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Estudos de Sociologia - ISSN: 2317-5427, v.

1,
n. 18 (2012)

DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DA LOUCURA
À REFORMA PSIQUIÁTRICA: as sete vidas
da agenda pública em saúde mental no
1
brasil

FROM INSTITUTIONALIZATION OF
MADNESS TO PSYCHIATRIC REFORM: THE
SEVEN LIVES OF THE PUBLIC AGENDA ON
MENTAL HEALTH IN BRAZIL

Eliane Maria Monteiro da Fonte

_______________________________________________________________________

Resumo

Este artigo tem por objetivo examinar, de forma sucinta, a


estruturação das políticas de saúde mental no Brasil, desde
os seus primórdios até o período atual. As políticas de
saúde mental são aqui consideradas como um acordo
político-jurídico que se estabelece numa determinada
sociedade sobre a concepção e respostas aos problemas da
loucura/doença mental. Com base em fontes secundárias e
em trabalhos de terceiros, buscou-se esboçar as principais
tendências na trajetória das políticas para esse setor, que
tem sua origem em 1830, com o projeto de medicalização
da loucura e se materializa com a criação dos primeiros
hospícios para alienados, no final da segunda metade do
século XIX, culminando no processo que se convencionou
chamar de reforma psiquiátrica, no final do século XX. Este
exercício sobre a história da agenda pública no cuidado com
a saúde mental no Brasil nos permitiu identificar sete fases
nessa trajetória, as quais são discutidas por etapa desta
evolução, apresentando ao final algumas das principais
tendências nas políticas de saúde mental no Brasil na
atualidade.

Palavras-chave

Loucura. Políticas de Saúde Mental. Instituição Psiquiátrica.


Reforma Psiquiátrica.

________________________________________________________________________
Abstract

This article aims to analyse, briefly, the structuring of


mental health policies in Brazil, from its beginnings to the
current period. The mental health policies are considered
here as a legal-political agreement that is established in a
particular society on the conception and answers to the
problems of madness/mental illness. Based on secondary
sources and other’s studies, we attempted to outline the
main trends in the trajectory of policies for this sector,
which has its origin in 1830, with the project medicalization
of madness and it is materialized with the creation of the
first hospices for the insane, at the end of the second half
of the nineteenth century, culminating in what has been
called the psychiatric reform, in the late twentieth century.
This exercise on the history of the public agenda in mental
health care in Brazil allowed us to identify seven phases in
this trajectory, which are discussed by stages of this
evolution, presenting at the end some of the main trends in
mental health policies in Brazil today.

Keywords

Madness. Mental Health Policy. Psychiatric Institution.


Psychiatric Reform.

Introdução

A construção da loucura como doença mental e a


propagação de instituições asilares especialmente
destinadas aos alienados, assinalando “a formulação de
políticas públicas de tratamento e/ou repressão dos
doentes mentais, identificados com base nos limites cada
vez mais abrangentes da anormalidade”, distingue-se como
um processo desencadeado no Brasil entre os anos 1830 e
os anos 1920, marcado por continuidades e
descontinuidades (ENGEL, 2001, p. 330). Este artigo, de
caráter exploratório, baseado em fontes secundárias e em
trabalhos de terceiros, tem por objetivo examinar, de forma
sucinta, a estruturação e transformações das políticas de
saúde mental no Brasil, desde os seus primórdios até o
período atual. As políticas de saúde mental são aqui
consideradas como um acordo político-jurídico que se
estabelece numa determinada sociedade sobre a concepção
e respostas aos problemas da loucura/doença mental. O
foco da análise são as transformações da instituição
psiquiátrica no Brasil, constituída historicamente em seu
modelo asilar como o lugar de confinamento e tratamento
especialmente destinado aos loucos. O que se
convencionou denominar como “reforma psiquiátrica”, que
está em curso no país nos últimos 35 anos, poderia deixar
transparecer a ideia de reformas que caracterizam os
rearranjos institucionais sem transformá-los em sua
essência. Entretanto, este é um processo multifacetado e
muito mais complexo do que a mera reorganização dos
serviços de assistência em saúde mental, extrapolando o
campo da psiquiatria enquanto um saber-fazer
especializado (AMARANTE, 1998b). O caráter abrangente e
radical que dá significado a essa expressão se deve aos
desdobramentos que o processo de reforma psiquiátrica
adquire, a partir de 1978, como um movimento social de
base ao adotar o lema “Por uma sociedade sem
manicômios”,

[...] que significou abraçar a


bandeira da eliminação
progressiva dos hospitais
psiquiátricos e sua substituição
por outros tipos de
equipamentos comunitários,
territorialmente circunscritos e
voltados para a inserção social
dos usuários, como passam a
ser chamados os “doentes
mentais”, no contexto de
recuperação de sua cidadania,
identidade e condições de
sujeitos (PASSOS, 2009a, p.
159).

Não se pretende empreender aqui uma exaustiva


reconstituição histórica das práticas de cuidados à loucura,
entendida também como “um tipo especial de existência-
sofrimento, que faz apelo a saberes especializados para seu
2
alívio” , mas esboçar as principais tendências na trajetória
das políticas de saúde mental no Brasil. Este exercício sobre
a história da agenda pública no cuidado com a saúde
mental nos permitiu identificar sete fases nessa trajetória,
as quais são discutidas a seguir, por etapa desta evolução.
Na seção final são apresentadas algumas das principais
tendências nas políticas de saúde mental no Brasil na
atualidade, apontando os progressos nos modelos de
cuidados que estão sendo criados, mas também as
dificuldades e obstáculos que ainda persistem.

1. A institucionalização da loucura no Brasil

A loucura só vem a ser objeto de intervenção por parte do


Estado no início do século XIX, com a chegada da Família
Real ao Brasil, depois de ter sido socialmente ignorada por
quase trezentos anos. Nesse período de modernização e
consolidação da nação brasileira como um país
independente, passa-se a ver os loucos como “resíduos da
sociedade e uma ameaça à ordem pública”. Aos loucos que
apresentassem “comportamento agressivo não mais se
permitia continuar vagando nas ruas, principalmente
quando sua situação socioeconômica era desfavorável, e
“seu destino passou a ser os porões das Santas Casas de
Misericórdia, onde permaneciam amarrados e vivendo sob
péssimas condições de higiene e cuidado” (PASSOS, 2009a,
p. 104).

Em 1830, a recém-criada Sociedade de Medicina e Cirurgia


lança uma nova palavra de ordem: “aos loucos o hospício”.
Para Machado (1978, p. 376), só é possível compreender o
nascimento da psiquiatria brasileira a partir da medicina
que incorpora a sociedade como novo objeto e se impõe
como instância de controle social dos indivíduos e da
população. O hospício, considerado na época o principal
instrumento terapêutico da psiquiatria, aparece como
exigência de uma critica higiênica e disciplinar às
instituições de enclausuramento e ao perigo presente em
uma população que começa a ser percebida como
desviante, a partir de critérios que a própria medicina social
estabelece.

O projeto de medicalização da loucura, esboçadas nos


textos médicos deste período, que defendiam novos
parâmetros para a loucura e a necessidade de reclusão dos
loucos, começaria a ser concretizado a partir da criação dos
primeiros hospícios nas décadas seguintes. Entretanto, as
funções saneadoras dos primeiros hospitais psiquiátricos
fornecem às origens da assistência psiquiátrica brasileira
um caráter bastante peculiar, que é “o da precedência da
criação de instituições destinadas especificamente para
abrigar loucos sobre o nascimento da psiquiatria , enquanto
3

corpo de saber médico especializado” (RESENDE, 2007, p.


39).

Pode-se situar o marco institucional da assistência


psiquiátrica brasileira com a fundação do primeiro hospital
psiquiátrico, o Hospício D. Pedro II, explicitamente
inspirado no modelo asilar francês (elaborado por Pinel e
Esquirol), que ocorreu em 1852, no Rio de Janeiro. De
acordo com Machado (1978, p. 431), o isolamento foi uma
“característica básica do regime médico e policial do
Hospício Pedro II” e era o próprio hospício, concebido como
o lugar do exercício da ação terapêutica, que deveria
realizar a transformação do alienado. Nesse primeiro
momento, o isolamento em relação à família é prioritário e
indispensável apenas para um tipo especifico de louco: o
caso do louco que vaga pela rua, pois a família pobre não
tem possibilidade alguma de garantir a segurança e o
tratamento. Para famílias ricas, que quisessem manter
junto dela o alienado, o internamento não deveria ser
imposto, pois, ainda que com limitações, acreditava-se que
ela poderia reproduzir um hospício no interior de sua ampla
residência.

Durante o Segundo Reinado (1840-1889), foram criadas


outras instituições, que se denominavam “exclusivas para
alienados” em São Paulo (1852), Pernambuco (1864), Pará
(1873), Bahia (1874), Rio Grande do Sul (1884) e Ceará
(1886). Conforme aponta Resende,
4

...as primeiras instituições


psiquiátricas surgiram em meio
a um contexto de ameaça à
ordem e à paz social, em
resposta aos reclamos gerais
contra o livre trânsito de doidos
pelas ruas das cidades;
acrescentem-se os apelos de
caráter humanitário, as
denúncias contra os maus
tratos que sofriam os insanos.
A recém-criada Sociedade de
Medicina engrossa os protestos,
enfatizando a necessidade dar-
lhes tratamento adequado,
segundo as teorias e técnicas já
em prática na Europa
(RESENDE, 2007, p. 38).

Entretanto, a ênfase no caráter religioso e caritativo das


instituições criadas durante este período acabaria por
restringir o caráter medicalizado destes hospícios, onde, até
o fim do Império, não havia presença significativa de
médicos. Não só a nosologia psiquiátrica estava ausente
das instituições, como também eram leigos os critérios de
seleção dos pacientes, a juízo da autoridade pública em
geral. Os poucos médicos existentes nas instituições tinham
pouca influência nas questões administrativas e, somente
no início do século XX, os médicos conseguiram desmontar
as poderosas administrações leigas das Santas Casas, bem
como as ordens religiosas que prestavam serviços nestes
locais, instalando-se na direção dessas instituições (ENGEL,
2001; ODA e DALGARRONDA, 2005).

[...] por mais parciais e


ambíguas que tenham sido as
primeiras conquistas dos
alienistas brasileiros, elas
estiveram pautadas, desde o
início, na ampliação do
significado da moléstia mental
que, ultrapassando em muito
os limites da loucura associada
ao delírio, procurava legitimar a
reclusão de indivíduos que
manifestassem os mais
diversos comportamentos
considerados moral e/ou
socialmente perigosos, ao
mesmo tempo em que
viabilizava as perspectivas de
ampliação de poder do alienista
(ENGEL, 2001, p. 331).

Nas análises dos relatórios dos presidentes das províncias


estudadas, Oda e Dalgarronda (2005, p. 1005) identificam
“uma clara contradição entre o discurso que enunciava um
projeto de assistência oficial e moderno aos loucos e uma
prática realmente efetivada”. De fato tratava-se de pessoas
pobres submetidas a uma reclusão forçada e a péssimas
condições de vida. Nos documentos analisados por estes
autores há claras indicações da existência de pressão para
internação dos portadores de transtorno mental, de sua
retirada das ruas, ação operacionalizada através das
autoridades policiais. Para eles, o processo de
institucionalização dos alienados no Brasil foi marcado pela
construção de uma opinião pública consensual quanto à
necessidade e legitimidade de sua reclusão em hospícios
próprios.

2. A medicalização da loucura

Com o advento da República, em 1889, tem início um


período que se caracteriza pelo “redimensionamento das
políticas de controle social, cuja rigidez e abrangência eram
produzidas pelo reconhecimento e pela legitimidade dos
novos parâmetros definidores da ordem, do progresso, da
modernidade e da civilização” (ENGEL, 2001, p. 331). Asilo
de alienados, quartel de polícia, hospital psiquiátrico,
hospício, asilo de mendicidade e casa de correção tinham
como função principal realizar a exclusão social do louco,
garantindo que ele não ficasse perambulando pela rua, à
vista dos passantes, o que era incompatível como nosso
pretenso grau de civilidade. Entretanto, se os arranjos
realizados nas distintas unidades da Federação foram
diferenciados, uma tendência geral serviu de pano de fundo
para todas as respostas distintas e práticas diferenciadas
no tratamento da loucura pelo poder público: a exclusão
em instituições asilares de milhares de ‘homens livres’,
“onde só aguardavam o dia de sua morte, encarcerados
nesses imensos cemitérios dos vivos” (JABERT, 2005, p.
714).

Em 1890, o Hospício Pedro II é desvinculado da Santa


Casa, ficando subordinado à administração pública,
passando a denominar-se Hospício Nacional de Alienados,
primeira instituição pública de saúde estabelecida pela
República. Para Resende,

Pode-se estabelecer
grosseiramente o período
imediatamente posterior à
proclamação da república como
o marco divisório entre a
psiquiatria empírica do vice-
reinado e a psiquiátrica
científica, a laicização do asilo,
a ascensão dos representantes
da classe médica ao controle
das instituições e ao papel de
porta-vozes legítimos do
Estado, que avocara a si as
atribuições da assistência ao
doente mental, em questões de
saúde e doença mental tal
como a gravidade da situação
exigia (RESENDE, 2007, p. 43).
Nesse período, a loucura é gradativamente medicalizada e o
tratamento psiquiátrico continua a ter como principal
fundamento o isolamento do louco da vida social. “Os
hospícios e as colônias agrícolas, destinadas aos loucos
curáveis, para tratamento através da práxis ou da
ergoterapia, foram surgindo e se multiplicando pelos
principais centros urbanos do país como ícones de sua
modernização” (PASSOS, 2009a, p. 107). Para Amarante
(1998a, p. 76), “este conjunto de medidas caracterizam a
primeira reforma psiquiátrica no Brasil, que tem como
escopo a implantação do modelo de colônias de assistência
5
aos doentes mentais” .

Nesta época, a maioria dos Estados brasileiros incorpora


colônias agrícolas à sua rede de oferta de serviços, seja
como complemento aos hospitais psiquiátricos tradicionais,
seja como opção única ou predominante. De acordo com
Resende (2007, p. 47), o entusiasmo na adesão “à política
de construção de colônias agrícolas não se deu apenas por
exclusão de outras estratégias terapêuticas, de eficiência
duvidosa, mas por ter encontrado um ambiente político e
ideológico propícia ao seu florescimento”.

Como a prática psiquiátrica não


existe num vazio social, era de
se esperar que ela assimilasse
aos seus critérios de
diferenciação do normal e do
patológico os mesmos valores
da sociedade onde se inseria, e
se empenhasse em devolver à
comunidade indivíduos tratados
e curados, aptos para o
trabalho. O trabalho passou a
ser ao mesmo tempo meio e
fim do tratamento (RESENDE,
2007, p. 47).

Entretanto, apesar das intenções de recuperação dos


doentes mentais, nas propostas de seus criadores, as
colônias continuaram a manter na prática a mesma função
que caracterizava a assistência ao alienado no Brasil desde
a sua criação: a de excluir o louco de seu convívio social e
de escondê-lo dos olhos da sociedade. Este período, que se
encerra em 1920, mantém “inalterada a destinação social
do hospital psiquiátrico a despeito da substituição da
psiquiatria empírica pela cientifica” (RESENDE, 2007, p. 52)
e se destaca pela ampliação do espaço asilar.

3. Da higiene mental à psiquiatria comunitária

A década de 1920 é marcada pela “ampliação e o


aprofundamento da influência dos princípios eugênicos no
âmbito da psiquiatria brasileira, que sem romper com os
referenciais organicistas, passaria a caracterizar-se, cada
vez mais, pela presença de perspectivas preventistas”
(ENGEL, 2001, p. 175). Em 1923, com a fundação da Liga
Brasileira de Higiene Mental (LBHM), se cristaliza o
movimento de higiene mental, como um programa de
intervenção no espaço social com características
marcadamente eugenistas, xenofóbicas, antiliberais e
racistas. A psiquiatria passa também a pretender a
recuperação das raças e a constituição de coletividades
sadias, colocando-se definitivamente em defesa do Estado,
levando-o a uma ação rigorosa de controle social e
reivindicando um maior poder de intervenção (AMARANTE,
1998a, p. 78).

As palavras de ordem da Liga eram “controlar, tratar e


curar” e os fenômenos psíquicos eram vistos como produtos
da raça ou do meio, decorrentes de obscuros fatores
biológicos ou orgânicos. A visão da vertente mais radical da
Liga, liderada por Gustavo Riedel, seu fundador, guiava-se
por um princípio moralizador e saneador dos
comportamentos, pregando a pureza da raça ainda que
fosse à custa da esterilização dos “tarados e degenerados”.
A vertente higienista propunha melhorias sanitárias e
modificação dos costumes e dos modos de vida da
população como forma de prevenir as doenças mentais,
pois embora tivessem origem em fatores individuais, as
condições sanitárias, tais como “o aumento do alcoolismo e
da sífilis”, eram consideradas como “fatores
desencadeantes” (COSTA, 1989 apud PASSOS, 2009a, p.
108).

De acordo com Venâncio (2007), as ações político-


assistenciais para a área da psiquiatria, iniciadas na década
de 1940, foram organizadas no contexto de um processo de
modernização, centralização e nacionalização da assistência
mais ampla em saúde. Esse processo foi iniciado em 1930,
articulado a uma reforma das políticas de saúde, com a
criação de serviços nacionais por doenças produzindo uma
verticalização das ações, atreladas a enfermidades
especificas. Em 1941, foi criado o Serviço Nacional de
Doenças Mentais (SNDM), vinculado ao Ministério da
Educação e Saúde . Neste período predominavam os
6

hospitais públicos responsáveis por 80,7% dos hospitais


psiquiátricos no Brasil. Os famosos asilos, como o Juqueri
(em São Paulo), o Hospital de Alienados (no Rio de Janeiro)
e o São Pedro (em Porto Alegre), exerciam um papel
orientador da assistência psiquiátrica, consolidando a
política macro-hospitalar pública como o principal
instrumento de intervenção sobre a doença mental. Embora
existissem alguns hospitais privados e ambulatórios, estes
eram bastante incipientes diante do vigor dos hospitais
públicos (PAULIN e TURATO, 2004).

As décadas de 1940 e 1950 se caracterizam pela expansão


de hospitais públicos em vários estados brasileiros, cujo
crescimento foi propiciado pela aprovação do decreto-lei
8.555, de 3 de janeiro de 1946, que autorizava o SNDM a
realizar convênios com os governos estaduais para a
construção de hospitais psiquiátricos. O Código Brasileiro
7

de Saúde, publicado em 1945, condenava as denominações


‘asilo’, ‘retiro’ ou ‘recolhimento’, reconhecendo a categoria
‘hospital’, se afirmando o espaço de atuação do hospital
psiquiátrico. Naquela época a psiquiatria buscava se
estabelecer como especialidade médica e os instrumentos
mais avançados da psiquiatria biológica foram introduzidos
no país, como o choque cardiazólico, a psicocirurgia, a
insulinoterapia e a eletroconvulsoterapia (SAMPAIO, 1988;
AMARANTE, 1998a).

A criação de novos hospitais não amenizou a situação


caótica dos hospitais públicos que, na década de 1950,
viviam em total abandono e apresentando excesso de
pacientes internados, continuando os hospitais psiquiátricos
a terem basicamente a função social de exclusão. A
assistência psiquiátrica pública apresentava enorme
lentidão em tomar conhecimento das importantes
transformações que ocorriam na prática psiquiátrica na
Europa e Estados Unidos no período pós-segunda guerra e
as drogas psicóticas, parcialmente responsáveis por
grandes transformações nas práticas terapêuticas dos
asilos, só fariam sua aparição no mercado em 1955.
Segundo Resende (2007, p. 56), o descrédito que os
hospitais públicos atingiram junto à população, “expressada
em marchinhas de carnaval, anedotas e rótulos pejorativos
atribuídos a determinados hospitais”, seria utilizado
posteriormente como “evidência incontestável de sua
incompetência e um forte argumento em favor da
excelência da iniciativa privada”.

3. O surgimento da “indústria da loucura”

O tratamento asilar foi sendo modificado, questionado e


mesmo substituído desde o pós-guerra em vários países.
Neste período vários movimentos de contestação ao saber
e prática psiquiátrica instituída se fizeram notar no cenário
mundial, dos quais se destacam os movimentos
denominados Psiquiatria de Setor, na França; as
Comunidades Terapêuticas, na Inglaterra; e a Psiquiatria
Preventiva, nos EUA . Esses movimentos se caracterizaram
8

por visar uma reforma do modelo de atenção psiquiátrica,


propondo rearranjos técnico-científicos e administrativos da
psiquiatria. Apesar disso, observa-se uma grande expansão
da rede de hospitais psiquiátricos no Brasil a partir da
década de 1960.
9

O período que se seguiu ao golpe militar de 1964 foi o


marco divisório entre uma assistência eminentemente
destinada ao doente mental indigente e uma nova fase, a
partir da qual se estendeu a cobertura à massa de
trabalhadores e seus dependentes. Foram os governos
militares que consolidaram a articulação entre internação
asilar e privatização da assistência, com a crescente
contratação de leitos nas clínicas e hospitais psiquiátricos
conveniados, que floresceram rapidamente para atender a
demanda. As internações passaram a ser feitas não apenas
em hospitais públicos (que, dadas as suas precárias
condições, permaneceram reservados aos indivíduos sem
vínculos com a previdência social), mas em instituições
privadas, que eram remuneradas pelo setor público para
isso. Na maioria das vezes, as clínicas contratadas
10

funcionavam totalmente as expensas do Sistema Único de


Saúde (SUS) – antes via INPS (Instituto Nacional de
Previdência Social). Sua única fonte de receita era a
internação psiquiátrica, remunerada na forma de diária
paga para cada dia de internação de cada paciente.

Como na psiquiatria, ao contrário de outras especialidades


da medicina, a indicação de internação nem sempre é clara
ou indiscutível, a decisão, com grande margem de escolha,
fica a critério do médico ou da família do paciente. Como o
pressuposto disseminado no meio especializado e na
sociedade era de que lugar de louco é no hospício, e diante
da inexistência de dispositivos de assistência intensiva
alternativos ao modelo asilar, o sistema impulsionava a
internação, mesmo onde havia boa fé (TENÓRIO, 2002:
34). O sistema e a mentalidade vigentes estavam
organizados em torno da internação (e da internação
prolongada), as empresas hospitalares auferiam benefícios
significativos com as internações (sua única fonte de lucro),
com total falta de controle pelo estado, observando-se um
verdadeiro empuxo a internação, razão pela qual este
sistema veio a ser chamado de “indústria da loucura”.

A discussão acerca da necessidade de humanização do


tratamento do doente mental teve início na década de
1970, momento em que diversos setores da sociedade
brasileira se mobilizaram em torno da redemocratização do
país. A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em ações
políticas para defender médicos que haviam sido presos e
torturados, revitalizou, no cotidiano profissional, discussões
éticas acerca dos direitos humanos e da necessidade de
ampliação dos direitos individuais no país. Apelos para que
"ninguém fosse submetido à tortura, a tratamento ou
castigo cruel, desumano e degradante" e nem
"arbitrariamente preso, detido ou exilado" foram estendidos
para a condição de opressão do doente mental nos
manicômios e sua humilhação moral na sociedade em geral
(FIRMINO, 1982, p. 35). Os hospitais psiquiátricos,
centralizando a assistência e sendo praticamente únicos na
oferta de serviços psiquiátricos no contexto nacional,
tiveram as condições internas de maus-tratos aos
internados, desnudadas e denunciadas no processo social
brasileiro de "abertura democrática". A discussão acerca da
violência, dos maus tratos e da tortura praticada nos asilos
brasileiros produziu, em grande parte, a insatisfação que
alimentou o Movimento Antimanicomial. Entretanto, ainda
não estava muito claro qual deveria ser o modelo de
cuidado e nem havia uma proposta estruturada da
intervenção clínica.

3. A deflagração da reforma psiquiátrica


A derrocada da denominada “indústria da loucura”,
capitaneada pelo Movimento de Trabalhadores em Saúde
Mental (MTSM), dá início a quinta fase, que se inicia em
1978, identificada por Amarante e Torre (2010: 119), como
“fase de crítica institucional”, que deflagra a reforma
psiquiátrica. Segundo os autores mencionados, foi neste
ano que culminaram as denúncias e a mobilização de atores
sociais decisivos para a transformação do sistema
psiquiátrico vigente. Para eles, o acontecimento decisivo foi
a “crise da DINSAM”, órgão do Ministério da Saúde
responsável pela formulação das políticas de saúde do
subsetor saúde mental. Vários fatores, tais como, a
precarização das condições de trabalho, e as frequentes
denúncias de agressão, estupro, trabalho escravo e mortes
não esclarecidas, nas grandes instituições psiquiátricas
brasileiras, provocaram a união dos trabalhadores da saúde
mental para a luta pelas as mudanças necessárias no
sistema. A partir daí começam a ocorrer, em diversos
estados brasileiros, congressos e encontros decisivos na
militância do MTSM, dando origem à trajetória da Reforma
Psiquiátrica Brasileira (AMARANTE e TORRE, 2010: 117-
118).

A influência dos movimentos de crítica à psiquiatria


começou a se fazer sentir no contexto social brasileiro,
principalmente a partir da década de 1980, no ocaso da
ditadura militar e aguda crise econômica que
caracterizaram o período (OLIVEIRA e ALESSI, 2005). A
sociedade reencontrava as vias democráticas de expressão
e reivindicação e, neste contexto, as ideias de Foucault
(2005), Goffman (1996), Szasz (1961), Laing (1969,
1982), Scheff (1966), Basaglia (1985) e outros tiveram
uma forte influência. A situação crítica em que se
encontrava a assistência psiquiátrica brasileira era favorável
à crítica proposta por esses pensadores e por esses
movimentos sociais.

Alguns grupos de técnicos de saúde, acadêmicos, militantes


sociais, organizações comunitárias e afins, influenciados
pela Psiquiatria Democrática Italiana – especialmente o
pensamento de Franco Basaglia - começam a criar uma
sistematização de pensamento contra hegemônico na
assistência em Saúde Mental. No final da década de 1980,
surgem os primeiros Centros de Atenção Psicossocial –
CAPS e fecham-se alguns manicômios e se inicia um
embate epistemológico, político e técnico em prol de “uma
sociedade sem manicômios”. Em 1987 foi realizada, no Rio
de Janeiro, a I Conferência Nacional de Saúde Mental e, em
1989, foi dada a entrada no Congresso Nacional do Projeto
de Lei do Deputado Paulo Delgado (PT/MG), que propunha
a regulamentação dos direitos da pessoa com transtornos
mentais e a extinção progressiva dos manicômios no Brasil,
marcando “o início das lutas do movimento da Reforma
Psiquiátrica nos campos legislativo e normativo” (DELGADO
et al, 2007, p. 41).

Entre os protagonistas desse movimento contra-


hegemônico surge o Movimento Nacional da Luta
Antimanicomial como um movimento social deveras
heterogêneo, mas com um importante consenso entre seus
integrantes: não é mais aceitável que o infortúnio do
acometimento de um transtorno mental leve qualquer
indivíduo ao encarceramento num manicômio por décadas
de sua vida, muitas vezes sem cuidados integrais a sua
saúde e com desrespeito a seus direitos Humanos e civis.

3. A “institucionalização” da reforma psiquiátrica

Em função do compromisso firmado pelo Brasil na


Declaração de Caracas e pela realização da II Conferência
11

Nacional de Saúde Mental, passaram a entrar em vigor no


país, a partir da década de 1990, as primeiras normas
federais regulamentando a implantação dos serviços de
atenção diária, fundadas nas experiências dos primeiros
CAPS, NAPS e Hospitais-dias. Também foram aprovadas as
primeiras normas para fiscalização e classificação dos
hospitais psiquiátricos. As macro mudanças legislativas,
jurídicas e administrativas foram, no período de
institucionalização da Reforma Psiquiátrica, consideradas
necessárias e, até mesmo, as garantias de
operacionalização de novas práticas terapêuticas.

Nesta fase a Reforma Psiquiátrica efetivamente começou a


se materializar em serviços extra-hospitalares, sejam
intermediários ou substitutivos ao manicômio e os novos
serviços de saúde mental são normatizados, estabelecendo-
se algumas definições administrativas e operacionais. Se,
por um lado, isso assinala a inclusão da questão na agenda
governamental, definindo legalmente sua existência como
uma nova forma de assistência oficial, por outro lado, há
uma homogeneização dos serviços pela criação de um
modelo único, denominado nos documentos como
“NAPS/CAPS”, limitando “a criação de experiências
inovadoras, induzindo à criação de novas formas de
assistência estritamente sanitárias e tecnologias de
tratamento e organização de serviços padronizados sob um
modelo operacional” (AMARANTE e TORRE, 2010, p. 122).

No contexto da reforma psiquiátrica, duas leis solidificaram


a direção da política de saúde mental no Brasil, no sentido
da desospitalização da assistência psiquiátrica, atendimento
na comunidade e respeito aos direitos humanos do
paciente: a Lei Federal nº. 10.216, de abril de 2001, com
base na famosa "Lei Paulo Delgado", sobre a extinção dos
manicômios, criação de serviços substitutivos na
comunidade e regulação da internação psiquiátrica
compulsória (aprovada no Congresso após 12 anos de
tramitação); e a Lei Federal nº. 10.708, de julho de 2003,
instituindo o Programa De Volta para Casa (conhecida como
"Bolsa-Auxílio"), que assegura recursos financeiros que
incentivam a saída de pacientes com longo tempo de
internação dos hospícios para a família ou comunidade .
12

Outras Portarias importantes foram também a nº 106, de


2000, que dispõe sobre as residências terapêuticas e a
Portaria de nº 336, de 2002, que regulamenta os novos
serviços e o modelo assistencial, introduzindo as
modalidades CAPS I, II e III, CAPSi e CAPSad. Entretanto,
apesar do processo de expansão dos CAPS e NAPS (que em
2002 já somavam 424 serviços em todo o país), as normas
para fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos
não previam mecanismos sistemáticos para a redução de
leitos e cerca de 80% dos recursos do Ministério da Saúde
ainda eram destinados aos hospitais psiquiátricos (BRASIL,
2007).

Nesse período merece destaque ainda a realização da III


Conferência Nacional de Saúde Mental, ao final de 2001,
em Brasília, com ampla participação dos movimentos
sociais, de usuários e seus familiares que, segundo Delgado
et al (2007, p. 43) “consolida a Reforma Psiquiátrica como
política de governo, confere aos CAPS o valor estratégico
para a mudança do modelo de assistência e estabelece o
controle social como garantia da reforma Psiquiátrica”,
fornecendo “os substratos políticos e teóricos para a [atual]
política de Saúde mental no Brasil”.

3. A consolidação da reforma psiquiátrica

A partir de 2003, na gestão presidencial do Governo Lula, o


processo de desinstitucionalização vem avançando
significativamente, graças à criação de alguns mecanismos
para a redução de leitos psiquiátricos no país e a expansão
de serviços substitutivos como os Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS), levando ao fechamento de vários
hospitais psiquiátricos. A reflexão sobre essas medidas, que
será feita a seguir, apresenta um breve balanço da
implantação dos principais programas, dos novos serviços e
dos modelos assistenciais.

No que se refere à Atenção Psiquiátrica Hospitalar, salienta-


se o Programa Nacional de Avaliação do Sistema
Hospitalar/Psiquiatria (PNASH/Psiquiatria), instituído em
2002, que é essencialmente um instrumento de avaliação
que permite aos gestores um diagnóstico da qualidade da
assistência dos hospitais psiquiátricos conveniados e
públicos existentes na rede de saúde, descredenciando os
hospitais considerados de baixa qualidade. De fato trata-se
da instauração do primeiro processo avaliativo sistemático
dos hospitais psiquiátricos. O Programa Anual de
Reestruturação da Assistência Hospitalar Psiquiátrica no
SUS (PRH), aprovado em 2004 pelo Ministério da Saúde,
tinha como principal estratégia a redução progressiva e
planejada de leitos de macro-hospitais (acima de 600
leitos) e hospitais de grande porte (240 a 600 leitos
psiquiátricos), evitando a falta de assistência. Para tanto,
foram definidos os limites máximos e mínimos de redução
anual de leitos para cada classe de hospitais (definidos pelo
número de leitos existentes, contratados pelo SUS). Além
disso, se deveria garantir que os recursos que deixassem
de ser utilizados nos hospitais, com a progressiva redução
dos leitos, fossem redirecionadas para incremento das
ações territoriais e comunitárias de saúde mental (BRASIL,
2005). Dados do Ministério da Saúde mostram, no final de
2011, uma clara reversão dos recursos gastos com
hospitais psiquiátricos para os serviços extra-hospitalares,
quando mais de 70% dos recursos são destinados aos
gastos destes serviços (BRASIL, 2012).

Outro dado importante com relação à atenção hospitalar é


a mudança do perfil dos hospitais psiquiátricos que, desde
2002, vem ficando menores. Com o PNASH/Psiquiatria e o
Programa de Reestruturação da Assistência Psiquiátrica
(PRH), observa‐se uma mudança do perfil dos hospitais
psiquiátricos a partir da redução de leitos. Tal cenário foi
reforçado com a publicação da Portaria GM 2.644/09, de 28
de outubro de 2009, que vem induzindo o sistema, a partir
do reagrupamento dos hospitais psiquiátricos em quatro
classes , a remunerar melhor os hospitais de menor porte,
13

buscando-se a redução dos problemas presentes nos macro


hospitais e se configurando como uma estratégia, em
contextos mais difíceis de fechamento de leitos. Dados de
2011 mostram que 49,53% dos leitos psiquiátricos estão
situados em hospitais de pequeno porte (até 160 leitos),
enquanto em 2002 apenas 24,11% estavam nestes
hospitais. Os leitos em hospitais de grande porte (acima de
400 leitos) reduziram-se, no período 2002-2011, de
29,43% para 10,48% (BRASIL, 2012, p. 18). A expansão
de leitos psiquiátricos nos Hospitais Gerais é ainda um
problema para a rede de saúde mental, necessitando-se
investigar suas causas. Enquanto o número total de leitos
SUS em hospitais psiquiátricos, em 2011, era de 35.426
leitos, a estimativa de leitos habilitados de psiquiatria em
Hospitais Gerais era de apenas 3.910 leitos, distribuídos em
646 Hospitais Gerais, localizados de forma muito desigual
no território nacional (BRASIL, 2012, p. 20).

A implantação e o financiamento de Serviços Residenciais


Terapêuticos se constituem em componentes decisivos para
a concretização da superação do modelo de atenção
centrado no hospital psiquiátrico. As Residências
Terapêuticas são casas localizadas no meio urbano, que
devem ser utilizadas para resolver o problema de moradia
de pessoas com transtornos mentais graves,
preferencialmente as egressas de hospitais psiquiátricos,
devendo auxiliar o morador em seu processo de construção
progressiva de autonomia, como também de reintegração
na comunidade. Para aquelas pessoas que passaram anos
de suas vidas hospitalizadas o significado de habitar uma
residência terapêutica não significaria apenas o uso da
casa, mas “um processo de (re)apropriação da própria
vida”, a passagem do lugar de “pacientes” para o de
“residentes” A metáfora “retorno para casa” pode ser
considerada “a primeira referência simbólica de um rito de
passagem que sinaliza uma nova vida, uma nova
identidade, uma nova referência” (ROEDER, 2010, p. 319).
No final de 2011 existiam 779 residências em
funcionamento, com um total de 3.470 moradores, e ainda
154 residências em implantação (BRASIL, 2012, p. 11).
Vale salientar que a cobertura deste serviço ainda é muito
baixa em relação às necessidades existentes, e a oferta
desses serviços no território nacional também é muito
desigual (até 2011 não existiam residências terapêuticas
em quatro dos estados brasileiros).

O Programa de Volta para Casa tem como objetivo


contribuir para o processo de reinserção social e resgate da
cidadania das pessoas com longa história de internações
em hospitais psiquiátricos, através do pagamento mensal
de um auxílio-reabilitação pago aos seus beneficiários.
Entretanto, o programa tem encontrado algumas
dificuldades na sua implementação. A grande maioria dos
beneficiários, sendo egressos de longas internações
psiquiátricas, não possui a documentação pessoal mínima
para cadastramento no programa. Muitos não possuem
certidão de nascimento ou carteira de identidade (BRASIL,
2005; DELGADO et al, 2007). A inclusão de beneficiários no
programa depende de vários fatores, entre os quais se
destacam o ritmo efetivo da desinstitucionalização, da
organização de Residências Terapêuticas e da reinserção de
pacientes em suas famílias, o que explica a disparidade no
número de beneficiários por estado da federação. Dados
desagregados por estado mostravam que, em 2010, os
estados do Sudeste, com um total de 2.347 beneficiários,
concentravam 65,7% do total de beneficiários, enquanto
nos estados do Norte apenas quatro pessoas recebiam o
auxílio (BRASIL, 2010, p. 12).

A substituição do modelo hospitalocêntrico tem se dado


através da criação e fortalecimento de uma rede de
serviços substitutivos, como os Centros de Atenção
14
Psicossocial (CAPS) , Núcleos de Atenção Psicossocial
(NAPS), Hospitais-Dia, Centros de Convivência, Serviço de
Urgência e Emergência Psiquiátrica em Pronto-Socorro
Geral, etc. Compete aos CAPS o acolhimento e a atenção às
pessoas transtornos mentais graves e persistentes,
procurando preservar e fortalecer os laços sociais em seu
território. São serviços de saúde municipais abertos,
comunitários, que oferecem atendimento diário, que
buscam realizar “o acompanhamento clínico e reinserção
social” de seus usuários “por meio de acesso ao trabalho,
ao lazer, exercício de dos direitos civis e fortalecimento dos
laços familiares e comunitários” (DELGADO et al, 2007:
59).

Embora os primeiros CAPS tenham surgido no país desde


meados da década de 1980, só a partir de 2002 passaram
a receber uma linha específica de financiamento do
Ministério da Saúde, quando se observa uma grande
expansão destes serviços. Com o cadastramento de 122
novos CAPS em 2011, entre eles cinco CAPSad 24h, a
cobertura nacional em saúde mental chegou a 72%, com
1.742 CAPS em funcionamento (BRASIL, 2012). Apesar do
crescimento numérico extraordinário dessas unidades de
serviço, estes números ainda estão aquém do parâmetro
estabelecido pelo Ministério da Saúde, que é de um CAPS
para cada 100.000 habitantes. Além disso, a distribuição
espacial desses serviços no território nacional também é
bastante desigual (BRASIL, 2010). Embora o perfil
populacional seja um dos principais critérios para o
planejamento da rede de atenção à saúde mental nas
cidades, este é apenas um critério orientador para o
planejamento das ações.

Tendências atuais das políticas de saúde mental no


Brasil: começo de uma nova história?

Em uma rápida avaliação do processo aqui historiado,


pode-se perceber que a reforma psiquiátrica brasileira tem
se apresentado, de forma geral, bem sucedida e os fatos e
dados aqui apresentados demonstram que ela vem
alcançando alguns de seus objetivos, especialmente no que
tange à provisão de recursos extra-hospitalares e redução
da internação asilar. Um dos êxitos da política de saúde
mental atual foi ter conseguido o redirecionamento do
financiamento público e um maior controle sobre o
funcionamento dos hospitais. Entretanto, os dados
discutidos apontam também para desigualdades regionais
na inserção da Reforma Psiquiátrica nos estados da
federação.

Pode ser temerário afirmar que a era asilar tenha sido


suplantada no Brasil, considerando que, em muitos casos, o
internamento psiquiátrico como ato de exclusão e
isolamento ainda persiste em muitas localidades. O que se
pode afirmar é que a assistência à saúde mental no Brasil
apresenta uma clara tendência para a perda de hegemonia
institucional do hospital psiquiátrico e aponta para uma
nova convergência no modelo assistencial. Mas, o fato de
um serviço ser externo não garante sua natureza não-
manicomial e sua qualidade. Uma das críticas mais
contundentes da Reforma Psiquiátrica diz respeito à
identificação de certo processo de “reinstitucionalização”
nas políticas de saúde mental, que é demonstrado pela
configuração de uma “CAPScização” do modelo assistencial,
na forma como os CAPS são colocados como “centro do
sistema” (AMARANTE e TORRE, 2010, p. 130).

Integra ainda o processo de reforma psiquiátrica brasileira


a disseminação do recurso dos psicofármacos nos
tratamentos terapêuticos, o que pode ser corroborado pelo
aumento vertiginoso nos gastos de recursos federais
destinados ao pagamento de medicações “antipsicóticas
atípicas”, que se amplia de 35.817 milhões, em 2002, para
263.440 milhões em 2009, valores excessivamente altos,
se aproximando do custeio federal para toda a rede CAPS
no período considerado (BRASIL, 2010, p. 23). Se não se
pode negar que os médicos são, de modo geral, levados a
receitar remédios (por uma série de fatores que não cabe
aqui discutir), é verdade também que grande parte dos
usuários dos serviços espera do médico exatamente isso e,
por vezes, identifica a boa consulta ou o bom tratamento à
prescrição de medicamentos.
Mas, mesmo considerando-se alguns possíveis exageros
nessa medicalização em massa dos usuários dos serviços
de saúde mental, deve-se reconhecer a enorme
importância dos psicofármacos como instrumentos
terapêuticos. Como afirma Perrusi (2010: 102-103), o uso
de psicotrópicos produziu um processo de diferenciação na
clientela psiquiátrica, que não precisa mais ser identificada
como reclusa no asilo, produzindo internamentos
intermitentes (com duração limitada) e possibilitando a boa
parte dos pacientes o uso de serviços extra-hospitalares.
Atualmente no Brasil, assim como em muitos outros países,
os serviços psiquiátricos e de atenção psicossocial são
utilizados voluntariamente pelos pacientes, identificados
como “usuários”, no papel de doentes, ou seja, “num papel
reconhecido e sancionado socialmente, como qualquer
outro serviço de saúde pública ou privada”, contribuindo
para minimizar o estigma da intervenção psiquiátrica. Como
resultado conjunto da reforma institucional (hospitalização
do asilo + instituições extra-hospitalares), o portador do
sofrimento psíquico pôde deixar de ocupar uma linha
biográfica, a carreira moral de paciente psiquiátrico, cujo
resultado era a cronicidade do paciente, se transformando
em usuário.

“Assim, os estados psicóticos


cronificados estão deixando de
povoar os hospitais
psiquiátricos e um bom número
de pacientes reencontrou o
meio social, embora muitos
sejam dependentes de uma
assistência extra-hospitalar e
sofram de uma socialização
precária. Talvez, a dependência
dos serviços extra-hospitalares
e da ajuda social seja a grande
contrapartida da reforma
psiquiátrica” (PERRUSI, 2010,
p. 103).

Atualmente, a visão do louco e da loucura como algo a ser


excluído do convívio social tem sido amplamente
questionado na medida em que a proposta de
desinstitucionalização vem sendo incorporada na agenda
pública. Mas, interessa saber também qual é a visão dos
profissionais de saúde, da população em geral e dos
familiares dos portadores de sofrimento psíquico e como
estes atuam neste processo.

Perrusi (2010, p. 103) salienta que o portador de


transtorno mental, mesmo deixando de ser um recluso no
asilo, pode perseverar num estado de invalidez permanente
ou sucumbir a uma exclusão social “aberta” ou outras
formas de exclusão, e até sofrer um processo de
mendigação. Um dos maiores desafios da reforma
psiquiátrica parecer ser ainda a superação do estigma do
“louco” como pessoa perigosa ou incapaz no imaginário
social. A permanência do estigma em relação ao portador
de sofrimento psíquico pode colaborar na perpetuação da
exclusão social, na dificuldade de inserção no mercado de
trabalho e na comunidade, na construção de relações
afetivas e no isolamento, muitas vezes levado a efeito pela
própria família, na intenção de proteger seus membros do
risco da chacota e do escárnio social.

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1Texto produzido no âmbito de um projeto de investigação


financiado pelo CNPq (A reforma psiquiátrica no Brasil: o
papel das redes sociais e os desafios nas novas práticas de
cuidados na saúde mental - Edital MCT/CNPq/MEC/CAPES
Nº 02/2010). Constitui-se em versão revisada e ampliada
de Comunicação apresentada no XXVIII Congresso
Internacional da Associação Latino-Americana de
Sociologia (ALAS), Recife, setembro de 2011.

* Universidade Federal de Pernambuco, Brasil.

2Segundo Passos (2009b, p. 35) essa é a expressão utilizada


pelos praticantes da desinstitucionalização italiana, como
forma de renomear a doença mental por criticar o seu
conteúdo médico-patológico original e estrito.

3Segundo Machado (1978, p. 382), em meados do século XIX


surgem no Brasil os primeiros trabalhos teóricos sobre
alienação mental, entretanto, a teorização psiquiátrica não
reflete qualquer articulação com a prática, se constituindo
em “um exercício de cunho universitário, escolar e
burocrático”. Apenas em 1881 é que seria criada a cadeira
de Psiquiatria na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.

4Conforme informações de Moreira (1905) e Medeiros (1977,


apud ODA E DALGARRONDA, 2005).

5No âmbito da assistência foram criadas as Colônias de São


Bento e de Conde Mesquita (para tratamento de alienados
indigentes do sexo masculino) na cidade do Rio de Janeiro,
as duas primeiras colônias de alienados do Brasil e da
América Latina. Logo depois foram criadas as Colônias de
Juqueri, em São Paulo, e a de Vargem Alegre, no interior
do Rio de Janeiro. Em 1911, foi criada a Colônia de
Alienadas de Engenho de Dentro (para mulheres
indigentes) e, em 1920, são iniciadas as obras da Colônia
de Alienados de Jacarepaguá e as obras do manicômio
Judiciário (AMARANTE, 1998a, p. 76).

6O SNDM mais tarde se constituiu na Divisão Nacional de


Saúde Mental (DINSAM) e hoje é a Coordenadoria Geral de
Saúde Mental do Ministério da Saúde.

7Entre 1841 e 1954 foram criadas 56 instituições psiquiátricas,


concentradas principalmente na região Sudeste
(predominantemente no Rio de janeiro e São Paulo),
Nordeste e Norte (PASSOS, 2009a, p.107).

8Para um mapeamento dos movimentos reformistas da


psiquiatria na contemporaneidade consultar Amarante
(1998b).

9Em 1961 existiam 140 hospitais psiquiátricos no Brasil, dos


quais 54 pertenciam à esfera pública e 86 à esfera
privada. Dez anos depois, quando se deu a mais ampla
privatização de serviços de saúde da história do país, 340
hospitais distribuíam-se pelo território nacional, sendo 277
privados e 63 públicos. Em 1981, a rede hospitalar privada
havia crescido ainda mais, alcançando 425 hospitais.
Nenhum hospital público foi aberto entre 1971 e 1981
(MESSAS, 2008, p. 93).

10O direcionamento do financiamento público para a esfera


privada durante o regime militar pode ser percebida no
fato de que entre 1965 e 1970 a população internada em
hospitais públicos permaneceu inalterada, enquanto a
clientela das instituições privadas remuneradas pelo setor
público saltou de 14 mil para 30 mil, chegando a uma
proporção de 80% de leitos contratados junto ao setor
privado e 20% diretamente públicos (TENÓRIO, 2002, p.
34).

11O principal documento norteador das políticas adotadas pelo


governo brasileiro nesta área foi a declaração de Caracas,
aprovada em 1990. Este documento estabeleceu a diretriz
da saúde mental, centrando-a na comunidade e dentro de
sua rede social. Os recursos, cuidados e tratamentos
devem salvaguardar a dignidade pessoal, direitos civis e
humanos, propiciando a permanência do doente em seu
meio comunitário. O principal efeito nocivo do sistema
asilar era diagnosticado como o isolamento, a
desintegração social e a exclusão do portador de
transtorno mental (DUNKER e KYRILLOS NETO, 2004, p.
119) .

12O período 1990-2003 concentra a máxima intensidade


política e normativa do que chamamos, no Brasil, de
Reforma Psiquiátrica. Para uma visão do conjunto de
normativo no período, ver publicação do Ministério da
Saúde (BRASIL, 2004a), que se constitui em uma
antologia de documentos legais, capaz de ajudar na
compreensão do esforço de construção da agenda de
saúde mental do SUS.

13Macro hospitais (acima de 600 leitos); hospitais de grande


porte (240 a 600 leitos psiquiátricos); hospitais de médio
porte (161 a 240 leitos) e hospitais de pequeno porte (até
160 leitos).

14Os CAPS estão estabelecidos em três níveis: CAPS I e CAPS


II (para atendimento diário de adultos) e CAPS III (para
atendimento diário e noturno de adultos), definidos por
ordem crescente de porte, complexidade e abrangência
populacional. Os CAPSi são destinados ao tratamento de
crianças e adolescentes com transtornos mentais e os
CAPSad são destinados à população dependente de álcool
e outras drogas. Os CAPSad III ou CAPSad 24h, que
começaram a ser implantados em 2012, são serviços
destinados ao cuidado de pessoas que fazem uso abusivo
do álcool e outras drogas, que funcionam 24 horas, nos
sete dias da semana, inclusive finais de semana e feriados.

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