Você está na página 1de 4

 Anjos.

As Sagradas Escrituras e a Tradição da Igreja deixam-nos entrever dois


aspectos a respeito dos anjos. Por um lado, o anjo é uma criatura de Deus, que
está sempre diante d’Ele, orientada, com todo o seu ser, para o Senhor. Os
três nomes dos arcanjos que celebramos, na Liturgia, terminam com a palavra
hebraica “El”, que significa “Deus”. Ele está inscrito não somente nos seus
nomes, mas também e, principalmente, em sua própria natureza. A sua
verdadeira natureza é a existência em vista d’Ele e para Ele.

O segundo aspecto que caracteriza os anjos está precisamente ligado ao


primeiro: eles são mensageiros de Deus e O trazem aos homens, abrem o
Céu, e, assim, abrem a Terra. Justamente, porque estão na presença do
Senhor, eles podem também estar muito próximos de nós.

Como dizia Santo Agostinho, Deus é mais íntimo a cada um de nós do que nós
mesmos. Nesse sentido, os anjos falam a nós do que constitui o nosso
verdadeiro ser, do que, em nossa vida, com muita frequência, está escondido
em nosso mundo interior. Eles nos chamam a nos reentrarmos em nós
mesmos, tocando-nos da parte de Deus. Por isso, nós também deveríamos nos
tornar anjos uns para os outros, anjos que nos afastam dos caminhos errados e
nos orientam sempre de novo para Deus.

Somos chamados a nos tornar anjos, mensageiros de Deus, que ajudam as


pessoas a encontrar a sua verdadeira natureza, a si mesmas, e a viver a sua
vocação, o chamado de Deus. Toda essa realidade espiritual se torna ainda
mais clara, se meditarmos sobre as missões dos três Arcanjos, cuja festa nós
celebramos na Liturgia.

 As duas funções de São Miguel Arcanjo


Nas Sagradas Escrituras, encontramos a figura de São Miguel Arcanjo no Livro
de Daniel, na Carta do Apóstolo São Judas Tadeu e no Apocalipse de São
João. Nesses textos bíblicos, tornam-se evidentes duas funções deste Arcanjo.
Primeiramente, Miguel defende a causa da unicidade de Deus contra a soberba
do grande dragão, da primitiva serpente (cf. Ap 12, 9), como diz João. O
Arcanjo defende-nos da constante tentativa de satanás fazer-nos crer que
Deus deve desaparecer, para que possamos nos tornar grandes, e da ideia de
que Ele é um obstáculo para a nossa liberdade, e que, por isso, devemos
afastar-nos d’Ele.

O dragão não se limita a acusar Deus. O Apocalipse nos revela que ele é
também “o acusador dos nossos irmãos, que os acusava de dia e de noite
diante de Deus” (12,10). Mas quem põe Deus de lado não se enobrece. Ao
contrário, priva-se da Sua dignidade. Dessa forma, tornamo-nos escravos da
nossa própria natureza, corrompida pelo pecado original. Pois quem acusa
Deus acusa também a si mesmo.

A fé em Deus defende-nos em todas as nossas fraquezas e limitações. Pela


virtude da fé, o esplendor divino resplandece em cada um de nós, pois o que
podemos dizer e pensar de mais elevado sobre a humanidade, a não ser que o
próprio Deus se fez homem? Segundo as Escrituras, outra função do Arcanjo
Miguel é a de ser protetor do Povo de Deus (cf. Dn 10,21; 12,1). Sendo assim,
nós que, segundo a Tradição, somos o novo povo de Deus, devemos pedir,
constantemente, a proteção de São Miguel.

 O Arcanjo São Gabriel e o anúncio de Deus

Na Bíblia, encontramos o Arcanjo São Gabriel na preciosíssima narração do


anúncio da encarnação do Filho de Deus a Virgem Maria, conforme nos
transmitiu São Lucas (1,26-38). Gabriel é o mensageiro de Deus por
excelência, que nos revelou o mistério da encarnação do Verbo de Deus. O
Arcanjo bate à porta de Maria e, por meio dela, o próprio Deus pede a ela o seu
“sim”, para o desígnio divino de se tornar a Mãe do Redentor, de dar a sua
carne humana ao Verbo eterno de Deus, ao Filho de Deus.
Repetidas vezes, o Senhor bate à porta do nosso coração. No livro do
Apocalipse, Deus diz ao “anjo” da Igreja de Laodiceia e, através dele, aos
homens de todos os tempos: “Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir a
Minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele” (3,20). O
Senhor está à porta, à porta do mundo e à porta de cada um de nossos
corações. Deus bate à porta de nosso coração, para que O deixemos entrar: “a
encarnação de Deus, o seu fazer-se carne deve continuar até ao fim dos
tempos. Todos devem estar reunidos em Cristo num só corpo: dizem-nos isto
os grandes hinos sobre Cristo na Carta aos Efésios e na Carta aos
Colossenses. Cristo bate” 1 .

Também hoje, Deus tem necessidade de pessoas que coloquem à disposição


a própria carne, que Lhe doem seus bens materiais e espirituais, servindo
assim para a unificação entre Ele e a humanidade, para a reconciliação
universal. Ao entrarmos em comunhão com Cristo, podemos também assumir a
função de Gabriel: levar o chamado de Cristo aos homens. Assim, à
semelhança de São Miguel, compete a nós bater à porta do coração dos
homens, em nome de Deus, e anunciar-lhes a Boa Nova da Salvação,
realizada em Cristo.

 São Rafael, a cura e a reconciliação

O Arcanjo São Rafael nos é apresentado no Livro de Tobias como o Anjo ao


qual é confiada a tarefa de curar. De modo análogo, quando Jesus envia os
seus discípulos em missão, com a tarefa do anúncio do Evangelho, está
sempre ligada a de curar. “O bom Samaritano, acolhendo e curando a pessoa
ferida, que jaz à beira da estrada, torna-se silenciosamente uma testemunha do
amor de Deus. Esse homem ferido, com necessidade de curas, somos todos
nós. Anunciar o Evangelho, já em si, é curar, porque o homem precisa,
sobretudo, da verdade e do amor” 2 .
No Livro de Tobias, são referidas duas tarefas emblemáticas de cura do
Arcanjo Rafael. Primeiramente, ele cura a comunhão entre homem e mulher,
cura o seu amor. Além disso, ele fasta os demônios que, sempre de novo,
querem destruir o seu amor. Rafael purifica a atmosfera espiritual entre o
homem e a mulher e confere-lhes a capacidade de se receberem mutuamente
para sempre.

No Novo Testamento, a ordem do matrimônio, estabelecida na criação e


ameaçada de muitas formas pelo pecado, é curada pelo fato de que Cristo o
acolhe no Seu amor redentor. Jesus faz do matrimônio um sacramento. Nele, o
Seu amor, que se tornou patente no mistério da cruz, é a força restauradora
que dá ao homem e à mulher a capacidade da reconciliação, purifica a
atmosfera e cura as feridas. Nesse sentido, no sacramento da Penitência ou
Confissão, somos sempre guiados de novo ao encontro da força reconciliadora
do amor de Cristo.
Em segundo lugar, o Livro de Tobias nos fala da cura dos olhos cegos de Tobit.
Em sentido espiritual, todos nós sabemos o quanto estamos ameaçados pela
cegueira. Corremos um grande perigo, pois, por causa de tudo o que sabemos
sobre as coisas materiais e o que somos capazes de fazer com elas, podemos
tornar-nos cegos para a luz de Deus. Curar esta cegueira, mediante a
mensagem da fé e o testemunho do amor, é o serviço do Arcanjo Rafael.

Você também pode gostar