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AS DIFICULDADES DA PROPULSÃO NUCLEAR EM

LARGA ESCALA NO BRASIL


RENAN RODRIGUES NASCIMENTO ZAMPILIS

MARÇO/2019

ORIENTADOR: CMG (RM1) PAIVA

Resumo

A energia nuclear é uma das fontes de energia mais limpas no planeta. Para seu
desenvolvimento e utilização, considera-se o Estado como o principal ator, sobretudo pelo
alto grau de sensibilidade tecnológica envolvida nos processos científicos, além do regime
internacional de segurança que salvaguarda as atividades nucleares dos países a que se
sujeitam. Sob tal contexto, Navios de grande porte e com grande capacidade de dissuasão,
como submarinos e Navios Aeródromos, buscam a energia nuclear como uma alternativa
mais eficiente para a sua propulsão, conhecida como propulsão nuclear. No Brasil, entretanto,
o desenvolvimento da energia nuclear como forma de propulsão encontra diversas
dificuldades que vão desde restrições impostas pelos tratados internacionais, que regem as
atividades nucleares, até dificuldades políticas, econômicas e aquelas relacionadas à pesquisa
científica. O objetivo deste artigo é elucidar a importância da energia nuclear na propulsão
naval e suas consequências para o Estado Brasileiro, dando ênfase nas dificuldades
relacionadas à pesquisa científica, política e economia.

Palavras-chave: Propulsão Nuclear, PROSUB, Programa Nuclear da Marinha.

Introdução

As pesquisas científicas relativas à Energia Nuclear remetem aos anos 1930 e 1940,
com as primeiras pesquisas nucleares realizadas na Universidade de São Paulo (USP),
período em que também foram encontradas as primeiras reservas de urânio no país. No
entanto, somente em 1965 o país conseguiu desenvolver a tecnologia suficiente para a
construção de um reator nacional.
Em 1970, ainda dependente do fornecimento do urânio enriquecido, o Brasil propôs
um acordo com a Alemanha para a construção de reatores nucleares no país e a transferência

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de tecnologia para domínio do enriquecimento do urânio. Entretanto, pressões internacionais
exercidas sobre o acordo firmado entre Alemanha Ocidental e Brasil, a fim de impedir o
acesso à tecnologia de enriquecimento de urânio, fizeram com que o país buscasse
desenvolver sua própria tecnologia de geração de energia nuclear.
Em 1979, inicia-se então o Programa Autônomo de Tecnologia Nuclear (PATN),
conhecido como Programa Nuclear Paralelo, com o objetivo de desenvolver a estrutura
nacional e fazer uso da energia nuclear em larga escala, permitindo a produção de explosivos
nucleares para fins pacíficos e, principalmente, a propulsão naval. A partir de tal perspectiva,
o desenvolvimento nuclear brasileiro motivara-se no desenvolvimento tecnológico autônomo
e nos avanços da Argentina no assunto.
A partir de 1990, o Programa Nuclear Paralelo deixa de existir sob a forma que havia
sido criado e o Brasil começa a ingressar em diversos acordos internacionais que normatizam
a questão nuclear. Nos anos 2000, o Programa Nuclear Brasileiro volta a ser uma das
prioridade do Estado, fato evidenciado na publicação de documentos que realçam a
importância do setor nuclear, como a Estratégia Nacional de Defesa e o Livro Branco de
Defesa Nacional, além do foco no acordo anteriormente realizado junto ao governo francês
para a construção de quatro submarinos convencionais e a construção da parte não nuclear
do futuro submarino de propulsão nuclear da Marinha do Brasil.

Regulamentação Internacional

O Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), criado na década de 60,


é um conjunto de normas que objetivam o desarmamento mundial de armas nucleares, por
meio da cooperação dos países, onde a aplicação da tecnologia nuclear é utilizada para fins
pacíficos. A fim de fiscalizar o que foi preconizado no tratado, garantir a não proliferação e
o desarmamento, foi criada a Agência Internacional de Energia Atômica (Internacional
Atomic Energy Agency-IAEA), em 1957, cuja responsabilidade é fiscalizar o sistema nuclear
internacional.
O TNP é o principal tratado internacional e estipula deveres tanto para Estados que
usam a tecnologia nuclear para dissuasão, quanto para Estados que utilizam tal tecnologia
para não proliferação.
O Brasil, seguindo seus princípios constitucionais e como histórico contribuinte para
as negociações de não proliferação, é signatário do TNP desde 1998. O país compreende que
a existência de documentos normativos com o objetivo de reduzir ou eliminar os armamentos
nucleares, quando feito de forma multilateral, cria um ambiente de confiança mútua entre as
Nações. Entretanto, o TNP tem sido alvo de diversas críticas por parte do Brasil,

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principalmente pelos escassos avanços na desnuclearização dos Estados que utilizam a
energia nuclear para dissuasão, por tratamento diferenciado entre os Estados e pelo receio de
que o tratado possa significar uma restrição ao acesso à tecnologia nuclear.
Segundo o Livro Branco de Defesa Nacional, o tratamento diferenciado dado aos
países que realizam testes nucleares, além do desequilíbrio entre os objetivos do TNP,
somados à ineficácia da simples redução de arsenais nucleares, demonstram a pouca
efetividade das doutrinas do TNP. Sendo assim, a posição do Brasil em relação ao tratado
tem sido de resistência aos acréscimos apresentados, sem que antes haja um avanço
significativo na esfera do desarmamento nuclear.
Nota-se que para compreender a questão do desenvolvimento da propulsão nuclear
no Brasil, é necessário considerar os fatores internacionais como influenciadores das ações
do país no âmbito interno, dada a sensibilidade tecnológica envolvida, além do caráter
político-estratégico. Dessa forma, a atual regulamentação internacional representa uma,
dentre as diversas dificuldades da propulsão nuclear em larga escala.

Políticas Públicas

As políticas do governo brasileiro em relação à atividade nuclear sempre divergiram


ao longo dos anos. O principal questionamento no início das atividades nucleares do país era
definir qual o caminho a seguir: buscar a autonomia no setor ou se aproximar de países que
já exportavam a matéria prima, que é o componente elementar das atividades nucleares.
Em 1951, foi fundado o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), com o objetivo de
permitir ao Brasil intensificar a exploração de suas potencialidades na área nuclear de
maneira independente. Segundo Jesus (2011), o CNPq foi considerado a maior agência
brasileira voltada para o desenvolvimento nuclear, delineando as ações brasileiras nessa área.
Já em 1952, foi criada a Comissão de Exportação de Materiais Estratégicos (Ceme),
responsável pela venda de urânio e de outros compostos minerais. Segundo Brandão (2008),
a Ceme foi responsável pelas decisões políticas da questão nuclear, enquanto o CNPq era
responsável pelo apoio científico e tecnológico.
A partir da segunda metade dos anos 1960, surge a preocupação do governo brasileiro
com o conceito de “segurança nacional”. Tal conceito trazia consigo a concepção da
necessidade do país de possuir autonomia em setores sensíveis, como o nuclear. Segundo o
então Presidente da República, Costa e Silva, “ a energia nuclear é o recurso mais poderoso
a ser colocado ao alcance dos países em desenvolvimento para reduzir a distância que os
separa das nações industrializadas”.

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Sendo assim, os conceitos de segurança e desenvolvimento tornaram-se os
orientadores da política nuclear brasileira, considerada, a partir de então, como assunto de
Estado. Tal fato justifica a não assinatura do Tratado de Não Proliferação de Armas
Nucleares, na sua concepção, em 1970. A assinatura só foi feita em 1998.
A segunda metade da década de 70 é considerada um período de definição dos rumos
da política nuclear brasileira. Foi Criada a Nuclebrás, órgão responsável por delinear os
termos do Acordo Nuclear entre Brasil e Alemanha. Segundo Kuramoto e Appoloni (2002),
a grande questão desse acordo era dar continuidade a pretensão dos governos militares em
fazer do país uma grande potência. A energia nuclear era considerada a solução do problema
da dependência em relação à energia elétrica, uma vez que as hidrelétricas não supriam as
necessidades por completo e a importação de carvão e petróleo geravam dependência.
Segundo Brandão (2008), a crise do petróleo de 1973 somada ao esgotamento da matriz
hidrelétrica brasileira eram as principais questões apontadas pelos gestores da época.
Seguindo a busca pela autonomia, o PATN, pautava-se na aquisição da tecnologia
nuclear por meios próprios. No seu período de desenvolvimento foi vinculado à Presidência
da República e supervisionado pelo Conselho de Segurança Nacional. O PATN pode ser
considerado o programa que mais associou entidades do meio civil e militar, no que diz
respeito à tecnologia nuclear. Segundo Barletta (1997), apesar da grande discordância de
interesses, a heterogeneidade não causou desordem no interior do programa, uma vez que
todos os envolvidos entendiam a importância da autonomia tecnológica. O quadro abaixo
demonstra os diversos objetivos que os órgãos participantes buscavam atingir através do
programa.

Figura 1- Fonte: Brasil (1985)

Estando inserida no contexto do PATN, a Marinha do Brasil demonstrava seu


interesse em adquirir um submarino de propulsão nuclear. Entretanto, considerando a
inviabilidade de se ter o conhecimento por transferência de tecnologia, por motivos já citados
anteriormente na questão entre Brasil e Alemanha, decidiu por concentrar suas pesquisas no

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desenvolvimento do enriquecimento do urânio por ultracentrifugação. Porém, um dos
problemas do projeto era a questão dos limites da plataforma continental brasileira, tendo o
governo iniciado um estudo em 1980 e obtendo resultados em 2004.
Já na primeira década do século XXI, o Programa Nuclear Brasileiro volta a ser pauta
do Estado e as ações públicas de apoio a propulsão nuclear se fizeram mais visíveis. Sob tal
perspectiva, podemos destacar o fato da concretização, em 2006 da produção e domínio da
tecnologia do ciclo do combustível nuclear no Brasil.
Outra ação do governo brasileiro para suprir a dificuldade da implantação e
desenvolvimento da energia nuclear, foi a criação da Unidade Produtora de Hexafluoreto de
Urânio, em Aramar, além da criação do Laboratório de Geração de Energia Nucleoelétrica
(Labgene), que significaram os dois grandes projeto do Programa Nuclear da Marinha
(PNM).
Por fim, sob as orientações da Estratégia Nacional de Defesa, o PNM recebeu a
finalidade de atender ao Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB), que é
considerado o mais importante empreendimento da Marinha do Brasil nos últimos tempos.
Tratando-se especificamente da área nuclear do programa, nota-se que não há troca de
conhecimento entre França e Brasil. Toda tecnologia nuclear está sendo desenvolvida pelo
Brasil, através do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP) e de Aramar.
Segundo pesquisadores que atuam no desenvolvimento da propulsão nuclear do
submarino brasileiro, o PROSUB está promovendo um grande avanço na área científica e
levando a indústria nacional a um patamar de sofisticação. Entretanto, coube ao Estado e suas
políticas voltadas ao desenvolvimento, o investimento de cerca de R$ 23 bilhões no
programa, fazendo do PROSUB o maior programa de capacitação industrial e tecnológica da
história da indústria brasileira.

Dificuldades econômicas

Assim como todo grande projeto de Estado, o desenvolvimento da propulsão nuclear


no Brasil ficou suscetível às crises que permearam o país ao longo dos anos. Por exemplo,
segundo estudos da Fundação Getúlio Vargas, os anos 1990 podem ser considerados a
“década perdida” para as atividades nucleares no Brasil. De um lado, houve grande
dinamismo para aceitação dos regimes internacionais de não proliferação, por outro lado, as
atividades nucleares viveram uma fase de decadência por efeito da crise econômica entre os
anos 1980 e 1990.

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É importante destacar que entre os anos de 2010 e 2013 houve um crescimento no
investimento do governo no PROSUB. Em 2013, através da inclusão do programa no
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o governo deu o maior repasse para o
PROSUB de todos os anos. Porém, segundo a Coordenadoria-Geral do Programa de
Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear (COGESN), a partir de 2014 o
repasse começou a entrar em declínio devido aos sintomas da crise mundial que começaram
a ser sentidos no país através daquele momento.

Figura 2- Fonte: www1.mar.mil.br/ccimar/relatorios-de-auditoria

Vale destacar ainda a recente crise econômica e política brasileira de 2015 e os ajustes
econômicos feitos pelo governo, fato que culminou no encolhimento nas obras do Estaleiro
de Manutenção e na Base Naval de Itaguaí. Outro fator de destaque foi o escândalo de
corrupção que deflagrou a Operação Lava Jato, tendo como principal personagem a empresa
brasileira Odebrecht, principal aliada da Marinha do Brasil no PROSUB. Segundo Charleaux
(2017), a Marinha do Brasil foi severamente abalada e acometida, o que acarretou no atraso
do projeto estimado em seis anos.
Por outro lado, segundo o Almirante Bento Albuquerque em recente palestra
ministrada ao clube de engenharia, “nós temos um paradoxo: o país que tem a sétima reserva
mundial de urânio utiliza apenas 2,2% de energia nuclear em sua matriz energética. Se nossa
matriz toda fosse nuclear poderíamos prover energia para o país por 100 anos”. Dessa forma,
percebe-se que fazer uso da propulsão nuclear em larga requer um conhecimento atípico e
também de uma nova visão a cerca da empregabilidade do urânio enriquecido como forma
de energia. No que diz respeito ao conhecimento, segundo dados apresentados pelo próprio
Almirante, foram investidos cerca de 5 bilhões de reais em capacitação de técnicos e
engenheiros no exterior, além de 480 milhões de reais na Nuclebrás Equipamentos Pesados

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S/A, indústria de base vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e
Comunicações.
Sendo assim, constata-se que além de políticas públicas voltadas para o
desenvolvimento da propulsão nuclear, é necessário um volume de investimento muito
grande para que o Brasil possa desenvolver todo o ciclo de enriquecimento do urânio e para
que a tecnologia necessária fosse completamente incorporada e periodicamente renovada, a
fim de fazer do Brasil um dos 5 países capazes de construir e operacionalizar um submarino
de propulsão nuclear.

Figura 3- Fonte: COGESN

Dificuldades produtivas, tecnológicas e de recursos humanos

O processo de propulsão tem o objetivo de fazer uma embarcação sair de um estado


de repouso para o movimento por meio de diferentes métodos. De modo específico, no caso
da propulsão nuclear, a água ou o vapor são aquecidos por meio da energia liberada por
reações nucleares. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a propulsão
nuclear pode ocorrer através de três modelos distintos: propulsão por fissão nuclear,
propulsão por decaimento de isótopos radioativos e propulsão por fusão nuclear.

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O Livro Branco de Defesa Nacional define que a propulsão nuclear no Brasil engloba
o projeto específico do ciclo de combustível e o projeto de geração nucleoelétrica. Mesmo
que no segmento possa ser utilizado um dos três métodos de propulsão, atualmente no Brasil
é utilizada a propulsão por fissão nuclear.
Para que seja realizada a fissão nuclear, é necessária a utilização de materiais físseis,
como por exemplo o urânio 235 (U-235), que passa por um processo de enriquecimento. Para
que o urânio tenha condições de gerar energia é necessário o pleno atendimento dos vários
processos que compõe o ciclo do combustível nuclear, como ilustrado na figura abaixo:

Ciclo do combustível nuclear

Figura 4- Fonte INB(2015)

A dificuldade inicial para domínio do ciclo do Urânio era o processo de conversão,


que consistia em transformar o concentrado de urânio, conhecido por especialistas como
“yellow cake”, em estado gasoso, tornando-se hexafluoreto de urânio (UF6). Entretanto, após
a criação da Unidade Produtora de Hexafluoreto de Urânio (Usexa) nas instalações do Centro
Experimental de Aramar (CEA), o problema da etapa da conversão foi solucionado.
Destaca-se também o processo de geração, onde a energia é produzida através da
reação em cadeia proveniente da fissão do núcleo do átomo. Nessa etapa a energia produzida
pode ser utilizada para atender as demandas de energia nucleoelétrica e para os mecanismos
de propulsão nuclear. Para que tal fenômeno ocorra, é necessária a utilização de reatores
nucleares e de seus elementos de controle, principalmente, por controlarem a quantidade de
energia que é liberada na reação.
Outra grande dificuldade de um propulsor nuclear é confiança de que os elementos
de controle, conhecidos como barras de controle, sejam movimentadas de forma a controlar
a quantidade de energia que as barras de combustível liberam, de maneira eficiente, tendo

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em vista a grande quantidade de energia liberada na reação e os imensuráveis danos que uma
explosão nuclear poderia ocasionar.
Segundo o relatório do mapeamento da Base Industrial de Defesa, atualmente, no
Brasil, as empresas que foram selecionadas e que participam do segmento de propulsão
nuclear estão, em sua maioria, incluídas no patamar de pequenas e médias empresas. Segundo
o mesmo relatório, são, em sua maioria, empresas fundadas por militares da reserva com
conhecimento que fora adquirido no exterior, no período em que ainda estavam em atividade.
O grande problema consequente da realidade apresentada pelo relatório é que esse
tipo de conhecimento proporciona produtos com inovações próprias, porém com uma
produção pequena, por falta de grandes volumes de investimento que poderiam causar um
crescimento contínuo, que atenderia as demandas de produção de propulsores nucleares.
Além disso, constata-se que essas empresas estão em um estágio de competitividade
muito aquém, além da inexpressiva capacidade produtiva, tecnológica e de inovação. Essa
realidade é fruto do fato de que a tecnologia nuclear voltou a ser pauta de relevância para o
Estado há poucos anos, tornando as empresas do segmento apenas complementares da área
nuclear, não sendo focadas na produção de um produto nuclear.
Outra grande questão do desenvolvimento da propulsão nuclear no Brasil, bem como
da energia nuclear, é a formação de recursos humanos. Segundo dados levantados pelo
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), observa-se que o número de profissionais do
segmento de propulsão nuclear tem aumentado nos últimos anos, principalmente os
profissionais de nível superior.
Entretanto, no Brasil, ainda há uma carência muito grande no que se refere à formação
de profissionais com conhecimentos aplicados à propulsão nuclear que pudessem levar o
país à autonomia. Essa carência levou o Governo Brasileiro a firmar o Acordo de Cooperação
Brasil-França, em 2008.
Tal acordo preconizou que a estatal francesa Direction des Constructions Navales et
Services (DCNS) seria responsável pela transferência de tecnologia para a construção de
quatro submarinos convencionais e da parte não nuclear do submarino de propulsão nuclear
brasileiro, além da capacitação técnica de todos os recursos humanos envolvidos no projeto
de construção do submarino nuclear.
É importante destacar que mesmo que o Brasil não seja detentor de uma Base
Industrial de Defesa muito expressiva ou que não tenha passado por um intenso processo de
industrialização como nos países desenvolvidos, o país emprega tecnologia nacional no
desenvolvimento do projeto, demonstrando sua preocupação com a autonomia no segmento
de propulsão nuclear e de não depender exclusivamente da tecnologia estrangeira.

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Além disso, com o propósito de atender a deficiência na formação de recursos
humanos, além dos cortes orçamentários e do contingenciamento do setor de defesa, foi
criada, em 2012, a estatal vinculada à Marinha do Brasil e ao Ministério da defesa, a
Amazônia Azul Tecnologia de Defesa (AMAZUL). A criação de tal estatal possibilitou a
continuidade do projeto e permitiu acolher os recursos humanos destinados ao Programa
Nuclear da Marinha e ao PROSUB.

Considerações Finais

Um submarino de propulsão nuclear é um bom exemplo de instrumento dissuasório,


e tal fato levou o Brasil, especificamente a Marinha do Brasil, a sonhar com a operação de
tal meio. Operar um submarino de propulsão nuclear significa ao país a capacidade de se
fazer presente nos mais de 7 mil km de costa litorânea, além da área que compreende a
Amazônia Azul.
Entretanto, o ramo da propulsão nuclear não se restringe apenas à propulsão do futuro
submarino brasileiro. Em países como EUA, Reino Unido e França, é possível constatar a
utilização de tal modo de propulsão em navios aeródromos, o que pode ser considerado uma
evolução do mesmo tipo de propulsão em submarinos.
No caso do Brasil, a realidade desse tipo de propulsão faz com que nos restrinjamos
a discorrer acerca do submarino de propulsão nuclear Álvaro Alberto (SN-10), previsto para
ser lançado ao mar em 2029. Por se tratar de um projeto em andamento que demandou muitos
anos de elaboração, evolução e investimentos, a utilização da propulsão nuclear em larga
escala, no Brasil, ainda é uma realidade muito distante.
Esse distanciamento se dá por diversas dificuldades que a estrutura nuclear do país
possui. Inicia-se com a regulamentação internacional, que mesmo sendo um mecanismo
externo, delimita e influencia as ações do governo no âmbito interno. Tal regulamentação é
representada principalmente pelo TNP, tratado que é alvo de diversas críticas feitas pelo
Brasil, por acreditar que o tratado signifique uma restrição ao acesso à tecnologia nuclear.
Além da regulamentação internacional, é importante ressaltarmos os efeitos que as
políticas públicas causaram no desenvolvimento da propulsão nuclear ao longo dos anos.
Tais políticas basearam-se na criação de diversos órgãos capazes de fomentar o
desenvolvimento da tecnologia nuclear, e por criar programas capazes de acelerar tal
desenvolvimento. Um fato importante relativo às políticas públicas é que a energia nuclear
passou a ser uma prioridade para o Estado praticamente na última década, limitando, de
forma expressiva, a capacidade das empresas brasileiras de produzirem bens nucleares.

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No caso da propulsão nuclear, as políticas públicas estão intimamente ligadas ao
volume de investimentos que são feitos atualmente no PROSUB, que pode ser considerado
a materialização da capacidade do Brasil de produzir um submarino com propulsão nuclear.
Tal volume de investimentos faz do PROSUB o maior programa de Estado voltado para a
área de defesa já feito pelo país. Porém, através de um acompanhamento anual feito pelo
COGESN, é possível perceber que o projeto vem enfrentando sérias dificuldades de repasses
de verbas provenientes do ministério da defesa.
E, como último ponto relativo às dificuldades do país para desenvolvimento
autônomo de propulsão nuclear, pode-se destacar a formação de recursos humanos. A
preocupação do Brasil em suprir as carência de recursos humanos para o desenvolvimento
do projeto do submarino nuclear, foi um dos motivos que levou ao acordo entre Brasil e
França e à criação da AMAZUL.
Logo, conclui-se, através dos fatos apresentados, que os principais impedimentos
referentes ao uso da propulsão nuclear em larga escala vão de óbices internacionais a
problemas na estrutura tecnológica e produtiva do país. Sendo assim, para que o segmento
de propulsão nuclear cresça de forma significativa, é necessário investimentos na área de
pesquisa e desenvolvimento, tendo em vista que o potencial do Brasil na área nuclear é
grande, principalmente pelas grandes reservas de urânio.
O caráter político-estratégico que caracteriza a propulsão nuclear necessita que o
Estado se faça presente no desenvolvimento. E sua alta complexidade tecnológica exige que
o meio empresarial se aproxime do meio acadêmico, de forma a facilitar o conhecimento
científico a ser aprendido e aperfeiçoado.

Referências Bibliográficas

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 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6022: informação
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