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ADRIANA C. LOPES
ADRIANA FACINA
DANIEL N. SILVA
(ORGS. )

EM
PINGO
D’ÁGUA
SOBREVIVÊNCIA,
CULTURA E LINGUAGEM
Entre dicotomias que fundamentam o
pensamento moderno liberal, encon-
tramos o binarismo vida/morte. Uma
polaridade que parece uma simples autoa-
firmação da realidade, mas que esconde
uma divisão assimétrica entre os dois
termos. Uma hierarquia violenta, que se
desdobra em tantas outras. Enquanto vida
é percebida como a origem, a morte é
temida, sinônimo de cinzas e de finitude
humana. Trata-se de certa lógica vitalista
que concebe o sujeito a partir de uma
matéria orgânica que triunfa sobre a morte.
No entanto, se pensássemos que não só
existem diversas maneiras de morrer e de
viver, mas, para além deste esquema,
deixássemos transbordar distintas formas
de se pensar, de se experimentar e de se
fazer ‘o viver e o morrer’? Se trouxéssemos
os rastros de histórias, de memória, de
culturas, de narrativas, de corpos e de
escritas que colocam em xeque o próprio
maniqueísmo de tal divisão? Derrida, em
Sobreviver/Diário de Borda, argumenta que
há um intervalo entre essas polaridades,
que continua, persiste, luta, dura e está
além do viver e do morrer: a sobrevivência.
ADRIANA C. LOPES

NÓ ADRIANA FACINA
DANIEL N. SILVA
(ORGS. )

EM
PINGO
D’ÁGUA
SOBREVIVÊNCIA,
CULTURA E LINGUAGEM
O labirinto e o caos:
narrativas proibidas e sobrevivências
num subgênero do funk carioca
DENNIS NOVAES • CARLOS PALOMBINI

Tá tudo vigiado,
O sistema tá sorrindo.
Quer pegar o bonde?
Cai pra dentro do labirinto!
[ MC ORELHA, “SISTEMA”, ABR. 2010 ]

Semântica e pragmática

O proibidão é um subgênero da música funk carioca, ao lado do consciente,


da putaria, da montagem, do melody e da ostentação. Esses termos remetem
preponderantemente a temáticas: o proibidão, à vida no crime100; a putaria,
a proezas eróticas; o melody, ao romance; a ostentação, ao alarde de bens.
Mas também a técnicas: a montagem, à repetição de fragmentos vocais de
procedências diversas; e a pontos de vista: o consciente, a perspectivas
explicitamente críticas, pedagógicas ou moralizantes. Aos seis subgêneros
se poderiam acrescentar: o gospel funk, designado por sua temática; e o funk
comédia, o funk neurótico e o pop-funk, designados, cada um, por seu ethos.
Se temas, técnicas, pontos de vista e disposições definissem isoladamente
um subgênero, caberiam as perguntas: Quando os fragmentos advêm de
proibidões, trata-se de montagem ou proibidão? A bandidagem apresentada

100
Utilizamos itálicos, de preferência a aspas, para termos e expressões nativos. Para uma
definição de “o crime”, ver Facina e Palombini (2017, p. 349).

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de modo crítico resulta em proibidão ou consciente? Se a vida do crime exalta
seu poder de compra, temos proibidão ou ostentação? Efetivamente, a
montagem constitui tanto uma técnica de produção musical quanto uma
estética; proibidão e consciente são manifestações de consciências diversas
(ou da mesma consciência) que se exprimem em contextos diferentes
(ou no mesmo contexto), em registros distintos; grifes são elementos de
identidade que, nos anos 1990, afixaram o pertencimento a este ou àquele
grupo (amigo ou alemão, Lado A ou Lado B, Comando Vermelho ou Terceiro
Comando), e a ostentação de armas, de grifes e de mulheres foi caracterís-
tica do proibidão em seu fastígio101. Temas, técnicas, disposições e pontos
de vista articulam-se de formas complexas no decorrer da história do funk
carioca para definir o que seja um proibidão, um consciente, uma putaria,
uma montagem, um melody, um ostentação, um gospel, um comédia, um
neurótico ou um pop-funk.
Embora fundamentada na semântica nativa, tal concepção não corres-
ponde necessariamente à pragmática: MCs, DJs, compositores, empresários
e funkeiros empregarão ou não o termo de acordo com estratégias de legi-
timação, quer almejem valer-se do cacife do movimento — de seu capital
subcultural, diria Sarah Thornton (1995) — quer prefiram dissociar-se deste
perante interlocutores potencialmente hostis. Assim, os termos neurótico
e consciente adquirirão valor de eufemismos, e o subgênero não deixará de
sujeitar-se ao clássico antagonismo segundo o qual haveria um proibidão do
mal, apologético, e um proibidão do bem, cronístico ou moralizante, e este só
não seria consciente por insipiência da sociedade102. A expressão rap de contexto
manifesta a ligação da música com a localidade (o contexto, no sentido literal)
e as narrativas da facção (o contexto, por extensão), e seria portanto a mais
denotativa, não carregasse consigo as conotações de rap bom, de contexto. Ela
foi utilizada sobretudo por volta dos anos 1998 e 1999, mas caiu em desuso
no decênio subsequente.

101
Localizamos esse apogeu entre a Chacina do Pan, em 2007, e a ocupação militar dos
Complexos da Penha e do Alemão, em 2010. Nesse período, o Baile da Chatuba tornou-se
uma plataforma de lançamentos, e o Complexo da Penha, um celeiro de artistas: os MCs
Smith e Max, o DJ Byano, os compositores Praga e Cláudio da Maragogi etc.
102
Sobre o uso nativo do termo “sociedade” na terceira pessoa do singular, ver Novaes (2016).

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A produção musical e a performance podem contribuir para aproximar ou
afastar o rap das esferas do proibidão ou do consciente. “Falcão do morro”,
do MC Dido, na voz do autor, em produção do DJ Mortadela (2010), é um
proibidão, mas nas vozes dos MCs Dido e Marcelly, em produção dos DJs
Dennis e Victor Jr (2011), torna-se um consciente. “Amigo da antiga”, do
MC Andrezinho Shock, na voz do MC Tikão, em produção do DJ Kbelinho
(2009), é um proibidão, mas “Tempos de moleque”, a mesma música na voz
do autor em produção do DJ Gilberto (2010), torna-se um consciente. “Vida
na cadeia”, com Mr. Catra, em produção dos DJs Ratinho e Grandmaster
Raphael (1998), é um consciente, mas, ao vivo, no CD “O Fiel” (1999),
torna-se um proibidão. Contribuem para os reenquadramentos alterações
na letra e diferenças de produção musical, de performance vocal e de perso-
nalidade artística dos intérpretes. A criminalização será o selo de qualidade
disruptiva conferido pelo Estado a uma estética musical.

Vozes

Um dos precursores do subgênero, o MC Mascote, autor do “Rap do


Comando Vermelho”, de 1998, primeiro hino da facção, rechaçou o termo
proibidão em mesa-redonda sobre o assunto na 4ª Conferência Funk, no
Museu de Arte do Rio, no dia 26 de agosto de 2015: “Não é proibidão. Para
mim, na minha opinião, não é proibidão!” Ele explana:

Sabem quem está falando pra vocês? Um dos maiores colabora-


dores do Estado! O MC, que canta... proibidão? Para mim não é um
proibidão. Eu me considero um colaborador do Estado. Porque
através do meu rap proibidão — vocês falam que é proibidão, não
julgo ninguém, a sociedade diz que é proibidão — eu pude relatar,
eu e vários MCs, o que acontecia aqui em cima. Eu chamei a atenção
da autoridade. Eu chamei a atenção do Estado. (eleva o tom) Olha
só o que acontece aqui em cima! (grita) Socorre nós, meu irmão!
Socorre nós! (pausa) Se não a gente vai ter de continuar batendo
palmas para isto aqui.

Eu cantei uma realidade que um dia — minha palavra não voltou


vazia — cortou minha própria carne, quando perdi o meu irmão.

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Quem me conhece, sabe. O que eu cantei não foi proibidão. O que
eu cantei foi o que eu vivi. O que eu cantei foi o que eu presenciei. O
que eu cantei foi o que um dia eu sofri (Cordeiro e Palombini, 2015).

Mascote mostra sua reação aos críticos.

Não lembro bem quando, fui convidado para um debate numa


TV a cabo. E aí teve um amigo nosso — hoje ele trabalha na Xuxa,
(irônico) é um grupo muito famoso: (escande as sílabas) “o nosso
amigo”. Ele criticou o proibidão. Eu falei para ele: (intimidante)
“Você mora onde, ô, moleque? Onde foi tua vida? Você morou
onde? Você morou no morro? Você morou no morro? Você não
morou no morro. Então é fácil meter o pau no rap dos outros. Estou
contando, me relatando. Isso aqui não é proibidão. Isso aqui é um
relato, rapaz. É um relato!”

Eu discordo muito quando tem esta palavra: proibidão. Eu sei que


todo o mundo está falando porque a sociedade fala mesmo. Porque
eles querem (com dor) fechar os olhos para o que acontece lá, (suave
e firme) mas não adianta. Pode fechar os olhos que a gente vai gritar
lá de cima (Cordeiro e Palombini 2015).

Autor do segundo hino da facção, “Na Faixa de Gaza é assim” (2009), e


aprendiz confesso de Mascote, o MC Orelha endossa o mestre quando declara
em seu Instagram, no dia 2 de maio de 2015, em Belo Horizonte: “A favela é
um grito em meio a tanto silêncio nas cidades, um grito que incomoda!”.
Ao divulgar em rede social, no dia 10 de junho de 2014, a faixa “Somos CV”,
produzida pelo DJ Gurilão, ele ironiza: “Parei de cantar proibidão; agora só
canto permitidão, uma realidade que ainda existe: tá aí, escuta quem quiser”.
Orelha sela sua fidelidade ao subgênero em declaração pública de 11 de maio
de 2015: “Vejo vários MCs deixando de cantar proibidão porque sabem que
está fora de moda e comercialmente não é bem visto, (...) mas quando todos
se forem, aqui estarei”. De uma localidade fictícia, “Rio de Gaza ou Faixa de
Janeiro?”, ele se explica no dia 13 de abril de 2015:

Descrevo em minhas letras a realidade criminosa e violenta das


periferias, mas isso não quer dizer que eu seja a favor dessa guerra
que mata pessoas diariamente. Fico pensando aqui como deve ficar

290
a consciência de uma pessoa que acaba de tirar a vida de outra a
troco de nada. Bandido, polícia ou cidadão comum, somos todos
seres humanos que deveríamos preservar nossas vidas como Deus
nos ensinou. Nessa guerra não existe lado certo porque a guerra já
é um erro.

Provocado por críticas oriundas do próprio meio, Orelha reage no dia 25


de setembro de 2015.

Aí eu abro o Facebook e vejo uma porrada de gente falando que o


proibidão está acabando com o funk. Porra! O funk é muito maior
do que esse mundinho onde vocês vivem: “quem é mais pica”;
“quem é mais relíquia”; “quem é o cara do momento”; “quem grava
carimbo”; “quem toca por cinquenta reais”; “quem está acabando
com o funk”. O funk vai ser sempre funk (putaria, consciente, proi-
bidão, melody, ostentação, comédia, pop), e pra mim quem está
acabando com o funk são os parasitas que ficam gerando intriga no
mundo funk.

Em resposta à matéria “Prisão de jovem que ouvia funk ‘criminoso’ e


sua liberação por juiz que citou Chico Buarque provocam debate” (Lichote,
2015)103, publicada na seção de cultura do jornal “O Globo” em 13 de julho de
2015, Orelha se manifesta no Instagram, para concluir com uma frase do rap
“Nasci Comando Vermelho”:

Saiu uma matéria no jornal “O Globo” falando um pouco sobre o


estilo de funk. Inclusive citaram meu nome. Entendam uma coisa:
escrevo e interpreto letras que relatam o dia a dia na favela, dia a dia
esse que é repleto de coisas boas e legais de serem cantadas, mas
prefiro cantar a realidade vivida por parte dos criminosos, não me
fazendo um criminoso por isso, pois tal realidade também faz parte
desse dia a dia, e eu só canto o que acontece. E se acontece, a culpa
não é minha. Como eu mesmo falo: “se tem gente pra comprar, vai
ter gente pra vender”.

103
Sobre os antecedentes dessa matéria, ver Araújo (2015), Fantti (2015) e Torres (2015).

291
Ao estrear “Faixa de Gaza 2” na Roda de Funk de São Gonçalo, no Recanto
do Caranguejo, na madrugada de sexta-feira, 13 de novembro de 2015, ele
exclama: “Tá ligado no meu ritmo: canto proibidão mesmo, o que muitos
chamam de proibidão, que pra mim é liberdade de expressão: esse bagulho de
apologia ao crime não existe!” Presente ao evento, Mascote ratifica: “Orelha,
continua nessa de proibidão!”
Intérprete consumado das composições de Cláudio da Maragogi e Praga,
o MC Smith se expressa nos seguintes termos durante entrevista a nós conce-
dida em sua residência, na Penha, dia 9 de fevereiro de 2015:

Aqui nós éramos104 jornalistas verbais. Nós não publicávamos nada


em jornais, em livros, em rede social. Nossa parada era mais narrada,
mais cantada, mais interpretada. Então as pessoas meio que... Toda
essa pegada musical, que afrontava muito o governo, secretaria de
segurança, chefe de polícia e até algumas pessoas do Estado... Nós
éramos chamados de marqueteiros do tráfico. Foi o que a delegada
falou pra gente lá, quando eu e os outros MCs fomos presos105.

Em entrevista concedida em sua residência, na Vila Cruzeiro, Complexo


da Penha, dia 14 de junho de 2013, o compositor Praga sintetiza:

Vivemos numa falsa democracia. O proibidão fala o que não se


quer escutar. Quando dizemos “vida bandida”, é tudo o que não
querem ouvir. O governo sabe que é uma realidade, mas não quer
que seja vista, que seja veiculada. O proibidão é o que fizeram na
ditadura: isso pode, aquilo não. No que atingisse o governo militar,
não se podia tocar. Cantasse uma música desagradável aos ouvidos
do general no poder, a MPB não podia ser tocada, era proibida
pela censura, o AI-5. Falasse de Geisel, dessa gente, censurava-se.
Hoje é mais ou menos isso. Se você disser “Comando Vermelho”

104
Smith fala no pretérito imperfeito porque a cena do proibidão esmoreceu desde a
ocupação militar dos Complexos da Penha e do Alemão, em novembro de 2010, e o próprio
MC distanciou-se do subgênero após sua prisão, em 15 de dezembro daquele ano.
105
O MC Galo foi detido numa blitz no Leblon em 14 de dezembro, mas Smith refere-se a
outro inquérito, em função do qual os MCs Frank, Tikão, Max e ele mesmo foram presos na
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010, enquanto o MC Dido apresentou-se no dia seguinte
(Palombini, 2013).

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ou “A.D.A.” ou “Terceiro Comando” ou o que seja, não pode. Mas
o filme “Tropa de elite”, o livro “Tropa de elite”, onde eles falam
que torturam mesmo, que matam mesmo, é coisa normal, e não
“apologia”. É uma grande hipocrisia. As pessoas só fazem home-
nagem ao traficante porque é ele quem promove o baile. No dia
em que o governo começar a promover o baile, a dar oportunidade
de trabalho para essa rapaziada (acabamos de falar sobre quantos
empregos o funk gera), quem sabe essas pessoas não farão uma
homenagem ao governador, ao invés de ao traficante? Pode mudar.

Verdade/veracidade

O proibidão associa-se às palavras grito, realidade e relato na voz do MC


Mascote; a grito, realidade, relato, descrição e dia a dia na do MC Orelha; a
afronta, jornalismo, narração e interpretação na do MC Smith; a realidade na de
Praga. Se realidade é o termo mais frequente, as afirmações de que o proibidão
constitua realidade da favela ou crônica da vida no crime devem ser tomadas sob
ressalvas. Em primeiro lugar porque, embora diga respeito a uma parcela de
seus moradores, que convivem com ela ou nela tomam parte, a vida no crime
não constitui a realidade da favela, mas uma parte desta à qual nem todos
são simpáticos. Depois porque, em que pesem as presunções de autoridade
do legislativo, do judiciário, do ministério público e da polícia em questões
que não lhes concernem, bem como as caricaturas de atividade jurídico-po-
licial teatralizadas pela mídia, asserções sobre a verdade do proibidão só
podem emergir de análises que coloquem em relação: narrativa (conteúdo),
narração (modos e pontos de vista por meio dos quais a enunciação narra-
tiva se efetua), as personas artísticas do autor, do DJ e do intérprete, suas
biografias, suas plateias e suas performances. A complexidade dessa trama
faz de qualquer análise um ato interpretativo. É outro o problema da veraci-
dade. Ele coloca em jogo a conexão entre uma realidade e sua narrativa. Seus
âmbitos são o do jornalismo, o da investigação policial, o do testemunho
perante a Justiça.
Efetivamente, sequer a matéria de imprensa, o noticiário radiofô-
nico e o telejornal podem clamar para si o estatuto de realidade dos fatos.
Numa partida de futebol irradiada, os fatos sonoros ocorridos em campo

293
ou nas arquibancadas não constituem evento esportivo senão à guisa de
complementos de uma narrativa radiofônica que só é acessória perante o
testemunho visível dos atos (cf. Schaeffer, apud Pierret, 1969, p. 92). Em
outras palavras, se nem a linguagem nem a reportagem podem ser o que
transmitem (um absurdo ontológico), muito menos a arte. Elas o podem
significar, reconstituir, sugerir, relatar, representar, apresentar, elucidar,
ocultar, calar, mistificar, falsificar. E se a arte tem o dom de dar forma a arte-
fatos mais reais que a realidade mesma, é justamente por abdicar do estatuto
da realidade.
Complicações adicionais advêm do fato de alguns cantores estabele-
cerem distinções tácitas ou explícitas entre a persona artística do MC e o
indivíduo que a encarna. A esse respeito, assim se exprime Wallace Ferreira
da Motta, o MC Smith, na entrevista citada:

Se você me mandar cantar aqui não será o mesmo que eu no palco.


Você pega o Smith, tira do armário, bota e vai. Eu não consigo fazer
aqui o mesmo que faço no palco. É uma coisa muito diferente. (...).

Eu tenho que andar no meio do povo. Eu paro no cara que vende


tapioca, no coroa ali que é nordestino, que vende as bugigangas
dele, no cara que vende alface, que vende pipoca. Eu vivo a vida do
Wallace. De segunda a sexta eu vivo o Wallace, porque se um dia a
casa cair para mim, já vou ter o pé no chão: não vou me matar, não
vou me frustrar. Meu maior prazer na vida, meu maior sonho, é
sempre viver do funk, não ficar desempregado.

O MC Orelha racionaliza essa clivagem em entrevista de 10 de maio de


2012 no Estúdio dos Loucos, no Largo da Batalha, em Niterói:

O MC Orelha é o Gustavo, uma versão para os outros. Porque


o Gustavo é uma versão para mim. Eu tenho que me fazer duas
pessoas, não é? Às vezes mesmo não sou quem eu sou, quem estou
parecendo ser, como o Orelha. Já que você tocou no Facebook, ali
acontece muito isso: eu tenho que mostrar às vezes uma coisa que
não sou. E às vezes eu mostro uma coisa que sou, disfarçadamente.

O Gustavo é um cara de praticamente vinte e seis anos, comple-


tando agora, em setembro, às vezes com cabeça de trinta, às vezes
com cabeça de doze. Um cara que já teve muito sofrimento, porém

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não o suficiente para me mostrar que posso conseguir muito mais.
Sempre acho que posso querer algo mais, mas esse meu jeito
acomodado de ser não deixa. O Orelha está entre uma personagem
e a realidade do Gustavo. E o Gustavo é isso, o que vivo todo o dia. O
Orelha talvez não seja (Lopes e Palombini, 2013, p. 13-4).

Narrar o caos

Ao tensionar a validade da categoria proibidão, os artistas reiteram o elo


entre estética narrativa e vivência de favelado. Discurso “da favela sobre a
favela para a favela” (Caceres, Ferrari e Palombini, 2014, p. 178), o proibidão
suscita a irrupção narrativa de sujeitos apagados por meios hegemônicos
de produção discursiva. Nos jornais da mídia corporativa e nos inquéritos
policiais que abarrotam o sistema judiciário brasileiro, o traficante transita
no limiar da humanidade — existência menor, morte sem luto. A população
favelada vivencia o cotidiano da guerra e é diariamente confrontada com
o fato de que, para os agentes estatais de controle e repressão, suas vidas
valem menos. Sabem-no da forma mais cruel as mães de jovens executados
por policiais. Operadores de direito e de mídia acionam uma zona de incer-
teza que transforma vítimas em réus e leva as mães a buscarem provas da
inocência dos filhos (cf. Vianna e Farias, 2011). Tal hierarquização de vidas
explicita corpos sem valor e escancara a agência de processos de criminali-
zação da pobreza.
O proibidão subverte essa lógica ao colocar o bandido no epicentro da
narrativa, com família, amigos, nome, desejos, dores, prazeres e códigos
de conduta. As personagens proibidas podem arrepender-se da vida no
crime (“Vida bandida 2”), enaltecer-lhe as benesses (“A Penha é o poder”) e
produzir reflexões politicamente elaboradas sobre seus lugares numa guerra
às drogas que não escolheram (“Vida bandida”, “Sistema”, “Na Copa do
Mundo quem vai vencer é o CV”, “Faixa de Gaza 2”). “Na guerra não existe
lado certo porque a guerra em si já é um erro”, diz Orelha. Praga discorre
sobre o assunto em “A guerra”, texto escrito em 21 de junho, no calor das
Jornadas de 2013, quando milhões de manifestantes se viram às voltas com
o terror de Estado.

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Na guerra somos igualmente vulneráveis, na guerra não existe
justiça, nem direito, não existe lado certo, não existem escrúpulos,
na guerra afloram todos os sentimentos, principalmente o medo,
que por sua vez é o pai de todos os erros, a guerra só é suportável
quando nos apegamos à fé, fé muitas vezes compartilhada entre
inimigos, inimigos que se parecem, inimigos da mesma cor, da
mesma classe social, inimigos que creem nas mesmas coisas,
inimigos que lutam por algo que desconhecem, que buscam um
alvo que não tem forma, não tem rosto, inimigos que nem sequer
acreditam na causa que defendem. O fogo consome ambos os lados,
propagando um ódio bilateral. Numa sociedade movida pelo caos
surgem hinos que são entoados por milhões de pessoas que se reco-
nhecem na crônica do dia a dia: a crônica do caos.
Não existe violência mais cruel que a miséria, e tudo isso é reflexo
de uma política malconduzida. Diante dessa negligência admi-
te-se uma grande possibilidade de crimes, e em contrapartida uma
polícia que é treinada para ser violenta e letal, mal remunerada e de
fuzil na mão, pronta pra abater qualquer um que infrinja a lei que ela
própria não respeita ou sequer conhece, numa democracia em que
não se tem liberdade para fazer escolhas, onde as drogas lícitas são
as que mais destroem famílias (alcoolismo), onde os tabus estão
acima das prioridades, e as autoridades, acima das leis.
O medo de que essa realidade seja exposta faz com que se imponha
o silêncio. Por outro lado, a guerra nos deixa uma importante lição:
A paz só é negociada diante do caos (Batista, 2013, p. 11-2).

Narrar o caos, os seres engendrados por ele, nele, requer do artista deslo-
camentos constantes entre sentidos que, em seu conjunto, não propõem
juízo monolítico de valor. O eu lírico pode advertir um amigo sobre os
perigos da vida no crime (“Amigo da antiga”), anunciar a batalha com uma
facção rival ou com a polícia (“Gil do Andaraí ao vivo na Nova Holanda”),
lamentar a morte de amigos (“MC Cidinho a cappella ao vivo na Nossa Roda
de Funk”), descrever um assalto a banco (“Missão extraordinária”, “Terror
dos bacanas”), ansiar pela liberdade (“Vida na cadeia”) etc. A potência da
realidade artística, já o dissemos, reside justamente em não ser o real e muito
menos ter intenção de sê-lo.
Relacionamos o texto de Praga com as reflexões de Veena Das e Deborah
Poole sobre o Estado em suas margens, não para refletir sobre o ente

296
monolítico apresentado pela teoria política moderna, mas para conceber um
conjunto de práticas disciplinares e coercitivas constituintes desta coisa à
qual denominamos Estado. Dizer margem não é dizer que o Estado seja fraco
ou esteja ausente ali. Este redimensionamento contextual pode clarificar o
sentido de suas atuações (Das e Poole, 2004). A polícia de Praga é a mesma
dos moradores. Ela não permite separações nítidas entre legalidade e ilegali-
dade. A leniência do sistema judiciário com os crimes de policiais e o enfoque
dado pela mídia corporativa às mortes de jovens favelados mostram que a
corrupção e a letalidade da polícia são políticas de Estado106 com sentido
bem definido: exterminar ou encarcerar em massa jovens pretos, pobres e
favelados a fim de dar prosseguimento ao processo de penalização da miséria
exposto por Loïc Wacquant107. O rap “Sistema (Querô108 de São Gonçalo)”,
do MC Orelha, formula essa realidade em termos poético-musicais.

Eles não entendem o sistema.


Eu vou explicar o sistema pra eles.

Aí!

Disciplina nessa porra, aguarda o bloco passar.


Pra tu ver que o bonde é foda, tem coleção de AK.
Fuzil de tudo que é gosto, fuzil de tudo que é jeito,
Colete à prova de bala escrito CV no peito.

Não é só dia de baile que nós brota pesadão,


Dia a dia é nós na luta, irmão defendendo irmão.
Pode até tentar subir, mas entra na bala primeiro,
Que a luneta tá alinhada e o AR canta certeiro.

Bope faz operação tendo que contar com a sorte,


Oprimindo morador, trazendo cheiro de morte.

106
Aproximamo-nos da noção de Estado ampliado, de Gramsci (cf. Thwaites Rey, 2007), para
situar a mídia corporativa na sociedade civil no papel de difusora dos valores da classe diri-
gente e fornecedora do conteúdo ético do Estado.
107
“A ‘mão invisível’ do mercado de trabalho precarizado conseguiu seu complemento insti-
tucional no ‘punho de ferro’ do Estado, que tem sido empregado para controlar desordens
geradas pela difusão da insegurança social” (Wacquant, 2008, p. 93-4).
108
Morro do Querosene.

297
TH já deu o papo: traz logo os pentes de cem,
Deixa eles passar do trilho que nós vai ver quem é quem.

Polícia contra bandido, bandido contra polícia,


Clima de tensão no morro registrado pela mídia.
Acertaram um morador, falaram que era bandido,
No jornal até confirmou, mas nós sabe que não é isso.

Polícia chega com medo, largando tiro a esmo,


Acertando inocente e fica por isso mesmo.
Nunca vão pacificar oprimindo e agredindo,
Por isso que um-nove-zero, no Querô, não é bem-vindo.

Nós não tem medo dos homens, nós é homem também,


Nós só quer fazer o nosso sem ter que ferir ninguém.
Deixa os morador tranquilo dentro da comunidade,
Assinado, RL: Paz, Justiça e Liberdade.

E os amigos que lá dentro da cadeia conquistei,


Aqui fora o coro come, você sabe, eu também sei.
Liberdade vai chegar, nós se esbarra pela rua,
Enquanto isso, no Querô, nossa luta continua.

Quem fecha com o Asa Delta, quem fecha com o TH,


Quem é Comando Vermelho levanta a mão, levanta a mão, porra!

Quem pode acabar com a guerra não quer que a guerra acabe,
Enquanto isso nós trafica à vontade.
Tá tudo vigiado, o sistema tá sorrindo:
Quer pegar o bonde? Cai pra dentro do labirinto!

Quer entregar mandado, filha da puta? Cai pra dentro!


Sabe por quê?

Ao assumir o eu lírico do bandido, o MC Orelha questiona a violência


policial, a incoerência da guerra às drogas e um projeto de pacificação cujos
mediadores são os agentes estatais de controle e repressão. Os textos de
Orelha e Praga convergem. Ambos colocam em evidência a especificidade
de uma estética narrativa gestada na experiência do cotidiano militarizado.
O MC Frank relata essa vivência no documentário de Denise Garcia “Sou
feia mas tô na moda” (2005):

298
A maioria das minhas músicas, elas são verídicas. São coisas que
acontecem mesmo. Por exemplo: “Uma hora da manhã, o bonde
todo se apronta, Desce pelas vielas no estilo tipo Colômbia, Quando
eu tava subindo não deu para acreditar: tiro pá caramba no estilo
de Bagdá”. Eu estava subindo pra curtir o baile e policiais estavam
entrando na favela. E ao mesmo tempo que os policiais subiam, os
caras desciam lá de cima. Então rolou um confronto armado: tiro
pra lá e tiro pra cá. Eu fiquei naquele meio, e o motorista: “Caraca,
cara!” Eu falei: “Maluco, tá tipo Bagdá, mané!”

Dez anos depois, em entrevista concedida a 25 de março de 2015, ele


rememora:

No meio do baile, às vezes na metade do baile, a polícia insistia em


subir, o tiro comia, eu corria pra lá e pra cá. Agora vamos lá, se eu
morasse na Barra da Tijuca eu falaria do surfista, da gatinha que
passava com o biquíni rosa, da caipirinha maravilhosa. Mas nasci no
Complexo do Alemão e o que via, o que vivia ali naquele momento
era tiro porrada e bomba, meu irmão! O que ia escrever nas minhas
letras era isso. Então acho que não existe proibidão: existe o que
você vive, a maneira que você vive e sobre o que vai querer falar. Eu
vivia sob tiro, polícia sequestrando e pedindo dinheiro pra liberar, o
bandido dando tiro em cima da polícia, a polícia dando tiro em cima
do bandido. E acertando morador.

A gênese de “Terror dos bacanas”, narrada por Praga em mensagem de


25 de junho de 2013 aos autores, reitera a associação entre criação musical
e realidade da favela:

Essa música foi construída de modo interessante. Estávamos, eu e


um MC renomado, à espera do general no QG da Penha, e conversá-
vamos com alguns traficantes da quadrilha de um de seus aliados.
O Tatá e o Marlon começaram a descrever o assalto que haviam
feito na Barra, retratado fielmente na música. Ri muito porque Tatá
entrou em pânico quando, para confundir o refém no carro em fuga,
Marlon disse que seguiriam para o morro do Dendê, do TCP, facção
rival. Tatá começou a falar que pularia do carro em movimento,
enquanto Marlon o cutucava e dizia: “pega a fita, meu parceiro!”
Ambos seguiram até o acesso do Dendê, onde abandonaram a

299
vítima, e chegaram à Vila Cruzeiro para constatar um faturamento
de 240 mil reais, livre de impostos e livres de processo criminal,
pois o depoimento da vítima certamente apontaria os bandidos do
Dendê como principais suspeitos.

Michael Pollak (1989) indica a diferença entre, de um lado, as memórias


subterrâneas das minorias e grupos subalternizados, e de outro, a memória
oficial construída pelos grupos que almejam a própria hegemonia. A memória
coletiva é fruto de processos de dominação, imposição ou violência, e palco
de uma disputa constante pelo direito à narrativa. Melhor que ninguém, os
artistas do proibidão reconhecem que narrar, experiência eminentemente
coletiva, integra relações de poder. Ao apagarem identidades coletivas pelo
silêncio ou pelo esquecimento, os grupos que lutam pela hegemonia retiram
do espaço social a existência mesma de certos sujeitos. Nossos artistas
inscrevem poeticamente aqueles que não têm voz em canais privilegiados de
construção narrativa. O proibidão reitera, lamentoso, a saudade dos mortos
da guerra às drogas e coloca em xeque o discurso oficial pretensamente hege-
mônico. Sujeitos colocados à margem por demarcações estatais normativas
resistem à imposição do silêncio, e sua mensagem ecoa pela cidade. Poetas,
compositores, intérpretes e produtores musicais se contrapõem ao aparato
de repressão do Estado e a veículos bilionários de comunicação com paredões
de som e canais de internet.
Os textos de Praga e Orelha bem como as entrevistas citadas trans-
bordam e desafiam a legibilidade. Não por precariedade. “Se ler significa
tornar acessível um significado que seja transmitido enquanto tal, em sua
própria identidade inequívoca, traduzível” (Derrida, 1979, p. 116), então o
proibidão é ilegível. Seus artistas transitam propositalmente entre as fron-
teiras de sentidos e além delas, seja por meio da construção narrativa ou
por deslizamentos sonoros. Se o grito e a afronta, para usar os termos de
Mascote e Smith, fazem parte do proibidão, também o fazem os silêncios.
As versões light, que, ao embaralhar as fronteiras entre subgêneros, mudam
palavras ou apagam referências a bandidos, tornam essa expressão musical
difícil de matar, permitem-lhe que sobreviva. Não por acaso, o canto de quem
sobrevive, por amor ou teimosia, emana da favela.

300
Sobrevivência e revivência, seguir a viver e retornar dos mortos; seguir
a viver vai além tanto de viver quanto de morrer, suplementando
cada um com uma irrupção e certo alívio, parando a vida e a morte,
terminando-as numa parada definitiva, a parada que dá fim a algo e a
parada que condena com uma sentença, uma declaração, uma palavra
falada ou uma palavra que segue a falar (Derrida, 1979, p. 108).

É o que faz o proibidão quando canta e dança nos entrelugares do coti-


diano militarizado.

Perguntas frequentes

Do mesmo modo que Pascal Ory (2004) em seu livro sobre fascismo,
concluímos este trabalho com um conjunto de perguntas frequentes.

O proibidão é crime?
Não, o delito de apologia ao crime é inconstitucional.

O proibidão faz apologia ao crime?


Não, ele protesta contra a criminalização.

O proibidão faz apologia ao criminoso?


No papel de herói épico ou trágico, sim.

O proibidão faz apologia ao tráfico?


Não, ele mostra o resultado da criminalização.

O que o bandido representa no proibidão?


A possibilidade de uma nova ordem jurídica.

Qual a causa do proibidão?


O terror de Estado.

Qual a forma de acabar com o proibidão?


Acabar com o proibicionismo.

301
Qual o motivo condutor do proibidão?
A ética.

Qual seu modelo de narrativa?


A fábula, com moral tácita.

Por que o proibidão floresce sobretudo sob o Comando Vermelho?


Porque é deste o patrimônio simbólico da Falange Vermelha.

O proibidão faz propaganda do Comando Vermelho?


Não, ele faz a contrapropaganda do Estado.

O Comando Vermelho financia os artistas?


Não, ele fornece as condições para se tornarem o que são: o baile de favela.

Os artistas do proibidão são bandidos?


A grande maioria, não.

As carreiras de MC e bandido são compatíveis?


De diferentes modos em diferentes graus das hierarquias do canto e do crime,
dificilmente.

As carreiras de compositor de proibidão e bandido são compatíveis?


Sim.

Os artistas do proibidão cometeram infrações quando menores


de idade?
Alguns, sim.
De que vivem os MCs do proibidão?
Do cachê de suas apresentações, principalmente em outros estados.
De que vivem os compositores do proibidão?
Da venda de suas composições.
O que desejam os artistas do proibidão?
Ser reconhecidos como tal.

302
Os artistas do proibidão gostariam que seu trabalho fosse reconhecido
pelo Estado?
Alguns, sim; outros, não.

O proibidão tem partido político?


Não.

O proibidão é político?
Eminentemente.

O proibidão é música popular brasileira?


Sim.
Qual a posição do proibidão na MPB?
A contra-hegemônica.
O proibidão descende do samba?
Ele é o samba não cordial.
De onde o MC do proibidão deriva sua vocalidade?
Do palhaço da Folia de Reis, da capoeira, do repente, do samba de morro, das
macumbas, de outras manifestações afro-brasileiras e de seu próprio âmago.
O proibidão acabou?
Não, ele está em transformação.
Quando surgiu o proibidão?
Quando o primeiro negro se manifestou em música contra a escravidão.
O proibidão é feito por encomenda de traficantes?
Às vezes, do mesmo modo que compositores acadêmicos escrevem sinfonias
por encomenda do Estado.
O proibidão causa crimes?
Tanto quanto a música romântica causa o amor.
O proibidão incita ao crime?
Não, ele efetua sua catarse.

303
Qual a função do proibidão?
Manter acesas as chamas da revolta e da justiça.
O que Deus representa no proibidão?
O último recurso, diante do qual todos são iguais.

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SOU FEIA MAS TÔ NA MODA. Denise Garcia (diretora e roteirista). Toscographics (produ-
tora). Imovision (distribuidora), 2005. Disponível em <http://goo.gl/Hw1s3O>,
acesso em 31 jul. 2016.
TEMPOS DE MOLEQUE. MC Andrezinho Shock (autor e intérprete). DJ Gilberto
(produtor musical), 2010. Disponível em <http://goo.gl/6JjfIZ>, acesso em 1
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TIPO COLÔMBIA. MC Frank (autor e intérprete). DJ Catatau (produtor musical), 2003.
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VIDA BANDIDA 2. MC Smith (intérprete). Praga (autor). DJ Corvina (ao vivo), 2013.
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VIDA BANDIDA. MC Smith (intérprete). Praga (autor). DJ Byano (produtor musical),
2009. Disponível em <http://goo.gl/yb1NBm>, acesso em 30 nov. 2015.
VIDA NA CADEIA. Mr. Catra (intérprete). DJs Ratinho e Grandmaster Raphael (produ-
tores musicais). Bonde do justo (CD). São Paulo: Zâmbia Fonográfica, ZA-003,
1998. Disponível em <http://goo.gl/cGUAbc>, acesso em 30 jul. 2016.
VIDA NA CADEIA. Mr. Catra (intérprete). O Fiel (CD), 1999. Disponível em <http://goo.
gl/mnFJY1>, acesso em 30 jul. 2016.

307
Nas palavras do próprio filósofo: “o sobre-
viver transborda, ao mesmo tempo, o viver
e o morrer, suplementado-os, um e outro,
como um sobressalto e um certo alívio
temporário, parando a morte e a vida ao
mesmo tempo”. Assim, pensando além de
qualquer posição dicotômica, a sobrevi-
vência é um termo-chave que nos permite
ampliar nossos espaços de fala e de escuta,
bem como trazer à tona reflexões sobre as
estratégias, as frestas e as fraturas que os
sujeitos subalternizados encontram para
persistir e desenhar a suas próprias histó-
rias, memórias e trajetórias.

Muito próximo dessas formulações teóricas,


MC Raphael Calazans, nascido e criado no
bairro do Complexo do Alemão, destaca que
a cultura da favela é uma cultura de
sobrevivência. É o difícil cotidiano das ruas,
dos becos e das vielas das favelas que se
torna produtor de sentidos e valores — uma
matéria-prima para a imaginação e a
criatividade. Ainda segundo o MC, essa
cultura da favela é o que ela tem de mais
importante: uma estratégia que as pessoas
encontraram de “construir a vida a partir
daquilo que nega a própria vida”.
Inspiradas/os por autores que atravessam
limites disciplinares, bem como por uma
longa trajetória de pesquisa etnográfica em
contextos periféricos, esta coletânea é uma
proposta de pensar a questão do sobreviver,
em sua relação com a linguagem, a cultura, a
política e a arte. Nesse sentido, a obra
enfatiza não só as culturas de sobrevivência,
mas também as escritas, os letramentos, as
histórias e os testemunhos de
sobrevivências. Práticas narrativas formadas
por uma imaginação própria aos que devem
inventar desvios para viver ou, como nos
inspiram os compositores populares
Juninho Thybau e Kiki Marcellos, de quem
extraímos o título do livro:

“Gente que dá nó em pingo d’água


Se o calo aperta no embalo se liberta
E na adversidade encontra diretriz.”

ISBN 978856567981-7

9 78 8 5 6 5 6 7 9 8 17

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