Docente na Escola E.B. 2,3 de Abação Educar para a televisão
Vivemos no tempo da mediocracia, em que impera o virtual. De facto, actualmente, o
poder é da comunicação. E por isso os media são o instrumento mais eficaz para transmitir valores. As crianças já nascem e crescem num ambiente de que fazem parte integrante, e do qual são referência central, os media. Destaca-se a televisão com um papel mais forte e activo na educação das crianças. A televisão está omnipresente no nosso dia-a-dia. Uma vez que a tudo que a televisão apresenta, realidade ou ficção, está transposto para imagens, as crianças habituam-se a uma vida baseada no virtual. O grande problema é que o mundo por imagens, que é proposto pela televisão, desactiva a capacidade de abstracção e, com ela, a capacidade de compreender os problemas e de os enfrentar racionalmente. Dá-se uma perda da capacidade em utilizar a linguagem abstracta e nota-se já, na geração jovem, uma acentuada imprecisão na linguagem e uma incapacidade para estabelecer uma conversação simples e normal. Porque apoiadas no vazio, as gerações assim habituadas não têm sentido crítico, não são racionalmente activas, não conhecem as suas origens, não reconhecem raízes, não possuem valores firmes para se agarrarem. Do livro “Comandados à distância”, extraí um excerto de uma entrevista com uma professora primária americana, Kimberley Palmer, que refere as seguintes características, como típicas das crianças que vêem demasiada televisão: “A criança que vê muita televisão (criança média) tende a ser menos pronta a seguir instruções ou escutar conselhos. Mais agressiva e tende a achar que essa agressividade é natural, tende a ter um sistema de valores desordenado e é prejudicada por uma noção distorcida do que correcto ou errado. A criança média, mesmo no quarto ano, já é, em perspectiva, sexualmente permissiva, em vez de adoptar a orientação da família, da igreja ou da escola, imita as personagens da televisão e do cinema – até na linguagem, nos modos e no comportamento. A criança média não gosta de ler seja o que for e opõe resistência a qualquer oportunidade de melhorar a capacidade de escrever. Tem falta de criatividade, é apática e tem pouca imaginação. Tem uma noção distorcida e aberrante da realidade e do mundo – tendente a fazê-la viver num estado de permanente receio”. Como não podemos omitir “o peso que a TV possui para remar contra a maré, difundindo valores, mundividências e comportamentos que violentam o sentir geral” 1, esta passou a ser uma questão central para todos (filosofia, sociologia, Igreja, educação, escola). Para os professores a televisão é fonte de preocupação, é uma ameaça. Ameaça, pelo tempo que ocupa no dia-a-dia dos alunos e que os impediria de dedicar-se o necessário aos deveres escolares, à leitura, ao sono, a outras actividades. Ameaça, também, a capacidade de concentração e de atenção. Ameaça a disponibilidade para os requisitos que são considerados necessários à aprendizagem: o esforço, a repetição, a progressão, a avaliação. Na televisão tudo é fácil e atraente, tudo gratifica, tudo sugere que se pode aprender sem custo: basta estar lá e consumir ainda mais2. É urgente a educação para o uso crítico e inteligente da televisão por parte dos nossos alunos. Os professores, na escola, devem ensinar a ver televisão. Ajudar os alunos a distinguir o que é bom e o que é mau. “Ajudar a distinguir o que é real do que é ficcional; questionar a credibilidade que as crianças atribuem à televisão; aprender a avaliar programas e a tomar posição sobre eles; aprender a confrontar a informação televisiva com a experiência de outras pessoas que conhecemos e consulta outras fontes”3. É importante que os alunos percebam que para «ler» o sentido das imagens, é preciso «ver» para além do que se vê. Têm de compreender que nem tudo o que vêem na televisão é fidedigno. Devem, os alunos, conseguir questionar a credibilidade atribuída à televisão. Devem aprender a avaliar programas e a tomar posição. Devem ser ensinados não a ''ver televisão'', mas sim a ver programas de televisão. Assim poderão revelar a capacidade de selecção e discriminação. No final, os alunos devem saber que a televisão tem três funções: divertir, informar e educar. A televisão pode, ainda, ser um campo e pretexto de expressão e comunicação. Fazer da televisão tema de conversa e de reflexão pode incentivar à participação alunos com interesses divergentes dos escolares. A possibilidade de desenvolver competências de expressão sobre vivências originadas pelos programas televisivos pode constituir um estímulo para outras aprendizagens.
1 PINTO, Manuel – Televisão, escola, família, Lisboa: Ed. Presença, 2002, p. 46 2 IBIDEM, p. 47. 3 IBIDEM, p. 57