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Revista Teológica DOXIA 95

ISSN 2526-2300

FAZ DE NOVO
A origem histórica e teológica do Pentecostalismo no Avivamento da Rua
Azusa e suas implicações na Renovação da Igreja

Jonã Machado Teodoro


Resumo
O objetivo desta pesquisa é analisar a origem histórica e teológica do
Pentecostalismo no Avivamento da Rua Azusa e suas implicações na renovação
da igreja. A partir disso, pode-se provar a hipótese da influência do avivamento no
País de Gales em 1904 sobre o Avivamento da Rua Azusa em 1906, além de
destacar alguns personagens pouco valorizados na historiografia que
desempenharam um importante papel contendendo por avivamento. Também,
buscou-se compreender as doutrinas teológicas fundamentais para a aceitação da
continuidade dos dons espirituais e sua operação na igreja no século XIX, na
doutrina de Batismo no Espírito Santo como revestimento de poder para a
santificação e para o serviço, e do falar em línguas como evidência inicial do
Batismo no Espírito Santo que formam, assim, o tripé original da teologia
pentecostal em sua gênese. Todo o trabalho de consulta e análise utilizado nesta
pesquisa foi elaborado em grupo de estudo por meio de pesquisa bibliográfica.
Todos os conceitos a respeito de História da Igreja, Reforma, Evangelicalismo,
Pentecostalismo e Avivamento foram abordados a partir da concepção de Vinson
Synan, autor da obra “O século do Espírito Santo: 100 anos de avivamento
pentecostal e carismático”. Além destas, outras obras serviram de suporte teórico
para a construção desta monografia: “A história do Avivamento Azusa” de Frank
Bartleman, “O Avivamento do País de Gales” de Nancy Demoss e Maurice Smith,
e também “A Igreja do Século 20” de John Walker, além de outras obras que
serviram de revisão literária durante o processo de pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave
História da Igreja; Pentecostalismo; Avivamento; Rua Azusa.

INTRODUÇÃO

Em mais de dois mil anos de história cristã, ocorreram muitas renovações,


avivamentos e reformas. Sem esses eventuais despertamentos, a Igreja poderia ter-
se desviado para o caminho da corrupção, do ritualismo sem vida e da completa
inépcia. Algumas dessas renovações proporcionaram aos seus entusiasmados
seguidores uma experiência espiritual ou uma forma de culto bem diferente dos
sacramentos tradicionais da Igreja. Por exemplo, entre os montanistas do século
II, a forma extática da expressão da “nova profecia” gerou um senso de
entusiasmo e zelo apocalíptico. Entre os jansenistas da França do século XVII,

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reformadores católicos falaram em línguas, profetizaram e introduziram um novo


sacramento denominado consolamentum.
No século XVIII, John Wesley apresentou a seus seguidores a “segunda
bênção”, a qual ele chamava de “santificação plena”, uma experiência de crise
momentânea, que ele também denominou “perfeito amor” e “perfeição cristã”. Os
wesleyanos radicais que abandonaram o metodismo no século XIX para se unir ao
movimento de santidade muitas vezes chamavam essa segunda bênção de
“batismo no Espírito Santo”. Oriundo do movimento de santidade, surgiu no
início do século XX um novo e entusiástico movimento que dava ênfase aos sinais
e maravilhas, bem como aos dons do Espírito. Os crentes chamavam a si mesmos
“pentecostais”, uma vez que sua inspiração remontava ao dia de Pentecoste,
quando ocorreu o derramamento do Espírito Santo no cenáculo. Na primeira
década o crescimento foi lento, em virtude da rejeição e das perseguições. Após a
Segunda Guerra Mundial, no entanto, a expansão global dos pentecostais não
pôde mais ser ignorada. O mundo teve notícias de que um novo e poderoso
movimento se alastrava como fogo pela face da terra.
Em 1958, Henry P. van Dusen, então reitor do Seminário Teológico União,
em Nova York, aturdiu o mundo religioso com um artigo profético intitulado
“The Third Force in Christendom” [A terceira força na cristandade]. Com
extraordinário discernimento, ele anunciou a existência de uma nova força no
mundo cristão que se igualava em influência ao catolicismo e ao protestantismo.
O pentecostalismo, declarou Van Dusen, estava destinado a mudar a face do
cristianismo no século XX.
Logo Van Dusen percebeu que o movimento hoje denominado
“pentecostalismo clássico” iria muito em breve adentrar duas outras searas.
Apenas dois anos depois, o primeiro protestante “neopentecostal” declarou em
público a sua experiência, e em menos de uma década o movimento havia
chegado à Igreja Católica Romana. (SYNAN, 2009 p. 30-31)
Aos pentecostais clássicos, devemos adicionar os milhões de carismáticos
filiados a alguma denominação ou a grupos não denominacionais das igrejas
católica romana e protestante. Somados, pentecostais e carismáticos chegam a 500
milhões. Esse crescimento levou alguns historiadores a se referir ao século XX
como o “século pentecostal”. (SYNAN, 2009 p. 16)
Quatro anos antes, em 1954, um desconhecido evangelista pentecostal dos
Estados Unidos, chamado Tommy Hicks, empreendeu por conta própria uma
jornada da Califórnia a Buenos Aires, buscando oportunidade para pregar. Ele
afirmava que Deus o havia enviado. Sem propaganda e sem apoio financeiro,
realizou a maior cruzada evangelística da história da Igreja até sua época. O
número de pessoas que ele atraiu ultrapassou o dos registros de todos os
evangelistas antes dele, até mesmo Finney, Moody e Billy Graham. Em cinquenta
e dois dias, de maio a julho de 1954, Hicks pregou para cerca de 2 milhões de
pessoas, e mais de 200 mil encheram um enorme estádio de futebol para ouvi-lo
no último culto. (SYNAN, 2009 p. 31)

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Tendo início com um pequeno grupo de pessoas em 1901, os pentecostais


cresceram numericamente até se tornar a maior família protestante do mundo no
início do século XXI. Contando com mais de 200 milhões de membros
identificados como “pentecostais denominacionais”, o grupo ultrapassou as
denominações históricas e tornou-se a segunda maior família denominacional
cristã, superada em número apenas pelos católicos romanos. (SYNAN, 2009 p.
15-16)
Diante do assombroso crescimento do pentecostalismo nos Estados Unidos,
Brasil, Chile, Escandinávia, Coreia e África, líderes eclesiásticos protestantes e
católicos romanos começaram a ter notícia do fenômeno pentecostal. “O que isso
significa?”, perguntavam-se os estudiosos, pastores, bispos, e leigos. Por volta de
1964, Charles Sydnor Jr., ao saber que a Igreja de Deus, de Cleveland, havia
ultrapassado os presbiterianos, tornando-se a terceira maior denominação da
Geórgia (em número de igrejas locais), declarou ser “cada vez mais evidente que
o movimento pentecostal que estamos presenciando [...] é um autêntico
avivamento reformista de grande significado histórico, equiparado aos grandes
movimentos de outros séculos.
Era inegável que um movimento de grande proeminência estava tomando
corpo e se constituiria num imenso desafio para o cristianismo tradicional.
Perguntava-se: “De onde surgiram esses pentecostais? Em que eles creem?”Quais
são suas práticas? Não eram aqueles „santos barulhentos‟ vistos com comiseração
ou com escárnio até pouco tempo atrás? Quem foi o responsável por conduzi-los a
tamanha fonte de poder?”.
Uma investigação mais acurada revelou que os pentecostais priorizavam a
conversão radical, uma vida santa de separação do mundo após a conversão e o
“batismo no Espírito Santo” com a evidência inicial do falar em línguas. Depois
disso, o crente podia experimentar na vida normal da igreja todos os dons do
Espírito. A cura divina, por meio da oração, era enfatizada de modo especial,
assim como a segunda vinda de Cristo para arrebatar a Igreja, que poderia ocorrer
a qualquer momento. Outra característica era a adoração alegre e expressiva,
marcada por muito barulho e emoção, que sempre causava certo choque a quem
assistia a um culto pentecostal pela primeira vez. Havia mãos levantadas, louvor
em voz alta, mensagens em línguas, profecias, oração pelos enfermos e ocasionais
expulsões de demônios. Pregações fervorosas baseadas na Bíblia davam destaque
à salvação, à santidade, à cura e às bênçãos materiais concedidas pelo Senhor
àqueles que viessem até o altar. A linha mestra de sua doutrina era que os dons do
Espírito (“carismas”) estavam à disposição da Igreja do século XX tanto quanto
estavam presentes na Igreja do primeiro século de nossa era. (SYNAN, 2009 p.
32)
O avivamento da Rua Azusa foi o estopim de uma efusão pentecostal que
pavimentou todos os movimentos de renovação no século XX e abalou a
cristandade em todo o mundo. Nas palavras de Synan (2009), aludindo ao
terremoto que abalou o norte da Califórnia em 18 de abril de 1906, foi um
terremoto espiritual que atingira a pequena missão religiosa da Rua Azusa e

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sacudiu o mundo espiritual muito mais que o mais violento terremoto da história
dos Estados Unidos — 8,3 graus na escala Richter — abalou San Francisco e
continuaria sacudir o mundo com ainda mais intensidade no decorrer do século
mudando o curso da história da igreja para sempre.
A Igreja precisa experimentar uma nova restauração que envolva reforma e
avivamento, a fim de que Jesus possa buscar uma noiva perfeita para as Bodas do
Cordeiro. É de fundamental importância para a Igreja, em seu processo de
restauração interceder por um novo derramar do Espírito Santo e fomentar uma
teologia coerente com os últimos dias. Sobre o profissional de teologia está o
encargo de produzir ensino alinhado às escrituras, baseado na doutrina dos
apóstolos e posicionar-se de acordo com o que o Espírito Santo diz à Igreja nessa
última hora. O Avivamento da Rua Azusa já foi chamado de o maior mover de
Deus no século 20, porque preparou o caminho para todas as ondas do Espírito
que vieram sucessivamente ao longo do século, resgatando o elemento
sobrenatural na vida da Igreja, estabelecendo a doutrina do Batismo no Espírito
Santo com a restauração do dom de línguas que abriu o caminho para a Igreja
voltar a operar em todos os demais dons espirituais. Sendo assim, se debruçar
sobre esse importante momento da história recente da Igreja é se debruçar não
somente sobre um relato histórico, mas sobre o prenúncio do que Deus fará numa
medida muito maior, pois por maior que tenha sido o mover de Deus no século
passado ainda não experimentamos a plenitude de Joel 2:28 (Bartleman, 2016).
Nossa sociedade carece de experimentar um verdadeiro avivamento que irá tocar
o mundo com justiça e através da Igreja estabelecer o Reino de Deus sobre a terra.
Nosso futuro repousa sobre verdades que foram restauradas no passado; na
medida em que honramos aquilo que Deus já fez, podemos avançar para aquilo
que ele ainda fará (SYNAN, 2009 p. 9). Conforme nos voltamos para o passado e
bebemos dos poços antigos, estamos nos preparando para fazer parte de um futuro
glorioso (SYNAN, 2009 p. 8). Nosso intento com essa pesquisa é estabelecer uma
linha do tempo que conecta fatos e pessoas e compreende a contribuição de cada
elemento no escopo do movimento pentecostal que nasceu a partir do Avivamento
da Rua Azusa e aferir quais suas contribuições para a igreja de nossos dias.
A presente pesquisa se concentra na área de Teologia com linha de pesquisa
em História da Igreja e Pentecostalismo. História da igreja é a historiografia que
se dedica ao estudo específico da História da Igreja, entendida como história tanto
das diversas instâncias eclesiásticas existentes no interior do cristianismo, quanto
história dos cristãos considerados "leigos" pela teologia cristã. Isto é, a História da
Igreja investiga tanto a história da Igreja Católica, quanto a da Igreja Ortodoxa e
Igrejas Protestantes (além de outras Igrejas menores). Além disso, o entendimento
do que significa "Igreja" vai além do aspecto meramente eclesiástico e clerical;
abarcando também o estudo dos diversos contextos sócio-econômicos, políticos e
culturais nos quais as diversas Igrejas estão inseridas em determinados contextos
históricos. Aborda a edificação da igreja e a sua identidade. O termo
Pentecostalismo diz respeito a um movimento de renovação na Igreja que enfatiza
a experiência do batismo do Espírito, geralmente evidenciada por falar em línguas

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(glossolalia). O nome deriva de Pentecostes, o nome grego para a Festa Judaica


das Semanas.
O tema abordado será “A origem histórica e teológica do Pentecostalismo
no Avivamento da Rua Azusa e suas implicações na Renovação da Igreja”. O
objeto de pesquisa terá como recorte temporal o início do século XX que marca o
surgimento do movimento pentecostal. Nosso recorte espacial se concentrará nas
igrejas evangélicas dos Estados Unidos, mais especificamente na cidade de Los
Angeles, afetadas pelo pentecostalismo. O termo evangélico tem sua origem no
interior da Igreja da Inglaterra no século XVIII, Havia, desde o século XVI, a
herança da ala mais protestante da Igreja (“igreja baixa”), com a influência
luterana e calvinista e a presença de puritanos que optaram pela permanência na
instituição. Com os irmãos John e Charles Wesley, George Whitefield e John
Fletcher vem a influência armeniana. Vale lembrar que o “metodismo” foi
primeiramente um movimento evangélico dentro da Igreja Anglicana. Os irmãos
Wesley viveram até o fim nessa igreja, e, até hoje, constam como homenageados
pelo calendário anglicano. Após a sua morte é que há o cisma, com a criação da
Igreja Metodista. Parcela significativa dos seus seguidores, porém, continuou na
Igreja Anglicana, formando a ala evangelical. O recorte conceitual diz respeito a
inter-relação entre reforma e avivamento.
A problematização diz respeito à origem histórica e teológica do
Pentecostalismo no Avivamento da Rua Azusa e quais suas implicações para a
Igreja contemporânea. (1) Qual era a situação espiritual das igrejas da Califórnia
no final do século XIX. (2) Quais fatos e doutrinas teológica influenciaram na
investigação a respeito da continuidade dos dons espirituais e sua operação na
igreja no século XIX, na doutrina de Batismo no Espírito Santo como
revestimento de poder para a santificação e para o serviço, e do falar em línguas
como evidência inicial do Batismo no Espírito Santo. (3) Qual a influência do
Avivamento no País de Gales em 1904 no avivamento da Rua Azusa em Los
Angeles, Califórnia em 1906. (4) Quem foram os homens e mulheres que
contribuíram intercedendo e conclamando a igreja à intercessão por um
avivamento espiritual no início do século XX. (5) Além de traçar uma linha
cronológica desses e eventos, investigando sua repercussão nos Estados Unidos e
no mundo, assim como seu impacto na cristandade.
Todo o trabalho de consulta e análise utilizado nesta pesquisa foi elaborado
em grupo de estudo por meio de pesquisa bibliográfica. Todos os conceitos a
respeito de História da Igreja, Reforma, Evangelicalismo Pentecostalismo e
Avivamento serão abordados a partir da concepção de Vinson Synan autor da obra
“O século do Espírito Santo: 100 anos de avivamento pentecostal e carismático”
utilizada neste trabalho. Além destas, outras obras serviram de suporte teórico
para a construção desta monografia: “A história do Avivamento Azusa” de Frank
Bartleman, “O Avivamento do País de Gales” de Nancy Demoss e Maurice Smith,
e também “A Igreja do Século 20” de John Walker, além de outras obras que
serviram de revisão literária durante o processo pesquisa bibliográfica.

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1 SITUAÇÃO ESPIRITUAL NO FINAL DO SÉCULO 19: JULIA


HUTCHINS

Antes de focarmos o primeiro mover de Deus do século 20, seria proveitoso


fazer uma breve descrição da situação espiritual e das expectativas que se tinham
no final do século 19, para formar um pano de fundo do movimento Pentecostal
que surgiu logo no início do século 20.
Em geral, a situação das igrejas era de apostasia e frieza. O Protestantismo
Americano era rico, culto e influente, mas, com exceção de uns poucos grupos
conservadores, seu estado espiritual era de decadência. Imperavam o liberalismo,
a formalidade, o materialismo, o profissionalismo ministerial, a diferença de
classes e ausência de uma experiência com Deus. Instituições teológicas e
acadêmicas, que haviam sido levantadas para preservar a fé, tinham se tornando o
berço do Darwinismo e do ceticismo acerca da Inspiração da Bíblia. O nascimento
natural de uma pessoa, ao invés do espiritual, transformou-se no fundamento para
se pertencer a uma igreja, a ponto de os termos nascer de novo ou conversão se
tornarem arcaicos. O conhecimento das doutrinas substituiu a experiência pessoal
com Deus. Separação do mundo tornou-se um termo tão incomum no vocabulário
cristão que, para os protestantes em geral, chegou a ter apenas um significado:
morte física! Os pregadores pioneiros que haviam recebido com fervor o
“chamado de Deus” para pregar o evangelho foram substituídos por homens que
consideravam o ministério uma profissão e se orgulhavam de sua posição.
Denominações que em outro tempo eram conhecidas como “igrejas dos pobres”
gradativamente se tornaram a elite da sociedade.
Porém, paralelamente à apostasia e frieza espiritual, começaram a surgir
também alguns sinais de avivamento, indicando que nem todos haviam se dobrado
diante de Baal. Um chamado para arrependimento, oração e intercessão começava
a ressoar; um texto muito usado nos últimos anos do século 19 foi Jeremias 33.3:
“Clama a mim, e responder-te-ei, e anunciar-te-ei coisas grandes e ocultas que não
sabes”.
Outro sinal foi a busca e pesquisa das Escrituras, resumidas na pergunta: “
Que dizem as escrituras sobre isto?” Convenções bíblicas especiais eram
realizadas, e ministros e missionários se reuniam para estudar a Palavra e
averiguar qual era o pensamento de Deus para o fim desta Era da Igreja.¹
Começaram a surgir também expectativas pela Chuva Serôdia. Esse era um
tópico enfatizado nas conferências bíblicas, baseado na promessa de Deus em Joel
de derramar seu Espírito nos últimos dias. Encontramos uma boa explicação a
respeito no seguinte trecho de um famoso comentário bíblico sobre Tiago 5.7:
A chegada das primeiras e últimas chuvas não deve ser entendida como
objetivo final do lavrador, mas sim a colheita, para qual essas chuvas são
preliminares e necessárias. As primeiras chuvas caem no tempo da semeadura,
aproximadamente em novembro ou dezembro, enquanto as últimas caem em
março ou abril, para amadurecer o grão para colheita. A chuva serôdia que

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precederá a colheita espiritual que está por vir provavelmente será outra efusão do
Espírito Santo como a de Pentecostes.
Pastores, professores de institutos bíblicos e líderes de igrejas exortação a
todos “para pedir chuva no tempo da Chuva Serôdia” (Zc 10.1). Ensinava se que
no Dia de Pentecostes não se havia alcançado o pleno cumprimento da profecia de
Joel, pois uma parte das profecias consistia em referências óbvias a eventos
ligados à segunda vinda do Senhor. Consequentemente, devido a expectativa
universal de sua iminente volta, havia uma ávida antecipação pelos “tempos de
refrigério da presença do Senhor” (At 3.19) (WALKER, 2013 p. 11-12).
Por volta de 1905, as ondas de choque espiritual que sacudiram Topeka e
Houston começaram a ser sentidas em Los Angeles. Essas ondas repercutiam a
efervescência das comunidades Holiness, as progressivas revelações do
movimento da fé apostólica, de Charles Parham, e as frequentes notícias do
grande avivamento da fé apostólica, de Charles Parham, e as frequentes notícias
de Joseph Smale. Em várias missões Holiness da Califórnia, os crentes
começaram a orar com determinação, pedindo um derramamento do poder de
Deus. Em 16 de novembro de 1905, as palavras do pregador e profeta Holiness:
“Los Angeles parece ser o lugar e o tempo, na mente de de Deus, para a
restauração da Igreja”. Mal sabia Bartleman que esse anseio pelo avivamento não
teria origem em nenhuma grande igreja branca, e sim numa comunidade negra de
Los Angeles.
A população negra de Los Angeles tem uma história que antecede a
conquista americana de 1848. Quando os Estados Unidos assumiram o controle da
cidade, existia ali uma área conhecida como Calle de los Negros [Rua dos
Negros], uma via comprida e estreita e ligava a Rua Los Angeles à praça
principal. Essa área era habitada por uma população de mexicanos negros livres,
os quais eram bem representados no comércio e na vida social da cidade. Com a
chegada dos americanos e seus preconceitos, a tranquila área residencial foi aos
poucos tomadas por sallons, prostíbulos e antros de jogatina.
Em 1985, os membros negros da Igreja Metodista de Fort Street
(Convenção do Norte) se separaram e implantaram a Segunda Igreja Batista. Era
uma igreja que por volta de 1900, estava unida teologicamente ao movimento
fundamentalista. Na primavera de 1906, Julia Hutchins da Segunda Igreja Batista,
após vivenciar uma dramática experiência de “segunda benção”, começou a
ensinar a doutrina Holiness da santificação como obra separada da graça e
subsequente a salvação. Seus ensinos foram avidamente recebidos por todos os
que naquela igreja buscavam o toque de Deus. Como o grupo de crentes Holiness
da congregação aumentava mais e mais, o pastor exigiu que a Irmã Hutchins e
seus seguidores deixassem a igreja.
O pequeno grupo de nove famílias a princípio uniu-se às reuniões em tendas
na casa de Deus, de W. F. Manley. No entanto, continuava insatisfeito, pois queria
espaço para ensinar a doutrina Holiness com maior liberdade. Na tentativa de
proclamar sua independência religiosa, estabeleceu uma missão Holiness na Rua

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Santa Fé; mas, como independência, evidentemente, não era o que estava
procurando, dois meses depois se filiou à Associação Holiness do Sul da
Califórnia. Seguindo a predisposição da época, esse grupo acreditava que um
homem devia ser escolhido como pastor permanente. Por sugestão de Neely
Terry, um convite foi feito ao presbítero William J. Seymour, que ela havia
conhecido durante uma visita a Houston. (SYNAN, 2009, p. 67-69)

2 AS RAÍZES PENTECOSTAIS NO MOVIMENTO DE SANTIDADE:


CHARLES PARHAM (1901)

Através dos anos, os pentecostais têm sido identificados por vários nomes.
Embora muitas das primeiras igrejas pentecostais dos Estados Unidos fossem
conhecidas como “igrejas Holiness”, o primeiro grupo estritamente pentecostal
utilizava variações do nome Fé Apostólica. Esse foi o nome escolhido por Charles
Fox Parham para seu pequeno grupo em Topeka, por ocasião da descida do
Pentecoste, em 1901. Quando seu discípulo negro e amigo William J. Seymour
inaugurou a famosa Missão da Rua Azusa, em Los Angeles, no ano de 1906, Fé
Apostólica também foi o nome adotado. (SYNAN, 2009 p. 134)
Embora o movimento pentecostal tenha começado nos Estados Unidos, boa
parte de sua teologia básica tem raízes nos primeiros movimentos perfeccionistas
e carismáticos da Grã-Bretanha. Pelo menos três deles — o movimento de
santidade metodista, a Igreja Apostólica Católica (implantada por Edward Irving)
e o movimento Higher Life [Vida Superior] de Keswick — prepararam o caminho
para o que parecia um transbordamento espontâneo do Espírito Santo nos Estados
Unidos. Talvez o mais importante precursor imediato tenha sido o movimento de
santidade que emergiu do coração do metodismo do século XVIII.
John Wesley, clérigo anglicano, experimentou sua conversão evangelical
durante uma reunião na Aldersgate Street, em 1738, quando, disse ele, “senti meu
coração estranhamente aquecido”. Ele chamou isso de seu “novo nascimento”.
Foi também de Wesley que os pentecostais herdaram a ideia da crise da
“segunda benção”, subsequente à salvação. A essa experiência, ele chamava
também “santificação plena”, “perfeito amor”, “perfeição cristã” e “pureza de
coração”. John Fletcher, colega de Wesley, foi o primeiro a denominá-la “Batismo
no Espírito Santo”, experiência que concedia poder espiritual e purificação
interior a quem a recebia.
No Século XIX, Edward Irving e seus amigos, em Londres, admitiram a
possibilidade da restauração dos dons do Espírito na Igreja Moderna. O popular
ministro presbiteriano liderou a primeira tentativa de “avivamento carismático”
realizado na Igreja Presbiteriana em Reagens Square. Embora línguas e profecias
fossem experimentadas em sua igreja, Irving não obteve êxito em sua busca pela
restauração do cristianismo do Novo Testamento.

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Outro predecessor do pentecostalismo foi o movimento Higher Life de


Keswick, que floresceu na Inglaterra depois de 1975. Nos Estados Unidos, foi
inicialmente liderado por mestres do movimento de santidade, como não levaram
muito tempo para alterar a meta e o conteúdo da “segunda benção”, trocando a
ênfase de Wesley sobre a “pureza de coração” pelo “revestimento de poder
espiritual para o serviço”. D. L. Moody foi um líder evangelista ligado ao
movimento de Keswick.
Desse modo, quando o Pentecoste irrompeu nos Estados Unidos, em 1901,
já existiam havia pelos menos um século movimentos que enfatizavam a “segunda
benção”, também chamada “batismo no Espírito Santo”. Nos Estados Unidos,
alguns mestres como A. B Simpson e A. J. Gordon, acrescentaram a ênfase sobre
a cura divina.
As primeiras igrejas pentecostais do mundo tiveram sua origem no
movimento de santidade antes de 1901: a Igreja Santa Unida (1886), liderada por
W.H Fulford; a Igreja Holiness Batizada com Fogo (1895), liderada por B. H
Irving e J. H King; a Igreja de Deus de Cleveland, no Tennessee (1896), liderada
por A. J. Tomlinson; a Igreja de Deus em Cristo (1897), liderada por C. H Mason;
a Igreja Holiness Pentecostal (1898), liderada por A. B. Crumpler. Depois que se
tornaram pentecostais essas igrejas de tradição Holiness da “segunda benção”
preservaram seus ensinos perfeccionistas. Elas tão somente acrescentaram o
batismo no Espírito Santo com línguas como evidência inicial de uma “terceira
benção”. Não é exagero, portanto, dizer que o pentecostalismo do século XX, pelo
menos nos Estados Unidos, nasceu em berço Holiness. (SYNAN, 2009 p. 16-17).
O homem reconhecido pela maioria como o formulador da doutrina
pentecostal e fundador teológico do movimento foi Charles Fox Parham (1873-
1929). Sua doutrina das línguas como “evidência bíblica” do batismo no Espírito
Santo influenciou de forma direta o avivamento da Rua Azusa, de 1906, e a
criação do movimento pentecostal em todo o mundo.
Parham nasceu em Muscatine, no Iowa, em 4 de junho de 1873. Durante a
juventude, sofria com a saúde debilitada, chegando a ficar confinado ao leito
meses a fio. Ainda em tenra idade, enquanto amargava suas enfermidades, ele se
convenceu de que havia recebido um chamado para o ministério e começou a ler e
estudar a bíblia com muita dedicação. Quando tinha 13 anos de idade, sua mãe
morreu, lançando-o a mais um período de sofrimento. Durante essa crise, ele
“nasceu de novo”, por influência do ministério do Irmão Lippard, da Igreja Casa
Congregacional.
Convicto de seu “chamado”, Parham ingressou numa escola identificada
com o metodismo, a Faculdade Sudoeste, em Winfield, no Kansas, em 1889. Ele
já havia decidido servir a Deus não apenas como ministro do evangelho, mas
também como médico. Logo que começou a estudar medicina, foi acometido pela
enfermidade, dando início a uma angustiante batalha contra a febre reumática.
Enquanto estava acamado, começou a estudar as passagens bíblicas que relatavam
as curas realizadas por Jesus. O estudo dessas passagens levou Parham à crença de

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que Jesus também poderia curá-lo. Ele estava convencido de que o Diabo,
tentando impedi-lo de ingressar no ministério, o induzira a fazer medicina, e por
causa desse desvio Deus o estava castigando com aquela doença.
Depois de renunciar à carreira na medicina e retomar o plano original de
ingressar no ministério, o jovem pregador recuperou-se da doença, mas não
completamente. Ele ficou com sequelas nos artelhos e mal podia andar, tendo que
usar muletas ao retomar à escola. Pouco tempo depois um empecilho ao seu
ministério. Imediatamente, ele abandonou a escola. Foi exatamente nessa época,
contou ele mais tarde, que Deus o curou completamente das sequelas causadas
pela febre.
Parham é considerado o primeiro a desenvolver o argumento teológico de
que as línguas são sempre a evidência inicial de que uma pessoa recebeu o
batismo com o Espírito Santo. Ele também foi o primeiro a ensinar que esse
batismo e até mesmo as línguas que o evidenciam podem ser considerados parte
da experiência de todo cristão, algo presente na vida normal e na adoração, não se
manifestando, portanto, apenas em períodos de grande fervor religioso. Parham
ensinava ainda que o batismo no Espírito Santo era a única garantia de escapar à
grande tribulação do final dos tempos e que o falar em línguas era a única garantia
desse livramento. Os ensinos de Parham lançaram os fundamentos teológicos e
experienciais do Avivamento da Rua Azusa e da moderna prática pentecostal.
Depois de deixar a Igreja Metodista de Linwood para se tornar pregador
independente do movimento de santidade, Parham iniciou sua carreira de
professor itinerante e evangelista. Nessa época, implantou várias missões de
ensino e cura, todas operando com base na fé, porém nenhuma delas bem-
sucedida. Por volta de 1898, ele se estabeleceu em Topeka, no Kansas, onde
implantou a Escola Bíblica Betel e a Casa da Cura. Em dezembro de 1900,
Parham incumbiu seus alunos de pesquisar nas Escrituras algum sinal especial do
Batismo com o Espírito Santo. Ele se ausentou por três dias para pregar em
Kansas City, e durante esse período seus alunos, por meio de jejum, oração e
estudo das Escrituras, chegaram à conclusão unânime de que o falar em outras
línguas constituía a única prova bíblica do batismo com o Espírito Santo.
Depois que ouviu a resposta dos alunos, obtida com base naquela pesquisa,
Parham foi convidado a participar do culto de passagem de ano, realizado em 31
de 1900. Naquele culto, uma de suas alunas, Agnes N. Ozman, pediu a Parham
que lhe impusesse as mãos e orasse para que ela recebesse o batismo com o
Espírito Santo, acompanhado com a evidência inicial do falar em línguas. Mais
tarde, ao relembrar esse fato Parham escreveu:
Impus as mãos sobre ela e orei. Eu mal havia completado três frases
quando a glória descer sobre ela. Uma auréola luminosa parecia envolver sua
cabeça e seu rosto, e ela começou a falar em chinês. Durante três dias, não
conseguiu falar uma palavra em inglês. Ela tentou escrever em inglês, para assim
nos contar a experiência, mas só escrevia em chinês. Cópias do que ela escreveu
foram publicadas em jornais da época.

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Naquelas reuniões, afirmou-se mais tarde, os alunos falaram 21 idiomas


conhecidos (por exemplo, sueco, russo, búlgaro, japonês, norueguês, francês,
húngaro, italiano e espanhol). De acordo com Parham, nenhum dos alunos havia
estudado os idiomas falados, e todos os casos foram confirmados com autênticos
nativos daquelas línguas. Parham imediatamente começou a ensinar que nenhum
missionário cristão tinha a necessidade de aprender outra língua. Precisava apenas
receber o batismo com o Espírito Santo e assim seria miraculosamente capacitado
a falar qualquer idioma que se fizesse necessário. Parham sustentou essa
convicção até o fim da vida, a despeito das muitas evidências de que isso nunca se
tenha concretizado.
Munido de uma doutrina e de uma experiência, Parham encerrou sua “obra
de fé” em Topeka e iniciou um circuito de avivamentos que se estendeu por mais
de quatro anos. A princípio, ele não foi muito bem-sucedido, mas continuou a
trabalhar, mesmo depois que a maioria de seus seguidores o abandonou. O fogo
que ele vinha tentando acender finalmente pegou em Galena, no Kansas. No
embalo das notícias de curas divinas e outros milagres, o avivamento lhe trouxe
novos seguidores e atraiu multidões. Em 1905, Parham estabeleceu outra escola
bíblica do tipo “obra de fé”, dessa vez em Houston, no Texas, embora na época a
escola tivesse pouco mais de 20 alunos; um deles, William J. Seymour, estava
destinado a ser usado na condução do avivamento da Rua Azusa.
Charles Fox Parham foi, sem dúvida, um pioneiro de diversas maneiras. Foi
ele quem cunhou os nomes mais tradicionais aplicados ao moderno
pentecostalismo, entre eles “movimento pentecostal”, “movimento chuva serôdia”
e o “movimento da fé apostólica”. Esses três nomes constam do título de seu
primeiro relato publicado acerca dos fatos ocorridos em Topeka naquele culto de
ano-novo: “The Latter Rain: The Story of the Origin of the Original Apostolic
Faith or Pentecostal Movements” [Chuva serôdia: a história da origem dos
movimentos originais da fé apostólica e pentecostal]. Em 1899, ele fundou o
periódico Apostolic Faith, que logo se tornou modelo para todos os jornais de
linha pentecostal. Parham também emitiu credenciais de ministro para William J.
Seymour e muitos outros que mais tarde se tornaram figuras proeminentes do
avivamento mundial. (SYNAN, 2009 p. 63-67)
A história dos pentecostais, no sentido moderno da palavra, tem seu ponto
de partida na escola bíblica de Parham, em Topeka, Kansas, em 1901. A despeito
da controvérsia sobre as origens e a época exata em que Parham começou a dar
ênfase ao dom de línguas, todos os historiadores concordam que o movimento
começou no início de 1901, quando o mundo adentrava o século XX. Em
consequência do Pentecoste que eclodia em Topeka, Parham formulou a doutrina
de que as línguas eram a “evidência bíblica” do batismo no Espírito Santo.
Pelo fato de ensinar que as línguas eram uma concessão divina de idiomas
humanos com vistas à evangelização mundial, Parham também defendia a ideia de
que missionários não precisavam estudar nenhum idioma estrangeiro, uma vez
que estariam miraculosamente capacitados a pregar em línguas em qualquer lugar
do mundo. Municiado com essa nova teologia, ele implantou um movimento

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eclesiástico intitulado Fé Apostólica desencadeou um verdadeiro furacão


avivalista em sua turnê pelo meio-oeste dos Estados Unidos com vistas a
promover a nova experiência.
O pentecostalismo, no entanto, não chamou atenção do mundo até 1906.
Isso aconteceu com o avivamento da Rua Azusa, em Los Angeles, liderado pelo
pastor William Seymour. Ele tomou conhecimento do batismo no Espírito Santo
com línguas em 1905, numa das escolas bíblicas de Parham, em Houston, Texas.
Em 1906, Seymour foi convidado a pastorear uma igreja Holiness negra em
Los Angeles. As famosas reuniões da Rua Azusa começaram em Abril de 1906,
no antigo prédio da Igreja Episcopal Metodista Africana, situada na Rua Azusa,
312 no centro de Los Angeles.
Os acontecimentos relacionados ao avivamento da Rua Azusa fascinaram os
historiadores durante décadas e até hoje não foram plenamente entendidos e
explicados. A Missão da Fé Apostólica da Fé Apostólica da Rua Azusa realizava
três cultos por dia, sete dias por semana, durante três anos e meio. Milhares de
pessoas receberam o batismo no Espírito Santo com a evidência inicial do falar
em línguas.
O periódico Apostolic Faith [Fé Apostólica], que Seymour enviava
gratuitamente a cerca de 50 mil leitores, divulgava a mensagem do avivamento.
Da Rua Azusa, o pentecostalismo espalhou-se com rapidez pelo mundo e cresceu
a ponto de se tornar a maior força da cristandade. William J. Seymour liderou o
avivamento da Rua Azusa em 1906, o qual espalhou o pentecostalismo por todo o
mundo. (SYNAN, 2009 p. 17-19).

3 O AVIVAMENTO NO PAÍS DE GALES: EVAN ROBERTS (1904)

Na época em que o movimento de santidade preparava o palco para o


advento do pentecostalismo moderno, o avivamento do País de Gales, em 1904,
veio demonstrar, sem sombra de dúvida, que o anseio por tal renovação era
universal. Aquele avivamento incendiou todo o País de Gales, depois Londres e
por fim a Inglaterra inteira, atraindo gente de todo o mundo para observar de perto
se aquele fenômeno era o novo Pentecoste.
Diferente da maioria dos avivamentos norte-americanos, os quais eram
independentes, o avivamento de 1904 no País de Gales aconteceu dentro da igreja.
Foi também um avivamento de leigos, que contemplou os pobres e excluídos. O
líder do avivamento era um ex-mineiro de 26 anos de idade e calouro de teologia
chamado Evan Roberts (1876-1951). Aquela tremenda manifestação do poder de
Deus caracterizava-se pela completa liberdade no Espírito. As reações entre os
observadores que vinham de longe eram as mais diversas. Alguns se convenceram
de que Deus estava de fato agindo no meio de seu povo, enquanto outros não viam
nada além de histeria e confusão.

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O que alguns classificavam com o termo galês hywl, outros consideravam


como o falar em línguas. Diversas outras manifestações de energia exática faziam
parte daquele derramamento, entre elas períodos de cântico prolongados, pregação
por leigos, testemunhos, oração conjunta, interrupções frequentes do culto por
adoradores, e confiança inabalável na orientação do Espírito Santo, que era o
centro das atenções. O próprio Evan Roberts afirmou ter recebido muitas visões
sobrenaturais que julgava autênticas e baseadas em profecias bíblicas. Ele atribui
boa parte de sua inspiração e motivação a essas visões.
Nas primeiras semanas do avivamento muitos testemunharam ter sido
batizados no Espírito Santo. A experiência era acompanhada de gritos, risos e
danças, gente caindo ao chão por não resistir ao poder, lágrimas copiosas e
elocução de línguas desconhecidas. Houve também um intrigante ressuscitamento
do galês arcaico. Muitos jovens, que não tinham nenhum conhecimento dessa
língua, naquelas semanas de êxtase espiritual falavam fluentemente o antigo
idioma. O avivamento logo extrapolou o ambiente das reuniões dirigidas por
Roberts, embora ele tenha sido universalmente proclamado líder do movimento,
do início ao fim.
Os jornais noticiavam novos focos de avivamento em lugares cada vez mais
distantes, enquanto pessoas de outras partes da Grã-Bretanha e até mesmo do
mundo vinham conhecer Roberts, era comum as pessoas “caírem no poder” do
Espírito Santo, ficando prostradas no chão durante horas.
Os efeitos do extraordinário avivamento do País de Gales eram tangíveis e
duradouros. O poder do Espírito Santo, manifesto em diversos sinais,
especialmente nas conversões e no crescimento da igreja, combinado com a
presença de muitos que mais tarde desempenharam importantes papéis no novo
Pentecoste, fez do avivamento do País de Gales, de 1904, um precursor do
movimento pentecostal (SYNAN, 2009 p. 62-63).

3.1 O Encargo de Intercessão por Avivamento: Joseph Smale e


Frank Bartleman

Em todo grande avivamento religioso, o que parece ser novo e espontâneo é


na verdade o resultado de muita oração e preparação. Os crentes do movimento de
santidade estavam olhando em muitas direções, a fim de ver qual seria o
movimento seguinte de Deus. Uma das personagens que representaram essa busca
contínua de um caminho mais íntimo com Deus foi Joseph Smale, pastor da
Primeira Igreja Batista de Los Angeles. Smale nasceu na Inglaterra e estudou na
escola de pregadores de Spurgeon, em Londres, para ser ministro.
Quando a notícia de um grande derramamento do Espírito no País de Gales
chegou a Los Angeles, em 1904, Smale ausentou-se de seu púlpito e viajou para
aquele país a fim de observar o fenômeno e obter informações de primeira mão.
Enquanto permaneceu no País de Gales, Smale ajudou Evan Roberts a dirigir as
reuniões.

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Ao retornar a Los Angeles, Smale era um homem mudado. Disposto a


buscar um avivamento semelhante ao que presenciara no País de Gales, ele
empreendeu uma intensa jornada de oração. Dando prosseguimento a esse tempo
de preparação, o entusiasmado pregador batista instituiu reuniões de oração nas
casas, convocando para isso os membros mais dedicados de seu rebanho. As
reuniões de oração nos lares logo motivaram o pastor a promover reuniões de
avivamento em sua igreja.
Foram dezesseis semanas de contínua intercessão por um avivamento. As
reuniões eram marcadas pela espontaneidade e liberdade na adoração. O pastor
dava também total liberdade ao Espírito Santo para agir na reuniões. Era comum
os crentes tomarem a iniciativa de começar e dirigir os cultos quando Smale
demorava a chegar. Membros das mais diversas denominações tinham permissão
para pregar e dar testemunhos.
Depois de quatro semanas de poderoso avivamento, os membros mais
antigos da Primeira Igreja Batista resolveram chamar o pastor à responsabilidade.
Eles estavam incomodados com o rumo que reuniões estavam tomando,
justamente pelo fato de alguns não batistas terem permissão não apenas para
pregar, mas também, em algumas ocasiões, iniciar e dirigir cultos. Eles estavam
cansados daqueles inovações e desejavam retornar à forma antiga. O pastor Smale
optou pela renúncia. Ele e alguns membros leais naquela busca mais intensa por
avivamento deixaram a igreja batista e implantaram a Primeira Igreja Batista do
Novo Testamento, e as reuniões noturnas continuaram. A opinião dos crentes
Holiness a respeito dessa divisão pode ser resumida nas palavras de Frank
Bartleman: “Mas que posição horrível para uma igreja assumir: colocar Deus para
fora.”
Essa era a situação do movimento de santidade na Los Angeles de 1905. Era
um cenário de fermentação e turbulência, benção e dedicação, em que o povo
manifestava o desejo de se desvencilhar de velhos laços de compromisso e sair em
busca de um novo derramamento do Espírito de Deus, um segundo Pentecoste. Os
antigos regimes eram severos, e aqueles que agora constituíam o povo de Deus
buscavam uma nova unção. Como sempre acontece, o movimento era mais
pronunciado entre os pobres e oprimidos. As classes inferiores e seus líderes
pareciam mais dispostos a sacrificar seu tempo, suas convicções e sua reputação
em sua ardente busca pelo poder de Deus (SYNAN, 2009 p. 60-63).
Frank Bartleman foi o pregador holiness que ficou conhecido como o
historiador do avivamento da Rua Azusa por haver publicado em 1926 um livro
intitulado "Como o Pentecostes chegou em Los Angeles", com compilações de
seu diário pessoal, onde Bartleman registrou com fidelidade os relatos conforme
aconteciam, sendo uma fonte primária dos fatos de grande relevância para a
historiografia do movimento. No entanto a maior glória de Bartleman é ser
conhecido também como o intercessor do Avivamento da Rua Azusa, uma vez
que juntamente com Smale, Parham e outros irmãos ele carregou com fidelidade o
encargo de intercessão “pelo profundo trabalho que o Espírito Santo realizou”

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(Bartleman, 2016 p. 05). Nas palavra de John Walker no prefácio da edição


brasileira dessa obra:
Ao autor, talvez mais do que a qualquer outra pessoa, foi confiada a
responsabilidade de orar pela profunda obra que o Espírito Santo realizou.
Para louvor e glória de Deus, o Avivamento Azusa não trouxe honra para
homem algum. Como testemunho disso o nome de nenhuma pessoa está
ligado à ele. Entretanto, pode-se dizer com segurança que não houve
testemunha mais fiel do que ocorreu, que Frank Bartleman. Quem seria mais
qualificado para conhecer e registrar o avivamento, senão alguém que sofreu
intensas dores de parto no seu nascimento, zelou dele ternamente, e
defendeu-o corajosamente no início de sua vida? (BARTLEMAN, 2016 p.
05-06).

Bartleman chegou à Los Angeles, na Califórnia como missionário, com sua


esposa e duas filhas, a mais velha de três anos e meio, no dia 22 de dezembro de
1904. Na manhã do dia 7 de janeiro a filha mais velha do casal, Ester, começou a
ter convulsões e veio a falecer:
Ao lado daquele pequeno caixão, com meu coração sangrando, dediquei
minha vida novamente à obra de Deus. Na presença da morte, como se
tornam reais os assuntos eternos! Eu prometi que o resto da minha vida seria
dedicado exclusivamente à Ele. E Ele fez uma nova aliança comigo.
Supliquei-lhe, então, que logo me abrisse uma nova porta de serviço, para
que eu não tivesse tempo de sofrer com o que acontecera. Apenas uma
semana depois da partida de Ester, comecei a pregar duas vezes por dia na
pequena Missão Peniel, em Pasadena (Califórnia). Muitas pessoas foram
salvas durante o encontro que durou um mês, mas a maior vitória foi a
descoberta de um grupo de jovens que assistiam ao encontro. Alguns foram
chamados pelo Senhor para futuros trabalhos.(BARTLEMAN, 2016 p. 11-
12).

Os “panfletos que contavam a visitação do Espírito Santo no País de Gales,


em 1904, foram a centelha inicial para o grande Avivamento de Los Angeles em
1906.” (BARTLEMAN, 2016 p. 06). Bartleman já havia lido a respeito do
derramar em Gales, mas quando em 8 de abril ouviu F. B. Mayer, de Londres
descrever o grande avivamento que se desenrolava no País de Gales, onde acabara
de estar e conhecera Evan Roberts, foi profundamente comovido em sua alma e
ali mesmo prometeu a Deus dispor totalmente a sua vida para ser usado para
alcançar a cidade, passando a atuar ativamente como um evangelista:
Distribuí folhetos no prédio do correio, em bancos e edifícios públicos em
Los Angeles e visitei muitos bares. Depois visitei mais de trinta bares em Los
Angeles. Os prostíbulos estavam abertos naquele tempo e distribuí muitos
folhetos ali também. A morte da pequena Ester havia quebrado meu coração
e eu sentia que só poderia viver enquanto servisse ao Senhor. Ansiava
conhecê-lo de uma forma mais real e ver a obra de Deus avançar com poder.
Um grande peso e desejo surgiram no meu coração para que houvesse grande
avivamento. Ele estava me preparando para um novo serviço Seu. Este,
porém, só poderia acontecer quando houvesse em meu coração um anseio
mais profundo por Deus e uma verdadeira dor de parto na minha alma pela
Sua obra. Isto Ele me deu. Muitos estavam sendo preparados de forma
semelhante nesta época em diferentes lugares do mundo. Deus estava prestes
a visitar e libertar seu povo mais uma vez. Eram precisos intercessores.
(BARTLEMAN, 2016 p. 12-13).

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Bartleman faz um breve relato da situação espiritual das igrejas de Los


Angeles e descreve as ainda embrionárias reuniões de avivamento, onde Deus
chamava os primeiros irmãos, em sua maioria jovens à oração:
Por volta de primeiro de maio, um poderoso avivamento irrompeu no templo
da igreja Metodista da Avenida Lake, em Pasadena. Quase todos os jovens
que haviam sido tocados por Deus nas reuniões da Missão Peniel
freqüentavam esta igreja e estavam orando por um avivamento ali. Aliás
estávamos orando por um avivamento que varresse toda a cidade de
Pasadena. Deus estava respondendo nossas orações. Vi maravilhas feitas pelo
Espírito Santo na Avenida Lake. O altar estava repleto de pessoas buscando a
Deus, apesar de não haver ali nenhum grande pregador. Em uma única noite
quase todos os presentes que não estavam salvos tiveram um encontro
pessoal com Jesus Cristo. Foi uma vitória total para Deus. Havia uma
poderosa convicção de pecados sobre todo o povo. Em duas semanas
duzentas pessoas ajoelharam-se no altar, buscando ao Senhor. Os rapazes de
Peniel estavam por trás de tudo, sendo grandemente usados por Deus.
Começamos então a orar por um derramamento do Espírito Santo em Los
Angeles e todo o sul da Califórnia. Naquela época escrevi em meu diário:
"Algumas igrejas vão se surpreender quando Deus as deixar para trás e usar
outros canais que se renderam totalmente à Ele. É preciso humilhar-nos para
que Ele venha. Estamos rogando 'Pasadena para Deus!' Na sua grande
maioria, os cristãos estão muito satisfeitos consigo mesmos, e têm pouca fé e
pouco interesse pela salvação dos outros. Deus os humilhará deixando-os de
lado. O Espírito está orando através de nós por um grande derramamento do
Espírito em toda parte. Grandes coisas vão acontecer. Estamos pedindo
coisas tremendas para que o nosso gozo seja completo. Deus está se
movendo. Estamos orando pelas igrejas e seus pastores. O Senhor visitará
aqueles que quiserem se render totalmente à Ele." (BARTLEMAN, 2016 p.
13).

Ainda no período embrionário do avivamento em Los Angeles o então


missionário, evangelista, pregador e intercessor tornou-se um grande entusiasta da
mensagem de avivamento espiritual, chegando a deixar seu emprego formal para
pregar, evangelizar a escrever artigos para diversas publicações holiness,
distribuindo folhetos e fazendo conhecido o mover do Espírito Santo no início do
século:
No dia 12 de maio, Deus me disse que de uma vez por todas eu deixasse meu
emprego secular e me dedicasse exclusivamente à Ele. O Senhor queria que
eu confiasse a mim e a minha família exclusivamente à Ele. Eu acabara de
receber o pequeno livro intitulado: "O grande avivamento em Gales", escrito
por S. B. Shaw e o estava lendo durante um pequeno passeio, antes do café
da manhã. Há anos que o Senhor insistia comigo para tomar esta decisão.
Agora fizemos um novo pacto, segundo o qual o resto de minha vida, em sua
totalidade, lhe pertenceria. E, desde então, jamais ousei quebrar este pacto.
Minha esposa me aguardava com meu café, mas eu perdera a vontade de
alimentar-me. O Espírito Santo através daquele pequeno livro incendiara meu
coração. Visitei e orei com três pregadores e outros numerosos obreiros antes
de voltar para casa, ao meio-dia. Eu recebera um novo comissionamento e
unção. E ansiava profundamente por um avivamento espiritual. Depois disto
passei muitos dias visitando e orando com outros irmãos e distribuí o folheto
da G. Campbell Morgan "O Avivamento em Gales", que tocava as pessoas
profundamente. Cada vez sentia mais necessidade de orar e resolvi ser fiel à
visão celestial que tivera. A "questão do pão de cada dia" há muitos anos me
preocupava, mas agora orei a Deus para poder confiar nEle totalmente: "Nem
só de pão viverá o homem!" (Mateus 4:4). Deus me abençoou além disso,

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com o poder de exortar as igrejas quanto ao avivamento e também com


artigos que escrevi para a Editora Holiness sobre o mesmo tema. Uma noite
acordei gritando louvores a Deus. O Senhor cada vez mais se apossava de
mim. Agora de dia, e mesmo durante a noite, eu os exortava para terem fé em
Deus por coisas grandiosas. O peso pelo avivamento me consumia. O dom de
profecia também veio sobre mim com poder. Parecia haver recebido um
especial "dom de fé" em favor do avivamento. Era óbvio que estávamos no
início de dias maravilhosos e eu profetizava continuamente sobre o grande
derramamento que haveria de acontecer. Eu tinha um ministério muito real
junto com a imprensa religiosa e comecei a freqüentar reuniões de oração em
diversas igrejas a fim de exortá-las. O pequeno folheto de G. Campbell
Morgan inflamava a todas as igrejas maravilhosamente. Também visitei
muitos irmãos e comecei a vender nas igrejas o livro de S. B. Shaw: "O
Grande Avivamento em Gales" Deus utilizou-o grandemente para incentivar
a fé pelo avivamento. Meu trabalho de distribuir folhetos continuou em bares
e em casas de negócios. (BARTLEMAN, 2016 p. 14-16).

O primeiro registro de uma aproximação de Bartleman e Smale se deu na


Primeira Igreja Batista de Los Angeles pastoreada por ele na época, conforme
relatado em seu diário, e tratam a respeito da apatia da igreja e das convenções
humanas na liturgia:
No dia 17 de junho, fui a Los Angeles para assistir a uma reunião da Primeira
Igreja Batista. Eles, também, esperavam em Deus por um derramamento do
Espírito ali. Seu pastor, Joseph Smale, acabara de voltar do País de Gales
onde estivera em contato com o avivamento e com Evan Roberts, e estava na
sua própria igreja em Los Angeles. Esse encontro parecia estar em perfeito
acordo com a minha visão, tarefa e desejo, e passei duas horas na igreja
orando, antes da reunião da noite. As reuniões estavam sendo realizadas ali
dia e noite, diariamente, e Deus estava presente. Uma tarde comecei a reunião
em Los Angeles, enquanto esperava que Smale aparecesse. Eu os exortei a
não esperar pelos homens, mas a esperar em Deus. Eles estavam esperando
em alguma grande figura humana; era o mesmo espírito de idolatria que
havia sido uma praga para igreja e que impedira a ação de Deus através dos
séculos. Como os filhos de Israel, o povo precisava ter "um outro Deus diante
do Senhor." (Em algumas igrejas oficiais na Europa, o pastor é muitas vezes
conhecido como "o pequeno deus!") Começamos o culto da noite nos degraus
do templo, do lado de fora, enquanto esperávamos que o Zelador chegasse
com a chave. Tivemos um período de oração em favor da comunidade
vizinha. A reunião foi uma marcha progressiva de vitória. Depois fui para o
Parque Lamanda, e após a pregação passei a noite na casa paroquial orando e
dormindo alternadamente. Eu queria uma revelação maior de Jesus PARA
MIM MESMO. Como a lua cheia que fica mais e mais nítida e mais próxima
à medida que a contemplamos incessantemente, assim também Jesus fica
mais real às nossas almas à medida que o contemplamos. Precisamos de um
relacionamento mais íntimo, vivo, e pessoal com Deus, e de conhecimento e
comunhão maior com Ele. Só o homem que vive em comunhão com a
realidade divina está habilitado a levar as pessoas à Deus. Fui à igreja de
Smale outra vez e novamente encontrei as pessoas sem ânimo, esperando o
pregador aparecer. Muitas pareciam nem ter idéia definida a respeito do que
esperavam que acontecesse! Comecei a orar em voz alta e a reunião se
iniciou com poder. Estava já com força total quando o irmão Smale chegou.
Deus queria que as pessoas olhassem apenas para Ele e não para algum
homem. Aqueles que não colocavam a glória do Senhor em primeiro lugar,
naturalmente se ressentiam disto. Contudo este é o plano de Deus. Verifiquei
que a maioria dos cristãos não queriam aumentar sua carga de oração. Era
difícil demais para a carne! Eu carregava agora uma carga cada vez mais
volumosa, noite e dia. O ministério era intenso. Era a "comunhão dos seus

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sofrimentos" (Filipenses 3:10), a angústia de alma "com gemidos


inexprimíveis" (Romanos 8:26, 27). Muitos crentes acham mais fácil criticar
do que orar... (BARTLEMAN, 2016 p. 16-18).

Bartleman relata ainda a exortação aos irmãos a orar por um avivamento


semelhante ao que irrompeu no País de Gales, o doloroso peso do encargo de
oração, e a primeira correspondência com Evan Roberts por carta pedindo que ele
os ajudasse em oração por um derramar do Espírito Santo também na Califórnia,
cuja resposta muito os encorajou:
Um dia eu estava sobre uma carga tremenda de oração. Fui à casa de oração
do irmão Manley, caí no altar e ali aliviei minha alma. Um obreiro entrou
correndo e pediu que orasse por ele. Naquela noite fui a uma reunião e
encontrei um outro jovem, EDWARD Boehmer, que havia sido tocado por
Deus nas reuniões de Peniel, no outono, e que tinha o mesmo fardo de oração
sobre si. Ele estava destinado a ser meu companheiro de oração no futuro.
Fomos unidos no Espírito daquele dia em diante de forma maravilhosa.
Oramos juntos na pequena Missão Peniel até às duas horas da manhã. Deus
encontrou-Se conosco e nos fortaleceu maravilhosamente enquanto
lutávamos com Ele por um derramamento do Espírito sobre o povo. Minha
vida então estava totalmente consumida pela oração contínua. Estava orando
dia e noite! Escrevi mais artigos para a imprensa religiosa, exortando os
santos a orar. Novamente fui a igreja de Smale em Los Angeles. Encontrei as
pessoas esperando o pregador outra vez. Esta situação me oprimia muito e
tentei mostrar-lhes que só deviam esperar pelo Senhor. Algumas se
ressentiram, pois eram muito tradicionais, mas outras aceitaram. Afinal,
estávamos orando por um avivamento como houvera no País de Gales, onde
um dos pontos principais era que somente esperavam em Deus. As reuniões
continuavam lá com ou sem pregador. Eles vinham se encontrar com Deus. E
o Senhor vinha para estar com eles. Eu havia escrito uma carta a Evan
Roberts, pedindo que em Gales orassem por nós na Califórnia. Recebi
resposta de que eles estavam orando, o que nos ligava, então, ao avivamento
de lá. A carta dizia: "Meu querido irmão na fé, muito agradecido por sua
carta gentil. Fiquei impressionado com sua sinceridade e honestidade de
propósitos. Reúna o povo que está disposto a fazer uma entrega total. Ore e
espere. Creia nas promessas de Deus. Faça reuniões diárias. Deus o abençoe,
é a minha oração." Sentimo-nos muito encorajados ao saber que estavam
orando por nós em Gales. (BARTLEMAN, 2016 p. 18-19).

O seguinte excerto ilustra bem tanto esse período embrionário, quanto o


papel de Smale e Bartleman na preparação da igreja para o grande derramar do
Espírito Santo que breve irromperia em Los Angeles:
Escrevi mais artigos e o que se segue são extratos deles: "Um trabalho
maravilhoso do Espírito irrompeu em Los Angeles, Califórnia, precedido de
um profundo trabalho preparatório de oração e expectativa. A convicção está
se espalhando entre o povo, e as pessoas estão afluindo de todas as partes da
cidade para as reuniões da igreja do Pr. Smale. Estas reuniões realizaram-se
por si mesmas. Pessoas estão sendo salvas por todo o auditório, enquanto a
reunião continua sem ser guiada por mãos humanas. A maré está subindo
rapidamente e nós estamos antecipando coisas maravilhosas. A intercessão
em angústia de alma está se tornando em importante aspecto do trabalho, e
estamos sendo transportados para além das barreiras denominacionais. O
temor do Senhor está vindo sobre o povo, um verdadeiro espírito de
quebrantamento. A reunião que começou domingo à noite durou até a
madrugada do dia seguinte. O pastor Smale profetizou coisas maravilhosas
que irão acontecer. Ele profetizou que os dons apostólicos logo voltarão à

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igreja. Los Angeles é uma verdadeira Jerusalém. Justamente o lugar certo


para uma grande obra de Deus começar. É exatamente este tipo de
demonstração de poder divino que eu tenho esperado há algum tempo. Tenho
sentido que a qualquer momento ela surgirá. Sinto, também, que virá onde
menos se espera para que Deus receba toda a glória. Ore por um
Pentecostes!" (BARTLEMAN, 2016 p. 19-20).

Não muito depois o clamor por avivamento se espalhou ainda mais por toda
a Califórnia, demonstrando que as orações, pregações, assim como os artigos
publicados e os folhetos surtiram o efeito esperado, despertando irmãos em toda a
parte que atendiam o convite à oração e até mesmo atraindo uma certa atenção até
mesmo da imprensa local, como descreve Bartleman:
O espírito de avivamento que havia na igreja do irmão Smale se alastrou,
despertando logo os mais espirituais em toda a cidade. Obreiros vinham de
todas as partes, de diversas instituições, unindo-se à nós em oração contínua
para que houvesse o derramamento do Espírito por toda a parte. O círculo de
interessados aumentou rapidamente. Estávamos agora orando pela Califórnia,
pela nação e também por um avivamento universal. As profecias começaram
a aparecer em larga escala a respeito de grandes coisas que aconteceriam.
Alguém me mandou cinco mil folhetos a respeito do "Avivamento no País de
Gales". Distribuí-os entre as igrejas. Tiveram um efeito maravilhoso e
vivificante.

Visitei outra vez a igreja de Smale e iniciei a reunião, pois ele ainda não
havia chegado. As reuniões agora eram caracterizadas por uma maravilhosa
espontaneidade. Nosso pequeno grupo Gideão estava marchando para a
Vitória certa, guiado pelo Capitão da sua salvação,Jesus. Fui levado a orar
nessa época especialmente por fé, discernimento de espíritos , cura e
profecia. Senti que precisava de mais sabedoria e também de amor. Parecia
ter recebido o "dom de fé" pelo avivamento naquela época e também o dom
de profecia para o mesmo fim, e comecei a profetizar a respeito das grandes
coisas que estavam para vir.

Quando começamos a orar na primavera de 1905, ninguém parecia ter muita


fé por nada fora do habitual. O pessimismo entre os santos era total com
relação às condições então existentes. Mas tudo havia mudado! Deus mesmo
nos havia dado fé em coisas melhores. Não havia nada á vista que nos
estimulasse a ter fé. Veio do nada. Não poderá Ele hoje fazer a mesma coisa?

Escrevi naquela época um artigo para o jornal "Daily News" de Pasadena,


descrevendo o que havia na igreja do irmão Smale. Foi publicado e o
administrador do jornal pouco depois veio ver por si mesmo o que estava
acontecendo. Ficou totalmente convencido e veio ao altar para

buscar a Deus com sinceridade. O artigo foi reimpresso em muitos periódicos


das igrejas "Holiness" através do país. Era intitulado: "O que vi numa igreja
em Los Angeles". Seguem-se abaixo alguns trechos.

"Há diversas semanas têm se realizado cultos especiais na Primeira Igreja


Batista de Los Angeles. O Pastor Smale que voltou do País de Gales, onde
esteve em contato com Evan Roberts e com o Avivamento, está convicto que
Los Angeles será em breve sacudida também pelo

grande poder do Senhor." "A reunião que desejo descrever começou de forma
inesperada e espontânea algum tempo antes do pastor chegar. Um pequeno
grupo havia se reunido antes da hora, o que parecia ser suficiente para o
Espírito operar.A reunião começou. Sua expectativa estava em Deus. Deus

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estava lá, o povo estava lá, e quando o pastor chegou a reunião se realizava
com força total. O Pastor Smale sentou-se no seu lugar, mas ninguém parecia
prestar atenção especial a ele. Sua mentes estavam ligadas a Deus. Ninguém
parecia atrapalhar o vizinho, embora a congregação representasse muitas
denominações. A harmonia parecia perfeita. O Espírito guiava." "O pastor se
levantou e leu um trecho das Escrituras; fez algumas observações cheias de
esperança, e que serviram de inspiração para aquela ocasião, e a reunião
novamente tomou o seu próprio rumo. O povo continuou como antes.
Testemunhos, orações e louvor se intercalavam durante a reunião que parecia
guiar-se por si mesma, sem orientação humana. O pastor era igual a todo
mundo. Qualquer pessoa com a menos sensibilidade espiritual possível sentia
logo no ambiente que algo maravilhoso estava prestes a ocorrer. Um
misterioso e poderoso transtorno no mundo espiritual está às portas. A
reunião dá a sensação de "céu aqui na terra" com a certeza que o sobrenatural
existe e em um sentido muito real." (BARTLEMAN, 2016 p. 22-24).

Bartleman foi um testemunho vivo de uma vida dedicada à oração


incessante, quando oração não era uma prática popular na igreja e o encargo de
intercessão poderia minar a reputação de qualquer um que se propusesse a um
estilo de vida de jejum e oração própria de um extremado:
Um dia, na igreja de Smale, eu estava gemendo em oração no altar. O espírito
de intercessão estava sobre mim, mas um irmão veio e me repreendeu
severamente. Ele não compreendia o que estava acontecendo. A carne
naturalmente reluta diante de tão árduo sacrifício. Os gemidos não são muito
populares em algumas igrejas assim como não são agradáveis os brados de
uma mulher dando à luz. A angústia na intercessão não é companhia
agradável para os que querem uma vida egoísta no mundo. Mas as almas não
são ganhas sem esta experiência. Dar à luz não é considerado um exercício
agradável hoje em dia. O mesmo acontece num verdadeiro avivamento que
gera novas vidas nas igrejas. A sociedade não se importa muito com uma mãe
que está para dar à luz. Prefere a alegria superficial. O mesmo acontece nas
igrejas com relação a angústia da intercessão. Há pouca preocupação com os
pecadores. Os homens fogem dos gemidos de uma mulher que está para dar à
luz. E as igrejas não querem ouvir os gemidos da intercessão. Estão muito
mais preocupados em se divertirem. (BARTLEMAN, 2016 p. 26).

E
Quase todos os dias em Los Angeles encontrava-me ocupado em
evangelismo pessoal, distribuição de folhetos, oração ou pregação em alguma
reunião. Estava escrevendo artigos para a imprensa religiosa sem parar. Orei
e jejuei antes de ir, numa tarde, a uma reunião na lona em Pasadena. O
Senhor me ungiu de forma maravilhosa e vinte pessoas aceitaram a cristo. A
essa altura o espírito de intercessão se apossara de mim de tal maneira que eu
orava noite e dia; jejuava tanto, que minha esposa de vez em quando achava
que eu iria morrer. As tristezas do meu Senhor estavam sobre mim. Eu estava
no jardim do Getsêmani com Ele. "O penoso trabalho da sua alma" também
estava sobre mim. Comecei a temer, como Ele temera, que não viveria para
ver as respostas às minhas orações e lágrimas pelo Avivamento. Ma ele me
consolava, mandando mais de um anjo para me fortalecer e eu ficava
satisfeito. Senti que estava experimentando um pouco do que Paulo queria
dizer quando escreveu: "preencho o que resta das aflições de Cristo", por um
mundo perdido. Alguns temiam que eu estivesse ficando desequilibrado. Não
conseguiam entender minha tremenda incumbência. Até hoje muitos não
conseguem compreender. "O homem carnal não aceita as coisas do Espírito
de Deus, porque lhe são loucura". Os homens egoístas não podem entender
tal sacrifício. "Quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á." "Se o grão de trigo

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caindo na terra, não morrer...." Nosso Senhor era um "Homem de dores".


(BARTLEMAN, 2016 p. 30).

Em Pasadena, antes de mudar para Los Angeles, eu ficava deitado de dia,


virando-me na cama e gemendo sob o enorme peso. À noite, eu mal podia
dormir de tanto sentir a necessidade de orar. Jejuava muito, pois sob esta
carga não sentia necessidade de alimento. Em certa época fiquei em
angustiosa intercessão por vinte e quatro horas seguidas sem interrupção.
Fiquei muito esgotado. As orações praticamente me consumiam. Comecei a
gemer até quando dormia. As orações não eram formais naquele tempo. Eram
sopradas por Deus. Vinha sobre nós e nos dominavam inteiramente. Não
fazíamos força para que se intensificassem. Éramos possuídos por verdadeira
angústia no Espírito que não podia ser cortada. Assim como é impossível
uma mulher em trabalho de parto evitar suas dores, não se pode fugir da
angústia na intercessão sem cometer grande violência ao Espírito Santo. Era
verdadeira intercessão feita pelo Espírito Santo. (BARTLEMAN, 2016 p. 32-
33).

Smale e Bartleman foram os precursores que contenderam em Deus pelo


avivamento que tocaria Los Angeles em 1906, mas eles não estavam sozinhos
nesse propósito, pois Deus em toda a parte separava homens e mulheres que se
posicionavam por um novo mover do Espírito Santo. William Seymour teve
especial protagonismo na história do avivamento de Azusa, nas palavras de
Bartleman “Deus achou seu Moisés na pessoa do irmão Smale para nos guiar até a
travessia do Jordão. Escolheu, entretanto, ao irmão Seymour para ser nosso Josué
para nos levar ao outro lado.” (BARTLEMAN, 2016 p. 46). Bartleman não esteve
na reunião de 09 de abril na rua Bonnie Brae quando diversas pessoas falaram em
línguas, mas assim que soube das notícias se juntou aos irmãos nas reuniões de
oração que aconteciam ali e os acompanhou quando foram transferidas para Azusa
312. Seus relatos riquíssimos dos primeiros dias da Missão da Fé Apostólica
trazem luz ao momento mais importante da história do derramar do Espírito Santo
no século 20.

4 AVIVAMENTO DA RUA AZUSA: WILLIAM SEYMOUR (1906)

Na manhã do dia 19 de abril de 1906, os leitores do Los Angeles Times


sentiram um choque ao ler a manchete sobre o terremoto de San Francisco. Às
5h18 da manhã do dia anterior, o mais violento terremoto da história dos Estados
Unidos (8,3 graus na escala Richter) havia destruído 514 casas no coração da
cidade. Mais de 700 pessoas morreram em consequência do tremor e dos
incêndios que se seguiram. No dia anterior, 18 de abril, leitores do mesmo jornal
haviam deparado com uma curiosa notícia de primeira página sobre o terremoto
espiritual que atingira a pequena missão religiosa da Rua Azusa uma noite antes.
As manchetes diziam:
“Esquisita Babel de línguas
Nova seita de fanáticos à solta
Cena grotesca ontem à noite na Rua Azusa
Gorgolejos ininteligíveis falados por uma irmã”.

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Foi assim que o mundo ouviu falar pela primeira vez do avivamento da Rua
Azusa, que sacudiu o mundo espiritual muito mais que o terremoto no norte da
Califórnia abalou San Francisco. Poucos leitores sabiam que os tremores
subsequentes do fenômeno ocorrido na pequena igreja negra Holiness da Rua
Azusa continuaria a sacudir o mundo com ainda mais intensidade no decorrer do
século. Poucos dias antes, um pequeno grupo de lavadeiras e serviçais domésticos
havia acompanhado William J. Seymour até um antigo prédio da Igreja Episcopal
Metodista Africana, na Rua Azusa para dar início aos cultos. Seymour havia
chegado à cidade poucas semanas antes com uma desconcertante mensagem,
relativa ao “batismo no Espírito Santo” com a “evidência bíblica” do falar em
línguas conforme o Espírito se manifestasse. O que aconteceu na Rua Azusa
mudou o curso da história da Igreja para sempre (SYNAN, 2009 p. 59-60).
Nascido na Louisiana, filho de escravos libertos, Seymour era um negro
baixinho e robusto, cego de um olho e agraciado com um espírito manso e
humilde. Ele começou sua odisseia espiritual ainda na infância, quando fez
profissão de fé em um culto metodista. No início de sua fase adulta, mudou-se
para Indianápolis, onde se filiou a uma igreja metodista. Mais tarde, estabeleceu
relações com a igreja de Deus (Anderson, Indiana), pela qual recebeu a ordenação
ministerial. Seymour passou alguns anos pregando em várias igrejas dessa
denominação. Chamados Santos da Luz do Alvorecer, os defensores da doutrina
Holiness submeteram Seymour aos seus ensinos mais radicais. Em 1905, depois
de se mudar para Houston em busca de parentes perdidos, Seymour foi convidado
por Lucy Farrow [a pedido de Julia Hutchins] para assumir o pastorado de uma
missão Holiness independente, a qual ficava perto da área. Arthur Osterberg, que
posteriormente se tornou líder da Missão da Rua Azusa, descreveu-o como
alguém “de fala suave e simples, mas não um orador. Ele falava a linguagem
comum de gente sem instrução. Podia pregar durante quarenta e cinco minutos
sem demonstrar mais emoção que aquele poste. Não era do tipo que levantava os
braços como para lançar raios e trovejar, nem era possível imaginá-lo fazendo
isso.”
Seymour aceitou o convite da pastora Hutchins como um “chamado divino”
para ir a Los Angeles. Havia pouco tempo, ele fora inflamado pelo ensino de
Parham sobre a evidência inicial das línguas, que havia absorvido durante sua
curta experiência educacional na escola bíblica de Parham, em Houston.
Presumindo, a partir de seu ligeiro contato com a srta. Terry, que o povo de Los
Angeles estava ansioso para ouvir sua mensagem, Seymour partiu com a benção e
o apoio financeiro de Parham, disposto a espalhar a doutrina pentecostal, embora
ele mesmo ainda não fosse batizado com o Espírito Santo.
Em seu primeiro sermão, num domingo de manhã, Seymour escolhou o
texto de Atos 2.4 e deixou muito claro em sua pregação que o crente que não
falava em línguas não havia ainda experimentado o verdadeiro batismo com o
Espírito Santo. De acordo com o ensino aceito e defendido pelo movimento de
santidade, a Irmã Hutchins e os demais membros da Missão Santa Fé acreditavam
que a santificação eram a mesma experiência, pessoal e na busca por algo mais.

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O novo ensino acerca das línguas incomodou tanto a Irmã Hutchins que
Seymour ao retornar para o culto da noite, encontrou as portas da missão fechadas
com cadeado. Desse modo, um ano depois de terem sido expulsos de sua igreja
pelo que seu pastor considerava um ensino antibíblico. aqueles cristãos
expulsaram outro cristão pelo mesmo motivo.
Tomando para si as responsabilidades de fundadora e pastora interina da
Missão Santa Fé, a irmã Hutchins¹ preferiu ignorar o fato de que muitos dos seus
seguidores haviam sido receptivos a pregação de Seymour. Por isso, um pequeno
grupo de famílias deixou a Missão Santa Fé com o pastor rejeitado e assim lançou
Seymour a uma trilha independente, que o levaria muito longe.
Expulso de sua igreja e à beira da miséria, Seymour era um homem com
uma mensagem que lhe ardia como fogo nos ossos. Sentindo que precisava
continuar, a despeito do revés sofrido na Missão Santa Fé, ele voltou a pregar, a
princípio falando àqueles que o haviam seguido. Eles se reuniam na casa de Owen
“Irlandês” Lee, onde Seymour se hospedara anteriormente. Lee era um americano
filho de irlandeses e frequentava uma das missões Holiness Peniel. Quando a casa
de Lee ficou pequena para comportar as reuniões, Seymour aceitou o convite de
parente de Neely Terry — Richard e Ruth Asberry — para dirigir encontros de
oração e adoração na casa deles, na rua Bonnie Brae, 214. Na época em que
fizeram o convite a Seymour, eles pertenciam à igreja Batista e não concordavam
com os ensinos de Seymour. No entanto, ao saber do que lhe havia acontecido,
sentiram pena do pregador rejeitado.
No início, as reuniões na casa dos Asberrys eram frequentadas quase
exclusivamente pelas “lavadeiras negras”, algumas acompanhadas do marido.
Seymour tinha ainda um grande empecilho à sua mensagem: até aquele momento,
ele não recebera o batismo com o Espírito Santo, não havia falado em línguas e
era muito difícil para ele conduzir os outros àquela experiência.
A notícia das reuniões logo se espalhou, a despeito de algumas barreiras. Os
Lees falaram das reuniões a outros membros da Missão Peniel. Os McGowans,
que tinha ouvido Seymour pregar seu único sermão na Missão Santa Fé, levaram a
informação ao grupo que se reunia em sua casa, a Igreja Holiness da Rua
Hawthorne, pastoreada por William Pendleton. Arthur G. Osterberg, pastor da
Igreja do Evangelho Pleno, também independente, ouviu falar das reuniões por
meio do bem desenvolvido sistema de comunicação espiritual de Los Angeles,
como dizia Frank Bartleman, o pregador Holiness que estava sempre tentando
descobrir o “próximo movimento de Deus”. No final de março de 1906, vários
cristãos brancos se juntaram ao pequeno grupo de negros que se reunia na casa de
Rua Bonnie Brae, a fim de buscar o batismo com o Espírito Santo e a evidência
inicial do falar em outras línguas.
O grupo continuava crescendo, mas com o sucesso preocupava Seymour e
seus seguidores. Quase em desespero, ele comunicou a Parham a situação em Los
Angeles e pediu ajuda. No final daquele mês de março, em resposta ao pedido de
Seymour, Parham enviou, de Houston, April Lucy Farrow e J. A. Warren para

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assistir Seymour. Warren era aposentado e ainda não havia recebido o batismo
com o Espírito Santo, porém Lucy já era batizada e incendiava as reuniões com
seus testemunhos.
Quando já estava prestes a deixar a casa dos Asberrys, na noite de 9 de
Abril de 1906, Seymour foi orar, na companhia do Senhor Lee, por uma cura
divina. Owen Lee, que costumava discutir assuntos espirituais com seu
convidado, contou-lhe uma visão que tivera na noite anterior, segundo o qual 12
apóstolos se aproximaram dele e lhe explicaram como falar em línguas. Lee então
pediu a Seymour que orasse para que ele, Owen, recebesse o batismo com o
Espírito Santo. Eles oraram juntos, e Lee de fato recebeu o batismo com o Espírito
Santo por meio da oração de Seymour.
Seymour correu para a reunião noturna na casa dos Asberry e relatou o que
havia acontecido com Edward Lee. A notícia estimulou a fé do povo, mais que o
normal, e de repente “Seymour e sete outros crentes caíram ao chão em êxtase
espiritual, falando em outras línguas” (Synan, 1972 p. 106). Quando isso
aconteceu, uma jovem chamada Willella, filha dos Asberrys, saiu correndo pela
vizinhança, aterrorizada. O alvoroço provocado pela menina chamou a atenção de
toda a vizinhança.
Os vizinhos se aglomeraram do lado de fora para ver o que estava
acontecendo, e os que participaram da oração vieram para a entrada da casa e
começaram a pregar a mensagem do Pentecoste. Uma das sete pessoas que
haviam recebido o batismo com o Espírito Santo naquela noite era Jennie Moore,
que mais tarde se casou com Seymour. Ela começou a tocar uma bela música e a
cantar num idioma que alguns afirmaram ser o hebraico. Até aquele dia, ela nunca
havia tocado piano e, sem nunca ter assistido a uma única aula de música,
continuou a tocar o instrumento pelo resto da vida. O fenômeno das línguas e a
mensagem dinâmica causara tamanho impacto que na noite seguinte uma
multidão se reuniu na rua diante da casa para ouvir Seymour pregar de um púlpito
improvisado à entrada da residência dos Asberrys.
As histórias acerca do que aconteceu em 9 de abril de 1906 se tornaram
lendárias entre os pentecostais, e, como todas as lendas, algumas tendem ao
exagero. O paralelo óbvio com a experiência pentecostal dos apóstolos, no livro
de Atos, parece ser sempre diminuído pelos historiadores seculares. Na ausência
de testemunho contemporâneo para desmentir aquelas histórias, a cuidadosa
pesquisa dos testemunhos remanescentes deixa um ponto muito claro: algo de
proporções extraordinárias aconteceu numa modesta casa de quatro cômodos da
Rua Bonnie Brae, na noite de 6 de Abril de 1906. Uma testemunha ocular relata o
incidente da seguinte maneira:
Eles gritaram três dias e três noites. Era época da Páscoa. As pessoas
chegavam de todos os lugares. Próximo ao amanhecer, não havia mais como
entrar na casa. Os que conseguiam entrar caíam sob o poder de Deus. A cidade
inteira ficou alvoroçada. Eles continuaram o clamor até o chão da casa ceder, mas
ninguém ficou ferido. (J. HOLLENWEGER (s.d), p. 23)

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Como evidenciado pela presença de crentes de muitas denominações e


várias igrejas independentes nas reuniões realizadas depois de 9 de abril, o
segmento religioso da cidade entrou em convulsão. O mundo secular parece não
ter tomado conhecimento dos fatos, ou pelo menos não registrou nada de
significativo senão nove dias depois, quando o primeiro jornal publicou os
acontecimentos de 18 de abril de 1906. Conforme corroborado por diversos
testemunhos, depois do incidente de 9 de abril, a reunião da casa da Rua Bonnie
Brae prolongou-se sem interrupção por pelo menos três dias. Os participantes
davam notícias de pessoas “caindo no poder” e recebendo o batismo com o
Espírito Santo com a evidência inicial do falar em línguas enquanto ouviam
Seymour pregar do outro lado da rua.
A multidão era tão numerosa que ninguém conseguia fechar as portas, e a
pressão da massa para entrar na casa era tão grande que fez ceder os fundamentos.
O alpendre afundou cerca de um metro. Miraculosamente, ninguém se feriu. Uma
semana depois, ficou evidente que era preciso encontrar um lugar maior para as
reuniões de oração e adoração quase contínuas que surgiram após 9 de abril de
1906 (SYNAN, 2009 p. 69-74).
Após uma rápida busca na região, encontrou-se uma estrutura de dois pisos
numa rua curta de dois quarteirões, no antigo distrito industrial, que fazia parte do
gueto negro original da cidade. O edifício abrigara originalmente a Igreja
Metodista Episcopal Africana Stevens, mas, acompanhando a migração do povo,
a igreja se estabelecera mais para o sul, numa parte mais próspera da cidade,
mudando o nome para Primeira Igreja Metodista Episcopal Africana.
Depois que a igreja se mudou, o edifício foi usado como loja de atacado,
armazém, depósito de madeira, curral, loja de pedras tumulares e por fim como
estábulo na parte inferior e quartos de aluguel no piso superior. Era um edifício
pequeno e retangular, de telhado plano e revestimento de madeira, e media cerca
de 900 metros quadrados. O único indício de que fora um dia uma casa de Deus
era a janela de estilo gótico acima da entrada principal.
Em 1906, o edifício estava em péssimo estado de conservação. As portas e
janelas estavam quebradas, e havia entulho por toda parte. Arthur Osterberg,
embora fosse pastor da Igreja do Evangelho Pleno, ocupava também um modesto
posto de chefia como cronometrista na Empreiteira McNeil. Ele contratou dois
homens de seu pessoal, pagando-os do próprio bolso, para colocar as janelas e as
portas. O dono da empreiteira, J. V. McNeil, que era católico devoto, doou
madeira e outros materiais.
Seymour e alguns voluntários removeram os entulhos do salão, espalharam
serragem no piso e pregaram pranchas de madeira bruta sobre pequenos barris,
providenciando assim assento para 30 ou 40 pessoas. Seymour fez algo incomum
com a disposição dos assentos. Na maioria das igrejas da época, o púlpito ficava
numa extremidade do salão, normalmente próximo do altar, com assentos
dispostos deste em fileiras duplas. Seymour ergueu a plataforma no centro do
salão, com os assentos em volta, e colocou o púlpito no centro da plataforma.

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Dois engradados vazios (que eram sempre descritos como caixas de sapatos)
serviam de púlpito.
O Entulho e o lixo do segundo piso também foram removidos. O lugar
servia como “cenáculo” onde os crentes podiam ficar “até serem revestidos de
poder do alto”. O andar de cima também tinha dupla serventia, como alguns
quartos para que Seymour e sua equipe pudessem descansar.
A primeira notícia do avivamento num periódico secular foi publicada como
dito anteriormente, em 18 de abril de 1906. O Los Angeles Times enviou um
repórter a uma reunião noturna, em 17 de abril. O repórter escreveu uma matéria
extremamente negativa, em que ridicularizava não apenas a reunião em si, mas
também o povo que as frequentava. A dramática guinada nas práticas e na
doutrina Holiness fez o movimento pentecostal explodir no cenário secular
quando o jornal informou que uma “esquisita babel de línguas” estava se
manifestando num bairro pobre da cidade. O articulista expressava sua opinião
sobre os cultos já no início da matéria, declarando que as pessoas presentes nas
reuniões em questão emitiam “sons estranhos e professavam um credo que
nenhum mortal em perfeito juízo poderia entender.” Ele escreveu ainda:
As reuniões são realizadas num barracão caindo aos pedaços, na Rua Azusa,
perto da Rua San Pedro. Ali, devotos das mais estranhas doutrinas praticam
rituais próprios de fanáticos, pregam teorias extravagantes e tentam atingir,
com o fervor que lhes é peculiar, um estado de excitação que beira a
insanidade. Negros e uma pequena quantidade de brancos compõem a
congregação, e à noite os uivos dos adoradores promovem um espetáculo
medonho para a vizinhança. Eles passam horas balançando para frente e para
trás num enervante exercício de orações e súplicas. Eles alegam possuir o
“dom de línguas” e se dizem capazes de entender aquela babel. (AUTOR,
1906, p. 1)

Embora no início a cobertura da imprensa secular ao avivamento fosse


inteiramente negativa, as matérias funcionaram como propaganda gratuita e
levaram as notícias do derramamento do Espírito a lugares cada vez mais
distantes. No final de 1906, panfletos e artigos circulavam em locais tão distantes
quanto Londres. Na época em que as reuniões eram realizadas na Rua Bonnie
Brae, e mesmo depois que se transferiram para a Rua Azusa, a polícia tentava
impedir os cultos, porque as ruas ficavam congestionadas, causando confusão e
aborrecimentos. Várias testemunhas oculares afirmaram ter visto uma
incandescência diante do edifício, que era visível a grande distância. Outros
afirmaram ter ouvido sons como de explosões saindo do pequeno prédio de
madeira, que deixaram a vizinhança assustada. Por causa de fenômenos dessa
natureza, o Corpo de Bombeiros foi chamado em diversas ocasiões, sempre que
alguém informava a ocorrência de uma labareda ou de explosões no edifício da
missão. A Agência de Bem-Estar Infantil tentou acabar com as reuniões porque
haviam muitas crianças circulando dentro e fora do prédio, sem a supervisão de
um adulto, a qualquer hora do dia ou da noite. O Departamento de Saúde tentou
embargar a missão, alegando que os apertados cômodos eram insalubres e
constituíam uma ameaça à saúde pública.

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Parte da comunidade religiosa se pronunciava contra, e parte se mostrava


favorável ao que estava acontecendo, ambas baseadas na natureza singular dos
acontecimentos. Glenn A. Cook, que em 1906 era pregador de rua em Los
Angeles, declarou que a princípio frequentava as reuniões da Rua Azusa,
“pensando que poderia orientar o povo na questão doutrinária”. Ele acrescentou:
“Eu não estava sozinho nesse empreendimento, porque muitos outros pregadores
e trabalhadores do evangelho se uniram para argumentar com o irmão Seymour”.
Pelo fato de o povo que frequentava as reuniões de oração na casa dos
Asberrys — e mais tarde na Rua Azusa — ser oriundo de várias igrejas, a notícia
se espalhou rapidamente entre os habitantes de Los Angeles que davam atenção às
coisas espirituais. No primeiro domingo depois que foi batizada com o Espírito
Santo (o Domingo de Páscoa de 1906), Jennie Moore foi a um culto de sua igreja,
a Primeira Igreja Batista do Novo Testamento, do pastor Smale. Depois do
sermão, ela ficou de pé e falou em línguas, o que não foi visto com bons olhos
pela congregação. Por isso, ela deixou aquela igreja e filiou-se à Missão Azusa.
Mais tarde, logo que as reuniões começaram a ser realizadas na Rua Azusa,
Jennie Moore e Ruth Asberry visitaram a Missão Peniel. Ali, Jennie falou em
línguas, e Ruth explicou “Isto é o que foi profetizado por Joel”.
A congregação inteira as seguiu para a missão da Rua Azusa. A maioria das
igrejas, missões e tendas de reuniões nas redondezas sentiu de imediato os efeitos
do avivamento. Algumas delas perderam tanta gente para a Missão da Rua Azusa
que tiveram de fechar as portas e se unir ao movimento. O avivamento
representou um grande problema para muitos ministros religiosos, os quais, com
insistência, aconselhavam o rebanho a manter distância da Missão da Rua Azusa.
Alguns chamavam a polícia e tentavam acabar com as reuniões. Dois mais
proeminentes líderes Holiness de Los Angeles reagiram cada um de uma forma
diferente. O pastor Smale a princípio apoiou totalmente a obra, unindo-se ao
movimento. Mais tarde porém, renegou o trabalho da Missão da Rua Azusa e
fechou as portas de sua igreja aos que falavam em línguas.
Phineas Bresee, da Igreja Pentecostal do Nazareno, posicionou-se de forma
veemente contrária ao “movimento das línguas”. Aparentemente sem nunca ter
visitado ou investigado a Missão da Rua Azusa, ele declarou aquela obra um falso
avivamento e aconselhou seu rebanho a se manter afastado. Mais tarde, em 1919,
ele mudou o nome de sua denominação retirando a palavra “Pentecostal” do
título, para que ninguém viesse a confundir seu movimento com o dos seguidores
de Seymour.
A maior parte do movimento de santidade estabelecido, que havia buscado
com tanto empenho e tanta oração um novo Pentecoste, agora opunha forte
resistência ao avivamento. O líder da Igreja União Pentecostal, bispo Alma White,
acusou o movimento da Rua Azusa de promover adoração ao Diabo, bem como
de incentivar e praticar bruxaria e imoralidade sexual. Essas acusações foram
publicadas num livro intitulado Demons Tongues [Línguas de Demônios]. Os
periódicos Holiness acautelavam seus leitores, sugerindo que estes, em sua busca

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de poder, poderiam estar envolvidos num esquema de manipulação demoníaca.


Não tardou para que passassem afirmar que o “movimento das línguas” era do
Diabo. Alguns líderes Holiness chegaram a referir-se ao movimento como “o
último vômito de Satã”.
A despeito de todas as críticas, gente de toda estirpe — instruídos,
analfabetos, homens, mulheres, nativos, imigrantes e visitantes estrangeiros —
orava, cantava e vinha para o altar. Nas palavras de Frank Bartleman, “a
segregação racial foi apagada pelo sangue de Jesus”. Fotos antigas mostram
negros, brancos, homens e mulheres em cargos de liderança. O relaxamento das
barreiras racial e sexual representava uma ameaça a muitos que pertenciam a
classe dominante. Essa configuração humana do Avivamento da Rua Azusa atraiu
a perseguição sobre os primeiros pentecostais e contribuiu para que a
autenticidade do movimento fosse contestada.
Impelidos pela nova forma de liberdade que desfrutavam e pela perseguição
resultante, os recém-energizados crentes pentecostais passaram a renegar aquilo
que consideravam mera invenção humana, como as hierarquias denominacionais.
Os pentecostais pretendiam substituir essas estruturas por um governo
divinamente inspirado, tendo por base o modelo bíblico. Seguindo a tradição da
maioria dos movimentos de renovação, os primeiros pentecostais não se
consideravam uma entidade separada. Em vez disso, viam a si mesmos como um
movimento “interno” da Igreja, permitido por Deus para trazer nova vida ao um
Corpo mal governado e carente de espiritualidade. Os líderes jamais incentivaram
a formação de denominações “pentecostais”. Eles se referiam ao movimento e a si
mesmos como “não denominacionais”. Cada um se esforçava para permanecer em
sua igreja de origem e para difundir a nova teologia. Os pentecostais chamavam
“compartilhar a verdade” ao mesmo que seus irmãos tradicionais denominavam
“infiltração”.
As tendências antiestruturalistas também se faziam notar nos padrões de
adoração estabelecidos pela Missão Azusa. Seguindo a crença de que o Espírito
Santo orientava todos os crentes, não só líderes, qualquer um podia tomar a
palavra, mesmo durante o culto, o que significava que a linha divisória entre os
membros e clérigos fora apagada. Era também ensino corrente que o Espírito
Santo e o evangelho não podiam estar confinados às quatro paredes de um edifício
religioso. Por isso, aproveitavam toda oportunidade que tivessem para
testemunhar, fosse no trabalho, fosse no meio da rua, apagando assim, também a
linha que separava os espaços sacro e profano. Além disso, a crença de que o
Espírito Santo podia dirigir os cultos da maneira que bem desejasse, inspirando
aleatoriamente cânticos, testemunhos, pregações e ensinos, fez evaporar ainda
mais as distinções entre a liturgia eclesiástica e o que alguns denominavam
“anarquia espiritual”.
O maior fenômeno antiestruturalista associado ao avivamento da Rua Azusa
era sua marca registrada da experiência: o falar em línguas, que determinou o
rumo do movimento. Foi essa experiência que relegou ao esquecimento o
embaraço das convenções humanas e entregou as rédeas ao Espírito. Nos

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discursos extáticos, a agência humana era inteiramente negada, e a própria


estrutura da linguagem era posta de lado. Em todas as ocorrências desse tipo
verificadas naquele avivamento, do “cair no poder” à cura divina, a clara
delimitação entre o comum e o extraordinário apresentava uma feição unificada.
Definitivamente, aquele embaraçamento das linhas, aquela mistura de raças e
sexos e aquela banalização do sagrado foram a causa de cristãos piedosos se
transformarem em inimigos inveterados do avivamento da Rua Azusa, bem como
do isolamento e da perseguição que se abateu sobre os herdeiros do movimento.
Essas tendências se evidenciam de muitas maneiras, e todas tinham a virtude de
provocar grande animosidade entre os pentecostais e os demais cristãos. Tal
incompatibilidade fez que os pentecostais fossem rejeitados por suas
denominações de origem.
Outra perspectiva pela qual se pode analisar o avivamento que sacudiu o
mundo depois do primeiro abalo, em 1906, é a econômica. Desde o início, a vasta
maioria dos líderes e seguidores da doutrina pentecostal era proveniente das
classes trabalhadores mais pobres. Uma das principais acusações muitas vezes
dirigidas aos adeptos do Pentecoste moderno era a de serem pessoas incultas e
rudes, e essa ausência de refinamento era usada como evidência de sua
ingenuidade e extravagância (SYNAN, 2009 p. 74-80).

5 FLUXO E REFLUXO DO AVIVAMENTO

O poder de atração do avivamento teve dois períodos de pico: de 1906 a


1909 e de 1911 a 1912. O primeiro período foi ininterrupto, desde o
derramamento inicial na rua Bonnie Brae. Depois de explodir no cenário religioso
de Los Angeles e atrair a atenção do mundo inteiro, o avivamento da Rua Azusa
por volta de 1909, ingressou num lapso de assistência reduzida e ausência de
acontecimentos notáveis.
De acordo com Frank Bartleman, a causa desse primeiro arrefecimento foi a
crescente incidência do sectarismo, formalismo e rituais. Decisões como as de dar
nome ao edifício, fazer um "trono" para Seymour e impor uma ordem estrita aos
cultos causaram divisões e reduziram o fluxo das manifestações extáticas.
Outro fator que contribuiu para que o avivamento chegasse ao fim depois de
1909 foi a insistente recusa da maioria das comunidades cristãs em aceitar como
genuíno o movimento. Avivamentos anteriores, como o Primeiro e o Segundo
Grande Avivamento, haviam sido universalmente aprovados e saudados com
grande entusiasmo pelo público em geral. Aquela rejeição era movida por diversas
razões. A primeira delas foi o antagonismo engendrado pelo sentimento de que os
pentecostais viam a si mesmos como uma espécie de aristocracia espiritual.
Agiam como se fossem detentores de discernimentos especiais com referência ao
batismo com o Espírito Santo, aos dons espirituais e aos métodos e adoração.
A segunda causa para a decadência do movimento foi uma das marcas
registrados do avivamento da Rua Azusa: a natureza igualitária das reuniões. Essa

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particularidade era ofensiva para muitos e contribuiu para o fim dessa primeira
etapa do avivamento. A diversidade racial e cultural que se observava no
avivamento da Rua Azusa, vista como um sinal da presença de Deus, tornou-se
fonte de divisões. Questionamentos em torno da teologia e de algumas práticas
começaram a se multiplicar, diferenças subjacentes àquele povo e a outros fatores
sociais, como raça, classe e herança religiosa adquirida em antigas afiliações
levaram a cismas e divisões em todos os níveis. Os conflitos motivados por raça e
outros fatores sociais levaram Seymour a concluir que o “sonho de um movimento
pentecostal inter-racial, que poderia ser um testemunho positivo numa América
segregada”, estava acabando.
O maior golpe desferido contra o primeiro período de avivamento pode
muito bem estar relacionado com a questão racial. Duas mulheres brancas, Clara
Lum e Florence Crawford, que faziam parte da equipe do Apostolic Faith, jornal
da Missão da Rua Azusa (cuja circulação ultrapassava 50 mil exemplares em
1909), suspenderam, com o consentimento de Seymour, mas sem o conhecimento
do presbitério, a distribuição do periódico. A sede do jornal foi transferida para
Portland, no Oregon, para onde se mudara a senhora Crawford. Com a perda da
mala direta, a Missão da Rua Azusa perdeu também sua base de apoio mundial e
logo ficou sem recursos e influência.
Durante o período de calmaria, Seymour trabalhou num prédio do ministério
da Missão da Fé Apostólica do Pacífico, à qual se filiara em dezembro de 1906.
Viajando o tempo inteiro, Seymour espalhou a mensagem do Maine a San Diego.
Recebeu honras de apóstolo da Igreja de Deus em Cristo e muitas vezes dirigiu
suas reuniões. Nos longos períodos de ausência ocasionados pelas viagens
missionárias de Seymour sua esposa, Jennie Evans Moore Seymour, assumia a
liderança da Missão da Rua Azusa, que se tornaria uma pequena igreja afro-
americana. Seymour e aquela jovem que havia recebido miraculosamente
habilidade para tocar piano num culto de oração na casa dos Asberrys, na Rua
Bonnie Brae, em 9 de abril de 1906, casaram-se em 13 de maio de 1908. O
casamento enfrentou veemente oposição de Clara Lum e Florence Crawford. Por
causa da proximidade da segunda vinda de Cristo, elas estavam convencidas não
devia pensar me casar-se. Já outros suspeitavam de que Clara Lum, uma mulher
branca, alimentava a esperança de ser a escolhida de Seymour.
Nessa época, o problema racial agravou-se entre os pentecostais. Seymour,
embora honrado e muito solicitado pelas igrejas afro-americanas que
experimentavam rápido crescimento nos Estados Unidos, era muitas vezes
ignorado pelos brancos. O clima de hostilidade cada vez mais pesado, resultante
da tensão racial da época, é tido como a principal causa de muitos brancos terem
abandonado Seymour e o avivamento da Rua Azusa para se reunir a
denominações que primavam pela exclusividade racial ou para implantar igrejas
com essa característica.
Os tempos de calmaria espiritual não contaram com nenhuma cobertura
jornalística. Nem a imprensa secular nem a religiosa noticiavam as evidências de
acontecimentos miraculosos da Rua Azusa. No intervalo entre os dois picos, a

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Missão da Rua Azusa funcionou como uma pequena igreja local, mais
especificamente uma congregação afro-americana presidida por Seymour, a qual
em nada se diferenciava das centenas de outras igrejas pentecostais frequentadas
por negros em Los Angeles. Nos primeiros dias do segundo período de pico,
iniciado em 1911, os cultos da Missão da Rua Azusa eram frequentados apenas
por uma dezena de pessoas, todas negras.
O segundo período de pico teve início em fevereiro de 1911, quando
William F. Durham (1873-1912) chegou de Chicago à Rua Azusa com a missão
de pregar. Durham era natural do Kentucky, e sua primeira afiliação religiosa foi à
Igreja Batista, em 1891. De acordo com o testemunho do próprio Durham, ele só
veio a experimentar a conversão em 1898, ao ter uma visão de Cristo crucificado
enquanto viajava pelo Estado de Minnesota. Logo que experimentou essa
transformação, Durham dedicou o restante de sua vida ao ministério em tempo
integral.
Em 1901, Durham implantou a Missão da Avenida Norte, em Chicago, da
qual se tornou pastor. Era uma missão Holiness localizada numa área habitada por
imigrantes. Como pastor, ele pregava a salvação, a santificação, e a cura. Durham
também ensinava que as estruturas denominacionais eram “o maior obstáculo para
o avanço da verdadeira causa de Cristo”.
Depois que tomou conhecimento do avivamento da Rua Azusa, Durham
declarou-se favorável ao movimento. Entretanto, pouco tempo depois começou a
questionar a ideia de que o falar em línguas era sempre a evidência inicial do
batismo com o Espírito Santo. Quando pessoas de seu círculo começaram a falar
em línguas, contudo, ele resolveu estudar a questão mais a fundo e concluiu que
“as experiências que haviam presenciado, incluindo a dele próprio, estavam muito
abaixo do padrão apresentado por Deus em Atos”. Durham visitou a Missão da
Rua Azusa em 1907. Mais tarde, declarou que desde esse primeiro contato com a
Rua Azusa ele tomara consciência da presença de Deus. O pastor de Chicago
buscou e recebeu o Batismo com o Espírito Santo, Seymour profetizou que “onde
quer que Durham pregasse haveria um derramamento do Espírito Santo”. De volta
à sua igreja em Chicago, Durham passou a trabalhar incansavelmente na
propagação da doutrina pentecostal. As reuniões na Missão da Avenida Norte
recebiam gente em número muito maior que sua capacidade, bem como pessoas
que chegavam de todo o meio-oeste dos Estados Unidos para para receber o
batismo com a mensagem pentecostal para suas respectivas igrejas. Haviam
também muitos testemunhos de cura divina nos cultos realizados por Durham.
Aimee Semple, antes de se casar com seu segundo marido, Harold McPherson,
mais tarde revelou que fora curada instantaneamente de um tornozelo quebrado
durante um culto dirigido por Durham em Chicago.
Em 1911, Durham transferiu a maior parte do seu trabalho para Los
Angeles. Ele estava enfrentando problemas com a liderança da Missão da Avenida
Norte e também desejava estabelecer a base de seu ministério no berço do
moderno pentecostalismo. Deus início a essa nova fase de seu ministério como
pregador da Missão Cenáculo, mas foi expulso dali por causa de seu novo

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ensinamento teológico, a doutrina da “obra consumada”. Esse ensino ia de


encontro à doutrina Holiness da santificação como segunda obra da graça, pois
afirmava que tudo que o crente podia necessitar estava incluído na obra de Cristo
sobre a cruz. Durham defendia a ideia de que, quando Cristo disse “está
consumado”, tudo ali se cumpriu: salvação, santificação, cura e batismo com o
Espírito Santo. Ele ensinava que a única coisa requerida do crente para ter acesso
a esses benefícios era a aceitação dessa realidade.
A nova doutrina reacendeu o avivamento e, de acordo com Frank
Bartleman, “o fogo voltou a cair sobre a velha Azusa, como no início”. Alguns
consideravam Durham um “pródigo do púlpito” que induzia seus seguidores, a
quem os críticos chamavam “os simplórios de Durham”, a se expressão aos
brados. O edifício mais uma vez ficou pequeno, e o povo se aglomerava próximo
das janelas e das portas para ouvir o revolucionário pregador e sua nova doutrina.
Várias missões e igrejas suspenderam os cultos para ouvir Durham. O evangelista
de Chicago enfatizava a salvação pela fé somente, e os cultos eram marcados por
notícias de milagres extraordinários e pela ocorrência de muitas manifestações do
Espírito presenciadas no primeiro período de atividades da Missão da Rua Azusa.
As reuniões com Durham começaram a se desenvolver enquanto Seymour
pregava na Costa Leste. À medida que se espalhavam as notícias no segundo
período de avivamento, crescia também a controvérsia em torno da teologia da
“obra consumada”. Quando tomou conhecimento desse fato, Seymour retornou às
pressas para combater a heresia. Isso ocorreu em 1912, e Seymour proibiu
Durham de entrar novamente na Missão da Rua Azusa. Durham, ao partir, levou
consigo seus seguidores e implantou uma missão concorrente em outra parte da
cidade. O segundo período de pico do avivamento chegava ao fim (SYNAN, 2009
p. 87-92).
Seymour foi fiel no trabalho da missão, mas no fim, o avivamento se
espalhou para além das paredes onde ele pastoreava. Ele continuou a liderar sua
congregação até sua morte, em 28 de Setembro de 1922. Após sua morte, sua
esposa Jennie Evans [Moore] Seymour o sucedeu no pastoreio.
Após a morte de Seymour, a congregação permaneceu com uma certa
membresia, de afro-americanos. Em 1930, a Missão foi confrontada com um
desafio por um novo intruso, mas no final falhou. Ruthford Griffith chegou à
missão em 1930 e permaneceu até 1931. Ele intimidou Jennie Seymour e sua
congregação e tentou assumir a igreja. Ele se mudou para o prédio da igreja e
começou a fazer reparos na estrutura. Quando confrontado pela congregação, ele
os processou. O processo inicialmente levou a um julgamento a seu favor e a
venda do imóvel. Em recurso, no entanto, o tribunal acabou sendo favorável à
senhora Seymour.
Em julho de 1931, o prédio que outrora presenciara dias extremamente
importantes entre 1906 e 1909 foi demolido infestado de cupins. A Sra. Seymour
morreu em 2 de julho de 1936 e foi enterrada no Cemitério Evergreen, em Los
Angeles. Um mapa da região, publicado em 1936, revela nada além de um lote

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vago no local que antes testemunhou o trabalho de Deus em remodelar a face do


cristianismo global. A história do avivamento da Rua Azusa no entanto não
termina em 1936. Desde aquela época, o movimento pentecostal e carismático foi
construído sobre os fundamentos estabelecidos pelos evangelistas e missionários
que levaram a mensagem da Fé Apostólica ao redor do mundo que produziu
milhares de denominações, cruzadas em muitas igrejas históricas na forma de
renovação carismática e em congregações evangélicas através de uma terceira
onda de avivamento. Funcionou como um sinal de esperança para os oprimidos,
como durante a era do Apartheid na África do Sul. E continua a apontar os
cristãos para Aquele que prometeu aos Seus seguidores que, se eles fossem a
Jerusalém e se permanecessem, receberiam a Promessa do Pai. (ROBECK, [200-
?]).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste estudo foi analisar a origem histórica e teológica do


Pentecostalismo no Avivamento da Rua Azusa e suas implicações na renovação
da igreja, delineando uma cronologia que prove a influência que o avivamento no
País de Gales exerceu ao avivamento na Rua Azusa, buscando compreender as
doutrinas teológicas que formam a base do Pentecostalismo Histórico como
conhecemos hoje e quem foram os agentes humanos que trabalharam na formação
dessa teologia e no despertar da igreja através da oração em um período em que a
igreja experimentava frieza e apatia. Foi possível alcançar todos os objetivos
pretendidos graças a bibliografia disponível, principalmente pelo relato de
testemunhas que registraram os fatos conforme eles ocorriam em diários ou
jornais, e um movimento posterior de resgate da identidade Pentecostal que
buscou contar a história do Avivamento da Rua Azusa, uma vez constatado que
muitos pentecostais desconheciam sua própria história, e sequer haviam ouvido a
respeito de nomes como de Charles Parham e William Seymour, ou sabiam da
razão daquilo que acreditavam e porque acreditavam.
As raízes da doutrina do Batismo no Espírito Santo para a santificação e o
serviço, assim como do falar em línguas, como evidência inicial, foi herdadas de
movimentos anteriores e adaptadas à recém-formada teologia pentecostal. Estes
movimentos, assim como seus principais nomes são estudados previamente antes
de nos debruçarmos sobre os eventos que apontam para o avivamento da Rua
Azusa, uma vez que remetem ao século XIX. Desse modo, o recorte temporal
empregado foi de 1901 a 1936 com recorte espacial na cidade de Los Angeles,
Califórnia, nos Estados Unidos da América.
A linha cronológica dos fatos foi traçada a partir no início do século XX
quando já na virada do ano de 1901 temos em Agnes Ozman o primeiro relato de
um crente batizado no Espírito Santo com a evidência inicial do falar em línguas
— fruto da oração com imposição de mãos de Charles Parham. No ano de 1904 o
País de Gales experimenta um avivamento singular liderado por Evan Roberts, as
notícias desse grande mover do Espírito Santo correm o mundo por meio de

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folhetos e animam aqueles que em Los Angeles também oravam por um


avivamento que impactasse os Estados Unidos e alcançasse toda a terra. Enfim,
em 1906 um avivamento sem precedentes na história — muito diferente do
Primeiro Grande Despertamento e do Segundo Grande Despertamento —
irrompeu em Los Angeles, primeiro da Rua Bonnie Brae e posteriormente na Rua
Azusa e a Missão da Fé Apostólica tornou-se uma central de avivamento para o
mundo inteiro.
Esta pesquisa dedicou especial atenção a destacar alguns nomes poucos
comentados na historiografia, exaltando a importância de homens e mulheres
sinceros como Julia Hutchins, Joseph Smale e Frank Bartleman que tiveram um
importante papel na história do avivamento da Rua Azusa, ainda que como
Edward Boehmer, um jovem jardineiro, que foi um parceiro de oração Bartleman,
e muitas vezes ajudaram a financiar seus empreendimentos evangelísticos,
personagem cujos historiadores pouco sabem, mas que foi chamado por
Bartleman de “um maravilhoso homem de oração”. Esses leigos são um sinal da
inclusão social e religiosa que o aviamento da Rua Azusa proporcionou
quebrando antigos paradigmas até então invioláveis na cúltica da igreja.
Finalmente o estudo comprova a hipótese de que o Avivamento da Rua
Azusa sofreu forte influência do avivamento no País de Gales conforme
comprovado nas visitas de Joseph Smale ao País de Gales, que retornou a Los
Angeles muito afetado pelo que experimentou lá e disposto a contender por um
mesmo romper na cidade em que pastoreava, liderando então reuniões de oração
em sua igreja local. Também pelas correspondências entre Frank Bartleman e
Evan Roberts.
A pesquisa ainda responde os problemas levantados descrevendo a situação
espiritual das igrejas da Califórnia no final do século XIX no primeiro capítulo.
Detalhando a condição em que se encontravam e desenhando o panorama da Los
Angeles do início do século XX. Quais fatos e doutrinas teológica influenciaram
na investigação a respeito da continuidade dos dons espirituais e sua operação na
igreja no século XIX, na ideia de Batismo no Espírito Santo como revestimento de
poder para a santificação e para o serviço, e do falar em línguas como evidência
inicial do Batismo no Espírito Santo, investigando as raízes dessas doutrinas em
no perfeccionismo do metodismo, movimento de santidade e outros movimentos
de menor expressão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SYNAN, Vinson. O século do Espírito Santo: 100 anos de avivamento pentecostal e


carismático - São Paulo: Editora Vida, 2009.
BARTLEMAN, Frank. A história do avivamento azusa. 3. ed - Americana: Impacto
Publicações, 2016.
WALKER, John. A Igreja do Século 20: a história que não foi contada. 3. ed - São Paulo:
Impacto Publicações; São Paulo: Editora Clássicos, 2013.

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DEMOSS, Nancy L; SMITH, Maurice. O Avivamento do País de Gales. - Americana:


São Paulo, 2016.
ROBECK, Cecil M. Azusa Street:100 Years Later, [200-?]. Disponível
em:<http://enrichmentjournal.ag.org/200602/200602_026_Azusa.cfm/>. Acesso em: 21
de jun. 2018.
MILLER, Denzel R. The Women of Azusa Street: four spirit-anointed leaders of the
azusa street revival - Springfield, AIA Publications, 2015.
312 AZUSA STREET. Edward Boehmer. Disponível em:
<http://www.azusastreet.org/ParticipantBoehmerEJ.htm>. Acesso em: 25 de junho de
2018;

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