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TCC Final - CD
TCC Final - CD
BOA VISTA, RR
2016
GERAULY DUARTE VASCONCELOS
BOA VISTA, RR
2016
GERAULY DUARTE VASCONCELOS
_______________________________________
Prof. Dr. Nelvio Paulo Dutra Santos
Professor do Curso de História
______________________________________
Prof. Dr. Américo Alves de Lyra Junior
Professor do Curso de Relações Internacionais
_____________________________________
Prof. Dr. Reginaldo Gomes de Oliveira
Professor do curso de História
Dados Internacionais de Catalogação na publicação (CIP)
Biblioteca Central da Universidade Federal de Roraima
CDU – 911.3:32(811)
AGRADECIMENTOS
Nessa monografia analisei as medidas tomadas pelo governo militar brasileiro em relação ao
extremo Norte da Amazônia, no período de 1967 a 1977. Nas mentalidades dos militares, o
caráter estratégico dessa região que durante séculos foi ameaçada pelos países vizinhos e por
isso tinha que ser integrada a sociedade nacional brasileira. Apoiados num pensamento
geopolítico construído pela Escola Superior de Guerra (ESG), os militares deslocaram uma
grande estrutura militar e administrativo visando assegurar o domínio desse espaço frente às
nações que fazem fronteira com a Amazônia. A construção das rodovias BR 174 e 401
permitiu acesso às diversas regiões do país e ligação com a República Cooperativista da
Guiana e República da Venezuela, garantindo, de acordo com o pensamento dos militares, a
segurança e a soberania nacional. Nesse TCC, a abordagem foi fundamentada
necessariamente na Geopolítica, ramo da História Política que estuda os espaços geográficos
para dar suporte à compreensão dos principais fatores para a construção de grandes obras
estruturantes na região amazônica.
In this monograph analyzed the measures taken by the Brazilian military government in
relation to the extreme north of the Amazon, in the period from 1967 to 1977. In the
mentalities of the military, the strategic importance of this region for centuries was threatened
by neighboring countries and so had to be integrated into the Brazilian national society.
Supported a geopolitical thought constructed by the Superior School of War (ESG), the
military moved a large military and administrative structure to ensure that the domain space
facing the nations bordering the Amazon. The construction of the BR 174 and 401 highways
allowed access to the various regions of the country and link to the Cooperative Republic of
Guyana and the Republic of Venezuela, ensuring, according to the thinking of the military,
security and national sovereignty. TCC that the approach was necessarily founded on
Geopolitics, Political History branch of that studies the geographic areas to support the
understanding of the main factors for the construction of large structural works in the Amazon
region.
Introdução.............................................................................................................. 12
1. O Pensamento Geopolítico Brasileiro.................................................................. 15
1.1 A geopolítica brasileira e a segurança nacional....................................................... 15
1.2 A geopolítica de Integração Nacional de Golbery Couto e Silva e Carlos de Meira
Mattos...................................................................................................................... 22
2. Os Militares no Poder: A construção de estradas na Amazônia....................... 29
2.1 A geopolítica brasileira na Amazônia...................................................................... 29
2.2 Antecedentes históricos: a construção de estradas na Amazônia...............................34
2.3 O Programa de Integração Nacional – PIN................................................................39
3. A Construção das Estradas Federias 174 e 401 no Extremo Norte da
Amazônia...................................................................................................................46
3.1 As primeiras tentativas de construção de estradas no Território Federal de Roraima46
3.2 Segurança Nacional e Desenvolvimento interno e externo: a construção das estradas
federais 174 e 401.......................................................................................................50
3.2.1 A resistência Waimiri–Atroari....................................................................................62
3.2.2 Os resultados da construção das estradas federais 174 e 401....................................70
4. Considerações finais.................................................................................................78
Referências bibliográficas........................................................................................80
12
Introdução
1
Para Rémond (2003, p. 21) “nas sociedades contemporâneas, a política organiza-se em torno do Estado e
estrutura-se em função dela: o poder do Estado representa o grau supremo da organização política e também seu
principal objeto de competição”.
14
De acordo com Costa (2013), a teoria geopolítica que o estado nacional se apropriou
para garantir sua segurança interna e externa surgiu em 1905, com o jurista e burocrático
sueco Rudolf Kjéllen (1846-1922), mas foi o geógrafo e alemão F. Ratzel (1844-1904) que é
considerado o inspirador da corrente geopolítica, pois seus estudos sobre em relação Estado-
espaço rapidamente se espalharam pelo mundo “civilizado” principalmente nos centros de
pesquisar militares.
2
Às revoluções políticas, o advento da democracia, as lutas partidárias, a I e II Guerras Mundiais e os confrontos
entre ideologias políticas levaram os novos Estados Nacionais ampliar seu poder sobre a sociedade. (RÈMOND,
2013).
16
De acordo com Santos (2013), na primeira metade do século XX, nomes como: Sir
Halford J. Mackinder3 (1861-1947), e Karl Haushofer4 (1869-1946) tornaram-se
mundialmente conhecidos pelos trabalhos desenvolvidos durante a I e II Guerra Mundial.
Mas, foi no período da Guerra Fria, que surge no cenário internacional e no campo da
geopolítica, o teórico político Nicolas Spykman5. Santos, salienta que “as ideias do professor
influenciaram diretamente diversas correntes e ações geopolíticas na America Latina,
principalmente no Brasil, Chile, Argentina e no México” (SANTOS, 2013, p. 55).
O conceito sobre o qual se fundamenta o pensamento geopolítico é o Estado –
Nação, este, “é concebido como um grupo de pessoas unidas por laços naturais e por tanto
eternos – ou pelo menos existentes ab immemorabili – e que, por causa desses laços se torna a
base necessária para a organização do poder sob forma de Estado nacional” (BOBBIO, 1998
p. 796). Logo, a geopolítica se faz presente e necessária frente à necessidade de resguardar a
integridade da Nação. De acordo com Atencio (1975);
3
“Mackinder, geógrafo e professor de Oxford, autor de O pivô geográfico da história (1904), adquiriu
notoriedade mundial, incluindo o conceito de “Heartland”. Este, situado na região da Eurásia, seria o centro
geopolítico do mundo, a “Ilha do Mundo” (SANTOS, 2013, p. 56).
4
General e professor alemão teve grande influência na política expansionista alemã na II Guerra Mundial.
5
Professor de Ciência Política da Universidade de Yale (EUA).
17
Vargas foi apoiado por militares que ganharam espaço na superestrutura estatal, logo suas
ideias se constituíram como estratégia de defesa da nação, pois estavam preocupados com a
segurança de nossas fronteiras. Apoiados nas ideias de Ratzel6 buscaram desenvolver políticas
gerais e territoriais que garantissem o pleno domínio do território nacional.
Em seus estudos sobre as principais obras dos geopolíticos brasileiros, Costa (2013),
salienta que estes absorveram as ideias geopolíticas desenvolvidas na Europa, que
privilegiavam a necessidade de unidade nacional-territorial, ao nível de ambiente ideológico
interno. Essa ideia do domínio integral do território sobre a tutela do Estado era defendido
pelo conservadorismo nacional. Como afirma Costa (2013, p. 185), “o pensamento
conservador brasileiro, desde o período colonial, passando pelo o Império, é de certo modo
até os dias atuais, sempre tendeu a expressar um conceito de nação articulado com o
território”. Esse pensamento, segundo Costa (2013), era representado por intelectuais como
Alberto Torres (1865-1917) e Oliveira Viana (1883-1951), ambos de caráter antidemocrático,
que viam como solução para o domínio integral do território brasileiro, a centralização do
poder político e da gestão territorial sob o comando do Estado.
No Brasil, podemos identificar como os precursores das ideias geopolítica, atuantes
desde os anos de 1920, 1930 e 1940, Pandiá Calógeras (1870-1934), Everardo A. Backheuser
(1879-1951), Mário Travassos (1891-1973) e Lisias Rodrigues (1896-1957). Mas, o
pensamento geopolítico brasileiro amadureceu com a Escola Superior de Guerra, fundada em
1949, onde podemos apontar dois teóricos de grade expressão como os generais Golbery do
Couto e Silva (1911-1987) e Carlos de Meira Mattos (1913-2007), estes vão produzir seus
trabalhos voltados para a segurança, integração e o desenvolvimento do Brasil.
Como veremos a seguir, as ideias apresentadas pelos geopolíticos brasileiros
buscavam fortalecer o Estado nacional, dessa forma poderia conduzir políticas eficientes
voltadas para nossas fronteiras, além de neutralizar o avanço da República da Argentina,
garantindo ao Brasil o pleno domínio do continente sul americano.
6
Conforme Costa (2013, p. 37-38), o Estado na ótica de Ratzel, pode formular e executar políticas gerais e
territoriais. No primeiro caso o território é tomado a priori, constituindo-se numa base, onde serão desenvolvidas
ações. Já as políticas territoriais consistem na apreensão do território como elemento fundamental, exigindo do
Estado e do povo relações de domínio, sendo as ações necessariamente desenvolvidas como políticas não
territoriais como: as políticas econômicas e sociais, sem as quais a política territorial torna-se unicamente
política de expansão.
18
7
Segundo Costa (2013, p.197), “no campo intelectual, a geopolítica de Travassos sofreu uma influência de
Mackinder, com sua teoria de poder terrestre, [...]. Para Travassos, o controle da Bolívia, região – pivô do
continente, antagonismo ao Brasil o domínio político econômico sul-americano”.
19
[...] que se complete uma construção de uma rede ferroviária capaz de carrear para
os portos do Atlântico, Santos, Paranaguá, São Francisco, Porto Alegre e Rio
Grande, as influências platinas sobre essas bacias do rio Uruguai, Paraná, Paraguai.
Posteriormente, essa rede de trilhos chagaria a Santa Cruz de La Sierra, e daí ao
Pacífico. Enfim, o general em termos de vertebração de nossa massa continental
sugere ampla conjugação dos sistemas ferroviários, fluvial e aéreo, além de propor
um sistema aéreo interamericano, capaz de superar, temporariamente, as
dificuldades de trânsito oferecidas pelos obstáculos geográficos (MATTOS, 1975 p.
52).
8
Para Lewis Tambs, a América Latina comporta dois pólos estratégicos: o nexo andino do “maciço boliviano do
Charcas” e o mar “fechado do caribe” (TAMBS apud SANTOS, 2004, p. 83).
20
p. 53, COSTA; 2013, p. 192). Lisias propõe a redivisão territorial do país, só que neste caso,
com a criação de territórios federais na porção setentrionais dos (Estados de Mato Grosso,
Pará e Amazonas). Segundo Mattos (1975, p. 53), “Lisias se mostrava particularmente
preocupado com o futuro de nossas fronteiras do norte, nas áreas de confinamento com países
europeus (França, Holanda e Inglaterra)”. Pois, esses países tinham o caráter expansionista,
principalmente a Alemanha Nazista. Salienta que a redivisão do território nacional deveriam
ser seguidas exclusivamente pelo poder central.
Conforme o pensamento de Rémond, “entre os fatores políticos que concorrem para
moldar uma sociedade e influenciar o curso dos acontecimentos, estão às instituições”
(RÉMOND, 2003, p.448). No final da década de 1940, as ideias difundidas pelo professor
Everaldo Backheuser e o general Mário Travassos influenciaram toda uma geração de
geopolíticos militares e civis, que fundaram em 1949, a Escola Superior de Guerra (ESG)9.
Esta instituição fundou as bases do campo da geopolítica nacional, possibilitando o
surgimento de uma doutrina militar brasileira, que formulou a Doutrina de Segurança
Nacional.
Portanto, para entendermos a condução do Estado brasileiro nas áreas de segurança e
desenvolvimento do território nacional, devemos conhecer ideias sistematizadas do General
Golbery de Couto e Silva (1911-1987), considerado o mago das decisões políticas,
continuador de um tipo de pensamento militar inaugurado por Backheuser e Travassos, que
em sua obra Conjuntura Política Nacional: o Poder Executivo e Geopolítica do Brasil (1981),
o general se dedica nos primeiros capítulos aos estudos de Thomas Hobbes (1588 – 1679),
autor de Leviatã (1651)10.
Base de seu pensamento, a obra de Hobbes aponta o papel do Estado Moderno para
garantir a segurança do cidadão. Segundo o general, “o Estado Soberano, surgido das fontes
profundas do Medo para prover a segurança individual e a coletiva da Terra, passaria a
afirmar sua vontade onipotente sobre o destino de todos os súditos que haviam criado”
(SILVA, 1981, p. 7). O mesmo afirma “que a insegurança do cidadão dentro da nação e a
insegurança de uns Estados em face dos outros, a visão [...] da guerra civil ou guerra
subversiva ou guerra internacional – dominam o mundo de nossos dias” (SILVA, 1981, p. 9),
conforme Golbery, o Medo levaria alguns governos a defenderem o Estado autoritário e a
centralização do poder como forma de garantir a segurança da Nação.
9
É constituída através do decreto presidencial, assinado por Eurico Gaspar Dutra, em 20/08/1949. Sua
constituição extrapola o âmbito militar, contemplando civis em seus cursos de formação geopolítica.
10
Publicado em 1651, Leviatã, ou “a matéria, a forma e o poder de um Estado Eclesiástico e civil.
21
No Brasil não vai ser diferente, o general como os outros geopolíticos citados,
defendem que só um governo de caráter autoritário e centralizador poderiam garantir a
sobrevivência da Nação. Golbery (1981), afirma que era necessário construir uma estratégia
para a defesa do Estado-nacional, apontando a questão nacional como enfoque principal. Para
o autor, só um Estado forte, centralizador e realizador das “aspirações nacionais” poderiam
colocar o Brasil entre as grandes potências mundiais. Esse pensamento estava articulado no
binômio “Segurança e Desenvolvimento”, que para conduzir os interesses do Estado
brasileiro, formulou o conceito de Segurança Nacional.
Entendido é claro – na sua mais ampla e ativa acepção permeada aos poucos o
domínio todo da política estatal, condicionada quando não promovendo ou
determinando todo e qualquer planejamento, seja da ordem econômica, seja da
natureza social ou política, para não falar dos planos propriamente militares, tanto na
guerra como na paz. (SILVA, 1981, p.23.)
Para atender os objetivos propostos pelos militares na DSN, deveria haver uma “[...]
integração crescente do grupo social que compõe a Nação, tanto do ponto de vista político
como psicossocial e econômico, é também condição fundamental da própria sobrevivência do
Estado” (SILVA, 1981, p. 168). Mas adiante, diz a mesma fonte “à sobrevivência, essencial é
ainda a manutenção do território, base física do Estado, uma vez que sua mutilação redundará,
em qualquer caso, em prejuízo da integração e em redução do bem-estar, da prosperidade e
dos prestígios nacionais” (p. 169). Para o general, “nossa geopolítica, deverá ser, pois, ainda
uma geopolítica de expansionismo interior, de integração e valorização territoriais” (SILVA,
1981, p.170).
Golbery mostrava-se preocupado com os problemas apresentados no domínio do seu
espaço geográfico, desde o período colonial, passando pelo Império até a República. As
22
nossas fronteiras não apresentavam um sistema de integração e defesa. Logo, para garantir a
segurança do Estado, era necessário apresentar um projeto que garantisse a articulação do
território nacional e o seu desenvolvimento. No governo militar (1964-1985), vários projetos
foram elaborados para a região amazônica, onde podemos citar dois pela sua envergadura e
alcance do ponto de vista estratégico, O Programa de Integração Nacional (1970) e o II PND
– Plano Nacional de Desenvolvimento (1974-1979).
11
Conforme Mattos (1977, p. 82), Castelo Branco (1964-1967), ao assumir o poder, já contou com o cabedal de
estudos sobre política e segurança nacional da Escola Superior de Guerra, exercitada durante quatorze anos no
cassarão do Forte São João; [...] onde foi formulado uma metodologia de racionalização e planejamento da
política nacional. Castelo teve que aplicar a metodologia da ESG no equacionamento de nossa política.
12
Segundo Miyamoto (1995, p. 96), “[...] em 1966, foi elaborado um documento “secreto” de 25 páginas pela
ESG em que se colocava o Brasil como satélite privilegiado dos Estados Unidos na América Latina. Essa
estratégia de vinculação com os Estados Unidos é encontrada não só em Golbery do Couto e Silva como também
no teórico Nicolas j. Spykman”.
13
Segundo Becker (1990, p. 11), a fronteira é, pois para a nação, símbolo e fato político de primeira grandeza,
como espaço e projeção para o futuro, potencialmente alternativo. [...] A potencialidade econômica e política de
fronteira, por sua vez, torna-se uma região estratégica para o Estado, que se empenha em sua rápida estruturação
e controle.
23
14
De acordo com Meira Mattos, o conceito de geopolítica: “é a política aplicada aos espaços geográficos” (1980,
p. 160).
25
das dificuldades que a Amazônia apresentava e os desafios que o Estado iria enfrentar como:
a imensidão do território, florestas, pântanos, rios, planícies etc.; mas se mostrava otimista
nesse momento da história do Brasil, pois só respondendo e superando esses obstáculos
poderíamos ambicionar nosso espaço entre as grandes potências mundiais.
Para Costa (2013), o Brasil possui potencialidades, mas uma maior fragilidade
encontra-se justamente nas fronteiras desguarnecidas do poder militar e uma população que
desconhece à importância das suas fronteiras para a nação. Logo, reverter esse quadro são os
principais objetivos dos geopolíticos brasileiros, que apontavam como solução a
interiorização no sentido Norte – Sul e Leste – Oeste15, como aponta Mattos (1980):
(Conforme mapa 02).
15
Conforme Mattos (1980, p 146) A interiorização, a nossa “Marcha para Oeste”, que foi representado no
talento de Cassiano Ricardo, onde conta a epopéia dos bandeirantes que realizaram há mais de 200 anos, em
termos de fronteiras políticas, e que as gerações que sucederam não conseguiram em termos de fronteiras
econômicas. Agora, a estratégia deverá corresponde aos meios técnicos e científicos que estão atualmente à
disposição dos projetos políticos e econômicos.
26
Essa orientação do poder central de integrar a região amazônica com todo território
nacional, num processo patrocinado pelo Estado, estava de acordo com a política adotada pela
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e os Estados Unidos (EUA) que
desenvolveram o pleno domínio de sua massa continental transformando-se ambas as nações
em potências econômicas, políticas e militares, conforme a citação de Mattos (1980):
Mattos (1980) assevera que após dominar seu território, os EUA e URSS criaram
pólos de desenvolvimento nos pontos estratégicos do país. Para ele “enfrentar a problemática
de conquista de seu próprio território, de integrar sua porção marítima e continental, mostram-
27
Essa manobra mais ampla, buscando articular essas três frentes até os limites do
território amazônico, tinha como objetivo segundo Mattos (1980) criar áreas pólos que
atuariam como verdadeiros dínamos “[...] que produzirão irradiações de desenvolvimento
28
A Amazônia brasileira representa toda a fronteira Norte do país. Essa imensa área de
floresta abrange, além do Brasil, Peru, Bolívia, Equador, Colômbia, Venezuela, Suriname,
Guina e Guina Francesa (Estado Ultramarino da França), com a maior parte da floresta
presente no Território Brasileiro. Segundo Becker (1990), a Amazônia sul-americana
corresponde a 1/20 da superfície terrestre, 2//5 da América do Sul, 3/5 do Brasil, essa
fantástica massa florestal de 6 500 000 Km², mais da metade do território nacional e 63,4% da
Amazônia sul-americana. Devido sua localização estratégica é disputada desde o século XVI
até o XX pelas grandes potências europeias pelo seu potencial econômico e estratégico.
Desde o século XVII até a chegada dos militares no poder em 1964, várias tentativas
foram feitas para ocupar os “espaços vazios da Amazônia” pelo Estado. Conforme já
mencionado, “região estratégica, a Amazônia ocupava um lugar especial na mentalidade dos
militares brasileiros, há décadas. A antiga ideia de sua integração à economia e à vida
nacional vinha sendo defendida por inúmeros geopolíticos, principalmente após a década de
1920” (SANTOS, 2013, p. 82). No entender dos estrategistas militares como Golbery de
Couto e Silva e Carlos de Meira Mattos, uma política bem formulada na área de transportes
garantiria uma logística eficiente para as futuras ações do Estado na região amazônica.
No governo militar (1964-1985), amparados em princípios geopolíticos de segurança
nacional e desenvolvimento, os militares defendiam uma política de integração nacional da
Amazônia, ao ecúmeno nacional. Como medidas para cumprir seus objetivos deram a criação
do Programa de Integração Nacional – PIN – publicado pelo Decreto-Lei nº 1.106, de
16/06/1970, tendo como principal objetivo a integração física da nação, através de
construções de rodovias. Neste capítulo conheceremos as ações desenvolvidas pelo Estado
para construir estradas na Amazônia brasileira.
Maranhão e Grão-Pará16, onde passará ter autonomia como nova unidade administrativa
separada do Brasil e ligada diretamente a Lisboa. Essa medida fortaleceu as imensas
fronteiras do norte da América lusitana, facilitando a conquista e colonização da Amazônia.
Nesse período o território amazônico já constituía um amplo espaço para o
desenvolvimento da Coroa portuguesa. Conforme Nádia Farage (1991), desde o século XVII
os portugueses através de entradas e bandeiras, em busca dos índios fugidos (descimentos e
resgates)17 e das especiarias (drogas do sertão), penetravam no sertão em direção à Amazônia.
No entanto, a região estava sobre o domínio da Coroa Espanhola conforme o Tratado de
Tordesilhas18, segundo Oliveira (2003) o que facilitou a exploração dos lusitanos sem
interferência dos espanhóis, foi o interesse espanhol pelas minas de ouro e prata no Peru e
México, seguido com a unificação das coroas19 que integrou Portugal a União Ibérica. Estes
dois pontos possibilitaram um processo de ocupação pacífica do vale amazônico pelos
portugueses, permitindo o alargamento das fronteiras, mas não garantia por definitivo sua
posse.
16
“Criado por carta régia de 13 de junho de 1623, pelo rei Felipe III” (OLIVEIRA, 2003, p. 60).
17
Segundo Farage (1991), a expansão portuguesa na Amazônia, se deu pelo esgotamento do fornecimento de
mão de obra escrava indígena nas áreas próximas a Belém, se estendendo até o século XVIII, já atingindo ao
Norte o rio Negro e Branco.
18
Assinado em 07 de junho de 1494, o Tratado daria aos portugueses todas as terras à 370 léguas das ilhas de
Açores e Cabo Verde, que demarcou o litoral brasileiro por meio de um meridiano que passa por Belém (ao
Norte) e Laguna (ao Sul), dando ao Império português o domínio de quase toda bacia do Atlântico sul, além de
parte de terra firme a leste.
19
No período histórico de 1580 até 1640, quando da morte do Cardeal Dom Henrique (1580), rei de Portugal,
sem deixar herdeiros diretos, o reino passou para o poder de Felipe II, rei da Espanha. A união entre as duas
Coroas (portuguesa e espanhola) ampliou o poder político ibérico nas terras do Novo Mundo e despertou reação
agressiva entre as outras nações européias, que disputavam o comércio internacional. (OLIVEIRA, 2003)
31
da uti possidetis20 como critério demarcatório. Essa vitória lusitana se deve às medidas
tomadas por ações do ponto de vista geopolítico do ministério pombalino, como aponta
Mattos (1980):
Mapa 04: Território Luso - brasileiro em 1759, após assinatura do Tratado de Madri.
20
O critério estabelecido pelo “Uti possidetis” permitiu a definição do novo marco territorial entre Portugal e
Espanha. Onde garantia a posse da terra quem já estivessem estabelecidos colonos portugueses.
32
21
A chegada da família real no Brasil (1808) buscou tirar o poder das forças regionais, adotando medidas
modernizadores, essas acompanhadas de uma maior centralismo e poder político do novo governo. (COSTA,
1989, p. 34).
22
Para Barros (1995, p. 56-57) “com a grande crise da coleta de borracha, que se inicia em torno de 1920[...], a
pecuária do alto rio Branco vai perder o estimulo de mercado que causara sua expansão desde 1870. [...] essa
crise, levou a região do rio Branco migrar para a mineração, setor que passar ser o principal produto de
exportação, deixando a pecuária para o segundo plano.
33
Essa vitória à Inglaterra da área na região do rio Tacutu e Mau, em disputa ficou
conhecido como o caso do Pirara.
Para Mattos (1980) a Constituição de 1937, conhecida como constituição do Estado
Novo, rompe com a iniciativa estadual, e abriu caminho para a criação dos Territórios
Federais, sempre defendida pelos geopolíticos e intelectuais brasileiros, principalmente na
extensa região amazônica. Conforme o mesmo autor, a criação dos Territórios Federais.
Invoca no artigo 6.º, o principio da segurança nacional estipulado: “a União poderá criar, no
interesse da defesa nacional, com partes desmembradas dos Estados, territórios federais, cuja
23
Conforme Costa (2013), no governo de Getúlio Vargas como parte do reaparelhamento do Estado foram
criados: Em 1931, o Conselho Nacional de Estatística, e em seguida o Serviço Geográfico e Histórico do
Exército 1934 e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em 1938 com objetivo de promover estudos dos
problemas históricos do Brasil.
24
Questões fronteiriças com França e Bolívia foram resolvidos pelo Presidente da Confederação Suíça (1900), e
pelo Tratado de Petrópolis (1903), favorável ao Brasil, Já a decisão por arbitragem do Rei Vitório Emanuel III
(1904), conhecido com Pirara, deu vitória a Inglaterra de uma grande área do rio Tacutu e Mau..
34
administração será regulada em lei especial” (MATTOS, 1980, p. 69). Assegurado por lei, o
governo abria-se para uma intervenção estatal na Amazônia.
No inicio da II Guerra Mundial (1939-1945), o Brasil manteve uma política distante
das grandes potências envolvidas na guerra, mas com a assinatura dos “Acordos de
Washington em (1942)”, o país decide por uma política de alinhamento com os Estados
Unidos:
25
Decreto-Lei nº 5.812, de 13 de setembro de 1943.
35
urbanos era uma preocupação dos governantes brasileiros, desde o período colonial até o
presente. De acordo com Maull (1960):
Quem tem os meios de comunicação de um país em seu poder domina o país. [...] As
estradas são tão importantes para os Estados como as fronteiras, os meios de
comunicação constituem o sistema nervoso do Estado, daí sua importância
(MAULL, 1960 apud MIYAMOTO 1995, p. 146).
[...] em 1858, quando se inaugurou a Estrada de Ferro D. Pedro II, Cristiano Otoni,
alertou as autoridades sobre a necessidade de se elaborar um Plano Nacional de
Viação. [...] plano que possibilitasse ocupar todo território nacional, [...] se
estendendo tanto pelo lado da fronteira paraguaia, como atingindo também a
fronteira da Guiana Francesa” (MIYAMOTO, 1995, p. 150).
O fim do Estado Novo em 1945, conforme Santos (2013, p. 74) “não interrompeu a
idéia de ocupação da Amazônia, patrocinado pelo governo federal”. O retorno de Vargas ao
poder (1951-1954)26 se constrói as bases da integração e o desenvolvimento da Amazônia,
após o governo aprovar a lei da criação da Superintendência do Plano de Valorização da
Amazônia – SPEVEA27.
26
No governo de Getúlio Vargas (1951-1954) o presidente criou a Amazônia Legal prevista no artigo 199 da
Constituição de 1946 é regulamentada pela Lei 1.806 de 1953 que constitui o território segundo critérios
político, fisiográfico e geográfico envolvendo os Estados do Pará e Amazonas, o norte do paralelo 16° do Estado
de Mato Grosso, norte do paralelo 13° do Estado de Goiás, oeste do meridiano 44° do estado do Maranhão e os
Territórios Federais de Guaporé, Rio Branco e Acre.
27
Conforme Bahiana, A Constituição Federal de 18 de setembro de 1946, determinava no seu Artigo 199, que
na execução do Plano de Valorização da Amazônia, a União aplicará, durante pelos menos vinte anos
consecutivos, quantia não inferior a três por cento de sua renda tributária. Em 6 de janeiro de 1953, o Congresso
votou a Lei n.º 1.806, criando a Superintendência do Plano de Valorização da Amazônia – SPVEA, com o
objetivo de “promover o desenvolvimento da agricultura e a exploração da floresta em termos de maior
37
Brasília seria a nova sede logística e administrativa do Brasil, uma de suas metas era
expandir a fronteira rumo ao Centro-Oeste e ao Norte do País, pois correspondia ao
pensamento geopolítico de Segurança Nacional, que tinha como objetivo maior, segundo
Vesentini (1987):
rendimento e melhor técnica de trabalho, fomentar o criatório e a pesca e indústria decorrentes, promover o
aproveitamento de recursos minerais, incrementar a industrialização de matérias primas, realizar um plano de
viação, promover a recuperação permanente das terras inundáveis, estabelecer uma política demográfica,
desenvolver o sistema de crédito bancário regional, e as relações comerciais com os centros de consumo e
abastecedores, nacionais e estrangeiros, proceder a pesquisas, à formação dos quadros técnicos necessários,
incentivar o capital privado para que se integre nos propósitos de valorização (BAHIANA, 1991, p. 18).
28
No governo do Presidente Juscelino Kubitschek, foi preparado o Programa de Metas (1956 – 1960), tendo se
baseado nos estudos do Grupo Misto CEPAL/BNDE e da Comissão Mista Brasil – Estados Unidos, O plano
consistia de 30 metas para diferentes campos de energia, transportes, alimentos, indústria básicas e educação de
pessoal técnico. (COSTA, 2014)
29
A construção de Brasília no Planalto Central, já tinha defendida por José de Bonifácio (1763 - 1838) e
Vanharge (Visconde de Porto Seguro), que desde o Império defendiam uma nova localização da capital que seria
no “Planalto Central”. Essa proposta ganhou apoio na Constituinte de 1891, que resultou em 1892, na criação da
Comissão Cruls, que pré-determinou no Retângulo Cruls, área com 14Km², que seria a sede da nova capital
(COSTA, 2013, p. 192).
38
Corrobora com essa ideia Barros (1995), onde afirma que no governo de Juscelino
Kubitschek, a Amazônia receberia atenção especial com a abertura de estradas rumo à Oeste:
implantação dos eixos, o grande movimento de extensão da fronteira” (BAHIANA, 1991, 19).
Portanto, o sonho da Amazônia integrada de Kubitschek, só se tornaria realidade no governo
militar 1964, que lançaria grandes projetos na Amazônia.
Percebe-se que o governo federal tinha que buscar soluções para assegurar de forma
eficiente o domínio da Amazônia brasileira, frente a outras nações que já buscavam explorar
40
os recursos naturais de suas amazônias. Para Becker (1990, p. 13), “a missão de incorporar as
terras, defender nossas fronteiras, preservar as riquezas, enfim, a nacionalização do território
[...] era prioridade dos militares”. Essas medidas seriam feitas através da implantação de redes
de integração espacial, onde podemos destacar como mais relevantes: a rede rodoviária, as
telecomunicações, a rede urbana das instituições estatais e privadas e a rede hidrelétrica.
Nosso interesse limita-se a rede rodoviária.
Em 13 de junho de 1965, em Belém – PA, o presidente da República Humberto de
Alencar Castelo Branco (1964 – 1967)30 em um discurso dá o primeiro passo para a ocupação
da Amazônia em nome da segurança nacional e o desenvolvimento, declarando que “já é
tempo de adotarmos para esta região alguma estratégia [...] que vise integrá-la
verdadeiramente no Brasil, abrindo-a para o mundo” (LOPES 1982 apud FURNIEL 1993, p
52). Para Castelo Branco, “a Amazônia apresentava a grande fronteira de recursos a ser
explorada e ao mesmo tempo preocupação geopolítica para os militares que passam a vê-la
como fronteira nacional que deve ser protegida”. (LOPES 1982 apud FURNIEL 1993, p 52).
Portanto, os militares buscaram atuar de forma rápida e consistente, para a segurança e o
desenvolvimento da Amazônia, colocando em prática um conjunto de metas e planos
necessários como a criação em 1966 da Superintendência para o Desenvolvimento da
Amazônia (SUDAM)31, o Banco da Amazônia S/A (BASA), em 1967 criou a
Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA)32.
No entender de Bahiana (1991, p. 19), “tudo isso era apenas parte de um plano
maior, de nítidas concepções geopolíticas, que buscavam colocar em práticas aquelas antigas
ideias de ocupação formuladas [...] desde o período Vargas. É desta maneira que nasce a
Operação Amazônia (1965 – 1967)33”. Corrobora com essa ideia Skidmore (1988), ao afirma
30
Segundo Santos (2013, p 51–52), Castelo Branco era alinhado com a ala mais moderada dos militares,
conhecida como Sorbonne, isto é, da Escola Superior de Guerra (ESG). A Escola tinha um projeto para a
integração, segurança e desenvolvimento da Amazônia.
31
Nesse período foi criada a Amazônia Legal; Art.2.º da Lei 5. 173, de 27.10.66, entidade espacial e legal, sua
área de atuação abrangeria os Estados do Acre, Amazonas, e Pará; parte dos Estados de Goiás – norte do paralelo
de 13 graus; Maranhão – oeste do meridiano de 44 graus; Mato Grosso – norte do paralelo de 16 graus; e pelos
então Territórios Federais do Amapá, Rondônia e Roraima. (BARROS, 1995, p. 19).
32
Segundo Mattos (1980, p. 98), “a criação da Zona Franca de Manaus representou, assim como a anterior
transferência da Capital para Brasília, um artifício geopolítico visando acelerar o processo de interiorização do
território, a responder aos apelos da política de continentlidade. Brasília foi destinada a ser o grande pólo de
conquista do interior e irradiação do progresso ao Brasil Continental. A Zona Franca de Manaus, em proporções
regionais deveria ser o pólo acelerador do desenvolvimento da Amazônia Ocidental”.
33
Segundo Santos (2004) a Operação Amazônia “objetivava colocar em prática em prática as antigas ideias de
ocupação, desenvolvimento e integração, formulada desde o primeiro Governo de Getúlio Vargas (1930-2945),
mas aperfeiçoado nas décadas posteriores, nos institutos de pesquisa e planejamento oficiais, como o Instituto de
Pesquisa Econômicas e Social (IPES). (MAHAR 1978 apud SANTOS 2004, p. 91).
41
que o objetivo principal era garantir a segurança e controle dos setores mais delicados do
Brasil, nossa fronteira:
O interesse de Médici pela Amazônia tinha outra lógica. [...] A elite brasileira,
especialmente os militares, há muitos receavam que o país perdesse a Amazônia por
falta de colonização. Gerações de cadetes do Exército brasileiro foram
conscientizados sobre a significação geopolítica da Amazônia, agora, como oficiais,
temiam possíveis incursões de peruanos, venezuelanos pelo vasto, mas esparsamente
povoado território rio acima. (SKIDMORE, 1988, p. 290)
Esse era o momento dos militares executarem seu programa estratégico para a
Amazônia, como afirma Barros (1995, p. 36), “a fronteira amazônica dos anos de 1970
corresponde à ideia “centro-periferia”, no auge do centralismo de estado, regime militar, e
discurso de potência emergente”. Enfim, o perigo que a Amazônia apresentava a segurança
nacional por causa da sua vasta “fronteira praticamente vazia” e sem pólos de
desenvolvimentos, direcionava para região medidas imediatas.
Visando alcançar tais objetivos, o Presidente da República Emiliano Garrastazu
Médici34 (1969-1974), no uso das atribuições que lhe confere cria o Decreto-Lei nº 1. 106 de
16 de junho de 1970 que lança o Programa de Integração Nacional – PIN35, considerando de
extrema urgência e de relevante interesse público promover a maior integração à economia
nacional das regiões compreendidas nas áreas da SUDENE e SUDAM. Essa integração se
daria através de um amplo programa de construção de estradas que buscava articular a
Amazônia e o Nordeste às regiões Centro-Oeste e Centro-Sul, possibilitando um programa de
colonização das suas margens e o desenvolvimento das atividades econômicas da região.
Chamo a atenção para o artigo nº 2 do PIN:
34
O Presidente Médici (1969 – 1974), como Costa e Silva fazia parte da “linha dura” do Exército.
35
Esse Decreto-Lei permite a definição de políticas públicas pelo executivo nacional sem necessitar de
aprovação do plenário do Congresso Nacional, instituída da Constituição de 1967.
42
36
Para Skidmore (1988, p. 293), “os programas amazônicos eram ideias para a campanha triunfalista de relações
públicas do governo que exaltava a “grandeza” do Brasil e seu inexorável salto para o status de potência
mundial”.
43
37
Conforme Mattos (1980, p. 99), o governo federal também tinha planos específicos para o setor hidroviário e
aeroviário com a construção de portos e aeroportos.
44
38
Segundo Furniel (1993, p. 51; Bahiana 1991, p. 20), na realidade muitos desses recursos atendeu mais as
grandes proprietários de terras e grandes projetos agropecuária e de mineração como: a Jari Florestal e
Agropecuária, do estadunidense Daniel K. Ludwig, um extenso projeto de silvicultura para a produção de
celulose, de mineração de caulim e de cultura comercial de arroz, no vale do rio Jari (PA).
45
Percebe-se que o Estado para sobreviver precisa tomar políticas agressivas de “cunho
nacionalista”, e não vai ser diferente no território nacional, e posteriormente na região
amazônica, quando aparecem os primeiros sinais de pressões internas e externas contra seu
território. Pode-se dizer que o pensamento geopolítico visa ser o porta-voz dos interesses do
Estado brasileiro na Amazônia, pois era extremamente importante para os geopolíticos
brasileiros o domínio da massa continental da America do Sul.
46
39
Criado pelo Decreto-Lei nº 5.812, de 13 de setembro de 1943, chamando-se Território Federal do Rio Branco,
tem o nome alterado para Território Federal de Roraima através da Lei 4.182, de 13 de dezembro de 1962.
40
Fonte: Brasil: Ministério do Interior. Conforme o IBGE o atual Estado de Roraima possui cerca de 224.300
Km².
47
De acordo com Freitas (1993) fica claro que o tempo e a falta de tecnologia adequada
eram os principais inimigos dos construtores, pois rapidamente a mata se encarregava de
fechar os trechos iniciais. Outro ponto importante que dificultava a conclusão da obra era as
péssimas condições de trabalho, ocasionando óbitos. Mas, o isolamento do Rio Branco era um
41
O município de Boa Vista do Rio Branco foi criado em 09 de julho de 1890 através do Decreto nº 49, pelo
governador do Estado do Amazonas Augusto Ximeno de Villeroy, que desmembrou as terras do município de
Moura. (Hoje Amazonas)
42
O município de Catrimani foi criado pelo Decreto-Lei 5.812/1943, tendo seu nome alterado pela Lei Federal
nº 2.795, de 28 de maio de 1955, para Caracaraí.
43
No século XIX houve o “boom da borracha” na Amazônia, milhares de nordestinos se deslocaram para
Manaus, levando a uma explosão populacional, para atender essa demanda, a região do rio Branco passou
abastecer a capital amazonense com carne bovina, que passou a ser seu maior produto de exportação.
44
Por causa da estiagem na região do rio Branco, os 7 km de corredeiras do Bem Querer tornava-se um grande
obstáculo para a navegação, restando 4 meses do ano navegável.
48
Corrobora com essa ideia Barros (1995), ao afirmar que [...] “as picadas para abrir a
estrada começaram a ser feitas na década de 1920, através da concessão da Companhia
Industrial do Rio Branco49, pertencente aos Beneditinos, que teriam levado o caminho
carroçável e sem pontes até a área de Mucajaí”. (BARROS, 1995, p. 60). Mas, a empresa da
45
Construída entre os anos de 1907 e 1912, estendia-se por 366 Km na Amazônia, ligando Porto Velho (atual
Rondônia) a Guajará –Mirim.
46
Segundo Souza (2011) O Prelado do Rio Branco Pedro Eggerath em 1924, também denunciou no Instituto
Histórico e Geográfico do Brasil, a falta de meios de comunicação com o Rio Branco elevara em preços
absurdos os matérias para a agricultura e gêneros de primeira necessidade.
47
Conforme Souza (2011, p 32), “a “expedição de Rice” resultou em um minucioso mapeamento de boa parte do
território do Rio Branco, levantando a fauna, a flora e os minérios ali presentes.
48
Ordem Religiosa de São Bento, ou Ordem dos Beneditinos, se instalou no Vale do Rio Branco em 1909. Essa
ordem foi a única a fazer uma trabalho de assistência religiosa contínua entre os colonos e também as populações
indígenas. (VIEIRA, 2003, p. 89)
49
De acordo com Vieira (2003), o interesse em construir a estrada Rio Branco – Caracaraí, foi devido ao projeto
Agroindustrial do Rio Branco, essa industria estava ligada a vários departamentos como: navegação, charqueada,
curtume, fábrica de gelo, eletricidade, sala de cinema etc. A construção da estrada erra essencial para o sucesso
do empreendimento.
49
Ordem de São Bento apresentava dificuldades na administração por uma serie de fatores
como aponta Vieira (2003): os problemas nas instalações das caldeiras e transportes, a falta de
mão de obra especializada, desvio de mercadorias, má administração da casa comercial, levou
a Ordem dos Beneditinos abrirem falência em 1927. Dessa forma, as obras na estrada tiveram
que ser suspensas, a falta de capital para fazer a manutenção da estrada, ocasionou na invasão
da vegetação, destruindo novamente a estrada.
Na década de 1940, como anteriormente citado, por razões geopolíticas de segurança
nacional o governo do Presidente Getúlio Vargas criou em 1943 o Território Federal do Rio
Branco. Em 1944 o governo federal manda para região do rio Branco o Técnico
administrativo do governo federal Araújo Cavalcante50, juntamente com sua equipe tinha
como objetivo realizar um levantamento da vida econômica do recém criado Território. Desse
levantamento foram apontados problemas em todos os setores da administração pública51.
O técnico aponta o setor de transportes, como essencial no desenvolvimento do
Território. Relata ao governo federal a necessidade de construírem estradas próximas as
nossas fronteiras, para garantir acesso a três mercados consumidores de Manaus-Venezuela e
Guiana Britânica, assegurando a segurança e o desenvolvimento econômico do Território do
Rio Branco. O Plano Rodoviário Territorial proposto por Cavalcante partiria do Rio Branco –
Venezuela – Rio Branco – Guiana – Rio Branco – Caracaraí, esta última já começada e
concluída nos fins de 1947.
Tal medida se deve conforme o autor, após o Decreto Presidencial do Governo da
Venezuela de 17 de dezembro de 1938, onde o Presidente Lopes Contreiras, deu atenção
especial para promover e desenvolver parte de seu território inexplorado de sua Amazônia, na
área venezuelana fronteira ao Território do Rio Branco, com objetivo de incorporar essa
região à economia integral da nação (CAVALCANTE, 1949).
O Relatório de Cavalcante deixava clara a importância de se construir estradas no
Território Federal do Rio Branco, principalmente a estrada Boa Vista – Caracaraí, conforme
Barros:
O governo do Território reinicia por várias vezes as obras, para finalmente alcançar,
em 1948/1949, o caminho carroçável alcançar Caracaraí. [...]. Este caminho só
poderia ser trafegado por veículos no período de maior baixa das águas, por que não
50
Em 1944, o Técnico Araújo Cavalcante foi encarregado pelo Governo Federal de elaborar um estudo
socioeconômico, intitulado Plano de Recuperação e Desenvolvimento do Vale do Rio Branco, com o objetivo
de organizar o referido Território Federal (CAVALCANTE, 1949).
51
Segundo Cavalcante (1949) a organização administrativa era extremamente simples e reduzida em 1945. Logo
aponta os setores principais para serem beneficiados no projeto: eletrificação, transportes (rodoviário, fluvial e
aéreo, colonização, imigração, obras e equipamentos, aquisição de materiais, desenvolvimento gradual dos
órgãos administrativos e o desenvolvimento progressivo do pessoal, etc.
50
De acordo com Freitas (1993, p. 42), “em 1949 estava previsto a construção de 620
Km de estradas federais para o Território Federal do Rio Branco, atingindo a fronteira da
Venezuela e Guiana Inglesa”. Porém, as obras não foram concluídas, o insucesso nas obras
“foi por motivos de corte de verba na proposta, a escassez de mão de obra e equipamentos”
(FREITAS, 1993, p. 55). Assim sendo, o projeto não foi concluído no prazo estabelecido
pelo governo federal, gerando sérios problemas para a administração local. Portanto, as
estradas seriam retomadas novamente com a chegada dos militares no poder em 1964.
o governo brasileiro mantinha uma aliança como os Estados Unidos, e não iria tolerar
movimentos guerrilheiros nos países vizinhos, principalmente após a criação em 1967, na
cidade de Havana, da Organização Latino-Americana de Solidariedade, um instrumento com
que Cuba esperava fomentar guerrilhas no continente. Como assevera Santos (2013):
Logo, o governo Costa e Silva52 (1967-1969) para melhor articular seus projetos de
integração e segurança nacional, toma uma decisão estratégica para a Amazônia Ocidental53,
como afirma Mattos (1980):
Tal medida se deve como foi afirmado por Becker no (capítulo 02, p. 30), onde a
autora salienta que fundamentado na Doutrina de Segurança nacional, os militares tomaram
uma série de medidas estratégicas para a região amazônica por motivos da ordem interna e
externa. Registram-se aqui os pontos relevantes: 1) A solução conjunta de problemas de
tensão sociais no Nordeste; 2) a organização de focos revolucionários na região; 3) o
dinamismo dos países vizinhos nas suas amazônias; 4) a construção da estrada Carretera
Bolivariana Marginal de La Selva; 5) a exploração e escoamento de recursos naturais na
região. Dessa forma, após a instalação do Comando Militar da Amazônia (CMA) em Manaus,
52
O general Artur da Costa e Silva (1967 – 1969) fazia parte da “linha dura” do Exército, defensor intransigente
da ordem e do desenvolvimento sob a égide do Estado.
53
Conforme Mattos (1980, p. 110), “Exército, Marinha e Aeronáutica conjugaram esforços para manter viva a
sua missão amazônica, atuando principalmente nas regiões mais longínquas e mais hostis onde a iniciativa
empresarial não tem interesse em chegar. As três forças deslocaram de Belém para Manaus, na Amazônia
Ocidental, seu principal centro de operações de cooperação com seu desenvolvimento. O Exército atuou
essencialmente com seu Grupamento de Engenharia e seus batalhões de construção, tomando a seu cargo a
implantação das rodovias mais afastadas e difíceis. A Aeronáutica com seus “históricos” Catalinas, verdadeiros
barcos voadores e os mais modernos Búfalos e Hércules, assegurou a ligação das povoações nos confins
amazônicos e deu substancial apoio aos batalhões de engenharia de construção e a construção de aeródromos. A
Marinha de Guerra renovou sua flotilha fluvial e manteve sua tradicional ajuda às localidades longínquas através
da exploração de hidrovias”.
52
54
Foi construído o 5º Batalhão de Engenharia de Construção foi estruturado na cidade de Porto Velho _
Rondônia, para fazer a ligação com Manaus e Cuiabá; o 7º Batalhão sediado na cidade de Cruzeiro do Sul no
Acre, ligaria as cidades próximas as fronteiras; o 8º e 9º Batalhões tiveram como sede as cidades de Santarém e
Cuiabá, suas atribuições era ligar as duas cidades. (MARTINELLI, 2004)
55
Segundo Silva Jr (xxx, p. 283) o 6º BECnst foi criado pelo Decreto Presidencial nº 60.456, de 13 de março de
1967, e organizado pela Portaria nº 50-Res, de 13 de julho de 1967. Sua origem foi a 1ª Companhia Especial de
Engenharia de Manaus-AM. Em 09 de agosto de 1968, ocorreu a instalação da Companhia, ainda em Manaus.
No mesmo mês, transformou-se do 6º BECnst.
56
Segundo Santos (2013, p.110) O Decreto-Lei 200, de fevereiro de 1967, com seus 613 artigos, deu nova forma
à máquina administrativa federal brasileira. Entre outras coisas abriu caminho para disposições legais como o já
referido Decreto-Lei 411/69, de janeiro de 1969, o principal regimento dos governadores dos territórios durante
o regime militar.
57
Cheddi Jargan era presidente do PPP (People’ s Progressive Party), o partido era composto por
indoguianenses, cujo o objetivo era a independência da colônia. (LIMA, 2011).
58
Forbes Burnhan era presidente do PNC ( People’ s National Congress), foi criado para expressar a vontade dos
guianeses.
59
O governo americano via a ascensão do Partido Popular Progressista ao poder com a transformação da Guiana
numa nova Cuba. O que não admitiriam como demonstra a comunicação do secretário do governo Kennedy,
Dean Rusk, ao Ministro das Relações Exteriores do Reino Unido: (...) acreditamos que Jargan e sua esposa
americana são realmente esquerdistas, e que sua ascensão ao poder na Guiana Britânica seria um sério e
desagradável revés nesse hemisfério. (LIMA, 2011, p. 50)
60
United Force – UF Partido da Força Unida, representado pela elite capitalista guianense.
53
51). No entender de Lima, o plano de Burnham deu certo, no poder o presidente rompeu com
o UF, e consolidou seu controle sobre o Estado, dando inicio a nacionalização de empresas
estrangeiras.
De acordo com Borges (2005, p. 52), “o processo de organização do Estado de
Burnham, excluía os fazendeiros do Rupununi por serem grandes proprietários de terra”.
Levando o UF romper com o PNC 1967, o fim da aliança foi o principal combustível para os
fazendeiros do Rupununi se organizarem e se aproximarem da Venezuela61, dando inicio no
que seria conhecido como A Revolta do Rupununi em 1969.
Borges afirma que (2005), a liderança da Revolta ficou com as famílias de Hart e
Melville, o ex-senador Ted Melville após fazer várias reuniões, ficou acordado que a ação
militar deveria tomar os pontos estratégicos na região. No dia 1 de janeiro de 1969, todos os
representantes do governo da Guiana na região estavam presos. Mas a rebelião foi um
fracasso, devido à ausência das forças venezuelanas. No dia seguinte, as forças armadas do
governo guianense62 chegaram à região dando inicio ao movimento de repressão da revolta.
Os revoltosos se retiraram em direção do Brasil. Para Freitas (1993), nessa época, nossa
fronteira com a Guiana, como também com a Venezuela era totalmente desguarnecida, o que
facilitou a entrada dos revoltosos no país.
A invasão de nossas fronteiras, segundo Freitas (1993) mostrou os grandes
problemas do Território Federal de Roraima (TFR) “não tínhamos estradas, não tínhamos
caminhão para o transporte de tropas, não tínhamos enfim, como manter a soberania nacional
de modo digno em nossas fronteiras” (FREITAS, 1993, p. 176). Dessa forma não houve
resistência brasileira contra a invasão. Como afirma Borges (2005):
61
De acordo com Borges (2005, p. 88) Tal situação levou os fazendeiros a se aproximar da Venezuela, que
mantinha uma pendência territorial com a Guiana em torno da região do Essequibo. São exatamente tais relações
iminência no interior da estrutura social da Guiana que desencadeou a Revolta com apoio daquele país.
62
Conforme Borges (2005, p. 114), depois que da forças armadas do governo assumiu o controle do Rupununi,
passaram a chegar noticias a Georgetown dando conta de uma brutal repressão aos índios da região, e àqueles da
parte noroeste do Essequibo, nas regiões fronteiriças com a Venezuela. Apavorados, muitos índios teriam se
refugiados no Brasil.
54
Essa desordem que se passava no TFR para o governador Hélio Campos63 (1967-
1970) “era uma vergonha para o país” (FREITAS, 1993, 173). No entender de Freitas (1993),
a invasão foi extremamente importante, pois ganhou destaque de modo rápido na agenda do
governo federal, que passou da prioridade na conquista da Amazônia Setentrional.
Em entrevista concedida para Freitas (1993) Hélio Campos reconhece que a Revolta
do Rupununi foi essencial para o governo federal, direcionar uma logística eficiente que
atendessem as necessidades estratégicas de Segurança Nacional do TRF. Como medida, os
militares deslocaram o 6º Batalhão de Engenharia de Construção (BEC) para Boa Vista dia 09
de janeiro de 1969. Segundo Silva Jr (1994), nesse mesmo ano, foi assinado o convênio entre
o governo federal, representado pelo 6º BEC e o Departamento Nacional de Estradas e
Rodagem (DNER) para a construção da BR 174 e 40164 que reiniciou a abertura da BR 174
ligando Manaus – Boa Vista, até então a cargo do governo do estado do Amazonas.
63
O Tenente – coronel aviador Hélio Campos, provinha do Correio Aéreo Nacional. Amigo do Ministro do
Interior, general Albuquerque Lima, e este ardente nacionalista, componente da “linha dura”, teria sido o
“padrinho” da nomeação de Campos. Este, também gozava do apoio do Ministro dos Transportes Mario
Andreazza para as obras. (FREITAS, 1993, p.166)
64
Segundo Santos (2013, p. 108), “essas estradas já tinham sugeridas na década de 1940 por Cavalcante (1949),
o que demonstra sua visão geopolítica e, também, que há uma continuidade entre a ideologia do Estado Novo e o
regime militar pós-1964”.
55
65
O Ministério do Exército e o Ministério dos Transportes juntaram esforços para a implantação de rodovias na
região amazônica, com o propósito de reduzir custos e, ao mesmo tempo ocupar a Amazônia Legal
(MARTINELLE, 2004, p. 28)
66
Autor do livro: Dois anos na Floresta Amazônica: abrindo estradas pioneiras nos anos de 1970 e 1971.
67
Conforme Souza (1977), a BR 174, nasce na cidade de Cárceres (Mato Grosso), seu projeto original era
Cáceres – Vilhena – Canumã – Careiro – Manaus – Caracaraí – Boa Vista – BV8 (Venezuela), se transformando
numa estrada Transcontinental.
68
Segundo Martinelli (2004), Manaus e Boa Vista são cidades na região Norte e a distância entre elas e pequena.
Apesar disso, o regime de chuvas apresenta um comportamento muito peculiar para ambas as cidades, talvez por
estarem em hemisférios diferentes. De junho a novembro as chuvas são intensas na região de Boa Vista e mais
fracas nas regiões de Manaus e dezembro e maio, quando se inverte.
56
CMA para terminar a frente Norte mais rápido do que a frente Sul, era porque o poder central
via essa região como setor mais delicado da Amazônia Ocidental.
Instalado a equipe de topografia no trecho Manaus – Caracaraí, frente Sul, km 48,
próximo o rio Tarumanzinho. Conforme Martinelle (2004), a equipe de topografia e
terraplenagem daria continuidade na estrada inicialmente construída pelo DNER, e após
contato com índios Waimiri – Atroari interromperam as obras, que foram entregues para o
comando do 6º BEC. Os militares deram continuidade na obra, após restauração do trecho
construído pelo DNER, para se adequar com o projeto original. Devido os diversos atritos
com os índios tiveram que para as obras várias vezes.
Na década de 197069, no segundo governo Hélio Campos (1970 – 1974) o governo
federal lança vários programas na Amazônia, com objetivos de garantir investimentos para
levar os projetos adiante como afirma Santos:
Esses recursos, além de garantir a continuidade das estradas, segundo Freitas (1993)
também daria inicio em outra grande obra estratégica quanto a Segurança Nacional, começava
se construída em frente Boa Vista, a ponte sobre o rio Branco70. Esta daria inicio a rodovia
BR-401, que ligaria Boa Vista – Normandia – Bonfim, na fronteira da República
Cooperativista da Guiana. Como as construções da ponte e da estrada tinham prioridades, os
militares criaram o 2.º GPT e CONST71 em parceria com as demais Unidades de Construção
da Amazônia e o 6.º BEC, e, em 1972 alcançaram a fronteira da Republica Cooperativista da
Guiana, como afirma Souza (1977):
69
Conforme Souza (1977, p. 298), “somente nos anos de 1970 a 1976 foram investidos aproximadamente Cr$
361.220.000, 00 (trezentos e sessenta milhões e duzentos mil cruzeiros), [...] demonstrando a prioridade do
governo em ligar Roraima ao restante do país”.
70
A Ponte dos Macuxis ainda em uso tem 1200 metros de aço e concreto armado, a maior no gênero construída
na America do Sul, foi inaugurada em 02 de agosto de 1975. (SOUZA, 1977)
71
Portaria Min. Res. N.º 35, de 04 de setembro de 1970. (SOUZA, 1977, p. 298)
57
Essa vitória significaria para os militares que a fronteira Brasil – Guiana, jamais seria
invadida por qualquer força estrangeira, pois, já se encontrava instalado na região o 1.º e 2.º
Pelotão Especial de Fronteira – PEF, de Bonfim e Normandia, garantindo a segurança dessa
fronteira internacional.
No trecho, Boa Vista – Venezuela, os trabalhos não pararam segundo Souza (1977),
o 6.º BEC, em 1972, alcançava o alto da Serra de Pacaraima, em fevereiro de 1973, a frente
Norte sentido Venezuela seria inaugurado pelo presidente do Brasil General Emílio
Garrastazu Médici e da Venezuela Rafael Caldeira no Marco BV – 8, linha considerado limite
entre os dois países.
Pode-se afirma que a pressa em concluir o trecho Norte, das BR 174 e 401 pelas
FFAA, demonstrava que os militares não admitiriam novamente uma invasão a nossa
soberania, principalmente de governos de esquerda. Essa posição do governo federal fica
claro na citação de Meira Mattos (1980) na fala do geógrafo Otto Maull, sobre as finalidades
das nossas fronteiras: “distinguir o meu do teu; - proteger o território nacional; isolá-lo,
grande necessário, e facilitar-lhe o intercâmbio quando conveniente”. (MAULL, 1960 apud
MATTOS, 1975, p. 29).
Com a conclusão das estradas ao Norte do TFR, os trabalhos se voltaram para o Sul
com a mesma prioridade, pois os trabalhos ainda não estavam concluindo, o TFR ainda
continuava isolado. Agora, a prioridade era abrir caminho em direção o Estado do Amazonas.
A estrada Boa Vista – Caracaraí já se encontrava em ótimo estado, os militares
instalaram uma base logística na Vila de Vista Alegre, no município de Caracaraí para da
continuidade da estrada. Para Martinelli “A missão de lançar a linha topográfica para a
implantação da rodovia BR 174 no trecho ainda não explorado de Caracaraí - Manaus, sem
apoio de qualquer levantamento geodésico ou aerofotogramétrico, era no mínimo uma
aventura, embora um risco calculado”. (MARTINELLI, 2004, p. 57). O resultado foi que no
trecho localizado na rodovia BR – 174 aproximadamente no quilometro 60 ao sul da
Caracaraí, a estrada parou no meio de uma floresta alagada. Com isso, os engenheiros tiveram
que traçar um novo percurso, perdendo 40 km de rodovia construída, que ficou conhecida
como “estrada perdida”.
58
Os engenheiros do 6.º BEC retomaram as obras a partir de uma nova rota, com o
objetivo de se encontrar com a frente Sul, que vinha de Manaus, mas o conflito com o povo
Waimiri – Atroari foi inevitável, pois o projeto da rodovia cortaria suas terras. Diante dessa
situação, as obras foram suspensas para mediação das partes, o órgão responsável do governo
foi a Fundação Nacional do Índio (FUNAI). Entretanto, para os militares as obras não
poderiam para, logo, a frete de trabalho foi redirecionada para a construção da BR 210 –
Perimetral Norte no sudeste do TFR.
Lançada no Plano de Viação Nacional de 1973, pelo presidente Médici, a rodovia BR
210 - Perimetral Norte inicia suas obras em Porto Grande (Amapá), em 29 de julho de 1973,
buscava entrecortar a Amazônia setentrional, ligando os estados do Amapá, Pará, Roraima e
Amazonas. (ver mapa 05) No TFR, segundo Barros (1995, p.84) a rodovia se junta com a BR
174, na vila de Novo Paraíso, ali forma uma única via, seguindo até Caracaraí no sentido
norte, daí seguiria no sentido leste na fronteira colombiana, já no estado do Amazonas, ali se
interligaria com a BR-307 que chagaria no Acre.
O sonho de construir uma estrada margeando toda fronteira da Amazônia Ocidental
não se realizou. As razões para Neto (2015) estão no equivoco na implantação da rodovia,
59
Não vim para mandar, ou comandar, vim apenas servir, participar e contribuir com
um esforço pessoal, para que o desejo, a esperança e o sonho dos filhos da terra em
desenvolver o território e transformá-lo em um Estado da federação ocorra num
futuro próximo. (Jornal Boa Vista, 29/05/1974, p. 01).
Com o slogan “ocupar, desenvolver e integrar” (Jornal Boa Vista, 27/071974, p. 01),
o governador Ramos Pereira assume a responsabilidade de concluir a estrada BR 174 no sul
do Estado, trecho Caracaraí – Manaus. Além das pontes de concreto armado e metálica sobre
os rios, Branco, Mucajaí e Urariquera73.
Conforme Souza (1977) no dia 06 de abril de 1977, no km 355,8 da BR 174 a frente
de trabalho Norte se encontrou com a frente Sul no ponto de passagem da linha do Equador
numa extensão de 971 Km. No dia 30 de abril de 1977, o Vice – Presidente da República,
General Adalberto Pereira dos Santos; o governador do Amazonas, Henoch da Silva Reis e do
Território Federal de Roraima, Fernando Ramos Pereira, além de uma grande comitiva74
72
Perimetral Norte completa o plano – Minérios como o manganês e as pedras preciosas passaram a ser
exploradas em maior escala com a construção da Perimetral Norte, na Amazônia, que atravessará terras férteis e
ricas em minérios, como do Território do Amapá e Roraima. [...] Além da exploração industrial de minérios e de
pedras preciosas, fontes do DNER revelaram ontem que a Perimetral Norte tem ainda por objetivo promover a
colonização da região amazônica, completando o plano referente à estrada Transamazônica. (Jornal Estado de
São Paulo, p. 38, 22 de set. 1973)
73
Segundo Hélio Campos, as pontes de concreto sobre os rios Branco e Urariquera foram construídas não em
função de sua estratégia econômica, mas, sim pela sua posição estratégica quanto a Segurança Nacional. Essa
afirmação se dá após o projeto original se modificado para atender exigências técnicas da Marinha de Guerra
Brasileira, que previa a construção de uma barragem do Bem Querer, para navegação de grande porte.
(FREITAS, 1993, p. 192)
74
Ministro Dirceu Nogueira, dos Transportes; General Ernani Ayrosa da Silva Comandante Militar da
Amazônia; Major Brigadeiro Protásio Lopes de Oliveira, Cmt. Do 1.º Comando Aéreo Regional; General
Ismarth de Araújo, da FUNAI; entre outrso. (SOUZA, 1977)
60
Fonte: Jornal Informativo O Pium, 6.º BEC, Ano III, 35, Boa Vista – RR, de 30 de abril de 1977, p. 01.
política nacional. Essa ideologia nacionalista era passada através dos meios de comunicação
como: jornais, rádio e televisão, etc.
Portanto, as ações dos militares do ponto de vista geopolítico para o Extremo Norte
da Amazônia estavam alcançadas. Como afirma Souza (1977) à conexão viária entre Brasília
(Brasil) através das rodovias federal BR – 060, BR – 364, BR – 319 e BR 174 com uma
extensão de 4. 462 Km até a fronteira com a Santa Helena Uairen (Venezuela), articulando ao
grande sistema rodoviário nacional e internacional. Em Boa Vista nasce e bifurca-se com a
BR 174 a estrada BR 401 rumo a fronteira de Lethem (República Cooperativista da Guiana).
62
Rodrigues, intitulado: Juaperi, pacificação dos Crichanás. Estes eram conhecidos como
Chichanás, Juaperi, Alalaus e Waitemiris. No século XX, ficaram conhecidos como Waimiri
Atroari, “habitavam a região compreendida desde o rio Urubu [...], até a foz do rio Jauaperi,
subindo por este rio até a bacia de seu maior afluente, o rio Alalaú, onde hoje localiza a maior
concentração populacional desses índios”75 (CARVALHO, 1982, p. 63). O mesmo afirma
que nesse período:
[...] subindo o rio Jauaperi, as lanchas encontrou os grupo que seguiu em vários
ubás. Os ubás foram alvejados com tiros de artilharia levando pique, os que
chegaram na margem foram também fuzilados [...], mais de 400 índios morreram
nessa expedição. Os militares com apoio dessas lanchas de guerra sistematicamente
foram matando os índios, estes, perseguiam até as regiões longínquas praticando um
verdadeiro extermínio dos Waimiri Atroari. (CARVALHO, 1982, p. 17)
75
Os Waimiri Atroari são classificados como do tronco linguístico Karib.
64
A resistência dos nativos contra os invasores continuava, mas nessa guerra desigual
foram cometidas atrocidades contra o povo Waimiri Atroari. Essas atrocidades levaram o
etnólogo Theodor Koch-Krunberg76 (1903-1905) a denunciar o Brasil no XVI Congresso de
Viena em 1908, o Brasil. Para evitar retaliação das Cortes Internacionais, o governo brasileiro
buscou criar mecanismos de legitimação para administrar as áreas ocupadas por indígenas.
Em 1910, o Governo Federal, através do Decreto nº 8.072, de 20 de junho cria Serviço de
Proteção do Índio (SPI)77 .
Em setembro de 1944, conforme Monte (1992), uma expedição organizada pelos
Norte Americanos com apoio do SPI chegou à região para fazer um trabalho na observação
astronômica78, atendendo aos acordos entre Brasil e os Estados Unidos, liderada pelo Tenente
Walter Willianson do 4th Photo Charting Squadron, do Exército Norte Americano. A
expedição partiu da vila de Moura, em 28 de setembro de 1944 com destino à região do rio
Jauaperi. Durante o mapeamento da região, os militares foram atacados pelos índios Waimiri
Atroari, o resultado foi onze mortos entre servidores do SPI e militares americanos.
No fim da II Guerra Mundial, a economia gumífera entrou novamente em crise,
levando o Governo Federal a reduzir os gastos na Amazônia, e posteriormente no SPI. Tal
medida levou o SPI a ausentar-se da região da reserva indígena, abrindo caminho para os
comerciantes, coletores e caçadores organizarem novamente uma matança contra os índios.
Como registra Monte (1992, p. 127) “em janeiro de 1949, invadiram e mataram com requintes
de perversidade e barbárie mais de 70 índios, dentro de seu próprio território”. Mesmo com
novas invasões e assassinatos dos Waimiri Atroari, o governo federal só se manifestou na
abertura da construção da rodovia Manaus – Boa Vista - Venezuela.
Como salientado no capítulo 3.2, em 1968, iniciam-se os trabalhos de construção da
BR – 174, ficando a cargo do Departamento Nacional de Estradas e Rodagem – DNER e do
Departamento Estadual de Rodagem do Estado do Amazonas DER-AM. Os trabalhos tiveram
76
No inicio do século XX, a expedição do etnólogo Theodor Koch-Krunberg (1903-1905), afirma que a
população dos Waimiri Atroari era estimada em 6.000 índios. (CARVAKHO, 1982)
77
“Por iniciativa da 1ª Inspetoria do Serviço de Proteção aos Índios, o governo do estado do Amazonas, através
da Lei nº. 941, de 16 de outubro de 1917, concedeu aos Waimiri Atroari as terras situadas a 50 km a jusante das
cachoeiras dos rios Jauaperi e Camanau” (CARVALHO, 1982, p. 37)
78
Segundo Monte (1992) os militares americanos tinham como objetivo mapear jazidas minerais.
65
que para no momento que teriam que cruzar a região habitada pelos índios Waimiri Atroari.
(Ver figura 04) Logo, os órgãos do governo buscaram apoio da Fundação Nacional do Índio -
FUNAI79. Carvalho (1982) salienta que o funcionário da FUNAI, lotado na Delegacia
Regional do Amazonas, o sertanista Gilberto Pinto Figueiredo vinha mantendo contado com
os Waimiri Atroari no Posto de Atração do rio Camanau, o sertanista era contrario a
construção da rodovia BR 174 dentro as terras dos indígenas. Essa posição levou o Presidente
da FUNAI Queiros Campos substituir pelo Pe. Italiano Giovanni Calleri80.
Figura 04: Localização da Terra Indígena Waimiri-Atroari.
79
Lei 5.371, de 5 de dezembro de 1967.
80
Segundo Carvalho (1982), Calleri era membro atuante da Prelazia da Consolata em Roraima, mas não tinha
pouca experiência na pacificação de índios.
66
[...] desde o primeiro contato com os Waimiri Atroari vinha alertando o Padre
Calleri para a forma como tratava os índios. Dizia Paulo Mineiro que o Padre, ao
invés de tratar com respeito e dignidade os índios, ao contrário, procurava sempre,
aos gritos humilhá-lo, inclusive ameaçando-os com uma espingarda, quando eles
queriam forçosamente apossar-se de alguns objetos que a expedição levava.
(CARVALHO, 1982, p. 97)
Segundo Carvalho (1982), Paulo Mineiro que havia adquirido experiência em outras
expedições da FUNAI, percebendo a retaliação dos índios advertiu o missionário para mudar
seus métodos de pacificação, mas o Pe. Calleri não deu ouvidos. No dia seguinte, o
acampamento foi atacado pelos Waimiri Atroaris, o mateiro se desligou da expedição
retornando por seus próprios meios para Manaus. Na capital amazonense, além da localização
do acampamento, Mineiro relatou que todos os expedicionários tinham sido
67
81
A notícia dos assassinatos da expedição Calleri pelos índios Waimiri Atroari foi noticia nos principais jornais
nacionais e internacionais, aumentando a tensão das Forças Armadas na região.
82
Segundo Carvalho (1982) tendo em vista que o Decreto continha erros, os indigenistas da FUNAI protestaram,
levando o governo cria o Decreto nº. 74. 463 de agosto de 1974, e posteriormente o Decreto nº. 75.310/75
fixando o Terra Indígena Waimiri Atroari ao Sul do Território de Roraima e ao Norte do Estado do Amazonas.
83
Gilberto Pinto Figueiredo Costa, funcionário da FUNAI e Coordenador da Frente de Atração Waimiri Atroari.
68
84
O bizarro plano de Amâncio chocou a imprensa brasileira e internacional, levando o presidente da FUNAI, o
General Ismarth de Araújo Oliveira, substituir por Apoena Mairelles.
69
Fonte: 6º BEC
Na placa a seguinte inscrição “em homenagem aqueles que deram suas vidas pela
realização desta obra. Não morreram em vão. Abril 1977”. (SOUZA, 1977, p. 270). Em
referência aos quatros militares e 28 civis que morreram na obra, Como afirma Souza (1977,
p. 270) “foram sacrificados, mas foram sacrificados pelo progresso”. Para os indígenas só o
esquecimento, como registra o sertanista Apoena Meireles (1975) “os Waimiri Atroari
tombaram no silêncio da mata. Foram sutilmente enterrados e esquecidos no espaço e no
tempo.” (MEIRELES, 1775 apud Relatório do Comitê da Verdade, 2012, p. 72).
70
85
Baseada no diagnóstico de Araújo Cavalcanti e sua equipe, implantada pelo decreto citado e inalterado por
duas décadas, a máquina administrativa territorial constava de: Governador; Secretaria Geral; Divisão de Saúde e
Saneamento; Divisão de Assistência à Maternidade e à Infância; Divisão de Educação; Divisão de Produção,
Terras e Colonização; Divisão de Obras; Divisão de Segurança e Guarda; Serviço de Administração Geral e
Serviço de Geografia e Estatística. (SANTOS, 2004, p. 94)
86
O governo Federal aproveitou-se da construção da estrada Boa Vista – Caracaraí, para criar a colônia de
Mucajaí.
71
Como foi citado no capítulo 2.1, o PIN reservaria para colonização e reforma
agrária, um faixa de até 10 km e, posteriormente, com PVN 100 km à esquerda e direita para
ocupação da terra. Para implantação de sua política agrária, o governo federal criou em 1970,
o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA)87. Para Santos (2013, p.
152) “a criação do INCRA no governo Médici não representou apenas uma mudança na sigla,
mas a passagem da colonização à frente da redistribuição, através da ênfase da modernização,
buscando a revolução tecnológica na agricultura”. Para facilitar a distribuição de terras e o
fomento, “o governo federal lançou o PROTERRA, com objetivo de alavancar uma reforma
agrária” (SANTOS, 2013, p. 152). A modernização na agricultura implantada pelo poder
central se dá com a criação de núcleos urbanos88; que podem ser classificados em três tipos:
Mas, conforme Santos (2013, p. 152) “fatos novos como as secas no Nordeste – a de
1967 e a de 1979 – motivaram o governo a planejar o deslocamento do excesso populacional
nordestino para a Amazônia”. O TFR localizado numa região estratégica receberia
abundância de recursos para dar inicio à colonização desse front, principalmente, após a
construção das BRs 174, 401 e 210 (Perimetral Norte).
No inicio da década de 1970, no governo de Hélio Campos (1969-1974), Freitas
registra que “em razão de políticas públicas implantadas, Roraima e Boa Vista: a capital se
transformou num canteiro de obras, com centenas de novas casas e bairros novos. [...]
Migrantes chegavam a toda hora, em busca de novas oportunidades” (FREITAS, 1993, p. 64).
A migração representa para Santos (2010) “[...] a determinação da luta não somente contra a
imposição do capitalismo no campo, através de sua expropriação, mesmo não estando
87
Decreto nº 1.110, de 9 de julho de 1970.
88
Podemos citar dois grandes núcleos empresariais que se estalaram próximo as rodovias citadas, na BR 174, o
grupo Paranapanema, da área de mineração; no Perimetral Norte, a empresa Jari Florestal e Agropecuária, do
norte-americano Daniel Keith Ludwig.
72
consciente disso, o que está em jogo e a conjuntura estrutural de expulsão da terra” (IANNI,
1997 apud SANTOS, 2010, p. 66).
No campo, os migrantes que chegavam em Boa Vista, segundo Barros (1995) eram
deslocados para o front no sudeste do Estado89. Isso só se deu porque o nordeste já estava
povoado por um grande número de índios e fazendas90 de famílias tradicionais91 (Conforme
mapa 08). Mas, para Santos (2013) o governador Hélio Campos era bem relacionado com as
lideranças locais, para não entrar em choque, principalmente com a chegada do INCRA92. O
governador reservou um pequeno número de lotes localizados próximos às fronteiras da
Venezuela e Guiana, deixando o problema da migração espontânea, para seu sucessor
Fernando Ramos Pereira.
Mapa 08: Localização da produção pecuária em 1970
Muitos queriam apenas a madeira para vender às serrarias; estas por sua vez,
também queriam evitar intermediários e avançavam elas próprias para a floresta;
outros queriam terra, roçado, pastos. Outros somente formar pastos. Acredita-se em
geral que logo aquelas estradas estariam asfaltadas, crenças sem dúvida nutridas
pelo ambiente de “milagre” no qual se embriagava a sociedade brasileira no começo
e meados dos anos de 1970 (BARROS, 1995, p. 33).
93
Em 6 de dezembro de 1974 foi publicado no diário oficial da República, a Lei nº 6. 151 de 4 de dezembro de
1974,sancionou após aprovação no Congresso Nacional (BRASIL, 1974, p. 28)
94
Lei nº 5.173, de 27 de outubro de 1966.
95
O POLAMAZÔNIA prevê a implantação na região de 7 pólos agropecuários sendo: 1 nos Estados Amazonas,
Acre, Maranhão e Pará, 2 no norte do Mato Grosso e 1 que engloba os limites norte do antigo Estado de Goiás e
Maranhão. Também descreve o desenvolvimento de 6 pólos agrominerais 1 nos Estados e Territórios de Mato
Grosso, Rondônia, Roraima, Pará e Amapá, o Pólo de Carajás-Itaqui engloba a região limítrofe dos Estados do
74
Pará e antigo Goiás. Toda essa infra-estrutura estaria ligada a três grandes pólos urbanos São Luís, Belém e
Manaus. (BRASIL, 1974, p. )
75
Dos recursos destinados para o programa, a maior parte era para fomentar os
empresários. Para estes o governo dava garantia de incentivos fiscais, subsídios e
financiamento agropecuário e da agricultura, buscando a inserção de novas tecnologias (II
PND para o Território Federal de Roraima, 1975). Já as colônias agrícolas, segundo o
Programa de Ação do Governo tinham que reestruturar as existentes e priorizar os
povoamentos espontâneos, transformando em colônias produtivas, mas, os recursos liberados
eram ínfimos frentes os projetos agropecuários. Assim, podemos citar que “[...] os problemas
que contribuíram para que as primeiras colônias oficiais não alcançassem êxito pode-se
apontar a falta de incentivos à produção como: implementos agrícolas, acompanhamento
técnico, financiamento, educação e assistência médica e uma política de colonização do
Estado” (SANTOS, 2004, p. 39). Enfim, soma-se a isso, a falta de condições para o
escoamento da produção e a precariedade durante o inverno como fatores de fracasso da
ocupação. Para piorar a situação, Barros afirma que “o “milagre” se encerra, e o gasto
público na fronteira declina drasticamente, se abandonado as estradas e obras, e projetos, e o
front equatorial é deixado à própria sorte, cercado de restrições ambientais e indigenistas. O
front de “subsídios” entra em exaustão (BARROS, 1995, p. 36).
Só, nas décadas seguintes, que os investimentos no setor agropecuário na região sul,
aumentaram substancialmente, bem como a área de pastagem. Essas medidas deslocaram a
frente agropecuária para o sul do Estado96, aumentando o número de migrantes e
investimentos nesse setor. E, o resultado foi que nas décadas seguintes essas colônias se
transformaram em municípios. (Ver tabela 01)
96
No governo do Brigadeiro Otomar de Souza Pintos (1979-1983). Este, buscou promover o desenvolvimento
social e econômico desta região, incentivando a ocupação da terra através do pequeno produtor rural. O setor
agropecuário constitui o objetivo central da política econômica estabelecida, para o qual convergirá parcela
expressa dos recursos orçamentários e em função do qual alocados os recursos em infra-estrutura física e social.
(SANTOS, 2013, p. 189)
76
O fim do milagre econômico abriu caminho para front garimpeiro com noticias de
ouro na área Yanomami97, como afirma Barros “em medos da década de 1980 começou a
massiva invasão dos garimpeiros que veio a culminar com o “boom”. [...] Estima-se que cerca
de 40.000 garimpeiros estavam nas partes mais remotas da área Yanomami” (BARROS,
1995, p. 75). Para Barros (1995) a construção da BR 210 – Perimetral Norte no trecho
Caracaraí – Catrimani, sentido da fronteira com a Venezuela facilitou a entrada dos
garimpeiros. O aumento das atividades garimpeiras nessa região levou os Yanomamis
aproximarem suas aldeias para as margens das rodovias. O mesmo autor salienta que “os
índios tendiam viver perto dos acampamentos de garimpo. Em troca pelos trabalhos de força,
recebiam calções, camisas, relógios, rádios e toca fitas, bebidas, cigarros”. (1995, p. 79).
O resultado do avanço garimpeiro sobre a área Yanomami, segundo Barros (1995)
foi a contaminação dos cursos d’água por mercúrio e as doenças realizavam uma destruição
fulminante contra os nativos, devido os rios receberem dejetos de óleo diesel, gasolina,
esgotos humanos. Esse contato com água contaminada e doenças para Barros levou “muitos
Yanomamis desaparecerem, internando-se na floresta, outros procuravam desesperadamente a
medicina da sociedade para adiar a morte. [...] As enfermidades que mais atingiam eram:
malária, tuberculose, hepatite, desnutrição e doenças sexualmente transmissíveis etc”
(BARROS, 1995, p. 80. O aumento no numero de mortes por doenças e assassinatos de
indígenas, levou missionários e ativistas dos Direitos Humanos denunciarem nas Cortes
Internacionais.
97
A área Yanomami corresponde às partes montanhosas do noroeste de Roraima, fronteira com a Venezuela, e
as terras da floresta que se situam na metade leste da superfície estadual. Representa 54. 7000 quilômetros
quadrados em Roraima, sendo a maior reserva indígena do Estado, a partir dele se estende pelo Estado do
Amazonas. No território venezuelano fronteiriço, é lhes reservado área também. (BARROS, 1995, p. 76)
77
Portanto, a construção das rodovias federais BR 174 e 401 permitiram acesso para
outras regiões do país, e abriu caminho para o Mar do Caribe. Logo, uma das primeiras
medidas tomadas pelo governo federal foi à militarização de nossas fronteiras, garantindo a
segurança de nossa soberania. Seguiram-se medidas para desenvolvimento da região com a
implantação do II PND e o POLORORAIMA, mas o fim do milagre econômico levou o
governo corta gastos para a região, abrindo caminho para o front garimpeiro. Enfim, com a
Carta Magna de 1988, o Território Federal de Roraima, se transformou em Estado Federativo,
se iniciando um novo momento para a região.
78
Considerações Finais
Estado brasileiro, suas ideias foram sistematizadas pela Escola Superior de Guerra, que
formulou um projeto estratégico para a Segurança Nacional e Desenvolvimento do Brasil.
Portanto, quando os militares tomaram o poder em 1964, deram continuidade ao
projeto geopolítico de Segurança e Desenvolvimento de Getúlio Vargas e Juscelino
Kubistchek, só que, agora, aperfeiçoado por militares e geógrafos da Escola Superior de
Guerra. Para a Amazônia, foi lançada a “Operação Amazônia”. Essa posição chave assumida
pelos militares frente a região amazônica estava diretamente ligada a fatores internos e
externos: o interno ligado os problemas sociais no Nordeste proporcionado por uma grande
seca, o externo a vulnerabilidade da extensa e isolada fronteira da região e o surgimento de
possíveis “focos revolucionários”. Para resolver tais problemas, os militares criaram vários
órgão e projetos, aqui cito os mais relevantes na pesquisa, o Programa de Integração Nacional
– PIN e o Plano Nacional de Desenvolvimento – II PND. Em resumo, esses projetos só foram
possíveis graças às medidas tomadas de um Estado nacional autoritário de cunho nacionalista,
e o apoio do capital internacional.
Concluímos que, a construção das rodovias federais 174 e 401no extremo Norte da
Amazônia de forma acelerada, se deve as ideias geopolíticas, que incluíam integração
nacional, desenvolvimento regional e proteção das fronteiras. Estas estariam sem proteção de
países vizinhos em crise política, como a Guiana, após a chegada ao poder do nacionalista
Forbes Burnham (1966). Enfim, em 1977, estavam construídas as duas maiores obras
estratégicas do governo federal no extremo Norte da Amazônia - as rodovias citadas.
Porém, as construções dessas estradas acabaram afetando negativamente os povos
nativos da região, como: os ataques das forças armadas contra o povo Waimiri Atroari
levando-os quase à “extinção”. Outro povo tradicional que foi afetado foi os Yanomamis. No
campo, a maior parte dos migrantes que chagavam no Território Federal de Roraima foi
deslocada para o front sul do Estado, formando pequenos povoados que nas décadas seguintes
se transformaram em novos municípios.
Diante desse exposto proponho-me continuar os estudos iniciados sobre o tema,
possibilitando uma pesquisa mais densa que o TCC, apresentando possibilidades de
identificar em arquivos oficiais políticas públicas voltadas para a segurança nacional e o
desenvolvimento do extremo Norte da Amazônia. A continuidade da pesquisa buscará
entender historicamente como esse processo foi implantado e quais os impactos na vida da
nova sociedade roraimense.
80
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