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NECROMANCIA

Destino do Universo
livro 2

FREDERICO DUARTE
NE C ROMA NC I A
Destino do Universo – livro 2

© 2008, Frederico Duarte (texto)

© 2008, João Tavares (capa)

1.a edição: Novembro de 2008


Depósito legal no. 282781/08
ISBN 978-972-712-550-0
Reservados todos os direitos

Uma chancela do Grupo Leya

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Para a Ana, a minha cara-metade,
por estar sempre do meu lado

Para os meus pais,


por me terem posto neste mundo

Para todos os que nunca


desistem dos seus sonhos
Agradecimentos

Um grande “Obrigado!” a todos os meus amigos que aturaram os meus


pedidos de ajuda para rever este livro. O apoio deles tornou a continuação deste
sonho uma realidade.
Agradeço também a toda a equipa da Nova Gaia pela oportunidade que me
deram e por terem acreditado e continuarem a acreditar em mim.
Índice

PRÓLOGO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

CAPÍTULO I – O Novo Deus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

CAPÍTULO II – A Nova Ameaça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

CAPÍTULO III – O Último Reduto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

CAPÍTULO IV – Ponto de Situação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58

CAPÍTULO V – Banshee . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

CAPÍTULO VI – Uma Nova Página na História . . . . . . . . . . . . . . . . . 77

CAPÍTULO VII – A Grande Maçã . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89

CAPÍTULO VIII – Perigo Suspenso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103

CAPÍTULO IX – Recordações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113

CAPÍTULO X – Revolta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128

CAPÍTULO XI – D.A.M.A.G.E. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141

CAPÍTULO XII – Guerra Intermundial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 156

CAPÍTULO XIII – Campanha de Retaliação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172

CAPÍTULO XIV – Ataque . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 185

CAPÍTULO XV – As Duas Frentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 200

CAPÍTULO XVI – Terra Contra Fogo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211

CAPÍTULO XVII – Restauração . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 226

CAPÍTULO XVIII – Infernum . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 240

CAPÍTULO XIX – Golpe Mortal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 260

CAPÍTULO XX – Meia-noite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 270

CAPÍTULO XXI – Devastação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 284

CAPÍTULO XXII – Tóquio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 294

CAPÍTULO XXIII – Retaliação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 310

CAPÍTULO XXIV – Levar a Guerra ao Inimigo . . . . . . . . . . . . . . . . . 323

CAPÍTULO XXV – A Torre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 343

CAPÍTULO XXVI – Provações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 355

CAPÍTULO XXVII – Luz e Trevas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 370

EPÍLOGO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 379
PRÓLOGO

– … que os Deuses olhem por vós e permitam que fiquem


juntos para sempre.
O sacerdote levantou os olhos do Iluminação, o livro de Selenia,
a Deusa da Vida e da Luz, e fitou Fredisson e Annya. Ambos sorriam
abertamente. O noivo, com o seu manto cinzento de cerimónia e
um fato da mesma cor, estava bastante simples, como era hábito
dos elementares em termos de indumentária. Já a noiva brilhava e
prendia a atenção de qualquer um no seu vestido branco e compri-
do, com um corpete bastante decotado. Ao pescoço trazia um pen-
dente com a representação de Selenia, uma grande estrela dourada,
tipicamente usada pelas noivas do reino de Aurora.
O olhar do sacerdote dirigiu-se então para os padrinhos de am-
bos. Ao lado de Fred estavam Alexandra, a Avatar, que derrotara
Adina, a Necromante, na Grande Batalha cerca de duas estações
antes, e Francis, o paladino e comandante do exército de Aurora.
Alexis usava um vestido branco e simples, que se moldava ao cor-
po de modo a salientar as suas curvas perfeitas, e Francis usava um
uniforme militar de cerimónia, igualmente branco e com um enor-
me pegasus dourado, o símbolo do reino, no peito. Tinha também
na sua bainha uma espada cerimonial.
Uma boa escolha – pensou Fred.
O que o incomodava era a escolha de Annya. Não era Thelma,
a elementar da Água, uma sereia, que o deixava pouco à vontade
mas sim Raptor, o elementar do Fogo e, acima de tudo, um caçador.
Até há bem pouco tempo estas criaturas – demónios meio dragões,

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meio humanos – eram consideradas um dos piores inimigos de
Aurora. No entanto, entre as grandes mudanças que ocorreram com
o fim da guerra, a própria Rainha Luana havia decretado que elas
passariam a ser consideradas aliadas de Aurora. Muitas continua-
vam a ser consideradas perigosas, mas a grande maioria havia-se de-
clarado amiga e ajudava agora na reconstrução do reino. Thelma
usava um vestido simples, azul, a cor associada ao seu elemento,
enquanto que o demónio, pouco habituado a roupas, cobria-se com
um manto vermelho, deixando apenas a cabeça a descoberto. Per-
cebendo que o sacerdote o observava, Raptor fitou-o nos olhos, o
que fez com que o homem voltasse a concentrar-se na cerimónia.
– Bom, chegou a altura de trocarem as alianças – declarou.
De entre os convidados saiu então Hanna. A jovem elementar
da Terra dirigiu-se para o altar com um pano vermelho aberto nas
suas mãos, mostrando as duas alianças douradas. As suas orelhas
pontiagudas mostravam bem que tinha sangue elfo. Envergava um
vestido de cerimónia élfico, verde com folhas douradas desenhadas.
Ainda mais bem-disposta que o normal, exibia um enorme sorriso
de orelha a orelha.
– Que giro! – comentou alguém. – É uma criança elfo que vai
entregar as alianças!
Hanna deteve-se um segundo. A sua altura dava muitas vezes
origem a comentários destes. Apesar de ser adulta, o seu sangue anão
dera-lhe uma estatura fora do comum para um elfo. Mas, naquele
dia, nem esses comentários iriam estragar-lhe o humor, pelo que
retomou o passo em direcção ao altar, para alívio de todos os que a
conheciam bem.
– Au! – gritou a voz que tinha feito o comentário.
– Chchch! – fizeram os restantes presentes.
– Mas alguém me atirou uma pedra! Quem é que…?
– Chchchchchch!
O sacerdote aclarou a voz, atraindo novamente a atenção de
todos. Fred e Annya trocaram então as alianças, fazendo juras de

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amor um ao outro. E então, com a bênção do sacerdote, beijaram-
-se. Os convidados explodiram em aplausos. Corados de felicidade,
os noivos desceram do altar, seguidos pelos seus amigos.
– Os meus parabéns! – disse Luana, aproximando-se de ambos
e abraçando-os.
– Obrigado, Majestade! – responderam eles.
Piscando-lhes o olho, a Rainha afastou-se para ceder lugar aos
pais de Annya. A seguir veio Siona e Livia, que haviam permane-
cido na cidade desde que Larn partira para parte incerta. Longe das
vidas que tinham em Águilar, as duas recomeçavam do zero em
Aurora. Siona ingressara na academia de magia do exército ao pas-
so que Livia abrira uma estalagem na cidade. Depois delas vieram
então os vários convidados, entre os quais os pais adoptivos e uma
amiga de Alexis.
– Realmente é mesmo estranho – confessou Carla, quando se
afastaram do casal recém-casado. – Conseguimos entender tudo o
que dizem sem conhecermos a língua.
– É por causa do feitiço que a nossa filha nos lançou – lembrou
o seu marido, Carlos.
– Se ela não nos tivesse avisado, acho que nem me tinha aper-
cebido de que era mesmo outra língua – comentou Sílvia.
– E então? Estão a gostar? – perguntou uma voz atrás deles.
Voltaram-se e deram de caras com Alexis. Esta sorriu-lhes en-
quanto prendia uma madeixa do cabelo ruivo atrás da orelha.
– Isto é mesmo incrível! A magia, todos estes seres fantásticos
– respondeu Sílvia.
– Fiquei impressionada com a presença que aquele lá atrás
consegue impor – comentou Carla.
– Qual, mãe? O centauro? É Krinos, o Deus da Terra. O ou-
tro ao lado dele é o Deus do Fogo, Trukun, um minotauro.
– A mim mete-me mais impressão aquele ali – afirmou Carlos,
inclinando a cabeça para Raptor. O encontro com os dois caçadores
na Terra ainda estava bem presente na sua mente. – Fiquei mesmo

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admirado quando me disseste que era um dos amigos que tinhas
feito aqui.
Alexis riu-se.
– Posso assegurar-te que ele é um amor de pessoa! – sossegou
ela. – Venham.
Seguiram os convidados para dentro do castelo. Quando Fred e
Annya anunciaram o casamento, a Rainha fizera questão que este se
realizasse no pátio do seu castelo. Entraram num enorme salão. Vá-
rios serventes aguardavam-nos e começaram a encaminhar os convi-
dados para as respectivas mesas. Estas, todas elas redondas, estavam
dispostas de maneira uniforme por toda a sala. A excepção era a dos
noivos, que era rectangular e estava ao longo de uma das paredes,
para que estes pudessem ver todos os convidados. Na mesa de Fred
e Annya ficaram não só os padrinhos como também Hanna e Luana.
Alexis colocou os pais e a amiga junto aos terrestres que faziam par-
te do exército de Aurora, que ficaram radiantes ao saber que iriam
ter quem pudesse contar-lhes as novidades da Terra. Após a luxuosa
refeição seguiu-se um pequeno baile. Mais uma vez, Luana fizera
questão de patrocinar o casamento. Tudo aquilo saía dos bolsos do
reino mas, ante a argumentação dos noivos, ela replicara que era o
mínimo que Aurora podia fazer para pagar a ajuda deles. Ásis, o sa-
télite nocturno de Nova, considerado também a representação do
Deus da magia Negra com o mesmo nome, já se havia elevado nos
céus há muito tempo quando os convidados começaram a sair.
Na manhã seguinte, Alexis, os pais desta e Sílvia encontraram-
-se novamente com Fred, Annya e Luana no pátio do castelo. Os
criados haviam feito um bom trabalho, pois não existiam agora
quaisquer vestígios do casamento.
– Tenho pena de que se vão já embora – disse Annya. – Infeliz-
mente, com isto tudo não pudemos dar-vos muita atenção.
– Vamos ter imenso tempo para nos conhecermos melhor –
respondeu Carlos. – Afinal, a vossa lua-de-mel vai ser lá em casa,
não é verdade?

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– Melhor prenda de casamento do que essa não há! – afirmou
Fred. – Quantos podem ter hipótese de festejar o casamento numa
terra mítica?
– Mas espero que voltem. Gostaria imenso de voltar a receber-
-vos – disse Luana. – Quando a vossa vida o permitir, claro, pode-
riam passar alguns dias aqui na cidade.
– Umas férias num castelo num país distante, hem? Que mais
podem vocês querer? – brincou Alexis.
– Porque não vão todos juntos depois? – sugeriu a Rainha. –
Assim poderiam ficar mais alguns dias.
– Eu quero ter a certeza de que a minha casa está pronta para
os receber como deve ser – respondeu Carla. – Não quero que
pensem mal de nós – acrescentou piscando o olho a Fred e Annya.
– Ora! Quem te ouvir… – começou Alexis.
– Não, a sério, gostaríamos muito de ficar, mas preferimos ir
agora e voltar noutra altura – replicou Carla.
A Rainha inclinou a cabeça ligeiramente, em concordância,
lançando-lhe um caloroso sorriso.
– Vamos a isso, então! – disse Alexis, voltando as costas ao gru-
po.
Fechou os olhos e abriu os braços começando a concentrar o
seu chacra Branco. Apesar de o seu conhecimento e domínio sobre
a magia serem muito superiores ao que eram há alguns meses, para
criar um portal entre Nova e a Terra continuava a ter de recorrer
ao seu poder de avatar. Quando abriu os olhos, estes estavam total-
mente brancos. Um círculo de luz formou-se no ar, criando a ponte
entre os dois mundos. Com um último adeus, os terrestres atra-
vessaram-no, seguidos por Alexis. Não levavam qualquer bagagem
pois não haviam trazido nenhuma. Aurora providenciara-lhes tudo
de que haviam precisado nos últimos dias. Quando já estavam do
outro lado, o portal dissipou-se. Pelo menos a precisão de Alexis
aumentara: desta vez criara o portal apenas a um metro do sítio que
pretendia. Das primeiras vezes o portal havia ficado a alguns metros

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de distância. Embora alguns achassem que isso era irrelevante pe-
rante a capacidade de abrir o portal em si, a jovem feiticeira sabia
perfeitamente que alguns metros poderiam fazer muita diferença.
Neste caso, por exemplo, sem a valiosa precisão, não conseguiria
transportar os pais adoptivos e a amiga para dentro da sala de estar.
– Não te vais já embora, pois não? – perguntou Sílvia.
– Vou. Preciso só de uns segundos para recuperar. Não fiques
assim, eu volto dentro de alguns dias – acrescentou ao ver o ar de-
siludido da amiga.
Os pais aproximaram-se e Alexis abraçou os três.
– Até ao meu regresso – disse, começando a repetir o processo
para criar o portal.
– Não te demores – pediu a mãe, quando ela concluiu a magia.
– Vamos ficar ansiosos pela tua chegada.
Atirando-lhes um beijo, Alexis atravessou o portal, que desapa-
receu imediatamente. Carlos consultou o relógio enquanto Carla
ligava a televisão para ver as notícias da manhã.
– Bom – começou ele, voltando-se para Sílvia –, vamos até casa
dos teus pais. Estava a pensar convidá-los para almoçar num sítio
qualquer. Que dizes, querida?
Sem esperar a resposta da mulher, olhou em redor à procura
das chaves do carro.
– Ouviste o que eu disse? – perguntou ao ver que ela não lhe
respondia.
Pelo canto do olho viu Sílvia aproximar-se do sofá onde estava
Carla. Ia voltar a desviar o olhar para procurar as chaves quando
ouviu a rapariga lançar um gemido. Voltou-se e reparou que ambas
tinham tapado a boca com as mãos. Fixavam a televisão, aterradas.
Aproximou-se rapidamente de ambas para ver o que as assustava.
– … recebemos agora a confirmação de que o mesmo se está a passar no
Reino Unido, na França, no Japão… Meu Deus, a lista não pára de aumen-
tar! – disse o apresentador do telejornal. – É-me totalmente impossível
conseguir explicar o que se passa de uma forma imparcial. O que estamos a

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presenciar é algo inconcebível. – Fez uma pequena pausa. – A nossa equi-
pa em Roma acabou de nos enviar mais algumas imagens.
O apresentador desapareceu. No ecrã estavam agora vários
prédios em chamas.
– Como podem ver – prosseguiu a voz do locutor –, também Itália
está a ser atingida. A precisão com que o ataque está a ser feito demonstra que
ela sabe perfeitamente o que está a fazer.
– Ela? – perguntou Carla a ninguém em especial.
– … a criatura desapareceu! Pelo menos não a conseguimos ver agora
– disse o repórter.
– Criatura? – inquiriu Carlos.
– Sim – respondeu Sílvia. – Eles estão a dizer que há dragões
envolvidos nos ataques!
– Dragões!? Na Terra!? – espantou-se ele.
No ecrã, voltou a aparecer o apresentador. Este mostrava um
ar bastante perturbado.
– Acabámos de perder o contacto também com a equipa de reportagem de
Roma. Que Deus os ajude… – Fez-se silêncio novamente. Parecendo
recuperar a compostura, o jornalista prosseguiu. – Tudo começou com
o ataque nos Estados Unidos, há algumas horas, seguindo-se todas as gran-
des potências nucleares. Estamos agora a receber relatos de ataques vindos de
todo o mundo. A atacante afirma ser uma feiticeira poderosa; e se ao início
pensávamos ser apenas uma louca, agora já não sabemos o que dizer. Vamos
passar novamente a declaração feita.
O ecrã passou então a mostrar uma jovem morena. Esta pos-
suía uma expressão cruel e maldosa no rosto.
– O meu nome é Adina – começou ela, falando em inglês. – A
partir de agora, a Terra pertence-me. A resistência é completamente inútil.
Neste preciso momento, o meu exército está a aniquilar todas as vossas forças
de combate. Para que não haja dúvidas do meu enorme poder, irei fazer uma
pequena demonstração do mesmo em vários pontos do globo. Eu…
O ecrã ficou subitamente mudo. Os três olharam em redor.
Não havia electricidade. Carlos dirigiu-se à janela para a abrir.

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– Adina? – interrogou-se Sílvia. – Mas essa não era…?
A frase morreu-lhe na garganta. Acabavam de se aperceber, fi-
nalmente, da gravidade de tudo o que se estava a passar.
– Que Deus nos valha… – murmurou Carla.
Uma sombra enorme escureceu o céu durante um segundo.
Carlos espreitou lá para fora.
– Deus? – repetiu ele com a voz a tremer. – Não, querida, nós
vamos precisar de mais do que um Deus.

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CAPÍTULO I

O Novo Deus

– Passa-se alguma coisa? – perguntou Alexis.


Sargas respondeu afirmativamente com um aceno de cabeça.
Segundo parecia, também ele acabara de chegar, pelo que nem Fred
nem Annya sabiam ainda a razão da súbita vinda do elementar do Ar.
– Era exactamente isso que eu ia explicar – disse ele, dando um
jeito à cabeça de modo a colocar o seu cabelo comprido totalmente
atrás das costas. – Tens de regressar imediatamente a Avalon, Fred.
– Aconteceu alguma coisa grave? – perguntou o interpelado.
– Grave, não. Importante. Já está determinado quem será o
novo Deus do Ar.
Gerou-se imediatamente silêncio. Fred olhou de relance para
Annya, com um ar chateado e perturbado em simultâneo.
– Bom, eu acabei de me casar… Estava à espera de poder pas-
sar algum tempo com…
– Mas há uma solução simples para isso – interrompeu Alexis.
Voltaram-se todos para ela.
– Trá-la também para Avalon. Ela pode ficar comigo.
– Bem… – começou Fred, coçando a nuca e olhando para Annya.
– Sim, é uma boa ideia. Nos próximos dias não vou ter muito tem-
po, mas se estiveres em Avalon sempre é possível estar um pouco
contigo.
– Sou livre de fazer o que quiser nas próximas quatro semanas
– lembrou ela. – Mas os pais da Alexis esperam-nos daqui a três dias.
– Nessa altura a cerimónia já estará terminada, espero.
– Em último caso, eu vou à Terra e aviso-os.

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– Temos é de partir imediatamente – apressou Sargas. – Colo-
quem-se à minha volta, eu transporto-os.
– Ena, ena! Também já consegues!? – admirou-se Fred.
– Ah! Como se eu me deixasse ficar atrás de ti! Só demorei
mais um pouco do que tu a dominar o feitiço.
Alexis sorriu ao ver os dois amigos a provocarem-se. Embora na
altura em que conhecera Sargas ela não o soubesse, sempre existira
uma rivalidade saudável entre ambos, rivalidade essa que aumenta-
ra ligeiramente após o teste que Fred fizera para se tornar elemen-
tar do Ar. Colocaram-se todos em redor de Sargas e este estendeu
os braços, como se os fosse abraçar.
– Portal de Ar – gritou ele, batendo com as palmas das mãos
uma na outra.
Um tornado começou imediatamente a formar-se em redor
do grupo.
– Pensei que os elementares não precisassem de falar para exe-
cutarem feitiços do seu elemento – observou Alexis, na altura em
que o chão desaparecia debaixo do grupo.
– Bom, este é um feitiço complicado, pelo que nós mesmos
precisamos de o executar deste modo até o dominarmos melhor. É
claro que o fazemos com mais facilidade do que a maioria.
– É verdade. Eu também tive de fazer o mesmo da primeira
vez, quando te levei a Avalon – recordou Fred. – Até levei nas ore-
lhas, lembras-te?
Todos se riram. O chão voltou a reaparecer. O tornado dissipou-
-se e eles olharam em redor. Estavam em Avalon. A julgar pela posi-
ção de Selenia, desta vez a ilha móvel estava localizada num ponto
do planeta com um fuso horário parecido com o de Aurora.
– Quando é que volto a ver-te? – perguntou Annya.
– Com sorte devo poder jantar convosco – respondeu Fred,
olhando para Sargas, que inclinou a cabeça para o lado e encolheu
os ombros.
– Bom, então até logo – despediu-se Alexis, incitando o amigo
a não se atrasar mais.

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Fred deu um último beijo a Annya e, juntamente com Sargas,
ergueu-se no ar, voando de seguida em direcção ao Palácio dos
Elementos.
– Vamos andando? – sugeriu Alexis.
– Sim, vamos. Mas gostava de passar por um sítio primeiro.
Não foi necessária qualquer explicação para que a Avatar sou-
besse onde é que a curandeira queria ir. Não foi também necessário
qualquer tipo de indicação para que Annya começasse a dirigir-se
para o local desejado. Desde o fim da guerra, Fred havia-a levado
algumas vezes até à ilha mágica.
Caminharam um pouco, contornando o enorme lago que em-
belezava as entradas dos templos dos quatro elementos. Pelo cami-
nho foram saudadas por vários elementares, a maior parte dos quais
nenhuma delas conhecia. Mas toda a gente conhecia Alexis. Uma
das consequências da guerra, principalmente da Grande Batalha, fo-
ra a fama que Alexis ganhara, mesmo sem querer. Era considerada
a mais poderosa das feiticeiras vivas. E, se o tom do seu cabelo não
denunciasse a sua identidade, era mesmo o poder que dela emanava
que o fazia. Não tendo necessidade de se ocultar, Alexis simples-
mente descontraía-se e deixava-o fluir.
Em pouco tempo chegaram ao cemitério da ilha. Entraram e
dirigiram-se a um local específico, cheio de pequenos santuários.
Abrindo cautelosamente a porta de um deles, espreitaram. Estava
vazio, pelo que entraram. Por cima do único túmulo ali existente,
estava um quadro com um retrato de Oxior, o último Deus do Ar.
– Bom dia, Mestre – disse Annya, ajoelhando-se em frente ao
túmulo. Alexis fez o mesmo. – Tenho a certeza de que o Fred la-
menta não ter vindo aqui assim que chegou, como eu sei que sem-
pre faz, mas virá assim que puder.
Ficaram ambas em silêncio, fazendo só uma pequena oração.
Ambas sabiam que era algo que Fred nunca fazia, preferindo antes
relatar ao seu falecido mestre o que havia feito desde a sua última

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visita, como se este ainda estivesse vivo. Mas essa era a sua maneira
de prestar homenagem, não a delas. Mesmo assim, Annya ainda
disse algo antes de sair.
– Havia de o ter visto no casamento. Naquele fatinho, até que
estava bonito.
Riram-se ambas, como sabiam que Oxior teria feito.
Dirigiram-se então para a pequena aldeia da ilha.
– Tenho pena de não o ter conhecido melhor. Pelo menos co-
mo tu o conheceste – comentou Annya com Alexis.
– Ele era uma pessoa adorável. E às vezes fazia coisas que eu
não esperava de modo algum ver um Deus a fazer – acrescentou
Alexis, sorrindo ao lembrar-se das caretas que ele lhe fazia quando
picava Fred.
Uns minutos depois chegaram a casa de Alexis. Recebera-a
durante o seu treino em Avalon e vivia nela desde que se aperce-
bera de que nunca conseguiria voltar a ter uma vida normal na
Terra. Esta abriu a porta e correu a ver as suas plantas.
– Eu pedi à Aldor que viesse dar-lhes água ontem quando che-
gasse do casamento, mas tinha de ir vê-las na mesma – desculpou-
-se ela perante o sorriso trocista de Annya.
Como se tivesse sido invocada, Aldor apareceu nesse momento,
abrindo a porta com a chave que Alexis lhe dera. A atlética mulher,
considerada a melhor ferreira de Avalon e uma excelente mestre-
-de-armas, nada tinha que deixasse adivinhar a quem a visse que
ela era a mãe de Raptor, o que era normal, tendo em conta que os
caçadores tinham aspecto demoníaco apesar de serem sempre filhos
de uma mãe humana.
– Olá, olá! Tudo bem desde ontem?
Após apertar as duas raparigas num abraço, Aldor voltou-se
para Alexis.
– Já calculava que também viessem. Às vezes não entendo estes
elementares. São muito organizados, mas ao mesmo tempo conse-
guem tomar decisões que, apesar de muito ponderadas, parecem

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