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CURRÍCULO, CULTURA E IDEOLOGIA NA LÍNGUA INGLESA:

UMA PROPOSTA DE ENSINO E DE APRENDIZAGEM DO IDIOMA

Camila Borges dos ANJOS

UNISUL – Universidade do Sul de Santa Catarina

RESUMO

O propósito deste estudo é investigar métodos e discutir uma proposta de


ensino da Língua Inglesa no ambiente escolar. Para tanto, apresentam-se as
prescrições de documentos oficiais e as atribuições do professor para se
pensar em maneiras de ensinar o idioma em questão.

Palavras-chave: Língua Inglesa, Proposta de ensino,Professor.

ABSTRACT

The purpose of this study is to investigate methods and to discuss an English


Language teaching purpose in scholar space. For that, it is presented the
prescriptions of the official documents and the teacher´s attributions in order to think
about teaching ways of the idiom.

Keywords: English Language, Teaching Purpose, Teacher.

Introdução

A Língua Inglesa (LI) vem ocupando um espaço de prestígio na


sociedade, ao passo que se encontra presente em diversos campos do saber –
Ciência, Tecnologia, Comunicação – e, por isso, tem feito parte do dia a dia
das pessoas de várias maneiras, seja em textos científicos, inovações
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tecnológicas, como aplicativos do celular, programas de computador e
também nas embalagens de produtos, nas roupas ou na marquise de lojas.
Embora haja uma intensa valorização do idioma no meio social, o que
também é ressaltado nos documentos oficiais e largamente discutido em sala
de aula, principalmente com o requisito de abranger fins profissionais, é
possível dizer que a LI, na escola, ainda não atende, em tese, às exigências do
currículo escolar, pois as práticas de sala de aula ainda estão vinculadas à
repetição, memorização e reprodução de conteúdos, o que não direciona o
aluno a pensar sobre a língua.
Neste sentido, o ideal de aluno projetado, com base no
desenvolvimento de competências e habilidades comunicativas na LI, passa a
não existir. Isto, porque as práticas de ensino da língua, voltadas
essencialmente para regras de bem dizer, não permitem ao aluno avançar
nesse processo de aquisição do idioma.
Essa é, pois, uma preocupação de teorias que estão em voga no
momento, como é o caso da Linguística Aplicada, da Análise do Discurso, e
outros campos
categorias teóricos
gramaticais. que neste
Assim, buscam repensar
estudo, parte-seo doensino embasado
princípio nas
de que para
se aprender uma língua estrangeira (LE) na escola, o aluno não precisa
dominar a gramática da língua, ou ainda desenvolver competências tal como
um nativo, o que também não seria possível, mas que, mesmo com suas
limitações, ele consiga fazer uso do idioma em interações verbais, produção
de textos, momentos de oralidade, realização de exercícios e outras situações
de cunho comunicativo. As aulas de LI estão sempre vinculadas a
determinados métodos específicos de ensino, entretanto, embora diferentes
métodos tenham feito parte das aulas de LE, ainda se está à procura de um
método ideal, que dê conta de abarcar todas as habilidades que um falante de
Inglês precisa desenvolver. No entanto, precisa-se também repensar o perfil-
padrão de aluno que a escola desenha e, a partir disso, verificar se as práticas
de ensino de LI contribuem para a aprendizagem desse idioma. Assim, pensar
sobre as práticas de ensino da língua é pensar também em como a Linguística
Textual (LT) compreende a vivência de uma LE na escola.
Partindo desse pressuposto, este estudo apresenta uma abordagem de
ensino de LI que ultrapassa os saberes gramaticais de língua, convidando o
aluno a interagir no idioma, por meio de propostas de ensino e de
aprendizagem que o proporcionem essa relação com a língua. Assim, essas
propostas de ensino visam promover “aulas voltadas à aprendizagem da
língua como função social, onde deve haver apropriação e produção de saber”
(PCSC, 1998: p. 100).

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Nesse movimento, vale dizer que o ensino de LI obtém uma nova
importância para o aluno, que não ocupa mais um espaço passivo frente às
atividades de aula e, assim, é oportunizado a vivenciar a língua por meio de
práticas significativas. Com isso, ele pode considerar a aprendizagem de LI
além da compreensão de termos estruturais, ao passo que torna-se possível
visualizá-la enquanto representação da srcem, da cultura e do lugar do outro.
E, nesse sentido, a experiência com o idioma o permite estabelecer
comparações com sua língua materna, confrontar opiniões, bem como ampliar
o conhecimento da língua-alvo.

As orientações dos documentos oficiais para o ensino de LE

Os documentos oficiais buscam orientar a prática pedagógica dos


educadores, para tanto abordam questões sociais, filosóficas,
psicolinguísticas,
conhecimento em de modo campos
diferentes a formar um indivíduo
do saber. Voltando-sequepara
detenha
o temao
central desta pesquisa, o ensino de LI, é possível afirmar, de antemão, que há
vários critérios estabelecidos por esses documentos para a condução das aulas
desta disciplina – abordagem comunicativa, conhecimento cultural, eficácia
na produção de textos, competência para a fala e a escrita na língua-alvo – que
vislumbram práticas e modelos de ensino ideais para a efetiva aprendizagem
do idioma.
Neste âmbito, a Proposta Curricular de Santa Catarina (PCSC) e os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), documentos abordados neste
estudo, buscam nortear a prática pedagógica dos educadores em sala de aula.
Esses documentos sugerem uma reflexão sobre as razões para se aprender
uma LE. Neste sentido, dentre as justificativas para a aprendizagem de LE, lê-
se na PCSC (1998):

1. O domínio de uma LE se constitui em mais uma


possibilidade de ampliação do universo cultural do
aluno, possibilitando-lhe o acesso e a apropriação de
conhecimentos de outras culturas. Como um dos eixos
norteadores da proposta curricular é a socialização do
conhecimento, a aprendizagem de uma LE não limita
o conhecimento ao que a língua materna pode
oferecer (PCSC, 1998: p. 95).

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Neste entendimento, pode-se dizer que no processo de ensino e de
aprendizagem de LE, “através do confronto/estranhamento com a língua do
outro (estrangeiro) terá o aluno também a oportunidade de questionar,
compreender e ressignificar a sua” (PCSC, 1998: p. 94). E assim pode fazer a
partir das diferenças culturais que vigoram em cada sociedade, características
próprias de cada povo, que formam sua diversidade cultural. O choque de
culturas fomenta discussões e abre espaço para o diálogo a respeito de como
cada um sustenta ideias e defende pontos de vista. Mota & Scheyerl
(2010), nesse sentido, destacam a necessidade de:

(a) situar a língua dentro de um contexto sócio-


cultural historicamente construído; (b) considerar os
componentes identitários dos alunos que se
conflituam com aqueles outros expostos pelos
materiais didáticos e pelas falhas pretensamente
monoculturais dos professores e (c) integrar os
conteúdos linguísticos em cenários pluriculturais
mediadores de uma conscientização intercultural
crítica, a partir do reconhecimento da sua cultura de
srcem (2010: p. 13-14).

A partir dessa imersão do aluno no contexto sócio-cultural da língua


que está aprendendo, será possível fazê-lo perceber como o espaço do outro é
diferente do seu, por apresentar uma cultura distinta da sua, mas que também
se aproxima à medida que a língua resgata a história, a ideologia e os aspectos
interculturais que a compõem.
Para os PCNs, “Uma língua estrangeira, e neste momento histórico,
particularmente o inglês, dá acesso à ciência e à tecnologia modernas, à
comunicação intercultural, ao mundo dos negócios e a outros modos de se
conceber a vida humana” (PCN, 1998: p. 65). Compartilhando desta ideia,
Serrani (2005) afirma que “É bom lembrar que até para que a língua seja um
bom instrumento é preciso considerá-la como muito mais do que um mero
instrumento. Ela é matéria-prima da constituição identitária” (2005: p. 29). Ou
seja, a identidade do aluno, neste caso, é formada por diferentes questões
sociais, ideológicas, históricas, que são intrínsecas tanto à língua materna
quanto à LE. Neste sentido, a analogia e/ou divergência a essas questões irá
construir a identidade de cada sujeito/aluno. Para a PCSC (1998),

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“[...] o sujeito se constitui nas e pelas relações sociais,
a partir de situações significativas. Dessa forma,
quanto mais o sujeito aluno interagir com outros
grupos (outros alunos, professores, outras línguas e
culturas), maiores serão as possibilidades de
aprendizagem/desenvolvimento” (PCSC, 1998: p. 94)

Partindo desse pressuposto, entende-se que o ensino de LI está


vinculado não só a aspectos estruturais da língua, mas também a suas práticas
sociais. A língua, neste sentido, está relacionada à ideia de cultura, que
embora esteja presente na sala de aula, muitas vezes não é convocada no
trabalho com o idioma. O conceito de cultura está sendo entendido aqui
conforme Lima D.C (2009): “como padrões compartilhados de
comportamentos e interações, construtos cognitivos, e compreensão afetiva
que são adquiridos por meio de um processo de socialização” (2009: p. 182)
Assim como se afirmou anteriormente, ainda que os documentos
oficiais exijam um ensino de LE que traga à tona aspectos sociais, históricos,
culturais, a escola, por ora, não corresponde a tais práticas. Serrani (2005)
sugere que “em cada projeto pedagógico, currículo, programa, planejamento,
etc. selecionem [...] materiais lingüístico-discursivos correspondentes a
territórios, momentos, grupos sociais e legados culturais que permitam um
enfoque culturalmente heterogêneo” (2005: p. 32). Lima D. C (2009), nesse
contexto, afirma que “[...] os padrões compartilhados identificam os membros
de determinado grupo social enquanto , ao mesmo tempo, os distingue de
outros (2009: p. 182). E é nesse processo, de diferentes trocas, experiências
culturais distintas, que o aluno será oportunizado a vivenciar a LI também

como prática
Nestesocial.
sentido, ensinar a LI na escola, em conformidade com as
orientações curriculares, significa apresentar também perspectivas culturais da
língua-alvo. Para Chuchene & Hibarino (2010), a cultura na aprendizagem de
LE pode ser vista “como o compartilhamento de crenças e valores
acumulados durante o processo de formação dos indivíduos e construção de
sua identidade sócio-cultural fortalecendo suas concepções de mundo, onde a
comunicação eficaz e a competência intercultural são determinantes” (2010:
p. 200).
Não se trata, neste caso, de trabalhar a LI para enaltecer a cultura
estrangeira e, com isso, depreciar a cultura brasileira, pois, para Leffa (1999)
“parece
fazemosque ao invés
muitas vezes de incorporar
é submeter aspectos
nossa deàsoutras
cultura culturas
outras” (1999:àp.nossa,
14). o que
Há uma hierarquização do idioma, pois a LI tornou-se referência
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mundial e movimenta principalmente interesses profissionais e econômicos, o
que afeta irremediavelmente o ambiente escolar. Entretanto, não se busca um
ensino de Inglês que desempenhe um papel estritamente concentrado no
aspecto financeiro. O processo de ensino e de aprendizagem de LI deve
pautar-se em outras finalidades, que, segundo Leffa (1999), correspondem a
“objetivos educativos ("contribuir para a formação da mentalidade,
desenvolvendo hábitos de observação e reflexão") e culturais ("conhecimento
da civilização estrangeira" e "capacidade de compreender tradições e ideais de
outros povos, inculcando [no aluno] noções da própria unidade do espírito
humano") (1999: p. 22).
Partindo desse pressuposto, é papel do professor elucidar aos alunos
as razões pelas quais estão aprendendo outra língua, de modo que
questionamentos como: por que preciso aprender Inglês? não fomentem
dúvidas e, assim, provoquem resistência por parte dos alunos em aprender o
idioma. Ainda, o professor, conforme Siqueira (2009), deve ser dotado “da
capacidade de refletir criticamente sobre sua prática, visando ao
aprimoramento
como contribuindoconstante
para docombater
processo ede jogar
ensinopor
e aprendizagem
terra todos de
osLE, assime
mitos
preconceitos que ainda pairam sobre a capacidade de aprender LE (...)”(2009,
p: 108). Isso representa que cabe ao professor encorajar os alunos em suas
práticas com a LI, estimulando-os a a interagir com/na língua.
Desta forma, em concomitância com os documentos oficiais, a PCSC
e os PCNs, é possível dizer que o ensino de LE acontece na instituição escolar
para o desenvolvimento de competências comunicativas interculturais, ou
seja, o aluno é capaz de desenvolver, conforme prevê a PCSC (1998), um
“melhor nível de conhecimento de si e da própria cultura, na medida em que
esta é confrontada com a cultura do outro” (PCSC, 1998, p: 96). Isso,
portanto, não deve fazê-lo idealizar a LE, mas compreendê-la enquanto um
idioma que permite entremear pontos de vista, suscitar processos de
significação e restabelecer ideologias.

O papel do professor de LI

“[...] independente do método, do livro didático


adotado e das atividades propostas em classe, o
professor é que vai dar o tom da aula” (CONTIN,
2008: p.53 apud SIQUEIRA 2011: p. 97).

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Frente a essa afirmação de Contin, é possível levantar algumas
questões acerca do papel do professor de LE em sala de aula: Que tipo de
ensino é considerado ideal para a aprendizagem de uma LE? Como deve agir
o professor em relação ao livro didático (LD)? Que atividades são importantes
para o desenvolvimento da competência comunicativa dos alunos? A partir
desses questionamentos, busca-se, aqui, traçar respostas que, embora não
esgotem tais perguntas, o que também não seria possível, são capazes de
mexer na ideia de aquisição de LE, contribuindo para significativas mudanças
na natureza desse processo. Conforme foi
discutido, o ensino de LI encontra-se vinculado a uma metodologia regida
pelos documentos oficiais, tal qual se orienta por métodos de ensino de língua
distintos e que, ao longo dos anos, foram sendo substituídos, aprimorados,
conforme os parâmetros curriculares também foram sofrendo alterações e
mudando a ótica pela qual o ensino deveria acontecer.
Esses métodos defendiam cada qual uma perspectiva de ensino
diferente em relação à língua, ora buscavam ensiná-la por meio de uma
abordagem
textual, etc. comunicativa, ora por meio
Com isso, no período de os
em que uma abordagem
métodos estruturalista,
vigoravam, oral,
buscava-se,
na escola, desenvolver habilidades e competências próprias àquela abordagem
de língua que estava sendo trabalhada. Assim, por exemplo, se o método em
vigor era o comunicativo, o ensino de LI deveria voltar-se principalmente à
prática da comunicação.
Nesse entendimento, o ensino de língua ficava desarticulado, pois os
métodos atendiam cada qual um elemento linguístico, e não trabalhavam a
língua num todo. Embora os métodos de ensino buscassem, durante o período
de vigência na escola, aprimorar determinadas habilidades no aluno, conforme
os critérios que defendiam, devido a esse fracionamento linguístico, não
davam conta de promover a aprendizagem de LI. Entende-se, com isso, que a
substituição e/ou a evolução dos métodos de ensino ao longo do tempo na
escola não foram suficientes para formar um aluno que soubesse desempenhar
uma boa escuta, uma boa fala no idioma.
Em estes métodos não respondendo, a escola buscou encontrar outras
maneiras de ministrar o ensino de LI, que pudessem dar conta de suprir a
carência dos métodos, que privilegiavam aspectos linguísticos determinados.
Com isso, os métodos foram sendo abandonados aos poucos e atualmente não
há um método específico que esteja regendo o ensino de LI, contudo a escola
continua com a mesma postura em relação à língua, segregando o que é da
fala, o que é da escrita, o que é da comunicação, desintegrando os
componentes linguísticos.
Assim, cada vez mais surgem teorias que buscam preencher o vazio

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deixado por outras e, nesse movimento, idealiza-se um método perfeito, no
entanto, não há uma metodologia ideal, há maneiras outras de ensinar uma
LE, fazendo uso de abordagens comunicativas, interativas, contextuais,
abrigando princípios de vários métodos propostos, o que facilita o processo de
aquisição do idioma. Para tanto, faz-se necessário que o professor ‘atue bem’
em sala de aula, e faça uso dessas abordagens no espaço escolar. Sabe-se, no
entanto, que assumir uma nova postura quando se privilegia principalmente
meras atividades de repetição é um papel desafiador, no entanto, é preciso
romper com a ideia de que se devem seguir fielmente os conteúdos
programáticos, afinal o desenvolvimento de atividades como “passe para a
negativa” ou “traduza as frases abaixo” não garantem a eficácia do ensino de
LI. Assim, enquanto no âmbito escolar, muitas vezes, são realizados
exercícios dessa natureza, perde-se, na visão de Siqueira (2009), a
“oportunidade para realmente educar, confrontar pontos de vista, instigar o
senso de cidadania nos [...] alunos a partir das aulas de LE, hoje tão
esvaziadas de criatividade, subjetividade e senso crítico” (2009: p. 85).
Nesse sentido,
dos conteúdos embora ocabe
preestabelecidos, currículo escolarselecionar
ao professor exija a sequência didática
os materiais e as
atividades dos LDs de LE, de modo a trazer à tona, como afirma Siqueira
(2009), “as mensagens sociais e ideológicas externadas nas mais variadas
situações e que são usualmente neutralizadas em prol de uma
metodologização excessiva do processo de ensino e aprendizagem [...]”
(2009: p. 85).
Essas mensagens sociais e ideológicas, das quais trata Siqueira,
provêm de temas que têm relevância e fazem parte do círculo social e, muitas
vezes, devido ao curto período de uma aula e ao foco do professor em
obedecer ao que o sistema prescreve, não são abordados em sala de aula.
Siqueira (2009) traz um exemplo de uma aula de LI na qual o aluno sugere
que “a solução para acabar com a violência e a criminalidade no país seria
explodir as favelas da cidade” (2009: p. 80). A princípio, a opinião do aluno
pode soar como uma piada, ou até mesmo não ser levada em consideração na
sala de aula. Então, eis a questão: como o ensino de uma LE pode contribuir
para formar opiniões, abrindo espaço para novos campos de sentido, se o que
os alunos pensam sobre determinado assunto não é discutido no ambiente
escolar? A partir desse exemplo, Siqueira (2009) afirma que é papel do
professor “propor um aprofundamento da questão, explorando
cuidadosamente o contexto, e promover uma discussão mais ampla ou algum
tipo de debate, envolvendo todo o grupo” (2009: p. 84-85). Assim, o aluno
seria capaz de expor seu ponto de vista, que é também a voz de muitos outros
que pensam da mesma maneira. Com isso, torna-se possível discutir valores,

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crenças, discursos e ideologias ao passo que a cultura da LI também está
sendo trabalhada. Isto, porque ensinar uma LE não se trata apenas de elaborar
uma gama de exercícios, mas debater situações comuns do dia a dia,
aproveitando assuntos que interessam aos alunos e agregando o conhecimento
linguístico necessário para discutir o tema, por meio de vocabulário
específico, produção oral, texto escrito, para que desta forma os alunos
possam exercitar sua capacidade de argumentação aprendendo a língua-alvo.
Com relação ao aspecto cultural, Serrani (2005) aborda o professor de
línguas como interculturalista, definindo-o “como apto para realizar práticas
de mediação sócio-cultural, contemplando o tratamento de conflitos
identitários e contradições sociais, na linguagem da sala de aula” (2005: p.
15). O perfil do docente, assim, deve contemplar o aluno ao promover
discussões e debates em torno de sua cultura a partir de questionamentos da
cultura do outro. Neste âmbito, conflitar pontos de vista faz-se necessário para
depreender noções próprias de cada segmento cultural. Conforme a Proposta
Curricular de Santa Catarina (PCSC) (1998):

O professor é parte fundamental do processo como


mediador, o que faz a ponte entre o aluno e a cultura,
o conhecimento e as formas de apropriação desse
conhecimento. Ele deve monitorar, explicitar, dar
possibilidades na resolução de problemas – enfim,
pôr-se nesta relação, intervindo via diálogo como um
dos interlocutores: privilegiado, porém não detentor
absoluto do saber, dando assim possibilidades a uma
prática pedagógica discursiva de múltiplas
formulações (1998: p. 99).

Ainda sobre as atribuições do professor de LE, Siqueira (2009) afirma


que “o professor deve se comportar como um sujeito crítico, firme nas suas
concepções, aberto, flexível e atento à compreensão dos textos que emergem
na sala de aula [...]” (2009:p. 86). Isto, porque adotar uma postura
passiva e homogênea frente às diferentes manifestações da linguagem que
acontecem na sala de aula não conduz o aluno a pensar efetivamente sobre a
língua.
É essa postura passiva que assume o material didático, pois ele é um
dos principais responsáveis pelo controle dos sentidos no ambiente escolar. O
LD de LI acompanhou as mudanças que ocorreram no ensino ao longo dos
anos, e procurou adequar suas atividades conforme os critérios/objetivos
traçados para o ensino de LE na escola. No entanto, a ênfase nos aspectos
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estruturais da língua sempre prevaleceu e, ainda hoje, embora o LD aponte
para uma proposta textual de língua, ainda há exercícios com sentidos
direcionados e de reconhecimento gramatical. Assim, envolto em exercícios
de compêndios gramaticais e guiado pelas interpretações previstas e
recomendadas pelo LD, o aluno não assume uma interpretação sua ao lidar
com o texto.
Anteriormente, os LDs traziam textos sem relevância social, que
apenas retratavam diálogos ou representavam situações fictícias para que o
aluno somente decorasse um vocabulário específico ou respondesse às
perguntas de forma adequada. Para Siqueira (2009), “Situações que tragam à
tona temas de cunho político, ideológico, ético, social, étnico, entre outros, ou
seja, que contribuem para o desenvolvimento da identidade do aprendiz,
praticamente inexist[iam] no escopo desses materiais” (2009: p. 88).
Os LDs, atualmente, em geral, procuram não trabalhar com esse tipo
de texto tão fechado em si mesmo, com a finalidade única de transmitir um
conteúdo. Agora, os manuais de ensino têm sido divididos em seções,
capítulos
referênciaquena trabalham temas
sociedade, taisdistintos,
como: retratando assuntosvícios,
meio ambiente, pertinentes e de
amizade,
invenções, alimentação, preconceito, tecnologia, sexualidade, costumes,
liberdade, trabalho, comportamento humano, artes, política, violência, etc. O
trabalho com textos desse tipo contribui para um ensino de língua mais aberto
à interpretação, contudo embora sejam considerados mais próximos da
realidade, pelo fato de serem retirados de jornais, revistas que circulam no
meio social, o modo como boa parte desses textos são abordados em sala de
aula ainda não leva o aluno a realizar um trabalho significativo na LI, a pensar
sobre, interpretar.
Nesse sentido, o professor deve estar sempre se atualizando e bem
preparado, tornando os LDs uma ferramenta útil e eficaz em suas aulas.
Então, pedagogicamente, conseguir-se-ia superar muitas falhas dos exercícios
a partir da interação professor e aluno. Essa interação poderia sanar as
deficiências e levar a um bom uso de todo material didático. Assim, é
necessário que os profissionais que lidam com a LE não só conheçam o
material que empregam como também saibam administrar tanto os pontos
positivos quanto os negativos que nele existem.
O professor de LE deve usar, nas palavras de Siqueira (2009), “a LE
não apenas como fim, mas principalmente como meio para os alunos
desenvolver suas qualidades de futuros cidadãos engajados e pensantes”
(2009: p. 91). Com isso, sua prática docente se tornará mais significativa,
desprovida de movimentos automáticos e atitudes neutras, pois, assim como
traz Costa (2002), “o “bom” professor não vê nos estudantes personalidades

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aprendizes uniformes, com anseios de aprendizagem também uniformes, mas
implementa, respeita e estimula a individualidade dos estudantes” (2002: p.
179). Da mesma forma, o “bom” aluno também não é aquele que pensa a
partir das mesmas perspectivas que a sala inteira, ou que reproduz o conteúdo
conforme o LD prevê, mas aquele que questiona, interroga, interpreta e atribui
sentidos outros às atividades propostas pelo professor.

Atividades de LI: da reprodução à formulação de sentidos

O processo de ensino e de aprendizagem de LI é embasado nos


fundamentos da LT, teoria balizadora do ensino na escola e que, embora
compreenda os sentidos de maneira mais estanque, não trata o texto como um
processo acabado, o que oportuniza o aluno a mexer em seu próprio dizer,
tendo aí uma certa margem de manejo da língua.

Figura 1 – Exemplo de Texto Pedagógico1

Fonte: DONNINI, Lívia et al. (2010, p.37)

Assim, para ilustrar o que se tem discutido sobre o modo como o


ensino de LI é conduzido na escola, e a forma como se está propondo que ele
aconteça, traz-se a seguir uma figura extraída do livro “Ensino de Língua
1
João está na sala de estar. Ele está assistindo televisão. A mãe dele está na cozinha. Ela está
preparando o jantar. O pai dele está na sala de estar. Ele está lendo o jornal.

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Inglesa”, que apresenta uma situação comum em família: pai, mãe e filho num
cômodo da casa e cada um executando uma tarefa. Essa imagem ajuda a
pensar o ensino de LI por meio do caráter pedagógico da escola e, a partir daí,
possibilita também introduzir um funcionamento da língua nas práticas de sala
de aula.
A partir da figura, verifica-se que o texto ao lado da imagem trabalha
com construções estruturais da língua, ao abordar o tempo verbal present
continuous e o vocabulário de família, no entanto, Doninni (2010), docente na
área de metodologias do ensino de LI, afirma que “[...] cabe indagar em que
contexto de uso alguém diria ou escreveria uma sequência de frases assim
organizada” (2010: p. 38). Isto, porque o ato da comunicação não obedece a
um critério metódico de disposição de frases, acontece no dia a dia,
involuntariamente, sem submeter-se às regras da língua.
Isso faz pensar, portanto, no perfil dos textos trabalhados no ensino de
LI, pois, conquanto que o texto pedagógico ainda atenda finalidades
específicas na língua – pronomes, verbos, vocabulário –, para Doninni (2010)
“O ensino
de seus usosbaseado exclusivamente
e de seus em textos
usuários, e contribui paradesse tipo desvincula
a separação a língua
entre o inglês “da
escola” e o inglês “do mundo”” (2010: p. 38). Ou seja, textos como esse da
atividade servem como exemplo de práticas de ensino que dizem respeito
apenas à cópia/reprodução de conteúdos na escola e não, neste caso, à
vivência do inglês no mundo, pois dispensam a abordagem de aspectos
significativos que poderiam alçar outros sentidos possíveis no trabalho com a
língua.
Dessa forma, para que essa atividade não se resuma à ordem da
repetição, faz-se necessário que ejam apresentadas de outra maneira em sala
de aula, abrindo espaço para a construção de sentidos. Doninni (2010) afirma
que é possível, neste caso, “[...] propor uma discussão a respeito dos papéis
desempenhados pelos personagens ilustrados [...] e a própria imagem da
família mononuclear (com pai, mãe e filho)” (2010, p. 38).
Neste contexto, o professor poderia instigar os alunos, a partir dos
papéis desempenhados pelos personagens dessa atividade, a pensar sobre
como a sociedade estabelece as funções de homem e mulher, como essas
atribuições foram se consolidando ao longo dos anos, e de que forma a mulher
foi conquistando sua independência, sua autonomia, seu espaço. Além disso,
conforme a abordagem de Doninni, também é possível, a partir da imagem,
trabalhar a questão do ideal de família, questionando quem faz parte da
família dos alunos, como eles vivem, assim dando oportunidade para que
falem de sua família, o que gostam nela e o que poderiam fazer para melhorar
a convivência entre as pessoas. Nessa perspectiva, o aluno é capaz de atribuir

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um novo sentido à imagem, pois não está cingido por regras de bem dizer e
condenado a uma construção simbólica de texto, conforme apresentado, pois
ao estar isento de atividades automáticas, ele consegue atribuir sentido à
atividade. São propostas de atividades desse tipo que devem ser exploradas no
campo da LI, pois o aluno terá abertura para falar sobre o texto em questão.
Assim, mesmo que ele se recuse a falar o que pensa sobre essas questões na
língua-alvo, ele pode fazer suas contribuições na língua materna e, assim, o
professor, num trabalho de mediação, pode também contribuir com
vocabulários específicos, frases e conceitos-chave, de modo que o aluno se
habitue a trabalhar com o idioma.
Essa integração com a LI é necessária para que o aluno se sinta à
vontade ao praticá-la, sem que, para isso, ele precise decorar regras. Assim, de
maneira espontânea, é possível desenvolver um trabalho que, ao mesmo
tempo em que se concentra na aprendizagem de uma LE na escola, também
abra possibilidade para que o aluno srcine uma fala sua.
Não se quer, nesse sentido, dizer que as regras não devam ser
ensinadas, mas suprimir,
é preciso aprender conforme
a língua Doninni
para depois (2010),a “a
aprender noção
usar de que(2010:
a língua” primeiro
p.
37). Neste pensamento, entende-se que o processo de ensino e de
aprendizagem de LI deva acontecer por meio da vivência do idioma, sem
obedecer a uma cronologia que dita o que vem primeiro e o que vem depois,
neste caso, inicialmente as regras e, consecutivamente, a prática da língua-
alvo. É preciso, pois, que se pense outra posição do aluno em relação à língua
e, com isso, inicie-se uma aprendizagem de LI que não segregue o que é da
fala, o que é da escrita e o que é da comunicação, como se a vivência da
língua acontecesse separadamente, disassociada, isolada dos elementos que
são próprios de sua organização. Nesse sentido, ao elencar tais elementos –
fala, escrita, comunicação, etc. –, consegue-se harmonizar práticas que deem
conta de trabalhá-los simultaneamente no contexto da sala de aula. Assim,
torna-se possível visualizar um ensino de Inglês que não aconteça de modo
ramificado, fragmentado, conforme pressupõe a escola, mas que, a partir de
práticas de atividades como a que aqui foi construída, possa autorizar o aluno
a fabricar novos sentidos e reconhecer-se, identificar-se com a língua que está
interagindo.

Proposta de ensino de LI

A LI, como a maioria das LEs, esteve atada a métodos de ensino,


conforme se abordou anteriormente, que, embora buscassem um
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aprofundamento específico acerca da língua, nem sempre exerceram
influência cultural, étnica, religiosa, política no ensino da língua-alvo. No
entanto, muitos desses métodos contribuíram para a evolução das LEs,
provocando transformações essenciais no currículo das escolas, como a
abordagem intercultural da linguagem, o desenvolvimento de competências
comunicativas e a utilização de técnicas voltadas à habilidade no idioma.
Embora uma gama de potencialidades fosse desenvolvida a partir dos
métodos, o ensino de LI voltava-se unicamente para a abordagem que esses
métodos privilegiavam. Entretanto, mesmo os métodos de ensino sendo
abandonados, a escola continuou com a mesma postura em relação à língua,
trabalhando-a de maneira fragmentada. O professor, como já se discutiu,
nesse sentido, deve atuar bem para conduzir o ensino de LEs com idoneidade.
Para tanto, é necessário que transponha os conhecimentos linguísticos do LD
e vá além, propondo atividades que interessem aos alunos, supram as
exigências do currículo e provoquem mudanças no panorama de ensino de
línguas. Neste âmbito, torna-se possível vislumbrar um ensino de LI que
conduza o aluno
volta. Nesta ótica,apara
umaBolognini
leitura mais reflexiva, mais crítica do mundo à sua
(2007),

A aprendizagem de línguas estrangeiras, entendida


não apenas como um acúmulo de conhecimentos
teóricos sobre a língua, mas como um processo de
capacitação para uma prática discursiva no idioma-
alvo, hoje é vista como um empreendimento
altamente complexo, em que se cruzam variáveis de
diferentes ordens: linguísticas, sociais, culturais,
identitárias etc. (2007: p. 14)

Partindo desse pressuposto, a LI, não como um idioma a ser cumprido


conforme o currículo escolar, agrega variáveis de diferentes ordens:
linguísticas, sociais, culturais, identitárias, daí emanando discursos que
dialogam com os saberes do aluno, permitindo-lhe posicionar-se como um
sujeito que de fato interpreta ao assumir o seu próprio discurso e construir o
seu próprio sentido. Com este pensamento, apresenta-se a seguir uma proposta
para o ensino de LI nas escolas, descrita a partir da experiência da autora, de
modo que se possa pensar um ensino de LE que fuja aos aspectos tradicionais
da língua – repetição,
oportunidade classificação,
para produzir seu texto,estrutura
imprimir–sua
, aovoz,
passo que dáà ao
trazendo aluno
tona sua
cultura, história, ideologia e também confrontando seu espaço com o espaço
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que o outro ocupa e, nessa relação, ele possa visualizar a língua não como um
código a ser decifrado, mas enquanto vivência, interação e troca de
experiências.

Proposta: Vídeos – Música e Imagem

Procedimentos:

1. Escolher uma letra de música em inglês;


2. Entregar a letra (inglês e português) até o dia estabelecido;
3. Não escolher músicas com temas inapropriados;
4. Para cada verso da música, escolher uma imagem que o represente;
5. As imagens podem ser retiradas da internet, filmes em geral;
6. Juntamente com as imagens, a música deverá ter legenda (Ing/Port);
7. identificado;
O trabalho deverá ser entregue em CD ou DVD devidamente
8. Entregar uma cópia da música para a turma, apenas com a versão em
inglês;

A proposta em questão remete a uma aprendizagem de língua que


avança em relação aos métodos de ensino que vigoraram na escola, pois não
foca apenas numa habilidade a ser desenvolvida no aluno, pelo contrário, a
partir dos elementos dos quais a língua dispõe – fala, escrita, comunicação,
estrutura –, permite-se, aqui, trabalhar em todas essas esferas.
Além disso, conforme a discussão em torno do material didático,
verificou-se que o LD, muitas vezes, ao abordar atividades relacionadas às
regras da língua, não permite ao aluno interagir e vivenciar o idioma que está
aprendendo. Essa proposta, no entanto, assume uma outra postura em relação
ao ensino de LI à medida que envolve o aluno na produção de sentido em sala
de aula. Nesse movimento, ele passa do lugar de receptor, decodificador,
repetidor de verdades para ocupar um espaço de intérprete, autor e indíviduo,
que vive uma cultura, segue uma determinada ideologia e habita um lugar na
história.
Os vídeos e a música contribuem para essa mudança significativa do

ensino de LI, pois são


aluno envolver-se meios
nesse muito de
processo utilizados
produçãono de
dia sentidos
a dia e possibilitam
à medida queao
abrem espaço para a interpretação, para que o aluno atribua um significado ao

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que está vendo, ouvindo, vivenciando. Os vídeos têm basicamente feito parte
da vida das pessoas, que buscam registrar momentos, guardar memórias, bem
como exibi-los em programas de TV, internet ou até mesmo tentar ganhar
dinheiro com isso. A música, da mesma forma, desempenha um papel
importante na vida das pessoas, pois tem o poder de mudar sua maneira de
pensar, fazê-las chorar ou sorrir, resgatar lembranças, recordações, lugares,
sentimentos e, por isso, elas se identificam com a letra ou a melodia, capaz de
elevar a autoestima e/ou causar desconforto, angústia, melancolia. A imagem
– fotos, retratos, pinturas – também esboça emoções únicas, seja de pessoas,
paisagens, etc.
Nesse sentido, essa proposta, a partir da música que os próprios
alunos selecionaram, convida-os a produzir um vídeo reunindo imagens que
desenham a parte acústica, de modo que eles possam expressar os versos da
letra por meio de representações que, aos olhos do aluno, referem-se ao que a
música supõe, presume, exprime e/ou significa. É possível fazer o aluno
pensar sobre a música, compreendendo por que gosta da letra, por que se
identifica
em sala decomaula.a melodia, e de que forma isso interfere na posição que ocupa
Esse trabalho é bastante significativo, pois o aluno envolve-se com a
música e atribui a ela significados distintos, sentidos que, por sua vez, são
construídos nesta interação existente entre o sujeito e a linguagem. Koch
(2005) afirma que “O sentido de um texto é, portanto, construído na interação
texto-sujeitos (ou texto-co-enunciadores) e não algo que preexista a essa
interação” (2005: p. 17). Pode-se dizer, assim, que por meio da letra da
música, o aluno constrói e direciona os sentidos que busca alcançar a partir
das imagens (textos), estabelecendo um diálogo entre a representação visual e
a parte escrita do texto. Nesse movimento, em que o aluno tem certo manejo
da língua, os sentidos podem ser vários. Com isso, enquanto a música para o
compositor pode ser um desabafo ou uma exibição fictícia, para o aluno pode
vir a ser um consolo, uma representação da realidade ou uma demonstração de
amor, afeto, felicidade. Entende-se, desta forma, que há um leque de
interpretações possíveis, que vêm à tona mobilizando diferentes opiniões, pois
no ponto de vista de um aluno, por exemplo, “Don't you worry, don't you
worry child, see heaven's got a plan for you” (Não se preocupe, não se
preocupe criança, os céus têm um plano pra você) pode significar que alguém
está passando por alguma dificuldade de cunho social, econômico, já outro
aluno pode interpretar que alguém sofreu uma desilusão amorosa ou foi
vítima de acidente, etc. Sob essa perspectiva de diferentes interpretações, é
possível, ainda, que um aluno, ao ouvir a música pela primeira vez, faça uma
leitura distinta da segunda ou terceira vez que escutá-la. Essa interpretação, no

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caso, pode ser determinada pelo lugar em que ele está, o momento que está
vivendo, as pessoas que estão ao seu redor, enfim, há inúmeras possibilidades
que podem determinar que o sentido pode ser um ou outro. Ainda, essa
proposta de ensino inclui cinco questões de interpretação e cinco questões de
gramática, porque o aluno que elaborar as questões de interpretação terá que
visualizar na música personagens, momentos, história, enfim fazer uma leitura
e, então, organizar perguntas que possibilitem aos seus colegas de classe
trabalhar a LI. E, quanto às questões de gramática, é uma forma de estudar a
língua sem “fatiá-la” para que possa ser classificada num contexto situacional.
Com isso, as categorias gramaticais são abordadas num cenário linguístico, no
qual o sujeito apropria-se do contexto da música e pode perceber o uso dos
verbos regulares, irregulares, a utilização de pronomes, conjunções, tempos
verbais diversos, enfim, há uma série de elementos gramaticais que podem ser
analisados na própria composição musical. Para dar continuidade à proposta,
sugere-se que os alunos dominem a letra da música e a cantem para a turma.
Isto, porque é importante o uso da oralidade em sala de aula, pois dentre todos
os
atoelementos que estãoAlém
de comunicação. dispostos na na
disso, estrutura
LI, a da língua,
escrita dasa fala é crucial
palavras paradao
difere
pronúncia, o que torna ainda mais proeminente que o aluno utilize o oral para
se expressar na língua-alvo.
É importante salientar que além de todas as competências acima
explanadas, essa proposta de ensino ainda conta com o alicerce cultural, pois a
música, dentre outras características, aborda elementos culturais que são de
grande valia para o aprimoramento e enriquecimento da competência
linguística no idioma em questão. Lima (2010) afirma que “As canções, como
forma de expressão cultural, veiculam valores estéticos, ideológicos, morais,
religiosos, linguísticos, etc. Elas possuem, a exemplo de outras produções
artísticas, as marcas do tempo e lugar da sua criação” (2010, p. 184). A
música, nesse sentido, vai ao encontro da maneira como se está propondo o
ensino de LI nessa pesquisa, com base nos aspectos que abragem a língua
num todo.
Para Lima (2010), ainda, “A mensagem da música, assumida como
manifestação cultural, facilita a compreensão do vocabulário, ao mesmo
tempo em que estimula os alunos a identificarem os aspectos interculturais
(semelhanças e diferenças)” (2010, p. 191). É neste espaço, como tem sido
discutido, que se pretende trabalhar a LI, à medida que o aluno se confronte
com a cultura do outro e, a partir do estranhamento e dessa nova experiência,
ele seja possibilitado a realizar um trabalho significativo com a língua,
percebendo as semelhanças e diferenças que o afastam, mas ao mesmo tempo
o aproximam da LE.

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Figura 1 – Exemplo de imagem e legenda de vídeo2

Fonte: Print Screen de um vídeo de autoria dos alunos.

Figura 2 – Exemplo de imagem e legenda de vídeo

Fonte: Print Screen de um vídeo de autoria dos alunos.


2

deOsLIexemplos, trazidos
abordada neste aqui,desenvolvida
artigo, referem-se àpor
execução
alunos da
da proposta
Escola dedeEnsino
ensinoBásico
e de aprendizagem
Maria Joana
Teixeira (nome fictício).

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Neste caminho, é possível arraigar o ensino do idioma a partir das
músicas, que socializam ideias e, conforme Gobbi (2001), “fornecem textos
autênticos que estimulam a compreensão auditiva e o debate” (2001, p. 29),
além disso, ainda segundo a autora, também “representa[m] um grande elo
comunicativo. É a linguagem do som e letra que chegam ao ouvinte em forma
de comunicação” (2001, p. 40). Desta forma, é possível afirmar que a música
amplia o universo cultural do aluno, ao apresentar ritmo e letra, que dialogam
com a posição social que ele ocupa e, com isso, constitui-se em um estratégia
de ensino, capaz de treinar a oralidade, a pronúncia e, principalmente, ampliar
o vocabulário na língua-alvo.

Figura 3 – Exemplo de imagem e legenda de vídeo

Fonte: Print Screen de um vídeo de autoria dos alunos.

Considerações finais

A LI, durante muito tempo, vinculada aos métodos de ensino, esteve


ancorada a técnicas que privilegiavam o desenvolvimento de determinadas
habilidades, enquanto outras não eram tão trabalhadas. O ensino, desta forma,
passou por algumas fases até atingir um nível satisfatório de aprendizagem,
lidando com os elementos que estruturam a língua num todo (oralidade,
escrita, nomenclaturas, interpretação), bem como aspetos sociais, históricos,
culturais.
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A LI, nos dias atuais, tem exercido grande importância no meio
profissional, o que tem despertado o interesse das pessoas em aprender o
idioma para o mercado de trabalho. A escola, com isso, vem tentando alcançar
a possibilidade de formar um aluno fluente no idioma, entretanto tem
esbarrado em algumas dificuldades pelo caminho. Embora o currículo exija
que o aluno domine determinadas competências linguísticas na língua-alvo,
ainda há impedimentos no ensino – preparo do professor, poder do LD,
condições ínfimas de trabalho, desvalorização, número excessivo de alunos,
carga horária, etc – que não garantem a qualidade no processo de
aprendizagem. Faz-se necessário intervir no ambiente escolar e transformar o
pensamento de muitos professores que julgam impossível que seus alunos
consigam expressar-se na LI, bem como de muitos alunos que jamais
imaginaram falar outro idioma. É preciso que ambos, aluno e professor,
acreditem em suas potencialidades e tornem possível um processo de ensino e
de aprendizagem de LE dentro das possibilidades do ambiente escolar. A
partir de reflexões, pesquisas, exposições, abordando temas diversos, é
possível novos
constrói promover momentos
dizeres, tambémdese interação para que
constitua como o aluno,
sujeito enquanto
à medida que é
convidado a opinar e reconhecido pelo seu ponto de vista ao confrontar
valores de sua cultura em relação à cultura estrangeira.
É desse modo que o aprendiz de LI tem abertura para assumir outros
movimentos de aprendizagem, pois é a interação do sujeito com a linguagem
que possibilita ao aluno desenvolver competências na língua-alvo, a partir de
situações que não busquem “nativizá-lo”, mas concebê-lo enquanto brasileiro
que é para, então, ensinar-lhe uma LE.

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