Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
O objetivo deste texto é analisar as representações sociais sobre a prática docente entre
professores vinculados as etapas iniciais da educação básica do município de Riacho de Santo
Antonio - PB. Pretendemos identificar os conteúdos representacionais sobre prática docente
entre os grupos de professores da área urbana e do meio rural, e compreender como estas
representações se expressam nos diferentes momentos pedagógicos. O presente estudo
compreende a abordagem teórico-metodológica das representações sociais fundamentada em
Serge Moscovici, além de optarmos também pela contribuição de Denise Jodelet, por está em
estreita proximidade com a nossa proposta. O estudo lança mão do pressuposto teórico
adotado por Freire (1996) sobre o caráter multidimensional atribuído à prática docente,
enquanto os saberes necessários à prática educativa do professor. Parte-se nesse estudo
também da concepção de a docência é uma atividade complexa e heterogênea cercada de
formalismos, normas, contradições, tensões, dilemas e diversificações. O encaminhamento da
pesquisa deu-se em momentos distintos: aplicação de questionário, análise de alguns
documentos das escolas, observação e técnica de grupo focal. Os resultados nos revelaram
que os professores da área rural e do meio urbano partilham as mesmas representações
sociais, isto é, que a prática docente envolve múltiplas dimensões por se tratar de um objeto
altamente complexo, embora os professores apresentem em seus discursos maiores evidências
em determinadas dimensões. Na pesquisa, emergiram, de modo geral, as seguintes dimensões:
dimensão profissional/institucional, dimensão cognitiva, dimensão filosófica, dimensão
política, dimensão ética, dimensão afetiva e dimensão estética. Sendo algumas delas mais
evidenciadas dentro de um grupo de professores que no outro.
1
Estudo vinculado ao Programa de Cooperação Acadêmica - CAPES – PROCAD NF2010
2
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) atuando
como Professora Substituta da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)
3
Professora Adjunta da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Centro de Educação (CE), Departamento de
Habilitações Pedagógicas (DHP).
11218
Introdução
Apresentamos neste artigo uma parte da pesquisa de mestrado que está sendo
desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE da Universidade Federal
da Paraíba – UFPB.
A pesquisa nasceu das experiências vivenciadas na condição de supervisora escolar
das cinco escolas do município Riacho de Santo Antonio, sendo quatro na área rural e uma no
meio urbano. Na função de supervisora, a convivência com os gestores educacionais, o
contato com pais e alunos, os diálogos e a troca de experiências com os professores
envolveram circunstâncias que nos inquietaram e nos direcionou a figura do professor e o seu
fazer pedagógico.
Dentre estas inquietações constatamos as que se seguem: todas as cinco escolas são
geridas por um único diretor, um vice-diretor e dois coordenadores pedagógicos, o que causa
desconforto entre os professores da área rural, pois ressentem não ter a presença constante da
equipe diretiva nas escolas.
Vê-se o desejo expresso pelos professores, tanto do meio rural quanto do urbano, em
ter à frente da organização do trabalho pedagógico das escolas uma gestão escolar que
caminhe junto com eles com vistas a colaborar na prática docente. Ao passo que revelam o
anseio por uma gestão rigorosa e exigente em suas práticas educativas dentro da escola.
Normas são instituídas pela secretaria municipal de educação estabelecendo as tarefas
que a direção e a coordenação escolar devem exercer no âmbito pedagógico e administrativo
das escolas. Desse modo, ao passo que os professores percebem a dedicação da secretaria de
educação na gestão das escolas, manifestam o anseio de uma gestão escolar (direção e
coordenação) autônoma, na qual tome suas decisões sem a interferência constante da
secretaria municipal de educação nas questões administrativas e pedagógicas.
O projeto político pedagógico, outro elemento evidente das escolas foi elaborado por
uma equipe especializada da Universidade Estadual da Paraíba, limitando a participação dos
professores à nível de colaboração. Quanto às escolas rurais, estas não possuem a proposta
regendo-se, portanto, pelo projeto da escola urbana. Mesmo tendo a mínima participação dos
professores na construção da proposta pedagógica, encontramos indícios de como a escola
pensa como deve ser a prática docente, listando atribuições que sinalizam as dimensões
afetivas, técnica, pedagógica, política e filosófica pertinentes ao fazer docente. Lista esta de
11219
atribuições que os professores é levados a assumir em sua prática, mas que não foram
pensadas por eles.
Percebemos também que os professores tanto da área rural quanto da urbana
estabeleçam relações de respeito entre si, porém encontramos diferenças entre estes dois
grupos. Ainda que o município disponha de espaços pedagógicos, atividades educativas,
suporte da Assistência Social e da Psicologia, dentre outros benefícios, é comum as escolas do
meio rural, embora façam parte da rede regular de ensino, não apreciar. O que os torna um
grupo que se priva de determinadas atividades comparado à instituição de ensino da área
urbana.
Outro aspecto é o próprio comportamento dos professores da área rural nos encontros
pedagógicos e nas reuniões de planejamentos semanais. Diferente dos encontros pedagógicos,
aonde todos os professores da rede participam juntos, os professores da área rural demonstram
participar com menos intensidade das discussões. Em contrapartida, nas reuniões semanais de
planejamento, cujos grupos de professores encontram-se em horários distintos, os professores
da área rural demonstram participar mais ativamente dos debates sobre as problemáticas
vivenciadas em seu fazer docente.
Foi neste cenário que nos motivamos a pesquisar sobre a prática docente e utilizamos
os professores como sujeitos principais da pesquisa, já que são os protagonistas no exercício
da docência. Por ansiarmos em ouvir os professores falarem sobre a prática docente,
intitulamos o trabalho de mestrado de O toar dos professores: representações sociais sobre a
prática docente, pelo significado da palavra toar que significa dar som forte; estrondear; soar
(LUFT, Celso Pedro). Buscamos, portanto, permitir aos professores falar sobre o fazer
docente.
Neste sentido, definimos as seguintes indagações: como a prática docente é
compreendida pelos professores? Que diferenças ou semelhanças existem na compreensão
sobre prática docente entre os professores da área rural e do meio urbano? Essas
representações sociais são uma única representação? De que forma refletem na prática
docente? Que dimensões são valorizadas pelos professores no fazer docente?
A partir destas indagações percebemos que a teoria da representação social (TRS) de
Serge Moscovici podia nos auxiliar a compreender essas questões. Além de optarmos pela
teoria, foi também necessário optarmos pela contribuição de Denise Jodelet por está em
estreita proximidade com a nossa proposta. A representação social enquanto teoria
11220
Desenvolvimento
por acreditarmos ser o seu aporte teórico o mais adequado para explicar tal
multidimensionalidade.
Na dimensão Profissional/Institucional envolvemos os discursos dos professores
sobre o planejamento enquanto instrumento para nortear a ação docente, as competências
específicas, a motivação, o incentivo e a inovação enquanto estratégias para auxiliá-los na
prática docente.
Sobre o planejamento, os professores do meio rural o percebem enquanto instrumento
precípuo no fazer docente, por orientar suas ações e parecem perceber que este instrumento é
uma forma de contribuir para o desenvolvimento dos alunos.
A defesa do planejamento não parte apenas do grupo de professores da área rural, mas
perpassa também pelos discursos dos professores da área urbana. Este outro grupo revela que
há professores que demonstram não saber definir o que será trabalhado na sala de aula e
também existem ainda aqueles que admitem saber ‘’dar aula’’ sem precisar planejar, o que é
questionado por este grupo, ao acreditar que não há como ‘’dar aula’’ sem planejar, visto que
o planejamento é um instrumento norteador capaz de direcionar suas ações. Neste sentido,
percebem que o planejamento torna-se um roteiro ou guia de trabalho para direcionar o fazer
docente, mas quando o professor não busca fazê-lo, ‘’na hora se perde’’, ou seja, desvirtua-se
do que deve ser trabalhado em sala de aula, revela uma das professoras entrevistadas.
Sobre este pensamento partilhado pelos professores, buscamos caracterizar o
planejamento nas teorias pedagógicas circulantes e levantamos a concepção de Gandin (1983)
sobre o planejamento, cujo autor afirma que “planejar é organizar a própria ação”.
Mas, o que não ficou explícito nas falas dos professores do grupo da área urbana foi o
planejamento enquanto instrumento capaz de levar o professor a refletir sobre o sentido social
de sua prática e não como um único roteiro ou guia. Esta concepção, encontramos em Gandin
(2010, p.15), quando diz que o planejamento ultrapassa a idéia de um simples plano ou
roteiro, defendendo um planejamento que resgata ‘’o sentido social do trabalho escolar’’ e
‘’supera o mero domínio cognitivo da informação’’.
Mas, nos parece que a perspectiva de planejamento adotada pelos professores do meio
rural diferencia-se. Enquanto os professores do meio urbano pensam o planejamento voltado
para uma dimensão de organização das ações, o grupo da área rural o percebe mais além,
enquanto instrumento capaz de ser pensado a partir da realidade concreta do aluno. Nos
discursos, os professores demonstram o sentimento de não ser fácil, mas perecem perceber
11222
que trabalhar a partir de sua realidade e trazer os conteúdos ensinados o mais próximo
possível dos alunos é um caminho para ‘’melhorar a aprendizagem’’.
A competência é outra exigência da prática docente dentro da dimensão
profissional/institucional reconhecida pelos professores. À exemplo, os professores relatam
que o professor precisa ter ‘’preparo’’ no trabalho com turmas de maternal. Para eles, criou-se
uma imagem entre as pessoas de que o maternal é apenas voltado para o brincar, o que
discordam, ao revelar que a educação infantil exige da prática docente ‘’preparo’’.
A perspectiva pensada pela professora ultrapassa a finalidade apenas de brincar ou
tomar conta das crianças. A partir deste pensamento compartilhado entre os professores,
buscamos as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – Resolução CEB no
01, de 07 de abril de 1999 – que em seu artigo 3o, inciso III estabelece que as propostas
pedagógicas para a educação infantil, tanto para a creche como para a pré-escola, devem
promover ‘’práticas de educação e cuidados, que possibilitem a integração entre os aspectos
físicos, emocionais, afetivos, cognitivo/lingüísticos e sociais da criança, entendendo que ela é
um ser completo, total e indivisível’’.
Outra situação sobre competência é citada pela professora da primeira fase do ensino
fundamental, quando declara a falta de ‘’capacidade’’ de alguns profissionais do ensino em
lecionar a série que atuam. Neste sentido, a professora no trecho da seguinte fala ‘’eu escuto
muitos comentários dos alunos: o professor tal, meu Deus Céu, eu fui a pulso a aula porque
sinceramente eu sei mais do que ele’’, compreende que a competência do professor está
relacionada aos conhecimentos que deve ser superior ao do aluno.
A motivação e o incentivo são outros aspectos da dimensão profissional/institucional
da prática docente. Partimos do pressuposto de que estes dois elementos – motivação e
incentivo – denotam nas falas dos professores da área rural e urbana relações entre si. Os
professores demonstram que é preciso realizar atividades que incentivem os alunos, o que
desperta o interesse de ir para a escola e ‘’chama sua atenção’’.
Moysés (1994), enfatiza que a motivação é um poderoso aliado do professor em sua
prática docente. Campos (1972, p.95), diz que ‘’a compreensão e o uso adequado das técnicas
motivadoras resultarão em interesse, concentração de atenção’’, idéia esta que vem sendo
colocada pelos professores da área rural e urbana.
A inovação também é um elemento expressado pelos professores, não com tanto
freqüência quanto motivação e incentivo. Para alguns, ‘’inovar’’ denota ser para a prática
11223
docente uma forma de ‘’não parar no tempo’’. Para outros, aceitar o novo ainda é uma
resistência entre os professores, ao justificar que embora desejem que se acrescente o novo,
não querem se adequar a ele, pois o novo ‘’dá trabalho’’, deste modo muitos preferem não
mudar.
No que concerne ao ato de inovar, Freire (1996) apresenta que ensinar exige aceitação
do novo, este pensamento parte do princípio do sujeito não negar o novo, mesmo que este o
conduza a arriscar-se em terrenos desconhecidos. Na compreensão do autor, o novo não pode
ser negado por ser no primeiro momento estranho, nem tampouco acolhê-lo apenas por ser
novo e apresentar resistência em adaptar-se a ele.
Na Dimensão Cognitiva, estão direcionados as discussões dos professores sobre a
construção dos conhecimentos a partir do saber científico, das experiências da própria prática
em sala de aula e das trocas de saberes estabelecidas com os outros colegas professores.
Quando se fala em prática docente um dos aspectos a ser revelado pelo grupo de
professores a necessidade pela busca do conhecimento. Para os dois grupos de professores, o
ensino exigirá do professor conhecimentos e o conhecimento surge quando se busca. A
professora da área rural expõe que depende do professor criar o hábito de buscar os
conhecimentos e a professora do meio urbano acrescenta que o conhecimento existe e está
próximo do professor, entretanto torna-se útil quando o professor vai até ele e procura colocá-
lo em prática.
Esta idéia está calcada na concepção de Freire (1996, p.29) quando defende que ‘’não
há ensino sem pesquisa’’. O ensinar incita a tarefa de pesquisar, que significa buscar novos
conhecimentos. Neste sentido, Freire (1996, p.29) coloca “Ensino porque busco, porque
indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho,
intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar
ou anunciar a novidade”.
Para o autor, o professor está em constante processo de formação, logo, necessita
sempre buscar o conhecimento. O pensamento exposto por Freire (1996) sobre buscar
conhecimentos, direciona à prática docente a intervir e conhecer o novo. Nesta perspectiva, o
ato da pesquisa implica estudar mais para conhecer melhor o que ainda não conhece.
A professora no seguinte trecho da fala ‘’ o aluno pode me perguntar tal coisa então eu
tenho que responder isso, e se ele me perguntar isso eu já tenho que responder isso’’, mas se
ele não tiver nenhuma pergunta eu vou voltar todas as perguntas pra ele’’, denota que o
11224
professor precisa estar preparado para as indagações dos alunos, ao passo que também deve
contribuir para criar possibilidades que o conduza a ser um indagador. É o que Freire
(FREIRE, 1996, p.47) defende quando diz, ‘’quando entro em uma sala de aula devo estar
sendo um ser aberto a indagações, à curiosidade, às perguntas dos alunos’’.
Porém, a busca pelos conhecimentos não se dá apenas por meio do saber científico,
mas é evidenciado nos discursos dos professores do meio rural o valor dado à ‘’troca’’ de
conhecimentos e experiências entre os professores como forma de refletir e discutir em
conjunto sobre as questões voltadas à prática docente. Percebe-se que a busca pelos
conhecimentos parte tanto do saber científico quando dos saberes experienciais. Os
professores da área rural embora não pratiquem, compreendem a importância de estudar e
discutir atividades em conjunto com os demais colegas professores. Deste modo, chamar
atenção para a importância do trabalho em ‘’grupo’’, em ‘’união’’, como forma de fluir
melhor as atividades, pois do contrário, a prática docente torna-se ‘’isolada’’. Para outro
professor do meio rural, a prática docente a partir da ‘’troca’’ oportuniza a socialização das
experiências dos professores para ajudar na prática docente do outro, para ‘’somar’’ os
saberes.
Para os professores da área urbana, o conhecimento está atrelado a própria experiência
que adquirem no dia a dia de sua prática docente. A professora da primeira fase do ensino
fundamental revela que as experiências vivenciadas no decorrer de suas práticas vão
compondo o universo de conhecimento necessário à sua ação docente. Demonstra que os
conhecimentos não foram construídos antes de entrar em uma sala de aula, mas no dia a dia.
Para os professores, os conhecimentos adquiridos nas vivências em sala de aula passa
pelo que Tardif (2002) chama de saberes experienciais. O autor compreende que os
conhecimentos oriundos da própria experiência cotidiana da atividade docente é para o
professor o alicerce da prática, pois se torna uma condição para produzir seus próprios
saberes.
Evidenciamos também no corpus discursivo dos professores da área urbana, a
importância de integrar a teoria e a prática, de modo a superar a dicotomia entre o que se
estuda nas universidades ou outros espaços de formação e o que se vivencia na prática.
Parece-nos que os professores percebem a importância em estabelecer relações indissociáveis
entre a teoria e a prática.
11225
Esta idéia é compreendida por Freire (1996, p.39), ao afirmar que ‘’o próprio discurso
teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda
com a prática’’. Quanto mais próximo o discurso teórico estiver da atividade prática, o fazer
docente envolverá o movimento dinâmico e dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer.
Na Dimensão Filosófica, envolvemos a idéia de inacabamento do ser humano.
Evidenciamos que uma das professores percebe que os professores estão em constante
formação, conforme o seguinte trecho de sua fala ‘’a gente não está totalmente formado, a
gente está ao longo do tempo se formando, construindo’’. A concepção teórica de Freire
(1996) encontra-se arraigada no discurso dos professores, quando o autor pronunciar que
ensinar exige consciência do inacabamento, cuja afirmativa compreende o sujeito enquanto
ser inconcluso capaz de formar-se ao longo da vida.
Na Dimensão Ética, evidenciamos nos discursos dos professores duas vertentes: a
prática docente enquanto trabalho em conjunto com direção e coordenação escolar e o
compromisso ao ensinar. Sobre o trabalho em conjunto, os professores evidenciam que a
prática docente não se detém apenas como responsabilidade sua, mas percebem a importância
do trabalho em conjunto desenvolvido pela direção, coordenação escolar e pais.
Percebemos que este tema despertou uma discussão intensa entre todos os professores
envolvidos. Não se contiveram e entraram ao mesmo tempo na discussão, falando de uma só
vez, concordando um com o outro ao revelarem a necessidade de articular o trabalho da
coordenação e direção escolar à prática docente, pois revelam que há questões relacionadas
aos alunos que necessitam da intervenção da coordenação. Os professores lamentam-se por a
tarefa de educar não ser realizada em conjunto – professores e equipe diretiva – mas,
restringi-se apenas ao professor, ocasionando o isolamento das partes que compõem a escola.
A equipe diretiva torna-se para estes professores um ‘’elo de ligação’’ (expressão de
uma das professoras) entre as várias instâncias da escola (professor, aluno, família), mas
quando este ‘’elo’’ é rompido, o trabalho em conjunto é comprometido. A perspectiva da
direção e coordenação escolar fragilizada traz danos à prática docente, entre elas está a
precária comunicação entre escola e família, a falta de trabalho da coordenação pedagógica
com os alunos indisciplinados ou a frágil iniciativa de coordenadores e diretor em coordenar
determinados trabalhos administrativos e pedagógicos das escolas.
Este pensamento de que a prática docente exige o trabalho conjunto com os
coordenadores e direção, passa pelo que Libâneo (2004, p.215) defende ‘’quem coordena tem
11226
Outra vertente inserida na dimensão política, evidente nas falas dos professores do
meio urbano, em específico, da segunda fase do ensino fundamental é os professores estarem
preocupados em sua prática docente formar cidadãos capazes de atuar no meio social.
A prática docente também passa pela compreensão de tornar possível a formação
crítica do aluno capaz de inseri-lo no ambiente que se encontra inserido e transformá-lo. Esse
entendimento dos professores parece demonstrar que uma das funções da prática educativa é
interagir e articular suas ações com as práticas sociais.
Sobre esta vertente, nos apoiamos em Freire (1996, p.99) quando diz que ‘’a educação
é uma forma de intervenção no mundo’’. É uma forma de criar possibilidades do aluno formar
uma consciência crítica sobre as questões da sociedade levando-os a uma possível tarefa de
mudar o que está posto em face da melhoria. Segundo Freire (1996, p.77), o nosso ‘’papel no
mundo não é só o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem intervém [...]
constato não para me adaptar, mas para mudar’’. O discurso dos professores da área urbana
apóia-se neste pensamento de Freire (1996), sobre a capacidade de intervir na realidade do
que simplesmente a de se adaptar a ela, pois segundo o autor, ninguém pode ser neutro.
A Dimensão Afetiva envolve uma mistura de sentimentos dos professores envolvidos
na pesquisa: as emoções, a atenção, o cuidado, as angústias e as preocupações. Parece-nos que
a afetividade veio surgir com mais evidência nas falas das professoras da educação infantil da
área urbana e entre os professores do meio rural.
Mediante a discussão com os professores, a afetividade é uma dimensão que se
corporifica no cuidado e no olhar atento do professor em relação aos seus alunos. Pudemos
perceber nos discursos das professoras que a afetividade está presente em cada momento do
processo educativo e atrelada ao olhar atento e cuidadoso do professor diante da criança. Isto
é, desde que a criança chega à escola, até o momento que volta para sua casa.
Além deste sentimento de cuidar e observar atentamente a criança, há evidências nos
discursos dos professores de sentirem emoções. Segundo alguns relatos, percebemos que os
professores se comovem com as histórias de vida de seus alunos.
Ao passo que a afetividade relaciona-se a sentimentos de cuidar ou de se emocionar,
surgem também sentimentos de angústias e preocupações. O fazer docente tem se mostrando
difícil de ser praticada e quem sinaliza é uma professora do 1° ano do ensino fundamental I,
quando relata a preocupação com os alunos que apresentam dificuldades em aprender a ler e a
escrever. Ao nos contar a situação vivenciada, é perceptível em sua fala e nos gestos físicos,
11228
quando coloca as mãos sobre o rosto demonstrando preocupação, a difícil tarefa de enxergar
uma solução para o problema vivido. Este sentimento de preocupação também é visto na fala
dos professores do meio rural, ao revelar sobre as dificuldades de trabalhar com turmas
multisseriadas.
Freire (FREIRE, 1996, p.145) apóia uma prática educativa que valorize a dimensão
afetiva, principalmente por ser o trabalho do professor uma especificidade humana. Nesta
perspectiva, diz ‘’como prática estritamente humana jamais pude entender a educação como
uma experiência fria, sem alma, em que os sentimentos e as emoções, os desejos, os sonhos
devessem ser reprimidos por uma espécie de ditadura reacionalista’’. O autor mostra que ao
lidar com ‘’gente’’ e não com ‘’coisas’’, a ação docente não há como recusar a atenção e o
amor.
E por fim a Dimensão Estética, que compreende a idéia de beleza do trabalho
docente, da estética de escolas, espaços apertados, de difícil circulação, móveis inadequados
espaços limitados para as crianças brincarem e falta de materiais didáticos. Os professores
percebem que o espaço físico contribui para a sua ação docente e é importante na
aprendizagem do aluno. Evidenciamos nas falas das professoras da creche a necessidade de
um espaço físico para realizar as atividades recreativas com as crianças. O que não é diferente
para os professores do meio rural, que lamentam pelas escolas serem pequenas e pela falta de
espaço para os alunos recrearem.
Ainda que não seja problema para as aulas acontecerem, as professoras também se
ressentem com a falta de brinquedos, jogos de montar, formas geométricas com cores, dentre
outros instrumentos pedagógicos e lúdicos necessários à aprendizagem desse público infantil.
As professoras parecem compreender que a infraestrutura da creche é um fator importante
para apoiar o professor em sua prática e contribuir na aprendizagem do público infantil, uma
vez que deve ser um lugar acolhedor e prazeroso para a criança. Neste sentido, a professora
do meio rural partilha ‘’criança tem que se sentir confortável na escola’’.
Encontramos nos estudos de Azevedo e Bastos (2002) que o espaço físico escolar é
essencial no processo ensino-aprendizagem, uma vez que este é o cenário diário de estudos,
discussões, debates, reflexões, convívios e interações que alunos e professores estão inseridos.
11229
Conclusão
REFERÊNCIAS
Azevedo, G. E. N., & Bastos, L. E. G. (2002). Qualidade de vida nas escolas: produção de
uma arquitetura fundamentada na interação usuário-ambiente. In V. Del Rio, C. R. Duarte, &
P. A. Rheingantz (Orgs.). Projeto do lugar: colaboração entre Psicologia, Arquitetura e
Urbanismo. Rio de Janeiro: PROARQ.
FRANCO, Maria Laura Publisi Barbosa. Análise do Conteúdo. 3 ed. Brasília: Liber Livro
Editora, 2008.
GANDIN, Danilo. Planejamento como prática educativa. São Paulo: Loyola, 1983
LUFT, Celso Pedro. Minidicionário Luft. São Paulo: Ática, 2000. p.640
MOYSÉS, Lúcia Maria. O desafio de saber ensinar. Campinas, SP: Papirus, 1994
TARDIF, Maurice. Saberes docente e formação profissional. Ed. Petrópolis: Vozes, 2002