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Aporia Poesia e Pensamento: dever da escrita

Do dever sem sentido: a obra de Samuel Beckett

“É preciso continuar, não posso continuar, vou continuar. ”1

Introdução

A dificuldade, aqui, está na expressão. Expressar, sinta-se, não em estado de


simplicidade, não em estado de naturalidade de vida, mas de dificuldade, de falta, de
falta de vida: a expressão no limite da linguagem ou da vida. Expressar, então, não a
língua enquanto sistema vivo e orgânico, mas seu contrário, aquilo que ela carrega de
perigoso, de limite: de morte.

A dificuldade, então, está em situar, encontrar seu lugar ou dar sentido, a obra de
Samuel Beckett. Nascido na Irlanda, Becket (1906-1989), em contraste a sua obra, teve
uma vida pacata. Não que sua obra seja, de alguma maneira, alguma coisa. Não. Mas
em contraste, ao menos no que diz respeito a composição de suas personagens:
destruídas, podres, pobres e, às vezes, desprovidas de corpo, ou mesmo de fala, até.
Não. Beckett foi um homem querido, e que sempre que retratado, seja por
entrevistadores (que, aliás, se deixou conhecer por poucos: é sabido o asco que Beckett
cultivava contra a fama e tudo que a envolvia; não foi receber o Nobel que ganhou pelo
Godot por exemplo) ou pessoas mais próximas, era descrito como uma pessoa de
caráter e de capacidades intelectuais incontestáveis 2.

Sua obra, se situada historicamente, dá conta desse período que ficou conhecido como
o pós-guerra; um período estranho se pensado artisticamente. A primeira e segunda
guerras haviam interrompido os projetos de revolução artísticas iniciados pelas
vanguardas. De fato, foram poucos os artistas que, durante e após a guerra,
conseguiram manter a coesão do projeto vanguardista.

O pós-guerra, então, se o entendermos como Perloff3 o entende, foi a retomada dos


projetos estéticos incitados pelas vanguardas do início do sec XX. No panorama mundial
da produção literária dos anos 40-50, a literatura parecia ter esquecido as explosões e

1 “O inominável”, pag. 137.


2 “Samuel Beckett” pg., 7-9
3 “O gênio não original”, pg. 95
implosões pelas quais havia sido submetida pelas vanguardas. O dada, Joyce, Stein etc.
todxs pareciam não ter existido.

Diante deste apagamento, então, era necessário que algo fosse feito.4

Deste algo, surge um movimento que, a título de categoria somente, parece reiniciar os
experimentos e problemáticas propostos pelas vanguardas. Talvez mais do que um
movimento, e menos do que um gênero literário propriamente, o Roman nouveau tinha
como horizonte reintegrar e atualizar a literatura diante de tudo que estava ou tinha
acontecido.

No entanto, existe algo que distancia Beckett da ideia do Roman nouveau. Sim, nós
temos a experimentação com a linguagem, tão cara às vanguardas por exemplo. Sim,
nós temos a fragmentação da narrativa; uma certa tendência a dissolução do “eu” que
narra, eu que, depois de duas guerras, não poderia simplesmente sair incólume. Mas o
que distancia Beckett de todxs seus contemporâneos não é nem tanto a experimentação
com a forma nem tanto o conteúdo (pois sim, Beckett participa também de uma certa
tradição do humor negro, que atravessa os surrealistas e chega também ao Roman
nouveau através da Oulipo, por exemplo).

O que o distância é justamente a impossibilidade de expressão. Beckett é o único que


coloca em cheque a ideia da expressão do autor enquanto tal, expressão que, querendo
expressar-se, expressa-se e elimina uma certa ideia de silencio. Já aqui, a aporia: como
expressar a impossibilidade de expressão, como expressar nada, ou reduzir a linguagem
a tal estado em que ela consiga expressar somente aquilo que lhe falta: o silencio?

Este artigo tentará dar conta, então, da questão da expressão, ou melhor, do dever da
expressão que atravessa a obra beckettiana. Para fins metodológicos, apontamos desde
já que das suas obras, as que serão mais extensamente utilizadas serão a trilogia do pós-
guerra, a peça esperando Godot, -- responsável, aliás, por torna-lo um escritor
consagrado -- e sua prosa posterior, que vai da dec. de 60 até os anos 80.

4“Ou será que a literatura, solitária, deve permanecer atrasada em seus velhos caminhos preguiçosos
que há tanto tempo foram abandonados pela musica e pela pintura? Há alguma coisa paralisantemente
sagrada na natureza viciosa da palavra que não se encontra nos elementos das outras artes? Há alguma
razão pela qual a terrível e arbitrária materialidade da superfície da palavra não seria capaz de ser
dissolvida [...] beckt entrevista 169
Falar não falar

“Onde agora? Quando agora? Quem agora? ”5

O artista, diz-se comumente, manifesta-se, ou melhor, expressa-se através de seu


suporte. O fim da arte, o que ela tem de finalidade, visto sob esta perspectiva, é a
expressão. Poderíamos, ainda, substituir finalidade (fim) por dever: é dever da arte
expressar aquilo que o indivíduo que a produz sente; é dever da arte representar (e aqui
já vislumbramos uma certa relação entre representação e expressão) uma determinada
classe; etc. Já possuímos, então, desde de já, duas palavras que nos serão muito caras
ao longo desse artigo: “dever” e “expressão”. Ou melhor, não muito essas duas palavras,
mas a relação que surge entre elas, ainda mais se pensadas dentro do campo da arte,
ou mais precisamente, da literatura. Mas, que relação é essa?

Com relação, queremos dizer algo que está entre as duas palavras. Poderíamos ainda
dizer que, no intervalo gráfico entre as duas palavras “dever expressão”, seria ali que
encontraríamos a relação que procuramos, marcada graficamente pelo intervalo, pelo
“branco da página” entre uma palavra e outra, “o silencio”, enfim: mas sabemos que o
suporte, a escrita, não suporta o silencio. E aqui, já no início, o fim: o silencio. No entanto,
é desse limiar, desse silencio impossível, desse intervalo inexprimível entre uma palavra
e outra, que surge a relação que queremos estabelecer entre dever e expressão na obra
de Beckett.

Sejamos mais sucintos, quase silenciosos. Desde já, é importante que pensemos a
respeito do limiar entre “expressão dever”. Expressar, quer dizer. Aquele que expressa,
que se manifesta, se não diz, se não usa palavras (ora, quantas vezes o corpo não é
expressão mais forte que as palavras? Beckett, por exemplo, em todas as suas peças, foi
especialmente atento a isso), possui a capacidade de produzir palavras. Dito de forma
mais sucinta: a expressão gera a expressão.

O mesmo pode ser dito, só que de outra maneira, a respeito do dever. O dever gera
dever, poderíamos dizer. E aqui, cabe fazer uma elucidação a respeito do que queremos
dizer. Dever, usamos ele também no sentido kantiano, esse prescrito pelo imperativo
categórico ("ele é valido em toda e qualquer situação [...] e tem, com isso, a capacidade
de explodir qualquer contexto [...]é incondicional, no sentido de não ser condicionado
por alguma finalidade outra", nos lembra Safatlle6), mas pensamos mais na noção de

5 Beckett, inominável pag. 5.


6 Safatle, O dever e seus impasses, pag. 12-13.
dívida que todo dever carrega. Por isso dizemos que o dever gera o dever: aquele que
cumpre um dever, ou melhor, que tem um dever a cumprir, entra em dívida com um
outro, mesmo que não nomeado; e assim, essa regra aplica-se ad infinutum ao outro,
também sempre em dívida com o “eu”. Poderíamos, ainda, pensar de forma mais fractal
ainda: o dever nos obriga a dever.

Pensar no dever enquanto dívida e na expressão enquanto querer dizer, ou melhor,


relacionar essas duas formas se torna particularmente complicado se pensarmos na
escritura beckettiana.

A começarmos pela segunda noção -- a do dever -- beckett orienta sua escrita para nada.
Não à toa blachot, em um ensaio dedicado ao inominável7, coloca em questão não tanto
o dever em si, mas a idea da orientação da fala beckettiana: “Ou então ele entrou num
círculo onde gira obscuramente, arrastado pela fala errante, não desprovida de sentido,
mas desprovida de centro”. Urge agora que nos atrasemos um pouco mais na palavra
errar. Ora, errar não é só estar em condição de erro, como também é não possuir um
caminho, ou seja, não possuir algum lugar (ou, ainda, como poderíamos pensar no caso
da fala, algo ou alguém) para onde se orientar. Da falta de orientação, então, surge
algum lugar.

Se pensarmos, por exemplo, no inominável, é daí, então, que surge seu dever: da falta.
Porém, como podemos dever algo que não possuímos? Ou melhor, como podemos
dever nada? Para continuarmos, ou melhor, tentarmos continuar, é necessário que
lancemos mão da ideia de aporia. Pois, é evidente, possuímos uma aporia em mãos: se
o dever é aquilo que deve (e, ao dialogarmos com Kant e sua noção de imperativo
categórico, possuímos uma assertiva nesse sentido) como ele pode ser dever sem ser
devendo? Ou, como nos lembra Derrida: “quem ousará chamar dever um dever que
nada deve, ou melhor, ou pior, que deve nada dever?”8.

A questão agora está em compreender de onde vem esse “dever que deve nada dever”
na obra de Beckett. É curioso pensarmos que, segundo Kant, o dever deve possuir uma
motivação em si mesmo, ou seja, para que ele seja legitimamente um dever, ele não
deve recorrer à outra justificativa que não uma espécie de amor injustificável pela
vontade de realizar um dever. Para ele, por exemplo, se realizamos um dever porque
nos sentimos obrigados, ou porque temos medo de uma sanção, é como se não
realizássemos completamente esse dever, ou antes fossemos “escravos” de nós
mesmos, de um certo desejo dentro de nós que quer ser realizado. Ora, realizar um
dever para que exista a satisfação de um desejo, ainda segundo a ideia de dever
presente em Kant, seria não se libertar através do dever, mas antes nos tornar escravos
de uma certa pulsão fisiológica ou inconsciente. Nesse sentido, o ser jamais alcançaria a
transcendência que a ideia do dever, enquanto dever como fim em si mesmo,
proporciona. É interessante, ainda, repararmos que, para Barthes, a escrita nasce como
a satisfação de um desejo 9 , logo, segundo as prescrições kantianas, ela não poderia
existir enquanto dever legitimo, pois uma vez que fosse atendido o desejo, o dever, no

7
8
9 “A preparação do romance, vol II”, pg. 11.
sentido de algo que atravessa as pulsões do eu e nos faz continuar de qualquer maneira,
cessaria de existir, ou se tornaria apenas mais um desejo a ser satisfeito.

Se demoramos, ou mesmo, se procrastinamos para, enfim, alcançar a obra de beckett


propriamente, é porque a espera, a procrastinação e a demora estão intimamente
ligadas ao dever em sua obra. Nesse sentido, temos na segunda parte da trilogia do pós-
guerra, Malone Morre, o melhor exemplo. Malone, não sabe onde está, não sabe o que
foi seu passado e nem como foi parar ali. Malone, o que sabe Malone então, é que sua
morte está, quem sabe, próxima. Para Malone o que existe é a proximidade de sua
morte. Algo de interessante aqui. Ao invés de calar-se, ou assumir a possibilidade de seu
fim iminente, ele fala. Ou melhor, antes de falar, nos conta histórias. Wolfgang iser 10
nos aponta, agudamente, que este momento que atravessa o momento de suas
histórias e o momento de sua possível e iminente morte, é o momento da espera, ou
melhor, o momento em que Malone nos apresenta a espera pela morte. Tudo que nos
diz Malone -- a possibilidade já existe desde o início -- o tempo todo, são histórias
supostamente inventadas para fazer passar o tempo. Para, enfim, esperar o tempo de
sua morte. Dai a ideia de que Malone nos apresente 11 o tempo da espera; cada palavra
sua, cada historia que nos conta, só está ali para que, em algum momento, ele alcance
seu fim.

No entanto, ainda nos resta algo a dizer. Em Malone, possuímos uma associação direta
entre a palavra (a fala, a habilidade de narrar ou contar historias) e a morte, ou melhor
o intervalo entre a narração e a morte ( é importante que não nos esqueçamos daquela
relação silenciosa entre “expressão dever”). De fato, o próprio Malone traça essa
relação (Enquanto espero, vou tentar me contar historias, se puder. Não o mesmo tipo
de historias de antigamente, sem duvida. Não serão nem bonitas nem feias, serão
calmas, não mais haverá nelas nem fealdade nem beleza nem febre, serao quase sem
vida, como o narrador 6). E ela fica mais evidente e intensa no momento em que ele
relativiza a questão do nada em relação ao ato de narrar. “Nada é mais real que nada”.
Seu dever, então, enquanto narrador, escritor de uma historia, está associado ao nada:
o que o motiva, é nada, é uma espera pela morte, uma espera pelo momento em que
tudo, até a linguagem, se torna nada. Porém, é importante que entendamos aqui o nada
não como os existencialistas da época de beckett o entendiam – principalmente aqueles
associados ao movimento do Roman nouveau. Todxs xs outrxs (um Sartre por exemplo)
enxergavam o nada ainda como representação; existia, portanto, um dever que não
deixava em evidencia a aporia presente no exercio da escrita. Mas que aporia é essa,
então? Segundo o próprio beckett, é a expressão, a crença do escritor que, ao escrever,
ao expressar-se, acredita-se no dever e na capacidade de representar o nada. Em
beckett, pelo contrário, temos um dever orientado não para a representação ou a crença
de se poder dizer nada (ou alguma coisa sobre o nada), mas sim para a noção de
apresentar o exercício do nada na linguagem, deixar em evidencia aquilo que, na
linguagem, é o limite entre a expressão e os buracos, os nadas, que a própria linguagem,
por incapacidade de representar o nada, carrega. Daí a escrita em Malone estar nos
limites entre o que a linguagem deve representar enquanto mecanismo de expressão e
o que aquilo que ela não consegue representar, senão apresentar: a espera pela morte.

10
11
A escrita, então, se torna a espera pelo nada – a morte -- que irá, enfim, encerra-la.
Esperar a morte; esse é o dever, a aporia, que beckett exercita nos limites de seus textos
– principalmente nos do pós guerra.

Dito isso, podemos retornar à questão que, silenciosamente, nos esperava: “expressão
dever”. É necessário que agora, no entanto, recorramos as palavras do próprio beckett:

“a obrigação de que não há nada a expressar, nada com que expressar, nada a partir do
que expressar, nenhuma possibilidade de expressar, nenhum desejo de expressar,
aliado à obrigação de expressar. (a tradução perde o sentido positivo de “nothing to
express” – grifo nosso)

(é necessário que pensemos na língua em que, antes, esse comentário nos foi
pronunciado. Em português, por causa da dupla negativa, “não... nada”, perdemos uma
certa noção “positiva” que o inglês carrega ao se referir ao nada (“nothing to express”,
no original – incapacidade de tradução que, de resto, só acentua os “buracos” da
linguagem12).

Aqui fica evidente a relação aporetica entre “dever” e “expressão” na obra de beckett.
Beckett enxerga como” obrigação” do escritor expressar-se; porém, a grosso modo, ele
deve expressar-se sem ter o que ou com o que expressar. Ou seja, podemos ler, ainda,
sua expressão, sua forma de expressão, como uma forma vazia, que é motivada por um
dever mais vazio ainda: expressar nada. Ou melhor, esburacar a linguagem, até que dela
“reste nada ou alguma coisa”.

É interessante, ainda, repararmos que, se falamos em apresentação ao inves de


representação, é porque em beckett existe um esforço formal para fazer da língua
menos, vira-la quase que ao avesso e, de novo aporeticamente, fazer com que ela
expresse nada.

De novo, nada. É nesse sentido que deleuze, por exemplo, enxerga na escritura de
beckett uma tendência ao esgotamento de possibilidades, ou da própria linguagem
mesmo. Para tanto, ele opõe à noção de esgotado a de cansado. Para ele: “o cansado
apenas esgotou toda realização, enquanto o esgotado esgota todo o possível. O cansado
não pode mais realizar, mas o esgotado não pode mais possibilitar”13. Impossibilitadas
de possibilitar, todas as vozes nas obras de beckett, no entanto, continuam (de fato, o
próprio beckett em uma outra entrevista ainda nos diz que, quanto mais escreve, maior
a dificuldade que tem de escrever – quanto mais, menor a possibilidade).

Aliada à estratégia do esgotamento, existe uma outra ainda: a do esburacamento. Com


eburacamento, beckett quer nos dizer aquilo que todo suporte é incapaz de dizer: o
silencio (de novo, uma outra aporia, uma fala que não fala, uma escrita que não escreve).
Aqui temos um sintoma muito forte de toda a obra de beckett (principalmente a do pós-
guerra em diante): o silencio é gerado por uma incapacidade, por uma perda mesmo.

12 “Samuel Beckett: O Silencio possivel”, pag. 175.


13 “Sobre o teatro”, pg. 67.
Nesse sentido, o próprio beckett chega a comentar, em contraste ao finniganwake de
joyce, que o primeiro considera “work in progress”, que sua obra seria um “work in
regress”14. Ou ainda, como o próprio autor de godot viria a colocar em algum outro lugar,
uma “literatura da despalvra”15. beckett silencia-se, não, não se silencia, mas ao dizer,
nos diz nada.16

14 “Como é”, pag. 196.


15 É interessante, aqui, traçarmos uma relação entre a obra de Beckett e a de outro artista do sec. XX:
Duchamp. Este também, assim como aqule, possuía um projeto de desconstrução do suporte que
utilizava para se expressar. A diferença, é que Duchamp estava muito mais interessado em relativizar a
importância do suporte, principalmente diante de uma certa noção de artista visual no ocidente,
colocando em cheque principalmente a noção de autoria. Já em beckett, é muito mais sintomática a
incapacidade de expressão do suporte; daí sua necessidade exaustiva de esgotar a linguagem.
16 “tomara em que chegue o tempo, graças a deus que em certas rodas já chegou, em que a linguagem é

mais eficientemente empregada quando mal empregada. Como não podemos eliminar a linguagem de
uma vez por todas, devemos pelo menos não deixar por fazer nada que possa contribuir para sua
desgraça. Cavar nela um buraco atrás do outro, até aquilo que está a espreita por trás – seja isso alguma
coisa ou nada – comece a atravessar; não consigo imaginar um objetivo mais elevado para um escritor
hoje.”
Conclusão

Assim como a distancia entre uma palavra e outra, o branco, o silencio que ela carrega,
pode ser imensurável, assim a dificuldade de se alcancar um conclusao que queria dizer
alguma coisa a respeito da obra de beckett.

De fato, a questao apresentada por ele parece assombrar boa parte do pensamento
ocidental da segunda metade do seculo XX. É um assombro tanto no sentido daquilo
que, mesmo ausente, ainda faz sentir sua presenca17; mas tambem como uma especie
de “encosto”, uma obra que coloca uma questao eternamente insolúvel e que é capaz
de deixar com um pé atrás mesmo os pensadores mais ousados, como um derrida por
exemplo.

Seja por isso ou por aquilo, certo é que essa relação entre o dever e a expressao esta
longe de ser conciliada. Mesmo hoje, se pensarmos na proliferação de signos que chega
até nós via web, é difícil saber, exatemnte, o que motiva, no sentido forte da palavra,
daquilo que está por trás, todas esses signos e qual a relação que eles possuem com a
realidade, se é que essa já não foi substituída. Ou melhor, não substituída, mas qual era
mesmo a diferença entre nada e nada ? nada é mais real que nada.

17 como não pensar aqui, por exemplo, na ideia de sociedade do espetáculo,


apresentado por guy debord, onde a representação se torna sinônimo de vazio e o dever
que a motiva uma espécie, também, vazia de dever, na medida em que é motivado pela
transformação da representação em capital – de novo, uma outra representação: ou
seja, a representação retorna à representação e é motivada pela representação
esvaziando, assim, qualquer tipo de dever ou representação possível – como não sentir
a obra de beckett ecoando aqui, mesmo que debord não intensificasse-o abertamente
como uma influencia.)
Bibliografia

BECKETT, Samuel. Como é: 1. ed. São Paulo: Iluminuras, 2002. Pg 196


BECKETT, Samuel. Malone Morre: 1 ed. São Paulo: Circulo do Livro S.A., 1986.
DERRIDA, Jacques. Aporias: morrer—esperar-se nos “limites da verdade”: 1 ed. São
Paulo, 2018.
Sociedade do Espetáculo
ANDRADE, Fábio se Souza. Samuel Beckett, O silencio possível: 1. Ed. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2001.
BECKETT, Samuel. O inominável: 1ªed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.
SAFATLE, Vladimir. O dever e seus impasses: 1ªed. São Paulo: Martins Fontes, 2013.
BLANCHOT, Maurice. O livro por vir: 1ªed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
O genio não original
BARTHES, Roland. A preparação do romance vol II: 1ªed. São Paulo: Martins Fontes,
2005.
DELEUZE, Gilles. Sobre o teatro:1ªed. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.

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