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Disciplina: Agricultura e Ruralidade. Semestre 2019.

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Discente: Ivón Natalia Cuervo-Fernández.

Livro resenhado:

Wanderley, Maria de Nazareth Baudel. Um saber necessário: os estudos rurais no Brasil. Campinas,
SP: Editora da Unicamp, 2011, 151 p.

Maria de Nazareth Baudel Wanderley, advogada e doutora em Sociologia, é uma referência


obrigatória para quem se propõe estudar o mundo rural no Brasil. Com mais de 50 anos de carreira
acadêmica, foi professora de pós-graduação em Ciências Sociais na UNICAMP e na UFPE, Brasil.
Seus artigos sobre a diversificação dos espaços rurais como espaços de vida tornaram-se referentes
clássicos deste campo de estudo.

O livro aqui resenhado constitui um balanço da produção científica dos estudos rurais no
Brasil a partir de meados da década de 1960 até o ano de 2010. Nesse Estado da Arte, a autora dá
conta dos desenvolvimentos do estudo temático das relações de produção no setor rural, as diferentes
visões sobre a propriedade da terra e as políticas que derivam delas, a perspectiva do
desenvolvimento rural sustentável, entre outros temas.
O primeiro capítulo do livro, intitulado “Agricultura e acumulação do capital” abrange o
essencial dos debates sobre o estabelecimento do modelo econômico capitalista no setor agrícola. No
caso do Brasil, a autora assinala três particularidades que foram favoráveis ao avanço capitalista: A
condição colonial original, a relevância estrutural do sistema de escravidão e a importância histórica
da concentração da terra. Posteriormente, ela realiza algumas críticas ao modelo de modernização
conservadora implantado no Brasil, sustentando-se nos estudos de autores como Silva (1982)1 e
Delgado (1985)2 conclui que dito modelo acentuou os níveis de desigualdade econômica no Brasil,
subordinou a agricultura à indústria e converteu terras produtivas em “reserva de valor”, tornando-as
improdutivas.
O segundo capítulo do livro trata sobre a subordinação do trabalho e a resistência dos
trabalhadores rurais. Nesta parte, a autora descreve o processo sistemático de expulsão dos
trabalhadores rurais e a sua subsequente proletarização. Expropriados dos seus meios de produção os
trabalhadores rurais passaram a adaptar-se às exigências do modelo produtivo industrializado. Isto

1
SILVA, José Graziano da. A modernização dolorosa. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.

2
DELGADO, Guilherme Costa. Capital financeiro e agricultura no Brasil. 1965 - 1985. São Paulo: Ícone, 1985.
aconteceu no meio de resistências que fundamentaram a conformação de movimentos sociais de base
rural.
O terceiro capítulo enfoca-se na concentração fundiária e as lutas pela terra. Nessa parte, a
autora explica quais são as continuidades existentes nas formas de dominação do processo produtivo.
A aliança entre capital e propriedade fundiária incorporou novos olhares sobre velhas relações de
poder. Assim, o “latifúndio” passou a ser chamado “agronegócio” e os “latifundiários” foram
reconhecidos como “empresários” que receberam privilégios para seus empreendimentos, ainda
passando por cima dos direitos de posse da terra dos pequenos produtores.
No quarto capítulo, em contraposição com a corrente avassaladora do agronegócio,
Wanderley destaca o fato de que as unidades familiares de produção são compatíveis com o
desenvolvimento agrícola e “são capazes de transformar seus processos de produção no sentido de
alcançar novos patamares tecnológicos, que se traduzam por maior oferta de produção, maior
rentabilidade dos recursos produtivos aplicados e a plena valorização do trabalho” (Wanderley,
2011, p. 89). Além disso, realça que existem rupturas e continuidades no modo de vida de um
“camponês” que passa a ser reconhecido como “agricultor familiar”, e alerta que ser “camponês” vai
além de ser meramente produtor agrícola, de modo contrário, está se conduzindo a uma perda do
conteúdo histórico-político que implica ser “camponês”.
O quinto e último capítulo, intitulado “O mundo rural no Brasil moderno: espaços de
diversidade” destaca as contribuições dos estudos rurais no Brasil nos últimos cinquenta anos, entre
elas, os aportes teóricos para a consolidação dos movimentos sociais, o aprofundamento das críticas
ao modelo produtivista de modernização da agricultura brasileira, a revalorização da dimensão do
espaço social, o foco colocado no estudo dos sujeitos sociais rurais e nos efeitos do modelo de
crescimento agroindustrial e das políticas sociais sobre a pobreza rural.
Nas conclusões, a autora amplia seus comentários sobre a importância dos estudos rurais no
Brasil que abrangem temas ambientais, econômicos, tecnológicos, políticos e sociais. Ressalta sua
importância na orientação do papel do Estado e da cidadania e no estudo das dinâmicas demográficas
urbano-rurais.

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