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DIREITO PRIVADO
O Direito Civil é mais restrito que o Direito Privado, é uma parte que integra os princípios e regras
aplicáveis independente de qualquer situação, aplicados indistintamente a qualquer pessoa.
ex. Direito da Família - ao nascemos temos uma família e direitos e deveres por tal.
Mas, o Direito Privado tem outras áreas como o Direito Comercial (por ser pessoa não sou
comerciante) e o Direito do Trabalho (por nascer não tenho uma relação laboral com ninguém) que
não se confundem com os direitos civis já referidos (Direito da Família, Sucessões, Reais e
Obrigações) que, apesar de Direito Privado apenas se aplicam a pessoas que reúnam certas
características.
* Princípio da Igualdade (contrapõe-se com o jus imperium - estamos sempre numa posição de
desigualdade ante o Estado)
Não é uma igualdade pura, não significa que estejamos sempre na mesma posição. As
desigualdades existem porque assim quisemos, mas não é natural ao nosso estatuto, quem se
colocou nessa posição situação fomos nós, não foi a lei que nos colocou numa situação de
inferioridade face aos outros, nenhum indivíduo é superior a mim.
ex. no Direito do Trabalho estou subordinado por um contrato de trabalho ao empregador porque
assim o quis: as desigualdades criadas partiram duma posição de igualdade.
Está também ligada à ideia de Responsabilidade, pois uma vez escolhidos os efeitos temos de os
respeitar, assim a igualdade dá-se no acesso às situações jurídicas e não depois de estarem
concluídas
ex. compro um telemóvel e digo que o pago em 6 meses, depois não posso deixar de pagar
O Direito Privado não precisa da lei para actuar, aliás, esta existe para limitar as nossas ações.
ex. em Direito Administrativo para praticar um acto é necessário haver uma norma que mo
permite, já no Privado vejo se alguma regra me impede de fazer o que quiser.
Também, não somos totalmente livres, não podemos fazer tudo o que nos apetece.
1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos,
celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as claúsulas que lhes aprouver.
- posso fazer o que quiser, escolho o que quiser (dentro da lei). ex. comprar um carro
2. As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente
regulados na lei.
1. O contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo
consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei. - somos responsáveis pelo que escolhemos
2. Em relação a terceiros, o contrato só produz efeitos nos casos e termos especialmente previstos na lei.
Se praticar um facto ilícito, não respondo com os bens de natureza pessoal, mas sim com o meu
património.
ex. destruo o carro de alguém, para o Direito Privado só respondo com o meu património
Não respondo com a minha integridade física, mas sim com os bens que tenho (caso os tenha).
Há um função puramente reparadora, isto é, quando pratico um facto ilícito, o Ordenamento
Jurídico, põe a meu cargo, colocar o outro na situação em que estaria se não se tivesse
concretizado o facto ilícito, ou seja, faz com que repare o mal que fiz.
ex. dou um tiro em alguém e falho por pouco: para o Direito Privado não há consequência (se
acertasse tinha de pagar as custas do hospital, etc), mas se estava a brincar com uma arma e
acerto em alguma coisa, a consequência, no Direito Privado, poderia ser muito superior à primeira
(reparar danos que causei).
Assim, o Direito Privado trata das nossas relações individuais e como prosseguimos o nosso
interesse pessoal, assentando a regulação em pulares fundamentais como a igualdade, a
liberdade e a responsabilidade (exclusivamente patrimonial)
> Capacidade de Gozo: corresponde à medida das situações jurídicas de que uma
pessoa pode ser titular, isto é, quais os direitos e obrigações.
As pessoas singulares têm, por definição, uma capacidade genérica de gozo, podendo, enquanto
pessoa, ter acesso a todos os direitos e obrigações.
As pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em contrário; nisto
consiste a sua capacidade jurídica.
Já as pessoas colectivas têm uma capacidade de gozo específica, pois os fins que perseguem
limitam a capacidade gozo (Artigo 160º).
Há quem não tenha uma capacidade plena de exercício como os incapazes, os menores (123º), os
inabilitados (152º) e os interditos (138º), isto é, aqueles que o Ordenamento Jurídico considera não
terem as características necessárias para se autodeterminar e decidir por si próprias.
ex. Os menores podem ser ricos pois têm capacidade de gozo plena, mas o ordenamento jurídico
pode limitar a sua capacidade de exercício (não podendo exercer os direitos de que é titular).
Nas pessoas colectivas não há capacidade de exercício, mas sim nos seus representantes.
* Bem (podendo ser de natureza diversa: ex. obra artística, mesa, casa, etc): é algo que seja:
> susceptível de apropriação individual: algo que me possa apropriar, excluindo os outros
(ex. não consigo me apropriar do Sol)
Artigo 202º CC (Noção)
1. Diz-se coisa (é excessivo, pois “coisas” são aquelas previstas no livro III) tudo aquilo que pode ser objecto
de relações jurídicas.
2. Consideram-se, porém, fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos privados,
tais como as que se encontram no domínio público e as que são, por sua natureza, insusceptíveis de
apropriação individual - um bem só o é se for susceptível de apropriação individual, mas há certos bens
que não podem ser apropriados (ex. Praia - domínio público)
O Direito Privado visa à repartição entre as pessoas as utilidades que os bens propiciam.
* Facto Jurídico: são acontecimentos aos quais o Direito atribui relevância, atribuindo-lhes certas
consequências e determinados efeitos.
Há certos acontecimentos que não são relevantes para o Direito, assim como existem certos
factos irrelevantes para uns e relevantes para outros.
A intervenção do homem pode ocorrer num facto jurídico em sentido restrito: num museu, olho para
uma determinada peça, alguém empurra-me e caio em cima da mesa - não houve nenhuma decisão
tomada no sentido da verificação daquele facto.
* Acto Jurídico: são actos que, externamente apreciados, observamos serem consequência de
determinando sujeito ter-se comportado de determinada forma. É a percepção externa, a
interpretação do que se quis ou não fazer em função dos elementos externos.
O relevante para o Direito é a percepção que tiramos do comportamento dos outros e não a
intenção do seu comportamento, pois isso é algo psicológico e não consigo entrar na cabeça de
ninguém e saber o que ela queria ou não.
ex. no exemplo da peça, nunca vou ter a certeza que ela caiu sem querer ou porque quis, consigo
é analisar a situação, o seu comportamento e identificar o que é normal, o que é razoável fazer.
> Acto Jurídico em sentido estrito: apenas há liberdade de decisão: ou sim, ou não,
isto é, o Ordenamento Jurídico não dá liberdade à pessoa para escolher os
efeitos, estando estes já estabelecidos no Ordenamento Jurídico,
independentemente da decisão do sujeito, mas dá, sim, a possibilidade de
escolher fazer ou não fazer.
ex. acto de ir depositar o lixo é um acto jurídico (acto de abandono): coloco uma cadeira no lixo,
mas fico com remorsos e vou buscá-la, no entanto, alguém já a foi buscar. Não posso fazer nada,
não posso escolher os efeitos do meu comportamento, tornando-se a outra pessoa proprietária da
cadeira (direito de ocupação).
ex. decido sim, vou comprar um carro, mas também posso decidir os equipamentos e a forma de
pagamento.
‣ Contratos (Artigo 405º e ss.): negócios jurídicos plurilaterais: com várias partes,
resultando do consenso dessas (ex. contrato de compra e venda), projectando-se os
efeitos em direcções opostas.
‣ Negócios Jurídicos Unilaterais (Artigo 457º a 463º): são aqueles que se concluem com
a decisão ou declaração de apenas uma das partes, produzindo-se efeitos
unidirecionalmente
ex. pago X a quem encontrar e me devolver Y: fico vinculado à promessa que estou a fazer. Não é
o resultado dum consenso, eu, sozinho, comprometo-me.
Nestes negócios jurídicos unilaterais vigora o princípio geral da tipicidade, ou seja o Ordenamento
Jurídico só protege os previstos na lei.
ex. sou proprietário de um carro, pai de 3 filhos, com um contrato na faculdade - minha esfera
* Situação Jurídica: estabelece as relações de atribuição dos bens às pessoas, ou seja, é uma
posição perante o Direito que se traduz na existência de determinados poderes e deveres.
SITUAÇÕES JURÍDICAS
A fronteira entre uma situação jurídica e uma situação de facto é muito ténue.
ex. se acontecer algo ao filho na escola é relevante para o Direito, mas se acontecer quando
estiver com os avós não
Vitor Neves defende a mistura de ambos, entendendo que os critérios são cumpridos em
simultâneo.
ex. posso querer que o Direito sancione ou reaja a quem falta a um compromisso de ir ao cinema,
mas também tenho de reconhecer que para o Ordenamento Jurídico isso possa ser irrelevante.
Ou seja, mesmo nos casos em que não quis o Direito Privado este pode intervir: não por actos
que tenha entendido, mas sim porque assim o ordenamento jurídico o determinou
As situações jurídicas diferenciam-se umas das outras pois tratam-se de consequências de factos
que vão produzindo os seus efeitos, efeitos esses diferentes consoante a posição que tenhamos
sobre esses factos.
O Direito Privado adjudica Bens às para a prossecução dos seus interesses individuais, numa
relação inter-subjectivada das suas utilidades.
ex. este Código Civil é meu em linguagem jurídica: o ordenamento jurídico atribui-me o direito de
propriedade a mim e com ele faço o que quiser, tendo os outros que me
respeitar
Pesso BEM
a
Pessoas
Pessoa
Pessoas s
ex 1. ocupação: tomo posse de uma coisa que não tem dono, tornando-me proprietário (acto
jurídico com um efeito aquisitivo
ex 3. morte de um sujeito que era proprietário de um móvel: facto jurídico com um efeito extintivo.
> Situação Jurídica Activa: há espaço sobre o qual posso actuar, isto é, posso
decidir se actuo ou não actuo, havendo uma ideia de vantagem, um espaço de
liberdade.
> Situação Jurídica Passiva: quando existe uma situação de Necessidade, isto é,
a pessoa que está vinculada tem de fazer, associada a uma ideia de
desvantagem, a da imposição de um comportamento.
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Teoria Geral do Direito Privado
ex. posso tocar um instrumento na minha casa às 16h - situação jurídica activa / um músico
profissional toca o instrumento, mas está numa sitáuçaõ passiva, pois tem de tocar àquela hora.
ex 2. sou proprietário do CC, logo posso extrair desse bem tudo o que ele potência (Situação
Jurídica Activa) / a atribuição do CC a A exclui todos os outros, tendo o dever geral de respeito
pelo meu direito de propriedade, têm de a respeitar (Situação Jurídica Passiva).
Assim, não se classifica as situações jurídicas Activa como boas e as Passivas como más, pois
concentramos-nos é na liberdade de poder fazer ou não poder fazer (activas) ou de ter de fazer
(passivas). Óbvio que, nas situações jurídicas passivas até tenho liberdade de não fazer, mas
incorro num comportamento ilícito (ex. músico profissional - não aparece, terá de restituir o
dinheiro às pessoas que pagaram para lhe ver).
Tradicionalmente, por definição, tudo haveria de ser conduzido a uma relação: o Direito só existira
se duas pessoas se relacionassem uma com a outra.
Certos autores entendem que não faz sentido autonomizar-se os sujeitos (titulares de situações
jurídicas autónomas), mas sim centrar-nos para a relação entre A e B
ex. vivo na floresta e tenho um bem, não faz sentido a intervenção do Direito pois não há disputa.
A escola de Coimbra mostra uma preferência pela Relação Jurídica, já a de Lisboa prefere a
Situação Jurídica. Assim, Vitor Neves considera que devemos falar em situação jurídica, pois:
O que está em causa é a estrutura das próprias situações jurídicas, isto é, existem certas
situações jurídicas que só existem se existirem outras de sinal contrário (Relativas) e outras que
se bastam a si mesmas (Absolutas)
ex. Situação Jurídica Subjectiva - Direito de Crédito: para que haja credor, tem de haver devedor.
ex 2. Situação Jurídica Absoluta - Direito de Propriedade: se sou proprietário do meu Código Civil,
o Código Civil basta-me a mim para concretizar o meu interesse, não pressupõe os outros.
Ou seja, há situações jurídicas oponíveis a todos (Absolutas) e outras, que só o são a alguns
(Relativas), mas esta última situação não faz sentido porque, quando digo que o Credor apenas
pode exigir o pagamento ao Devedor, não digo que aquele Direito é apenas oponível ao Devedor,
isto é, o que digo é que o devedor é que tem de pagar, mas o Direito é oponível a todos.
Ou seja, nas situações jurídicas relativas, quanto à estrutura não se bastam a si próprias e quanto
à sua eficácia, estas não são oponíveis a todos.
Pelo contrário, nas situações jurídicas absolutas, quanto à estrutura, o titular tem o controlo de
todos os instrumentos que permitem a realização do fim e quanto à sua eficácia, estas são
oponíveis a todos.
ex. A deve 1000€ a B e a C, mas o seu património é de 1000€, logo, repartido proporcionalmente
o património e quando B exige o pagamento dos 1000€ a A, este opõe-se a C.
Assim, não se distingue a oponabilidade: não exige que B cumpra ante C, sendo estruturalmente
relativa, mas ao nível da eficácia é absoluta pois todos reconhecem-no como credor.
> Situação jurídica simples: insusceptível de divisão sem que perca o seu carácter
fundamental
* Direito Subjectivo: é através destes que o Ordenamento Jurídico atribui a alguém um bem,
disponibilizando-lhe um espaço de liberdade de aproveitamento ou não desse bem.
É a situação jurídica por excelência, isto é, aquela que, do ponto de vista teórico e prático, mais
relevo tem, Menezes Cordeiro define como a permissão normativa específica de
aproveitamento de um bem.
ex. Art. 405º CC - liberdade contratual: podemos ou não celebrar contratos (permissão) é
assegurada pelo ordenamento jurídico (normativa) mas não é um direito subjetivo porque é
genérica, é igual para todos, não é específica: todos podemos estabelecer contratos.
ex. Artigo 1305º: Direito de Propriedade - do qual resulta a permissão para que o proprietário
possa usar, fruir e dispor do bem de forma plena e exclusiva (ex. casa - eu como proprietário
posso arrendar, destruir, etc pois é um bem que o OJ reservou para mim).
Por vezes, ante um Direito Subjectivo o que varia é a amplitude do seu aproveitamento.
ex. o usufrutuário só pode usar a casa como ela existe, já o proprietário pode fazer o que quiser.
Assim, Direito Subjectivo é na verdade um conceito formal que depende duma dada concretização
em cada situação concreta.
Existem diferentes modalidades de direitos subjetivos que se distinguem graças à:
O direito subjectivo pode recair sobre uma coisa, duma criação artística, da minha honra, etc.
Assim, os direitos subjectivos distinguem-se pela diversidade dos objectos e consequentemente
dos regimes aplicareis, gerando diferentes ramos de Direito.
* amplitude das utilidades que o titular do direito subjectivo possa retirar desse bem.
Centra-se na diferente quantidade de utilidades que um sujeito pode retirar duma determinada
coisa. O Direito Subjetivo tem sempre, no seu conteúdo, certos poderes e faculdades, sendo a
sua amplitude quem marca a fronteira dos Direitos Subjectivos.
ex. Propriedade (tudo - 1305º) vs Usufruto (espaço de liberdade mais limitado - 1439º).
O reverso do Direito Subjectivo é o Dever Universal de Respeito, isto é, impor o respeito aos
outros (excluídos do aproveitamento) no aproveitamento do bem pelo titular, previsto no Artigo
483º do Código Civil:
1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal
destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes
da violação. - um terceiro que invada o meu Espaço de Liberdade terá de me indemnizar pelos danos.
* Poder e Faculdade
O Poder uma situação jurídica activa que se caracteriza pela disponibilidade de usar um meio para
atingir um fim, já Faculdade é a situação jurídica activa que se caracteriza pela disponibilidade de
diferentes meios para alcançar um fim, ou seja, a faculdade tem no seu conteúdo vários poderes.
ex. uma quinta: o proprietário pode fruir, fazendo uma plantação e retirando os frutos (fruto natural),
como pode arrendar o terreno a um terceiro (fruto civil), logo a fruição é uma faculdade - o
proprietário pode alcançar o fim através de vários meios alternativos.
Daí dizermos que o Direito Subjectivo é complexo (conseguimos segregá-lo em outras situações
jurídicas) e compreensivo (tem uma ideia própria que resulta do conjunto, da sua complexidade).
ex. direito de propriedade: é tudo um conjunto com a sua lógica própria que só captamos se
olharmos para este como um todo, tendo também momentos de passividade:
* Direito Potestativos
É a situação jurídica activa em que se encontra aquele que pode, unilateralmente alterar a esfera
jurídica de outrem (embora regra geral, a esfera jurídica dos outros nos seja impenetrável).
ex. não posso ir à esfera jurídica de outrem e lá criar um Direito de Propriedade, só se impondo os
efeitos que cada um quiser: Princípio da Autonomia Privada.
ex 2. quero lhe perdoar a dívida de alguém: só posso remitir a divida, por contrato, se ele aceitar
isso na sua esfera jurídica (Artigo 863º), caso recuse não lhe posso impor essa vantagem.
Assim conclui-se que a esfera jurídica alheia é, por regra, inantigivel, sendo o Direito Potestativo
uma excepção, pois o seu conteúdo trata da disponibilidade de, na esfera jurídica de outro
conseguir alterar a esfera jurídica alheia, existindo só nos casos previstos pela lei, tendo sempre
como ponto de partida uma posição de sujeição aceite por esse mesmo sujeito, sendo estes direitos
constituídos através de uma norma ou de um negócio jurídico.
Importa perceber que o Ordenamento Jurídico tem duas formas de nos proteger:
* Protecção Directa: atribuindo-nos uma situação jurídica que nos proteja, através de Direitos
Subjectivos, Faculdades/Poderes e Direitos Potestativos, quando o Ordenamento Jurídico
pretende proteger o particular, contemplando-o directamente com situações jurídicas activas.
* Protecção Reflexa: impondo deveres aos outros, beneficiando pelo cumprimento dos deveres
impostos aos outros, isto é, é por uma via oblíqua, quando o Ordenamento Jurídico protege os
sujeitos através da imposição aos demais sujeitos de situações jurídicas passivas.
ex. plano obrigatório de vacinas: saio beneficiado da obrigação imposta às pessoas se serem
vacinadas contra determinadas doenças.
> Protecção Indirecta: quando procura proteger o interesse de determinados sujeitos, isto é,
se visou indirectamente a proteger outras pessoas.
1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal
destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da
violação. - só nos podemos apropriar de interesses individuais.
ex. se fui protegido reflexamente por dada norma, mas acabei prejudicado não posso pedir uma indemnização
pois estava em causa o interesse público - Prot. Reflexa é irrelevante no Direito Privado
Assim, no Direito Privado podemos ser protegidos directamente (atribuindo-se uma situação jurídica
activa) e indirectamente (casos em que a lei impõe uma situação jurídica negativa, protegendo-nos).
Uma parte da doutrina não o vê como situação jurídica activa, distinguindo-se das outras por ser
uma situação funcional.
O Direito Subjectivo que o Ordenamento Jurídico atribui, fá-lo num espaço de liberdade para que o
sujeito consiga retirar proveitos desse bem, ponderando o seu próprio interesse, mas neste caso,
ao tomar a decisão não pondero exclusivamente o meu interesse, ponderando também o dos
outros. Assim, há liberdade, embora não seja plena, sendo tal ponderação imposta ao titular do
poder pelo Ordenamento Jurídico.
ex. o Ordenamento Jurídico retira a capacidade de exercício aos menores, tomando as decisões
por estes os seus pais, devendo os pais ponderar o interesse do filho e não o seu.
Ao ser uma situação jurídica activa, trata-se de um espaço de liberdade do titular do direito, que,
paralisa ou limita uma situação jurídica passiva que lhe vincule.
ex. A compra um bem a B devendo esse bem ser entregue por B ao mesmo tempo que A paga o
preço, mas A pode não entregar o preço enquanto B não lhe entregar o bem: Artigo 428º
1. Se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um
dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe
cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.
Assim, a excepção coincide sempre na esfera jurídica de uma pessoa com uma dada situação
jurídica passiva, conseguindo-se paralisar ou limitar os seus efeitos. Distinguindo-se ainda:
> excepção dilatória: não retiram a situação de desvantagem, apenas a adiam (428º)
> excepção peremptória: paralisam definitivamente a desvantagem (570º).
* Expectativa
É uma situação jurídica activa que funciona como um estado preliminar da aquisição de outra
situação jurídica activa, isto é, muitas situações jurídicas constituem-se na sequência de um
determinado processo que o titular tem a expectativa que se conclua até ter a situação final.
ex. expectativa de facto: quero comprar uma casa, faço uma visita ao prédio e o vendedor pede-
me 500 mil €, ofereço 400 mil € e ele diz-me que vai pensar: estou na expectativa que ele aceite,
mas não tenho nenhuma expectativa de direito.
ex. expectativa de direito: visito a casa e ofereço 400 mil €, respondendo o vendedor (B) que,
tudo bem, aceita e que para a semana assina-se o contrato, mas, passado 2 dias, um outro, C,
oferece-lhe 450 mil €, então B já não me vende a casa: aí estou protegido pelo Ordenamento
Jurídico, isto é, B, frustra a expectativa que me criou, sendo esse um acto ilícito.
O momento exacto no qual passo de uma expectativa de facto para uma expectativa jurídica
surge quando identifico que o Ordenamento Jurídico impõe a outro o dever de actuar consoante a
expectativa que criou, estando esta defendida ou salvaguardada pelo Direito.
Dentro das expectativas jurídicas distingue-se:
* Expectativas Jurídicas Fracas: quando o Ordenamento Jurídico exige ao outro que considere a
minha expectativa, actuando em termos conformes à minha confiança, podendo esse outro
considerar a minha confiança e não corresponder a essa expectativa, actuando licitamente.
ex. negoceio a compra de X com B, podendo-nos ou não entender, isto é, é possível que cheguemos
à conclusão de que não conseguiremos celebrar o contrato, isto é, chegamos ao acordo quanto ao
preço, mas não quanto ao meio de pagamento, B pode dizer no dia seguinte que já não quer
negociar mais o bem: é um comportamento previsível.
ex. chego a acordo com B quanto à compra de X, mas no dia seguinte quando vamos celebrar o
contrato B não aparece.
Assim, a minha expectativa é inicialmente sempre fraca porque o processo pode ou não ter
sucesso, mas a partir do momento em que a concretização dos deveres é imposta ao outro,
pressupondo a conclusão do processo com sucesso, a expectativa passa a forte.
É fundamental ter em conta que esta distinção não é puramente teórica já que as consequência
da frustração de uma expectativa fraca é diferente de uma forte, estando a diferença nos danos
em que se indemniza, assim:
ex. celebro um contrato, pago advogados, perco tempo, rejeito outras propostas, etc: faço certas
opções com base na expectativa que tenho e se esta sair frustrada tem de me pagar os advogados,
as despesas, etc.
ex. ia comprar a casa por 400 mil €, mas tinha já a quem vende-la por 600, posso pedir os 200 mil
* Obrigações
É uma situação jurídica passiva que corresponde a uma situação de necessidade, isto é, quando
se constitui na esfera jurídica de alguém uma obrigação que o torna adstrito ante outrem à
adopção de um certo comportamento.
ex. o ordenamento jurídico exige que alguém (devedor) adopte um certo comportamento
(prestação) perante outrem (credor).
ex 2. dou aulas numa faculdade, logo não posso dar aulas noutra
O objecto da obrigação pode ser diverso (ex.construir uma casa, pintar um quadro, dever dinheiro)
Obrigação é o vínculo (ex. relação que se estabelece entre o devedor e o credor) jurídico por virtude do qual
uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma prestação
1. As partes podem fixar livremente, dentro dos limites da lei, o conteúdo positivo ou negativo da prestação.
- as prestações são criadas por nós no âmbito da nossa autonomia privada
2. A prestação não necessita de ter valor pecuniário; mas deve corresponder a um interesse do credor,
digno de protecção legal.
São situações jurídicas complexas que podem ser segmentadas em outras mais simples:
ex. A assume a obrigação de pintar a casa de B, mas A deixa o chão todo sujo e a casa desarrumada
- logo a obrigação de A vai além de pintar a parede, ou seja, não se esgota no dever principal, tem
outros acessórios.
ex 2. A obrigado ante B a lhe entregar um conjunto de tijolos, mas A despeja-os para dentro dum
poço: fez todos os deveres, mas B não pôde dar uma correspondência formal à sua exigência.
Assim, toda a obrigação tem um dever principal, mas nunca se esgota aí, juntando-se outras
acessórias (algumas até de conteúdo activo), daí a necessidade de olhá-las como conjunto.
Os deveres secundários são aqueles estabelecidos pelas partes (ex. isolar o chão enquanto pinta
a casa).
* (Estados de) Sujeição: situações jurídicas em que se encontram aqueles que podem ver a
sua esfera jurídica alterada por um comportamento de um terceiro unilateralmente.
* Deveres
É uma situação jurídica elementar, em que um dado sujeito tem de adoptar um certo
comportamento, podendo este ser autónomo da obrigação.
Distingue-se no âmbito da sua incidência subjectiva:
* Deveres Específicos: são específicos porque são exigíveis a certas pessoas, são aqueles
deveres cuja observância é apenas exigida a determinadas pessoas, uma situação individual.
* Deveres Genéricos: são aqueles que são exigíveis a todas as pessoas independente das
circunstancias. Regra geral são o lado passivo dos direitos subjectivos, pois, quando o
Ordenamento Jurídico reserva a determinada pessoa um espaço de liberdade, está por
definição a excluir todas as outras.
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Teoria Geral do Direito Privado
ex. Direito da Propriedade tem duas dimensões: permite-me cumprir o que pretendo com o bem e
ao mesmo tempo exclui todos os outros, impedindo que interfiram na minha actuação com o bem.
✓ Ónus
Quando o Ordenamento Jurídico diz-nos que, para aceder a uma vantagem tens de fazer X, ou se
quiseres evitar uma desvantagem tens de fazer Y. Não é um comportamento imposto pelo
Ordenamento Jurídico.
É uma situação jurídica passiva porque a opção não é indiferente para o Ordenamento Jurídico,
isto é, há a associação de vantagem ou desvantagem numa das opções, mesmo sendo ambas
lícitas: se seguir uma tenho uma vantagem, se optar pela outra, tenho uma desvantagem.
ex. os Artigo 916 e 917 dizem-nos que “o comprador deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta
de qualidade da coisa, excepto se este houver usado de dolo”, isto é, que se o iPhone não
corresponde ao esperado (ex. não tira fotos), posso me dirigir ao vendedor até 30 dias, mas, se
deixar passar os prazos, então perco o direito de reclamar: a denúncia do defeito é um ónus porque
não me exige que actue, a decisão é minha e qualquer uma delas é lícita, não sendo, a opção que
tomo, irrelevante para o Ordenamento Jurídico.
✓ Deveres Funcionais
ex. sou administrador de uma sociedade e A, meu amigo, deve dinheiro à sociedade e, se A fosse
meu credor não cobrava a divida, mas enquanto administrador, tenho de a cobrar porque o interesse
específico da sociedade é reaver esse dinheiro, logo pondero o interesse da sociedade, não tendo
outra opção senão cobrar a divida
Assim, tanto os direitos como os deveres funcionais estão relacionados com os outros: se alguém,
actuando ponderando o interesse de outro, tiver alternativa de escolha é um Direito Funcional
(Situação Jurídica Activa), já se não tiver alternativa é um Dever Funcional (SJ Passiva).
* Princípio da Personalidade
Todo o Direito Privado respeita a Dignidade Humana, encontrando-se este Princípio no regime
aplicável às pessoas singulares, tendo estas capacidade de gozo ilimitada, podendo ter acesso a
todas as situações jurídicas activas e passivas, nunca existindo estas num vazio, já que relacionam-
se sempre com uma pessoa a quem lhes é atribuída esses direitos.
A importância que o Ordenamento Jurídico dá à Tutela dos Bens de Personalidade (Artigo 70º a
81º) é tão relevante que nos conduz a um outro princípio, o da disponibilidade, isto é, temos uma
auto-licitação dos direitos de personalidade, direitos esses aos quais não podemos renunciar.
A este princípio também se relaciona o da autonomia privada, já que, o respeito que o
Ordenamento Jurídico nos dispensa enquanto pessoa, tem como objectivo fundamental o
reconhecimento da nossa autonomia, podendo-se selecionar livremente os efeitos que queremos
ver reconhecidos na nossa esfera jurídico (ex. através dos contratos que celebro). Assim, tem:
* uma vertente positiva: sou eu quem escolho os efeitos que se produzem na minha esfera jurídica
, ou seja, as situações jurídicas que se integram na minha esfera jurídica.
* uma vertente negativa: fundamental para que a positiva se concretize, ou seja, assenta na
intangibilidade da esfera jurídica alheia, isto é, não posso interferir na esfera jurídica de outro.
Posso fazer de tudo na minha esfera jurídica, mas deixo de o poder fazer quando passo a
interferir na esfera jurídica alheia
Assim, junta-se agora um outro princípio já falado, o da responsabilidade, isto é, sou livre de decidir
o que quiser, mas depois sou responsável pelas decisões que tomei.
O enquadramento do princípio da responsabilidade com o da personalidade, leva-nos à
exclusividade patrimonial, isto é, as consequências para as actuações ilícitas são estritamente
patrimoniais.
* Princípio da Boa-Fé
Está associado à cláusula geral da Boa-Fé, o que reconhece o conhecimento prévio de uma
limitação: a impossibilidade de previsão dos deveres específicos que acautelem cada caso
concreto, de todas as situações que se possam verificar na nossa vida.
Assim, é possível que certas pessoas actuem em termos conforme àquilo que são os seus deveres
jurídico, mas não ter um comportamento tido como justo ou razoável.
ex. A entrega tijolos para uma dada construção, cumpre a data, a hora, a quantidade, mas ao chegar
despeja-os para dentro de um poço: cumpriu com os deveres específicos, mas o seu
comportamento não foi justo, honesto ou adequado.
Assim, a boa-fé permite-nos que, em cada acto façamos referência ao seu princípio, censurando os
comportamentos que, embora sejam um cumprimento formal da lei, sejam materialmente contrários
aos valores implícitos no Ordenamento Jurídico. Distinguindo-se:
o Boa-Fé subjectiva: apela à situação psicológica do agente em si mesmo, daquela em que ele
actuou, vendo, em essencial se, esse agente ao agir daquela forma sabia ou não sabia que
estava a lesar, a prejudicar interesse alheio.
ex. Artigo 266º e 268º (procuração): procuração a B para compra de uma casa, vigorando este
enquanto não se verificar uma causa extinta: se permanecer no negócio após a sua extinção só não
me prejudica se desconhecer que a procuração há tinha findado, se actuar sem saber que me
estaria a prejudicar.
A Boa-Fé surge quando questionamos se uma pessoa honesta praticaria ou não determinado acto
que trouxe prejuízo para um terceiro, se sabia que prejudicaria está de má-fé.
Diferencia-se:
* Boa-Fé Psicológica: basta que o agente diga que não sabia que estava a lesar terceiro, não
fazendo nenhuma indagação. Corresponde à mera ignorância.
ex 2. Artigo 1340º.4 (sementeira em terreno alheio): A semeia ou constrói num terreno que não é
seu, importa apenas se desconhecia que o terreno era alheio, não se importando com as razões.
* Boa-Fé Ética: não basta dizer que desconhece, é preciso que esse desconhecimento seja
desculpável, ou seja, que não seja censurável, tendo de desconhecer sem culpa, isto é, a
ignorância não pode ser censurável.
Não diz que temos de subordinar a prossecução do nosso interesse ao interesse do outro, mas sim
que há vários comportamentos alternativos, havendo uns benéficos para terceiros e desfavoráveis
para outros, devendo, nessas situasse a que menos situações desfavoráveis crie ao outro
ex. entrega dos tijolos: entre deitar num poço ou no chão, deve-se escolher a segunda.
Assim, a boa-fé objectiva aponta para um padrão de comportamento: actuar de acordo com o
homem sério e honesto, traçando o caminho exigido a esse homem num dado caso concreto: se,
naquele caso concreto o que o sujeito fez foi ou não de acordo com o padrão imposto.
Menezes Cordeiros entende que a boa-fé objectiva resulta em 2 consequências, isto é, que a
boa-fé objectiva intervém num espaço de liberdade, impondo critérios que devem ser seguidos:
* tutela da confiança: o comportamento que adoptamos gera nos outros a expectativa de que
sejamos coerentes com aquilo que vamos fazer, assim, vivendo-se em sociedade, os outros
esperam que prossigamos de certa forma, não se devendo ter comportamento contraditórios que
gerem prejuízos aos outros. Assim, só existe má-fé quando há uma alteração grave de
comportamento, em que seja manifesta a contrariedade.
> exista uma situação de confiança: A estar convicto de que B actuaria de certa forma.
> essa confiança seja justificada: é razoável que A se tenha convencido de que B agiria
de determinada forma.
> essa confiança seja imputável àquele cujo comportamento queiramos limitar
ex. A celebra com B um contrato que a lei exige forma escrita, mas formam um contrato oral (logo
nulo) e A diz, ao fim de 5 anos que quer rasgar o contrato, B pode imputar esse comportamento a
A.
ex 2. A queria que se fizesse apenas um contrato oral, mas B queria-no pela forma escrita: A não
pode imputar a B esse comportamento.
ex. A diz que vai celebrar o contrato e em face disso, B contrata um advogado para o legitimar
Tempo agora para fazer uma breve referecia ao Sistema Móvel, isto é, há casos em que verificamos
que determinadas consequências jurídicas estão dependentes da verificação de certos requisitos e
num sistema móvel, podemos compensar a intensidade da verificação de um desses requisitos com
uma menor intensidade (ou não verificação) de outro.
Ou seja, caso fosse um sistema rígido, teríamos de verificar os 4 pressupostos para que houvesse
tutela da confiança, mas num sistema móvel até pode faltar um deles, desde que os outros se
verifiquem a uma dada intensidade, lidamos de conceitos maleáveis, com alguma flexibilidade.
* primazia da materialidade subjacente: os comandos jurídicos (imposição do dever aos sujeitos)
não devem ser olhados como puramente formais, pois há uma regra jurídica que faz com que eles
assim o sejam, isto é, há uma dada razão para que o homem honesto assim actue, esperando-se
que faça prevalecer a matéria (substância) sobre a forma.
ex. devedor compromete-se a pintar a casa sabendo que à noite haverá uma tempestade, logo
cumprir o contrato não tem qualquer utilidade prática.
Assim, não devemos olhar para as normas como realidades puramente formais em que basta ao
sujeito fazer aquilo que a norma diz, mas ir mais a fundo, procurando a substância, tendo um
comportamento que permita a concretização da situação pretendida.
ABUSO DE DIREITO
É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa
fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
São aquela situações que a um determinado sujeito a quem lhe foi atribuído uma dada situação
jurídica activa (um espaço de liberdade e autonomia, onde o sujeito se pode autodeterminar), mas
que o Ordenamento Jurídico, por ser uma situação limite pode intervir.
ex. A constrói um muro para impedir que o Sol passasse para a piscina de B: A pode, dentro do
seu espaço construir o muro, mas este não é aceitável, estravando os limites do seu direito.
O Artigo 334º permite controlar esses espaço de liberdade, actuando de forma a evitar qualquer
comportamento contrário ao Ordenamento Jurídico que prejudique os outros. Desconstruindo:
> ou indemniza
ex. se A atira uma pedra a B quando o Ordenamento Jurídico for chamado, obrigará A a pagar os
danos causados por B
‣ exercício de um direito: atende a uma situação jurídica activa, onde o sujeito tenha
autonomia para fazer determinadas coisas e se as podes fazer, também pode abusar
destas, assim é necessário que:
ex. A arrenda a casa a B permitindo a B que faça obras (sem as qualificar pois B disse a A que se
tratavam de obras diminutas), mas passado 1 ano, B altera a casa toda.
‣ limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico:
são limites internos, trata-se da sujeição do comportamento do titular do direito a um
conjunto de situações que permitam a avaliação desse comportamento:
> boa fé: esta no sentido objectivo, ou seja aquele comportamento que
corresponde ao modelo seguido pelo homem honesto e razoável.
> bons costumes: associado à moral social, não é mais do que o conjunto
de regras morais e de natureza ética que não se adquirem por fontes de
direito, mas sim por serem o padrão ético pelo qual a comunidade se
rege (ex. regras de comportamento familiar, actuação deontológica).
> fim social e económico do direito: com pouca aplicação prática, mas
centra-se em certos direitos funcionalmente dirigidos à prossecução de
determinados objectivos e fins pelo qual o Ordenamento Jurídico atribui
esse direito (ex. se sou proprietário de um terreno, não o devo
abandonar, senão estaríamos a desaproveitá-lo face a outros que o
poderiam valorizar).
* Exercícios contrários à boa fé: tratam-se daqueles exercícios contrários à boa fé que tanto a
jurisprudência como a doutrina têm tipificado para um melhor entendimento desses.
‣ exceptio doli: consiste num comportamento doloso, onde o sujeito não exerce o seu direito
para a prossecução do seu interesse próprio, mas com o exclusivo propósito de prejudicar o
outro.
ex. A constrói no seu terreno uma construção que não poderia fazer e B, vizinho que gosta muito
dele, nada diz durante 2 anos, dando a entender que aquilo não seria relevante para ele, mas um
dia B zanga-se com A e diz que este tem de destruir a construção por ser uma situação ilícita: criei
a convicção de que nada faria, que estaria disposto a aturar essa situação, mas depois, do nada,
mostro-me indisponível para aturar tal situação.
‣ inalegabilidade formal: é semelhante ao venire contra factum próprio, mas com a característica
de resultar da não observância pela forma especial exigida a um dado contrato, isto é, se A
celebra um contrato com B e depois vê que o contrato não o vincula por não ter uma certa
forma, no entanto, convém não esquecer que a lei exige uma forma especial, para ponderação
de determinados interesses e se esta não é verificada, desvinculo-me do contrato. Mas o que
pode tornar a actuação abusiva são as circunstâncias em que essa desvinculação ocorreu: ou
porque já sabia dessa necessidade e convenceu o outro de que não seria possível, ou porque
as duas partes estavam conscientes que era necessário mas não a invocam, não podendo
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Teoria Geral do Direito Privado
invocar a sua falta depois. Podem também surgir circunstâncias posteriores à celebração.
Na prática consiste na invocação da invalidade formal de um negócio - a fim de não se manter
vinculado - pela parte que provocou intencionalmente tal vício ou que, ainda que não o tenha
provocado, tenha participado na sua prática.
ex. A e B achavam que celebravam o contrato na forma necessária, mas passado um tempo, A
descobre que lhe falta a forma mas nada faz. Passado 1 ano farta-se do contrato e invoca a sua
nulidade, sendo este um comportamento contrário à boa fé, pois A deveria era ter requerido a
nulidade logo e não passado 1 ano - executa-se um contrato, gerando confiança no outro e do
nada, invoca-se a inalegabilidade.
ex. Empresa cede carro a trabalhador, mas este só o usa para deslocações pessoais, sabendo a
Empresa disso, nada fazendo por 10 anos, não pode vir a exigir agora que o trabalhador
estacione o carro nas instalações da empresa.
‣ tu quoque: assemelha-se a um princípio geral de Equity (só posso recorrer à Equity se não
tiver praticado algo de censurável sobre esse assunto) e centra-se na ideia de que, para
censurar um direito, não posso ter criado artificialmente as condições para exercer esse
direito, ou seja, se só se coloca na situação de um direito na consequência de um acto ilícito.
É a invocação ou aproveitamento de um ato ilícito por parte de quem o cometeu,
ex. contrato de arrendamento (supõe que o senhorio deve manter o lugar arrendado em situação
adequado e que se o arrendatário abandonar o lugar arrendado o senhorio pode pôr fim ao
arrendamento) entre A (senhorio) e B (arrendatário) em que B pede obras porque chova dentro de
casa, então B sai de casa e vai para a do irmão por não conseguir viver na casa de A, então A,
senhorio, põe fim ao arrendamento por B ter abandonado o lugar: A deveria ter feito obras (facto
ilícito), mas como não as fez o arrendatário teve de sair (que gera uma consequência no outro).
ex. A quer fazer obras, mas exige a B que a tinta seja uma que só existe em Espanha, embora
outra existente em Portugal seja exactamente igual.
ACTIVIDADE NEGOCIAL
Referimos-nos àqueles factos por nós praticados no exercício da nossa autonomia privada, tendo
em vista a escolha dos efeitos que queremos ver satisfeitos na nossa esfera jurídica.
Diz respeito ao comportamento do sujeito que culmina na exteriorização de uma decisão que vise
à produção de um determinado efeito jurídico.
ex. ir ao bar não é uma declaração negocial porque não visa à produção de algum efeito jurídico
Assim, distingue-se o comportamento de uma declaração negocial consoante tenha ou não em vista
a produção de um dado efeito jurídico.
ex. A combina ir ao cinema com B: há uma exteriorização de uma decisão que nos compromete,
mas desse comportamento não esperamos a intervenção do Direito.
Um contrato forma-se pelo consenso de duas ou mais declarações negociais, tendo estas que ser
materialmente coincidentes, passando estas para um contrato.
É um comportamento a partir do qual se verifica uma exteriorização, onde, por trás dessa está uma
decisão, já que exteriorizamos aquilo que decidimos, mas há um processo, distinguindo-se:
ex. A pergunta a B se quer ir ver o Sporting vs Vitória: A representa a realidade, domingo é dia de
eleições, viu o que era relevante e depois em função disso deliberou, tomando a decisão, tendo-a
depois exteriorizado, dizendo a B que não iria.
ex 2. compra de um carro: primeiro represento a realidade, se é novo, quanto kms tem e depois de
ponderada penso nas opções e decido, exteriorizando-a depois
A lei acentua num conjunto de pressupostos que levam a reconhecer a eficácia das declarações
negociais, isto é, a lei não quer que decidamos de qualquer forma, ela assenta num modelo: uma
representação completamente esclarecida, uma decisão livre e uma exteriorização exacta.
As declarações negociais servem como um instrumento da actividade jurídica que confere eficácia
às nossas decisões, daí a necessidade dos seus efeitos efectivamente produzidos corresponderem
aos que efectivamente se quer, devendo-se poder subtrair delas quando estas não correspondem.
ex. A diz a B que compra um carro por 5 mil euros, pensando que tem por mil kms, mas afinal tem
cem mil kms, valendo por isso 2 mil euros.
> não sendo o agente que tomou efectivamente a decisão, só vejo as coisas a partir da
exteriorização, não me conseguindo colocar na cabeça do agente e ver a representação
e a tomada de decisão, não fazendo, por isso, sentido falar-se em vontade.
Assim, uma declaração negocial centra-se num comportamento (acção ou omissão) que
assumimos com a exteriorização de uma decisão procurando um determinado efeito jurídico. No
fundo é uma mensagem transmitida ao outro, onde se exterioriza os efeitos jurídicos que se
pretendem alcançar, assentando do ponto de vista lógico a uma sequência de fases:
Não se tratando apenas duma sequência de fases mas sim de um compromisso que o Ordenamento
Jurídico estabelece quanto ao que pretende em cada uma dessas fases:
De recordar que para o Direito o que é susceptível de ser valorado não é o processo interno do
declarante, mas sim o seu comportamento externo, havendo sempre uma tensão entre a posição
do declarante (à mínima situação de erro poder desvincular-se da decisão) e a posição dos terceiros
(que prevaleça o exteriorizado) perante o que o declarante quis fazer.
Aliás, se se desse todo o poder ao declarante, quebrar-se-ia o comércio jurídico, já que celebro
contratos porque tenho confiança, não se seguindo a subjectividade, embora também não se possa
ser puramente objectivos, tendo coisas que não se quis.
1. A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou
qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com
toda a probabilidade, a revelam.
2. O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha
sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz.
ex. numa loja, A aponta para X e B diz que X custa 100€, dizendo A que a quer comprar.
Têm ambas o mesmo valor, aliás, em termos gerais, sem prejuízo das normas especiais, o sistema
adoptado pelo Ordenamento Jurídico assenta numa irrelevância entre a declaração expressa e a
ta, embora a percepção do sentido das declarações expressas seja mais fácil.
ex. não respondo a B, A pergunta o preço, mexe nos bolsos e o vendedor, percebendo que A não
tinha dinheiro diz que A pode levar X: não há declaração tácita, mas sim roubo.
Toda a declaração pressupõe uma dada forma já que há uma exteriorização de uma decisão, sendo
necessário uma dada formalização, esta sujeita a certos requisitos.
ex. há situações em que se diz que a forma é indiferente, noutras exige-se uma dada forma.
A validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei a
exigir.
O contrato de compra e venda de bens imóveis só é válido se for celebrado por escritura pública.
Os factos que procuramos corresponder nas declarações negociais devem respeitar a forma, daí,
o numero 2 do Artigo 217º nos esclarecer que as declarações tácitas valem tanto com as expressas.
ex. A escrever a B que pretende celebrar com este um contrato com um dado conteúdo, mesmo
que essa forma não seja necessário, a declaração é expressa, mas também formal.
ex. A liga ao a B dizendo que quer comprar a sua casa: a declaração seria inválida por falta de
forma escrita, pois apesar de a declaração ter sido expressa, a esta falta forma escrita.
É fundamental ter claro que a declaração tácita não se confunde com o silêncio.
O silêncio é um princípio irrelevante, não tendo nenhum efeito negocial, isto é, o simples facto de
um dado sujeito nada dizer ou nada fazer não se confunde com uma declaração negocial.
Aliás, só se atribui valor ao silêncio, nos casos previstos na última parte do Artigo 218º:
O silêncio vale como declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou convenção.
> lei (norma especial): se A nada disser durante y dias, então aceita ou recusa X
> uso: difícil de se encontrar um exemplo
> convenção (contrato): nada impede que se celebre um contrato se nada se disser em y
dias
Fora dessas situações, o silêncio é irrelevante, no entanto, posso pré-estipular que o meu silêncio
tem um dado valor, mas não posso atribuir valor ao silêncio dos outros
ex. A manda uma carta a B dizendo que se B não lhe disser nada, então é porque concorda com a
venda de X: não posso imputar a B o ónus de se pronunciar.
Voltando às declarações negociais, podemos dizer que estas são performativas já que se trata de
um comportamento que pretende alterar uma situação pré-existente, distinguindo-se das meras
declarações de ciência, ou seja, aquelas pelas quais se atesta que se sabe uma determinada coisa
(ex. A diz que o seu iPhone é preto: demonstra que sabe uma dada coisa), estando o Ordenamento
Jurídico geralmente disponível para reconhecer os efeitos que queremos atribuir às nossas
declarações negociais.
Existem casos em que, por qualquer razão, o Ordenamento Jurídico não está disponível para aceitar
a produção dos efeitos pretendidos na declaração negocial, sendo essas ineficazes.
João Bernardo Silva 22 de 57
Teoria Geral do Direito Privado
* inexistência (mais grave): quando uma determinada declaração negocial diverge em termos tão
significativos que o Ordenamento Jurídico aceita como adequado que este rejeita-a sem a valorar.
Quando se trata de algo tão disparatado que passa completamente ao lado, surge só em casos
muito limitados e certos autores como Menezes Cordeiro, entendem que nem existe.
* invalidade (situação intermédia) - Artigos 285º a 294º: quando o Ordenamento jurídico reconhece
a existência de uma declaração negocial (não a coloca à margem), mas, valora-a negativamente,
não reconhecendo os efeitos que visava a produzir.
ex.. Artigos 245º: fala da coação moral (há uma ameaça de um mal, mas existe possibilidade de
decidir), sendo esta inválida, isto é, um dia que me liberte dessa ameaça posso-me desvincular do
declarado, pois a decisão não foi livre (ou assinas ou dou-te um tiro).
> formação da declaração negocial: quando o Ordenamento Jurídico diz que é inválida
porque existem vícios relacionados com o seu processo formativo (Artigos 240º e ss)
> questões de forma: quando o Ordenamento Jurídico diz que para a declaração negocial
ser valida tem de assumir uma forma especial que não assume (Artigos 219º e ss)
ex.. o Ordenamento Jurídico exige uma forma escrita que não foi respeitada
ex.. A contrata B para matar C: o Ordenamento Jurídico não admite o seu conteúdo
ex. um contrato X só tem efeitos depois de se ter pago uma dada taxa e enquanto essa exigência
não se cumprir não tem eficácia.
* Eficácia das Declarações Negociais: Artigos 224º a 226º e Artigo 236º e ss.
1. A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele
conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
2. É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente
recebida.
3. A declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é
ineficaz.
É necessário distinguir-se:
> quando não foi recebida pelo destinatário por razões que lhe são imputáveis
ex. A deve dinheiro a B e B manda uma carta registada, mas A, ao saber dos efeitos que daí provém,
não a vai buscar ao banco.
* declarações negociais não recipiendas: aquelas sem um declaratário determinado (Artigo 224º.1
- 2ª parte: tronando-se eficazes logo que conhecidas)
ex. A publica num jornal que quer vender a sua casa, dirigindo-se a qualquer pessoa interessada.
Só produz efeito quando a declaração é transmitida em termos que possa ser razoavelmente
conhecida por aqueles a quem esta pudesse interessar.
O nosso Ordenamento Jurídico afasta-se de várias teorias sobre qual o momento da sua eficácia:
> teoria da emissão: bastava que o declaração fosse emitida para que começasse a
produzir efeito (ex. escrevo uma carta, mas guarda-a na gaveta).
> teoria da recepção pura: a declaração negocial produz os seus efeitos quando o
destinatário a recebesse, mas a verdade é que há casos em que não, de todo, recepção
(ex. uma chocada com trovoada e não consigo ir buscar a carta aos correios): Artigo
224º.3: ineficaz
• Interpretação
Os Artigos 236º e ss dão-nos critérios objectivos, uniformes a partir dos quais devemos interpretar
as declarações negociais, de forma a que essa seja controlada.
Como já sabemos, o declarante pretende que o sentido dado à declaração seja aquele que
permanece (interpretação subjectiva) e o declaratário pretende que o sentido que estes retiraram
seja aquele que valha (interpretação objectiva) e o Artigo 236º tenta coincidir esses interesses
contraditórios, embora prevaleça o princípio geral de que a declaração vale com o sentido que um
declarante normal, colocado na posição do declaratário deveria ter entendido, protegendo-o.
1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real
declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente
contar com ele. - vale quando não conseguimos demonstrar que o declaratário conhecia a vontade real
do declarante: sentido objectivo
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a
declaração emitida. - se o declaratário sabia o que o declarante queria, então vale esse sentido: sentido
subjectivo
Assim, atribui-se geralmente a desvantagem de um risco à parte que mais poderia ter contribuído
para que o risco não se concretizasse, embora no numero 1 do Artigo 236º se preveja 3
instrumentos que protegem a situação do declarante:
ex. A diz a B que vende os anéis que herdou da mãe, mostrando-lhe uma com essas anéis: o
declaratário normal pensa que esses são os da mãe A, mas se o declaratário for o irmão de A, sabe
que tem alguns da sogra misturados.
* a declaração não vale nunca com o sentido que um declarante não pudesse razoavelmente contar
ex. A vai a uma loja para vender X e denomina-a X pela linguagem corrente, embora X tenha um
sentido técnico diferente: B, funcionário da loja, interpreta X num sentido muito mais técnico que A
No entanto, em certas situações, aplicando bem o artigo 236º, não conseguimos saber os efeitos
jurídicos que as partes queriam retirar dessa declaração, então para as resolver, in extremis, surge
o Artigo 237º (só aplicado depois de se esgotar o Artigo 236º)
Em casos de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o menos gravoso para
o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações.
Não nos permite descobrir um sentido alternativo para a declaração, mas sim, fazer a escolha entre
sentidos alternativos que possam estar identificados no Artigo 236º. Distinguindo entre:
> negócios gratuitos: aqueles nos quais se pretende beneficiar outro sem pretender ter algo
em troca, dizendo-nos que em caso de dúvida, decide-se pelo sentido menos
desfavorável àquele que dispõe.
ex. doação: A cria um benefício a B sem esperar nenhuma contrapartida: doou 1 ou 2 coisas? 1.
> negócios onerosos: aqueles que assentam na ideia de um sinalário ou de uma troca:
onde existe uma troca por troca: uma das partes dá para que a outra também dê e só
quer dar para poder receber, adoptando-se, em caso de dúvida, o que mais contribua
para o equilíbrio das prestações, havendo uma troca de prestações.
1. Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de
correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso - forma
determinante para a concretização do negócio.
2. Esse sentido pode, todavia, valer, se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes
da forma do negócio se não opuserem a essa validade. - questões não nucleares
O princípio geral do Direito Privado centra-se na Liberdade de Forma (Artigo 219º), no entanto,
existem certos casos em que a lei exige uma determinada forma para que sejam reconhecidos,
sendo a esses os que o Artigo 238º se refere.
Se a lei exige que uma determinada declaração, para ser válida, respeite uma certa forma, então
não a podemos desconsiderar quando estivermos a interpretar a declaração, ou seja, a declaração
só vale se tiver no texto formal um mínimo de correspondência, ainda que esse não seja claro,
inexacto ou inequívoco.
Existem, ainda assim casos em que a lei exige uma forma para um dado negócio ou contrato, mas
não exige necessariamente que todo o conteúdo revista essa forma, mas sim que os elementos
determinantes, as razões determinantes da forma a respeitem.
ex. A compra uma casa, exigindo a lei escritura pública, mas A combinou com o vendedor, B, que
teria de fazer remodelações na casa, fazendo isso também que fazer parte do contrato, mas não
tem de ser incluído na escritura, pois a forma apenas é exigível às razões determinantes.
É a actividade a partir do qual sanamos uma determinada lacuna: quem emite uma declaração
negocial não consegue antecipar tudo aquilo com que pode vir a ser confrontado no futuro, portanto
podemos identificar problemas para os quais possa ser necessário uma determinada solução não
prevista na declaração negocial.
Para que haja lacuna é necessário haver uma omissão na declaração negocial que, em vista no
todo, não deveria existir, exigindo-se uma dada solução, dando-nos o Artigo 239º, dois critérios
que nos permitem resolver as lacunas existentes nas declarações negociais.
Na falta de disposição especial, a declaração negocial deve ser integrada de harmonia com a vontade que
as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou de acordo com os ditames da boa fé, quando
outra seja a solução por eles imposta.
* recurso à chamada vontade hipotética das partes: não existindo uma vontade real, a lei conduz-
nos à sua procura, isto é, a que as partes quereriam se a tivessem fixado, embora a “busca” seja
limitada
* o recurso a essa vontade hipotética só é possível se a vontade identificada for de acordo aos
ditames da boa fé: essa vontade hipotética terá de ser confrontada com os ditamos da boa fé em
sentido objectivo, sendo um critério meramente controlador
> alguns autores fazem uma letra ampla: que abrangeria normas suplectivas (aquelas que
se aplicam em determinados e concretos contextos caso não lhes façamos referência).
ex. local de entrega da coisa comprada não é lacuna, pois há uma norma especial que a resolve.
> outros autores defendem uma leitura restritiva (Vítor Neves concorda mais): centra-se
nas regras legais que existem e estabelecem métodos diferentes para a integração de
lacunas: normas que estabelecem métodos diferentes de as resolver.
Mas esta divergência não é puramente teórica, tendo um fundamento prático relevante:
> para a primeira corrente (239º não se aplica se houver norma suplectiva) vai ao artigo 885º, que
diz que a coisa (O3) deve ser paga no momento da entrega da coisa.
> para a segunda corrente (239º refere-se à vontade hipotética das partes), logo O3 seria pago 30
dias depois da sua recepção.
A exigência de determinada forma pode ser exigida por lei (Ad substantiam - art. 364º.1) ou
necessária para prova (Ad probatiem - art. 364º.2).
A validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei a
exigir. - regra geral
Como vimos anteriormente, basta a ideia de exteriorização para que assumamos que as
declarações negociais pressupõe uma determinada forma, tendo-se como princípio geral o da
liberdade de forma (Artigo 219º), tendo-se que ver caso a caso se a lei exige ou não forma especial,
em caso negativo, pode-se optar pela forma que se quiser.
O contrato de compra e venda de bens imóveis só é válido se for celebrado por escritura pública.
Falamos em forma legal porque a necessidade de respeito por uma determinada forma resulta de
uma disposição legal, existindo autores que a criticam por considerar que muitas das regras
existentes estão desactualizadas ou desenquadradas da nossa realidade.
ex. Artigo 875º (imóveis) vs 219º (ex. móveis) - regime atribui “riqueza fundamental” aos imóveis.
* exigência de reflexão: o legislador quer evitar decisões levianas, procura que a emissão de
determinadas declarações negociais sejam precedidas de adequada reflexão.
* segurança jurídica: a forma possibilita a certeza da data em que foram os negócios foram
celebrados, sobre o seu conteúdo exacto.
ex. o documento jurídico não é totalmente seguro (posso imprimir algo a dizer que é de 2005, mas
ter sido feito ontem), daí que, um documento escrito e provido de fé dê maior segurança.
* publicidade: impede que certos contratos sejam ocultos, que se conheça o que se fez.
ex. registos
Como vimos, quando a lei exige uma forma especial num dado contrato, todos os elementos
essenciais devem constar no contrato, no entanto existem elementos acessórios, isto é, aqueles
que pertencem ao contrato, mas sem os quais o contrato existiria, não tendo estes necessariamente
de revestir a forma do contrato.
Assim, quanto aos elementos acessórios distingue-se:
1. As estipulações verbais acessórias (todas as outras estariam incluídas no documento, mas as acessórias
podem ganhar relevo) anteriores ao documento legalmente exigido para a declaração negocial, ou
contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a razão determinante da forma lhes não seja aplicável
e se prove que correspondem à vontade do autor da declaração. - anteriores
2. As estipulações posteriores ao documento só estão sujeitas à forma legal prescrita para a declaração
se as razões da exigência especial da lei lhe forem aplicáveis. - posteriores
> Forma voluntária (Artigo 222º) - são as partes que, no momento em que emitem a
declaração, emitem-na com uma forma exigente, vincula-se porque assim quis.
1. Se a forma escrita não for exigida por lei, mas tiver sido adoptada pelo autor da declaração, as
estipulações verbais acessórias anteriores ao escrito, ou contemporâneas dele, são válidas, quando se
mostre que correspondem à vontade do declarante e a lei as não sujeite à forma escrita.
2. As estipulações verbais posteriores ao documento são válidas, excepto se, para o efeito, a lei exigir a
forma escrita. - se for posterior é válida a menos que a lei mexia uma dada forma
ex. A compra uma colecção de livros a B (219º), mas escreve no papel as condições da compra.
> Forma convencional (Artigo 223º) - quando não existe a imposição legal duma dada
forma, mas as partes estipulam uma forma especial para a declaração, ou seja, antes da
declaração ser emitida, as partes pré-acordam a forma como se vinculam, se depois da
declaração negocial, assume-se que a forma convencionada consolidaria a existente.
1. Podem as partes estipular uma forma especial para a declaração; presume-se, neste caso, que as
partes se não querem vincular senão pela forma convencionada.
2. Se, porém, a forma só for convencionada depois de o negócio estar concluído ou no momento da sua
conclusão, e houver fundamento para admitir que as partes se quiseram vincular desde logo, presume-se
que a convenção teve em vista a consolidação do negócio, ou qualquer outro efeito, mas não a sua
substituição. - fala da forma convencional contemporânea ou posterior ao contrato: irrelevante.
ex. compra e venda de móveis pode ser feita oralmente, mas as partes acordam previamente que
haverá uma formalização convencionada do contrato, sendo essa forma determinante para a
celebração do contrato.
VALIDADE E INVALIDADE
Regra geral as declarações negociais produzem os efeitos por ela estabelecidos, no entanto em
certas situações estas são ineficazes, não produzindo tais efeitos, contribuindo para tal a forma
(Artigo 220º), os vícios da declaração (Artigos 240º a 257º) ou conteúdo (Artigos 280º a 284º).
Existem 3 modalidades de ineficácia, nomeadamente:
* Nulidade
Na prática quando falamos na forma do negócio jurídico, referimos-nos a duas alternativas: forma
oral e forma escrita. Mas nem todos os documentos escritos são iguais:
2. Autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos
limites da sua competência ou, dentro do círculo de actividades que lhe é atribuído, pelo notário ou outro
oficial público provido de fé pública; todos os outros documentos são particulares.
3. Os documentos particulares são havidos por autenticados, quando confirmados pelas partes, perante
notário, nos termos prescritos nas leis notariais.
> Documentos autênticos: aqueles onde se exige às partes que confirmem o seu conteúdo
ante um notário, confirmando o que elaboraram com este que o lê e confirma (não
coincide com o reconhecimento das assinaturas que apenas as reconhece, não
confirmando o conteúdo do documento).
> Documentos particulares: aqueles onde as partes escrevem, redigem e nada mais
fazem, podendo, se as partes assim o entender ser autenticado (Artigo 363º.3)
1. Quando a lei exigir, como forma da declaração negocial, documento autêntico, autenticado ou
particular, não pode este ser subtituído por outro meio de prova ou por outro documento que não seja
de força probatória superior. - formato substância
2. Se, porém, resultar claramente da lei que o documento é exigido apenas para prova da declaração, pode
ser substituído por confissão expressa, judicial ou extrajudicial, contanto que, neste último caso, a
confissão conste de documento de igual ou superior valor probatório. - forma acto probatione
> Forma acto substância (364º.1): quando a forma está associada à própria substância do
negocio, isto é, quando é necessária para que o acto seja válido (Artigo 220º).
> Forma acto probatione (364º.2): quando a lei fala na exigência do documento apenas
para prova da declaração, ou seja, o que leva a exigir a forma nas é uma preocupação
com a validade do negocio, mas sim com a prova desse mesmo negocio jurídico.
> Contratos Reais: aqueles que criam, modificam, transmitem, modificam ou extinguem
efeitos reais.
1. A constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato
(regra geral: quod effectum), salvas as excepções (quod costitonem) previstas na lei.
2. Se a transferência respeitar a coisa futura ou indeterminada, o direito transfere-se quando a coisa for
adquirida pelo alienante ou determinada com conhecimento de ambas as partes, sem prejuízo do disposto
em matéria de obrigações genéricas e do contrato de empreitada; se, porém, respeitar a frutos naturais
ou a partes componentes ou integrantes, a transferência só se verifica no momento da colheita ou
separação.
> Quod effectum (Regra Geral); quando o efeito real produz-se por mero efeito do
consenso, do acordo a que as partes chegam.
ex. a transmissão da propriedade ocorre por mero consenso daquilo a que as partes chegaram para
a confirmação do contrato - não é necessário que entregue a coisa para que se cumpra.
> Quod constitutionem: quando o efeito real pressupõe a entrega da coisa, ou seja,
o efeito real só se produz quando a coisa a que o negócio se refere for entregue
ex. penhor (Artigo 669º) - para que produza efeitos não basta que as partes cheguem a acordo, só
se cumpre quando se produz o efeito real, ou seja, a entrega da coisa.
E esse carácter excepcional da entrega da coisa associado ao quod constitutionem surge quando:
* procura-se que haja uma reflexão acrescida sobre o sentido do acto que estamos a praticar.
ex. Artigo 946º: a disposição testamentária dos imóveis para ser válida tem de respeitar a forma.
ex. Artigo 1142º mútuo: A empresta a B, ficando B obrigado a restituir a A o emprestado, ou seja, o
mútuo só se conclui quando B recebe o que A emprestou e é assim porque sim.
ex. penhor (móveis): exige-se a sua entrega para deixar de induzir o penhorado de que tem a sua
posse, já que esta está, na realidade, na possa da loja de penhores
ex 2. hipoteca (imóveis): A deixa de pagar ao Banco o empréstimo da casa, então o Banco apropria-
se da casa, podendo vendê-la.
Discute-se, na doutrina, se as regras legais que impõe o caracter constitutionem são imperativas
ou se está na disponibilidade das partes, podendo as partes subtrair-se à entrega da coisa, não se
podendo classificá-las como tal, pois a resposta está, na verdade, na razão que levou o legislador
a interpor essa exigência.
Assim, no caso do penhor, a regra é vista como imperativa, mas no caso do mútuo nada impede
que as partes celebrem um contrato prescindindo da entrega na coisa, estando na sua
disponibilidade de o fazer ou não fazer.
* formação da declaração
Há uma distinção que pode ser feita entre objecto e conteúdo do negocio jurídico:
> Conteúdo: conjunto de efeitos que o negocio visa prosseguir (ex. requisitos Artigo 879º)
> Objecto: o bem sobre o qual a declaração negocial reflecte (ex. carro)
A concretização não é viável por razões físicas ou por razões legais e para que essa impossibilidade
tenha por efeitos a nulidade é necessário que esta reúnem certas características:
> tem de ser definitiva: no momento da assinatura do contrato não temos qualquer
expectativa de alterar a situação, celebro o contrato na expectativa de que se concretize
o estipulado.
Não se confunde com indeterminação: aquelas situações com mecanismos que o permitem
determinar no futuro: A compromete-se a fazer X ou Y: sendo válido pois é determinável.
ex. A compromete-se a fornecer todo o ferro para a obra de B: a medida ainda está por ser
determinada, mas é uma questão de tempo: é determinável
ex. Artigo 405º: à partida permite tudo, mas há limites que não se pode ultrapassar - os contrários
à lei: A celebra um contrato com B para que B mate C.
A diferença entre impossibilidade legal e uma ilicitude prende-se com o conteúdo do contrato:
Assim, a ilicitude é geralmente contrária à lei, embora também possa ser contrária:
ex. princípio de que nenhum contrato é eterno, embora não haja nenhuma normal legal em que tal
se verifique, se a violasse faríamos apelo à ordem pública e aos seus princípios estruturantes.
* aos bons costumes: a ideia de moral social, o conjunto de regras deontológicas a que todos nós
reconhecemos vincular-nos.
Se apenas o fim do negócio jurídico for contrário à lei ou à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes,
o negócio só é nulo quando o fim for comum a ambas as partes. - único motivo de censura é o seu fim.
ex. A vai a uma loja comprar uma faca de cozinha para ir roubar carteiras: o contrato da compra da
faca não tem nada de inválido, mas o fim da compra é ilegal e ao abrigo do 281º o contrato não é
inválido pois o fim for só de uma das partes (A), se o fim fosse comum às partes o contrato aí seria
nulo.
O fim a que o Artigo 281º se refere trata-se de um elemento estranho ao negócio, é o objectivo que
as partes prosseguem que se distingue do fim usado como causa dos contratos, isto é, aqueles que
pressupõe uma dada causa, uma razão que justifique o nosso comportamento, assentando no
princípio do casuísmo. Assim, regra geral, o nosso Ordenamento Jurídico só está disponível a
prosseguir negócios jurídicos caso exista uma boa razão que o justifique.
ex. A vai a uma loja e passa um cheque, tendo depois o Banco que pagar a B, mas o Banco não
pergunta a B o que vendeu para receber esse dinheiro, sendo irrelevante para este.
ex 2. A transmite o seu Código Civil a B porque sim: é nulo, pois tem de haver uma justificação,
uma causa desse negocio jurídico.
Essa causa dos negócios jurídicos acaba por ser a função da natureza económico-social que os
negócios jurídicos prosseguem e, identificada essa causa, temos a razão justificativa do negocio.
A causa é na verdade um elemento interno do próprio negócio, já o fim é um elemento externo, isto
é, a causa justifica a razão pela qual o Ordenamento Jurídico está disponível para sancionar os
efeitos que as partes querem ver produzidas.
INVALIDADES
Os casos de invalidade são casos especiais em que o Ordenamento Jurídico recusa conferir-lhes
eficácia, assim, quando uma declaração negocial enfrenta um desses vícios é tida como nula.
O Ordenamento Jurídico prevê duas modalidades de invalidade, podendo os negócios jurídicos
inválidos serem nulos ou anuláveis, existindo um Regime Geral no Artigo 285º e ss e outras
invalidades atípicas, isto é, regimes especiais (ex. Artigo 410º ou 480º).
A nulidade e a anulabilidade distinguem-se pela:
A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo
tribunal.
Pode ser invocada por qualquer interessado, bastando que retire um dado interesse desse contrato,
nem precisando de ser parte do contrato.
A nulidade é também de reconhecimento oficioso, ou seja, o tribunal pode, espontaneamente, ao
ter conhecimento com o contrato, declará-lo nulo, mesmo que ninguém evoque a sua nulidade.
1. Só têm legitimidade para arguir a anulabilidade as pessoas em cujo interesse a lei a estabelece, e só
dentro do ano subsequente à cessação do vício que lhe serve de fundamento.
2. Enquanto, porém, o negócio não estiver cumprido, pode a anulabilidade ser arguida, sem dependência
de prazo, tanto por via de acção como por via de excepção.
ex. A (menor) celebra um contrato com B, por estar em causa a protecção do seu interesse, é A
quem pode invocar o a anulabilidade do contrato.
Os negócios celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em que
outra solução resulte da lei.
Não apresenta nenhum limite temporal, embora uma invocação tardia possa aparecer contaminada
pelo abuso de direito.
Tem de ser invocada no prazo de 1 ano a contar desde a cessão do vício, isto é, a partir do momento
em que se descobre a existência de um vício (ex. A, menor, celebra um contrato com B e B descobre
passado 2 anos que A era menor, o prazo conta-se a partir desse momento).
Caso se ultrapasse o prazo, o negocio não é passível de ser anulado. Esses prazo justifica-se na
segurança jurídica, para que as partes, ao saber com o que contam, possam clarificar se querem
ou não serem protegidas.
O Artigo 287º.2 quando fala em anulabilidade por via de acção ou por via de excepção, o que
importa reter é que, caso o contrato não esteja em vigor, a anulabilidade pode ser invocada a
qualquer tempo, afastando-se o prazo há que a situação ainda não está consolidada.
1. Tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído
tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
2. Tendo alguma das partes alienado gratuitamente coisa que devesse restituir, e não podendo tornar-se
efectiva contra o alienante a restituição do valor dela, fica o adquirente obrigado em lugar daquele, mas só
na medida do seu enriquecimento.
ex. A vende imóvel a B, B doa a C, o contrato de A e B é nulo. A pode dirigir-se a C, exigindo o imóvel na
medida em que enriqueceu
3. É aplicável em qualquer dos casos previstos nos números anteriores, directamente ou por analogia, o
disposto nos artigos 1269o e seguintes.
Ambas têm efeito retroactivo, devendo-se repor a situação anterior à emissão da declaração.
Quando um tribunal diz que um contrato é nulo, não inova, pois a nulidade já existia em si, já pré-
existe, apenas a reconhece: reconhecendo que não produziu nem produzirá efeitos, é uma
declaração puramente declarativa.
A nulidade nunca é sanável, podendo ser por qualquer interessado a qualquer momento.
Quando um tribunal anula um contrato, aí já se fala em algo inovador, pois cessa-se os efeitos
desse, alterando a situação pré-existente, sendo por isso constitutiva.
Não há declaração da anulabilidade, pois o tribunal certifica-se do vício e altera os efeitos jurídicos,
deixando o contrato de produzir efeitos.
Assim, a anulabilidade é sanável por duas vias:
> Prazo: ao abrigo do Artigo 277º, se passa o prazo de 1 ano após a cessação do vício,
então o negócio deixa de poder ser anulado, valendo como tal.
> Confirmação: caso a a pessoa à qual foi invocada a anulabilidade confirmar o negócio
(Artigo 288º)
ex. A confirma o contrato que celebrou quando era menor, sanando o erro do negócio.
Ainda assim, os efeitos que a lei associa à anulabilidade e à nulidade, como nos diz o Artigo 289º,
são os mesmos, isto é, têm eficácia retroactiva, apagando o contrato como se nunca tivesse
existido, destruindo todos os efeitos criados, impondo a que as partes restituam tudo o que
receberam, voltando-se a uma situação como se nada tivesse acontecido.
O Artigo 290º acrescenta que essa restituição deve ser simultânea
As obrigações recíprocas de restituição que incumbem às partes por força da nulidade ou anulação do
negócio devem ser cumpridas simultaneamente, sendo extensivas ao caso, na parte aplicável, as normas
relativas à excepção de não cumprimento do contrato.
Quando o negócio viola a lei, mas não há sanção aplicável, deve-se optar pela nulidade (Artigo
294º).
A nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio, salvo quando se mostre que
este não teria sido concluído sem a parte viciada.
É uma situação onde o vício afecta apenas uma parte do negócio, suprimindo-se a parte viciada,
continuando o negocio a produzir efeitos quanto ao resto do negocio.
No entanto, se a parte viciada for fundamental e se essa demonstração for feita então cai todo o
contrato, tendo o ónus da prova quem quer a anulação do contrato.
ex. A faz um contrato de arrendamento com B por 100 anos, mas a lei diz que o máximo possível é
de 30 anos, então, afasta-se os 100 anos, reduzindo-se a 30, suprindo-se a parte inválida.
Mas se B, que quer a anulação, conseguir demonstrar que os 100 anos tinham sido acordados por
uma questão de estabilidade, sendo essa uma questão fundamental, então supre-se tudo.
O negócio nulo ou anulado pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual
contenha os requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido pelas partes permita
supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade.
É uma situação onde todo o negocio está viciado, afectando a invalidade todo o negocio.
À partida, o contrato não produz quaisquer efeitos, mas este instituto da conversão permite salvar
o negocio, transformando-o num contrato diferente, caso os requisitos de forma estiverem
cumpridos, se se demonstrar que as partes haviam querido esse contrato e após as devidas
alterações terem sido feitas, tendo o ónus quem quer quer o contrato se cumpra.
Na falta de demonstração o negócio não pode ser salvo.
ex. A e B registam por escrito um contrato de compra e venda da casa de A, sendo o negócio nulo
por exigir escritura pública, mas se as partes demonstrarem que se soubessem do vício teriam era
feito um contrato-promessa (cumprindo os requisitos), faz-se a conversão do negócio.
1. Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os
direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição.
2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são
aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.
3. Os direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, enfiteuse, superfície e servidão não prescrevem,
mas podem extinguir- se pelo não uso nos casos especialmente previstos na lei, sendo aplicáveis nesses
casos, na falta de disposição em contrário, as regras da caducidade.
> Prazos: na Prescrição são gerais e definidos para todas as situações jurídicas (Artigos
316 º - 6 meses e 317º - 2 anos)
na Caducidade não tem vocação geral, sendo definidos consoante cada
direito e regime
Quando a lei fixa um determinado prazo para o exercício de um direito e esse não é exercido dentro
do prazo, o direito caduca, isto é, há uma extinção da situação jurídica, por força de lei ou vontade
das partes
Na prática e ante um caso concreto, é por vezes difícil saber se estamos perante um caso de
caducidade ou de prescrição, e, em caso de dúvida, aplica-se o regime da caducidade, dado nos
Artigos 328º e ss., aplicado sempre que a lei não remeta para a prescrição.
O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine.
O prazo de caducidade, se a lei não fixar outra data, começa a correr no momento em que o direito puder
legalmente ser exercido.
É também um caso em que um determinado direito não é exercido durante um determinado período
definido na lei, mas neste caso não se determina o fim dos direito prescritos, já que estes modificam-
se.
2. Não pode, contudo, ser repetida a prestação realizada espontaneamente em cumprimento de uma
obrigação prescrita, ainda quando feita com ignorância da prescrição; este regime é aplicável a quaisquer
formas de satisfação do direito prescrito, bem como ao seu reconhecimento ou à prestação de garantias.
3. No caso de venda com reserva de propriedade até ao pagamento do preço, se prescrever o crédito do
preço, pode o vendedor, não obstante a prescrição, exigir a restituição da coisa quando o preço não seja
pago.
Caracteriza-se pela sua imperatividade, não se podendo, por contrato, se alterar o regime aplicável
à prescrição (Artigo 300º), nem renunciá-la antecipadamente (Artigo 302º).
E tal como o Artigo 304º esclarece, a prescrição não determina o fim dos direitos prescritos, a sua
extinção, mas sim a sua modificação, passando a obrigação civil pararam obrigação natural (Artigo
402º), isto é aquela à qual não existe uma tutela que a exerça coercivamente.
Os prazos da prescrição começam por ser contados no início do curso da prescrição (Artigo 306º),
seguindo-se para os Artigos 309º a 311º, que não se confundem com a prescrição presuntiva
inscrita nos Artigos 312º e ss, assentando na presunção do cumprimento, isto é, que determinados
credores só deixam de exercer os seus direitos quando os devedores cumprissem as suas
obrigações, mas essas obrigasse, em condições normais seriam cumpridas rapidamente.
ex. Artigo 317º: A vai ao hospital e passado 2 anos a lei presume que A pagou a conta, devendo o
Hospital provar que A não pagou, cabendo-lhe o ónus da prova.
CONDIÇÃO E TERMO
A condição e o termo indexam à produção de efeitos, nos termos das declarações negociais, a
verificação de certos acontecimentos, isto é, as partes acordam que só pretenderão certos efeitos
aquando da verificação de certos factos ou, por outro lado, acordam que verificados certos factos,
pretende-se a cessação de efeitos.
* Termo (Artigo 278º e 279º)
É resolutivo quando após a sua verificação, os efeitos deu negocio cessam, por outro lado, é
suspensivo quando, após a sua verificação, os efeitos começam a ser produzidos.
Se for estipulado que os efeitos do negócio jurídico comecem ou cessem a partir de certo momento, é
aplicável à estipulação, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 272o e 273o.
Portanto, associa-se a todo o facto que as partes subordinam à eficácia de um dado negocio sempre
que a verificação desse facto é certa.
* certo: sempre que sabemos quando vai acontecer (ex. sabemos que será no dia 1 de Julho)
* incerto: sempre que se sabe que vai acontecer, mas não quando (ex. entre em vigor após a morte
de X)
O Artigo 279º estabelece as regras gerais do termo e o 278º remete para o regime da condição:
Existem negócios incondicionáveis, isto é, que não podem ser submetidos à condição como o
casamento, a perfilhação ou a aceitação e repudia de herança.
As partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio
jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se suspensiva a condição; no segundo, resolutiva.
As partes subordinam a eficácia de um dado concreto, mas ao contrário do termo, a sua verificação
é incerto, isto é, não sabemos se irá ou não acontecer.
Existem algumas excepções face às condições, nomeadamente condições ilícitas ou impossíveis,
devendo-se distinguir as resolutivas (por serem de condição impossível nunca cessam, logo retira-
se da parte escrita do contrato), das suspensivas (contrato é nulo)
1. É nulo o negócio jurídico subordinado a uma condição contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos
bons costumes.
2. É igualmente nulo o negócio sujeito a uma condição suspensiva que seja física ou legalmente impossível;
se for resolutiva, tem-se a condição por não escrita.
ex. A dá um carro a B, se B tiver tudo 18: é uma condição: não sabemos se irá ou não acontecer.
A verdade é que, segundo o que o Artigo 270º e ss. prevê, podemos introduzir nos contratos quanto
a um acontecimento futuro e incerto que celebramos duas cláusulas acessórias:
* cláusula suspensiva: associa-se a suspensão dos efeitos do negócio jurídico celebrado até à
celebração da condição
ex. Jorge Jesus diz que o contrato tinha um clausula a partir do qual o contrato com o SCP entraria
a 1 de Julho de 2015 - diz em que circunstâncias em termos de termo quando é que o seu contrato
produz efeitos.
João Bernardo Silva 38 de 57
Teoria Geral do Direito Privado
* certa: quando não sabemos se irá ou não acontecer, mas se acontecer sabemos que será num
dado momento ou num dado dia.
ex. Portugal vai ganhar o Euro 2016: a condição apesar de ser incerta, sabemos que a acontecer,
quando será.
* incerta: quando juntamos as duas incertezas: não saber se vai ou não acontecer, nem o momento
em que pode acontecer, pois exige-se o aproveitamento da expectativa de quem poderá vir a ser
afectado pela verificação da condição
A lei, na condição, destina o Artigo 271º a 274º ao problema da Pendência, isto é, o período de
tempo entre a celebração do contrato e a verificação ou não da condição.
Assim, o Artigo 272º refere-se que se actue segundo os ditames da boa fé no período de pendência
para que não se comprometa a integridade do direito da outra parte.
Aquele que contrair uma obrigação ou alienar um direito sob condição suspensiva, ou adquirir um direito sob
condição resolutiva, deve agir , na pendência da condição, segundo os ditames da boa fé, por forma que
não comprometa a integridade do direito da outra parte.
No Artigo 273º preocupa-se com os actos de conservação, isto é, quem habitualmente pode praticar
actos de conservação de uma coisa é o proprietário, mas este artigo altera a situação, dizendo que,
numa condição suspensiva, o comprador pode conservar por estar numa posição de expectativa
forte e numa resolutiva pode, o vendedor conservá-la.
No Artigo 274º preocupa-se com os negócios que ficam sujeitos à condição, assegurando que os
efeitos em vista, os efeitos dispostos, se concretizem.
1. Os actos de disposição dos bens ou direitos que constituem objecto do negócio condicional, realizados na
pendência da condição, ficam sujeitos à eficácia ou ineficácia do próprio negócio, salvo estipulação em
contrário.
2. Se houver lugar à restituição do que tiver sido alienado, é aplicável, directamente ou por analogia, o
disposto nos artigos 1269o e seguintes em relação ao possuidor de boa fé.
ex. A queria ver-se livre dum carro e B diz que compro isto com a condição de ter ou não um
financiamento bancário, surge o C que dá 10 mil logo, então A vende a C, mas na verificação da
condição, A restitui os 10 mil a C, C devolve o carro a A e cumpre-se a transição esperada.
ex. A rouba a B o Código Civil, mas A descobre que C tem o seu Código Civil, tendo legitimidade
para exigir a C que lhe dê o seu CC, independentemente do que pagou por ele
Esta situação de pendência termina com a verificação da condição, mas caso esta seja incerta e
nunca se possa verificar, então essa situação de pendência prolongar-se-ia eternamente, daí o
Artigo 275º proibir essa perpetuação, cessando a penderia quando se verifique a impossibilidade
da concretização da situação.
1. A certeza de que a condição se não pode verificar equivale à sua não verificação.
2. Se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-
se por verificada; se for provocada, nos mesmos termos, por aquele a quem aproveita, considera-se como
não verificada. - associa-se às situações de condição, onde o facto é futuro (posterior ao contrato) e incerto,
o que significa que os efeitos podem ou não se verificar, não se podendo atura contra a boa fé.
ex. A promete a B que se tiver 15 no exame de TGDP dá-lhe um presente, mas depois no dia do exame fecha
B em casa: A, contra as regras da boa-fé, impediu a concretização da situação.
A verificação da condição, regra geral (Artigo 276º), tem eficácia retroactiva, sendo, por definição
posterior, ou seja, durante esse período de tempo (da verificação da condição), as partes agem
como se o contrato tivesse a produzir efeitos desde a sua celebração, isto na condição suspensiva
, ou seja, como se B no exemplo anterior tivesse sido sempre o seu proprietário.
Caso seja resolutiva, associa-se à não retroactiva.
Existe ainda um outro fenómeno, as condições potestativas, ou seja, aquelas que apontam para
um facto que está na disponibilidade de uma das partes, podendo, a sua verificação ser determinada
discricionariamente por uma das partes, decidindo se o contrato produz ou não efeitos.
ex. A promete a B que se for às aulas dá-lhe um presente: é potestativa pois A decide livremente e
discricionariamente e vai ou não às aulas, logo decide se o contrato produzirá ou não efeito.
Para alguns autores, as condições potestativas seriam inválidas, contaminado o contrato, pois,
quando celebramos um contrato pressupõe-se uma situação de liberdade e de responsabilidade,
ora, se um contrato tem uma condição protestativa, depende de uma das partes concretizá-lo ou
não, logo acaba por negar o próprio negócio, conduzindo à ilegalidade do contrato.
No entanto, uma parte da doutrina critica esse entendimento por assentar na ideia de que um
contrato vincula ambas as partes à verificação do contrato.
ex. há certos contratos em que uma das partes se compromete a vender e a outra não se
compromete a pagar
Essa doutrina, embora ache que os contratos são, de facto válidos, não os vê como contratos com
condições, pois esta não existe, já que se dá uma opção a uma das partes.
O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que
lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último.
O regime geral é-nos dado pelo Artigo 258º que nos esclarece que o representante actua em nome
do representado, produzindo os efeitos da sua actuação na esfera jurídica do representado
ex. A concede a B o direito de vender a casa em nome deste, mas B arrenda em vez de vender, o
negocio não tem valor, pois B extravasou os limites dos poderes que lhe compete.
Para que haja representação é necessário, além de uma pessoa que actue em nome de outrem,
que o representado tenha conferido a terceiro poderes para actuar em seu nome. Logo, se uma
pessoa sem autorização, actua em nome de terceiro há um desvio da autonomia privada.
O poder de representação pode ter diferentes fontes, distinguindo-se:
> Representação Legal: em que a fonte de poderes representativos é a lei, ou seja, é uma
situação que resulta da aplicação da lei, onde a atribuição da representação não reside
na vontade ou decisão do representado, mas da aplicação da lei.
ex. incapazes de exercício: um menor não pode celebrar contrato, mas a lei atribui poderes de
representação a quem exerça um poder paternal, logo os pais actuam em nome dos filhos.
ex. quem actua em função das sociedades comerciais são os gerentes nas sociedades de quotas
ou os administradores nas sociedades anónimas
* actuação em nome de outrem: onde, quem actua, invoca a sua capacidade como representante,
actuando não para si, mas em função de 3º, sendo que, os efeitos jurídicos produzidos, produzem-
se directamente na esfera jurídica desse terceiro, do representado.
ex. A pede a B que vá comprar um livro a uma livraria onde os empregados conhecem bem A a
mando deste. B não paga, dirigindo-se C (dono da livraria) a A e não B
* actuação por nome de outrem: onde há uma actuação de alguém que visa transferir para terceiro
os efeitos económicos da sua actuação, tendo num primeiro momento os efeitos jurídicos efeitos
sobre ele, mas esses direitos e obrigações destinam-se a ser transferidas para um terceiro, por
conta de quem actuou, isto é, atua em nome próprio, mas pretende transferir para o outro as
consequências da actuação.
João Bernardo Silva 41 de 57
Teoria Geral do Direito Privado
ex. B não diz que vai a mando de A, logo a livraria depois requer o pagamento a B.
ex 2. Mandato sem representação (Artigo 1180º e ss.): onde os efeitos do mandato (Artigo 1157º:
o mandato praticar certos actos de outrem: A que comprar uma casa, mas não tem tempo para isso,
então manda B) produzem-se na esfera jurídica do mandatário (B - Artigo 1181º), embora esse deva
transferi-los para o mandante (A - Artigo 1182º) já que foi por conta deste que actuou.
* o Artigo 260º diz-nos que é o terceiro quem tem o ónus de se certificar que o representante tem
efectivamente poderes para, na prática, os praticar, dentro de prazo razoável.
* o Artigo 268º fala-nos da representação sem poderes, isto é, quando alguém, sem poderes de
representação, celebra em nome de outrem um negocio, sendo esse ineficaz (caso não haja
ratificação do representado) - protege o representado e penaliza o terceiro, tendo o ónus de exigir
a prova ao alegado representante dos seus poderes.
ex. B celebra negócios com C em nome de A nas tendo poderes de representação que produção
efeitos ante A, desprotegendo C, a quem, ao abrigo do artigo 260º compete o ónus da certificação,
mas caso C não verifique, incorre no perigo de concordar com um acto que se tornará ilegal, logo o
contrato é por si ineficaz em relação ao representado (para além do que, A não ficaria vinculado ao
contrato já que não teria conferido poderes a B para tal, a não ser que o ratifique).
O Artigo 268º.2 diz-nos que o suposto representado pode ratificar a actuação do suposto
representante, produzindo-se os efeitos como se tudo tivesse sido feito correctamente.
Centremos-nos agora nesta diferença entre Falta de Poderes (representante não tinha poderes de
representação) e Abuso de Poderes (representante ultrapassou o limite da representação - devia
vender, mas arrendou / devia vender por 200, mas vendeu por 150).
A doutrina diverge, embora Vitor Neves considere que se deva fazer a distinção, pensando nas
razões que levaram o legislador a tratar de forma diferente as situações e:
* o legislador no 268º protege o representado porque no 260º havia já dito que o terceiro deveria
ter conhecimento da situação;
* quando a actuação do representante é praticada em termos disformes do representado não esse
abuso não poderia ser conhecido pelo terceiro mediante a satisfação do ónus do 260º, devendo-
nos colocarmos na posição do terceiro e ver o que é que este sabia ou deveria saber e, se
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Teoria Geral do Direito Privado
mediante o uso dessa diligência tivesse percebido desse abuso de poderes então não é protegido
pois poderia ter pedido a procuração e se apercebido.
Então, sempre que o terceiro, sendo diligente puder ter-se apercebido da insuficiência de poderes
então, protege-se o representado. Pelo contrário, sempre que o terceiro, sendo diligente não
conseguir se aperceber da insuficiência de poderes, protege-se o terceiro. Assim, sacrifica-se
sempre aquele que poderia ter evitado o risco.
ex. A diz ao B que tens poderes para vender a minha casa por 200 mil €, C, terceiro neste caso, se
for diligente, ao abrigo do 260º, pede para ver a procuração, logo, se aceitar por comprar por um
preço inferior, o risco é dele, deixando de estar sob boa-fé subjectiva ética, logo desprotegido.
ex 2. Caso não se estipule o valor e o terceiro tiver sido diligente, visto que tinha poderes e comprou
por 100 mil apesar do representante ter informado o representado do preço de venda de 200 mil
(mas não colocando na procuração valores nenhuns), protege-se o terceiro.
Outras razões fazem com que se protege o terceiro e não representado, ora porque o representado
não é totalmente claro, ora porque, no limite, quem escolhe (mal) o representante é o representado.
O Artigo 261º proíbe negócios consigo mesmo, isto é, quando, em vez de representante e terceiro,
o representante assume as duas modalidades no negocio (anulável):
Deste modo, o princípio é o de que, um negocio celebrado consigo mesmo é anulável, embora haja
excepções, isto é, uma escapatória, nomeadamente quando:
O Artigo 262º e ss. fala-nos na já falada Representação Voluntária, cujo instrumento é a Procuração
(Artigo 262º), esta um acto jurídico unilateral pelo qual o representado dá determinados poderes a
outra pessoa, o representante.
Não tem forma específica, sendo a forma a necessária para o cumprimento dos actos aos quais o
representante está incumbido - artigo 262º onde o regime geral é o da liberdade da forma e, como
sabemos, a falta de forma dá origem à nulidade pelo 220º.
> há culpa ineteligente, isto é, quando escolhe alguém que não é apto
> há culpa nas orientações
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Teoria Geral do Direito Privado
* com reserva: quando o procurador substabelece os poderes, mas mantém os poderes que tinha,
partilhando-o com o novo procurador - quando a procuração nada mencionar, assume-se que é
com reserva (264º.2)
* sem reserva: quando os poderes passam para o novo procurador, perdendo o anterior os poderes
que tinha.
Esta situação não se confunde com os auxiliares (aqueles que auxiliam o procurador no exercício
dos poderes representativos - Artigo 264º.4), nem como núncio, ou seja, aquele que dá o recado
apenas transmite a mensagem, já que procurador toma decisões.
A procuração não é um acto que existe sozinho, pelo contrário, ao atribuir-se esse poder a outro, é
porque existe uma razão para tal e subjacente a isso, existe uma relação de base e a relação de
base é a procuração existente, surgindo sempre associada como um acto de cumprimento da
relação base, ou seja, o poder atribui-se através da procuração.
O mandato é uma relação que se estabelece, mas só com este não é possível representar, é no
fundo, a razão, a causa justificativa da relação, sendo que, para representar necessita-se de uma
procuração.
* cessa a base: se cessa a razão/base da relação jurídica, então cessa-se também a procuração.
* é revogada pelo representado: o procurador pode revogar a procuração e essa, uma vez
revogada, cessam também os seus efeitos e, sendo este um um acto livre na sua causa, não
pressupondo-se nenhum fundamento, podendo ser revogada se assim o procurador o entender.
Ainda assim, o legislador apresenta, no numero 3, algumas excepções, isto é, se o representante
deve praticar os actos de interesse do representado e se assim é, a procuração não deve ser
revogada, a não ser que tenha justa causa - procuração irrevogável
ex. A (representante de C) celebra contrato-promessa com B, nos termos do qual, A promete vender
X a B por 200 mil, pedindo o sinal de 50 mil, podendo A pedir que, caso a casa não seja vendida, A
pode ficar com a sinal.
ex. A dá poderes a B para vender a casa, mas B arrenda a C, logo à partida o negocio é ineficaz,
mas A gostou tanto da ideia que ratificou o acto, passando esse a produzir efeitos jurídicos.
A declaração negocial é o comportamento através dos qual exteriorizamos uma decisão no sentido
de produzir determinados efeitos jurídicos já que estes produzem-se em função da nossa vontade.
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Teoria Geral do Direito Privado
ex. quando decidimos comprar X, compramos porque preenche certos requisitos verificados.
ex. olho para o carro, analiso as suas características, decido e depois comunico a minha decisão.
O que se pretende com é a produção de efeitos jurídicos, por isso, dizer aos meus amigos que
quero ir ao cinema (depois de ter visto horários, trailers e ter tomado a decisão) e convidá-los a
virem comigo não é uma declaração negocial já que não produz efeitos jurídicos.
Mais duas ideias:
É impossível entrar na cabeça das pessoas e ver o que decidiram, atentamos é à exteriorização de
um dado comportamento e a única coisa que conseguimos ver é o comportamento exteriorizado e
é a partir daí que vemos qual o sentido do comportamento, ou seja, os efeitos que quis produzir na
sua declaração negocial.
Vários autores falam em vícios da vontade, pela ideia de que a vontade é psicológica, não se
conseguindo determinar o que na verdade se quis.
ex. decido comprar um carro pensando que tem 100 kms, mas afinal tem muitos mais, ou seja, julgo
comprar um carro com características diferentes daquelas que tem, não o tendo comprado se
tivesse conhecimento destas e num mundo ideal, a representação seria totalmente esclarecida.
2) Decisão: deve corresponder a decisões livres, trata-se de um acto de autonomia, não deve
assentar numa decisão que tenha sido prejudicada na sua liberdade de decisão.
ex. uma pessoa compra um carro porque está a ser coagida para tal, então compra porque se quer
subtrair a um mal a que está a ser ameaçado.
3) Exteriorização: seria uma correspondência perfeita entre o que o declarante decidiu e o que este
exteriorizou.
1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real
declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente
contar com ele.
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a
declaração emitida.
O Artigo 236º e seguintes explica-nos como devemos interpretar o comportamento dos sujeitos,
retirando-se assim, os efeitos e o conteúdo atribuído àquelas declarações negociais, comparando-
o àquilo que o agente efectivamente decidiu.
Caso a decisão tomada pelo agente seja igual à decisão tomada pelo agente, a declaração
negocial é perfeita.
A verdade é que, quando interpretamos uma declaração negocial ao abrigo do Artigo 236,
podemos chegar a sentidos contraditórios entre a vontade real e a da exteriorização do agente,
tendo-se uma serie de vícios com a consequência da invalidade das declarações negociais.
E assim é porque o Ordenamento Jurídico quis compatibilizar dois interesse contraditórios:
‣ Declarante: se a declaração não produz os efeitos como quer, então o declarante pretende é
subtrair-se desses efeitos, ressalvando-se o máximo da autonomia privada.
ex. carro com mais 100 mil km2 do que o acordado: o declarante quer é deixar de comprar o carro
Assim, encontramos sempre esse contraponto entre a protecção dos interesses do declarante e
necessidade de protecção do declaratário que confiou na seriedade desse comportamento.
Esse equilíbrio encontra-se nos artigos 240º e ss, onde deparamos-nos com diferentes vícios -
apesar da não haver uma sequência lógica que faça sentido, devendo-se, por isso, imputá-los à
fase a que dizem respeito (todos eles erros procedimentais em si mesmo, tirando a usura):
O Erro simples resulta do comportamento do próprio agente, já no dolo, este é causado por terceiro
que induz o agente em erro e, havendo dolo ilícito, aplica-se o 254º.
Resulta duma inexacta representação da realidade, ou seja, a visão da realidade não corresponde
à realidade daquele facto, tal como ele existe, ou foi a mais, ou foi a menos do que existia.
Se houver uma falsa representação da realidade, vamos aos artigos 251º a 254º e perguntamos:
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Teoria Geral do Direito Privado
> Sim: então quanto à primeira fase da representação está tudo bem
> Não: então temos um Erro-Vício, cuja resposta encontramos nos Artigos 251º a 254º
O Artigo 253º diz-nos que há dolo quando alguém engana/induz em erro o outro, isto é, é qualquer
comportamento que alguém empregue com a intenção ou a consequência de induzir ou manter em
erro.
ex. sabia que o carro tinha 100 mil kms e não 10 mil kms, ficar calado é, por si, suficiente para
haver dolo
1. Entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência
de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou
terceiro, do erro do declarante. - Dolos Malus
2. Não constituem dolo ilícito as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos segundo as
concepções dominantes no comércio jurídico (aquelas que são de acordo com as concepções gerais
aceites: sei que numa loja o empregado não me vai revelar todo os defeitos.), nem a dissimulação do erro,
quando nenhum dever de elucidar (omissões que, apesar de deixarem o declarante incorrer em erro,
não são ilícitas) o declarante resulte da lei, de estipulação negocial ou daquelas concepções. - Dolos
Bonos
A distinção (feita com o apelo às concepções dominantes no comércio jurídico e à boa-fé) entre
dolos malus e dolos bons advém das circunstâncias em que este se mantém:
A lei não exige que sejamos paternalistas, não temos o dever de esclarecer sempre os outros,
devemos é avaliar o comportamento dessa pessoa e ver se o homem bom e honesto o teria tido.
ex. se discutir um problema jurídico com outro jurista não tenho tanta preocupação em explicar
tudo direito, pois ele deve retirar as conclusões por si só, pelo contrário se os discuto com um
médico, devo ter essa preocupação de explicar tudo, não devendo enganá-lo.
1. O declarante cuja vontade tenha sido determinada por dolo pode anular a declaração; a anulabilidade
não é excluída pelo facto de o dolo ser bilateral. - se o dolo provém do próprio declaratário a declaração
é anulável
2. Quando o dolo provier de terceiro, a declaração só é anulável se o destinatário tinha ou devia ter
conhecimento dele; mas, se alguém tiver adquirido directamente algum direito por virtude da declaração,
esta é anulável em relação ao beneficiário, se tiver sido ele o autor do dolo ou se o conhecia ou devia ter
conhecido. - se o erro provier de um terceiro só é anulável se o destinatário tinha ou devia ter
conhecimento do dolo, pois, não foi o declaratário que deu aso ao erro.
Sempre que uma declaração seja emitida em erro e esse seja qualificado como Dolo, então essa
declaração é anulável nos termos do artigo 254.º.
> Sim: a declaração é sempre anulável, desprotegendo-se o declaratário pois esse sabia da
existência do dolo.
> Não: a lei pergunta e deveria saber? Se tivesse sido cuidadoso teria que saber?
O legítimo para declarar a anulabilidade pela existência do vício é o declarante, tendo para tal, o
prazo de 1 ano a partir da altura em que se apercebe do vício.
> Não, não há dolo (ou não conseguimos, por meio do dolo chegar à sua anulação): vemos se
estamos perante um erro simples: a consequência é o Artigo 251º ou 252º.
Ambos falam em erros sobre os “motivos determinantes da vontade”, relacionando-se estes com 4
questões diferentes, perguntando-se: Sobre que matéria recai o erro?
O erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira à pessoa do declaratário ou ao
objecto do negócio, torna este anulável nos termos do artigo 247o.
1. O erro que recaia nos motivos determinantes da vontade, mas se não refira à pessoa do declaratário nem
ao objecto do negócio, só é causa de anulação se as partes houverem reconhecido, por acordo, a
essencialidade do motivo.
2. Se, porém, recair sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, é aplicável ao erro do
declarante o disposto sobre a resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias
vigentes no momento em que o negócio foi concluído.
ex. uma pessoa contrata outra para uma dada função, mas esta não tem as habilitações esperadas
b. Objecto do Negócio - Artigo 251º: o erro recai sobre o bem sobre o qual o negócio incide, isto
é, sobre o bem à volta do qual o negocio é celebrado, havendo erro quando há uma
representação errada das características deste.
ex. alguém compra uma peça de arte, essa peça é o objecto, pensa que é original, mas afinal é
uma cópia ou então pensa que é rara, mas afinal há muitas delas.
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Teoria Geral do Direito Privado
Segundo alguns autores, o erro pode recair sobre o objecto utilizado no sentido da realidade do
bem sobre a qual a realidade existe, mas também pelo próprio conteúdo do negócio, ou seja,
apenas quando for essencial e caso seja alvo de erro.
ex. uma pessoa celebra um contrato de arrendamento pensando estar autorizada a fazer
alterações no imóvel, mas afinal vem constatar que, nos termos do contrato, lhe era vedado - está
em erro sobre os efeitos do contrato.
De recordar que, os termos do regime da anulabilidade (Artigo 251º) regula-se nos Artigos 246º e
ss., tendo a a pessoa sobre a qual recai o erro, o prazo de 1 ano a partir do momento que
conhece o vício, tendo ainda de respeitar os requisitos previstos no 247º:
> o elemento sobre o qual recaiu o erro tem de ser essencial para o declarante, isto é,
mostrar-se que, sem aquele elemento não se teria celebrado o esse contrato naquelas condições,
caso não se consiga o contrato permanece válido
ex. um sujeito adquire um carro clássico achando ter radio, mas não tem, não é razão suficiente
para a invalidade do negócio.
ex 2. achava ter comprado um carro clássico, de colecção, mas afinal era um de 2000 nada raro
ex. o declarante não diz que o facto de o carro ser de 1960 e de 1930 torna o seu interesse no
carro nulo, ele mantém interesse no contrato, mas em situações diferentes, daí a consequência
ser a invalidade (a modificação só poderia vir depois por consequência da figura da conversão
(Artigo 293º) no âmbito do regime da anulabilidade).
c. Base do Negócio - Artigo 252.2º: a lei remete para o regime da alteração das circunstâncias
(Artigo 437º), isto é, assume-se o contrato num dado contexto, mas depois esse altera-se
significativamente, logo as partes não devem cumprir as obrigações assumidas, é um instituto
que visa tornar as obrigações influenciáveis pela evolução circunstancial, ou seja, tratam-se de
circunstâncias externas que levaram as partes a contratar quando ambas as partes assentaram
num pressuposto essencial errado.
1. Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração
anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de
equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da
boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.
2. Requerida a resolução, a parte contrária pode opor-se ao pedido, declarando aceitar a modificação
do contrato nos termos do número anterior.
Retirando-se do Artigo 437º (os requisitos para a anulação são a anormalidade, se afectar a boa-fé
e desde que não esteja coberta pelos riscos do negocio ) o conceito de base do negócio falado no
252º, isto é, a alteração de circunstâncias comuns especificas em que as partes fundaram a decisão.
Assim, no Artigo 252º, impõe-se uma leitura correctiva, isto é, a modificação ou resolução do
contrato (sem que afecte os princípios da boa-fé, nem cubra os riscos próprios do contrato),
devendo este ser equilibrado e válido desde o momento inicial.
No seu número 2, refere-se a acontecimentos passados ou presentes que não foram representados
pelas partes como deveriam ter sido.
Embora existam certas situações de fronteira incluídas no próprio contrato.
Se o facto for passado é sempre erro, nunca é alteração de circunstancias, a dúvida está nos casos
futuros: se as partes trazem para o momento do contrato a previsão do negocio é erro, pelo contrário
se é algo à qual eles no presente não esperavam que se concretizasse é alteração das
circunstâncias
ex. cidade onde se aluga as varandas das casas para se conseguir ver a festa e uma dada pessoa
reserva uma varanda que tem vista para a praça X, mas do nada, a festa muda-se para outra praça:
não obstante ser uma alteração posterior à celebração do negócio, temos um erro da base do
negócio, pois as partes assinaram prevendo-se que acontecessem determinadas coisas: situação
de fronteira
d. Outros “motivos determinantes da vontade- Artigo 252.º1: o erro recai sobre outros elementos,
só levando à invalidade da declaração se as partes tiverem reconhecido a essencialidade do
motivo. Sendo os requisitos exigentes, pois impõe-se que as partes, por acordo, tenham
reconhecido a essencialidade da informação, da matéria sobre a qual o erro recai, ou seja, há
um acordo quanto à essencialidade (mesmo que esta essencialidade seja só de uma das
partes). Distinguido-se a:
> essencialidade absoluta: sem o elemento viciando não teria querido o negocio
> essencialidade relativa: tê-lo-ia querido ao negocio, mas com outro conteúdo.
ex. compro casa em Lisboa porque trabalho cá, mas rescindiram-me o contrato - não é uma razão
comum às partes, logo não é base do negocio, assim é outros motivos
ex 2. não basta que o declarante diga que o declaratário sabia (tinha ciência, conhecimento), pois
o facto de conhecer não implica que ele aceita que isso seja um motivo essencial.
2. Vícios da Decisão: Fase volutiva (coacção moral, declaração não séria, coacção
física e falta de consciência)
O agente, tendo recolhido toda a informação escolhe os efeitos jurídicos que puder associar ao seu
comportamento, procurando a lei que essa decisão resulte dum acto de autonomia decisória e não
duma posição externa que limite o caminho e a sua autonomia decisória, havendo aí um vício.
1. Diz-se feita sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o
declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração.
2. A ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de terceiro. - não é
necessário que o declarante tenha actuado com receio de um mal para si próprio, podendo o ter feito pelo
receio a terceiros (ex. ou assinas o documento ou expludo um prédio)
3. Não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor referencial
(usura). - limita pela negativa o que é uma ameaça ilícita, isto é, só não é coacção aquele perfeitamente
justificado à luz das circunstancias concretas e aquele resultante de um temor referencial, ou seja, a
referência que temos sobre determinada pessoa (ex. respeito que os alunos têm pelo professor).
Assim, para que haja Coacção Moral, é necessário, ao abrigo do Artigo 255º.1 que a ameaça:
> seja ilicita: que o declaratário ou terceiro faça uma ameaça ao declarante, isto é, a
promessa de um mal, devendo esta ser ilícita (ex. o senhorio dizer que se não pagares a renda
vais para a rua não se trata de uma ameaça ilícita).
> seja a causa da declaração: isto é, que o declarante só emitiu aquela declaração com
aquele conteúdo tendo em conta essa ameaça, isto é, o receio pela concretização desse mal.
A declaração negocial extorquida por coacção é anulável, ainda que esta provenha de terceiro; neste caso,
porém, é necessário que seja grave o mal e justificado o receio da sua consumação. -
O Artigo 256º diz-nos quais os efeitos da Coação, concentrando-nos em saber de onde esta
provém, se:
Surge quando o sujeito é fisicamente obrigado a ter certo comportamento, traduzindo-se esta
numa declaração, que não existiu.
Coação Física não se confunde com uma ameaça de um mal físico (ex. ameaça de tudo se não
fizer X é coação moral e não física). Nesta não há nenhuma decisão pois o corpo de quem declara
não é dirigido pelo alegado declarante, mas sim por um terceiro (ex. numa licitação, a pessoa que
está ao meu lado levanta-me o braço), como um verdadeiro autómato.
Em suma, alguém toma uma decisão por mim, nem se reconhece uma declaração negocial.
Em caso desse comportamento ter sido prejudicial para terceiro, deve-lhe ser paga uma
indemnização consoante os danos causados.
A declaração não produz qualquer efeito, se o declarante não tiver a consciência de fazer uma declaração
negocial ou for coagido pela força física a emiti-la; mas, se a falta de consciência da declaração foi devida a
culpa, fica o declarante obrigado a indemnizar o declaratário.
* Falta de Consciência
Casos em que o autor do comportamento não tem consciência de que está a emitir uma
declaração negocial. Se o autor tiver culpa, fica obrigado a indemnizar.
Há uma total ausência das 3 figuras previstas numa declaração negocial perfeita, aliás nem
invalidade há, pois nem se reconhece a existência dessas declarações, não produzem efeitos.
Artigo 245º CC (Declarações não sérias)
1. A nulidade proveniente da simulação não pode ser arguida pelo simulador contra terceiro de boa fé.
2. Se, porém, a declaração for feita em circunstâncias que induzam o declaratário a aceitar justificadamente
a sua seriedade, tem ele o direito de ser indemnizado pelo prejuízo que sofrer.
Ou seja, quando dizemos algo como se fosse uma coisa séria, mas não pretendemos produzir
qualquer efeito jurídico, estando convicto de que, o outro perceberia a brincadeira, isto é, a
ausência de intuito de produzir efeitos jurídicos, ou seja, emite em tom jocoso.
O Ordenamento Jurídico não lhe reconhece como declaração negocial pois não há qualquer
correspondência entre o que exteriorizamos e o que (não) decidimos, mas, se gerou prejuízos, há
a obrigação de indemnizar.
ex. A e B fazem uma partida a C, ligando-lhe dizendo ser uma proposta duma grande empresa
com um ordenado milionário, então C despede-se do seu emprego, ou seja, confia
justificadamente, tendo um prejuízo (despediu-se), devendo ser indemnizado pelos danos.
> Requisito relativo à formação - alguém adquire uma declaração negocial a partir da exploração
de uma inferioridade de outrem:
> Requisito relativo ao conteúdo - o conteúdo da declaração tem de resultar em algo injusto, isto
é, a atribuição para o o explorador ou terceiro de um beneficio injustificado ou excessivo.
1. É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, explorando a situação de necessidade,
inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste,
para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios excessivos ou injustificados.
ex. aluno que, nas véspera do exame não acordou a horas, faltam 5 minutos para o exame e diz
ao taxista que está com muita pressa e este diz que, para levar à Faculdade custar-lhe-á 50€
quando custa 10€ (necessidade de chegar a horas), obtendo para si benefícios injustificados,
excessivos (não faz sentido cobrar 50 por algo que custa 10).
ex 2. um Médico para salvar um paciente (debilidade ) diz que este terá de o tornar herdeiro
(vantagem injustificável).
Assim, a declaração viciada por usura é anulada (caso se cumpra os dois requisitos), estando
sujeita ao regime geral: pode invocar anulabilidade o que estava na posição de inferioridade tendo
1 ano desde o reconhecimento do vício. Mas esta anulação tem um regime especial:
1. Em lugar de anulação, o lesado pode requerer a modificação do negócio segundos juízos de equidade.
- declarante em vez de pedir a anulação, pede a sua modificação por requisitos de equidade (= transformar
o negócio em algo justo, afastando a usura) - no prazo para arguir a anulabilidade
2. Requerida a anulação, a parte contrária tem a faculdade de opor-se ao pedido, declarando aceitar a
modificação do negócio nos termos do número anterior. - o usuário em resposta ao pedido de
anulabilidade do lesado
Assim, aquele que pode invocar a anulabilidade ou destrói o negocio todo ou então mantém o
negocio, mas com modificações e, caso opte pela última, a outra parte tem de aceitar a modificação.
Caso opte pela primeira, a outra parte pode-se opor à anulação, oferecendo em troca, a
modificação, isto é, retirando os benefícios excessivos e injustificados.
1. A declaração negocial feita por quem, devido a qualquer causa, se encontrava acidentalmente
incapacitado de entender o sentido dela ou não tinha o livre exercício da sua vontade é anulável, desde
que o facto seja notório ou conhecido do declaratário.
2. O facto é notório, quando uma pessoa de normal diligência o teria podido notar. - anulabilidade só quando
é notória a incapacidade
ex. uma pessoa alcoolizada celebra um contrato, a declaração não é sempre anulada, pois a lei
encontra o equilíbrio dizendo que só é anulável se a incapacidade for notória ou conhecida pelo
declaratário, podendo o declarante requerer a sua anulabilidade, no prazo de 1 ano desde a
cessação do vício - quando volta ao seu estado normal).
A simulação existe quando o declarante e o declaratário acordam que o declarante emitirá uma
declaração diferente da sua vontade real, enganando assim terceiros, sendo necessário:
1. Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência
entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado.
2. O negócio simulado é nulo. - é nulo e não anulado porque existe o objectivo de enganar terceiro, logo
essa invalidade pode ser arguida a todo o tempo e por qualquer interessado - Art. 242º e 243º O NEGÓCIO
É SEMPRE NULO
> Relativa (Artigo 241º) - quando existe o objectivo de celebrar um negócio com um dado
conteúdo, mas por baixo deste está um outro escondido - o negócio dissimulado, ou seja, aquele
que as partes queriam efectivamente celebrar, aplicando-se ao negocio dissimulado o regime que
lhe seria aplicável se não tivesse havido vício e destrói-se o simulado, conferindo-se a validade ao
dissimulado.
1. Quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este o
regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a sua validade
prejudicada pela nulidade do negócio simulado.
2. Se, porém, o negócio dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver sido observada a forma
exigida por lei. - regra especial - sempre que se exija certos requisitos de forma, o negocio dissimulado
só é válido se o simulado cumprir esses mesmos requisitos.
Assim, sempre que o negócio simulado assentar no Artigo 219º da Liberdade de Forma o negócio
dissimulado pode, em princípio produzir efeitos, pelo contrário, se exigir uma forma especial temos
de ver se a respeita ou não, caso não cumpra, não produz efeitos ao abrigo do Artigo 220º.
Por definição, sabemos também, que o negocio dissimulado é distinto do simulado, encontrando-
se no Artigo 221º um limite: tem de conter os elementos que são determinantes da forma.
ex. vendedor e comprador declaram uma escritura num valor inferior (300 mil - simulado) ao real
(500 mil - dissimulado), enganando o Estado já que o valor de IMT cobrado seria mais baixo que o
real.
ex 2. Direito de Preferência: A tem preferência sobre uma coisa que B vende, mas B diz a A que
vai vender a C por 1000 (simulado) quando na verdade vende por 500 (dissimulado).
(A conversão não é possível porque esta só acontece se as partes não antevissem a invalidade)
A nulidade estabelecida no número 2 do Artigo 241º não se rege pelo regime geral (286º e ss.),
mas sim por disposições específicas estabelecidas pelo legislador:
‣ Artigo 242º: de acordo com o regime geral a nulidade poderia ser invocada por
qualquer interessado, surgindo a dúvida se, os simuladores poderiam ou não invocá-la.
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 286o, a nulidade do negócio simulado pode ser arguida pelos
próprios simuladores entre si, ainda que a simulação seja fraudulenta.
2. A nulidade pode também ser invocada pelos herdeiros legitimários que pretendam agir em vida do autor
da sucessão contra os negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de os prejudicar.
‣ Artigo 243º: de acordo com este regime o terceiro de boa-fé não pode ver a sua
posição afectada em razões da existência de simulação
1. A nulidade proveniente da simulação não pode ser arguida pelo simulador contra terceiro de boa fé. -
basta que o terceiro desconheça a existência da simulação para ser protegido.
2. A boa fé consiste na ignorância da simulação ao tempo em que foram constituídos os respectivos direitos.
- estamos no âmbito da boa-fé subjectiva psicológica
ex. A —> B passa os seus bens para B para não pagar impostos, mas B vende a C os bens de A.
A não pode dizer que o B não poderia vender a C porque o primeiro negócio (A->B ) tratava-se de
um acordo simulatório, pois o terceiro acreditou na veracidade do negocio.
ex 2 (anterior). Direito de Preferência: A tem preferência sobre uma coisa que B vende, mas B diz
a A que vai vender a C por 1000 (simulado) quando na verdade vende por 500 (dissimulado).
Entendo uma parte da doutrina que, se A diz que quer comprar por 500, mas C diz que aquele era
um negocio simulado, logo terás de comprar por 1000, mas a letra do 243º impede esta situação,
já que não se pode invocar a nulidade ante um terceiro de Boa-Fé, logo A compraria por 500.
Há também quem defenda uma interpretação restritiva do 243º usando um argumento teleológico,
isto é, que o seu sentido é proteger o terceiro de boa-fé, evitando que ele sofra prejuízos em função
da confiança instalada, mas o 243º atribui, na verdade direitos a terceiros, que, noutras
circunstâncias não teriam, ou seja, o terceiro não pode é ficar pior do que estava, aplicando-se
apenas nos casos em que traga um prejuízo ao terceiro.
> Absoluta (Artigo 250º.2) - quando, entre o declarante e o declaratário, se emite uma declaração
de negocio sem o objectivo de celebrar um negócio, mas sim enganar terceiros, logo depois de
destruído o simulado não sobra outro que possa ser salvo.
ex 3. estou cheio de dívidas e coloco os meus bens a fresco (finjo que os vendi a um amigo)
Fala-se em simulação pessoal (ou subjectiva) quando há uma interposição fictícia de pessoas, nas
sendo as partes do negocio as partes reais.
ex. A que comprar X, mas pelas suas funções não pode, então pede a B que compre.
E em simulação real (ou objectiva) quando há uma divergência entre a vontade e a exteriorização
dessa.
Esta unilateral: a divergência não resulta de um acordo entre declarante e declaratário com o
objectivo de enganar terceiros, é, sim, decidida pelo declarante que tem por objectivo enganar o
declaratário.
ex. A vende uma coisa a B e um amigo de B, C, diz que não quer que a coisa seja vendida a
terceiro, dizendo que está disponível para comprar só para que A não venda a B (mas não quer)
1. Há reserva mental, sempre que é emitida uma declaração contrária à vontade real com o intuito de
enganar o declaratário.
2. A reserva não prejudica a validade da declaração, excepto se for conhecida do declaratário, neste caso,
a reserva tem os efeitos da simulação. - se a pessoa emite uma declaração ao outro com o intuito de o
enganar fica sujeito à declaração negocial, tendo o efeito da simulação. - se o declarante a conhecer
> DIVERGÊNCIAS INTENCIONAIS - Artigos 247º - 250º: quando existe uma divergência entre a
vontade real e a declarada, mas que não foi propositadamente provocada pelo declarante,
acontecendo independentemente da vontade do declarante.
Quando, em virtude de erro, a vontade declarada não corresponda à vontade real do autor, a declaração
negocial é anulável, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade, para o
declarante, do elemento sobre que incidiu o erro.
Surge quando a vontade declarada não corresponde à vontade real em virtude de erro, sendo a
declaração negocial anulada (declarada pelo declarante no prazo de 1 ano desde a cessação do
vício - quando se apercebe que a vontade declarada não corresponde à vontade real) se:
ex. vejo um carro na montra de um stand e penso que amanhã ligo para lá para reservá-lo, mas na
manhã seguinte o carro da montra foi trocado: sendo a declaração negocial anulável pois recai
sobre o objecto e a essencialidade da declaração
A anulabilidade fundada em erro na declaração não procede, se o declaratário aceitar o negócio como o
declarante o queria.
Permite que o declaratário faça cessar a invalidade, desde que aceite a declaração com o sentido
que o declarante lhe quis dar, não havendo nenhuma razão para que o declarante se queira subtrair
desses efeitos a partir do momento que o declaratário anule essa diferença.
ex. declarante diz que quer comprar o carro que está na montra (mas já não é o mesmo): o vendedor
pode opor-se a essa anulabilidade dizendo que aceita a declaração com os efeitos que o declarante
quis dar, vendendo o carro que anteriormente estava na montra.
O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das
circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá o direito à rectificação desta.
É um erro especial que exige um tratamento adequado, encontrando-se nos casos em que a
própria declaração ou o seu conteúdo tornam visível a existência do erro, isto é, o declaratário
aceita e apercebe-se da existência de um erro na declaração, a sua existência é visível, então não
é necessário invalidar a declaração, devendo-se rectificá-la (desaparecendo o pressuposto do
247º onde o declarante não conhece, nem tem de conhecer a vontade do declarante).
ex. alguém diz que compra 15 latas de tinta por 5€ cada (75€), mas na declaração diz que as
compra por 85€
1. A declaração negocial inexactamente transmitida por quem seja incumbido da transmissão pode ser
anulada nos termos do artigo 247o.
2. Quando, porém, a inexactidão for devida a dolo (intencionalmente causada) do intermediário, a declaração
é sempre anulável.
Surge nos casos em que o declarante usa um intermediário, isto é, uma outra pessoa transmite a
sua declaração, mas de forma inexacta, existindo uma diferença entre a vontade real e a vontade
declarada, aplicando-se o regime do Artigo 247º, já que está dependente de dois requisitos: