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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª. REGIÃO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL


MINUTA DE JULGAMENTO FLS.
*** TERCEIRA TURMA ***

2002.61.00.011303-5 860969 AC-SP


PAUTA: 29/03/2006 JULGADO: 27/09/2006 NUM. PAUTA: 00063

RELATOR: JUIZ CONV. SILVIO GEMAQUE


PRESIDENTE DO ÓRGÃO JULGADOR: DES.FED. CARLOS MUTA
PRESIDENTE DA SESSÃO: DES.FED. CARLOS MUTA
PROCURADOR(A) DA REPÚBLICA: Dr(a). CARLOS FERNANDO DOS
SANTOS
LIMA
AUTUAÇÃO
APTE : ASSOCIACAO DOS FUNCIONARIOS APOSENTADOS DO BANCO DO
ESTADO DE SAO PAULO AFABESP
REPDO : MAURICIO GENOFRE (= ou > de 65 anos) e outros
APDO : Uniao Federal
APDO : BANCO DO ESTADO DE SAO PAULO S/A BANESPA
APDO : Banco Central do Brasil
ADVOGADO(S)
ADV : JOAO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES
ADV : ANTONIO LEVI MENDES
ADV : LIVIA ROSSI
ADV : JOSE OSORIO LOURENCAO
SUSTENTAÇÃO ORAL

CERTIDÃO
Certifico que a Egrégia TERCEIRA TURMA, ao
apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Prosseguindo o julgamento, a Turma, por maioria, negou
provimento à apelação, nos termos do voto da
Desembargadora Federal CECÍLIA MARCONDES, vencido o
Relator que lhe dava parcial provimento.
Lavrará o acórdão a Desembargadora Federal CECÍLIA
MARCONDES.
Votaram os(as) DES.FED. NERY JUNIOR, DES.FED. CECILIA
MARCONDES.

_________________________________
SILVIA SENCIALES SOBREIRA MACHADO
Secretário(a)

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PROC. : 2002.61.00.011303-5 AC 860969


APTE. : ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE
SÃO PAULO AFABESP
REPDO. : MAURÍCIO GENOFRE (= ou > de 65 anos) e outros
ADV. : JOÃO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES
APDO. : União Federal
ADV. : ANTONIO LEVI MENDES
APDO. : BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S/A BANESPA
ADV. : LIVIA ROSSI
APDO. : Banco Central do Brasil
ADV. : JOSÉ OSÓRIO LOURENÇÃO
RELATOR : DES. FED. MÁRCIO MORAES / TERCEIRA TURMA

VOTO-VISTA

O Exmo. Sr. Desembargador Federal NERY JÚNIOR: esta ação


coletiva tem por objeto a defesa de interesses de cidadãos aposentados do
Banco Banespa S/A incorporado ao Banco Santander S/A.
O voto proferido pelo eminente relator apresenta e acolhe a
tese de que o mérito diz com direitos individuais homogêneos, que seriam,
por isso mesmo, defensáveis pela via da ação civil pública.
A ação civil pública foi ajuizada sob o fundamentos de que “a
Associação autora está reivindicando, basicamente, em benefício de seus
associados relacionados no Anexo I, que o 3º requerido (Banespa) dê
integral cumprimento às disposições da Lei 6.435/77 e da Lei Complementar
nº 109/2001, que regulamentaram a previdência privada, a fim de que o
citado Banco seja compelido a instituir fundo de previdência complementar
para os seus funcionários aposentados admitidos na empresa até o dia
22/05/75, bem como para os dependentes dos funcionários falecidos, os quais
vêem percebendo complementação de aposentadoria e pensão diretamente desse
Banco Requerido (Banespa), em completo desacordo com a aludida legislação,
como se verá” (f. 4).
O direito invocado – de obrigar o banco requerido a “instituir
fundo de previdência complementar para os seus funcionários aposentados
admitidos na empresa até o dia 22/05/75” – estaria inserto na categoria dos
“direitos coletivos, ou direitos individuais homogêneos decorrentes de
origem comum” (f. 5).

Vejamos as pretensões deduzidas na ação. E para não correr o


risco de equívoco, transcrevo, in literis, o pedido constante da inicial,
referindo-me, evidentemente, ao pedido relativo ao mérito, desprezando-se o
que se requereu a título de antecipação da tutela final:
“f) julgar totalmente procedente a presente ação, a fim de declarar a
inegociabilidade dos títulos garantidores do pagamento da complementação de
aposentadoria e pensão dos associados e beneficiários da presente ação, em
razão da inconstitucionalidade das Portarias nºs 214/2000 e 386/2000, bem
como do Decreto 3.540/2000 e da medida Provisória 1.974-82 – vez que as
retro mencionadas normas foram baixadas em total afronta o disposto no art.
52 da Constituição Federal; restabelecendo-se assim a inegociabilidade dos
referidos títulos;
g) julgar totalmente procedente a presente ação, tornando definitiva a
liminar anteriormente concedida, a fim de condenar ainda o Banespa, agora
privatizado:
i) na obrigação de fazer, qual seja, o imediato cumprimento das
disposições da Lei 6.435/77 e da Lei Complementar 109/2001,
direcionando para um Fundo de Pensão os pagamentos das
complementações de aposentadorias e pensões dos beneficiários da
presente ação, previstas no art. 87 e seguintes do Regulamento
do Pessoal (Doc. 9), devendo serem destinados a esse Fundo os
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títulos acima aludidos e os demais aportes necessários, de


conformidade com cálculo atuarial a ser previamente realizado, e
sem que isto implique em qualquer restrição de direito;
ii) na obrigação de fazer, qual seja, a imediata criação de um Plano
de Complementação que irá atender todos os ex-funcionários que
não aderiram ao Plano Banesprev, e que deverá ter as
características elencadas no item ‘g.1’ abaixo descrito;
iii) ao pagamento aos beneficiários da presente ação das diferenças
vencidas de suas complementações de aposentadoria e pensão, bem
como das vincendas, até a efetiva constituição do Fundo ora
reivindicado, diferenças essas decorrentes da remuneração
auferida pelo Banespa com os títulos federais em apreço, não
repassadas integralmente aos beneficiários desta ação, tudo a
ser apurado em regular execução, de forma a se evitar o
locupletamento sem causa por parte do 3º Requerido;
iv) na obrigação de fazer, qual seja, a de não dar outro destinado
aos títulos ora referidos, senão o de garantir a liquidez do
Fundo que deverá ser implementado pela instituição financeira,
exatamente nos moldes para os quais foram criados.”
A autoria adotou, para os fins desta ação, os conceitos de
direito difuso e de direitos coletivos estampados no art. 81 do Código de
Defesa do Consumidor, que assim dispõe:
Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das
vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título
coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos
deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que
sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias
de fato;
II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos
deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja
titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com
a parte contrária por uma relação jurídica base;
III – interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos
os decorrentes de origem comum.
HUGO NIGRO MAZZILLI distingue assim as categorias legais:
1. “Interesses difusos são aqueles cujos titulares não são determináveis
e estão ligados por circunstâncias de fato. São indivisíveis porque,
embora comuns a uma categoria de pessoas, não se pode quantificar
qual a parcela que cabe a cada lesado, como o ar que respiramos ou a
paisagem apreciada pelos moradores de uma região.
2. Interesses coletivos reúnem um conjunto determinável de pessoas
(grupo, categoria ou classe), ligadas de forma indivisível pela mesma
relação jurídica básica, como os integrantes de um consórcio, em
matéria relativa, p. ex., à validade ou invalidade de uma relação
jurídica que os une (a ilegalidade de um aumento é interesse
compartilhado por todos os consorciados em igual medida, não podendo
ser quantificado na proporção de cada um deles).
3. Interesses individuais homogêneos são aqueles que têm origem comum e
são compartilhados na mesma medida por pessoas que se encontram
unidas pela mesma situação de fato. São divisíveis, ou seja,
quantificáveis em face dos titulares, como os consumidores que
compram produto fabricado em série, com o mesmo defeito” (in A defesa
dos interesses difusos em juízo, Saraiva, 1998, p. 209).
O legislador, pois, nos aponta critérios para distinguir as
três categorias. Os direitos difusos caracterizam-se por apresentar (i) a
indivisibilidade do direito, (ii) a indeterminação das pessoas e a (iii)
ligação por circunstâncias de fato; os direitos puramente coletivos
apresentam (i) a indivisibilidade do direito (ii) e a indentificabilidade
das que compõem o grupo, categoria ou classe de pessoas e a (iii) ligação
das pessoas por uma relação jurídica base; Os direitos individuais,
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homogeneamente considerados, têm de apresentar (i) a divisibilidade, (ii) a


homogeneidade dos direitos e (iii) a origem comum em uma situação de fato.
Como bem observa o voto antecedente, o art. 129, III da
Constituição Federal legitima o Ministério Público a “promover inquérito e
a ação civil pública para a proteção (...) de outros interesses difusos e
coletivos”, ação que já era regida pela Lei n.º 7.347/85 (LACP) e cujo
artigo 1.º, IV, determina que “regem-se pelas disposições desta Lei, sem
prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e
patrimoniais causados (...) a qualquer outro interesse público e coletivo”.
Sabemos que a jurisprudência pátria, inclusive acórdão de minha
relatoria, não tem admitido a legitimidade do Ministério Público para a
defesa de interesses individuais homogêneos disponíveis, pois a hipótese
apontaria para a ofensa ao seu importante papel institucional. Ressalva-se
aí os direitos oriundos das relações de consumo, como se vê dos seguintes
arestos:
PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO INDIVIDUAL
HOMOGÊNEO. MINISTÉRIO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE. APOSENTADOS E
PENSIONISTAS DO DNER. APOSENTAÇÃO SOB O REGIME CELETISTA. VANTAGENS DA
LEI Nº 8.112/90. ART. 243.
Tratando-se de interesses individuais, cujos titulares não podem ser
enquadrados na definição de consumidores, tampouco caracterizam-se
como indisponíveis, é inviável a defesa de tais direitos por
intermédio da ação civil pública. Precedentes. Prejudicado o mérito.
Recurso provido, reconhecida a ilegitimidade do Parquet para o feito.
(STJ, RESp 578677, DJU 14/03/2005, p. 408, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA
FONSECA)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PREVIDENCIÁRIO. ILEGITIMIDADE


DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA.
BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. RENDA FAMILIAR.
O Ministério Público não tem legitimidade para ajuizar ação civil
pública relativa a benefício previdenciário, uma vez que se trata de
interesse individual disponível.
Notadamente, o Texto Constitucional de 88 dá uma dimensão sem
precedentes ao Ministério Público, entretanto, convenço-me também de
sua ilegitimidade para propor Ação Civil Pública nas hipóteses de
benefícios previdenciários, uma vez que, a bem da verdade, trata-se de
direitos individuais disponíveis que podem ser renunciados por seu
titular e porque não se enquadram na hipótese de relação de consumo,
uma vez que consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou
utiliza produto ou serviço como destinatário final, em que não se
amolda a situação aqui enfrentada.
Recurso especial do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS
provido.
Recurso especial da União prejudicado
(STJ, RESp 502744, DJ 25/04/2005 , p. 360 Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA
FONSECA)

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. REAJUSTE DE BENEFÍCIO


PREVIDENCIÁRIO. DIREITO INDIVIDUAL DISPONÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
INADEQUAÇÃO. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
1. A ação civil pública não se presta à proteção de direitos
individuais disponíveis, salvo quando homogêneos e oriundos de relação
de consumo.
2. omissis;
3. O Ministério Público não possui legitimidade para ajuizar ação
civil pública visando ao reajuste de benefício previdenciário, por se
tratar de interesse individual disponível (Constituição da República,
artigos 127 e 129, inciso III, e Lei Complementar 75/93, artigo 6º,
inciso VII).
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4. Precedentes.
5. Recurso provido.
(STJ, RESp 417374, DJU 01/02/2005, p. 623, Rel. Min. HAMILTON
CARVALHIDO)

AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL


PÚBLICA. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITOS INDIVIDUAIS
DISPONÍVEIS. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO ENTRE O INSS E O SEGURADO.
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ILEGITIMIDADE ATIVA "AD CAUSAM".
A quaestio objeto da ação civil pública diz respeito a direito que,
conquanto pleiteado por um grupo de pessoas, não atinge a coletividade
como um todo, não obstante apresentar aspecto de interesse social.
Sendo assim, por se tratar de direito individual disponível, evidencia-
se a inexeqüibilidade da defesa de tais direitos por intermédio da
ação civil pública. Destarte, as relações jurídicas existentes entre a
autarquia previdenciária e os segurados do regime de Previdência
Social não caracterizam relações de consumo, sendo inaplicável, in
casu, o disposto no art. 81, III, do Código de Proteção e Defesa do
Consumidor. Ressalva do entendimento do Relator.
Agravo regimental desprovido
(STJ, AGRESp 502610, DJU 26/04/2004, p. 196, Rel. Min. FELIX FISCHER)

PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DECLARAÇÃO DA ILEGALIDADE DE LEIS


MUNICIPAIS. COBRANÇA DA CHAMADA “COTA VOLUNTÁRIA” NAS CONTAS DE
ENERGIA ELÉTRICA. RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA ESTABELECIDA ENTRE A
FAZENDA MUNICIPAL E O CONTRIBUINTE. NÃO APLICABILIDADE, AO CASO, DO
ART. 21, DA LEI Nº 7.347/85, POSTO QUE A REFERIDA AÇÃO PRESTA-SE À
PROTEÇÃO DOS INTERESSES E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS, QUANDO OS
SEUS TITULARES SOFREREM DANOS NA CONDIÇÃO DE CONSUMIDORES.
ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO RECONHECIDA. PRECEDENTES
DESTA CORTE.
1. omissis;
2. Os interesses e direitos individuais homogêneos, de que trata o
art. 21, da Lei nº 7.347/85, somente poderão ser tutelados, pela via
da ação coletiva, quando os seus titulares sofrerem danos na condição
de consumidores.
3. omissis;
4. Ilegitimidade ativa do Ministério Público reconhecida. Precedentes
desta Casa Julgadora.
5. Recurso provido, ante a ilegitimidade ativa do MPF autor.
(STJ, RESp 506000, DJU 08/09/2003, p. 240, Rel. Min. JOSÉ DELGADO)

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCURSO PÚBLICO. ALEGAÇÕES DE


VIA PROCESSUAL IMPRÓPRIA PARA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE E
NULIDADE DE CITAÇÃO. PRELIMINARES REJEITADAS. EXAMES DE APTIDÃO
PSICOLÓGICA, MÉDICA E FÍSICA. CANDIDATOS REPROVADOS. OBTENÇÃO DE
SEGURANÇA PARA RECORRER DOS RESULTADOS. RECURSOS JULGADOS PELAS MESMAS
AUTORIDADES QUE APLICARAM A PROVA. REEXAME DOS RECURSOS
ADMINISTRATIVOS POR BANCA DISTINTA. DIREITOS INDIVIDUAIS DISPONÍVEIS E
DIVISÍVEIS, EMBORA HOMOGÊNEOS. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
ILEGITIMIDADE ATIVA.
1. omissis;
2. omissis;
3. (...) Em sede de concurso público, o direito à instância recursal
administrativa, com banca de composição distinta daquela que aplicou o
exame, não se constitui em direito coletivo ou em direito difuso,
defensável pela via da ação civil pública. Ao contrário, trata-se de
direito individual divisível e disponível. Embora possam haver
direitos homogêneos nesse sentido, não são eles defensáveis pela via
escolhida e, muito menos, por atuação ministerial. Ressalva feita aos
direitos relativos à relações de consumo, regidas pelo Código de
Defesa do Consumidor.
4. omissis;
5. omissis;
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6. Evidenciada, na hipótese, a ausência da legitimidade do Ministério


Público Federal para a defesa de interesses individuais divisíveis e
disponíveis, impõe-se a extinção do processo sem julgamento do mérito
(art. 267, VI e § 3.º, do CPC). Precedentes jurisprudenciais.
7. Remessa oficial e apelação da União Federal providas.
(TRF 3.ª Região, AC 741929, reg. 2000.60.00.001904-4, 3.ª Turma, Rel.
Des. Fed. NERY JÚNIOR).

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL AÇÃO CIVIL PÚBLICA.


REAJUSTE DE VENCIMENTOS. LEIS N.º 8.622/93 E 8.627/93. MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL. DESCABIMENTO DA VIA ELEITA.
1. “Versando a lide sobre interesses individuais disponíveis de um
grupo determinado, falece legitimidade ao Ministério Público
Federal para propor ação civil pública” (AC n.º 1998.34.00.001076-
6/DF, Rel. Juiz Carlos Fernando Mathias, 2.ª Turma”.
2. Precedentes.
3. Apelação improvida. (TRF 1.ª Região, AC 1998.01.00.063546-6/DF, T.
Suplementar, Rel. Juiz Ricardo Machado Rabelo, DJ 21/1/2002, p.
559, Revista Fórum Administrativo, Ed. Fórum, março de 2002, p.
356).
A exceção jurisprudencial, no que tange à essa atuação
específica do MPF restringe-se aos direitos que interessem à toda a
coletividade, v. g., interesses vinculados ao Sistema Financeiro da
Habitação (RESp 635807 e 613480), mortes de usuários do serviço público de
saúde (RESp 637332) ou outro, que por sua dimensão coletiva, seja
relevante para a sociedade, como, excepcionalmente, no caso da cobrança de
pedágios (RESp 417804 e outros).
A presente ação, porém, não foi ajuizada pelo Ministério
Público Federal, mas pela ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO
DO ESTADO DE SÃO PAULO, o que poderia levar ao entendimento de que há
possibilidade de trânsito da pretensão na via coletiva especial.
Ainda assim, duas questões teimam em incandescer a mente do
exegeta. A primeira: os direitos individuais homogêneos, tais quais os
invocados na presente ação, podem ser tidos como uma espécie de direitos
coletivos, para que a discussão possa transitar pela via da ação civil
pública? E a segunda: a ação civil pública é via processual para a defesa
de interesses individuais homogêneos que não sejam decorrentes de relações
de consumo, ainda que a ação coletiva seja intentada por associação dos
interessados?
Não estou convencido de que a categoria “direitos individuais
homogêneos” seja uma sub-espécie de direitos coletivos, a ensejar assim o
trânsito da estreita via coletiva especial.
Claro que os direitos coletivos, exatamente porque a
coletividade é composta de indivíduos, pertencem também a cada indivíduo.
Mas os direitos individuais, mesmo quando homogêneos, não pertencem à
coletividade, a não ser quando são de interesse de toda a sociedade,
considerada como um todo, como assentou, aliás, o Ministro CARLOS VELOSO,
no julgamento do RE 195.056/PR, em boa hora lembrada no voto proferido pela
douta relatoria:

“certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados


como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses
sociais e individuais indisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública
presta-se à defesa dos mesmos”.

Ora: se o direito, ainda que classificado a priori como


“individual homogêneo”, é percebido a fortiori como direito de interesse
coletivo ou como direito de interesse social indisponível, é, então,
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direito que extrapola da pessoa do indivíduo para abarcar toda a sociedade.


Não é mais direito individual, mas direito coletivo e, por isso mesmo,
despido de qualquer disponibilidade. Foi o que decidiu a Suprema Corte no
aresto trazido pelo voto da relatoria, embora isso não restasse dito de
maneira direta. Decidiu-se que os direitos individuais homogêneos ali
buscados eram de interesse de toda a sociedade. Mas não é, absolutamente, o
que ocorre aqui neste feito.
Os direitos invocados aqui nesta ação não são coletivos, eis
que plenamente divisíveis. Não é porque está a abarcar todos os aposentados
admitidos pelo BANESPA até a data de 23/5/75 que a indivisibilidade e a
indisponibilidade se apresentam, no sentido do conceito de direitos
coletivos.
Para mim, a hipótese sub-exame é aquela à qual brilhantemente
se referia RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO, isto é, apenas “um interesse
coletivo na forma porque é exercido, não em sua essência”. Porque, como bem
assinala o insigne processualista, “um feixe de interesses individuais não
se transforma em interesse coletivo, pelo só fato do exercício ser
coletivo. A essência permanece individual. Na medida em que se trata de uma
mera justaposição de interesses individuais, apenas exercidos
coletivamente, não se pode ainda falar, propriamente, de verdadeiro
interesse coletivo (...) Está claro que a vera noção de ‘interesse
coletivo’ pede mais que uma simples adição de interesses individuais.
Sempre se pode fazer coletivamente o que já antes se poderia fazer a título
individual; todavia, uma simples alteração no modo de exercício, não pode
alterar a essência dos interesses agrupados, que permanecem de natureza
individual” (Interesses Difusos, 3.ª Ed., RT, SP, 1994, p. 414).
Em suma, a divisibilidade dos direitos, o fato de a relação se
instaurar apenas entre os interessados, sem que com isso se atinja,
obrigatoriamente toda a coletividade, me convence de que neste caso, os
interesses são individuais homogêneos e não coletivos. Estão sendo
conjurados, apenas, de forma coletiva, mas isso não transmuda a sua
natureza. Até porque, afinal, não é de interesse da sociedade como um todo
– no sentido de interesse relativo a direito coletivo - a criação de um
fundo de pensão que atenda à uma categoria de ex-funcionários de uma
instituição financeira, como não seria caso tratássemos de funcionários
públicos ou mesmo de funcionários de uma grande instituição de qualquer
ramo e natureza.
Por isso que a espécie deve ser vista sob ótica distinta
daquela tratada no precedente da Suprema Corte trazida à balha (RE 195.056/
PR), em que se tratou da correção de mensalidades escolares: o precedente
foi válido para toda a sociedade brasileira e realmente interessava à
coletividade, mesmo porque o precedente tinha em mira a realização do
direito à educação, elevado à categoria de norma constitucional.
Mas, repito, não é o caso presente. Tanto é assim que vários
dos eventuais beneficiários de uma decisão favorável nestes autos
ingressaram com ações individuais, buscando as mesmas providências aqui
requeridas, é o que se tem notícia.
Adentro ao segundo ponto que considerei determinante à
reflexão, isto é: mesmo em se tratando de direitos individuais homogêneos,
seria cabível a ação civil pública para sua defesa, admitindo-se que não
tratamos de relação de consumo?
Penso também que não.
Para mim, a previsão do Código de Defesa do Consumidor é
estrita, abrangendo somente as relações de consumo. Trago à colação lição
doutrinária constante de conhecida obra de HELY LOPES MEIRELLES:
“A possibilidade de ajuizamento de ação civil pública para a defesa de
direitos individuais disponíveis restringe-se, segundo a
jurisprudência mais atual, e em caráter extraordinário, às hipóteses
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de defesa de direitos homogêneos de consumidores (conforme definição


da legislação específica), e desde que tais direitos se insiram num
contexto de direitos sociais reconhecidos na Constituição. Assim, por
exemplo, admite-se a ação civil pública para discussão sobre
mensalidades escolares, considerando-se que o direito à educação é
protegido constitucionalmente, enquanto interesse de toda a sociedade”
(MANDADO DE SEGURANÇA (...), atualizado por ARNOLD WALD e GILMAR
FERREIRA MENDES, Malheiros, 2005, p. 182, em notas de rodapé).
Foi exatamente o que acabou sendo sufragada em diversos
acórdãos do Supremo Tribunal Federal e acabou sendo cristalizado na Súmula
n.º 643. Mas o fundamento – já o anotei - era exatamente que o direito à
educação é garantido na Constituição e interessa à sociedade como um todo.
Isso não ocorre aqui.
Portanto, também defendo a inaplicabilidade da ação civil
pública para a defesa de direitos individuais homogêneos puros. Não há base
legal para esse mister.
Afirmo isso, singelamente, porque a Lei n.º 7.347/85 (LACP),
somente autorizou o ingresso da ação civil pública nos casos de danos
morais e patrimoniais causados (i) ao meio ambiente, (ii) ao consumidor,
(iii) a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico
e paisagístico, (iv) a qualquer outro interesse difuso e coletivo, (v) por
infração da ordem econômica e da economia popular e (vi) à ordem
urbanística.
Não se diga que o art. 81 do Código de Defesa do Consumidor
autorizou o trânsito da via coletiva para a defesa irrestrita de todos e
quaisquer direitos homogeneamente considerados. Interpretação sistemática
dos dispositivos em tela nos autorizam a afirmar que a defesa coletiva, em
caso de direitos individuais homogêneos, é autorizada apenas para “a defesa
dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas“ que “poderá ser
exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo”. E como
complementa o inciso parágrafo único do dispositivo, “a defesa coletiva
será exercida quando se tratar de (...) interesses ou direitos individuais
homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.”
Quais direitos individuais homogêneos? Os dos consumidores e
das vítimas, evidentemente.
Portanto, não me resta dúvida alguma que direitos individuais
homogêneos que não digam com as restritas hipóteses elencadas no art. 1.º
da Lei n.º 7.347/85 e no art. 81 da Lei n.º 8.078/90 não podem ser objeto
da ação coletiva. Aliás, isso é plenamente confirmado pela leitura dos
artigos 91 e seguintes do CDC, que tratam exatamente das ações coletivas
para a defesa de interesses individuais homogêneos, nos casos das relações
de consumo.
A jurisprudência pátria, embora com divergências, tem decido
assim:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ILEGITIMIDADE. DIREITOS
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO.
1. A ação civil pública nasceu como instrumento processual adequado par
coibir danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de
valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico,
atendendo, assim, os interesses coletivos da sociedade. O campo de
aplicação da ação civil pública foi alargado por legislações
posteriores, especialmente pelo Código de defesa do Consumidor, para
abranger quaisquer interesses coletivos e difusos, bem como os
individuais homogêneos, estes últimos na proteção do meio ambiente, do
consumidor, dos bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico.
2. Tratando-se de interesses individuais, cujos titulares não podem ser
enquadrados na definição de consumidores, tampouco sua relação com o
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instituto previdenciário considerada relação de consumo, é inviável a


defesa de tais direitos por intermédio da ação civil pública.
3. Agravo desprovido.
4. (STJ AGRESP 404656/RS, 5.ª T., Rel. Min. Gilson DIPP, DJ 10/2/2003, in
Revista Fórum Administrativo, Ed. Fórum, março de 2002, p. 2038).

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FGTS. CORREÇÃO MONETÁRIA.


EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. ENTIDADE SINDICAL. CARÊNCIA DE AÇÃO
RECONHECIDA.
I – Não restando caracterizada qualquer das hipóteses de cabimento
previstas na Lei n.º 7.347/85 ou no Código de Defesa do Consumidor, já
que discutido direito de natureza individual e disponível, não pode o
sindicato de classe utilizar-se de ação civil pública com o objetivo
de reclamar índices de correção monetária expurgados dos saldos das
contas vinculadas ao FGTS.
II – Apelação desprovida.
(TRF 1.ª Região, AC 1999.01.00.113066-9/MG, 3.ª T. Suplementar, Rel.
juiz Moacir Ferreira Ramos, DJ 11/7/2002, p. 120, in Revista Fórum
Administrativo, Ed. Fórum, agosto de 2002, p. 1086).

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AÇÃO ORDINÁRIA COLETIVA.


ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. ISENÇÃO DE CUSTAS.
A ação civil pública, voltada para a defesa de direitos
transindividuais e indivisíveis, não se presta para veicular a tutela
de direitos individuais homogêneos, aos quais se recomenda a ação
ordinária coletiva.
(...)
(TRF 4.ª Região, AG 2003.04.01.028056-0/RS, 4.ª T., Rel. Des. Fed.
Valdemar Capeletti, DJU 2/6/2004, in Revista Fórum Administrativo, Ed.
Fórum, julho de 2002, p. 4179).
Também há apoio doutrinário para a afirmação:
“todavia, a aplicação supletiva das normas do Código de Defesa do
Consumidor à Ação Civil Pública só deve ocorrer, conforme determinação
expressa do legislador, no que couber, ou seja, nos casos em que o
mencionado diploma (LACP)admite a proteção de uma das espécies de
direitos aos quais se refere o seu art. 1.º. Deve, pois, prevalecer a
interpretação lógica e sistemática, que, em relação aos outros
interesses e direitos (art. 1.º, IV), só admite a utilização da ação
civil pública quando os mesmos forem coletivos ou difusos.” (MANDADO
DE SEGURANÇA (...), HELY LOPES MEIRELLES, atualizado por ARNOLD WALD e
GILMAR FERREIRA MENDES, Malheiros, 2005, p. 255, grifei).
Não admito, pois, o tráfego da ação civil pública para albergar
pretensão representativa de direitos individuais homogêneos não
relacionados a direitos do consumidor, cujo âmbito de abrangência não seja
tal que extrapole dos indivíduos para ser de interesse de toda a sociedade,
eis que, excluída essa restrita hipótese de admissibilidade, a utilização
da ação civil pública é reservada às relações de consumo e aos direitos
coletivos e difusos. Mas não é, realmente, o que se nos apresenta na
espécie.
Portanto, expostas estas razões, peço respeitosa vênia ao
ilustre relator para aderir à divergência inaugurada pela Desembargadora
Federal CECÍLIA MARCONDES para negar provimento à apelação.
É como voto.

NERY JÚNIOR
Desembargador Federal

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª. REGIÃO

PROC. : 2002.61.00.011303-5 AC 860969


APTE : ASSOCIACAO DOS FUNCIONARIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE
SAO PAULO AFABESP
REPDO : MAURICIO GENOFRE (= ou > de 65 anos) e outros
ADV : JOAO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES
APDO : Uniao Federal
ADV : ANTONIO LEVI MENDES
APDO : BANCO DO ESTADO DE SAO PAULO S/A BANESPA
ADV : LIVIA ROSSI
APDO : Banco Central do Brasil
ADV : JOSE OSORIO LOURENCAO
RELATOR : DES.FED. MÁRCIO MORAES / TERCEIRA TURMA

R E L A T Ó R I O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO SILVIO


GEMAQUE :

Trata-se de apelação interposta pela Associação dos


Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo – AFABESP, contra
sentença que indeferiu a inicial de ação civil pública proposta em face da
União Federal, do Banco Central do Brasil – BACEN e do Banco do Estado de
São Paulo S.A. – BANESPA, por entender o MM. Juízo a quo que o art. 1º,
parágrafo único, da Lei n. 7347/1985, com a redação que lhe foi dada pela
Medida Provisória n. 2.102-30, de 26.4.2001, sucedida pela MP n. 2.180-35,
de 24.8.2001, obsta a discussão da matéria tratada nos autos, nesta via.

Relata a inicial os fatos que seguem.

As Leis Estaduais Paulistas n. 1386/1951 e n. 4819/1958,


seguidas da Circular n. 6/1962 - BANESPA, instituíram a complementação de
aposentadorias e pensões aos empregados e pensionistas de empregados
falecidos do Banco do Estado de São Paulo – BANESPA.

A Lei Estadual n. 200/1974 revogou a legislação estadual


que deu origem a tal benefício, e em conseqüência, o Regulamento de
Pessoal, publicado em 23.maio.1975, revogou a vantagem, consignando que
apenas fariam jus a ela os futuros contratados pelo regime da Consolidação
das Leis do Trabalho – CLT, que não fossem optantes do FGTS.

Ocorre que as admissões a partir de 23.maio.1975 passaram


a ser feitas com exigência da opção pelo FGTS, então os admitidos dessa
data em diante ficaram excluídos do benefício.

Em 1987, o BANESPA instituiu o Fundo Banespa de Seguridade


Social - BANESPREV, para os funcionários admitidos a contar de 23.5.1975
atendendo o disposto na Lei n. 6.435/1977. Essa Lei, no entanto, obrigava o
banco a instituir Fundo de Pensão para pagamento da complementação de todos
os admitidos até 22.maio.1975, em face do direito adquirido no período em
que vigorou a complementação de aposentadorias e pensões.

A Lei n. 6.435/1977 foi revogada pela Lei Complementar n.


109/2001 que, no entanto, continua obrigando as empresas que pagam
complementação de aposentadoria aos seus empregados, que o façam por meio
de fundo de pensão adequado às regras da previdência complementar.

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª. REGIÃO

No processo de privatização do BANESPA, conforme cálculo


atuarial realizado, foi apurado que seriam necessários R$ 2,7 bilhões para
pagamento da complementação até a morte do último beneficiário, sendo que,
inicialmente, a dívida ficou a cargo do Estado de São Paulo e depois, a
União assumiu esse passivo previdenciário. Nesse passo, o Senado Federal
aprovou a emissão de títulos públicos no valor total de R$ 2.902,9 milhões,
inegociáveis, com resgate mensal para fazer face ao pagamento das
complementações citadas.

Os títulos, assim, entende a autora, teriam que ser


destinados a um Fundo de Pensão, para que fosse dado cumprimento à Lei n.
6.435/1977.

No entanto, União, Banco Central do Brasil e BANESPA


elaboraram o Plano de Complementação de Aposentadorias e Pensões que
estabelecia a necessidade de opção dos aposentados e pensionistas aos seus
termos, que previam : renúncia aos direitos previstos no Regulamento de
Pessoal, renúncia ao direito de ação, troca das complementações semestrais
de 1 (um) salário, em média, pelo acréscimo de 1% da aposentadoria devida.
Esse Plano seria administrado pelo BANESPREV e teve a adesão de pouco mais
de 5% do público alvo.

Para custear tal Plano, foi transferido para o BANESPREV


valor proporcional ao número de optantes, relativo aos títulos públicos
criados, ou seja, R$ 312.921.316,00 (trezentos e doze milhões, novecentos e
vinte e um mil, trezentos e dezesseis reais).

Após o prazo de opção, relata a inicial a ocorrência de


represálias como a concessão de maiores vantagens aos optantes do que
aquelas inicialmente divulgadas no prazo para adesão, a supressão de
benefícios dos inativos que não aderiram ao Plano ou exclusão deles da
incidência de vantagens adicionais concedidas aos outros, reajuste das
complementações, pelo IGP-DI-FGV, apenas aos optantes do Plano.

Então, o BANESPA ainda deve dar cumprimento à Lei n.


6.435/1977 e à LC n. 109/2001, em relação aos aposentados e pensionistas
admitidos antes de 23 de maio de 1975, que seriam mais de 13.000 pessoas,
haja vista a baixa adesão ao mencionado Plano de Complementação em vigor
(apenas 5% do total de beneficiários), como já mencionado. Para tanto, é
necessária a transferência do pagamento da complementação de aposentadorias
e pensões e dos títulos emitidos com a aprovação do Senado para um Fundo de
Pensão.

Ocorre que tais títulos, que eram inegociáveis por


disposição da Mensagem n. 106/1997 do Senado Federal, foram transformados
em negociáveis por meio da Medida Provisória n. 1974-82, Decreto n.
3.540/2000, Portarias n. 214/2000 e 386/2000, da Secretaria do Tesouro
Nacional, que, conforme a autora, padeceriam de inconstitucionalidade, por
afronta ao art. 52 da CF.

Aduz a inicial que o encargo de pagamento das


complementações acabou ficando com o BANESPA, agora já privatizado, sendo
que no edital de privatização já houve referência aos títulos como sendo
negociáveis, o que implicaria na perda da garantia do pagamento das
complementações, além de estar o banco auferindo lucro com o resgate mensal
dos títulos.

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª. REGIÃO

Requereu-se antecipação de tutela, sob a alegação de


iminente perigo da negociação dos títulos, para que:

. fosse determinado o bloqueio dos títulos de forma que não fossem


utilizados pelo BANESPA fora da característica da inegociabilidade
constante da Mensagem n. 106/1997 e Resolução n. 118/1997, do Senado;

. as sobras mensais decorrentes das diferenças entre os valores


resgatados e os efetivamente despendidos com o pagamento das
complementações fossem utilizados na compra de novos títulos de mesma
natureza;

. fosse determinado o reajuste das complementações relativas ao período


de 1.9.2000 a 31.8.2001.

Pede a autora, afinal:

I) a declaração de inegociabilidade dos títulos garantidores do


pagamento da complementação de aposentadoria e pensão dos
associados e beneficiários da presente ação;

II) a condenação do Banco do Estado de São Paulo – Banespa:

a) para que dê imediato cumprimento às disposições da Lei


6.435/1977 e da Lei Complementar 109/2001;

b) na criação de um Plano de Complementação para atendimento de


todos os ex-funcionários que não aderiram ao Plano Banesprev,
com as características especificadas na inicial;

c) no pagamento aos beneficiários da ação das diferenças vencidas


de suas complementações de aposentadoria e pensão, inclusive
vincendas, até a efetiva constituição do Fundo reivindicado;

d) na obrigação de não dar outro destino aos títulos referidos,


senão o de garantir a liquidez do Fundo a ser implementado, nos
moldes para os quais foram criados.

Protestou a autora pela produção de provas, especialmente


depoimento pessoal do representante legal dos réus, juntada de documentos,
inquirição de testemunhas, vistorias e perícias.

Os textos legais em discussão ou sobre os quais que se


fundamenta a ação estão redigidos como segue.

Art. 1º, parágrafo único, da Lei 7.347/1985 – Lei da Ação


Civil Pública

“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem


prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por
danos morais e patrimoniais causados :
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I – ao meio ambiente;

II – ao consumidor;

III – aos bens e direitos de valor artístico, estético,


histórico, turístico e paisagístico;

IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

V – por infração da ordem econômica e da economia popular;

VI – à ordem urbanística.”

Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para


veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições
previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço –
FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos
beneficiários podem ser individualmente determinados.”

Art. 21 da Lei n. 7.347/1985 – LACP

“Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses


difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os
dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código
de Defesa do Consumidor.”

Art. 81, parágrafo único, II e III da Lei n. 8.078/1990 –


Código de Defesa do Consumidor

“Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos


consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo
individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se


tratar de :
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para
efeitos deste código, os transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas
e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos,
para efeitos deste código, os transindividuais, de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria
ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte
contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim
entendidos os decorrentes de origem comum.”
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PODER JUDICIÁRIO
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A legitimidade ativa da Associação autora está


fundamentada no art. 5º, XXI, da Constituição Federal, no art. 5º da Lei
n. 7.347/1985 – Lei da Ação Civil Pública e no art. 82, IV – Código de
Defesa do Consumidor, este último assim redigido :
“Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são
legitimados concorrentemente:
...
IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos
um ano e que incluam entre seus fins institucionais a
defesa dos interesses e direitos protegidos por este
código, dispensada a autorização assemblear.”

Concedida a antecipação de tutela, os réus foram intimados


e citados, tendo o BANESPA oferecido contestação.

Apreciando pedidos de reconsideração da decisão


antecipatória, apresentados pela União e pelo BANESPA, o MM. Juízo a
quo afastou a alegação de ilegitimidade ativa, por entender que a AFABESP
está autorizada por seus estatutos a representar seus associados judicial e
extrajudicialmente, bem como também detém legitimação ativa para interpor
ação civil pública porque, na espécie, pleiteia “interesse coletivo”.
Considerando, entretanto, que se pretende tutelar direito de natureza
institucional, com embasamento em interpretação ampla do inciso IV do art.
1º da LACP, cujos titulares são facilmente identificáveis, entendeu o MM.
Juízo a quo não caber a ação civil pública por força do parágrafo único do
art. 1º da Lei n. 7.347/1985, na redação da MP 2.102-30, e indeferiu a
inicial, extinguindo o processo sem julgamento do mérito, por aplicação dos
artigos 295, V e 267, I, do CPC e cassando os efeitos da antecipação de
tutela (fls. 651/660).

Apela a autora a fls. 756/771, dizendo nenhum obstáculo


existir à propositura da ação, haja vista ser inconstitucional a Medida
Provisória n. 2.180-35 (sucessora da MP 2.102-30), porque a Emenda
Constitucional n. 32, posterior à citada MP, vedou a edição de medidas
provisórias versando sobre direito processual, sendo que o art 2º da
mencionada Emenda não teria validado a Medida Provisória, mas apenas
significaria que não há mais prazo para que as medidas provisórias
pendentes de análise à data da vigência da EC sejam votadas pelo Congresso.
Além disso, argumenta que a aludida MP traz evidente obstrução do acesso
coletivo à Justiça, violando os princípios da isonomia, da inafastabilidade
da jurisdição e do due process of law.

O citado art. 2º da EC 32/2001 dispõe :

“Art. 2º As medidas provisórias editadas em data anterior


à da publicação desta emenda continuam em vigor até que
medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou
até deliberação definitiva do Congresso Nacional.”

Finalmente, diz a AFABESP que mesmo que se entenda válida


a MP 2.102-30, a alteração que promoveu no art. 1º da Lei 7.347/1985 não
impede o trâmite desta ação civil pública porque :

a) a LACP diz respeito a fundos já


existentes, enquanto esta ação visa
a criação de um fundo;

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PODER JUDICIÁRIO
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b) o dispositivo legal faz menção a


fundos institucionais, ou seja,
fundos instituídos pelo Governo
como por exemplo, o PIS, PASEP,
FGTS e INSS, e não aos fundos de
natureza privada.

Requer, em conclusão, a alteração da sentença,


restabelecendo-se a antecipação de tutela e determinando-se o
prosseguimento regular da ação civil pública. Em não sendo reformada a
sentença, pede o prequestionamento explícito dos seguintes artigos da
Constituição Federal : art. 5º, caput e inciso XXXV, art. 62, § 1º, I, “b”,
com a redação da EC 32.

Recebido o recurso, foram apresentadas contra-razões pelo


BANESPA e pela União.

Neste Tribunal, os autos foram encaminhados para


manifestação da Procuradoria Regional da República, que requereu a fls.
951/967 o provimento da apelação com a anulação da sentença e
prosseguimento do feito em 1º grau. Pediu, finalmente, a preferência no
julgamento da ação, em atenção aos termos do art. 1211-A do CPC e art. 71,
da Lei n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso).

É o relatório.

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PROC. : 2002.61.00.011303-5 AC 860969


APTE : ASSOCIACAO DOS FUNCIONARIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE
SAO PAULO AFABESP
REPDO : MAURICIO GENOFRE (= ou > de 65 anos) e outros
ADV : JOAO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES
APDO : Uniao Federal
ADV : ANTONIO LEVI MENDES
APDO : BANCO DO ESTADO DE SAO PAULO S/A BANESPA
ADV : LIVIA ROSSI
APDO : Banco Central do Brasil
ADV : JOSE OSORIO LOURENCAO
RELATOR : DES.FED. MÁRCIO MORAES / TERCEIRA TURMA
V O T O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO SILVIO


GEMAQUE :

Cuida-se de apelação contra decisão que extinguiu ação


civil pública por aplicação do disposto no parágrafo único do art. 1º da
Lei n. 7.347/1985 – Lei da Ação Civil Pública.

A matéria posta a julgamento desta Terceira Turma implica


na apreciação do cabimento da ação civil pública para a proteção de direito
individual homogêneo, na decisão sobre a constitucionalidade do citado
parágrafo único do art. 1º da Lei n. 7.347/1985 e em saber se a restrição
por ele estabelecida alcança os fundos de previdência complementar.

I) Cabimento da ação civil pública em


defesa de interesses individuais
homogêneos.

A Constituição Federal, estabelece ser função


institucional do Ministério Público, “promover o inquérito civil e a ação
civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio
ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;” (art. 129, III).

Diz a Lei n. 7.347/1985 :

“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem


prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por
danos morais e patrimoniais causados :

I – ao meio ambiente;

II – ao consumidor;

III – aos bens e direitos de valor artístico, estético,


histórico, turístico e paisagístico;

IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

V – por infração da ordem econômica e da economia popular;


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VI – à ordem urbanística.”

O art. 21 da mesma Lei 7.347/1985, na redação que lhe foi


dada pela Lei n. 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor, diz que
“Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e
individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que
instituiu o Código de Defesa do Consumidor.” (sublinhei). O Título III do
CDC trata da defesa em juízo dos direitos metaindividuais, então, a
referência da Lei 7.347/1985 a interesses individuais, é tida pacificamente
como significando menção a interesses individuais homogêneos, uma vez que
apenas estes são espécie de interesses metaindividuais.

Interessante, neste ponto, é o seguinte trecho do voto do


Ministro Sepúlveda Pertence, proferido no RE 195056-1/PR, nestes termos :

“É preciso recordar que, no acelerado processo de


construção teórica e legislativa dos institutos da tutela
jurisdicional dos interesses metaindividuais, a categoria
dos individuais homogêneos só ganhou identidade própria
entre nós com a sua definição no art. 81, III, do Código
de Defesa do Consumidor, que é de 1990.

Se já é sujeita a críticas a interpretação da Constituição


conforme a lei ordinária precedente, menos ainda se
sustenta a que parta de uma distinção conceitual advinda
da lei superveniente à Constituição, como a que o Código
veio a estabelecer entre interesses coletivos stricto
sensu e interesses individuais homogêneos (art. 81, II, e
III).

Por isso, “o fato de o art. 129, III, CF não se referir a


“interesses individuais homogêneos” – acentua com razão
Rodolfo Mancuso (Sobre a Legitimação do MP em matéria de
interesses individuais homogêneos em Milaré (coord.), Ação
Civil Pública, ed. RT, 1995, p. 438, 444) – não autoriza,
a nosso ver, a ilação de que tal tipo de interesse
metaindividual estaria excluído da esfera de atuação do
MP. Em primeiro lugar, tal nomenclatura é espécie do
gênero “interesses metaindividuais”, cabendo lembrar que o
dispositivo em questão tem um endereçamento visivelmente
voltado para a acepção mais genérica, e não para a
conotação restritiva : fala em “patrimônio público e
social” e em outros “interesses difusos e coletivos”; ...;
em terceiro lugar, não se pode dizer, a rigor, que a CF
foi omissa quanto aos interesses “individuais homogêneos”,
porque a Carta Magna é de 1988 e essa expressão aparece no
CDC (art. 81), texto em vigor a partir de 1990”.

Conclui-se, pois, neste primeiro passo, que os interesses


individuais homogêneos são passíveis de defesa via ação civil pública, em
conformidade com a Constituição Federal.

Mas, afinal, o que são interesses individuais homogêneos ?

No dizer da Professora Ada Pellegrini Grinover, “são na


verdade direitos subjetivos tradicionais, passíveis, ainda hoje, de
tratamento processual individual, mas também, agora, de tratamento
coletivo, em razão de sua homogeneidade e de sua origem comum.” (“Da class
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PODER JUDICIÁRIO
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action for damages à ação de classe brasileira : os requisitos de


admissibilidade”, in “Ação Civil Pública”, Coord. Edis Milaré, Ed. RT,
2001, pág. 19/39).

No mesmo artigo, a ilustre doutrinadora ensina que serão


homogêneos os direitos quando houver prevalência das questões comuns sobre
as individuais, e esclarece : “No consumo de um produto potencialmente
nocivo, não haverá homogeneidade de direitos entre um titular que foi
vitimado exclusivamente por esse consumo e outro cujas condições pessoais
de saúde lhe causariam um dano físico, independentemente da utilização do
produto ou que fez deste uso inadequado. Não há homogeneidade entre
situações de fato ou de direito sobre as quais as características pessoais
de cada um atuam de modo completamente diferente.”.

Ainda que tenham origem comum, entretanto, diz Ada


Grinover que serão heterogêneos os interesses se, sob o aspecto prático,
inexistir prevalência dos aspectos coletivos sobre os individuais, ou seja,
menciona o requisito da superioridade da tutela coletiva, em relação à
individual, em termos de justiça e eficácia da decisão, “abordado, no
direito brasileiro, sob dois aspectos : o do interesse de agir e o da
efetividade do processo”.

Melhor dizendo, seria aferir a necessidade, a utilidade e


a adequação do provimento jurisdicional coletivo invocado, pois se esse
provimento “resultante da ação civil pública em defesa de direitos
individuais homogêneos não é tão eficaz quanto aquele que derivaria de
ações individuais, a ação coletiva não se demonstra útil à tutela dos
referidos interesses. E, ademais, não se caracteriza como a via adequada à
sua proteção.”

E prossegue a professora :

“Explique-se : a ação civil pública de responsabilidade


pelos danos individualmente sofridos, como é notório,
conduz a uma sentença condenatória, genérica, que
reconhece a responsabilidade do réu pelos danos causados e
o condena a repará-los às vítimas ou a seus sucessores
ainda não identificados (art. 95 do CDC). Segue-se uma
liquidação da sentença, a título individual, em que poderá
provar, aos que se habilitarem, o dano pessoal e o nexo de
causalidade entre este e o dano geral reconhecido pela
sentença, além de quantificar os prejuízos.

Ora, a prova do nexo causal pode ser tão complexa, no caso


concreto, que tornará ineficaz a sentença condenatória
genérica....

Nem todas as ações civis públicas em defesa de direitos


individuais homogêneos trarão a mesma dificuldade. Pense-
se num pedido de restituição de um tributo
inconstitucional a uma categoria de contribuintes, ou de
devolução de mensalidades escolares pagas em excesso, ou
ainda de pagamento de uma diferença devida pela
Previdência Social ou por bancos na aplicação de índices
de correção monetária. Nesses casos, e em muitos outros, o
reconhecimento do dano geral será extremamente útil e
adequado para liquidações que demandarão prova bastante
simples.”.

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª. REGIÃO

Lembra ainda, a doutrinadora, que a técnica processual


deve assegurar os fins últimos da prestação jurisdicional, ou seja, o exame
do interesse processual, no binômio interesse-utilidade e interesse-
adequação, deve também ser realizado “enquanto exigência da função social
do processo, entendido como instrumento que efetivamente leve à pacificação
com justiça”.

Já Lucia Valle Figueiredo, escreve que os direitos


individuais homogêneos, se forem de tal ordem e de tal relevância que
repercutam no patrimônio social, serão também indisponíveis e, portanto,
passíveis de defesa via ação coletiva. Por patrimônio social, esclarece,
entende-se o “conjunto de bens jurídicos assim denominados em face dos
valores adotados pelo texto constitucional”, e exemplifica esses valores
com a moralidade administrativa, a proteção ao idoso, à criança e ao
adolescente. (“Ação Civil Pública – Gizamento Constitucional”, in “Ação
Civil Pública”, coord. Édis Milaré, Ed. RT, 2001, pág. 484/502).

Em reforço a essa tese, colhemos subsídios na


jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal, que já decidiu que
“Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como
interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais
e individuais indisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública presta-se a
defesa dos mesmos,...” (RE 195056/PR, Rel. Min. Carlos Velloso, j.
8.12.1999, maioria).

Transpondo tais ensinamentos ao caso dos autos,


verificamos a viabilidade da ação coletiva na defesa dos direitos
individuais homogêneos aqui tratados.

De fato, o direito invocado dos aposentados e pensionistas


do BANESPA tem origem comum e há prevalência das condições comuns sobre as
individuais, na medida em que as invocadas lesões de direito afetam,
indistintamente, a todos os admitidos pelo BANESPA até 23 de maio de 1975,
independentemente das suas específicas condições, que não demandarão
dificuldade excessiva no processo de execução. Assim, a efetividade da
prestação jurisdicional estará garantida pela via da ação coletiva, sendo
que o mesmo não se poderia dizer se ficassem os mais de treze mil
aposentados e pensionistas obrigados a entrar com ações individuais,
abarrotando ainda mais a já assoberbada Justiça Federal, e ainda sujeitando
os jurisdicionados às vicissitudes da tramitação de milhares de ações
perante diferentes Juízos, com a possibilidade de prolação de decisões nos
mais diversos sentidos.

Acresça-se, ainda, que nestes autos discute-se a


existência ou não de óbice à negociabilidade de títulos públicos, ocorrida
no processo de desestatização do BANESPA, que estariam em verdade
destinados ao pagamento de complementações de aposentadorias e pensões,
portanto, assunto atinente à previdência privada, de caráter
complementar, especialmente enfocada pela Constituição Federal em seu
artigo 202, inserido no Título destinado ao trato da ordem social e,
portanto, diz com valores integrantes do patrimônio social do cidadão.

Recorremos, mais uma vez, a trecho do voto do Eminente


Ministro Sepúlveda Pertence no RE 195.056-1/PR, à guisa de ilustração :

“É preciso não perder de vista – conforme a lúcida


observação de Mancuso...- que, se interesses “difusos e
coletivos são, sem jogo de palavras, essencialmente
coletivos” (...) os “individuais homogêneos são episódica
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e contingentemente “coletivos”, já que o são somente na


forma judicial pela qual vêm exercidos” : ao contrário
daqueles, nesses últimos, anota, “os sujeitos são já
identificados (ou ao menos identificáveis) e o objeto é
cindível, divisível, atribuído a cada um desses sujeitos”
: de tudo isso – conclui o autor ilustre – “no que
concerne aos interesses individuais homogêneos, o seu
trato processual coletivo não decorre de sua natureza (que
é individual!) e sim de duas circunstâncias
contingenciais, a saber : a) de um lado, o expressivo
número das pessoas integradas no segmento social
considerado ...; b) de outro, o fato desses interesses
derivarem de origem comum, o que lhes confere
uniformidade, recomendando o ajuizamento de ação coletiva,
seja para prevenir eventuais decisões contraditórias, seja
para evitar sobrecarga desnecessária no volume do serviço
judiciário.”

Conclui-se, então, até aqui, pelo cabimento da ação civil


pública para a defesa dos interesses individuais homogêneos postos nos
autos.
II) A subsunção da hipótese dos autos ao disposto no art.
1º, parágrafo único da Lei n. 7.347/1985
Em que pese existir nos autos argüição de
inconstitucionalidade do texto legal em evidência, a matéria há de ser
apreciada, por primeiro, sob o aspecto da legalidade, tal como foi focada
pela sentença impugnada.
Nesse passo, tem razão a Procuradoria Regional da
República em seu parecer lançado a fls. 965/967, no sentido de que os
fundos de previdência complementar, de natureza privada, não estão
abrangidos na expressão “fundos de natureza institucional” inseridos no
parágrafo único do art. 1º da Lei n. 7.347/1985.
Passo a transcrever a manifestação :
“...os fundos de previdência privada, nos quais se
enquadra o fundo de pensão complementar de parte dos
associados da autora da presente ACP sempre foram regidos
por legislação própria, a saber : Lei nº 6435, de 15 de
julho de 1977, que dispunha sobre as entidades de
previdência privada, e hoje pela Lei Complementar nº 109,
de 29 de maio de 2001 (...).
Ressalve-se que os fundos de pensão possuem personalidade
jurídica própria, e são conhecidas como as entidades de
Previdência Complementar, podendo ser classificadas em
fechadas e abertas, de acordo com seus estatutos (...).
No âmbito constitucional, a Emenda nº 20, de 15 de
dezembro de 1988, estabeleceu a seguinte redação para o
artigo 202 :
“Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter
complementar e organizado de forma autônoma em relação ao
regime geral de previdência social, será facultativo,
baseado na constituição de reservas que garantam o
benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
§ 1° A lei complementar de que trata este artigo
assegurará ao participante de planos de benefícios de
entidades de previdência privada o pleno acesso às
informações relativas à gestão de seus respectivos planos.
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(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)


§ 2° As contribuições do empregador, os benefícios e as
condições contratuais previstas nos estatutos,
regulamentos e planos de benefícios das entidades de
previdência privada não integram o contrato de trabalho
dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios
concedidos, não integram a remuneração dos participantes,
nos termos da lei. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 20, de 1998)
§ 3º É vedado o aporte de recursos a entidade de
previdência privada pela União, Estados, Distrito Federal
e Municípios, suas autarquias, fundações, empresas
públicas, sociedades de economia mista e outras entidades
públicas, salvo na qualidade de patrocinador, situação na
qual, em hipótese alguma, sua contribuição normal poderá
exceder a do segurado. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 20, de 1998)
§ 4º Lei complementar disciplinará a relação entre a
União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, inclusive
suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e
empresas controladas direta ou indiretamente, enquanto
patrocinadoras de entidades fechadas de previdência
privada, e suas respectivas entidades fechadas de
previdência privada. (Incluído pela Emenda Constitucional
nº 20, de 1998)
§ 5º A lei complementar de que trata o parágrafo anterior
aplicar-se-á, no que couber, às empresas privadas
permissionárias ou concessionárias de prestação de
serviços públicos, quando patrocinadoras de entidades
fechadas de previdência privada. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 20, de 1998)
§ 6º A lei complementar a que se refere o § 4° deste
artigo estabelecerá os requisitos para a designação dos
membros das diretorias das entidades fechadas de
previdência privada e disciplinará a inserção dos
participantes nos colegiados e instâncias de decisão em
que seus interesses sejam objeto de discussão e
deliberação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20,
de 1998)”
Portanto, quando da primeira edição da Medida Provisória
1984 (finalmente, reeditada sob o nº 2180), que introduziu
no artigo 1º da Lei nº 7437/85 o malfadado parágrafo
único, a Constituição já tratava da “previdência
complementar”.
A Medida Provisória 2180-35 que foi tão específica quanto
às matérias que não poderiam ser objeto de Ação Civil
Pública, citando expressamente o FGTS, certamente se
quisesse tratar de fundo de previdência complementar,
teria usado tal expressão.
Por outro lado, os ditos “fundos de natureza
institucional” mencionados no parágrafo único do artigo 1º
da Lei nº 7347/85 são aqueles criados por uma lei própria
para uma finalidade específica, estabelecendo também a
referida lei a origem dos recursos, sua forma de aplicação
e seu órgão gestor. A aplicação dos recursos de tais
fundos para as finalidades estabelecidas nas leis
instituidoras está adstrita também à fiscalização dos
Tribunais de Contas.
Assim, são fundos de natureza institucional o Fundo de
Amparo aos Trabalhadores (FAT) e o Fundo de Amparo à
Pesquisa no Estado de São Paulo. Os fundos institucionais
públicos estão sob administração de “Conselhos Gestores”,
o FAT pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao
Trabalho – CODEFAT e o Fundo de Pesquisa de São Paulo pelo
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Conselho Superior da Fundação de Amparo à Pesquisa no


Estado de São Paulo – FAPESP.
Desta forma, fica explicitada a total diferença entre
fundo de previdência complementar e fundo de natureza
institucional, razão pela qual ainda que o parágrafo único
do artigo 1º da Lei 7.347/85 fosse constitucional não
poderia ser aplicado na presente hipótese, pois o
Associação dos Funcionários Aposentados do Banco do Estado
de São Paulo – AFABESP deduz na presente ação civil
pública pedido relacionado à fundo de previdência
complementar.” (Sic)
Acresça-se que De Plácido e Silva assim define o que seja
institucional : “Relativo ou pertinente a instituição, exprime, geralmente,
o sentido de fundamental, orgânico, vital, necessário, indispensável.
Regras, fatos ou formalidades institucionais entendem-se as que se
registram ou se anotam como fundamentais, vitais, ou indispensáveis à
legitimidade da instituição a ser estabelecida ou a ser formada.”
Sobre instituição diz : “é a expressão empregada para
designar a própria corporação ou a organização instituída, não importa o
fim a que se destine, isto é, seja econômico, religioso, pio, educativo,
cultural, recreativo, etc. Consideram-se pessoas jurídicas. Indica, mesmo,
usado no plural, o conjunto de órgãos representativos da soberania nacional
e que forma o próprio governo. São as instituições públicas.”
Não tendo o parágrafo único do art. 1º da Lei n.
7.347/1985 definido o que vêm a ser os “fundos institucionais”, e tratando-
se de norma limitadora de direito, sua interpretação há de ser restritiva
para compreender-se como referindo-se aos fundos vitais, indispensáveis, às
instituições públicas e portanto, não abrangendo os fundos de previdência
privada.
Analisando a matéria dos autos exclusivamente sob o
aspecto da legalidade, conclui-se, pois, pela reforma da sentença,
determinando-se o prosseguimento da ação na origem.

III) A constitucionalidade do parágrafo único do art. 1º da Lei


7.347/1985

Em que pese os relevantes fundamentos trazidos aos autos


acerca da inconstitucionalidade do dispositivo legal em destaque, entendo
que a matéria fica prejudicada pelo provimento do recurso com fundamento na
ilegalidade do entendimento esposado na sentença.

IV) Antecipação de tutela


Relativamente à antecipação de tutela, impossível o mero
restabelecimento da decisão concessiva datada de 17 de junho de 2002, como
quer a apelante. Tendo sido determinado o prosseguimento da ação, o atual
preenchimento ou não dos requisitos para a concessão da medida deverá ser
apreciado pelo Juízo de origem.
V) Art. 515, § 3º, CPC
Finalmente, ressalto não ser aplicável à espécie o
disposto no art. 515, § 3º, do CPC (imediato julgamento do mérito pelo
Tribunal), haja vista que o processo não está pronto para julgamento.

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De fato, a sentença foi proferida antes mesmo da juntada


da contestação do BANESPA, que argúi, dentre outros fundamentos para a
improcedência da ação, a falta de comprovação de prejuízos aos associados
da autora pelas “represálias” que, conforme alegações da inicial, o banco
teria imposto aos não optantes do BANESPREV, existindo pedido tanto da
autora quanto do BANESPA pela produção de provas. Ademais, embora
obrigatória a intervenção do Ministério Público na ação civil pública, por
força do disposto no art. 5º, § 1º - LACP, não houve intimação para tanto
em Primeira Instância, o que só ocorreu neste Tribunal, com manifestação da
Procuradoria Regional da República exclusivamente quanto à matéria da
apelação, opinando pelo prosseguimento da ação na origem. Assim, não há
manifestação do custos legis acerca do mérito, o que poderia acarretar a
nulidade do julgamento.

Pelo exposto, dou parcial provimento à apelação.

É o voto.

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PROC. : 2002.61.00.011303-5 AC 860969


ORIG. : 15 Vr SAO PAULO/SP
APTE : ASSOCIACAO DOS FUNCIONARIOS APOSENTADOS DO BANCO DO
ESTADO DE SAO PAULO AFABESP
REPDO : MAURICIO GENOFRE (= ou > de 65 anos) e outros
ADV : JOAO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES
APDO : Uniao Federal
ADV : ROGERIO EMILIO DE ANDRADE
APDO : BANCO DO ESTADO DE SAO PAULO S/A BANESPA
ADV : LIVIA ROSSI
APDO : Banco Central do Brasil
ADV : JOSE OSORIO LOURENCAO
RELATOR : DES.FED. MÁRCIO MORAES / TERCEIRA TURMA

DECLARAÇÃO DE VOTO

Trata-se de apelação interposta pela autora, contra decisão que


indeferiu a inicial em ação civil pública ajuizada em face da União
Federal, Banco Central do Brasil e do Banco de São Paulo por entender o MM.
Juiz “a quo” que o art. 1º., parágrafo único da Lei 7347/85, com redação
dada pela Medida Provisória 2102-30 de 2001, obsta a discussão da matéria
tratada nos respectivos autos.

Acolho na sua íntegra o minucioso relatório apresentado pelo


Senhor Relator.

Em voto proferido, o Eminente Relator acolhe a tese oferecida


pela parte apelante,no sentido de que o mérito versa sobre direitos
individuais homogêneos, possível portanto a discussão da questão por meio
de ação civil pública.

Consoante os termos da inicial, a presente ação foi proposta


pela autora ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE
SÃO PAULO – AFABESP, em benefícios de seus associados, pleiteando que o
Banespa dê integral cumprimento às disposições da Lei 6435/77 e da Lei
Complementar 109/2001, que regulamentaram a previdência complementar para
seus funcionários aposentados admitidos na empresa até o dia 22/05/75, bem
como para os dependentes dos funcionários falecidos, os quais vêm
percebendo complementação de aposentadoria e pensão diretamente dessa
instituição financeira, em completo desacordo com s aludida legislação. O
pedido inicial é no sentido de que seja julgado procedente, para que sejam
declarados inegociáveis os títulos garantidores do pagamento da
complementação de aposentadoria e pensão dos associados e beneficiários da
presente ação, em razão da inconstitucionalidade das Portarias 214/2000 e
386/2000, bem como do Decreto 3540/2000 e da Medida Provisória 1974-82, por
afrontarem o disposto no art. 52 da Constituição Federal.

Alega a autora, ora apelante, que o direito discutido nestes


autos, estaria inserido entre os direitos coletivos ou direito individuais
homogêneos decorrentes de origem comum.

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Contudo, contrariando o entendimento trazido pela ora apelante,


bem como adotado pelo Eminente Relator, entendo que os direitos individuais
nestes autos defendidos não integram a categoria de direito homogêneos
defensáveis pela estreita via da ação civil pública, em decorrências de
suas características, vez que representam direitos disponíveis que podem
ser renunciados por seu titular, assim como não se enquadram na categoria
de relação de consumo.

Pois bem, no que diz respeito ao parágrafo unico do art. 1º da


Lei 7347/85, com redação dada pela Medida Provisória 2102-30 de 2001,
mister se faz ressaltar que o referido dispositivo legal impõe restrição ao
uso da ação civil pública não somente com relação ao sujeito a que ela se
destina, isto é, não somente com relação aos fundos de que fala a lei, mas
também com referência à matéria que por meio dela será tratada, a apreciada
judicialmente.

Diz o parágrafo único do art. 1º do referido diploma legal:

“art. 1º
Parágrafo único – “Não será cabível ação civil pública para
veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições
previdenciárias e fundos de garantia e outros fundos de
natureza institucional cujos beneficiários podem ser
individualmente determinados.”

O acima mencionado dispositivo legal não definiu o que vem a


ser “fundos de natureza institucional”, e em se tratado de norma limitadora
de direito, necessários se faz que sua interpretação seja restritiva, de
modo que sejam abrangidos apenas aqueles indispensáveis às instituições
públicas, independentemente de serem preexistentes ou ainda não
constituídos, não alcançando, desta feita, os fundos de previdência
privada.

Na realidade, os fundos de pensão possuem personalidade


jurídica próprias, e são conhecidos como entidades de previdência
complementar, sendo que os fundos, objeto da presente ação regidos pela Lei
6435/77 e atualmente pela Lei Complementar 109/2001, já eram contemplados
pela Emenda Constitucional como previdência complementar.

Por outro lado, no que tange à alteração do contido na Lei


7347/85 por medida provisória, qual seja, a de n. 2102-30 de 2001, cumpre
ser asseverado que a Emenda Constitucional 32/01, ao estabelecer em seu
art. 2º que as medidas provisórias editadas em data anterior à publicação
desta emenda continuam em vigor até quando medida provisória ulterior as
revogar explicitamente ou até deliberação do Congresso Nacional, com o
intuito de manter salvaguardadas as relações jurídicas advindas das
disposições das mencionadas medidas provisórias, deixou bastante claro que
somente medida provisória que versasse sobre a matéria é que poderia
revogar aquelas editadas anteriormente à referida emenda.

Assim, tem-se que a Medida Provisória 2102-30, atualmente 2180-


35 de 2001 que alterou a Lei 7347/85 permanece em vigor na medida em que a
Medida Provisória 2180-35 não modificou o conteúdo da primeira medida
provisório, aliás, manteve-o na sua íntegra.

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Portanto, a matéria objeto do presente feito não pode ser


apreciada pela via da ação civil pública, tendo em vista o disposto no art.
1º da Lei da Ação Civil Pública, fato que não enseja afronta ao acesso à
justiça, tendo em vista que o ingresso ao Judiciário está assegurado, nos
termos do art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal e de acordo com as
normas estabelecidas pelo Estatuto Processual Civil.

Ademais, a restrição imposta pela lei, também está afeta ao


fato de que não cabe ação civil pública para defesa de direitos
disponíveis, sob pena de comprometer o seu papel institucional.

A apelante fundamentando-se no inciso IV do art. 1º da Lei


7347/85 insiste na possibilidade da presente via judicial para a discussão
do benefício objeto do presente feito.

Entretanto esta E. Turma já decidiu que não tem legitimidade o


Ministério Público para defender por meio de ação civil pública, direitos
disponíveis.

O caso em pauta trata de direitos disponíveis, assim, torna-se


inviável a defesa de tais direitos por meio da ação civil pública.

Ante o exposto, pedindo vênia, ao Senhor Relator, nego


provimento ao apelo.

É como voto.

CECÍLIA MARCONDES
DESEMBARGADORA FEDERAL

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PROC. : 2002.61.00.011303-5 AC 860969


ORIG. : 15 Vr SAO PAULO/SP
APTE : ASSOCIACAO DOS FUNCIONARIOS APOSENTADOS DO BANCO DO
ESTADO DE SAO PAULO AFABESP
REPDO : MAURICIO GENOFRE (= ou > de 65 anos) e outros
ADV : JOAO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES
APDO : Uniao Federal
ADV : ROGERIO EMILIO DE ANDRADE
APDO : BANCO DO ESTADO DE SAO PAULO S/A BANESPA
ADV : LIVIA ROSSI
APDO : Banco Central do Brasil
ADV : JOSE OSORIO LOURENCAO
RELATOR P/ ACÓRDÃO: DES. FED. CECILIA MARCONDES
RELATOR : DES.FED. MÁRCIO MORAES / TERCEIRA TURMA

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PUBLICA – MEDIDA PROVISÓRIA 2102-30 –


INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL - FUNDO DE PREVIDÊNCIA
COMPLEMENTAR – DIREITOS HOMOGÊNEOS DISPONÍVEIS – NÃO CABIMENTO DA VIA
ELEITA.

1-A Medida Provisória 2102-30, atualmente 2180-35 de 2001 que alterou a Lei
7347/85 permanece em vigor na medida em que a Medida Provisória 2180-35 não
modificou o conteúdo da primeira medida provisório, aliás, manteve-o na sua
íntegra. A Emenda Constitucional 32/01, ao estabelecer em seu art. 2º que
as medidas provisórias editadas em data anterior à publicação desta emenda
continuam em vigor até quando medida provisória ulterior as revogar
explicitamente ou até deliberação do Congresso Nacional, com o intuito de
manter salvaguardadas as relações jurídicas advindas das disposições das
mencionadas medidas provisórias, deixou bastante claro que somente medida
provisória que modificasse explicitamente a matéria é que poderia revogar
aquelas editadas anteriormente à referida emenda.

2- Os direitos individuais nestes autos defendidos não integram a categoria


de direito homogêneos defensáveis pela estreita via da ação civil pública,
em decorrências de suas características, vez que representam direitos
disponíveis que podem ser renunciados por seu titular, assim como não se
enquadram na categoria de relação de consumo.

3- Apelação improvida.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.
Decide a Terceira Turma do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por maioria, negou provimento à apelação, nos termos do voto da sra.
Desembargadora Federal Cecilia Marcondes, vencido o Relator que lhe dava
parcial provimento.
São Paulo, 27 de setembro de 2006 (data do julgamento).

CECÍLIA MARCONDES
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DESEMBARGADORA FEDERAL
RELATORA P/ ACÓRDÃO

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