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Universidade Federal de Pernambuco

Programa de Pós-graduação em Serviço Social


Trabalho de Conclusão da Disciplina de Mestrado: Trabalho na contemporaneidade

Síntese e breve análise dos seguintes ensaios:

-DIALÉTICA DA DEPENDÊNCIA (Ruy Mauro Marini)

-TEORIA DA DEPENDÊNCIA E EXTENSÃO DA


SUPEREXPLORAÇÃO: uma perspectiva teórica (Adrián Sotelo Valencia)

Jonathan Carvalho de Faria​*

*Bacharel em Administração e Especialista em Educação e Realidade Brasileira pela Universidade Federal de


Santa Catarina(UFSC); Mestrando em Serviço Social pela Universidade Federal de Pernambuco(UFPE)
INTRODUÇÃO

O presente trabalho, tem como objetivo elaborar uma síntese dos dois textos
mencionados acima na tentativa de uma apropriação teórica destes para a utilização em
estudos posteriores relacionados à pesquisa de dissertação do autor desta síntese.
A elaboração dessa síntese assim como as breves linhas da conclusão também faz
parte de um movimento de problematização, reflexão e síntese de diversos questionamentos
que surgiram no decorrer da disciplina “Trabalho na contemporaneidade”.

SÍNTESE 1:
DIALÉTICA DA DEPENDÊNCIA
Ruy Mauro Marini

O texto de Marini, como apresentado em sua introdução, inicia um debate na tentativa


de combater dois erros geralmente cometidos na produção marxiana acerca da américa latina.
O primeiro é forçar ou adulterar algum conceito marxista à uma determinada expressão da
realidade rompendo assim o elo teoria/realidade. Aos estudos dessa ordem Marini os chama
de “ortodoxos ou dogmáticos”. O segundo erro cometido é aquele que busca forçar uma
explicação do real ao recorrer a categorias de vertentes que não são possíveis adequá-las ao
método de análise marxiano, ou mesmo a adoção categorias utilizadas para explicar dinâmicas
de objetos diferentes à expressão do real estudada, negando inclusive o método de análise
marxista. Esse segundo erro conduz as análises ecletistas e insuficientes para a compreensão
do real. No entanto, Marini aponta que

Estes desvios nascem de uma dificuldade real. Frente ao parâmetro do


modo de produção capitalista puro, a economia latino-americana apresenta
peculiaridades, que às vezes se dão como insuficiências e outras - nem sempre
distinguíveis facilmente das primeiras - como deformações.(p. 105)

Marini resgata este debate na tentativa de avançar no entendimento da realidade latino


americana e como os processos de acumulação capitalista se manifesta nesta região. Segundo
o autor, há particularidades que impedem que esta região acumule de forma “tradicional” ou
similar as economias “avançadas”, por esse motivo, é necessário entender as particularidades
regionais, mas ao mesmo tempo, entender qual é a relação dessas expressões no âmbito global
de acumulação capitalista para que possamos entender o sentido desses movimentos.

1. A integração ao mercado mundial

Dentro do processo de ascensão do capitalismo como forma geral de produção de


riqueza, ainda no século XVI, a américa latina já apresenta um alinhamento com as dinâmicas
de acumulação do capital a nível internacional. Através da exportação de metais preciosos e
produtos exóticos, contribuiu para o sustento do sistema manufatureiro assim como o sistema
bancário europeu.
A revolução industrial trouxe um certo deslocamento nessa relação. Com a
independência dos países latino americanos, o eixo comercial passa a ser centralizado na
potência econômica da época, a Inglaterra. No entanto, esta relação comercial se apresenta de
forma desigual. Enquanto os países latino americanos exportam bens primários aos ingleses,
estes exportam produtos manufaturados de maior valor agregado, gerando uma balança
deficitária assim como o crescimento das dívidas dos países latino americanos. Esse
movimento perdurou até as primeira décadas do século XIX.
No entanto, com o aumento das exportações na américa latina, ainda na década de
1860, houve um aumento da proporção da dívida externa nesses países. Como os países
centrais não podiam mais contar com a remessa de capital oriunda da balança comercial
negativa dos países latino americanos, vemos um crescente aumento da dívida externa em
relação a balança comercial e ao volume de exportação.

Em outras palavras, é a partir desse momento que se configura a dependência,


entendida como uma relação de subordinação entre nações formalmente
independentes, em cujo âmbito as relações de produção das nações subordinadas são
modificadas ou recriadas para assegurar a reprodução ampliada da dependência. O
fruto da dependência só pode assim significar mais dependência e sua liquidação
supõe necessariamente a supressão das relações de produção que ela
supõe.(MARINI, 2000, p. 109)

Essa relação possibilitou que o eixo de exploração do trabalho nas economias centrais
se deslocasse da exploração de mais-valor absoluto para a exploração do mais-valor relativo,
ou seja, possibilitou as condições materiais necessárias para um aumento da acumulação
através de um crescente e constante aumento de produtividade nos setores
industriais/manufatureiros visando um aumento da extração de mais-valor. A grande
quantidade de capital utilizado para a consolidação desse processo só foi possível através do
aumento geral da exploração dos proletários latino americanos.

2. O segredo do intercâmbio desigual

Apesar do mais-valor relativo estar geralmente relacionado a produtividade, a ideia de


mais-valor na verdade está relacionado a capacidade de trabalho excedente que é apropriado
pelo capitalista, ou seja, a taxa de exploração. É na alteração da proporção entre trabalho
excedente e trabalho necessário é que está a raiz do conceito mais-valor relativo. Marini,
resgatando o livro I d’O Capital de Marx aponta que “A mais-valia relativa está ligada
indissoluvelmente, então, à desvalorização dos bens-salários, para o que concorre em geral,
mas não forçosamente, a produtividade do trabalho.”(p. 115)
A américa latina, por fornecer produtos primários a preços cada vez menores ao países
centrais, contribui para a redução do salário necessário para a reprodução da vida desses
trabalhadores, favorecendo um aumento da extração de mais-valor relativo destes países.
Apesar desta ser uma das expressões dessa troca, há outras que contraditoriamente,
permeiam essa relação. A queda dos preços das matérias primas e outros bens primários
também força a redução dos preços dos produtos industrializados. Para lidar com essa
contradição, principalmente por parte dos países centrais, criou-se alguns mecanismos para
contornar este problema.
Um dos elementos, é a própria forma desigual das relações comercial que as
economias centrais impuseram às economias dependentes. Esta deterioração comercial exerce
uma força para que a periferia, produza cada vez mais produtos na tentativa de minimizar tal
relação desigual. Segundo Marini, isso não significa que este problema possa ser resolvido
por relações econômicas de maior equidade entre as nações, esta contradição só pode ser
superada na medida que as relações econômicas não sejam mais baseadas no valor de troca.
Uma face deste problema está na dominação dos países centrais que, em um primeiro
momento, adota a violência política e militar para explorar as nações mais vulneráveis. E que
com o passar do tempo vai dando lugar a outros mecanismos econômicos para favorecer os
países centrais burlando inclusive as trocas equivalentes, pesando em favor das economias
centrais.
Outro aspecto desse intercâmbio desigual das mercadorias ofertadas pelos países
centrais, como estes produzem produtos manufaturados que não podem ser produzido com
facilidade pelos países da periferia, esses conseguem “empurrar” o preço para cima vendendo
os produtos acima de seu valor e consequentemente se apropriando de parte do valor
produzido pelos países dependentes.
Por parte dos países latino americanos, e em especial da burguesia desses países, não é
através da busca pela diminuição das desigualdades comerciais que se encontra a solução
desta perda, mas sim por transferir esse problema para sua classe proletária aumentando sua
exploração.

3. A superexploração do trabalho

Segundo Marini(2000), na América Latina a forma de extração de mais valor, se dá


não pela tentativa de equilibrar a balança comercial externa mas sim recorrer ao mercado
interno através de três mecanismos que não estão relacionados diretamente com o aumento da
capacidade produtiva:

Pois bem, os três mecanismos identificados - a intensificação do trabalho, a


prolongação da jornada de trabalho e a expropriação de parte do trabalho necessário
ao operário para repor sua força de trabalho - configuram um modo de produção
fundado exclusivamente na maior exploração do trabalhador e não no
desenvolvimento de sua capacidade produtiva.(p. 125)

Nesses três casos:

[...]a característica essencial está dada pelo fato de que se nega ao trabalhador as
condições necessárias para repor o desgaste de sua força de trabalho: nos dois
primeiros casos, porque ele é obrigado a um dispêndio de força de trabalho superior
ao que deveria proporcionar normalmente, provocando-se assim seu esgotamento
prematuro; no último, porque se retira dele inclusive a possibilidade de consumir o
estritamente indispensável para conservar sua força de trabalho em estado normal.(p.
126)
Esses mecanismos, que podem ou não aparecer de forma combinada, faz com que o
trabalho seja remunerado abaixo de seu valor, gerando assim uma situação de
superexploração de trabalho.
Neste caso, não é o tempo total da vida do trabalhador que está se levando em conta,
mas sim o tempo em que este se converte em força de trabalho no qual se produz valor e
mais-valor. A reprodução da força de trabalho em seu tempo “livre” fica ao encargo do
próprio proletário. Ao pensarmos na escravidão imposta ao trabalhadores da américa, vimos
que este se apresentava enquanto um entrave ao avanço do capital, visto que neste modo de
produção, apesar de reduzir drasticamente a vida do trabalhador, deixava a cargo da burguesia
todas as despesas relacionadas à reprodução da vida desses trabalhadores assim como os
gastos oriundos a reposição da força de trabalho.
Em síntese, num determinado momento da história, a própria escravidão na América
Latina representou um entrave ao avanço das forças produtivas. Na nova relação de trabalho
assalariado, a perda de um trabalhador pode ser reposta sem custos de aquisição e o valor
pago por esse trabalho não precisa corresponder ao mínimo necessário para reprodução de sua
vida. Apesar do trabalhador escravo também ser superexplorado, a substituição dessa forma
de trabalho gerou uma maior acumulação de mais-valor.
No Brasil, a convivência da produção baseado no trabalho escravo e trabalho
assalariado, juntamente com o desenvolvimento de suas exportações, se apresentaram como
uma das vias de integração da América Latina ao capitalismo.

4. O ciclo do capital na economia dependente

Com o desenvolvimento da economia mercantil nos países latino americanos, estes


são levados a orientar suas relações de produção de modo a parecer com as economias no qual
se originou essa forma de acumulação. No entanto, na américa latina, há uma profunda
contradição neste processo:

Chamada a coadjuvar a acumulação de capital com base na capacidade produtiva do


trabalho, nos países centrais, a América Latina teve que fazê-lo mediante uma
acumulação fundada na superexploração do trabalhador. Nesta contradição,
radica-se a essência da dependência latino-americana.(MARINI, 2000, p. 132)
Para caracterizar o ciclo do capital nas economias dependentes, Marini(2000), realiza
uma breve digressão, retomando Marx, sobre o duplo caráter do trabalhador enquanto
produtor e consumidor, e como essa relação se insere no ciclo de produção e reprodução do
capital.
No entanto, na economia latino-americana, que está fundada na exportação, o
consumo individual dos trabalhadores desta região, por não consumirem de fato os produtos
que exportam, acabam não interferindo na etapa de realização do produto, “ainda que
determine a taxa de mais-valia”(MARINI, 2000, p. 134).
A consequência desse processo é que o capital poderá explorar os trabalhadores com
maior intensidade pois estes não irão consumir os produtos que produzem para exportação, e
consequentemente não farão parte da realização do produto e sua re-inserção do ciclo de
produção do capital, conforme aponta Marini(2000):

Em consequência, a tendência natural do sistema será a de explorar ao máximo a


força de trabalho do operário, sem preocupar-se em criar as condições para que este
a reponha, sempre que seja possível substituí-lo mediante a incorporação de novos
braços ao processo produtivo.(p. 134)

A partir destes elementos, Marini(2000) caracteriza a função da economia


exportadora, dentro do capitalismo mundial:

A economia exportadora é, então, algo mais que um produto de uma


economia internacional fundada na especialização produtiva: é uma formação social
baseada no modo capitalista de produção, que acentua até o limite as contradições
que lhe são próprias. Ao fazê-lo, configura de maneira específica as relações de
exploração em que se baseia e cria um ciclo de capital que tende a reproduzir em
escala ampliada a dependência em que se encontra frente à economia mundial.(p.
134)

São essas as bases que se deu a industrialização da América Latina, e o autor dedica o
próximo tópico em caracterizá-la apontando algumas tendências que despontaram em sua
época.

5. O processo de industrialização

Segundo Marini(2000), ao contrário do processo de industrialização das economias


centrais, no qual produziu um incremento qualitativo no desenvolvimento econômico dessas
regiões, a industrialização na américa latina, indo contra o que os desenvolvimentistas diziam,
manteve as características de subordinação de sua indústria e a produção de bens primários à
serviço da acumulação de capital externo sem que isso trouxesse os benefícios e
desenvolvimento alcançado pelos países centrais .
Para diferenciar melhor os processos de industrialização entre os países dominantes e
subordinados, de economia dependente, Marini(2000), aborda brevemente o papel da
indústria e sua relação com a massa trabalhadora desses países.
Nos países centrais, há uma relação entre a produção e consumo que faz com que a
indústria desses países se concentrem mais no mercado interno. Em virtude da liberação de
parte dos salário em função do barateamento dos bens primários, os trabalhadores se integram
ao processo de produção industrial também enquanto consumidores, favorecendo assim a
baixa esfera de consumo relacionado a bens de consumo popular.
Também nos países centrais(mas não só), existe a produção de bens suntuosos, que
atendem a demanda da parcela mais rica da população e também, em menor medida, dos
setores abastados das economias dependentes. Essas duas esferas de produção relacionam os
trabalhadores na produção dos produtos a criação da demanda e a realização do produto
retroalimentando o processo de produção/reprodução do capital.
A indústria latino americana tem seu surgimento, no período da crise capitalista entre
a primeira e segunda guerra mundial. Neste período surge uma fraca indústria exportadora de
manufaturados na baixa esfera de produção, que atendia pífiamente o mercado interno e nele
se ampliava basicamente em virtude de fatores conjunturais que interferiam na demanda ou
cenários comerciais que atrapalhavam a importação de produtos manufaturados. A partir disso
a indústria latino americana se estabelece não em um cenário em que ela cria as condições e
demanda para seus produtos (como se estabeleceu nos países centrais), mas se estabelece para
atender uma demanda já constituída pelos países industrializados submetendo-se a sua
dinâmica. Esse processo de industrialização foi possível em um cenário em que a demanda
por produtos industrializados era maior do que a oferta desses produtos, neste sentido, não era
uma preocupação do industrial latino americano a forma como seus produtos seriam
realizados na esfera da circulação/consumo.
Outra característica da indústria latino americana, foi a diferença tecnológica junto às
indústrias dos países centrais. Para fazer frente a este aspecto, não era possível fazer frente aos
concorrentes buscando competitividade no aumento da produtividade e da proporção capital
constante em detrimento do capital variável resultante do avanço tecnológico. É através da
superexploração da força de trabalho que a indústria latino americana consegue se inserir no
mercado, desempenhando um papel determinado na acumulação desta fração do capital neste
momento:

Já não é a dissociação entre a produção e a circulação de mercadorias em função do


mercado mundial que opera, mas a ​separação entre a esfera alta e as esfera baixa
da circulação no interior mesmo da economia [grifo do autor], separação que, ao
não ser contraposta pelos fatores que atuam na economia capitalista clássica, adquire
um caráter muito mais radical.(MARINI, 2000, p. 141)

A generalização do consumo de produtos manufaturados nos países dependentes,


passa a ser um determinante no avanço das forças produtivas, uma parte desse movimento é
absorvida pela ampliação do consumo em virtude da ampliação das camadas médias, que tem
um poder aquisitivo maior. A outra forma de continuar o processo de acumulação do capital
industrial foi o empreendimento de um esforço no aumento da produtividade do trabalho,
assim como vimos no processo de industrialização das economias centrais. No entanto, este
aumento de produtividade difere dos primeiros justamente pelo fato da superexploração do
trabalho, possível, entre outros fatores, da não necessidade em transformar um operário em
um consumidor de manufaturas, restringindo o consumo a uma parcela mais abastada da
população. Esta transição da indústria, se dá de forma truncada e lenta, a longo prazo
enfrentará sérios problemas inviabilizando essa forma e forçando o capital industrial a buscar
novas soluções para seu problema de realização, mais especificamente o recurso à tecnologias
externas para a elevação da produtividade do trabalho.

6. O novo anel de espiral

Com a superação da crise pós segunda guerra mundial, grandes corporações


imperialistas conseguiram juntar um grande montante de capital, e consequentemente, surgiu
a possibilidade de que estes, ao invés de serem incorporados no próprio processo produtivo,
passou a serem investidos de maneira diversificada.
Com a expansão dos mercados, do consumo e da produção, a indústria latino
americana se tornou atrativa para esses investimentos. Através da superexploração, as
indústrias das economias dependentes se tornaram opções rentáveis e com boas promessas de
lucro ao capital internacional, além disso, a dinamização do avanço tecnológico dos países
centrais gerou um excedentes de maquinário industrial que estava sendo inutilizado antes do
fim do prazo total de depreciação.
Neste sentido, a economia industrial latino americana, surge como um mercado de
meios de produção de segunda linha, resolvendo em grande medida a questão da busca por
maior produtividade por parte dessa crescente indústria. As indústrias latino americanas
passaram a obter diversos estímulos externos para seu desenvolvimento.
No entanto, isso não apontava para o fim de uma relação de dependência, mas sim
uma nova fase no qual os países dependentes assumiram uma nova posição dentro da divisão
internacional do trabalho. A indústria dependente passava a ocupar um papel de produtora de
produtos manufaturados para consumo popular interno, assim como a produção de matérias
primas oriunda da indústria pesada. O progresso tecnológico não apagou a superexploração
nem e intensificação da exploração da força do trabalho:

A difusão do progresso técnico na economia dependente avançará então


paralelamente com uma maior exploração do trabalhador, precisamente porque a
acumulação segue dependendo no fundamental mais do aumento da massa de valor -
em consequência da mais-valia - do que da taxa de mais-valia.(MARINI, 2000, p.
148)

Também pode-se observar ao longo da década de 1960 um crescimento da indústria


ligada a alta esfera de produção. É na tentativa de exportação tanto de produtos da alta esfera
quanto na baixa, que o capital industrial das economias dependentes tentam se realizar, em
especial no Brasil, repaginando o papel exportador e subordinado dessas economias por um
lado e levando a uma postura subimperialista em outro.
SÍNTESE 2:
TEORIA DA DEPENDÊNCIA E EXTENSÃO DA SUPEREXPLORAÇÃO: uma
perspectiva teórica
Adrián Sotelo Valencia

Neste artigo/ensaio, Adrián Sotelo Valencia busca trazer elementos para analisarmos a
validade teórica da Teoria Marxista da Dependência(TMD), e particularmente da teoria da
superexploração da força de trabalho(​Sft)​ , para a análise contemporânea dos países latino
americanos.
Em um primeiro momento, o autor retoma um debate sobre a questão da mais-valia
absoluta e relativa, com o intuito de fazer a diferenciação entre os conceitos exploração e
superexploração da força de trabalho assim como levanta a necessidade do desenvolvimento
de uma economia política da dependência e o papel de Ruy Mauro nesse movimento.
A partir disso, Sotelo Valencia(2018), resgata a importância da teoria da dependência
de Marini para o entendimento da realidade. Neste sentido o debate sobre a exploração e
superexploração em Marini aponta para quanto maior o desenvolvimento tecnológico maior a
exploração do trabalho.
Esta tese se confronta frontalmente com as teorias desenvolvimentista defendidas pela
Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (CEPAL) no qual defendia que o
modelo da industrialização por substituição de importações, traria uma retenção de
investimento e consequentemente um desenvolvimento e conquista da “autonomia”
econômica desses países industrializados.
Sotelo Valencia(2018) aponta ainda que Marini contribuiu para o debate ao explicitar
que “a América Latina contribuiu para apressar o passo da mais-valia absoluta à relativa no
capitalismo clássico, na época da revolução industrial; ideia concreta que se converte em fio
condutor de qualquer teorização contemporânea sobre a ​Sft.​ ”(p. 18)
Outro tema importante da ​Sft contemporânea é sua relação com a flexibilização do
trabalho assim como a introdução de novas tecnologias no ambiente produtivo latino
americano. Gerando um grande incremento na produtividade mas ainda subordinando à ​Sft​.
Em seguida, o autor aborda como que a flexibilização do trabalho como dispositivo do
novo padrão de reprodução capitalista, aliado ao processo de globalização, contribuiu para
uma efetiva universalização da lei do valor, levando a extrapolação dos limites da ​Sft que
estava até então restrito aos países dependendentes.

Nos últimos anos, vem ganhando força uma ideia relativa à possibilidade de
que se esteja estendendo no mundo desenvolvido, isto é, nas economias avançadas
do capitalismo central, um intenso processo de ​Sft​, em virtude das múltiplas
dificuldades que o capitalismo está experimentando em escala global.(p. 24)

Como tentativa de superação da atual crise capitalista “não há outra saída possível
senão continuar aprofundando as reformas, impulsionando, consequententemente, a entrada
do regime de superexploração nessas sociedades[de capitalismo avançado][...]”(p. 26).
No entanto, o autor afirma que esta hipótese ainda é uma conjectura, formulada por
Marini, e ainda está passível de um maior confronto com a realidade através de acúmulo de
dados e comparações entre os países para que esta seja comprovada.
Na tentativa de entender a relação da entre mais-valia absoluta, mais-valia relativa e
superexploração do trabalho o autor chega na seguinte síntese sobre as economias
dependentes contemporâneas:

Consideramos que o aspecto específico e característico que prevalece historicamente


nas economias dependentes é a constituição de um modo de produção dependente -
articulado ao sistema capitalista mundial - cimentando em um regime de
superexploração do trabalho que assume certas especificidades e obstaculiza
sistematicamente a implantação da mais-valia relativa como eixo do processo de
acumulação e reprodução do capital.(pg. 27)

A mundialização do capital levou a uma hegemonização da tecnologia assim como,


em determinada medida, um maior nivelamento da exploração via incremento da
produtividade e da ocorrência de superexploração do trabalho para além dos limites dos países
dependendentes. Nesse movimento, segundo o autor, Marini apontou três fatos que
corroboram com essa hipótese: a difusão tecnológica e a padronização da produção de
produtos a nível mundial; maior hegemonização dos processos produtivos e tecnológicos; e
tendência mundial à igualação da produtividade e intensidade do trabalho. Com isso, a ​Sft
passa a ser uma característica cada vez mais estrutural do atual estágio de desenvolvimento do
capitalismo transcendendo uma característica regional do desenvolvimento capitalista
relegado aos países dependentes.
Na tentativa de aprofundar as análises dando maior concretude a essas hipóteses o
autor conclui apontando quatro pontos a serem melhor estudado dentro desta temática: no
plano econômico, a investigação de como a “nova dependência” se manifesta por uma
especialização produtiva cada vez maior assim como sua relação à política econômica
neoliberal e suas respectivas recessões e desequilíbrios; no plano social, a contínua restrição
da renda assim como a relação desta com mercados cada vez mais restritos (relação entre
baixa e alta esfera de produção); em relação a ​Sft,​ entender seu processo de expansão em
especial nos países centrais no período pós crise de 2008-2009; por último, na esfera política,
aprofundar os estudos entre democracia e autoritarismo políticos vigentes com o triunfo da
direita nos países dependentes latino americanos.

CONCLUSÃO

Com o avanço do neoliberalismo e a corrosão acelerada das condições e direitos


trabalhistas, a perspectiva desenvolvimentista e a política democrático popular se mostra cada
vez mais distante de se viabilizar a partir dos desdobramentos que a realidade vem nos
apresentando.
As limitações estruturais e a violência desse processo nos países latino americanos, se
mostra de forma cada vez mais nítida na medida que a crise capitalista vem se aprofundando.
Neste sentido, a essência da obra Dialética da Dependência de Ruy Mauro Marini ainda está
preservada e fornece elementos importantes para pensarmos a superação dessa realidade.
Soleto Valencia(2018) na tentativa de resgatar as últimas discussões de Marini sobre o tema e
dialogar com a realidade contemporânea, contribui para esta hipótese.
Entender a complexo desenvolvimento do novo arranjo do capital às luzes da TMD se
faz uma tarefa fundamental para a elaboração de uma análise da realidade capaz de nos munir
de uma potência transformadora da estrutura que está posta. Neste sentido, para além dos
pontos a serem estudados e aprofundados apontados por Soleto Valencia, reforçamos a
urgência em estudar como se estabelece atualmente a Superexploração da força de trabalho
nas economias dependentes e atualmente, sua manifestação nos países centrais,
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

MARINI, Ruy Mauro. Dialética da dependência. In: SADER, Emir (Org.). ​Dialética da
dependência: ​uma ontologia da obra de Ruy Mauro Marini. Petrópolis: Vozes, 2000. Cap. 2.
p. 105-166.

SOTELO VALENCIA, Arián. Teoria da dependência e extensão da superexploração: uma


perspectiva teórica. In: GUANAIS, Juliana; FELIX, Gil (Org.). ​Superexploração do
trabalho no século XXI: ​debates contemporâneos. Bauru: Praxis, 2018. p. 13-40.

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