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ARCADISMO NO BRASIL

ORIGEM
Das correntes artísticas do século XVIII, a que se difundiu com mais vigor no Brasil foi o Arcadismo. A palavra
?Arcadismo? Deriva da Arcádia, na Grécia antiga. Originalmente uma região onde se praticavam atividades
pastoris, a Arcádia passou a ser cantada na poesia como um lugar idílico, um espaço privilegiado em que
pastores-poetas dedicavam-se à criação de seus rebanhos e também às artes da palavra: andariam pelos campos
tocando sua lira ou flauta, cantando em versos seus amores e saudades.

CONTEXTO HISTÓRICO

O eixo do Brasil colônia se deslocara do nordeste para a região centro-sul ? Rio de Janeiro e, especialmente, Vila
Rica, atual cidade mineira de Ouro Preto. Esse deslocamento deu-se com o declínio da produção açucareira no
Nordeste e ao desenvolvimento do ouro e do diamante em Minas Gerais. Essa intensa atividade econômica deu
ensejo ao aparecimento da vida urbana. Os poetas árcades brasileiros estudaram em Portugal e de lá trouxeram
ideais libertários que fervilhavam pela Europa inteira. Alguns desses poetas viriam a participar da Inconfidência
Mineira.

CARACTERÍSTICAS GERAIS DO ARCADISMO BRASILEIRO

O Arcadismo foi um movimento de insubordinação ao Barroco decadente. O restabelecimento da simplicidade e


do equilíbrio da poesia clássica. Por isso o arcadismo também é chamado de neoclassicismo.
Pastoralismo é a doutrina que defende que o homem é puro e feliz quando integrado na natureza.
Bucolismo é o gosto pela vida dos pastores, campos e atividades pastoris, é reviver a Arcádia. A poesia só é
verdadeira se referenciada à natureza. Por isso, é que esta aparece com frequência idealizada e deslocada.
Nativismo é a exploração de paisagens e atividades brasileiras. Notadamente em Gonzaga, Basílio e Durão.
Subjetividade é a expressão de sentimentos íntimos e estados de espírito melancólicos e mórbidos, aflorando a
sentimentalidade e os dramas individuais. Exploração satírica da realidade burguesa, incorporando elementos do
cotidiano mais imediato.

POETAS DO ARCADISMO BRASILEIRO

TOMÁS ANTONIO GONZAGA (DIRCEU)

Nasceu no Porto, em 1744.Exerceu cargo de jurisdição em Vila Rica (atual Ouro Preto), capital da capitania de
Minas Gerais.Aí começou sua amizade com Cláudio Manuel da Costa e sue romance com Maria Joaquina Dorotéia
de Seixas, que passaria a ser identificada com A Marília de seus poemas. Foi denunciado como conspirador na
Inconfidência Mineira: preso, foi degredado para Moçambique, onde morreu. Escreveu As Liras de Marília de
Dirceu, poemas centrados no tema de amor do pastor Dirceu pela jovem Marília. A Marília de Dirceu apresenta
basicamente duas partes: a primeira pode ser identificada com o período de conquista amorosa e namoro; a
segunda pertence à fase da prisão do poeta. Escreveu também Cartas Chilenas, um longo poema satírico que faz
uma crítica ao então gove5rnador da capitania, Luis da Cunha Meneses.

CLÁUDIO MAUEL DA COSTA (Glauceste Satúrnio)

Nasceu em Mariana, MG, estudou no Rio de Janeiro e em Coimbra. Em 1768, publicou Obras, livro de poemas
considerado o marco inicial do Arcadismo brasileiro. Envolveu-se com a Inconfidência Mineira, submetido a
interrogatório, fez declarações que comprometiam seus amigos, entre eles Tomás Antônio Gonzaga. Preso e
deprimido, suicidou-se na prisão. A poesia lírica é a parte mais representativa de sua obra, principalmente os
sonetos. Produziu o poema épico, Vila Rica, publicado somente em 1839.

JOSÉ BASÍLIO DA GAMA (Termindo Sipílio)

Mineiro, nascido em Tiradentes, o ponto mais alto de sua obra foi o poema épico O Uraguai que celebrava a
vitória militar de Gomes Freire de Andrade, comissário real, contra os índios da Colônia dos Sete Povos das
Missões do Uruguai> Localizadas a leste do Uruguai, em região hoje pertencente ao estado do Rio Grande do Sul.
FREI JOSÉ DE SANTA RITA DURÃO

Mineiro de Mariana, Minas Gerais. Sua obra consiste basicamente no Caramuru, poema épico do descobrimento
da Bahia, que narra às aventuras de Diogo Álvares Correia, náufrago português que, salvo da antropofagia graças
a um disparo de sua arma, passou a viver entre os índios e exerceu importante papel na colonização das terras
baianas.

Com o que ficar atento? O Arcadismo brasileiro rompe com a tradição bucólica europeia, colocando na ordem do
dia a cor local e o sentimento nativista. Além disso, a proximidade dos poetas árcades com a Inconfidência
Mineira os insere em um contexto histórico que não pode ser desprezado por quem pretende compreender o
Brasil do século 18.
Como pode cair no vestibular? Uma tendência dos vestibulares é cobrar características próprias do arcadismo
brasileiro - como a paisagem e realidade concretas aliadas à natureza humanizada, em que a paisagem ganha
vida.
Como já caiu no vestibular?

1. (UFRS – RS) Assinale a alternativa correta em relação a Marília de Dirceu, de Tomás Antonio Gonzaga.

a) No livro, é estabelecido um contraste entre a paisagem, bucólica e amena, e o cenário da masmorra,


opressivo e triste.
b) Trata-se de um conjunto de cartas de amor, enviadas por Marília, de Minas Gerais, a Dirceu, que se
encontra em Moçambique.
c) Na obra, o pensamento racional é anulado em favor do sentimentalismo romântico.
d) Nas liras de Gonzaga, Marília é uma mulher irreal, incorpórea, imaginada pelo pastor Dirceu.
e) Trata-se de um livro satírico, carregado de termos pejorativos em relação às convenções da época.

GABARITO
1. Resposta correta: A
Comentário: O poeta dedica a primeira parte de Marília de Dirceu à descrição de sua musa pastora idealizada e a
segunda parte, ao relato de seus infortúnios no cárcere.
Poema Ismália do escritor Alphonsus de Guimaraens (Poeta Simbolista)

O poema Ismália pode significar a própria figura do poeta: sonhador, imaginativo, inofensivo aos outros,
ainda que às vezes não a si mesmo, visto que Ismália caiu no mar. A comparação da personagem com um anjo: “E
como um anjo pendeu”, fortalece mais ainda a ideia da não agressividade e até mesmo da beleza. Na tradição
poética, a figura do anjo comparada à mulher, sugere perfeição física, moral, inocência e pureza. O tom
suavemente trágico, melancólico do poema, também se traduz na revelação de que Ismália, “anjo”, se suicida, ou
melhor, tira a própria vida sem perceber. Observa-se que não há pontos de exclamação em todo o poema, com
isso, repisa-se a melancolia trágica, a beleza triste dos versos através da pontuação, onde se ver a todo o
momento o uso das reticências, sugerindo a interrupção do pensamento, hesitação, dubiedade.
A loucura da figura feminina é tratada poeticamente, a morte nem parece real, acontece como em
sonho e a linguagem transmite a mesma tristeza vaga e persistente. Não há violência explícita ou desespero, mas
uma tristeza suave, como se o próprio destino (loucura e morte) invocasse uma espécie de delicadeza, com a qual
é tratada a figura feminina por grande parte da tradição poética. Metaforicamente, o poema pode expressar
entre o divino (céu) e o humano (mar); a vida espiritual e a vida carnal; a vida extraordinária ou poética e a vida
habitual. Sendo assim, o desejo da vida “maior” (a lua do céu) e o reconhecimento das necessidades trazidas pela
vida “menor” (a lua do mar) leva à morte da personagem, sendo destruído pelo conflito entre ambas. Mas o
poema pode trazer ainda, desde a 1ª estrofe, quando fica claro que a “lua” do mar é reflexo da lua do “céu”, a
concepção de que o conflito entre elas, só acontece devido ao equívoco humano.
A lua do céu se reflete no mar, criando outra lua, no entanto, trata-se da mesma. A vida espiritual,
poética, a vida “maior” está atrelada à vida carnal, comum, “menor”. Com base nesta visão, Ismália seria um de
nós, quando não enxergamos a grandiosidade nos fatos comuns, quando não percebemos que no dia-a-dia mais
simples, existe poesia.
Poema do gênero épico, de autoria de um dos representantes do Simbolismo, movimento este, que
surgiu com vistas à renovação e atualização dos paradigmas literários; todo ele é construído com base em
antíteses, articulando-se ao redor dos desejos de Ismália, que se dividem entre realidade concreta e realidade
espiritual. Formado por cinco quadras, com rimas ricas e alternadas, escrito em sete sílabas fonéticas, ou seja, um
heptassilábico ou redondilha maior, construindo sons agradáveis e paralelismos constantes. Percebe-se a
presença de aliteração em d e s, e assonância em e e a. Em relação ao aspecto gráfico, encontra-se nas primeiras
quatro estrofes, sempre nos versos três e quatro, um verbo que se repete: viu/viu; queria/queria; estava/estava;
queria/queria. Tal repetição se dá, para acentuar ideias contrastantes, assim como, a oposição céu/mar é
constante nas cinco estrofes.
O conto Obscenidades para uma dona-de-casa, de Ignácio de Loyola Brandão, nos apresenta duas
vertentes: a repugnância em relação aos conteúdos descritos nas cartas, o receio do esposo, da família e
sociedade descobrirem seus reais desejos; em contrapartida, o prazer que a personagem sente com o conteúdo
erótico. Percebe-se que o relacionamento conjugal da protagonista não supre suas necessidades sexuais, sendo
assim, busca outros meios, fantasias de liberdade, para satisfazerem seus desejos mais profundos. A personagem
brinca com o imaginário, consigo mesma, transformando a própria existência em mera fantasia, o que lhe traz
muito entusiasmo.
No desenrolar do conto, destaca-se uma mulher organizada, que estabelece um esquema de vida nunca
desobedecido, se algo de anormal acontecesse, seria motivo de sofrimento e depressão. A dona-de-casa recebe
cartas com pequenas frases sugerindo seu relacionamento amoroso com um homem desconhecido. Essas cartas
são recebidas com muita euforia. Enquanto espera a carta do dia, ela se questiona se está ou não traindo seu
marido, ao mesmo tempo em que recorda as cartas anteriores. O certo é que, ela é uma mulher enrustida,
frustrada por não conseguir fazer com o marido tudo o que se descreve nas cartas. Fora criada de maneira
tradicional para manter a compostura e aparentemente sente aversão a palavras e atos relacionados ao sexo.
Essas lembranças deixam o leitor a par de sua educação, de suas crenças, de seus valores levando-o a
compreender o impasse que a figura dramática está vivendo, presa ao tradicionalismo e às supostas regras de
uma mulher pudica.
Geralmente, caracteriza-se o conto, por apresentar um enredo cuja estrutura contém apresentação,
complicação, clímax e desfecho. Neste conto, apresenta-se uma narrativa em prosa, concentrada em primeira
pessoa, em que o eu lírico dispensa as análises minuciosas de personagens ou ambiente, assim como as
complicações de enredo, e delimita o espaço e o tempo. Refere-se aos anos oitenta e está classificado na ala dos
roteiros do corpo. Apela para a trama e trata especificamente de uma determinada situação, acompanhando o
seu desenrolar, levando o autor ao desfecho, que coincide com o clímax da história, onde se descobre a autoria
das correspondências e o drama vivido pela protagonista.
OS SERTÓES

Obra publicada em 1902 por Euclides da Cunha, Os Sertões é um misto de literatura com relato histórico e
jornalístico. É uma resposta realista e pessimista à visão ufanista do Brasil, simbolizada pela obra do Conde
Afonso Celso Porque me Ufano do Meu País. Em 1897,Euclides da Cunha havia sido enviado pelo jornal O
Estado de S. Paulo, como correspondente, ao norte da Bahia para fazer a cobertura do conflito no arraial de
Canudos, liderado por Antônio Conselheiro. Com base no que viu e no que pesquisou depois, escreveu seu livro.

CIÊNCIA LITERÁRIA

Dividido em três partes – A Terra, O Homem e A Luta –, o livro ganhou status de obra literária em virtude do estilo
apurado e impecável de Euclides da Cunha.

A primeira parte, A Terra, pode ser vista como um estudo geográfico escrito em forma literária. Seguindo os
princípios positivistas, o autor descreve de forma minuciosa as características do meio sertanejo. Ao traçar a rota
do sudeste, partindo do litoral em direção ao sertão,Euclides da Cunha, com olhar científico, leva o leitor por
um árido percurso descritivo.

O vocabulário técnico empregado afastaria essa narrativa da conceituação clássica de literatura. Porém, o estilo
empregado pelo narrador dá à obra um ritmo peculiar. Isso se deve à cadência formal (representada pelas
construções sintáticas), que imita o movimento de entrada no sertão. Dessa forma, percebe-se uma preocupação
estética: o narrador busca, no plano da forma, reproduzir, ou imitar, o conteúdo do texto.

Se a primeira parte se aproxima do estudo geográfico, a segunda (O Homem) pode ser confundida com um texto
antropológico. De acordo com a estética naturalista, fortemente amparada pela filosofia de Taine – na qual o
homem é determinado pela tríade meio/raça/história –, essa parte representa o aprofundamento de análise da
raça sertaneja.

A Luta, terceira parte do livro, narra a batalha entre o litoral desenvolvido e o interior atrasado. A
princípio, Euclides da Cunha, que compartilha as ideias do povo litorâneo, enxerga os acontecimentos no arraial
de Canudos como uma revolta. No decorrer da narrativa, porém, essa posição se altera gradativamente até a
compreensão de que os sertanejos constituíam um povo isolado e, por isso, homogêneo.

Essa homogeneidade se deve a um isolamento histórico provocado pelo esquecimento civilizatório, que os
manteve distantes do desenvolvimento litorâneo.

ENREDO
A TERRA – De um ponto de vista privilegiado, elevado, o narrador inicia uma série de descrições que, como foi
dito, se aproximam de uma tese científica. Passando seu olhar arguto por análises biológicas, climáticas e
geográficas, ele descobre o espaço do sertão. Começa pelo planalto central e chega até o norte da Bahia, no
arraial de Canudos.

Nessa descrição, Euclides da Cunha estuda de maneira detalhada o meio que determinou a formação do
homem sertanejo. Isso serve de ratificação da teoria determinista, muito em voga na época, que postulava a
determinação do meio sobre o homem.

O seguinte trecho é bastante ilustrativo, tanto do ponto de vista formal quanto do metodológico, dessa primeira
parte do livro:

“Do alto da Serra de Monte Santo atentando-se para a região, estendida em torno num raio de quinze léguas,
nota-se, como num mapa em relevo, a sua conformação orográfica. E vê-se que as cordas de serras, ao invés de se
alongarem para o nascente, medianas aos traçados do Vaza- Barris e Itapicuru, formandolhes o divortium
aquarum, progridem para o norte. Mostram-no as serras Grande e do Atanásio, correndo, e a princípio distintas,
uma para NO e outra para N e fundindo-se na do Acaru, onde abrolham os mananciais intermitentes do Bendegó
e seus tributários efêmeros. Unificadas, aliam-se às de Caraíbas e do Lopes e nestas de novo se embebem,
formando-se as massas do Cambaio, de onde irradiam as pequenas cadeias do Coxomongó e Calumbi, e para o
noroeste os píncaros torreantes do Caipã. Obediente à mesma tendência, a do Aracati, lançando-se a NO, à borda
dos tabuleiros de Jeremoabo, progride, descontínua, naquele rumo e, depois de entalhada pelo Vaza- Barris em
Cocorobó, inflete para o poente, repartindo-se nas da Canabrava e Poço-de-Cima, que a prolongam. Todas
traçam, afinal, uma elítica curva fechada ao sul por um morro, o da Favela, em torno de larga planura ondeante
onde se erigia o arraial de Canudos – e daí para o norte, de novo se dispersam e descaem até acabarem em
chapadas altas à borda do S. Francisco.”

O HOMEM – Partindo de uma análise da gênese antropológica das raças formadoras do homem brasileiro, o
narrador decreta a impossibilidade de unidade racial, ou seja, no Brasil seria impossível termos uma raça
homogênea.
Porém, devido ao isolamento dos paulistas desbravadores que se tornaram vaqueiros do São Francisco, pode-se
dizer que se criou nesse povo certa homogeneidade.
O narrador discorre, também, sobre as tradições sertanejas dos vaqueiros, descrevendo com minúcias seu modo
de vida.
Em virtude de fazer parte de uma família cearense que se envolvera em querelas na região, além de ter perdido
sua mulher para um policial, Antônio Conselheiro embrenhou-se pelo sertão sem rumo certo, peregrinando pelas
cidades. Ele tinha uma imagem messiânica, profética: trajava roupão azul, com uma cabeleira por cortar e
desgrenhada, carregando um bastão. Essa imagem favoreceu sua associação com uma figura mística, que serviu
como uma luva para o povo fanático e desvalido. A formação do povo brasileiro é assim descrita por Euclides da
Cunha:

“Conhecemos, deste modo, os três elementos essenciais, e, imperfeitamente embora, o meio físico diferenciador –
e ainda, sob todas as suas formas, as condições históricas adversas ou favoráveis que sobre eles reagiram. No
considerar, porém, todas as alternativas e todas as fases intermédias desse entrelaçamento de tipos
antropológicos de graus díspares nos atributos físicos e psíquicos, sob os influxos de um meio variável, capaz de
diversos climas, tendo discordantes aspectos e opostas condições de vida, pode afirmar-se que pouco nos temos
avantajado. Escrevemos todas as variáveis de uma fórmula intricada, traduzindo sério problema; mas não
desvendamos todas as incógnitas.
É que, evidentemente, não basta, para o nosso caso, que postos uns diante de outros o negro banto, o indo-
guarani e o branco, apliquemos ao conjunto a lei antropológica de Broca. Esta é abstrata e irredutível. Não nos diz
quais os reagentes que podem atenuar o influxo da raça mais numerosa ou mais forte, e causas que o extingam
ou atenuem quando ao contrário da combinação binária, que pressupõe, despontam três fatores diversos,
adstritos às vicissitudes da história e dos climas. É uma regra que nos orienta apenas no indagarmos a verdade.
Modifica-se, como todas as leis, à pressão dos dados objetivos. Mas ainda quando por extravagante indisciplina
mental alguém tentasse aplicá-la, de todo despeada da intervenção daqueles, não simplificaria o problema.”

A LUTA – O conflito de Canudos surgiu de uma pequena desavença local. Antônio Conselheiro havia
encomendado e pago um lote de madeiras para a construção de uma igreja no arraial de Canudos.
Como o lote não foi entregue, houve uma ameaça de ataque à cidade de Juazeiro. O juiz da região pediu ajuda ao
governador da Bahia, que, não conseguindo resolver a situação, solicitou a presença das tropas federais. Antônio
Conselheiro também era acusado de sonegador de impostos e de ser antirrepublicano, por manifestar-se contra a
dissociação entre Estado e Igreja no casamento – medida surgida com o advento da República.

Esses foram os argumentos oficiais do governo brasileiro para o ataque ao arraial de Canudos.
Este trecho de Euclides da Cunha descreve a situação no final dos combates:

“A luta, que viera perdendo dia a dia o caráter militar, degenerou, ao cabo, inteiramente. Foram-se os últimos
traços de um formalismo inútil: deliberações de comando, movimentos combinados, distribuições de forças, os
mesmos toques de cornetas, e por fim a própria hierarquia, já materialmente extinta num exército sem distintivos
e sem fardas. Sabia-se de uma coisa única: os jagunços não poderiam resistir por muitas horas. Alguns soldados se
haviam abeirado do último reduto e colhido de um lance a situação dos adversários. Era incrível: numa cava
quadrangular, de pouco mais de metro de fundo, ao lado da igreja nova, uns vinte lutadores, esfomeados e rotos,
medonhos de ver-se, predispunham-se a um suicídio formidável. Chamou-se aquilo o “hospital de sangue” dos
jagunços. Era um túmulo. De feito, lá estavam, em maior número, os mortos, alguns de muitos dias já, enfileirados
ao longo das quatro bordas da escavação e formando o quadrado assombroso dentro do qual uma dúzia de
moribundos, vidas concentradas na última contração dos dedos nos gatilhos das espingardas, combatiam contra
um exército. E lutavam com relativa vantagem ainda. Pelo menos fizeram parar os adversários. Destes os que
mais se aproximaram lá ficaram, aumentando a trincheira sinistra de corpos esmigalhados e sangrentos. Viam-se,
salpintando o acervo de cadáveres andrajosos dos jagunços, listras vermelhas de fardas e entre elas as divisas do
sargento-ajudante do 39o, que lá entrara, baqueando logo. Outros tiveram igual destino. Tinham a ilusão do
último recontro feliz e fácil: romperam pelos últimos casebres envolventes, caindo de chofre sobre os titãs
combalidos, fulminando-os, esmagando-os...”

CONCLUSÃO
Estruturado em três partes que se referem à teoria determinista de Taine, XXXX Os Sertões, de Euclides da Cunha,
é a primeira obra significativa que se contrapõe à visão ufanista e ingênua do país. Além do valor literário, tem o
grande mérito de retratar a comunidade de Canudos, que foi liderada por Antônio Conselheiro.

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