeus não persistiram nisto. “Algunas observaciones preliminares sobre la
oposición religiosa”. In: Paganos, judíos y cristianos. México: Fondo de Cultura Económica, 1987.
p.320.
53
64
Exemplos: Justino, tertuliano, Cipriano, Panteno, Clemente de Alexandria, Teófilo de Antioquia, etc.
65
Falamos das argumentações da cultura filosófica. Exemplificada através dos filósofos Celso e Porfírio.
66
GIGON, O. “La polêmica de los filósofos contra el cristianismo”. In: La cultura antigua y el
cristianismo. Madrid: Gredos, 1970. p. 155.
67
Através de Orígenes percebemos que este assunto foi problematizado no discurso de Celso, mostrando-
se bem informado, no qual aponta diversos grupos dissidentes entre os cristãos. Realidade que força
Orígenes para responder a esse respeito, alegando ter conhecimento de distintas opiniões, mas também
54
defende “a grande Igreja”majoritária ante esses grupos dissidentes. Também argumenta que na filosofia e
na medicina existiam escolas contra escolas (Contra Celso, V, 61-65).
68
Aprofundaremos devidamente essas características de marcas discursivas em torno da identidade no
quarto capítulo.
69
“Ao homem faccioso, depois da primeira e segunda admoestação, evita-o” Tito 3:10.
55
70
MACMULLEN, Ramsay. Christianizing the roman empire (A.D. 100-400). EUA: Yale University
Press, 1984.
56
Judith Perkins faz menção que hoje se reconhece a importância dos discursos
literários, religiosos e técnicos que contribuem para produzir um mundo cultural(1995:
4). A mesma autora, entende que reconhecidos modos de pensamento, de fala, de
escrita e os mundos sociais que produzem tipos de poder que eles tornam possíveis, têm
se tornado uma matéria de pesquisa histórica, cabendo considerar os discursos imbuídos
de formas particulares que geram certos tipos de poder social. Ressaltamos que tanto
Judith Perkins como Averil Cameron, incluem a retórica cristã neste processo. Com
este fim, ident ificamos no discurso cristão a sua capacidade de unir outros tipos de
discurso e garantir a dominação de certos interesses sociais e políticos.
Simultaneamente, tais formações discursivas se preocupam em construir discursos de
“si” e dos “outros”, através de uma retórica dirigida para afirmar a hegemonia sobre o
outro.
Nosso interesse por Orígenes, que nesta pesquisa ocupa um foco central, vem da
relação do indivíduo com a sociedade, com o mundo social a que ele se insere e
representa, das relações que ele mantêm com os atores envolvidos neste espaço, do que
se produz face às contingências que surgem e da importância dos resultados criativos
dessas ações para um coletivo. Através da História Eclesiástica identificamos Orígenes
como interlocutor de diversas vozes e saberes, articulando diversos contatos com
pessoas proeminentes da comunidade cristã, quer seja pessoalmente ou por escrito. De
Porfírio (270 d.C.) temos o testemunho de que Orígenes teria sido leitor de Platão e
71
São assistidos por um conselho de presbíteros e por alguns diáconos(boulh,), e no terceiro
século são desenvolvidas outras ordens menores.
58
profundo seguidor de suas idéias; foi leitor também de: Numênio, Crônio, Longino,
Nicômaco, Apolófanes, Moderato e de pitagóricos influentes; incluindo livros dos
estóicos Queremão e Cornuto. Segundo Porfírio, deles Orígenes aprendeu a
interpretação alegórica dos mistérios gregos e aplicou às Escrituras judaicas(outra
leitura dada a figura de Orígenes). Também nos informa que Orígenes foi leitor de
Ammônio Saccas(neoplatônico), que perfazendo um caminho inverso deste, sendo
grego, formado segundo métodos gregos, desviou-se aderindo à obstinação peculiar aos
bárbaros. Talvez por esta razão Porfírio(mostrando seu patriotismo, falando como
grego) teria dito que “Orígenes vivia à margem das leis” (15 Tratados Contra os
Cristãos, III). Podemos concluir que Orígenes circulou em diferentes espaços. Isto não
significa necessariamente que tivesse havido uma imediata adesão de todos às suas
idéias, algo que nem teríamos como precisar. Porém, pode-se afirmar que atraídos por
sua fama, no exercício da propedêutica, muitas pessoas estiveram dispostas a ouví-
lo,como Porfírio dá a entender em sua obra(15 Tratados Contra os Cristãos, III).
72
Provavelmente em Alexandria, Orígenes foi autor de uma imensa obra intitulada Hexáplas na qual
apresenta versões das Escrituras hebraicas em grego, dispostas em seis colunas; como também as
Tétraplas, tendo em mãos como fontes a Tradução dos Setenta, além das de Áquila, Símaco e Teodocião,
vindo sobre elas exercitar sua exegese.
73
A obediência ao bispo parece indicar a garantia prática da unidade cristã nos documentos da Igreja. Da
forma como Eusébio escreve, podemos identificar esse objetivo similar ao retratar a carreira de Orígenes,
por exemplo, pontuada por contatos sempre contínuos com esses líderes.
59
74
Pela carta de louvor de Gregório o Taumaturgo ao seu mestre, Orígenes empreendeu em Cesaréia uma
intensa atividade de ensino, dando inclusive aulas particulares de gramática.
75
Em Cesaréia exercita-se na pregação de homilias.
76
Eusébio informa sobre a realização de um sínodo nesta região para discussão de desvios heterodoxos da
qual Orígenes participa(História Eclesiástica, VI).
77
Tudo indica que Orígenes foi chamado a esta região para lutar contra o marcionismo.
60
na patrística até aqueles que mostraram certas desconfianças de rigor doutrinário como
o próprio Orígenes(interpretações especulativas) e Tertuliano(adepto da doutrina
montanista; latino).
78
O exemplo mais conhecido é a “domus ecclesiae” de Dura Europus, cidade situada na fronteira da Síria
com a Mesopotâmia, onde foi encontrada uma casa transformada para receber um batistério e um local de
celebração da Eucaristia (MATOS, H. 1987: 35).
79
Nestes aspectos Porfírio se aproxima de seu predecessor Celso em relação aos cristãos em geral, mais
ou menos com o mesmo teor de crítica.
61
80
É a vez do brilhantismo nas escolas da retórica, da diatribe com os cínicos, da dialéctica de Aristóteles,
da moral estóica, e do platonismo, que revelam o ecletismo da Nova Academia (Daniélou e Marrou,
1984: 113).
62
81
Por este motivo as apologias são repletas de desqualificações quanto às práticas politeístas, as quais
consideram como fábulas da mitologia. Essas teriam sido, apropriações mal aplicadas aos mistérios
divinos revelados pelos profetas, por esta razão os pagãos precisavam se corrigir.
82
As interpretações a seguir são analisadas de maneira geral através do texto que Orígenes escreveu no
Prólogo de Contra Celso.
63
A par dessas inferências, acreditamos, que Orígenes escreveu sua apologia tendo
em vista uma audiência mais interna, isto é, entre os próprios cristãos 85 , a fim de que
também estivessem preparados para responder a seus interlocutores, diferentemente das
apologias do segundo século, destinadas às autoridades romanas. Neste caso a
identidade visava consolidar o ideal de pertença, uma profunda identificação do neófito
à sua comunidade e às suas regras de conduta. Enfim, as produções dos escritores
cristãos dos primeiros séculos, ao nosso ver participaram de configurações intelectuais
proeminentes de seu tempo, mantiveram-se sob controle eclesiástico, incluiram seus
preceitos religiosos nos debates acadêmicos, construíram seus lugares de fala e, a
literatura apologética contribuiu para o aprofundamento da doutrina cristã. Esse
83
De certa forma boa parte das virtudes professadas pelos cristãos foram também solicitadas pelos
filósofos pagãos, sendo que entre os cristãos acentuou-se a combinação da teoria e prática, devido o apelo
de “conformar-se à doutrina do Logos”, como requisito para completa identificação ao cristianismo.
84
Orígenes repetidamente em sua obra, insiste no alcance do cris tianismo em todas as terras gregas e
bárbaras ou a estatutos de pessoas, sábias ou ignorantes. Isto parece indicar que em sua época
vislumbrasse um maior número de cristãos confessos(Contra Celso).
85
Também existe a possilidade de Orígenes alcançar a pagãos cultos que viessem ter em mãos a sua
apologia.
64
86
Para Orígenes, filósofos que constroem sentenças e em seguida as corrigem não são verdadeiros
filósofos. A verdadeira filosofia não muda o seu parecer nem por necessidade, nem por persuasão(Carta
de Gregório, o Taumaturgo em louvor a Orígenes(III séc.d.C.).
65
87
Era comum entre patronos e estudantes de filosofia de época imperial, escolherem a opção que melhor
lhes condizia. R. Macmullen afirma que havia uma mistura de elementos, sendo favorito dentre eles, os
estóicos, mas também epicuristas, peripatéticos, pitagóricos, acadêmicos ou cínicos. O autor ainda
observa que ditas escolhas se davam não por sua lógica, mas motivados por interesses econômicos,
tendência política e costumes sociais(1992: 49).
66
88
Percebemos nos primeiros procedimentos metódicos de Orígenes, quanto ao ensino que ministrava, o
diálogo estabelecido entre cristianismo e neoplatonismo. Para uma melhor comparação verificar nesta
pesquisa as páginas 41, 42. Plotino(205-270d.C.),filósofo pagão e Orígenes(185-254 d.C.), filósofo
cristão foram contemporâneos e oriundos da mesma terra natal, Egito.
89
Neste aspecto, a partir do IV século, Orígenes receberia acusações veementes, por ter se aproximado
exageradamente dos filósofos não-cristãos, levando-o para interpretações não consensuais. Dentre as
temáticas combatidas destacam-se: a crença na preexistência da alma e na restauração universal, inclusive
dos demônios na ocasião do julgamento final, na eternidade.
90
Haja vista os discursos inflamados de Ireneu e Tertuliano contra a filosofia.
91
O itinerário de filósofos convertidos ao cristianismo como Justino, também demonstra como foi
valorizado o exerçício propedêutico alcançado pela filosofia e o auxílio que ela teria trazido para o
entendimento de saberes mais profundos numa tentativa de conciliação. Ele descreve no Diálogo, os
contatos estabelecidos com um estóico, com um peripatético(discípulo de Aristóteles), com um
pitagórico, com um platônico, tendo este último o conduzido a proveitosas lições. Para Justino, o
entendimento das coisas incorpóreas o fascinava e a contemplação das idéias dava asas ao espírito e
conduzia a enxergar a soberania divina, Deus, objetivo que ele julgou ser apresentado na filosofia de
Platão(Diálogo, VII,1-3)
67
Desde então, temos como objetivo, analisar argumentos utilizados por Orígenes
em Contra Celso(248 d.C.), sua apologia de língua e expressão grega, a partir de um
lugar social, isto é, como filósofo exercitado na atividade docente, formado nas ciências
gregas e partidário das releituras aplicadas ao platonismo que estavam sendo correntes
em seu tempo. A elaboração discursiva de Orígenes visa responder em mesmo grau de
igualdade, ao seu adversário filósofo. Os argumentos filosóficos que Orígenes utiliza
em seus discursos apologéticos foram elaborados em virtude do mesmo ter em mãos
uma obra intitulada “Doutrina Verdadeira” (Alèthès Lógos) cujo autor apontava para
Celso(escrita por volta do ano 178 d.C.), filósofo neoplatônico. Os pesquisadores
supõem que esta obra foi constituída de quatro livros. Através da reconstituição dos
fragmentos do texto de Celso 92 (reproduzidos na obra de Orígenes), reconhecem a
dificuldade de perceber uma coerência, uma marca do desenvolvimento do texto, ou
uma unidade orgânica em seus livros,embora se apresentem em quantidade bastante
significativa. Os escritos de Celso parecem não apresentar uma base homogênea,
condição que faz com que alguns estudiosos duvidem de sua observância filosófica. No
entanto, Celso revela ser um profundo conhecedor de textos bíblicos do Antigo
Testamento e Novo Testamento, bem como sobre o desenvolvimento da comunidade
cristã nos tempos apostólicos, além de constituir o primeiro ataque vigoroso do
cristianismo por um representante da alta cultura. O apelo que Celso faz à razão e à
tradição politeísta, resulta na comparação do pensamento cristão à cultura antiga.
92
A obra original em sua íntegra encontra-se perdida. Tudo que sabemos de Celso vêm através das
narrativas de Orígenes, inclusive a provável data do seu escrito é postulada segundo alguns
acontecimentos reproduzidos por Orígenes. As alusões à situação do império, à ameaça dos Bárbaros,
revoltas, calamidades, motivos que acentuam as perseguições aos cristãos no reinado de Marco Aurélio,
indicam os anos 178-180 o período aproximado de sua escrita. As palavras de Celso mostram em sua
elaboração um rigor patriótico, pelo zelo dos costumes tradicionais, das instituições e a preocupação pelo
resgate da pax deorum e subseqüente pax romana. Conferir a síntese de sua obra na pág. 75.
68
verificação completa sobre a doutrina, sobre o culto, sobre seus costumes e sobre sua
história(BORRET, M.: 1986: 24-28) . Orígenes então, apropria-se do título “Doutrina
Verdadeira” e aplica-o para identificá- lo com o alèthès lógos, o Cristo, estabelecendo
as diferenças entre o politeísmo e o cristianismo.
93
Tanto Orígenes quanto Plotino apresentam o exercício das virtudes, de maneira gradual, para participar
da essência divina; as virtudes faz do espírito uma viva expressão da Mente divina (In: The internet
encyclopedia of philosophy. www.utm.edu/research/iep/g/gnostic.htm) . Embora, sejam distintos quanto
à adesão religiosa, Orígenes e Porfírio apresentam certas características comuns: são provenientes do
Egito; tudo indica que ambos foram alunos de Ammônio Saccas, fundador do neoplatonismo; participam
do mesmo espaço temporal(primeira metade do século III); estabelecem uma escola, uma sistemática de
ensino.
94
Na obra Peri Archôn, Orígenes define melhor o que pensa sobre a razão: “é a capacidade de discernir e
julgar as representações e tendências, reprovando e recusando uma e aprovando e acolhendo outras, a
fim de que possam ser dirigidos pela razão para uma vida digna todos os movimentos do
homem”(III,1,3).
95
Discussão que Orígenes transcreve em todo terceiro livro.
69
(apaideutota,touj ou
idiwtikou.j dh,mouj), rústicas
(agroikota,touj); escravos(andra,poda); insensatos,
desprovidos de razão(avno,htoj) e de origem humilde, vulgar
(agenh.j), tais como os cardadores(eriourgou.j),
sapateiros(skutoto,mouj), pisoeiros(knafei/j), enfim artesãos
– Contra Celso, III, 49-61. O criticismo de Celso demonstra o pensamento da elite
conservadora romana. A questão ganha relevância tendo em vista as adesões às
associações tanto religiosas como filosóficas na cultura greco-romana que se
restringiam a determinados segmentos. Para aristocratas, nobres ou intelectuais adeptos
à filosofia, dedicados ao “exercício do trabalho da mente”, a opinião das massas
deveriam ser ignoradas, mostrando-se muitas vezes impacientes com os segmentos
inferiores da sociedade(MACMULLEN, R. 1992: 49). Orígenes então, argumenta que
Celso era contra a “raça dos cristãos”
(o` Ke,lsoj pro.j to. cristianw/n ge,n
oj). Em função disso, elabora sua refutação, supondo que Celso escreveu sob a
paixão mais inflamada motivada pelo ódio contra os cristãos, desprovido de modéstia ao
contrário de autênticos filósofos como Platão ou Crisipo(I, 40). Verifica-se através
desses embates entre intelectuais, o apelo à reflexão e finalmente à razão que procuram
o rigor e a penetração do espírito àqueles discursos filosóficos de caráter persuasivo e
sedutor (BORRET, M. 1976: 27).
A filosofia nas escolas cristãs marcou-se pelo procedimento de passar das coisas
sensíveis(tw/n ai`sqetw/n) às realidades
inteligíveis(ta. nohta,). Essa operação é bastante significativa para as
formações discursivas de Orígenes. Em sua linguagem é bastante recorrente termos
filosóficos, utilizados estrategicamente para infundir a veracidade de suas afirmações,
tornar o discurso eficaz e fazer-se persuasivo na construção do sistema de
representação da identidade cristã. Orígenes exorta que “é necessário que os que
filosofam sobre a doutrina se equipem de toda classe de provas tiradas das Escrituras
divinas e advindas da série de argumentos”(IV, 9, e VI,10). Suas narrativas portanto,
contêm uma série de citações apropriadas de outros discursos e sujeitos, a fim de
corroborar suas construções defensivas e produzir “efeitos de verdade” nas suas
afirmações. Vejamos outros enunciados de Orígenes, pelos quais reforça que no
70
96
Este enunciado está inserido no seguinte parágrafo: “...se fosse possível que todos abandonassem os
negócios da vida para vagar tranquilamente até a filosofia, não haveria que seguir outro caminho que
esse, pois no cristianismo não se achará menor tarefa, para não dizer algo forte, que em outra parte
alguma: o exame das verdades da fé, a interpretação dos enigmas dos profetas, das parábolas
evangélicas e de infinitas coisas mais acontecidas ou legisladas simbolicamente”(Contra Celso, I, 9;
nossa tradução).
71
97
Se atentarmos com mais afinco para estas disposições, veremos a aplicação daquele ideal do ser
contemplativo, postulado pelas releituras do platonismo que evocam a importância do sábio exercitado
nas coisas espirituais para o alcance das verdades mais profundas. Conferir pág. 41.
98
Esse recurso já tinha sido bastante utilizado pelo apóstolo Paulo e por Fílon, alexandrino judeu. Este
último tentou harmonizar os escritos judaicos com a filosofia grega(séc.I d.C.).
72
Concluindo seu oitavo livro, Orígenes crer ter construído uma refutação
irrepreensível e assinala : “ao leitor de seu escrito e de nossa réplica toca agora julgar
qual dos dois respira mais do verdadeiro Deus, da maneira que haja de darse-lhe culto,
e da verdade que chega aos homens daquelas sãs doutrinas que o induzem ao melhor
gênero de vida” (VIII, 76). Toda elaboração discursiva de Orígenes tem como meta
realizar digamos, a arte retórica da demonstração, buscando interagir e atrair o leitor, a
fim de que o mesmo venha aderir e ser capaz de compreender a mensagem cristã. Suas
narrativas apontam para estratégias de argumentações filosóficas, que visam infundir
efeitos de verdade e eliminar qualquer risco, em seu julgamento, de inserções falsas ou
heréticas, ao dispor tudo ao exame e à razão mais crítica. Com este procedimento
discorre sobre a doutrina cristã e todo seu conteúdo cognitivo. Identifica-se em
73
Orígenes seus “modos de seduzir” através do uso da linguagem que expressa sentidos
bastante significativos na forma de apresentar positiva ou negativamente determinados
valores ou aversões. Se a razão concorre para exercitar os espíritos ou dotá- los da
capacidade de captar o significado das coisas e enxergar as “verdades da fé”, como
vimos anteriormente, assim afirma: “Por que, que dano maior que não compreender
pela ordem do mundo a seu Fazedor? E que pior desgraça que ser cego de
inteligência(tou/ tetuflw/sqai to.n nou/n) e não
ver o Pai e artífice do Universo”(VIII,38). O dano ou desgraça estão associados à falta
de inteligência. É interessante este argumento retórico de Orígenes no livro oitavo,
porque logo no prefácio da obra ele discorre sobre o fato de ter que responder a Celso,
como se o mesmo também fosse enquadrado nessa condição referida, devido não ter
percebido que a realidade mesma oferecia uma clara refutação, pela ordem das coisas.
Essa assertiva mostra também a definição e significado do ateísmo para o cristianismo.
Mais propriamente, negar a providência divina significa estar excluído da comunidade
cristã. Vejamos no próximo capítulo essas marcas de caráter simbólico que atravessam
o conjunto da comunidade social e seus respectivos membros chamados cristãos.
99
Conferir a síntese narrativa de Orígenes nas páginas 75-77.
74
100
Verifica-se essas construções principalmente em relação à mitologia grega em: Taciano, Discurso
contra os gregos, 8-10; Aristides, Apologia, 3-13; Atenágoras, Súplica em favor dos cristãos, 17-29;
Teófilo de Antioquia, A Autólico, II, 7-8; Epístola a Diogneto(de autor anônimo), 2.
75
povos orientais, representarem seus deuses em figura humana. Ao Deus cristão atrib ui-
se as categorias da incorruptibilidade, invisibilidade, imutabilidade. Percebe-se nos
discursos apologéticos portanto, quão significativo foi a apropriação de conceitos,
noções, temáticas filosóficas como recursos instrumentais na construção de seus
argumentos e no esforço de dar lógica e inteligibilidade a todo este processo. Podemos
inferir que os discursos apologéticos também utilizaram de forma sútil a estratégia de
atrair intelectuais exercitados nas ciências gregas aprofundando-se no debate e no
conhecimento, de formação discursiva similar e exercer um consenso.
PREFÁCIO:
§ Qual o mérito da religião cristã, se os seus membros sofrem o risco de morte?
PRIMEIRA PARTE:
§ As origens suspeitas do cristianismo: reuniões e ensinamentos em secreto.
76
SEGUNDA PARTE:
§ A substância da doutrina cristã descende dos judeus, de um povo bárbaro; os
cristãos não apresentam um fundamento religioso verdadeiro. O caráter bárbaro do
cristianismo, que acolhe segmentos inferiores entre a multidão.
TERCEIRA PARTE:
§ O cristianismo professa uma doutrina sem valor; não buscam uma doutrina fundada
sobre a razão à maneira dos gregos; fomentam uma fé cega.
Celso compara a religião cristã e o seu fundador com práticas mágicas.
QUARTA PARTE:
§ Conflito do cristianismo com o império: tentativa de uma conciliação.
Celso reforça a prática das tradições religiosas e da vida cívica dos romanos.
Prefácio:
Orígenes apresenta as razões para refutar seu adversário, filósofo pagão, Celso. A
pedido de Ambrósio, seu grande amigo, Orígenes se detêm na tarefa de escrever e
elaborar a defesa do cristianismo. Procurará responder ponto por ponto aos enunciados
de Celso. Apresenta suas preocupações com os seus possíveis leitores, em particular
volta-se para aqueles que possam se deixar comover esse inclinar aos escritos de Celso,
os de fé débil ou fracos na fé.
Livro I:
Defenderá o cristianismo em virtude das acusações de Celso de que os cristãos
formavam uma associação secreta e falsa, além de ter um caráter sedicioso. Orígenes as
considerou como blasfêmias, de quem demonstrava pouco conhecimento acerca dos
cristãos.
Livro II:
Celso apresenta um personagem fictício judeu que acusa aqueles que sendo judeus
convertiam-se ao cristianismo, entendendo como gesto de traição à tradição de seus
pais. Celso reprova as origens judaicas do cristianismo e da mútua contenda sobre o
Cristo. Orígenes parte em defesa das Escrituras judaicas e ressalta que não será
identificando o cristianismo com o judaísmo que Celso conseguirá inferiorizá-lo, pois o
cristianismo observa as Profecias acerca de Jesus e dos Profetas que as profetizaram.
Livro III:
Orígenes rebate as palavras de Celso quanto à origem proletária do cristianismo, em
relação à maneira que Celso designou os cristãos, de forma pejorativa, como aqueles
77
Livro IV:
Orígenes discute sobre as profecias que versam sobre Cristo, sobre a manifestação do
Verbo de Deus, em virtude de Celso argumentar criticamente sobre a encarnação e
ressurreição. Orígenes introduz a mitologia grega e os escritos de poetas e filósofos
para de forma comparativa, esclarecer, enaltecer e defender os mistérios cristãos, a
doutrina da Salvação e a dispensação divina.
Livro V:
Orígenes argumenta sobre as formas de devoção cristã, que repudia a adoração aos
elementos da ordem do mundo, do kosmos, e expõe algumas semelhanças e diferenças
entre judeus e cristãos quanto ao entendimento da prática do culto monoteísta. Orígenes
ainda preocupa-se com os escritos de Celso sobre as relações entre o judaísmo e
cristianismo e as acusações de grupos sectários entre ambos.
Livro VI
Celso defende a antiguidade dos escritos dos poetas e filósofos gregos, argumentando
que há coisas que foram melhor ditas entre eles, principalmente em Platão, do que com
as sagradas letras. Orígenes então ressalta o valor das Sagradas Escrituras consideradas
superiores às ciências gregas, mas também argumenta em favor dos escritos de Platão
interpretando-os como tendo aberto o caminho para o entendimento das coisas
inteligíveis que se realizam no Cristo. A comparação entre sabedoria humana e divina é
estabelecida, sem que uma se volte contra a outra. No cristianismo se dá o escrutínio
das Escrituras.
Livro VII
Orígenes insiste em responder ao criticismo de Celso em relação às profecias e profetas
judaicos como Moisés e as comparações feitas com Jesus Cristo, que os coloca todos
em plano inferior aos homens gregos cultos do passado. Para Orígenes os mais simples
cristãos são melhores moralmente falando do que muitos filósofos e mostram-se
verdadeiramente piedosos para com Deus.
Livro VIII
inutilidade da adoração de muitos deuses. Tudo indica que Celso mostrava-se curioso
para entender o porquê dos cristãos em não seguir a tradição politeísta a tanto tempo
arraigada na sociedade, bem como a ausência de templos e altares. Há um debate
acerca da natureza dos deuses e dos demônios e a argumentação da superioridade do
Artífice do universo e da adoração das criaturas ao seu Fazedor. Celso receia que o
exclusivismo cristão quanto à prática monoteísta venha trazer algum perigo para o bom
andamento do império e o reconhecimento do poder público. Orígenes defende os
cristãos ressaltando que a observância às leis divinas está em primeiro plano, embora
manifeste o desejo de ver o império bem governado e mostre a esperança de vê- lo
tornar-se cristão.
“Contra Celso”
(Proj ton epigegrammenon Kelsou alh
qh logon)
Orígenes
101
“Nos aparta de todo criado” -
panto.j me.n afista,sh| genhtou/ - criado ou
gerado(advérbio no grego
genhto,j) é um termo filosófico, que diz respeito ao que é criado, resultado de criação, em
Orígenes aplicado em contraposição ao Incriado(agennh,tou), identificado a Deus supremo
que não sofreu o ato de ser gerado, que está justamente na mediação entre as coisas criadas(sujeitas a
corrupção) e o eterno(das coisas invisíveis e inteligíveis). Esse sentido também está presente em Contra
Celso, III,34.
80
IV, 26 “os que perderam a sã idéia de Deus, por Resposta à crítica de Celso
mera aparência de piedade, adoram animais sobre cristãos e judeus serem
irracionais, estátuas e coisas criadas, comparados a formigas e
quando pela beleza delas deveriam haver vermes, que convivem juntos e
admirado ao que as criara e a Ele só dar-lhe discutem entre si. Orígenes
culto” então responde quem ele julga
irracionais.
V, 46 “Por esta razão, nós preferimos suportar Refutação ao pensamento de
todo e quaisquer maus tratos do que Celso de que não importava
reconhecer Zeus por Deus.” chamar Zeus de Altíssssimo,
Adonai, Amon de acordo com
seus costumes nacionais.
VI, 4 “Precisamente por isto, os sábios e eruditos Crítica aos egípcios que
erraram em sua práticas acerca da davam culto a criatura em
divindade...” lugar do criador.
VII, “os cristãos...fechados os olhos da sensação, Comparação entre os
despertos os da alma, transcendem o mundo politeístas e os cristãos.
44
todo...pois tem aprendido de Jesus a não
buscar nada pequeno, isto é, sensível.”
“a imagem de Deus se conserva, afirmamos Comparando às práticas
nós, na alma racional que se realiza na politeístas (dirigir preces às
VII,
virtude.” imagens), refuta que nada
66 fictício deve morar na alma do
homem piedoso para com
Deus.
VIII, “Quem aspira a vida superior à multidão, Orígenes asssim contrapõe
pela piedade para com o Deus Supremo e aos que monosprezam o
60;
pelas orações dirigidas a Ele” divino.
III,50 “exortamos a piedade para com o Deus
Supremo e as virtudes que reinam com
Ele(...)”
VIII, “...certamente não juramos pela fortuna do Refutação sobre as afirmações
imperador, nem a nenhum outro considerado de Celso de que nada impede
65
como Deus.” que os cristãos reconheçam
“o que é tido por fortuna do imperador é o também a piedade para com
seu demônio” os deuses e gênio imperial
também.
importantes que outras, pelas quais em seu entender dariam conta de expressar a
diferença do cristianismo com o mundo politeísta, e realçar a superioridade daquele.
102
Como exemplos seguem esses enunciados, que percorrem a obra toda: “Logo diz Celso, que nossa
doutrina é, desde suas origens “bárbara(...)”; “vejamos também como trata de desacreditar nossa
doutrina moral(...)”; “presto-me a combater em minha obra...as acusações que lança Celso contra
nós...”
103
Orígenes não reconhece nenhuma unidade específica, quer dizer, se Celso critica
ou menospreza Jesus ou seus discípulos, ou algum dos personagens bíblicos como
Moisés, por exemplo, ele o faz sempre contra – nós/cristãos. Orígenes quer afirmar o
consenso e ao mesmo tempo, anular qualquer interpretação que viesse a surgir sobre
dissensão entre os próprios cristãos. Outra consideração a ser feita diz respeito a:
diferentemente dos apologistas anteriores, o discurso de Orígenes demonstra através
dessas marcas lingüísticas, que ele visualiza os cristãos como já tendo assentado fortes
raízes, tentando esmorecer quaisquer dúvidas quanto a sua identificação e afirmação,
como uma organização eclesial ou comunidade formalmente constituída. Lembremos
de que os apologistas do século II, se dirigiram às autoridades governamentais em
defesa dos cristãos, tendo sido acusados de crime contra o Estado, onde pesava a
associação do nome a grupos de sedição, portanto, ainda encontravam-se em definição e
tentando se distinguir do judaísmo. Na verdade, este é o contexto em que se situa Celso
quando escreveu sua obra, o que fará com que Orígenes trate de demonstrar, décadas a
frente, ser o contrário. Orígenes insiste diversas vezes em falar da expansão cristã não
mais restrita aos dutos locais, mas em todas as partes da terra. Os membros das
comunidades cristãs, ao seu ver, já estavam bem aliçerçados e acessorados. Podemos
inferir que provavelmente Orígenes quando escreveu (248 d.C), deixou-se influenciar
pelo ambiente circundante que indicava uma época de paz, no governo do imperador
Filipe, o árabe, do qua l acredita-se ter sido mais propenso ao cristianismo. Esta
situação, o induz a ver que tudo concorria para que o império se tornasse cristão. Esse
contexto o distingue dos demais apologistas e, o permite ser mais efusivo nas suas
elaborações discursivas e ideológicas.
Campos de oposição
Representação politeísta Representação Cristã
Visível (orato,j/blepwme,nwn)
Invisível (ao,ratoj)
Corruptível ( fqarto,j) Incorruptível
(afqarto,j)
Sensível (aisqhto,j) Inteligível
(nohto,j)
conduta(1984: 4,5). Ressaltava-se a capacidade da fé, que deveria estar marcada pelo
desprezo do mundo material.
105
Justino, também apologista, aplicando conceitos platônicos, diria que não é pelos olhos que o divino é
visível aos filósofos, mas é perceptível unicamente pelo espírito; o espírito foi dado para contemplar este
Ser, que é a causa de todas as realidades inteligíveis(Diálogo III, 7-IV, 1,5).
87
Tal compromisso, era sustentado nas comunidades cristãs, que deveria exigir do
novo aderente um aperfeiçoamento moral, indepentemente da classe ou nível cultural do
106
Essas práticas podem ser atribuídas a identidade cristã, com grande significância, em outra formação
discursiva ou, outro gênero literário, como os Evangelhos e Epístolas Paulinas, por exemplo, situadas
dentro de outras condições sócio-históricas. Lembramos que nosso objeto de análise são as apologias
que apresentam outras características que já foram apresentadas neste trabalho.
88
107
109
O enunciado de Orígenes, assim o demonstra: “dirigimos aos pecadores discursos que os ensinem a
não
pecar”(protre,pomen tou.j amartwlou.j h[kein epi
90
deuses adorados no politeísmo e o Deus cristão. Toda representação dos deuses e dos
objetos pelos quais eram reverenciados, templos, estátuas, altares, foram associados à
morada de demônios(dai,monwn) e traduzia-se em rebaixar a divindade à
matéria configurada, sujeita à corrupção, fabricada por artesãos (VII, 69 e VIII).
Conseqüentemente, os cristãos eram aqueles que se apartavam de tais práticas.
Orígenes assim estabelece: “os cristãos têm aprendido de Jesus a buscar nada pequeno,
isto é, a não buscar nada sensível” 110 , reforçando novamente a idéia da superioridade, de
se elevar acima dos demais homens, a um plano espiritual. Novamente se verifica no
conjunto de significações construído por Orígenes, a utilização e ordenação das
categorias estabelecidas entre as noções do corruptível, visível, sensível, e do
incorruptível, invisível, inteligível, que correspondem classificar o mundo dentro de
duas realidades, material e espiritual. Por esta razão a identificação do cristão e o
estabelecimento da diferença com a alteridade, no momento da crença é determinada
pela convicção da existência de um único Deus e que deve “se abster de dar culto a
ninguém que não seja o Deus Supremo e ao que é primogênito de toda criação, o
Verbo, Logos de Deus”(VII, 70; e todo o oitavo livro). No discurso cristão, não cabe na
sua ideologia, descrever a forma do Deus “invisível e incorpóreo”, muito menos, honrar
em lugar de Deus, de que nada necessita, “coisas sujeitas à servidão da corrupção”,
como por exemplo os incensos, as oferendas, sacrifícios, dirigidos ao culto dos
deuses(VII, 65, 66). Para Orígenes, dar culto ao único Deus através das orações ou
súplicas, corresponde em analogia, metaforicamente, oferecer “os verdadeiros incensos
como perfume” (resgatando o sentido estabelecido nas epístolas neotestamentárias), que
se elevam até Deus(VIII, 17). Cristãos(Cristianoi.), segundo Orígenes não
se valem de fórmulas mágicas(epw|dw/n) de nenhuma sorte, senão do nome de
Jesus e de outras palavras em que se tem fé em conformidade com as Escrituras
divinas(I,6).
Celso admite que os cristãos de fato, não reconhecem a existência de tais deuses
e nem sequer os nomeiam no seu meio(Livro VIII de Orígenes). Para este filósofo
politeísta, significa palavras de facciosos que se valem de se colocar como um bando à
parte e que se separam da sociedade comum. Ele interpreta que tais recusas pelos
cristãos, incitam a um ajuntamento, a uma ação em conjunto, de tendência misteriosa e
secreta. Além disso, Celso inclui no seu raciocínio, a recusa dos cristãos em jurar pelo
chefe do Império, que ele entendia como uma, dentre outras autoridades, constituída
pela providência divina no governo das coisas da terra. Se todos os outros procedessem
como os cristãos, o imperador ficaria relegado ao abandono e entregue aos “infâmes
povos bárbaros, selvagens e grosseiros”. Era mister, na compreensão de Celso,
combater por ele, com todas as forças civis e militares, cumprindo e zelando pelos
deveres cívicos, pelas funções públicas, para a saúde das leis e a causa da piedade. Se
os cristãos recusavam participar dos costumes tradicionais da cultura romana, por
conseguinte, não identificavam-se com representações tão arraigadas a tempos na vida
111
As considerações de Celso apresentadas a seguir são baseadas na reconstituição da “Doutrina
Verdadeira”, que corresponderia à composição da quarta parte da obra, segundo Louis Rogier(1999: 135-
151).
112
O mesmo sentido aplica à visão da sociedade romana, de um sistema hierarquicamente organizado, em
que a autoridade é garantida pela tradição.
92
Em razão das indagações críticas levantadas por Celso, Orígenes constrói sua
resposta em defesa dos cristãos, a qual resulta na própria elaboração da doutrina cristã,
com objetivo de dar um ordenado sistema de crenças ao cristianismo, como temos
percebido até aqui e prossegue mais adiante. Orígenes reconhece uma certa hierarquia
divina, porém de maneira distinta de Celso no seguinte sentido: primeiro é Deus
somente, segundo, seguido do Logos, incarnado em Jesus, logo em seguida, os anjos,
que desempenham funções positivas 113 . Orígenes reconhece então, a existência dos
demônios, espíritos maus, identificados como deuses, mas argumenta que Jesus tem
destruído seus poderes. Logo, a adoração a Deus deve ser oferecida diretamente a ele
através de Jesus, o Cristo, e jamais através de demônios, imagens, imperadores, ou até
mesmo de anjos. É assim, que na concepção cristã os demônios apartam os cristãos da
“verdadeira piedade para com Deus”(III, 37). Interpelado a falar sobre a questão “dos
muitos deuses”, afirma que o culto dos demônios diz respeito “a tudo que os gregos tem
por religião com seus altares, estátuas e templos de deuses”(VII, 69). Segundo “a lei
do Deus supremo”, não é possível adorar a muitos senhores. Orígenes afirma, que Deus
é Senhor sobre todos os deuses, em co-relação a essa atribuição, não haveria “um reino
de deuses”, mas “um Reino de Deus”(VIII, 11). Da mesma forma compreende e investe
nos significados simbólicos da adoração cristã, afirmando que cristãos não participam
da “mesa de demônios”, de seus banquetes, de seus sacrifícios de comida e bebida(VIII,
113
Esta afirmação encontra-se no livro oitavo, capítulo 13. Desta disposição origeniana, nascem as
críticas posteriores a Orígenes no meio cristão.
93
31), mas novamente, insiste nas orações, um meio primordial valorizado por Orígenes,
na forma de culto.
Orígenes dá a entender que a religião cristã está além dos interesses nacionais e
dos costumes pátrios. Ela tem a missão de alcançar toda a humanidade, uma vez que
todas as demais representações religiosas estão encobertas pelo erro. A crítica aos não-
cristãos, de que os mesmos teriam errado em suas práticas de piedade, é uma marca
formal bastante recorrente não só nos discursos de Orígenes, mas também nos demais
apologistas. Os cristãos, nesse entendimento, não reconhecem os deuses firmados pelas
outras nações, sejam dos gregos, Zeus ou Apolo, dos egípcios, Amon, etc., por acharem
que neles não havia nada de divino. Estavam inclusive dispostos a morrer do que
confessar a Zeus, por exemplo, por Deus 114 . Estas palavras demonstram a cautela dos
cristãos em não tomar nenhum dos nomes que aparecem na mitologia para aplicá- lo a
Deus, Criador do universo, conforme o próprio Orígenes argumenta(I,25). Cristãos
vivem segundo as leis de Deus, que significa viver segundo a sua providência 115 e o
reconhecimento de sua soberania (VIII,67), aspecto fundamental de confissão e
subseqüente identificação. Isto implica em admitir, diferentemente de Celso, que até os
imperadores ou as líderes de governo devem honrar a quem lhes deu o poder
constituído, ou mesmo, os destitui: ao Deus cristão. Ao imperador não se busca favores
como a um deus mas, se lhe tributa, com súplicas a Deus para que governe com justiça,
sendo o melhor meio para ajudá- lo em combate(VIII,73,74). Orações e súplicas
significam para Orígenes agir como sacerdote(ieureu,j), que presta real
serviço a Deus e pelos seus semelhantes. Com esses efeitos de sentido, corroborados
em seu discurso, Orígenes então afirma a impossibilidade de cristãos jurarem116 pela
“fortuna”117 do imperador, pois esta também é associada à ação de demônios:
“certamente não juramos (omnumi) pela fortuna do imperador,
nem a nenhum outro considerado como Deus
114
118
121
Não usamos “monoteísta”, a fim de não identificar também o judaísmo, tendo em vista que a diferença
nesta pesquis a, é estabelecida com o cristianismo.
96
“tradicionais” como se verifica nas cidades e suas associações. Isto demonstra como o
cristianismo foi fundamentalmente urbano pelo menos até o terceiro século, cujas
características são confrontadas com as representações plurais aí já dadas. Na
organização social, na estrutura da vida citadina romana, que o cristianismo se
manifesta e constrói suas relações. Para opor suas ideologias e estabelecer a diferença,
além do aspecto transcendental, tem em mente este universo do mundo dos homens que
precisa sofrer mudança na forma de conduta. A teologia cristã ou a doutrina, não se
resumem ao que aqui foi exposto, nem foi este nosso objetivo, mas sim, o de identificar
Orígenes especialmente em “Contra Celso” produzindo através da linguagem, temáticas
dominantes estrategicamente selecionadas para mostrar, interagir e seduzir aqueles que
viriam a ser seus leitores, ou interlocutores sobre o cristianismo e seus adeptos cristãos.
5. conclusão
piedosos para com Deus”. Essa é a linguagem, simbolicamente representada, com seus
efeitos de sentido produzidos sobre a comunidade de crentes.
Deixamos para o futuro uma análise mais profunda, sobre as relações entre
Orígenes e outros “líderes espiritua is”, que compartilhavam de um mesmo campo de
ação, na região oriental, e investigar, como relata Eusébio, se realmente contribuiram
para preservar o legado cristológico e da cultura helenística através de sua produção
literária. Pensamos nas comunidades de Capadócia, ou de Edessa, da Síria, e de outras
regiões próximas, também alcançadas pela pregação cristã, as quais suscitam a
indagação a respeito da conformação que elas receberam nesses locais.
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