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CURSO DE DIREITO
Coronel Fabriciano
2019
MATHEUS BARCELOS GOMES
Considering the importance of the process of the criminal law in a state based in the rule of
law, the structure of procedure criminal wanted by Federal Constitution must be identified, but
the literature do not find an agreement about the basic elements of each criminal justice
system, this research aimed to define the main elements of the current Criminal Justice
Systems pointed by most part of the brazilian criminal procedure literature, with this main
elements, it’s possible to set the criminal justice system wanted by Constitution and if a judge
with an active posture inside the process is compatible with Constitution’s will. To achieve this
goal, we used the methodology as applied research with a qualitative approach and as a
research technique using a bibliographic survey. It is concluded that it is possible to identify a
main element for each criminal procedure system, with these elements, the brazilian criminal
procedure literature, analyzed in this research, by unanimity, defines that the Federal
Constitution has adopt the Accusatory Criminal Justice System, for the judge posture in
evidences search, this literature recognizes that must be created limits in his acts after the
beginning of the criminal procure in judicio, and before it, in preliminary investigation, the
perform ex officio for searching evidences must be refused in view of the Constitution.
1. INTRODUÇÃO..................................................................................................7
2. A CONSTITUIÇÃO COMO FUNDAMENTO DO PROCESSO ........................9
3. OS SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS.......................................................11
3.1.1 Sistema Acusatório..................................................................13
3.1.2 Sistema Inquisitivo...................................................................23
3.1.3 Misto..........................................................................................30
4. O SISTEMA ADOTADO PELA CONSTITUIÇÃO.........................................33
5. (IN)COMPATIBILIDADE DA ATUAÇÃO DO JUIZ EX OFFICIO NA
PRODUÇÃO DE PROVA................................................................................36
6. CONLUSÃO.....................................................................................................46
REFERÊNCIAS ...................................................................................................49
7
1. INTRODUÇÃO
interpretativo a ser seguido pelos aplicadores do direito, é nela que devemos buscar
as vigas mestras do processo penal brasileiro porquanto “somente podemos entender
o sistema jurídico se, no seu ápice, estiver a Carta Magna” (RANGEL, 2015).
Desta feita, definida a sistemática constitucional, foi eleita como objeto de pesquisa
do presente trabalho a atividade do juiz na busca e produção de provas dentro do
Código de Processo Penal e se ela se adequa ao modelo processual penal eleito pelo
constituinte.
Por isso a aplicação da pena sofre uma série de limitações e tem seu conteúdo
delineado de forma incisiva pela Constituição e seus princípios explícitos e implícitos
que irradiam sobre todo o ordenamento jurídico, funcionando como verdadeiro
caminho a ser seguido pelos Poderes da República na criação e aplicação do direito
penal.
Evidenciando esse abismo entre o a seara penal e as demais Aury Lopes Jr. citando
Carnelutti (2012, p. 94) expõe:
[...] ao juiz penal não se pede, como ao juiz civil, algo que nos falta, o
tal “bem da vida” como se referem os civilistas. É a própria vida que
está em jogo. Para o autor, tanto o juiz penal como ao juiz civil,
compete dar a cada um o seu. A (imensa) diferença está em que no
penal é dispor do próprio “ser”, ao passo que no civil é o “ter”.
Antes, então, de ser visto como viabilizador da pena, na visão garantista de Aury
Lopes Jr. (2012), a função fundante do processo penal em um Estado Democrático
de Direito é garantir os direitos fundamentais do indivíduo refletindo o modelo de
Estado vigente, como ensina J.Goldsmith (2016, p. 67): “o processo penal nada mais
é que o termômetro dos elementos corporativos e autoritários de uma Constituição”;
e Pisapia (1971, p.3) que estabelecia que “o grau de civilidade um povo se mede
sobretudo pelo modo com o qual se salvaguarda os direitos e as liberdades do
imputado no processo penal”.
Concluindo, deve-se ter como premissa, então, que o processo deve ser um reflexo
daquele modelo delineado pela Constituição do país, aplicando o direito material e
defendendo o indivíduo dos efeitos negativos inerentes à aplicação do direito penal,
do abuso e excesso de poder, o grande desafio é a convivência desses dois objetivos,
não obstante o processo penal deve ser a única estrutura legitima para a imposição
da pena (JR. LOPES e GLOECKNER, 2014).
Importa-nos, agora, tratar dos sistemas processuais penais, ou como prefere Tourinho
Filho (TOURINHO FILHO, 2010), tipos de processo penal. Atualmente a doutrina
majoritária estabelece 3 (três) modelos processuais: o inquisitivo, acusatório e o misto.
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O estudo dos sistemas processuais é importante porque define a política penal eleita
pelo o legislador de determinado país, essa escolha é crucial, porque, como veremos,
determina o nível de imparcialidade do julgador, a eficiência da repressão criminal e
seu grau de tecnicidade (ANDRADE, 2013)
Discorrendo sobre assunto, Andrade (2013) aduz que os sistemas são formados por
elementos, esses divididos em duas espécies: fixos e variáveis. Os primeiros seriam
13
Por utilizar de uma metodologia bem definida, no decorrer de cada tópico relativo aos
sistemas processuais, será exposta a conclusão do autor supracitado em relação aos
elementos fixos de cada um dos sistemas.
De modo gradual, o poder popular foi ganhando força, até que os arcontes decidiram
que os assuntos judiciais deveriam ser decididos pelo povo. Por meio de tribunais
populares compostos por cidadãos leigos (WOLKMER, 2006).
Em síntese didática, Jose Reinaldo de Lima Lopes (LOPES, 2011, p.23) explica a
estrutura das instituições jurídicas no direito ateniense:
Portanto, os crimes eram julgados por diversos tribunais – todos populares –, que
eram divididos por competência em relação à modalidade do delito submetido a
julgamento (ANDRADE, 2013).
a busca por provas era encargo que recaia sob as partes, esse era um
princípio importante que constantemente era reforçado.
e) Debates orais, com tempos divididos de forma equitativa para cada parte
f) Existia algo parecido com in dubio pro reo, se a votação terminasse
empatada, decidia-se pela absolvição.
g) A tortura era utilizada, porém, vista com maus olhos. A confissão obtida por
meio dela tinha valor probatório menor.
O período republicano, ocorreu entre 509 e 27 a.C, nesse tempo, houve um intenso
movimento popular que aproximou o povo do poder, as decisões da plebe, depois de
várias revoltas, passaram, até certo ponto, a ter força normativa e os Tribunais da
Plebe começam a ter relevância. Ocorreu a promulgação de lei que garantia o direito
de casamento entre patrícios e plebeus, ganharam também, representatividade no
Senado antes composto apenas pela elite, além da lei Hortência que elevou as
decisões da plebe à categoria de lei (PALMA, 2011).
Tourinho Filho (2010, p.120), sintetiza como a acusação e todas suas funções
inerentes na mão exclusivamente de particulares poderiam afetar a sociedade:
Além disso, o processo era utilizado como meio de buscar vantagens indevidas,
porquanto, os acusados poderiam ter parte das multas e penas aplicadas ao acusado
convertidas para si, tornando-se um verdadeiro mercado lucrativo e por isso “uma
praga em Atenas” (LOPES, 2011, p.25)
Nos dois casos acima as práticas inquisitórias – sistema que será visto no proximo
capitulo – surgiram após ascensões autoritárias ao poder e sustentadas pela
impunidade gerada pelo sistema que fazia com que, aos poucos, os juízes se
aproximassem da função de acusar (LOPES JR., 2012).
Outro princípio que, segundo 7 dos autores, excepcionados por Pacceli (2017) e
Brasileiro (2016), é atrelado à sistemática acusatória é o contraditório, que decorre da
própria estrutura dialética desse procedimento – o processo de 2 partes em confronto
e o estado-juiz como terceiro imparcial –, nesse sentido, deve o juiz ouvir ambas as
partes em qualquer ato do processo. Inclusive o juiz, antes de praticar determinados
atos, deve ouvir ambas as partes. Tourinho Filho (2010, p.72) de maneira clara traduz:
Em sentido oposto, tem-se Mauro Fonseca Andrade (2013), o autor defende que o
contraditório não deve ser elevado à categoria de elemento fixo do sistema acusatório,
fundamenta sua posição nas excepcionalidades em que o princípio incorre, por
exemplo, quando o juiz aceita a denúncia sem ouvir a outra parte, quando defere
medidas cautelares inaudita et altera parte, o instituto da preclusão (réu que fica
impossibilitado de contrapor por perca de prazo) e até a retirada do réu da sala de
audiência são exceções ao contraditório admitidas, para Andrade então, a fim que um
princípio seja elemento essencial de um sistema ele deve ter: “presença ininterrupta
ao longo de todo processo” (ANDRADE, 2013, p.147-158).
O princípio da publicidade também é citado pela maioria dos autores como decorrente
do sistema acusatório.
É evidente que esse vínculo entre publicidade e sistema acusatório é fruto das
manifestações históricas dos modelos processuais, ora, o próprio surgimento dos
tribunais populares, que eram realizados em público, do direito ateniense e romano
remontam ao sistema acusatório, e ao contrário, no inquisitivo que atingiu seu auge
22
Não obstante, Andrade (2013) reforça seu entendimento com amparo nas
manifestações históricas, já que, o sigilo esteve presente em épocas acusatórias,
assim como a publicidade se fez presente em determinados momentos da inquisição.
Outras características são citadas pelos autores, mas não detém maioria, como, por
exemplo: oralidade, sistema de livre convencimento de juiz na análise das provas,
coisa julgada, presunção de inocência, entre outras.
Portanto, são citados pela maioria da doutrina como elementos do sistema acusatório:
c) Contraditório;
d) Afastamento do juiz da atividade probatória (sem considerar o grau de
afastamento);
e) Publicidade, admitindo amplas ressalvas.
Para Andrade (2013), qualquer outro elemento associado ao sistema acusatório, não
passa de elemento variável e que poderia estar presente em qualquer dos outros
sistemas processuais penais.
Os elementos propostos por Andrade (2013), são citados por todos os autores
analisados e, portanto, parece-nos serem os elementos fundantes essenciais do
sistema acusatório.
Concluindo, é possível verificar consenso total entre os autores quanto aos elementos
apontados por Andrade (2013), sendo considerados verdadeitos pilares do sistema
acusatório.
Enfim, a justiça no Direito Feudal nada mais era que a “continuação da guerra
regulamentada e ritualizada” (FOUCAULT, 2012, p.66)
Quando os feudos mais militarizados começam a submeter outros a seu poder, por
meio da força ou de acordos – com apoio da já muito influente igreja católica, que
legitimava as submissões, por ser a instituição que gozava de maior prestígio naquela
época, de modo que exercia controle quase integral na sociedade e detinha o
monopólio cultural e ideológico (PEDROSA, 2010).
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Portanto, servia a igreja de base para a concentração do poder absoluto nas mãos
dos “enviados de Deus” – os monarcas -, e usava a estrutura militar do estado a fim
de proteger a igreja de seus “inimigos” – os hereges.
Desse modo, entre os séculos XII e XIII, o poder da igreja atingiu seu ponto máximo,
porquanto ela coroava os reis com sua benção e podia, ainda, excomumgá-los
(WOLKMER, 2006).
Assim, em 1215 a Igreja proíbe a partição dos clérigos nos procedimentos que
apelavam a manifestação divina para o estabelecimento ou não da culpa, E passou a
adotar o novo sistema inquisitorial, que aumentou a eficiência no combate às heresias
e facilitou o julgamento de todos os crimes (WOLKMER,2006).
Em 1223 foi criado o Tribunal do Santo Ofício, a partir desse momento, o procedimento
inquisitorial foi consolidado por toda Europa Continental, considerado um período
extremamente brutal e desumano da história ocidental (PEDROSA,2010).
O início do processo poderia se dar de oficio, ou por qualquer tipo de boato ou rumores
públicos, conhecidos como notitia criminis. O medo imposto pelos inquisidores e pelo
monopólio ideológico da igreja, que espalhava a existência de seitas satânicas,
bruxarias e etc, fazia com que as pessoas denunciassem as heresias, havia nas
igrejas urnas para que se realizassem denúncias anônimas (PRADO,1999).
O acusado, não mais sujeito, e sim objeto do processo, era chamado a dar seu
testemunho, sob pena de coação, segundo Geraldo Prado (1999), a prisão durante o
processo era regra, já que, era forte a tese de que todo o acusado solto traria
obstáculos à investigação.
Apesar da ampla maioria da doutrina destacar que a prisão durante o processo era
regra, Mauro Fonseca Andrade (2013, p. 292) realizando uma análise dos Manuais
da Inquisição diz haver um erro nessa afirmação, haja vista que, houve períodos em
que era necessário provar dois requisitos: a grave suspeita de práticas de heresia e o
perigo de fuga do imputado. Requisitos muito próximos da atual conjuntura
processual.
O processo corria todo em segredo, o acusado, por vezes, não conhecia o conteúdo
da acusação e em decorrência disso, era escrito, portanto a oitiva de testemunhas e
do ofendido eram feitas às escuras (LOPES JR., 2012).
“Um suspeito podia ser preso a qualquer momento, sem saber o que
se queria dele. Nunca ficava conhecendo o nome de quem o acusou,
nem lhe era comunicado o motivo da prisão, nem o lugar em que havia
cometido o crime de que era acusado, nem com quem havia pecado”
(WOLKMER, 2006, p.250)
27
Ademais, alguns crimes, só admitiam provas obtidas pela confissão, exemplo dado
por WOLKMER (2006) dos crimes de bruxaria – invocação de tempestades, rituais
ocultos, pragas, satanismo -, que eram “crimes ocultos”, só poderiam ser descobertos,
via de regra, por meio da confissão. Diante desse protagonismo, buscava-se a
confissão a qualquer custo, daí decorre a utilização da tortura, autorizada oficialmente
como método inquisitório por Inocêncio IV, em 1252 (PEDROSA, 2010).
O uso da tortura tornou-se tão intenso, cruel, que quase todos confessavam os delitos,
o índice de condenação chegava a 95%, ou seja, diante da situação extremamente
aflituosa que eram submetidos os acusados, por vezes, confessavam simplesmente
para que aquele momento cessasse. Os métodos de tortura eram dos mais variados
a depender do delito sob investigação, Wolkmer (2006 p.250) ilustra alguns desses
métodos:
Foucault (2012) ilustra, outro motivo, além da dominação religiosa, que impulsionou a
adoção do sistema inquisitivo pelos soberanos: com o surgimento dos monarcas, e a
realidade de que a dominação era exercida com base na força, na concentração de
armas nas mãos do soberano, tem-se a primeira ideia de infração (o dano que antes
ofendia apenas um indivíduo passa, também, a ofender o próprio estado, o monarca
e a soberania).
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Além disso, a inquisição, apesar de vista com grandes reservas devido as atrocidades
cometidas, foi importante marco para dar fim a irracionalidade do sistema anterior que
determinava culpa com métodos de prova descolados da realidade, como ensina
Geraldo Prado (1999, p.89) :
Com avanço das ciências humanas, vários foram os trabalhos científicos que
questionaram os saberes da igreja, a própria existência de Deus passa a ser objeto
de questionamento. Com efeito, a jurisprudência e a atividade legislativa francesa
começaram a refletir a mudança de ares. A medicina já questionava a feitiçaria
atribuindo algumas “evidências” a doenças. Nos tribunais, passava-se a dificultar o
processamento dos crimes de bruxaria, restringiam-se as denúncias anônimas como
forma de iniciar o processo. Foi, em 1624, criado uma espécie de remessa necessária
aos tribunais superiores com relação aos crimes hereges e, em 1682, decreto real não
elencava bruxaria como crime. Iniciado, portanto, o processo de separação entre
crime e pecado (PEDROSA, 2010).
Concluindo, são, pois, elementos essenciais do sistema inquisitivo, para Aury Lopes
Junior (2012, p.38):
Para, Mauro Fonseca de Andrade (2013), utilizando de método mais fiel à história dos
sistemas os elementos fundantes do sistema acusatório são:
a) Prescindibilidade de acusação e,
b) O processo pode iniciar-se de oficio.
Não obstante essa obstrução conceitual, há uma unidade entre os autores na eleição
do processo penal que “representa” o sistema misto, o processo penal adotado na
França em 1808, instituído pelo Code d’Instruction Criminelle, que foi fruto dos defeitos
apresentados pelo acusatório e as atrocidades resultantes do inquisitivo (RANGEL,
2015).
Na primeira fase, poderia ser iniciada ex officio, era realizada uma colheita de provas
sem contraditório e ampla defesa, sigilosa, escrita, e dirigida por um juiz de instrução,
predominava as características de um processo inquisitivo - chamada de juizado de
instrução em alguns países. Finalizada a primeira fase, a segunda apenas iniciava-se
com a propositura da acusação proposta por alguém diferente do julgador, a partir daí
havia o processo dialético, contraditório com ampla defesa (LIMA, 2016).
Para Aury Lopes Jr. (2012) o processo Francês apenas dividiu o as funções
investigativas e a fase judicial, no mais, manteve o núcleo inquisitório do sistema
(como vimos, para o autor, o processo em que o juiz que tem poder buscar e produzir
prova ex officio é fundamentalmente inquisitivo) o que por certo macula a “suposta
fase acusatória”. Ademais refere-se à classificação de misto como uma falácia, que
mascara seu real caráter inquisitivo, e ainda explica:
Com o posicionamento parecido encontramos Nucci (2014), o autor ensina que quase
todos os sistemas atuais são mistos, é que não há manifestações dos sistemas
clássicos na sua forma pura. O que deve ser avaliado é a predominância de cada
princípio – acusatório ou inquisitivo. No mesmo sentido, Gustavo Badaró (2015, p.87):
Dos autores que reconhecem a existência do sistema misto, quase não listam
características essenciais, mas é possível perceber certos aspectos podem nos ajudar
a diferenciar esse sistema – quando houver referência especifica a ele - dos outros,
por exemplo:
Para Andrade (2013) grande diferencial desse sistema é que a fase investigativa dá
início ao processo jurisdicional, por isso, o processo inicia-se com o juizado de
instrução, sendo a segunda fase, apenas continuação. Ademais ao autor, ensina que
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Todavia, o constituinte não facilitou essa tarefa, porquanto, não fez sua escolha de
maneira expressa, como fez o de Portugal, que explicitamente adota o sistema
acusatório:
Desse modo, cabe aos juristas extraírem do texto constitucional os elementos que
indiquem qual sistema processual penal eleito.
O dispositivo mais citado para dar base aos autores é o art. 129 no seu inciso I:
Esse inciso, em tese, perfaz duas características apontadas pelos autores, vistas no
capitulo do sistema acusatório, a separação inicial de funções e a de que o juiz não
pode iniciar o processo de oficio, necessitando de uma acusação para tal.
Outro argumento que é usado pela doutrina é a vinculação imperativa entre um regime
democrático e o sistema acusatório, essa posição tem como base fundante a ideia já
exposta no Capitulo 1, que coloca o processo penal como o produto da distribuição
dos poderes em determinado ordenamento jurídico (BADARÓ, 2015), desse modo,
sendo a democracia um regime que deve atender à vontade popular, garantidor de
direitos individuais ao cidadão frente ao Estado, assegurando, principalmente, as
liberdades públicas, os autores concluem ser a sistemática acusatória a mais
adequada, Geraldo Prado (1999, p.363), expõem de forma clara essa linha de
raciocínio:
Essa corrente ganha força também ante a ideia de que o sistema inquisitivo é sempre
posto em prática por governos tirânicos, totalitários e é considerado o sistema
diametralmente oposto ao acusatório, assim, é fácil concluir que sistemas de governos
democráticos tendem a estabelecer o processo penal de forma igualmente contrária,
logo, o acusatório (LOPES JR., 2012).
E vários outros que abrem espaço para juiz, dessa vez, na fase processual, trazer ao
processo elementos de prova sem a provocação das partes, por exemplo:
A primeira posição a ser tratada é aquela que defende um total afastamento do juiz
da atividade probatória, representada, principalmente por Aury Lopes Junior (2012), o
autor defende que a gestão da prova é o núcleo do sistema acusatório, desse modo,
não basta tão somente que determinado ordenamento jurídico separe as funções de
acusar e julgar, deve obrigatoriamente afastar por completo o juiz da atividade das
partes, assim, deve-se ter, nessa sistemática, um “juiz-espectador”, que caminha
longe da atividade das partes durante todo o processo.
lógica dessa separação é as atividades das partes bem definida (estrutura dialética) e
uma juiz distante delas e, mais importante, a imparcialidade do estado-juiz (ao qual se
refere com princípio supremo do processo). No entanto, a partir do momento em que
um magistrado resolve de oficio buscar elementos para formação de seu juízo, tem-
se, além da invasão de funções originariamente das partes, a quebra da
imparcialidade, agora, o julgador escolheu uma tese e buscará elementos para
apenas justificar o pré-julgamento já realizado mentalmente por ele, desse modo, cria-
se um “quadro paranoico” no qual o “juiz primeiro decide e depois vai atrás dos fatos
que justificam sua decisão” (LOPES JR., 2012, p. 138)
Por conseguinte, Aury Lopes (2012) defende um processo privalístico, no qual o juiz
fica limitado a decidir com arcabouço probatório juntado exclusivamente pelas partes,
em que o interesse das partes sobrepõe o interesse público (outra expressão bastante
criticada pelo autor).
Como foi visto, o monopólio das partes na produção de prova é o grande problema
desse modelo proposto pelo autor, ele inclusive o reconhece, e aponta como possíveis
meios de tentar atenuar o problema o aumento do grau de tecnicidade das partes, e
também, o oferecimento de defesa bem preparada aos cidadãos que não tem
condições de pagar os elevados honorários advocatícios – tão bem organizado quanto
o órgão público acusador, o Ministério Público –, entretanto, entende tratar-se de mal
necessário ao processo democrático sob argumento de que não há sistemas perfeitos,
e que as tentativas de corrigir o vício desaguaram em sistemas inquisitivos.
A posição de Paulo Rangel (2015) milita no mesmo sentido, o autor também entende
que a atuação ex officio do juiz na busca de material probatório jamais pode ocorrer
na fase de persecução penal pré-processual – a investigação preliminar – haja vista
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não está cessada ainda a inercia judicial, de tal modo, essa atuação quebra a
imparcialidade do magistrado e, por isso, é contrária à sistemática acusatória.
Portanto, o autor trata com repúdio a atuação do juiz na fase pré-processual.
Rangel (2015, p.11) expõe bem sua posição, na mesma linha de raciocínio do pré-
julgamento realizado pelo juiz-ator de Aury Lopes Jr (2012), quando comenta sobre o
art. 156 do Código de Processo Penal:
O art. 156 [...] incidiu no mesmo erro anterior: colocando o juiz no papel
de investigador, descendo do seu lugar supra partes (distante dos
interesses das partes), para procurar aquilo que acha que é a verdade,
ou que ele quer que seja a verdade. Trata-se do juiz inquisidor. Do juiz
que, ao interrogar, já sabe o que vai fazer: condenar ou absolver.
Por fim trataremos daqueles que enxergam a compatibilidade do agir de oficio do juiz
na atividade probatória sem afetar o núcleo do sistema acusatório são eles: Badaró
(2015), Távora e Alencar (2017), Ada Pellegrini Grinover (2002) e Mauro Fonseca de
Andrade (2013).
Fica implícito que Badaró (2015) rejeita o agir ex officio do juiz na fase pré-processual,
porque, nesse caso, estará buscando provas.
Quanto à fase instrutória, o juiz não deve se tornar um investigador, mas pode trazer
aos autos fonte de provas que tomou conhecimento durante as audiências por
exemplo, fazendo-o assim, preserva sua imparcialidade.
Assim, tomando conhecimento, por meio das audiências, de uma pessoa que
presenciou o fato, pode o magistrado trazer essa pessoa para o processo pelo
testemunho (meio de prova), mantendo intacta sua imparcialidade, haja vista que ”o
resultado dessa produção de prova pode ser em sentido negativo ou positivo quanto
à ocorrência do fato” (BADARÓ, 2015, p. 90).
Conclui, admitindo que o atuar de oficio do juiz nesse escopo é historicamente ligado
à inquisição, porém, a atividade ex officio em caráter subsidiário ou suplementar não
prejudica o moderno processo acusatório.
Távora e Alencar (2017) colocam a questão da gestão da prova nas mãos do juiz
orbitando sempre um princípio: a busca da verdade real (principio criticado
fervorosamente por Paccelli (2017) e Aury Lopes Jr (2012), como vimos). No processo
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penal como os bens em jogo são indisponíveis, deve-se ao máximo buscar a verdade
dos fatos, aquilo que no mundo fático ocorreu.
Todavia, por considerarem essa verdade algo, por vezes, inalcançável no seio
processual, os autores propõem uma aproximação da verdade dos autos (verdade
processual, aquela compreendida com a análise das provas colacionadas no
processo) com a busca da verdade material limitada pelo direito posto.
Portanto, a busca da verdade real autorizaria o juiz atuar de forma supletiva às partes,
como forma de “consolidar a dinâmica de seu convencimento” (TAVORA e ALENCAR,
2017, p. 653) sem cruzar os limites da legalidade, por conseguinte, nunca substituir
por completo a atuação dos polos processuais, construindo sozinho o arcabouço
probatório, se o fizer, desconstrói sua imparcialidade e vai de encontro ao sistema
acusatório, e conclui que:
O tênue limite entre a busca da verdade e a fronteira de resguardo ao
sistema acusatório e a repartição de poderes deve ser reavivado, a fim
de evitar arbítrios e impedir que a prova produzida pelo juiz que perdeu
os limites da fronteira, venha transmudar-se em prova ilícita (TAVORA
e ALENCAR, 2017, p. 654)
Ou seja, o juiz pode atuar, mas de forma suplementar as partes, sanando eventuais
deficiências probatórias a fim de perseguir a verdade material dentro dos ditames
legais.
Para Ada Pellegrini Grinover (2002) e Mauro Fonseca de Andrade (2013), devemos
ter em mente que o núcleo do sistema acusatório é a separações de funções, mas no
sentido de que se deve ter um órgão diferente do julgador para acusar e o processo
apenas se iniciar com o oferecimento de uma acusação proposta por este. Isso que
funda o acusatório.
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Há, na visão desses autores, dois modelos de gestão de prova dentro do sistema
acusatório o adversarial system e o inquisitorial system (que apesar do nome não tem
relação com sistema inquisitivo).
O juiz, segundo Grinover (2002, p.18) deve ao máximo aproximar da verdade porque:
Parece-nos que o grande cerne da questão é como eles veem a função do processo.
Aqueles que consideram a função principal do processo a garantia de direitos,
advogam um juiz totalmente afastado da atividade probatória, mesmo que para isso,
deve ficar limitado à atuação deficiente das partes e os problemas decorrentes de tal
situação.
Por outro lado, a doutrina que permite um juiz ativo na busca por provas, consideram
que a função do processo penal é fazer cumprir a lei aplicando o direito material, ou
seja, predomina-se o interesse público, sustentado principalmente no princípio da
verdade real, negando que o juiz perca sua imparcialidade quando não se encontra
satisfeito com o material colacionado pelas partes. Mas há que se destacar: todos
colocam limite nessa atividade, e apregoam que se ultrapassados, derruba-se o
sistema acusatório.
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6. CONCLUSÃO
Foi possível identificar que para cada sistema há uma característica que doutrina
considera inafastável é que foi citado por todos os autores analisados:
Porém, apesar da falta de unidade quanto a esses elementos, com a análise, permitiu
concluir que todos os autores analisados no presente trabalho chegam a um só
resultado: o sistema processual adotado pela Lei Maior é o acusatório.
Por fim, foi possível verificar um debate com posições bastante divergentes quanto a
relação sistema acusatório e juiz com poderes instrutórios, aqui, não há maiorias cada
autor parece dar seu ponto de vista, e a conclusão de cada um deles acaba
encontrando raiz em o que cada autor entender ser a função principal do processo e,
por consequência, qual interesse deve predominar: o público – permitindo um juiz
ativo, na busca pela aplicação correta do direito, ou o privado – que coloca o direito
individual, a tutela do acusado como fim principal do processo, afastando o juiz da
atividade das partes.
Quanto ao último tema não foi possível chegar a uma conclusão exaustiva sobre a
constitucionalidade ou não da gestão da prova nas mãos do juiz, todavia, o
entendimento dos autores analisados segue o mesmo rumo nos seguintes aspectos:
Desse modo, esse resultado da pesquisa, nos permite afirmar que qualquer
dispositivo que permite o juiz atuar de oficio na investigação preliminar deve ser
declarado não recepcionado pela Carta Magna, por não se compatibilizar à
sistemática acusatória. E o legislador brasileiro deveria estabelecer limites claros aos
poderes instrutórios do juiz quando já iniciado o processo e não dar permissivo de
maneira genérica, sob pena de abrir espaço para juízes inquisidores, devendo
também os tribunais atuarem no sentindo de proteger o texto constitucional repelindo
eventuais abusos de poder perpetrados por magistrados. Agindo assim assegura-se,
pois, a efetividade da Constituição Federal.
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REFERÊNCIAS
PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2017.
PALMA, Rodrigo Freitas. História do Direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
PEDROSA, Ronaldo Leite. Direito em história. 6. ed. Rio de Janeiro: [s.n.], 2010.
PISAPIA, Glan Domenico. Appunti di Procedura Penale. [S.l.]: La Goliardica, 1971.
PORTUGAL. Constituição da República Portuguesa, Lisboa, PT, 2 abr 1976.
PRADO, Geraldo. Sistema acusatório: a conformidade constitucional das leis
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