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OS VALORES VIRTUAIS E AS TROCAS REAIS: A ESCALA COMUM DE

VALORES EM GRUPOS DE APRENDIZAGEM DE E/LE COMO SISTEMAS


ADAPTATIVOS COMPLEXOS

VIRTUAL VALUES AND REAL EXCHANGES: THE COMMON SCALE OF


VALUES IN LEARNING GROUPS OF SPANISH AS A FOREIGN LANGUAGE AS
APTATIVE COMPLEX SYSTEMS

Patricia Mussi Escobar1


Universidade Federal de Pelotas – UFPel

RESUMO
Este trabalho parte da existência de escalas de valores (PIAGET, 1973) e de uma escala
comum de valores (PIAGET, 1973); estes valores permeiam as diversas interações nos
sistemas complexos. O estudo objetiva verificar se um grupo de espanhol como língua
estrangeira (E/LE) em ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) comporta-se como um
sistema adaptativo complexo (SAC) (PAIVA, 2009) e identificar os valores envolvidos nas
trocas de sustentação solidária (ESTRÁZULAS, 2004) e de benefício recíproco (PIAGET,
1973), e especialmente a escala comum de valores nas trocas de benefício recíproco. Na
análise, foi observado de modo qualitativo descritivo o processo interativo via mensagens nos
fóruns de discussões dos alunos da disciplina de língua espanhola III de um curso de
graduação, para a formação de professores de espanhol em uma universidade pública
brasileira.
PALAVRAS CHAVE: Complexidade; Caos; Valores; Espanhol; AVA.

ABSTRACT
This work has its starting point in the scale of values (PIAGET, 1973) and in the common
scale of values (PIAGET, 1973); these values are present in the different interactions in the
complex systems. This study aims at verifying if a group of Spanish as a foreign language
(SFL) in virtual learning environments (VLE) behaving as a complex adaptive system (CAS)
(PAIVA, 2009) and identify the values involved in the exchanges of solidary support
(ESTRÁZULAS, 2004) and reciprocal benefit (PIAGET, 1973), and, specifically, the
common scale of values in the exchanges of reciprocal benefit. The interactive process via
messages in the discussion forums of students of Spanish III of an undergraduate course of a
public Brazilian university were observed in the analysis based on a qualitative descriptive
methodology.
KEYWORDS: Complexity, Caos, Values, Spanish, VLE.

1
Mestranda do Programa de Pós-graduação Mestrado em Letras: Estudos da Linguagem da Universidade
Federal de Pelotas – UFPel. Bolsista CAPES.
Introdução

Desde a última década, à Linguística Aplicada (LA) vem somando-se um expressivo


número de investigações sob a ótica do Pensamento Complexo (MORIN, 1994) e da Teoria
do Caos (GLEICK, 1989). Estes estudos têm apontado em suas pesquisas a sala de aula como
um sistema complexo (VETROMILLE-CASTRO, 2008; MARTINS, 2009) e a aprendizagem
de línguas estrangeiras também como um sistema complexo (LARSEN-FREEMAN, 1997;
2004; PAIVA, 2009).

Nestas pesquisas a interação aparece como elemento fundamental para a emergência


(JOHNSON, 2003) e a sobrevivência do sistema. As pesquisas mostram análises de diferentes
panoramas interativos e trazem conceitos como benefício recíproco (PIAGET, 1973) e
sustentação solidária (ESTRÁZULAS, 2004), também apontam a colaboração e a autonomia
como valores fundamentais para que ocorra a interação (VETROMILLE-CASTRO, 2007).

Embora as interações na coletividade venham sendo motivação para pesquisas que


visam o estudo das trocas e a sua contribuição para a emergência dos sistemas sociais
educativos, econômicos, biológicos, geográficos e linguísticos, até o momento nenhuma das
investigações que apontamos teve como objetivo a descrição de uma escala comum de
valores.

Portanto, por acreditar que a interação social é um aspecto importante para a


aprendizagem (VYGOTSKY,1991; PARREIRAS, 2005), e que ela se estabelece e se mantém
via co-valorização (PIAGET,1973), a descrição da escala comum de valores entre os agentes
dos agregados é o foco deste estudo.

Segundo Holland (2004) um agregado é a união de agentes adaptáveis, cuja conduta


de cada agente agregado depende das demais interações com os agentes componentes na rede.
Os agentes agregados podem agregar-se novamente para formar novos níveis hierárquicos.

Um agente em um sistema adaptativo complexo é um dos elementos que compõem o


sistema e cuja inter-relação com os demais é não-linear, caótica, suscetível às condições
iniciais e aos atratores estranhos, é também imprevisível, aberta, adaptativa, bifurcativa e
auto-similar (DAVIS; SUMARA, 2007). Um agregado é um conjunto de agentes, um
subsistema adaptativo complexo interagindo em outro sistema e com outros sistemas
complexos. Assim como (MARTINS, 2009), (VETROMILLE-CASTRO, 2007), (BRAGA,
2007) e (SILVA, 2008) consideramos o ambiente virtual de aprendizagem (AVA) como um
sistema complexo, e desejamos verificar se o AVA do E/LE onde investigaremos comporta-se
como tal. Da mesma forma observaremos se os agregados apresentam as características de um
sistema adaptativo complexo (SAC).

Segundo Davis e Sumara (2008), a capacidade de um sistema complexo para manter a


coerência está relacionada às semelhanças profundas de seus agentes. A redundância,
portanto, desempenha dois papéis principais: Primeiro, ela permite as interações entre os

2
agentes. Segundo, quando necessário, possibilita aos agentes a compensação das falhas dos
outros. É nesse sentido que a redundância é o complemento da diversidade2. Em um sistema
de produção de conhecimento, estes elementos devem co-existir em tensão produtiva.

Acreditamos que nos agregados do AVA, semelhantemente aos diversos grupos


sociais, há indivíduos que se vêem como co-valorizantes3 (PIAGET, 1973) e, portanto,
compartilham valores, o que se caracterizaria por uma relação de benefício recíproco
(PIAGET, 1973); e há ações de caráter desinteressado em que um mesmo par interage com
pares menos capazes, o que definiríamos como sustentação solidária4 (ESTRÁZULAS, 2004),
e que também envolve valores. Por isso entendemos que em cada agregado há valores
envolvidos em todas as interações: alguns são semelhantes (redundantes) e formarão uma
escala comum de valores entre os agentes do agregado, e outros são diferentes, e
correspondem à diversidade apontada por David e Sumara (2007) como o elemento que deve
co-existir com a redundância em tensão produtiva. A escala comum de valores fomentará as
interações, e a diversidade também presente promoverá uma maior adaptabilidade do
agregado.

Para Piaget (1973: 124), valor significa “as relações qualificadas diretamente
percebidas pelas consciências dos indivíduos”. A identificação valorativa em comum,
propulsora destas relações de sujeitos que compartilham valores foi definida por Piaget como
co-valorização, Holland (2004) a denominou como marbeteado5, o mecanismo que resultará
na união dos agentes adaptáveis.

“Los marbetes son rasgos importantes de los SCA que facilitan la interacción
selectiva y permiten a los agentes seleccionar a otros agentes u objetos, que
de otra manera serían indistinguibles. Las interacciones bien establecidas
basadas en marbetes proporcionan una base firme para la discriminación, la
especialización y la cooperación. Esto, a su vez, conduce a la emergencia
(aparición) de meta-agentes y de organizaciones que persisten incluso si sus
componentes están cambiando continuamente.” (HOLLAND, 2004)

A partir da identificação e seleção valorativa as trocas ocorrerão ora em ações de


benefício recíproco, ora em atitude solidária, os elementos ou agentes interagirão “em

2
David e Sumara alertam que uma maior redundância quando levada ao extremo, poderá diminuir a capacidade
de adaptação, pois uma redução na diversidade interna pode diminuir no sistema a capacidade de responder
rapidamente e de forma inteligente, simplesmente porque ela não tem uma gama suficiente de respostas diversas.
Em tais casos, mesmo pequenas perturbações podem provocar o colapso de um sistema.
3
“Chamaremos, pois, de „classe de co-valorizantes‟ todo conjunto de indivíduos que trocam seus valores
segundo uma escala comum”. “(…) é uma condição de enriquecimento mútuo dos indivíduos.” (PIAGET, 1973).
4
“(…) a sustentação solidária consiste numa concentração espontânea de esforços de caráter desinteressado em
trocas interindividuais que visam dar suporte ao processo de construir e manter uma ordem funcional e estrutural
num sistema aberto, durante os sucessivos estados de equilíbrio-desequilíbrio-reequilíbrio que caracterizam um
processo de complexificação, ou auto-organização sistêmica” (ESTRÁZULAS, 2004)
5
Etiquetado.

3
constante adaptação com o ambiente, à medida que buscam acomodação mútua para
otimizar possíveis benefícios que assegurem sua sobrevivência”. (BRAGA, 2009)

A auto-organização é uma das principais características dos sistemas adaptativos


complexos, é uma atividade espontânea que surge impulsionada pela desordem, fazendo com
que depois surja a ordem, construída pelas múltiplas interações entre os agentes. Se existisse
fronteiras entre os agregados, os agentes certamente cruzariam continuamente em idas e
vindas a muitas delas. Essa agregação em busca de adaptação levará em último momento à
emergência de novos padrões e comportamentos. (HOLLAND, 1995 apud PAIVA, 2009:
133).

Conforme Vetromille-Castro (2007), a emergência destas situações de troca de valores


qualitativos geralmente ocorre em função de algumas características sistêmicas: as regras de
baixo nível e a sensibilidade às condições iniciais.

Estes dois fatores convergem para comportamentos diversos nos agregados (SAC) do
AVA (sistema complexo). Podemos mencionar como regras de baixo nível aquelas relativas
ao conteúdo programático, aos planos de ensino, aos princípios pedagógicos, ao papel
assumido pelo professor no grupo, etc. As condições iniciais são as instruções e orientações
claras sobre o estudo, os comportamentos sistêmicos principiantes, o uso do ambiente
Moodle. No ambiente virtual de aprendizagem em estudo, as condições iniciais fariam com
que um novo comportamento emergisse a cada semana, devido à organização dos conteúdos
da disciplina estar estruturada por semanas, gerando um proceso de aprendizagem em que a
soma das partes é mais que o todo (MORIN,1994; BERTALANFFY,1968).

Dessa forma, a organização do conteúdo semanalmente nos mostra uma


“fragmentação” que é aparente, o que possibilita que adotemos o modelo fractal6 (PAIVA,
2004) a fim de entender o complexo dinâmico e adaptativo das interações a partir das quais
descreveremos a escala comum de valores de cada agregado.

A fractalidade teria relação com a dimensão fracionária e a complexibilidade do


grande número de variáveis e subsistemas envolvidos que dialogam e neles se constituem os
agregados. Uma destas variáveis fractais diz repeito às novas condições iniciais de cada
semana que faz com que o sistema e os subsistemas (agregados de agentes adaptáveis) se
reorganizem. Cada semana será vista como um fractal7, a partir da qual um novo
comportamento emerge.

6
O modelo fractal é um sistema dinâmico complexo, composto de subsistemas igualmente complexos e
dinâmicos. Porque é dinâmico, outras combinações imprevisíveis ocorrerão. Segundo Paiva (2004), a motivação
está diretamente conectada a contexto e afiliação. Ela poderá ser acionada por um elemento de contexto (ex. uma
viagem) ou por algum fator de afiliação (ex. estereótipo positivo em relação à língua). Outras configurações
seriam possíveis. Motivação poderia, por exemplo, estar conectada à interação.
7
A ideia de ver cada semana como um fractal emergiu durante a apresentação da tese de Vanessa Ribas Fialho
Condições iniciais em uma disciplina de graduação de língua espanhola a distância na I Jornada de Elaboração
de Materiais, Tecnologia e Aprendizagem de Línguas (JET@L).
4
É neste universo de pesquisa que analisaremos as interações de trinta alunos (de um
pólo) nos 16 fóruns semanais durante um semestre da disciplina de Língua Espanhola III de
uma licenciatura de espanhol como língua estrangeira a distância de uma universidade federal
brasileira. Para este artigo realizamos um recorte e mostraremos os resultados parciais obtidos
em dois fóruns observados.

1. A Pesquisa

Os dados foram coletados no ambiente Moodle (Ambiente Virtual de Aprendizagem -


AVA) em dois dos fóruns da quarta e da décima primeira semana da disciplina. Em nenhuma
etapa investigativa a pesquisadora interagiu com os indivíduos do corpus, pois o material
coletado foi de uma disciplina já encerrada. Neste artigo mostraremos o material escrito pelos
agregados de agentes que participaram dos fóruns de discussão: Contextualizando (semana
quatro) e Foro Videos-instrucciones (semana 11).

A análise foi qualitativa e descritiva. Nosso foco foi o processo sócio-interativo de


ensino-aprendizagem a partir do qual identificamos e descrevemos as escalas de valores de
cada agente e a escala comum de valores de cada agregado. O elemento quantitativo integra-
se ao qualitativo, e a interpretação investigativa relaciona a proposta metodológica e o
referencial teórico, que foi estruturado com base na Teoria da Complexidade, que acredita na
inseparabilidade dos elementos para a compreensão dos fenômenos.

1.2 A interpretação e descrição dos dados

1.2.1 Fórum semana 4: Contextualizando

O tema da semana quatro era La charla8, o objetivo, promover o contato e o diálogo entre
os alunos do mesmo semestre para que utilizassem os conteúdos das aulas. No fórum
Contextualizando os alunos deveriam assistir aos vídeos e discutir sobre o assunto com os
colegas. Neste fórum participaram 20 alunos mais a tutora, os agentes postaram 34
comentários. Entre os 33 comentários observamos nas postagens a emergência dos seguintes
valores9: ser colaborativo, ser autônomo, ter amigos, respeitar a diversidade, usar o lúdico, ser
fraterno, amar, ser criativo e ser feliz. Para este artigo selecionamos dois agregados do fórum
quatro e o único agregado do fórum 11.

1.2.1.1 Primeiro agregado: agentes (A20 e A03)

8
A conversa.
9
Ver na página 14 em 1.3.1 Tabela geral das escalas de valores dos agentes no fórum quatro.

5
Nos excertos acima10 observamos que entre os valores compartilhados por A03 e A20
emerge uma escala comum de valores formada por: usar o lúdico, respeitar à diversidade, ser
colaborativo e ser autônomo.

Com relação à autonomia, ela está presente como condição para que haja a interação,
conforme Agostinho (2003:6):

“Eles têm autonomia para orientarem suas ações de acordo com o que
apreendem de sua interação com o ambiente – o qual em grande parte é
formado pelos outros agentes. Em outras palavras, estes agentes estão livres
para colocarem em prática sua capacidade de aprendizado e de adaptação.”

Em resumo, segundo o mesmo autor, a autonomia é definida como “a faculdade do


indivíduo orientar sua ação com base em sua própria capacidade de julgamento”.
(AGOSTINHO, 2003:9). A autonomia e a colaboração eram portanto, valores esperados na
constituição das escalas de valores dos indivíduos deste grupo, visto que são professores em
formação. O valor colaboração possuia condições favoráveis à sua emergência, pois o tema da
semana era La charla, essa condição inicial, cujo objetivo é comunicativo e interativo aparece
na abertura do fórum quando encontramos a primeira chamada feita pela professora
pesquisadora “Después de haber discutido con los compañeros sobre los mensajes de los
videos, dejen un comentario en este foro” logo, seguida pela solicitação: “Discutan aquí los
mensajes difundidos en los videos trabajados en la clase” da mesma docente. Era uma das
ações pedagógicas da equipe docente. O valor colaboração surge na forma de benefício
recíproco, que segundo Vetromille-Castro (2007:186-187), juntamente com a autonomia,
fomenta “a participação dos indivíduos aumentando a energia colaborativa que enfrenta a
entropia sistêmica11”

10
É importante observar que os desvios de ordem linguístico-gramatical contidos nos excertos de aprendizes de
E/LE em processo interlinguístico não são o foco de nosso estudo para esta pesquisa, e não serão, portanto,
corrigidos e/ou analisados.
11
A entropia é a perda de energia, e é um fenômeno presente em todo e qualquer tipo de sistema, seja ele aberto
ou fechado, a diferença está na compensação, em sistemas fechados não há como recuperá-la, em um sistema
aberto há a possibilibidade de integrar a energia externa e compensar a que foi dissipada. A emergência do
sistema ocorrerá mediante as trocas integrativas e interrelacionadas entre os agentes internos e externos e entre
os sistemas.

6
1.2.1.2 Segundo agregado: agentes (A05, A23 e A29).

A29 e A05

A05

A 23 e A 29

Neste agregado também não temos a participação da tutora, a primeira mensagem postada
é a de A29 que oferece seu comentário valorativo sobre os vídeos. Neste fragmento
identificamos o respeito à diversidade e a valorização da criatividade como elementos
constitutivos da escala de valor de A29. A05 interage com o colega manifestando
concordância pelo respeito à diversidade, acrescenta a importância do uso do lúdico. A23 logo
abaixo menciona a amizade (ter amigos), o respeito à diversidade e os pontos semelhantes 12
(redundantes) existentes em meio à diversidade.

12
Conforme os excertos acima, observamos que os alunos quando faziam menção ao elemento semelhança,
justamente refletiam sobre esta maneira de pensar, de valorar igual, em resumo, são os valores. Em conceitos
jacobianos, temos a necessidade do outro, do diverso para a partir do outro constituir-nos em diferentes
7
Nos comentários dos três agentes do agregado acima, identificamos as seguintes escalas
de valores13: Na escala de A 05, os valores ser colaborativo e autônomo, respeitar a
diversidade e usar o lúdico. Na escala de A23, ser colaborativo e autônomo, ter amigos, usar o
lúdico e respeitar a diversidade. E em A29 os valores ser colaborativo e ser autônomo, ter
amigos, respeitar a diversidade e ser criativo. Essas escalas deram origem a uma escala de
valores comuns formada por: ser colaborativo, ser autônomo e respeitar à diversidade14.

Essa identificação recíproca de valores comuns é o que faz com que ocorram as
interações, segundo afirmam Cardoso, F.A. e Cabral, S.A. (apud HOLLAND, 2004 e
AGOSTINHO, 2003), “por intermédio de uma espécie de “rotulagem”, um indivíduo é capaz
de reconhecer com quem ele poderá obter benefícios mútuos, selecionando as interações
úteis”.

Podemos dizer que estes indivíduos são co-valorizantes (PIAGET, 1973) e co-
participantes, conforme menciona Goffmann (2011: 21), que é quando o indivíduo busca
participar do ritual de interação: “é como se a fachada15, por sua própria natureza, só pudesse
ser salva através de um certo número de formas, e como se cada agrupamento social
precisasse fazer suas escolhas dentro dessa única matriz de possibilidades”.

1.2.2 Fórum semana 11: Videos-instrucciones

O fórum da semana 11 teve sua criação motivada por uma obra de Júlio Cortázar que trata
das instruções que temos escutado no começo das aulas. Neste fórum o aluno deveria postar
sua vídeo-instrução (o tema era livre) em áudio, áudio-imagem e em texto e comentar as dos
colegas. O tema da semana 11 era el video e o objetivo era desenvolver a criatividade e a
habilidade da expressão oral e escrita. O fórum do pólo em estudo teve 12 postagens. A
mensagem deixada pela professora pesquisadora ao abrir o fórum foi: Después de haber
escrito el texto sobre la instrucción, van a grabarlo con algún recurso. Deben comentar sobre
la producción de por lo menos otro grupo.

Vemos que também neste fórum temos como uma das condições iniciais a solicitação de
interação, confirmando o objetivo pedagógico comunicativo do conteúdo programático da
disciplina (regra de baixo nível).

identidades que buscarão nos pares a identificação das unidades (pontos semelhantes, redundantes); “O eu é
impossível sem o tu”. “Uma intricada dinâmica em que todo falante, sendo uma realidade sociossemiótica, é ao
mesmo tempo único, singular, e social de ponta a ponta”. (FARACO, 2009: 136)
13
Ver na página 15 em 1.3.1.2 Tabela do agregado 2.
14
Consultar em 1.3.1.2.1 Matriz da escala comum de valores do agregado A05, A23 e A29. (Página 15)
15
“A fachada é uma imagem do eu delineada em termos de atributos sociais aprovados. O termo fachada pode
ser definido como o valor social positivo que uma pessoa efetivamente reivindica para si mesma através da
linha que os outros pressupõem que ela assumiu durante um contato”. (GOFFMANN, 2011:13)

8
1.2.2.1 Único agregado do fórum: agentes (A11, A15, A16 e A23)

As postagens iniciais de A16 são sobre a atividade desenvolvida, trazem informações e


orientações sobre o trabalho. De modo bastante colaborativo e autômo ela demonstra valores
bem pertinentes aos esperados que tenha uma professora, pois além dos já mencionados
(colaboração e autonomia), a estudante valoriza a tarefa de dar instruções, utilizando a
atividade para esclarecer sobre a pronúncia na língua estrangeira (esforça-se para explicar a
produção dos sons de acordo com a fonética), ainda valoriza a criatividade (com o uso do
lúdico em seu trabalho) e a diversão na aprendizagem de E/LE.

9
A16 interage várias vezes durante as postagens dos colegas no fórum, mostra-se solidária
com os companheiros de aula, elogiando os trabalhos que postaram e fazendo comentários
sobre o conteúdo, entretanto, neste fórum16, A16 não obtém resposta dos colegas. Poderíamos
considerar que A16 embora compartilhe os mesmos valores com os demais agentes do
agregado, não obtém o retorno por parte dos colegas do agregado, e isso poderá ocorrer por
dois motivos: é possível que no conteúdo da semana 11 A16 esteja em situação de menor
valorização frente ao grupo; ou simplesmente ocorra uma relação inversa neste sentido, A16
não recebe feedback neste fórum porque os companheiros a identificam como alguém que não
necessita de apoio, o que concluiram mediante o discurso positivo (e solidário) com respeito
aos trabalhos deles e as explicações claras que deu acerca de seu trabalho.

16
Destacamos que a situação vivenciada por A16 ocorre neste fórum e que a mesma não se repete nos demais
fóruns (como no fórum da semana 8, por exemplo). Visto que para este artigo fizemos um recorte de nosso
estudo, o nosso objetivo neste momento não será o de demonstrar diacronicamente como a relação interativa
entre - fóruns ocorre, e sim descrever a escala comum de valores a partir destas interações nos agregados.

10
A11

A 23

Nos excertos acima notamos que A23 e A11 trocam informações e elogios, nestas
mensagens destacamos como valores comuns a boa pronúncia na língua estrangeira (saber
aspectos linguísticos-comunicativos), e estudar elementos sócio-culturais (os hábitos de
higiene - lavar as mãos e fazer pão). É uma relação de benefício recíproco, que promove a
participação dos sujeitos envolvidos e também diminui o processo de entropia sistêmica,
assim como a interação de A16 também contribui para a emergência do sistema.

A 11

11
Nas duas postagens anteriores fica explícita a relação de sustentação solidária
primeiramente observada mediante a interação de A11 com A23, e a dívida contraída por A23
que fomentou a resposta a A11 e assim a relação de benefício recíproco. Este valor virtual
colaborativo foi gerado por uma “interação creditada” (PIAGET, 1973), e poderá permanecer
até mesmo depois que A23 pague sua dívida.

No excerto acima, temos novamente outra ação de A16, esta de caráter solidário; e abaixo
a última postagem do fórum, que é de A15, em que o aluno valoriza a originalidade e o
trabalho de dar instruções, comenta sobre dois trabalhos de colegas que não foram postados
no fórum. As colegas não participaram deste fórum. Um comportamento solidário para com
quem não está presente se caracterizará também como sustentação solidária, pois ainda que as
colegas não participem do fórum, elas poderão realizar a leitura das mensagens. A
colaboração e a autonomia também estão presentes pois o agente interage com o agregado,
oferecendo na troca valorativa idéias e sugestões.

Este fórum apresentou um comportamento sistêmico17 diferente com relação ao fórum da


semana 4, o número de postagens diminuiu de 33 para 12, entretanto, a interação foi muito
maior.

Referente às escalas de valores dos agentes do agregado do fórum 11, obtivemos a


seguinte matriz: em A11 (ser colaborativa e autônoma, dar instruções e saber aspectos
linguísticos-comunicativos, estudar elementos sócio-culturais). Na escala de valores de A16
encontramos ser colaborativa e autônoma, dar instruções, saber aspectos linguísticos-

17
Este comportamento sistêmico corrobora o conceito de „entropia socio-interativa‟ (VETROMILLE-
CASTRO, 2007), demonstrando claramente os dois momentos: no primeiro fórum, o de força entrópica máxima
(muitas mensagens e pouca interação), no segundo fórum „o de rendição sistêmica‟ (poucas mensagens e mais
interação).

12
comunicativos, estudar elementos sócio-culturais, ser criativa, usar o lúdico. A escala de A23
constitui-se pelos valores ser colaborativo e autônomo, dar instruções, saber aspectos
linguísticos-comunicativos, estudar elementos sócio-culturais. Na escala de valores de A15
temos ser colaborativo e autônomo, dar instruções, estudar elementos sócio-culturais e ser
original.

Diante destas escalas, destacamos a escala comum de valores do agregado: ser


colaborativo e autônomo, dar instruções, estudar elementos sócio-culturais.

1.3 Discussão dos dados

Verificamos que o grupo de espanhol como língua estrangeira (E/LE) em ambientes


virtuais de aprendizagem (AVA) comporta-se como um sistema adaptativo complexo (SAC)
de acordo com a definição de Larsen-Freeman e Cameron (2007), Larsen- Freeman (1997) ,
Van Lier (2004) e Paiva (2002) porque nele identificamos as seguintes características:

- Abertura e adaptabilidade: a combinação de experiências vividas por cada agente é


compartilhada e utilizada pelos agregados de maneira auto-organizativa e adaptativa,
sobrevivendo às perturbações do ambiente (atratores estranhos);

- A sensibilidade às condições iniciais, pois foi a partir da solicitação das tarefas semanais
e do conteúdo dado anteriormente que ocorreram ou não as postagens.

- As interações fizeram com que o todo fosse mais que a soma das partes (MORIN, 1994).

Com respeito aos valores e à escala comum de valores:

- As escalas de valores18 dos agentes foram identificadas e descritas tanto nas relações de
sustentação solidária, como nas de benefício recíproco, porém, nas de benefício recíproco foi
possível descrever uma escala comum de valores19 entre os agentes de cada agregado em
estudo;

- A sustentação solidária ocorreu de duas formas: o agente a prestava de maneira coletiva


(no agregado), direcionada a todos agentes ou a algum agente em especial;

Também observamos que há valores que emergiram favorecidos pelas condições iniciais,
como os valores respeitar à diversidade (no fórum da semana 4) e dar instruções (no fórum
da semana 11). Pois a cada semana novos conteúdos , atividades e um fórum era aberto.

18
Ver as escalas de valores do grupo (os 30 estudantes de E/LE) e dos agregados nas páginas seguintes em: -
Tabela geral das escalas de valores dos agentes no fórum quatro; - Tabela do agregado1 agente A03 e A20; -
Tabela do agregado 2 agentes A05, A23 e A29. Consultar as escalas de valores do grupo (os 30 estudantes de
E/LE) e dos agregados no fórum 11 em: - Tabela geral das escalas de valores dos agentes no fórum 11; - Tabela
do agregado1 agentes A11, A15, A16 e A23;
19
Ver a matriz da escala comum de valores dos agregados de agentes no fórum quatro e no fórum 11 na página
14 e 15.

13
1.3.1 Tabela geral das escalas de valores dos agentes no fórum quatro.

1.3.2 Tabela geral das escalas de valores dos agentes no fórum 11.

1.3.1.1 Tabela do agregado 1 – as escalas de valores dos agentes A03 e A20 no fórum
quatro.

1.3.1.1.1 Matriz da escala comum de valores do agregado A03 e A20 (acima).

A03 A20

Escala Comum de valores Ser colaborativo; ser autônomo e respeitar à diversidade.

14
1.3.1.2 Tabela do agregado 2 – as escalas de valores dos agentes A05, A23 e A29 no
fórum quatro.

1.3.1.2.1 Matriz da escala comum de valores do agregado A05, A23 e A29 (acima)

A05 A23 A29

Escala Comum de valores Ser colaborativo; ser autônomo e respeitar à diversidade.

1.3.2.1 Tabela do agregado – agentes A11, A15, A16 e A23 no fórum 11.

1.3.2.1.1 Matriz da escala comum de valores do agregado A11, A15, A16 e A23 (acima).

A11 A15 A16 A23

Escala Comum de valores Ser colaborativo; ser autônomo; dar instruções e estudar elementos
sócio-culturais.

3. Considerações Finais

O ambiente virtual de aprendizagem de E/LE é um sistema complexo e seus agregados


formados por agentes adaptáveis comportam-se como um sistema adaptativo complexo
(SAC). Os agentes co-valorizantes (PIAGET,1973) fomentaram a formação dos agregados. A
partir das trocas destes agentes foi possível identificar e descrever uma escala comum de
valores em cada agregado, bem como as escalas de valores de cada agente.

15
A escala comum de cada agregado apresentou outros valores além dos valores „ser
autônomo‟ e „ser colaborativo‟20. A colaboração e a autonomia são valores encontrados nas
escalas de valores de todos os agentes que interagiram nos fóruns. As interações e a formação
dos agregados também foram beneficiadas pelas condições iniciais que possibilitaram que um
novo comportamento sistêmico emergisse diante do caráter fractal e portanto atrator de cada
semana ao apresentar um novo conteúdo. As regras de baixo nível do conteúdo programático
com enfoque comunicativo e a estrutura em fóruns semanais também fomentaram este
processo. Mas a formação dos agregados somente ocorreu entre os agentes co-valorizantes,
que identificaram no outro um ou mais valores em comum e a possibilidade de compartilhar
trocas em prol de um benefício mútuo.

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