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PARTIDO DA REPÚBLICA - PR
SUMÁRIO
I – DA LEGITIMIDADE ATIVA
III.II.I – AS
MANIFESTAÇÕES DOUTRINÁRIAS RELATIVAS À COMPENSAÇÃO
PREVISTA NO ART. 20, § 1º, CF
III.II.II – DAS
CONSIDERAÇÕES DO E. STF SOBRE OS ROYALTIES COMO
COMPENSAÇÃO SOCIOECONÔMICA E AMBIENTAL
1
C) A PREVISÃO DE COMPENSAÇÃO E A TELEOLOGIA DO ART. 20, § 1º, CF – A
PLATAFORMA CONTINENTAL E A MAIOR LEGITIMIDADE DE RECEBIMENTO
PELOS AFETADOS DO QUE PELOS CONFRONTANTES, CHAMADOS
“PRODUTORES”
IV – CONCLUSÕES
V – DA MEDIDA CAUTELAR
VI – DOS PEDIDOS
2
EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA MINISTRA
PRESIDENTE DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
com fundamento nos arts. 103, inciso VIII, 102, inciso I, alínea “a”; 5º, II
e LIV; 20, § 1º; 225 da Constituição Federal, contra os arts. 48 e 49,
inciso I, alínea “c” e inciso II, alínea “d”, da Lei n.º 9.478/97, na redação
original; arts. 48, inciso I, alínea “c” e inciso II, alínea “c” e 49, inciso II,
alínea “c”, da Lei n.º 9.478/97, na redação dada pela Lei n.º 12.734/2012;
e 42-B, inciso I, alínea “c” e inciso II, alínea “c”, da Lei n.º 12.351/10, na
redação dada pela Lei n.º 12.734/2012, pelos seguintes fundamentos a
seguir expostos:
3
I – DA LEGITIMIDADE ATIVA
02. Os atos normativos impugnados são: art. 48; art. 49, inciso I, alínea c;
art. 49, inciso II, alínea d, todos da Lei n.º 9.478/97, na redação original;
arts. 48, inciso I, alínea “c” e inciso II, alínea “c” e 49, inciso II, alínea
“c”, da Lei n.º 9.478/97, na redação do art. 3º da Lei n.º 12.734/2012;
bem como o art. 42-B, inciso I, alínea c; e inciso II, alínea c, da Lei n.º
12.351/10 (com a redação dada pelo art. 2º da Lei n.º 12.734/12), in
verbis:
(...)
(...)
II - .......................................................................
(...)
(...)
2
“Pelo exposto, na esteira dos precedentes, em face da urgência qualificada comprovada no caso,
dos riscos objetivamente demonstrados da eficácia dos dispositivos e dos seus efeitos, de difícil
desfazimento, defiro a medida cautelar para suspender os efeitos dos arts. 42-B; 42-C; 48, II; 49,
7
Ainda assim, são parte do ordenamento jurídico e podem ser
igualmente apreciados pela presente ADI, eis que a suspensão da
eficácia não tem o condão de retirar a norma do ordenamento jurídico.
Até que decisão definitiva seja prolatada, as referidas normas são
vigentes, válidas e, portanto, passíveis de serem apreciadas em sede de
controle de constitucionalidade. Por outro lado, em vista da referida
decisão, estão vigentes e eficazes parte dos textos originais da Lei n.º
9.478/97, designadamente os dos seus arts. 48 e 49.
04. Corolário disso é que a liminar concedida na ADI n.º 4917 também
suspendeu a eficácia do art. 48, inciso II e 49, inciso II, da Lei n.º
9.478/97, na redação dada pela Lei n.º 12.734/2012, razão pela qual, em
relação ao art. 48, inciso II, quando a lavra ocorrer na plataforma
continental, no mar territorial ou na zona econômica exclusiva, a parcela
do valor do royalty, previsto no contrato de concessão, que representar
cinco por cento da produção, continua sendo distribuída segundo os
critérios estipulados pela Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989, ex vi
do disposto na redação original do art. 48 da Lei n.º 9.478/97. A
suspensão do art. 49, II, da Lei n.º 9.478/97, com as alterações
promovidas pela Lei n.º 12.734/2012, também repristinou a eficácia da
redação original do art. 49, inciso II, da Lei n.º 9.478/97.
II; 49-A; 49-B; 49-C; § 2o do art. 50; 50-A; 50-B; 50-C; 50-D; e 50-E da Lei Federal n. 9.478/97,
com as alterações promovidas pela Lei n. 12.734/2012, ad referendum do Plenário deste Supremo
Tribunal, até o julgamento final da presente ação. Publique-se.”
8
II.I – DA VIABILIDADE DO PEDIDO DE DECLARAÇÃO
PARCIAL DE INCONSTITUCIONALIDADE: POLISSEMIA DA
INTERPRETAÇÃO LEGAL
3
Nesse sentido, analisando de modo equivocado as ações judiciais a que se referiu, nada obstante a
excelência da obra em outros aspectos, Fernando Facury Scaff. Royalties do petróleo, minério e
energia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 296. O referido autor entendia que tais ações
pleiteavam royalties para Municípios que lidavam com derivados do petróleo, o que não é o caso para a
interpretação postulada na presente ADI, e não era o caso tratado naquelas ações, em que os
Municípios prejudicados lidavam com óleo bruto ou gás natural.
10
interpretação da lei, sem que haja alteração alguma no texto normativo. É
exatamente o que se requer com a presente ação de controle abstrato de
constitucionalidade: impedir uma ou mais hipóteses de interpretação
dos dispositivos impugnados que ignorem os condicionamentos
normativos dados pelo próprio texto constitucional e por bens
jurídicos fundamentais ali constantes.
11
12. Como visto, a Constituição garante, na dicção do art. 20, § 1º, aos
municípios que sofram os efeitos da exploração do petróleo, uma
compensação no produto daí decorrente.4
7
A construção é de Carl Schmitt: Teoria de la Constitución, p. 175-177. Não cabe espaço aqui para
digressões teóricas mais aprofundadas, contudo, é necessário demarcar que Schmitt via a garantia
institucional como distinta dos direitos fundamentais. E ela de fato o é. Entretanto, há de se ressaltar
que, para Schmitt, direitos fundamentais eram apenas os propriamente chamados direitos de liberdade
(os de primeira geração). A distinção para a concepção aqui defendida é que, em nossa visão, a garantia
institucional pode ser o objeto do exercício de um efetivo direito fundamental. Vale ressaltar, porém,
que o próprio Schmitt admite que “hay garantias institucionales com derechos subjectivos y sin ellos
(...) pero a la esencia de la garantia institucional no le corresponde ni um derecho subjectivo, ni el
mantenimiento de uma via jurídica.” (p. 177) Nesse ponto, estamos de acordo com o controverso
jurista alemão.
8
Nesse sentido, J.J. Gomes Canotilho: Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, p. 252.
9
Idem, p. 252-253.
13
“interesses definidos em abstracto e ao sabor das constelações políticas
no poder.”10
10
Idem, p. 253-254.
14
“ADMINISTRATIVO – PETRÓLEO –
ROYALTIES – ICMS – ATIVIDADES DE
EXTRAÇÃO E DE REFINO E DISTRIBUIÇÃO –
COMPETÊNCIA DA ANP – ILEGITIMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO – DECRETO 01/91 – LEI
9.478/97 – DESTINAÇÃO DOS EQUIPAMENTOS.
(...)
2. Agência Nacional do Petróleo - ANP é competente
para regular as atividades econômicas integrantes da
indústria do petróleo (art. 8º da Lei 9.478/97) e
estabelecer critérios para o pagamento de royalties .
(art. 49, I, c, da Lei 9.478/97).
(...)
5. As instalações marítimas ou terrestres de
embarque ou desembarque de óleo bruto estão
arroladas no parágrafo único do art. 19 do Decreto
01/91, as quais não incluem parque de tancagem para
armazenamento de petróleo, parque de bombas e
transferência de petróleo, casa de bombas de combate
a incêndio.
6. O critério a ser atendido para o pagamento dos
royalties é o da destinação dos equipamentos, os
quais devem ser direta e primariamente voltados
à extração do petróleo, e não à distribuição e
refino.
7. O equilíbrio da distribuição entre os Municípios
da riqueza relacionada à atividade petroleira é
feito com a distribuição de royalties (diretamente
ligadas à extração do petróleo) e com o
16
recebimento do ICMS (demais atividades
relacionadas).
8. Recurso da UNIÃO parcialmente provido e
recurso da ANP provido”. (STJ, Recurso Especial n.º
1.119.643, Ministra Relatora Eliana Calmon,
julgamento em 20.04.2010, publicação em
17.08.2010)
26. Importa referir que esse acórdão teve seus efeitos suspensos, em vista
de liminar concedida na Reclamação n.º 10.958, ajuizada perante o STF.
É que o reclamante, Município de Osório, entendeu haver uma declaração
escamoteada de inconstitucionalidade na referida decisão, com o que se
12
De parte significativa dos 25% do produto do ICMS que retorna aos Municípios.
13
Perceba-se que a Reclamação não discute o acerto ou não da suposta interpretação com base na
Constituição. Cabe apontar, contudo, a necessidade de que tal construção, para sobreviver, requer ainda
o afastamento da ideia de uma interpretação sistemática entre o art. 20, § 1º e as possibilidades de
compensação por dano ambiental, situadas igualmente no nível constitucional.
18
ofenderia a cláusula de reserva de plenário. Assim dispôs o despacho da
Ministra Ellen Gracie:
14
STF, MS 24312/DF, Rel. Min. Ellen Gracie (trecho do voto do Min. Nelson Jobim), DJ 19.12.2003.
15
Art. 155 (...)
§ 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
X – não incidirá:
(...)
20
33. Ora, o art. 20, § 1º, CF, tem um alcance que transcende o eventual
“pensamento” do Constituinte quando da busca do equilíbrio entre os
Estados.
b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis
líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica;
16
Curso de direito constitucional, 6ª ed., p. 96.
21
25
E, diante deste comando lanço a seguinte indagação:
Tolher o direito de participação do município
requerente, sem que haja qualquer permissão
constitucional neste sentido, é prestigiar o princípio
do pacto federativo, que, em última análise, refuta
qualquer tratamento que implique no tratamento
desigual dos seus pactuantes???? É certo que não!
.......................................
E, na situação posta em juízo, a exclusão do direito à
compensação financeira dos entes municipais,
certamente, implica na desestabilização política,
social e enfraquecimento da unidade política, pois até
o presente momento, o direito constitucionalmente
assegurado à municipalidade está sendo restringido
indevidamente.
....................................
Por outro ângulo de análise, muito embora sustente o
eminente e culto Des. Arnaldo Santos Souza a edição
de diploma normativo para viabilizar a fruição do
direito subjetivo pleiteado pela municipalidade, não
vislumbro a necessidade da edição de diploma
normativo para esse fim, isto porque tal direito,
talhado expressamente no texto constitucional,
encontra-se perfeitamente materializado no artigo 48
da citada lei. Assim, vincular o direito dos royalties a
edição de nova lei é, em última análise, retirar do § 1º
do artigo 20 da CF o grau de eficácia jurídica mínima
que possui, já que a lei responsável pela
regulamentação da participação no resultado da
exploração direta e indireta do petróleo e gás natural
é a lei n° 9.478⁄97, e não outro diploma. A edição de
outro diploma normativo que trate do assunto pode
ocorrer, já que é da essência do direito sua mutação
ao longo dos tempos, vindo a aperfeiçoar um ou
outro ponto da lei em questão; mas que o direito da
municipalidade é patente e plenamente fruível, não
resta a menor dúvida.
Ante o exposto, data vênia, sigo caminho diverso do
percorrido pelo nobre relator e por aqueles que o
acompanham, entendendo por bem julgar procedente
a pretensão da municipalidade.
26
É como voto”. (grifos nossos)
17
Parecer divulgado no site: www.conjur.com.br. Acesso em 15.7.2010.
28
38. O eminente constitucionalista apresenta a conclusão inarredável a
respeito da interpretação do dispositivo da Constituição:
39. Na mesma linha, refere Luiz Cezar Quintans, ao interpretar o art. 20,
§ 1º, CF:
40. A Constituição, em seu art. 20, § 1º, bem como em seu art. 225,
preocupa-se em compensar todos aqueles que sofrem os efeitos da
exploração do petróleo, independentemente de suas instalações
estarem ou não diretamente ligadas a um campo produtor, ou de
terem mais pertinência à extração do que à distribuição do petróleo.
A noção de compensação é também uma tendência existente em nível
mundial, que se refletiu no Brasil, conforme dá conta outro estudo
específico sobre o tema:
18
Os Royalties do Petróleo na legislação brasileira e a Emenda Ibsen, In www.netlegis.com.br.
30
more acute conflicts, royalties address the residual
impacts. (…) If directs controls exercised by the
government were made more stronger, the need
for the royalty to account for residual pollution
would move inversely. A royalty in this case is the
value of remaining environmental impacts
(Schantz Jr, 1994).19 (grifos nossos)
19
Serra, Rodrigo; Leal, José Agostinho. Uma investigação sobre os critérios de repartição dos
royalties petrolíferos. In Piquet, Rosélia (org.). Petróleo, Royalties e Região. p. 168-169. Rio de
Janeiro: Garamond, 2003. Vale referir que esse autor aponta, como se verá na sequência, um
fundamento econômico autônomo, ligado a esses apresentados, sem necessariamente excluí-los.
31
o petróleo. Vale dizer, justamente aos municípios afetados por esses
efeitos.
45. Não importa tratar aqui da questão tributária, base desse precedente,
mas das considerações tecidas em torno do art. 20, § 1º, da Constituição,
designadamente: a) da titularidade dos bens; b) da ênfase na teleologia do
dispositivo constitucional, especialmente na noção de que a compensação
serve a minorar danos ambientais, sociais ou econômicos; c) do fato do
acórdão ater-se exclusivamente à lavra de recursos minerais em solo, e de
uma contribuição voltada à exploração desses recursos.
50. Deflui da análise doutrinária, bem como desse próprio STF, uma
ênfase na compensação como um mecanismo de recomposição de
riscos e/ou danos ambientais, econômicos e sociais decorrentes das
atividades envolvendo o manejo do petróleo. É o que se aprofundará na
sequencia, na exegese dos arts. 20, § 1º e 225, CF, com ênfase na
razoabilidade e igualdade.
21
Adiante, a citação de Smend, aplicável também à situação acima exposta.
22
Sem falar na confusão que se pode estabelecer também do termo produção, consoante o art. 6º, inc.
XXVII da Lei n.º 9.478/97. Vê-se ali que faz parte da cadeia produtiva o sistema de produção de
petróleo, que inclui a distribuição, a revenda e a estocagem, bem como o consumo de petróleo. Ou seja,
tudo isso faz parte da produção de petróleo, uma das causas que autoriza o recebimento pelos
Municípios.
23
Cf., por todos, Dimoulis, Dimitri (Coord.-Geral). Dicionário Brasileiro de Direito Constitucional.
Verbete: Interpretação Constitucional, p. 195 (por André Ramos Tavares). Saraiva: São Paulo, 2007.
36
55. Como bem afirma Friedrich Müller, o conceito jurídico de um
termo difere do conceito técnico que ele possui em sua área do
conhecimento. Texto e contexto se confundem, e para o jurista
germânico, os conceitos não poderão ser entendidos de uma maneira
convencional, como simples abstrações de elementos encontráveis na
realidade, mas sim diante de uma sua inevitável especificidade jurídica:
os conceitos jurídicos são, sem dúvida, fórmulas redutoras, ordenadoras,
referidas à realidade (sachbezogene, ordnende Abkürzungsformeln). 24
Não serão, porém, simples abstrações desta. Ao contextualizá-lo, dentro
de um texto válido, com pretensão de normatividade, o conceito jurídico
transforma aquele conceito oriundo de outra área do conhecimento, ao
mesmo tempo que com ele se relaciona.
59. Contudo, ainda que, por si só, a noção de exploração fosse tomada de
modo restrito, ela deve ser compreendida em interpretação sistemática
com o restante do próprio dispositivo, de outros excertos da Constituição
e, em especial, do âmbito normativo consistente nas particularidades da
indústria do petróleo.
64. Ora, já quanto à lavra em terra, mesmo que os bens do subsolo sejam
da União, fica claro que o dispositivo constitucional remete o benefício
ao município em cujo território ela ocorre.
26
Cf. Müller, Friedrich. Juristische Methodik, 9ª ed., p. 269 e ss.
39
do próprio art. 20, § 1º, CF, veremos que outras “interpretações literais”
são possíveis. Isso desde logo porque o próprio dispositivo faz a
referência ao termo exploração (cuja adequação do significado amplo foi
já acima tratada), bem como à noção de compensação pelo petróleo
extraído da plataforma continental. Tudo o que remete à necessidade de
investigação do sentido desses termos e de sua correlação recíproca. Em
outras palavras, para além de várias conclusões sob o aspecto literal, a
contribuição desse elemento é insuficiente para se chegar a uma noção
mais aprofundada. Isso exige a presença de outros elementos de
interpretação e de concretização.
40
C) A PREVISÃO DE COMPENSAÇÃO E A TELEOLOGIA DO
ART. 20, § 1º, CF – A PLATAFORMA CONTINENTAL E A
MAIOR LEGITIMIDADE DE RECEBIMENTO PELOS
AFETADOS DO QUE PELOS CONFRONTANTES, CHAMADOS
“PRODUTORES”
74. Essa ficção foi sacramentada por lei, como se verá na sequência.
42
28
O art. 1º da Lei 7453/85 deu nova redação ao art. 27, § 4º, da Lei 2004/53.
Art. 1º...........................
§ 4º - É também devida a indenização aos Estados, Territórios e Municípios confrontantes, quando o
óleo, o xisto betuminoso e o gás forem extraídos da plataforma continental, nos mesmos 5% (cinco por
cento) fixados no caput deste artigo, sendo 1,5% (um e meio por cento) aos Estados e Territórios; 1,5%
(um e meio por cento) aos Municípios e suas respectivas áreas geo-econômicas, 1% (um por cento) ao
Ministério da Marinha, para atender aos encargos de fiscalização e proteção das atividades econômicas
das referidas áreas, e 1% (um por cento) para constituir um Fundo Especial a ser distribuído entre todos
os Estados, Territórios e Municípios.
43
77. Isso coincidiu justamente com o incremento da produção de petróleo
oriundo da plataforma continental, bem como com os ventos da
redemocratização política do país, em que o federalismo e a
descentralização de recursos ganharam impulso.
81. Ora, por mais que a Constituição tivesse tomado as referências então
dadas pela lei para a redação do art. 20, § 1º, os significantes ali
inseridos assumem agora outros contornos. Como se sabe, a
interpretação dos dispositivos constitucionais não se deve vincular
aos significados legais prévios de dispositivos anteriores idênticos ou
assemelhados. Essa é a lição clássica do constitucionalista Rudolf Smend,
que consolida a força da Constituição. Como elegantemente afirma o
mencionado autor:
83. Desse modo, mesmo que se desse vazão à força do elemento genético
de interpretação, e que se entendesse presente o chamado critério do
determinismo físico, ainda assim a noção de prejudicialidade, de
impactos ambientais, está inserida também nos dispositivos legais que
contemplavam os confrontantes, quando menos para a caracterização das
áreas geoeconômicas. Em outras palavras, caso se entendesse,
erroneamente, dever-se tomar como referência os critérios existentes
na lei anterior para a compreensão do dispositivo constitucional,
mesmo aí está ínsita, a par do determinismo físico, a noção de
prejudicialidade para qualquer compreensão que se venha a fazer de
municípios portadores de instalações ou afetados por operações de
embarque e desembarque de petróleo.
Verfassung wegen. Sie verfolgen nicht die technischen Sonderzwecke jener einzelnen Rechtsgebiete,
sondern den konsttuierenden Gesamtzweck des Verfassungsrechts. (...) der abgescriebene Satz (des
Privatrechts – R.B.) rückt in eine andere Ebene und in seinem ganz neuen, ihm bisher fremden
Bedeutungszusammenhang und tritt infolgedessen zugleich in ein Verhältnis eigentümlicher
Inkommensurabilität zu seiner Vorlage und der technisch gemeinten Umgebung, aus der sein Wortlaut
stammt.”
47
31
Os autores analisam, sob o prisma da teoria econômica, os fundamentos para o pagamento de
royalties. Concluem, quanto a Estados e municípios que, para além da peculiaridade da questão
federativa e fiscal no caso brasileiro, devem receber todos os Municípios que efetivamente sofram os
efeitos da indústria petrolífera, não apenas pelos impactos que causa, e também nem só pelo
incremento de infra-estrutura necessária, mas fundamentalmente porque essa infra-estrutura, em
determinado momento, se tornará obsoleta, dada a finitude dos recursos (Impropriedades dos critérios
de distribuição dos royalties no Brasil, in: Petróleo, Royalties e Região, p. 191-192). Há, pois, um
peculiar mecanismo de justiça intergeracional, cujas bases estão fincadas na teoria de Hotteling.
Hartwick, baseado em Hotteling (pioneiro na análise de um peculiar conceito de renda mineral. Seus
estudos baseavam-se na hipótese de um explorador privado, razão pela qual sua teoria sofre ajustes
quando o bem é do poder público), sustenta que “a geração atual deixe, para a futura, capital
reprodutível, humano ou natural, o suficiente para que esta mantenha um padrão de vida satisfatório”.
Assim, “a geração atual deve converter parte da renda gerada (renda de Hottelling) pela extração de
recursos não-renováveis em máquinas e trabalho... Lembrando Hotteling, se o valor do recurso é o
valor futuro descontado para o presente e, uma vez aplicada a regra de Hartwick, estará preservando-se
o montante total de capital.” Tudo em Rodrigo Serra e Carla Patrão, op. cit., p. 192.
32
Serra, Rodrigo; Patrão, Carla, op. cit., p. 202-203.
48
apenas para aquinhoar os confrontantes, mas também com o objetivo
de definir o sentido de “instalações de embarque e desembarque de
petróleo” e de municípios afetados por operações de embarque e
desembarque de petróleo. Assim, em vez de limitar a utilização do
critério para os confrontantes, a ANP subverteu a teleologia dos arts.
48 e 49, incrementando o determinismo físico ao exigir uma suposta
ligação ao campo produtor – na plataforma continental!!! – da
instalação de embarque e desembarque que recebe o petróleo dali
oriundo e transportado até a costa brasileira.
33
Op. cit., p. 203.
49
altera em vista da instalação do aparato da indústria do petróleo,
com todas as conseqüências daí advindas; (ii) em função de impactos
ambientais e/ou paisagísticos; (iii) em vista da essencialidade das
instalações localizadas nos municípios, para o adequado escoamento
do petróleo e do gás natural, com eventuais riscos ambientais daí
advindos. Portanto, quando verificadas ao menos uma destas condições,
os municípios confrontantes se equiparam aos afetados, detendo a mesma
legitimidade que estes últimos.
50
91. Como se sabe, a indústria petrolífera destaca-se por dois aspectos: sua
vitalidade enquanto matriz energética, com enorme impacto para as
atividades econômicas; e pelas consequências danosas de sua atividade,
em vista dos impactos ambientais e socioeconômicos dela decorrentes.
34
Müller, Friedrich. Juristische Methodik, 9ª ed., p. 37. O autor destaca, porém, que se trata aqui de
uma realidade recortada já pelo texto de norma. Para um singelo exemplo no direito brasileiro, quando
a Constituição reconhece a existência da liberdade de associação para fins pacíficos, está já a excluir
aquelas associações paramilitares, eventualmente encontráveis na realidade, mas não admitidas pelo
direito.
35
Cf., por todos, Daniel Yergin. O Petróleo. Scritta Editora, 1989.
51
exploração em regime de monopólio (art. 177). Aliás, mesmo a
apropriação da plataforma continental pelo Estado brasileiro teve em mira
os potenciais petrolíferos ali existentes.
Art. 225
(...)
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica
obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de
acordo com solução técnica exigida pelo órgão
público competente, na forma da lei.
56
ambientais. Perceba-se aqui que a legislação explicita exigências já
existentes no nível constitucional, designadamente na parte relativa
ao meio ambiente, não se tratando, pois, de uma inusitada
interpretação sistemática entre dispositivos no nível constitucional e
outros em nível infraconstitucional.
38
No mesmo sentido, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (10.12.1982) exige uma
série de cuidados para o transporte de petróleo no mar.
39
Apud Maria Augusta Paim: O petróleo no mar: o regime das plataformas marítimas petrolíferas no
direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 355.
57
D.3) CONSEQUÊNCIAS PARA A CONCRETIZAÇÃO LEGAL
DOS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS
104. Ora, é bem de se ver que, como bem referido pelo voto do Min. José
Delgado e pela acurada análise do Prof. e Min. Luís Roberto Barroso, da
exigência constitucional de compensação surge a necessidade de proteção,
pela legislação, àqueles municípios afetados pelas atividades envolvendo
o manejo do petróleo e do gás natural.
108. Portanto, também por essa visão, a tese da ANP, secundada pelo STJ,
ao restringir os royalties à lavra no território do município, quando da
exploração na plataforma continental, não tem respaldo constitucional. A
Constituição não faz a diferenciação entre extração e transporte do
óleo bruto, para fins de pagamento de royalties aos municípios. A
Constituição não promove a divisão das atividades para efeitos de
compensação financeira pela exploração. Ao contrário, a Carta Magna
deliberou pelo regime de monopólio das atividades consideradas em
bloco, ou seja, considerou o seu conjunto.
60
IV – CONCLUSÕES
62
apenas para os primeiros municípios que recebem o óleo bruto da
plataforma continental, como especialmente para aqueles que o
armazenam e o processam.
8) Isso tudo é também corroborado por uma atividade de
interpretação/concretização do art. 20, § 1o, CF, designadamente através dos
elementos de interpretação, aí incluído o âmbito normativo;
9) É cânone da interpretação constitucional a consideração de que seus termos
são utilizados num sentido mais leigo, sem tanta precisão técnica. É o que
também acontece na referência à exploração feita pelo § 1º do art. 20 da
Constituição. Além disso, como afirma Friedrich Müller, o conceito jurídico
de um termo difere do conceito técnico que ele possui em sua área do
conhecimento. Fosse, aliás, um conceito técnico do ramo do petróleo, a
exploração seria o equivalente à mera pesquisa, prévia à atividade de extração.
O significado mais adequado ao termo é comum, no sentido de “fazer
produzir; desenvolver (um negócio ou indústria); empreender, cultivar”. O
termo exploração, pois, não significa unicamente a atividade de extração de
petróleo e gás, para fins de distribuição dos royalties. A exploração de
petróleo e gás, para fins constitucionais, constitui atividade complexa que se
inicia com a pesquisa, passa pela extração, pelas atividades de embarque e
desembarque e culmina com o processamento, quando então se transforma
em outro produto, pronto para o consumo;
10) Tanto o elemento literal quanto o teleológico indiciam que, quanto à
exploração na plataforma continental, a atividade passível de compensação é
a de suporte logístico para o transporte, armazenamento ou
beneficiamento do petróleo. Corolário disso é que, quanto às atividades
desenvolvidas na plataforma continental, têm mais legitimidade para o
recebimento os municípios portadores de instalações de embarque e
desembarque de petróleo e aqueles por elas afetados, do que os meramente
confrontantes, chamados também produtores, que têm relação indireta com a
extração;
11) Mesmo que se desse vazão à força do elemento genético de interpretação, e
que se entendesse presente o chamado critério do determinismo físico, a
63
aquinhoar os municípios confrontantes pela mera extensão fictícia de suas
linhas ao território da plataforma continental em que ocorre a extração de
petróleo, ainda assim a noção de prejudicialidade, de impactos ambientais e
socioeconômicos, está inserida também nos dispositivos legais que
contemplavam os confrontantes, quando menos para a caracterização das áreas
geoeconômicas, cujos municípios integrantes também estão aptos ao
recebimento de royalties. Em outras palavras, caso se entendesse,
erroneamente, dever-se tomar como referência os critérios existentes na lei
anterior para a compreensão do dispositivo constitucional (pois é sabido que,
na Constituição, termos de leis anteriores que inspiraram determinados
dispositivos ganham outro significado), mesmo aí está ínsita, a par do
determinismo físico, a noção de prejudicialidade para qualquer compreensão
que se venha a fazer de municípios portadores de instalações e/ou afetados por
operações de embarque e desembarque de petróleo;
12) Porém, em vez de limitar a utilização do critério do determinismo físico para
os confrontantes, a ANP subverteu a teleologia dos arts. 48 e 49 (arts. 48,
inciso I, alínea “c” e inciso II, alínea “c” e 49, inciso II, alínea “c”, da Lei n.º
9.478/97, na redação dada pela Lei n.º 12.734/2012), incrementando esse
critério ao exigir uma suposta ligação ao campo produtor – na plataforma
continental!!! – da instalação de embarque e desembarque que recebe o
petróleo dali oriundo e transportado até a costa brasileira;
13) Estudiosos dos impactos da atividade petrolífera sobre municípios e regiões,
Rodrigo Serra e Carla Patrão afirmam restar, “como definição sensível aos
efetivos impactos econômicos das atividades petrolíferas sobre o continente, o
conceito de municípios onde se localizam instalações marítimas ou terrestres
de embarque ou desembarque vinculados àquela indústria.” (grifos nossos);
14) O art. 20, § 1º, CF, mediante a noção de compensação, corrobora a
necessidade de uma indenização em face de um prejuízo sofrido pelos
municípios que suportam as atividades de embarque e desembarque de
petróleo ou são por elas afetados;
15) A compensação justifica-se nos seguintes casos: (i) quando a vocação
socioeconômica do município se altera em vista da instalação do aparato da
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indústria do petróleo, com todas as consequências daí advindas; (ii) em função
de riscos ou impactos ambientais e/ou paisagísticos; (iii) em vista da
essencialidade das instalações localizadas nos municípios, para o adequado
escoamento do petróleo e do gás natural, com eventuais riscos ambientais daí
advindos. Afora tais situações, são aquinhoados constitucionalmente também
os municípios confrontantes;
16) O âmbito normativo revela que a indústria do petróleo é primariamente
poluente, portanto de forte impacto ambiental, devendo ser abarcada no
regime de cautelas e políticas de prevenção previstos no art. 225 da
Constituição. O petróleo e o gás natural, nesse sentido, devem ser
considerados também recursos minerais, estando aqueles que os exploram
obrigados a recuperar o meio ambiente degradado, nos termos do art. 225, §
2º, CF;
17) O meio ambiente degradado, quando da exploração na plataforma continental,
não é somente a área respeitante aos equipamentos situados no mar. O meio
ambiente que se degrada é também e fundamentalmente aquele respeitante às
áreas em que situados os equipamentos em terra, que acolhem o petróleo
oriundo do mar. Essa recuperação é feita em variante do princípio poluidor-
pagador, consistente no pagamento de royalties;
18) Cabe referir outro elemento do âmbito normativo, crucial para a compreensão
dos municípios a serem compensados. Trata-se da complementaridade entre as
estruturas e equipamentos existentes para o recebimento do petróleo oriundo
da plataforma continental. Com efeito, uma monobóia necessita de um parque
de tancagem, e vice-versa; e ambos necessitam, posteriormente, de uma
refinaria. Se situados em Municípios diversos, obviamente que devem todos
eles receber a devida compensação, na modalidade royalties;
19) As hipóteses de interpretação da lei que exigem, para distribuição de
royalties: a) a ligação direta da instalação ao campo produtor; ou b) maior
pertinência à extração do que à distribuição do petróleo, são inconstitucionais,
na medida em que excluem municípios portadores de instalações e/ou
afetados, todos sofredores de iguais ou maiores impactos ambientais,
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socioeconômicos ou paisagísticos, do direito à compensação. Esse direito à
compensação é norma de índole constitucional;
20) Além disso, os referidos critérios restritivos são completamente destituídos de
razoabilidade e igualdade. Com efeito, como se pode exigir ligação direta a
um campo produtor localizado por vezes a dezenas ou a mais de uma centena
de quilômetros da plataforma continental? Nesses casos, artificialmente está-
se a considerar que a ligação direta faz-se com o “primeiro ponto” de
desembarque do óleo. Não há, contudo, razoabilidade nessa consideração. E a
igualdade resta violada, na medida em que outros municípios não são
compensados como os primeiros que recebem o óleo bruto da plataforma
continental;
V – DA MEDIDA CAUTELAR
114. Na ADI n.º 5353, o Min. Rel. Roberto Barroso sustenta a ideia de
unidade do sistema de controle concentrado de normas pelo Supremo
Tribunal Federal, com a consequente possibilidade de aplicação analógica
do art. 5º, da Lei n.º 9.882/99 e do art. 21, da Lei n.º 9.868/99, que
facultam a suspensão do andamento de processos que envolvam a
aplicação da lei ou ato normativo questionado. Vejamos:
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III. Da possibilidade excepcional de suspensão do
andamento de processos
7. A ação direta de inconstitucionalidade, por
constituir processo objetivo de fiscalização de
constitucionalidade, não se destina à resolução de
situações concretas. No entanto, como todas as leis se
destinam a produzir consequências no mundo real,
não pode ser indiferente ao intérprete situação
excepcional e grave que envolva a aplicação do ato
impugnado. É esta a hipótese aqui. Está-se diante de
decisão judicial potencialmente capaz de gerar
situação irreversível, além de afetar o direito
fundamental de liberdade.
8. A Lei nº 9.882, de 3.12.1999, que disciplina a
arguição de descumprimento de preceito
fundamental, prevê, em seu art. 5º, a possibilidade de
concessão de medida liminar para a suspensão do
andamento de processo ou dos efeitos de decisões
judiciais (§ 3º), inclusive monocraticamente, em caso
de extrema urgência ou perigo de lesão grave (§ 1º).
Da mesma forma, a Lei nº 9.868, de 10.11.1999,
contempla, em relação à ação declaratória de
constitucionalidade, a suspensão do julgamento de
processos que envolvam a aplicação da lei
questionada (art. 21).
9. Não existe, é bem de ver, previsão idêntica no
tocante à ação direta de inconstitucionalidade.
Porém, o Supremo Tribunal Federal tem evoluído, ao
longo do tempo, para tratar as ações diretas como
uma unidade conceitual. Existe, na verdade, um
gênero, que é a ação constitucional, que comporta
variações de espécies, em razão de seus requisitos e
do seu objeto. Tais ações, no entanto, sujeitam-se a
uma disciplina uniforme, no que couber. Por esta
razão, afigura-se perfeitamente possível a aplicação
analógica da possibilidade de concessão de medida
cautelar suspensiva de ações em ação direta de
inconstitucionalidade. Não fora por esta razão, a
providência estaria legitimada pelo poder geral de
cautela do juiz.
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10. Deve-se observar, ademais, que mesmo no
controle incidental de constitucionalidade, o relator
da causa no Supremo Tribunal Federal pode
determinar a suspensão de todos os processos que
versem sobre a matéria discutida em regime de
repercussão geral, conforme previsto no art. 328, in
fine , do RI/STF. Não há razão para que o mesmo
não possa valer para o controle concentrado. Aliás,
existem precedentes do Tribunal nessa linha, como
ilustram as ADIs 4.627 e 5.298, de relatoria do Min.
Luiz Fux.
alínea “c”, da Lei n.º 12.351/10, na redação dada pela Lei n.º 12.734/2012,
decorre dos possíveis danos em razão da demora na decisão.
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117. A prevalecer a tese da ANP, inúmeros municípios podem ser
privados do seu direito constitucional de percepção dos royalties do
petróleo. Isso suscitará enorme desequilíbrio federativo, excluindo-se
municípios amplamente legitimados, em prol de outros que já recebem
generoso quinhão na distribuição dos royalties.
VI – DOS PEDIDOS
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c) seja excluída a interpretação de que é permitido à ANP a livre
definição dos critérios de afecção, bem como do que sejam operações de
embarque e desembarque de petróleo e gás natural.
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