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POEMAS

SEM
LUGAR
(poesia 2M5)
I.J. Ansotegi Suárez
ABRIL 2005

Horizonte

RIVERA: La frontera social y la religiosa les importan más que la frontera


nacional.
GARCÉS: Entonces, la nación no existe.
M. Azaña, La velada en Benicarló

Um café, uma fiestra:

E se a Liberdade
é uma puta de luxo
que nunca poderei pagar?

Nesse casso, só desta vez,


deixai-me a venda nos olhos,
desta vez, só desta vez,
prefiro a ignorância.

Compreendei-me
faz-me falha algo de transcendência,
toda vez que...
a Nação...
o Amor...
o Socialismo...
a Família...
a Ciência...
a História...
Deus...
a Anarquia...
a Poesia...
toda vez que queimei
as bonecas de trapo.

Na rua floresce a primavera,


bronzeando as peles e os sentidos.

Miro-a
nua no meu leito
e
entra-me
muita fome.

Um beijo no joelho,
para começar,
e penso que algo deve de haver
para além do horizonte.
Carta azeda
ya comprendo la verdad

ahora
a buscar la vida
A.Pizarnik, "Solamente"

No busques en los libros


sólo aquí, dónde corazón y calle
se encuentran y se besan. Sólo
aquí queda sitio para un poema.
Graffiti, Palacio de los Morlanes, Zaragoza, 1998
Querido poeta:

Sou a poesia que levas anos procurando,


quero informar-te
de que já não vivo mais nos teus livros,
nem nos teus pensamentos,
nem nos teus desejos,
nem nas tuas angúrias.

Que vivo nas sabas suadas,


nos bancos dos parques,
nos jogos cos brinquedos,
nos sorrisos e nas envejas,
nos saloucos dos desenganados,
nos berros dos partos,
nas bágoas dum enterro,
no sémen derramado nuns peitos,
no sangue coalhado dum torturado,
na calor dos corpos nus,
no pranto dum recém,

porque entre o ermo das letras e mim


há a mesma distância
que entre viver e dizer.
MAIO 2005
Domingo de leitura
los que permanecemos corremos a refugiarnos
en la roja palpitación de la única certidumbre segura y cálida:
el abrazo
el pecho
de los que amamos.
G. Belli, "Mensaje al final del año 2001"

Todas as minhas arelas,


colher a sua mão,
sós, esquecidos, imanentes,
abraçados num lugar...
qualquer
num país...
qualquer
num planeta...
qualquer
numa galáxia...
qualquer
num universo...
qualquer.

O que fizemos, à tarde.

Às vezes,
as arelas
são tão eternas
e tão frágiles...

Mas sem elas,


como topar sentido,
como contar histórias,
como vencer o medo ao mundo
sendo minúsculos,
como fugir da derrota?

Por quê? Pró quê?

Não há leitura possível


sem alfabeto.
Orfo

esta galería oscura, oscura, este hundirse sin hundirse.


A. Pizarnik, "La palabra del deseo"
Sem fé,
agachado trás das potencialidades,
no sem sentido,
pensar
o por quê
tão só uma vez
não é verdade?

Será ela
a verdade?
Ou ficarei
sem topá-la?

Podias
fazer favor
e ser
a minha verdade.
Ítaca
O sonho que passou não volta mais.
M. Alegre, "O grande ziguezague"

Se todos os caminhos levam


à mesminha parte.

A NENHUMA.

Se nada tem sentido.

Busquémo-lo.
JUNHO 2005
Diagnose sem prognose

Alguna vez creí en los glóbulos blancos


Leopoldo María Panero, "Al oeste de Greenwich"
Primeiro o DEVER
depois
o PRAZER.

DEVER/PRAZER

Não acredito
nessa dicotomia.
Não posso acreditar
em nenhuma dicotomia:
HOMEM/MULHER
BOM/MAU
FALSO/VERDADEIRO
PORTUGUÊS (GALEGO)/(GALEGO)ESPANHOL
(...)

Sou
post-sexual
post-ético
post-científico
post-nacional
post-(...)

Sou post-

Uma forma de não tomar partido.


Uma forma de COVARDIA.
Uma outra forma de acubilhar-me.

Porque quando uma mãe


assassina aos seus filhos
e, depois -sempre depois!-,
tenta suicidar-se
hoje,
eu...eu... (SILÊNCIO)... fico mudo,
porque quando as minhas mãos
acarinham uns peitos sedosos
o meu caralho ergue
o pendão de guerra
e, asemade, indiscreto,
berra que está preparado
prá batalha final,
NÃO É ISTO TOMAR PARTIDO?

Bem seguro.

Mas isso não faz certas


as dicotomias,
todas são tão certas
coma TOLÉMIA/RACIOCÍNIO
ou, melhor,
todas são tão falsas
coma TOLÉMIA/RACIOCÍNIO.

Não é, Franco Basaglia?


Mas,
se nada é certo,
e nada é falso,
o quê se pode esperar?

Sinto
que extravio o sentido de realidade,
melhor dito, o efeito de realidade,
sinto
que sou um louco racional,
uma puta virgem,
um violador respeitoso,
uma guerra pacífica,
um pederasta civilizador,
e todas as criaturas inimagináveis e reais.

Há algum/a,
só preciso dum/a,
que me entenda?

Há algum/a,
só uma vez,
que mo explique?

Poderias
explicar-me
o por quê
às noites
gostaria de colher
a auto-estrada das tuas pernas,
introduzir-me no teu ventre,
e, em posição fetal,
fechar os olhos,
sentir a tua calor,
perder-me no preto infinito
do teu interior,
e não sentir,
não pensar,
nada. NADA.

NADA.
OUTUBRO 2005

Sonhei contigo
Somos el tiempo que nos queda
J.M. Caballero Bonald
Desejando inseguras arelas,
mentres passa
imparável,
inexorável,
o tempo.

Arelas que são puro cimento,


cimento de ar sonhador,
cimento de espera
e de nada.

Mas todo o que temos.

'Tu não sabes o quê é a vida'

Viver era isto.

Crer-se John Wayne


ou He-Man,
tanto tem!,
assemade todo sucede.

Viver era isto.

Mirar cara dentro,


e descobrir a animalidade essencial,
o ódio que é o reverso imprescindível do amor,
e o inferno. Descobrir a humanidade,
só isso, humano,
uma besta armada com a reflexividade,
o quê fazer com ela??

Não quedar a soas com um mesmo,


ou não quedar a soas com o euskara,
tanto tem,
não é, Izagirre?

Um espelho definitivamente roto,


e o sorriso debuxa-se já,
para sempre,
noutros horizontes...

...quiçá morder o teu colo,


quiçá o tacto e o olor do teu cabelo,
quiçá nada disto.

O mau do futuro é que é incerto.

Viver era isto.

Passam os dias,
coma passam as galinhas,
em vida graças à covardia.

Soa música na rádio:


¿qué ha pasado, que no quiere salir?
Un rayito de sol que me ayude a vivir.
¿qué ha pasado, se ha olvidado de mí?
Yo me siento triste si el cielo está gris.

Viver era isto.

Contar histórias
para não contar o que passa,
histórias falsas que ajudam a digerir a realidade,
coma esta noite,
que sonhei contigo o derradeiro sonho, pólvora molhada, que me quedava.

Viver era isto,


levantar-se autómata do leito e existir,
só porque sonhei contigo,
só porque a dúvida disse que quiçá sonhar seja criar,
mália toda a evidência à contra.

Viver é o burro e a cenoira,


não morre o corpo,
a morte é ser consciente de que não acadarás a cenoira.

Viver é morrer,
somos el tiempo que nos queda, que dizia o poeta.

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Epílogo:
São os poemas do cansaço do que já não amarra em nenhum porto nem lugar do mundo.
A pluma foi-se submergindo no silêncio... e já quase no diz nada.

A bom entendedor, poucas palavras...

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