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Kant e a questão da maioridade

Kant defendeu sua ideia ao refletir sobre a modernidade em um pequeno texto


intitulado “Resposta à pergunta: o que é o Iluminismo?”, em que entendia convir ao
homem sair da menoridade pela porta que fora aberta pelo Iluminismo.
A proposta de Kant é que o homem escape da tutela das instituições, da tradição
e de suas verdades consolidadas. A menoridade, como condição de um homem
infantilizado e covarde, aparece na ação daquele que não consegue agir por si mesmo de
forma autônoma, que sempre procura o aval de uma autoridade, de uma instituição, de
um poder que está fora e acima dele.
Analisando a forma com que se dá essa adesão coletiva à tutela de um poder
exterior e superior, Kant entende que uma minoria assume o poder de decisão sobre
uma maioria tutelada e procura assegurar a submissão evitando que a maioria raciocine.
O homem, para atingir a maioridade, teria que sair da tutela, da dependência, mas,
segundo Kant, por preguiça e por covardia, delega a tarefa de pensar e decidir.
O homem da maioridade, segundo Kant, é aquele que um uso público da razão,
que faz críticas, porém, no fim ele tem que obedecer. A ética proposta por Kant é a ética
do dever (imperativo categórico).

O criticismo Kantiano

Kant nota que a metafísica se apoia em um conhecimento especulativo, isto é, em


dedução da pura razão sem apoio em qualquer elemento proveniente dos sentidos.

A metafísica sempre se baseou em conclusões elaboradas pela razão pura,


apoiando-se em uma dedução que parte do princípio da causalidade. O princípio da
causalidade sobre o qual a metafísica se apoia desde Aristóteles estava baseada no
seguinte raciocínio: se tudo tem uma causa, o mundo precisa ter tido uma primeira causa
que não fosse causada por qualquer outra causa. Esta dedução racional havia sido a base
das demonstrações racionais sobre a origem do universo e até mesmo da adoção da tese
da criação divina do mundo.

A metafísica, portanto, baseia-se em um conhecimento puramente racional;


enquanto a ciência se apresentava como um conhecimento que dizia ser puramente
empírico. Os filósofos racionalistas pleiteavam a autonomia da razão e os empiristas
contestavam essa autonomia, afirmando que somente através dos sentidos algum
conhecimento é possível.

De início, Kant acata os argumentos dos empiristas, fazendo uma homenagem a


Hume, filósofo inglês para quem a noção de causa sobre a qual a metafísica se apoiava
também procede da experiência. Num primeiro momento, portanto, Kant se afasta dos
racionalistas ao dizer que Hume o retirou do sono dogmático de acreditar na capacidade
da razão pura conhecer aquilo que fica além do campo da experiência, porque a noção de
causa de fato depende da observação e dos sentidos. Com isto, Kant passou a admitir que
a razão humana só pode alcançar algum conhecimento a partir da experiência. Ele faz
uma importante distinção entre conhecimento e pensamento.

A Metafísica, a partir do uso que os racionalistas dogmáticos faziam da razão, não


chegava a certeza ou unanimidade sobre suas conclusões e nem possuía argumentos
sólidos em que se basear. A partir da conclusão de que o grau de certeza dos
conhecimentos da matemática e da física decorria do fato de o conhecimento formulado
por essas ciências se basearem na vinculação que se estabelece entre razão e experiência,
produzindo juízos sintéticos a priori.

Na perspectiva de criticar o uso da razão, ou seja, discernir o que a razão pode


fazer ou o que ela é incapaz de fazer, Kant propõe o sistema crítico que é apresentado em
três obras fundamentais: a Crítica da razão pura investiga o uso teórico da razão que se
aplica ao pensamento científico, aos pensamentos que tratam de questões de fato, ou seja,
busca estabeleceras possibilidades da razão ao conhecer; a Crítica da razão prática
investiga o seu uso prático, no qual a razão determina a vontade e os princípios do
comportamento moral, ou seja, estabelecer como os homens devem agir em relação aos
outros homens, o que ele deve fazer para garantir o bem geral; a Crítica do juízo analisa
a ação da razão nas formas de pensamento teleológico e estético, dedicando-se ao
sentimento de prazer e dor.

Indicação de leituras complementares:

Curso de Filosofia do Direito – Eduardo Bittar & Guilherme de Almeida – Ed. Atlas –
São Paulo.
Lei Moral e autonomia em Kant

Sobre o imperativo categórico da razão, Kant afirma:

“Devo proceder sempre de maneira que eu possa querer também que a minha
máxima se torne uma lei universal”.

Kant afirma que se as ações humanas se regulam por meio de uma intenção
egoísta, não podem se caracterizar como livres, pois estão ancoradas em inclinações, ou
seja, em desejos, intenções e impulsos egoístas.

Uma ação por dever não está fundada na conseqüência da ação, no objeto do
querer, mas no princípio formal e racional (ligado à intenção) que a determina. Portanto,
para se pensar uma ação por dever, é necessário pensar em um princípio formal da
vontade (ou do querer). Em segundo lugar, para Kant, esse princípio formal da vontade
deve ser compreendido como uma lei da razão, daí ele dizer que o “dever é a necessidade
de uma ação por respeito à lei”. Assim, a ação por dever respeita uma determinada lei da
razão. A moral kantiana não é prescritiva, no sentido de possuir um conteúdo prévio
gerador de valores, mas terá de ser compreendida como um procedimento racional de
avaliação das ações dos homens.

Esse procedimento de avaliação diz respeito à possibilidade de universalização de


uma determinada regra que, por sua vez foi pressuposta pela vontade. Assim, se uma
determinada regra, subjetiva, é válida para todos os seres racionais, a ação pressuposta
pela regra da vontade é racional e, conseqüentemente, a ação será compreendida como
uma ação por dever, que respeitou a lei. Esta obriga o sujeito a avaliar suas regras de
conduta por meio do critério de universalização, ou seja, se a sua máxima, a sua regra de
conduta, é ou não passível de valer para todos os sujeitos racionais.

Uma ação somente pode ser considerada moral se for livre, e só pode ser vista
como livre no momento em que passa pelo critério de avaliação fornecido pela própria
razão, pela universalização de sua máxima por meio do imperativo. É a razão que,
portanto, determina a condição moral de uma ação.

Com relação ao conceito de autonomia, Kant afirma que todo ser racional deve se
submeter à lei moral e, portanto, deve obedecer à razão e a seu mandamento objetivo.
Entretanto, o homem, enquanto ser racional, dotado de razão, não é apenas o destinatário
da lei, mas também o seu próprio legislador, e, participa, assim, da legislação universal
da razão. Nesse sentido, o próprio conceito de dever é ampliado, pois o homem é obrigado
a respeitar a lei racional também porque a formulou. Uma ação é livre porque é autônoma,
porque além de seu princípio estar desvinculado de qualquer relação com inclinações
sensíveis, esse princípio possibilita que a ação seja compreendida como uma
autodeterminação do homem.

Indicação de leituras complementares:

Curso de Filosofia do Direito – Eduardo Bittar & Guilherme de Almeida – Ed. Atlas –
São Paulo.

Hegel e a teoria do reconhecimento

Esta teoria consiste na relação entre indivíduo e coletividade, na qual os sujeitos


individuais só podem formar e afirmar suas identidades pessoais a partir do
reconhecimento do outro, isto é, o indivíduo só pode ser autônomo a partir do momento
em que ele é valorizado positivamente pelos demais indivíduos de sua comunidade. Caso
não haja essa aceitação, desencadeia-se uma luta por meio da qual a parte não-
reconhecida pretende criar as condições do reconhecimento.

A reflexão hegeliana parte da premissa de que os indivíduos não são dados, mas
se formam por meio de um processo de socialização. Assim desde sempre o indivíduo se
encontra em convívio intersubjetivo. Esse convívio, na medida em que é sempre
determinado por costumes e valores, por vínculos éticos de maneira geral, é chamado por
ele de eticidade. Ele supõe para todo processo de socialização do indivíduo um conjunto
de obrigações intersubjetivas dadas na eticidade (civilização). Em uma determinada
comunidade pode haver o reconhecimento intersubjetivo da particularidade de todos os
seus membros.

Na dialética do crime e do castigo, Hegel afirma que o crime é visto como um ato
que gera cisões no todo da vida ética. Sentindo o castigo como destino, o criminoso pode
enfim compreender que, ao destruir a vida de um outro, destruiu a unidade de sua
existência. Ele passa então a sentir a nostalgia da vida unificada, da qual ele dependia.

A reflexão sobre essa perda de si mesmo, simultânea à perda do outro, faz do


destino culposo a figura de uma punição interna, que vai além da mera aplicação da lei.
Além dessas questões, a preocupação de Hegel em sua época é que Deus parece
ter morrido, a Igreja e as religiões, fracassado, no sentido de “realizar” o Espírito
Absoluto, cabendo, então, ao Estado realizar na terra o Absoluto, ou, como ele diz,
oferecer a “identidade do real com o racional”, a unidade essência/existência,
interior/exterior. O Espírito aqui parece dissolver-se no Estado. Como na Revolução
Francesa, que ele saudou com entusiasmo como a realização plena terrestre do Espírito.

O princípio de sua dialética está em Heráclito e sua “luta entre contrários”. A


passagem de um contrário a outro, Hegel retraduz na forma de sua trilogia (tese, antítese
e síntese): há uma tese ou positividade (por exemplo, o estado aristocrático) e uma antítese
ou negatividade (a burguesia que entra em conflito com esse estado). O resultado dessa
luta de contrários é que a negação é “negada”, deixa de ser negação, torna-se a nova forma
(síntese), a sociedade burguesa. Mas, no novo quadro, a antiga aristocracia, apesar de ser
suprimida, é conservada e “elevada”. A vida, assim, é um processo dialético, divisão e
união, auto-alienação e reconciliação. Por isso é marcada pela consciência infeliz: cada
um aspira ao que não pode ter.

Hegel é a expressão do idealismo objetivo. O absoluto é o sujeito; quer dizer, o


saber, o discurso que o exprime e o mundo são, todos, nada mais que o desenvolvimento
da Idéia (do Absoluto). É Deus se manifestando na natureza e no espírito humano.

Indicação de leituras complementares:

Curso de Filosofia do Direito – Eduardo Bittar & Guilherme de Almeida – Ed. Atlas –
São Paulo.

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