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UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA

ALEXANDRE FALCÃO SANSEVERINO

OS DESAFIOS DO PROFESSOR INICIANTE DO ENSINO SUPERIOR

SÃO PAULO

2018
1

UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA

ALEXANDRE FALCÃO SANSEVERINO

OS DESAFIOS DO PROFESSOR INICIANTE DO ENSINO SUPERIOR

Trabalho de Conclusão de Curso


como requisito parcial para a aprovação na
Pós-Graduação em Formação de Professores
para o Ensino Superior para a obtenção do
título de Especialista em Ensino Superior,
apresentado à Comissão Julgadora da
Universidade Paulista – UNIP.

SÃO PAULO

2018
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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos professores iniciantes do Ensino Superior.


3

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Jeová Deus pela vida e pela oportunidade de realizar esta Pós-
-Graduação.

À minha mãe, Cleonice Falcão Sanseverino, e à minha amiga, a professora


doutora Talita Pedroni Torres, pelo incentivo e pelo apoio dados.

À minha amiga, a professora mestre Andrea Carina Pilipposian, pela ajuda


nas minhas dúvidas e inquietações.

À minha amiga, a professora mestre Patrícia Quirino de Sousa, pela


disposição em ajudar e pelo apoio prestado.

À professora especialista Bernadete Matos, minha ex-chefa, por ter sido uma
formadora, tanto de nós como funcionários, como professores, quanto como seres
humanos. Ela é humanista e preocupada com a formação integral, holística, do ser
humano.
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“Não há docência sem discência... Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende
ensina ao aprender.” (Paulo Freire)

“Eu era muito menino quando descobri uma certa paixão pelos estudos de gramática
e dei saltos por mim mesmo. Eu li todos os bons gramáticos brasileiros e portugueses que eu
conseguia comprar em sebos, tinha uma paixão enorme e foi exatamente me servindo dos
conhecimentos que fui adquirindo que eu me tornei, antes mesmo de estar dando aula,
competente para dar aula. Dando aula a jovens de classe média, tão apertados quanto eu em
Jaboatão, que fui me tornando professor. Quando digo que ninguém nasce professor, eu
tenho uma experiência viva disso.” (Paulo Freire)

“Ensinar não é nada mais do que mostrar a diferença entre uma coisa e outra no que se
refere aos seus objetivos, suas formas e suas origens. (...) Portanto, quem explica bem as diferenças,
ensina bem.” (João Amós Comênio)
5

RESUMO

O docente neófito no Ensino Superior passa por dificuldades ou desafios que são
normais aos principiantes. Há dúvidas, inquietações, além de algum eventual
problema de infraestrutura. Como a Didática pode ajudar? É preciso ter uma
formação específica para ser professor de Ensino Superior? Um bom profissional
pode contribuir com sua experiência? Aprende-se Didática dando aulas? Este
trabalho pretende responder a essas perguntas. A metodologia usada foi o estudo e
comparação de diversos autores sobre a Didática no Ensino Superior. Pudemos
chegar à conclusão de que sim, o professor do Ensino Superior precisa ter uma
formação específica para atuar como docente, mesmo que ele já conheça o
conteúdo a ser passado.

Palavras- chave: Docência; Ensino Superior; Didática; Professor iniciante.


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RESUMEN

El docente neófito en la Enseñanza Superior atraviesa dificultades o retos que son


naturales a los principiantes. Hay dudas, inquietudes, además de algún posible
problema de infraestructura. ¿Cómo puede ayudarle la Didáctica? ¿Hay que tener
una formación específica para ser profesor de Enseñanza Superior? ¿Puede un
buen profesional contribuir con su experiencia? ¿Se aprende la Didáctica
impartiendo clases? Este trabajo pretende responder a esas preguntas. La
metodología usada fue el estudio y la comparación de diversos autores sobre la
Didáctica en la Enseñanza Superior. Hemos podido llegar a la conclusión de que sí,
el profesor de la Enseñanza Superior necesita tener una formación específica para
actuar como docente, aunque ya conozca el contenido que debe transmitirse.

Palabras- claves: Docencia; Enseñanza Superior; Didáctica; Profesor principiante.


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SUMÁRIO:

Resumo ................................................................................. 5

Resumen ............................................................................... 6

Introdução ………………………………………………............. 8

Capítulo 1 – “No princípio” ………………………………........ 12

Capítulo 2 – A Andragogia ………………………………........ 22

Capítulo 3 – A formação dos professores ………………....... 25

Capítulo 4 – O professor pesquisador .................................. 38

Capítulo 5 – Quem é o professor do Ensino Superior? ........ 43

5.1 – O professor na era das TICs ........................................ 48

Capítulo 6 – Ensinar .............................................................. 51

6.1 – Como ensinar – métodos e técnicas ............................ 56

Capítulo 7 – Aprender ........................................................... 64

Capítulo 8 – Ensinagem ........................................................ 69

8.1 – Ensinar a pensar .......................................................... 71

Considerações Finais ............................................................ 72

Referências Bibliográficas ..................................................... 75

Anexo ..................................................................................... 79
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INTRODUÇÃO

“Aquele professor é ‘fera’! Sabe muito! Mas sabe só pra ele. Não consegue
passar pros outros”, “Ele sabe muito, mas falta didática”. Comentários como esses
ilustram a necessidade da Didática no ensino, incluído o Ensino Superior.

Cury (2013, p. 64) afirma: “Bons professores são didáticos, professores


fascinantes vão além. Possuem sensibilidade para falar ao coração dos seus
alunos”.

Mas o que é, de fato, Didática?

Figura 1. Disponível em <https://www.slideshare.net/Rhouver/didtica-do-ensino-superior-2017>

Vejamos algumas definições:

Para Libâneo (1995, p. 15): “Iniciamos nosso estudo da Didática situando-a


no conjunto dos conhecimentos pedagógicos”. E acrescenta: “(...) o processo de
ensino – objeto de estudo da Didática...”.

Monteiro, Silva e José (s/d, p. 16) dizem: “A didática é o principal ramo da


pedagogia. Ocupa-se em estudar os métodos e as formas mais apropriados de
praticar a instrução e o ensino”.

Araújo (2000, p. 43) afirma que há vários conceitos de Didática:

processo de transferência de conhecimentos;


maneira de transferir cultura;
conjunto de processos ou técnicas para maior rendimento do educando;
doutrina do ensino e do método;
direção da aprendizagem;
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“estudos do conjunto de recursos técnicos que tem em mira dirigir a


aprendizagem do educando, tendo em vista levá-lo a atingir um estado de
maturidade que lhe permita encontrar-se com a realidade, de maneira
consciente, eficiente e responsável, para na mesma atuar como um cidadão
responsável” (Nerici, 1989);
“estudo dos procedimentos destinados a orientar a aprendizagem do
educando da maneira mais eficiente possível, em direção a objetivos
predeterminados” (Nerici, 1989);
conjunto de estratégias e técnicas para estimular a evolução sadia de
processos mentais em suas etapas de “pensamento operacional-concreto”
(0-3 anos); “pensamento imaginativo” (4-7 anos); “pensamento abstrato” (8-
12 ou 15 anos) culminando na “racionalidade ética” (síntese do
construtivismo piagetiano);
“método de capacitar para o jogo triádico da vida” (De Gregori, 1999).

Segundo Schmitz (1980, pp. VII, 1 e 3):

Ao resolvermos escrever sobre didática, estabelecemos de propósito


uma diferença entre didática e metodologia. Consideramos didática como
uma teoria geral do ensino e de aprendizagem. Como tal, ela necessita
fornecer todos os elementos fundamentais da situação a que se dedicará.
Já a metodologia se preocupa mais com as situações imediatas de ensino e
aprendizagem, fornecendo princípios de aplicação imediata a situações
concretas.

(...) a didática é uma ciência humana, básica para ação na educação.


Está-se acostumado a confundir didática com metodologia. Na prática,
muitos livros ou tratados de didática se reduzem a desenvolver aspectos
relacionados apenas com metodologia do ensino. Inicia-se com
planejamento, visando a uma aplicação imediata. A seguir se desenvolvem
outros aspectos referentes à ação direta e concreta do professor. Tudo isso
é metodologia, faltando uma fundamentação para toda essa ação, que para
nós é parte da didática.

(...) a ação educativa é uma ação humana por excelência.

(...) a didática... representa... uma tomada de decisão em torno do


que é conveniente para o homem, o aluno, na situação educacional em que
ele se encontra. (...)

Entendemos, pois, didática como: a ciência que estuda a organização


da situação de aprendizagem e educação para o aluno, a partir deste
mesmo aluno e para o alcance de seus objetivos. (Grifos do autor.)

Carvalho (s/d, p. 2), esclarece:

A didática é a área da Pedagogia que tem como objeto de estudo o


ensino. Isto é, a didática é uma das áreas da Pedagogia que tem como
finalidade investigar os fundamentos, condições e formas de realização da
educação, em sua versão escolar, ou seja, mediante o ensino sistematizado
e de conteúdos formativos. (Grifo da autora.)

Pimenta e Anastasiou (2014, p. 82) comentam:


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Os professores universitários, quando indagados sobre o conceito de


didática, dizem em uníssono, com base em suas experiências, que “ter
didática é saber ensinar” e “muitos professores sabem a matéria, mas não
sabem ensinar”. Portanto, didática é saber ensinar. Essa percepção traz em
si uma contradição importante. De um lado, revela que os alunos esperam
que a Didática lhes forneça as técnicas a serem aplicadas em toda e
qualquer situação para que o ensino dê certo; esperam ao mesmo tempo
em que desconfiam, pois também há muitos professores que cursaram a
disciplina (e até a ensinam!) e, no entanto, não têm didática. De outro,
revela que, de certa maneira, há um reconhecimento de que, para saber
ensinar, não bastam a experiência e os conhecimentos específicos, mas se
fazem necessários os saberes pedagógicos e didáticos. (Grifos das
autoras.)

Comentando a já citada declaração de Pimenta e Anastasiou de que os


professores costumam dizer que “ter didática é saber ensinar”, Carvalho (s/d, pp. 3 e
4) complementa:

Essa tendência, na óptica dos professores, vem de uma concepção


de didática normativa, sem apropriação de sua função social
transformadora.

Assim, chega-se ao entendimento de que em Didática se aprende as


técnicas (sic) de dar aulas. Esse reducionismo da Didática é legitimado pela
fragmentação da organização curricular nos moldes disciplinares, agravada
com a diferenciação entre disciplinas teóricas e disciplinas práticas.

Muitos... confundem Didática com “um receituário de boas aulas”,


numa nítida visão reducionista da prática, isenta de teoria! Lembrem-se: a
Didática constitui-se como teoria do ensino.

Nóvoa, citado por Castanho (2004, p. 156), refere que a formação do


professor não se esgota na dimensão técnica e enfatiza que: “Não há
receitas para a solução de problemas pedagógicos. A situação de sala de
aula é altamente complexa, envolve múltiplos aspectos e não é possível
reduzi-la a poucas variáveis a manipular. Isso não significa que não seja
possível dar indicações práticas para o trabalho pedagógico (...), significa
que não há conselhos infalíveis aplicáveis a qualquer contexto”. (Grifos da
autora.)

Com base nas definições acima, podemos dizer simplificadamente que


Didática é a ciência que estuda o modo de transmitir conhecimento com o fim de
alcançar a aprendizagem.

Por que nos demoramos em definir Didática? Ora, o tema deste trabalho é a
Didática no Ensino Superior. Alguns alunos, por vezes, se queixam da falta de
didática de certos professores, embora reconheçam que estes sabem ou entendem
muito da sua área.

De acordo com Tinoco (2015, p.38), isso ocorre porque:


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Historicamente, a formação para a docência universitária constituiu-se


como uma atividade menor. Existia a preocupação com o bom desempenho
profissional, e o treinamento profissional. Alguns teóricos apontam que a
docência poderia ser prestada por qualquer um que soubesse realizar bem
determinado ofício. Destacam, em seus estudos, que quem soubesse fazer,
saberia automaticamente ensinar, não havendo, portanto, preocupações
mais determinadas com a necessidade de um preparo pedagógico do
professor. (Grifo nosso.)

Fica evidente que isso ocorre em muitos casos, em especial no ensino técnico
de 2° grau e em alguns cursos do Ensino Superior.
Nosso foco será no professor do ensino superior, especialmente o iniciante.
Fávero e Tauchen (2013, p. 237) dizem que “(...) a questão da
profissionalização precisa ser discutida como um problema de ‘reprofissionalização’,
pois possuímos uma profissão anterior à profissão docente universitária.”
Discordamos em parte dessa afirmação porque, afinal, muitos têm como formação
primária a licenciatura e, portanto, já tiveram sua formação voltada para o ensino,
embora não o universitário.
Os que já vêm da área da Educação, certamente, contam com uma preparação
pedagógica. Porém, talvez o desafio maior seja a mudança de público: como
adequar os conhecimentos didático-pedagógicos, até então aplicados a crianças e
adolescentes, a jovens e adultos? Como redirecionar a sua prática didática? O que
se espera desse profissional? Mais: se a Pedagogia se relaciona à criança, como
transpor esse conhecimento para o ensino de adultos? Claro que, neste último caso,
pode-se falar de Andragogia, que é o ensino-aprendizagem de adultos.
Fávero e Tauchen (2013, pp. 237 e 238) argumentam que

Há um processo inicial de construção da identidade profissional, que


passa por estudos sistemáticos da graduação, pela participação nas
entidades de classe, pelas atividades profissionais em determinados
setores, uma regulamentação profissional que configura, com o passar dos
anos, uma identidade profissional caracterizada por saberes, fazeres e
formas de conviver. Contudo, esse processo de profissionalização inicial,
em geral, não comporta a profissionalização para a docência na educação
superior. Nem mesmo as licenciaturas que se voltam para a educação
básica, contemplam estudos sobre este campo profissional. (Grifo nosso.)

O objetivo deste trabalho é tentar elucidar essas questões e contribuir para a


Didática do professor iniciante do Ensino Superior. Falando em iniciante: alguns
consideram o início da carreira como os primeiros três a sete anos. Mas nosso foco
será nos que principiam “do zero”, os que ainda estão “crus”, inexperientes.
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CAPÍTULO 1 – “NO PRINCÍPIO”

Ἐν ἀρχῇ ἦν ὁ Λόγος... (João 1:1, O Novo Testamento Grego,


Sociedade Bíblica Alemã e Sociedade Bíblica do Brasil)

Figura 2. Disponível em <http://www.professoremsala.com.br/5-cuidados-indispensaveis-para-o-


professor-iniciante-nos-primeiros-dias-de-aula>

A epígrafe deste capítulo diz muito. Não nos deteremos no significado bíblico
(inclusive, nem é este o propósito deste trabalho), mas “brincaremos” com os
possíveis significados de logos.

A palavra grega λόγος, transliterada logos, segundo o Dicionário Grego-


-Português e Português-Grego de Isidro Pereira (1998, p. 350), significa:

palavra; dito; revelação divina, resposta dum oráculo; máxima, sentença;


exemplo; decisão, resolução; condição; promessas; pretexto; argumento;
ordem; menção; notícia que corre; conversação; relato; matéria de estudo
ou de conversação; razão, inteligência; senso comum; a razão de uma
coisa; motivo; juízo, opinião; estima, valor que se dá a uma coisa;
justificação; explicação; a razão divina; N.T. O Verbo de Deus. (Grifos
nossos.)

O curioso é que se relaciona este substantivo com o verbo lego, o qual é


definido como (à p. 343): “dizer; declarar, anunciar; designar; querer dizer;
vangloriar-se; ler; ordenar, mandar; falar como orador; fazer dizer.” (Grifo nosso.)

Se logos pode significar “inteligência, razão” e também “argumento”, não seria


apropriado relacioná-lo ao professor (em especial o universitário), o qual, em
português, também é chamado de “o lente”?
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Além disso, a palavra lógica está relacionada com logos. E o professor deve
argumentar, falar de maneira lógica, provar, explicar, dar referências.

O fato de relacionar-se o verbo lego com “falar como orador” nos faz lembrar
os sofistas. Na introdução ao primeiro volume dos Diálogos de Platão, da editora
Edipro, Bini (2014, pp. 11 e 12) diz que a palavra sofista está relacionada a sofos,
que significa “hábil em alguma arte manual” ou “hábil”, em geral. E agrega:

Os sofistas eram professores de retórica e filosofia implicando


necessariamente a correlação desses dois saberes. (...) o que se entendia
por sofista: o professor de retórica e política, ou melhor ainda: o professor
que ensinava como utilizar a retórica no discurso e debate políticos...
ensinavam a jovens... habilidade e maestria no uso da palavra visando à
persuasão do público. (Grifos do autor.)

Sobre a retórica, Alexandre Jr., na introdução ao livro Retórica, de Aristóteles


(2012, pp. XX, XXI, XXVII e XXIX), diz o seguinte:
Retórica é... uma forma de comunicação, uma ciência que se ocupa
dos princípios e das técnicas de comunicação. Não de toda a comunicação,
obviamente, mas daquela que tem fins persuasivos. Não é, pois, fácil dar da
retórica uma só definição. Quando dizemos que ela é a arte de falar bem e
a arte de persuadir, a arte do discurso ornado e a arte do discurso eficaz,
estamos simplesmente tentando estabelecer a relação entre duas maneiras
de definir a retórica, de ligar o ornamento e a eficácia, o agradável e o útil, o
fundo e a forma. Quando os antigos dizem que a retórica é a arte de bem
falar, fazem-no na consciência de que para se falar bem é necessário
pensar bem, e de que o pensar bem pressupõe não só ter ideias e tê-las
lógica e esteticamente arrumadas, mas também ter um estilo de vida, um
viver em conformidade com o que se crê. (...) Arte de bem dizer, arte de
persuadir, arte moral, eis os elementos implícita ou explicitamente
verificados em quase todas as definições de retórica.

(...) a sua Retórica [de Aristóteles] ocupa-se da arte da comunicação,


do discurso feito em público com fins persuasivos.

A verdadeira retórica é uma forma de argumentação comparável à


dialética. (Grifos nossos.)

E o próprio Aristóteles (p. 5) afirma:

A retórica é a outra face da dialética; pois ambas se ocupam de


questões mais ou menos ligadas ao conhecimento comum e não
correspondem a nenhuma ciência em particular.

De fato, todas as pessoas que de alguma participam de uma e de


outra, pois todas elas tentam em certa medida questionar e sustentar um
argumento, defender-se ou acusar. (Destaques nossos.)

Isso nos faz lembrar o que dizia Freire (2016, pp. 28, 34 e 35):

(...) faz parte [da] tarefa docente [do educador] não apenas ensinar os
conteúdos, mas também ensinar a pensar certo. (...) o ensino dos
14

conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral do educando. Educar é


substantivamente formar. (...) Ensinar exige a corporificação das palavras
pelo exemplo. (...) Pensar certo é fazer certo. (Grifos nossos.)

Figura 3. Disponível em Bagno (2012, p. 39).

O que queremos dizer com tudo isso? “No princípio, era o professor.” (É certo
que este verbo ser, era, dá a ideia de existir. Mas vamos pensá-lo como estar,
estava.) No princípio de sua carreira. “No princípio, estava o professor universitário,
em início de carreira, a entrar na sala de aula para ensinar seus alunos.” E ele deve
formar os alunos. Ajudá-los a pensar. E o princípio de carreira pode ser
atemorizante. Veremos alguns desafios aos quais se depara o professor
universitário iniciante.

Meireles (2017), em seu blog (http://www.professoremsala.com.br), lista cinco


cuidados que devem ter os professores iniciantes nos primeiros dias de aula:

Planejar bem as aulas;


Ser organizado/disciplinado;
Não demonstrar timidez;
Demonstrar segurança e
Mostrar autoridade

E em seguida discorre um pouco sobre cada um dos tópicos. Vamos falar de


três deles: o planejamento das aulas, demonstrar segurança e autoridade.

Sobre o primeiro, sabemos que as aulas devem ser planejadas. É


fundamental fazê-lo! Existe um planejamento anual ou semestral (às vezes também
semanal), mas cada aula deve ser preparada. A professora Bernadete Matos
costuma dizer: “Good student, good teacher!”, ou seja: o bom aluno influi no bom
professor e vice-versa. Mas ela também costuma afirmar: “Todas as aulas devem
ser preparadas!”.

As aulas devem ser planejadas, com previsão do tempo usado, as atividades


a serem realizadas, como abordar tal aspecto, o conteúdo, os objetivos a serem
alcançados, as dificuldades que determinada sala (ou certo aluno) pode ter, entre
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outras coisas. Isso ajuda na organização e no bom andamento da aula (embora, é


claro, não seja possível prever imprevistos ou alguma pergunta possa fazer-nos sair
do roteiro). E se chegamos a errar no planejamento? Segundo Karla Veloso Pinto (in
Pellegrini, 2011, p. 51):

Errar no planejamento não é exclusividade dos professores iniciantes.


Os mais experientes também enfrentam esse tipo de tropeço ao longo da
carreira. Isso porque uma turma é diferente da outra e as atividades e
sequências didáticas já testadas podem não obter o mesmo resultado em
duas classes diferentes. Se os alunos são participativos e perguntam muito
sobre um conteúdo que despertou a curiosidade deles, certamente será
necessário dispor de mais tempo do que o resevado para ensiná-lo numa
turma mais retraída. A saída é nunca perder o foco no objetivo final e ir
corrigindo o que for necessário a cada aula, seja retomando pontos que não
ficaram claros anteriormente ou abreviando conteúdos que se tornam
supérfluos...

Ainda sobre o planejamento, vejamos o que escreveu Carvalho (s/d, p. 8):

A Didática prende-se então à intencionalidade, ou seja, ao ato pré-


-determinado de ensinar, o que implica, portanto, em planejar. (...)

Gil (2006, pp. 94, 95) enfatiza a importância do planejamento... e...


assim define o planejamento educacional: “processo sistematizado
mediante o qual se pode conferir maior eficiência às atividades
educacionais para, em determinado prazo, alcançar as metas
estabelecidas”.

(...) Gil (2006): “(...) nem todos planejam seus cursos de maneira
criativa. Muitos simplesmente seguem os capítulos de um livro texto, sem
considerar realmente o que é necessário que os alunos aprendam. Também
é grande o número de professores que utilizam sem muita reflexão os
mesmos métodos de ensino e os mesmos procedimentos de avaliação”.

Sintetizando, podemos afirmar que há momentos que antecedem a


aula. Libâneo (1990) cita a necessidade de explicitação de objetivos, a
organização e seleção de conteúdos, o conhecimento e compreensão do
nível cognitivo do aluno, a definição e os instrumentos do ensino.

A respeito de demonstrar segurança, Meireles (2017), no blog supracitado


menciona:

Caso ele [o professor] não tenha segurança, nem confiança na sua


capacidade para lidar com tal situação [a indisciplina dos alunos], é provável
que se sinta inseguro e possa manifestar grande dificuldade de exercer seu
papel.

Porém, tem casos que (sic) a insegurança tem um efeito protetor, na


medida em que nos impede de cometer erros ou de correr riscos
desnecessários.
16

Em ambos os casos o ideal é que o professor não deixe que a insegurança


seja um obstáculo e sim um combustível para exercer a sua missão com
eficiência.

Se você está inseguro porque teme a indisciplina dos alunos, então


pesquise, peça ajuda, crie estratégias para lidar com essa situação.

Se você está inseguro porque acha que não está preparado suficiente,
então use essa insegurança para se preparar o máximo possível, estude
bastante, pesquise, enfim, transforme a insegurança em competências e
cumpra o seu papel. (Grifos da autora.)

Por fim, sobre autoridade, citamos Paulo Freire (2016, p. 100): “Sou professor
a favor... da liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a
licenciosidade...”.

Contudo, não param aí os desafios do professor universitário iniciante. Há


outras coisas a levar em conta. Por exemplo, Perrelli e Garcia (2016, pp. 13 e 14)
mencionam as dificuldades vivenciadas por professores iniciantes no ensino superior
no Brasil, relatadas no Congreso Internacional del Profesorado Principiante e
Inserción Profesional a la Docencia, nos anos 2010, 2012 e 2014 (adaptado):

1) Aluno:

Imaturidade;
Falta de conhecimento básico;
Dificuldades de aprendizagem;
Dificuldade para pensar e resolver problemas;
Desinteresse pela aula;
Desmotivação;
Desrespeito ao professor mais jovem;

2) Professor:

Dúvidas com relação à conduta docente;


Desmotivação
Dificuldade de equacionar o tempo das atribuições docentes com as de
gestão administrativa;
Ausência de formação específica para a disciplina ministrada;
17

Falta de vivência no mercado de trabalho para o qual está sendo formado o


aluno;
Frustração por não conseguir mudanças;
Desconhecimento das normas e regulamentos internos;
Dificuldades em lidar com o sistema de registro de aula;
Percorrer os trâmites burocráticos (retirar senhas, comunicar ausências,
solicitar encaminhamentos, redigir memorandos, etc.);

3) Relações humanas:

Dificuldade de relacionamento com os alunos;


Dificuldades em lidar com os diferentes perfis sociais e de personalidade;
Contradição de discurso com a prática pedagógica;
Falta de comunicação entre o corpo docente;
Dificuldades na comunicação com os alunos;
Inibição para enfrentar a sala de aula;

4) Ensino da matéria:

Dúvidas na seleção de conteúdos;


Dificuldades de adaptação do conteúdo ao tempo de aula;
Dúvidas sobre métodos para transmissão de conteúdo;
Dúvidas sobre avaliação;
Obrigação de ministrar diferentes disciplinas;
Dificuldade de ministrar disciplinas que não tiveram na graduação;
Distanciamento da teoria da sala de aula com a prática profissional no
mercado de trabalho;
Dificuldades na determinação do nível de aprendizagem dos alunos;

5) Infraestrutura:

Carência de materiais básicos (toner para impressora, por ex.);


Carência de materiais mais sofisticados;
Limitação de recursos;
Conservação dos espaços físicos;
Carência de recursos audiovisuais;
Insuficiência da biblioteca;
Excessivo número de alunos por turma;
Incompetência do corpo técnico administrativo;
Docentes sobrecarregados por cumprir outras funções;
18

Excesso de trabalho;
Falta de tempo para o docente se atualizar, estudar, pesquisar;

6) Institucionais:

Ausência de políticas de apoio ao docente iniciante;


Dificuldades na recepção pelos pares e pelos alunos;
Ausência de momentos de discussão em relação ao pedagógico, ficando
estes restritos a aspectos administrativos e burocráticos;
Excesso de burocracia.

E prosseguem (p. 14):

Quanto às condições para a superação das dificuldades, citadas


pelos professores iniciantes, os relatos apontam:

a) em relação ao ensino da matéria: o professor iniciante busca auxílio dos


colegas, a quem recorre em busca de materiais didáticos e para
programar a disciplina, buscam também soluções individuais, tais como
ler sobre o assunto em literatura especializada ou estudar sozinho um
determinado conteúdo que não domina.
b) sobre os problemas de relações humanas: contribuem para superá-los a
boa recepção por parte da universidade, dos colegas e dos alunos.
c) questões de infraestrutura: são superadas com o oferecimento de boas
condições materiais de trabalho (equipamentos didáticos, biblioteca,
acesso a rede de computadores, etc.)
d) em relação à formação para a docência: a maioria dos relatos aponta
que o professor vai superando esse problema aprendendo na prática,
pois falta uma política institucional permanente de apoio pedagógico e
esse apoio, quando existe, é restrita (sic) às “capacitações” que
ocorrem de forma esporádica, são de curta duração, têm enfoque
principal as instruções burocráticas e raramente promovem a discussão
das experiências docentes no início da carreira. (Grifos nossos; aspas
das autoras.)

Embora elaborado pensando no professor neófito do Ensino Básico


(Fundamental e Médio), o Guia do professor iniciante, da revista Nova Escola,
organizado por Pellegrini (2011, pp. 48 e 51), dá valiosos conselhos:
19

O objetivo do professor no primeiro dia de aula é conhecer e


conquistar a turma. Especialistas indicam medidas que podem ajudar a dar
conta do recado.

Apresentar-se. Antes de qualquer coisa, é fundamental o iniciante


dizer quem é, dar pistas de sua personalidade, de seus gostos e de suas
expectativas. Nessa conversa, cabe um panorama dos conteúdos e do que
é esperado dos alunos.

Tornar o contato inicial agradável. Essa é a forma de deixar os


estudantes animados para o próximo encontro. A dica é pensar numa uma
(sic) atividade que permita estabelecer uma aproximação entre professor e
alunos e deles entre si. Uma alternativa é a leitura de um texto seguida de
uma dinâmica de grupo para apresentações. O professor pode só observar
ou também participar – para permitir que a classe o conheça melhor.

Falar sobre o que vão aprender. É interessante apresentar o


programa e contar detalhes sobre cada etapa. Isso permite que os
estudantes se sintam parte do processo de construção do conhecimento. Se
eles sabem o objetivo da sequência de que participam e o que cada etapa
deve agregar, veem mais sentido nas aulas, o que pode se traduzir em
motivação para estudar. (...)

O segredo para ganhar a confiança da turma é ser autêntico, sem


forçar a espontaneidade – se não for uma característica genuína.
Especialistas afirmam que, quanto mais velhos os estudantes, mais
importantes as informações sobre a formação de quem ensina. (...)

“A primeira aula pode servir como um ótimo exercício de observação


do grupo de estudantes. Uma atividade produtiva é propor que eles pensem
sobre o nome da disciplina e relatem suas ideias relacionadas a ela. Com
isso, todos acabam contando, espontaneamente, algumas de suas
experiências. (...) Com base nessa atividade simples, é possível colher
muitas informações, como quanto os estudantes já avançaram, o tipo de
contato que mantêm uns com os outros e a capacidade de cada um em
responder prontamente a uma questão...” – Eliane Bambini Gorgueira
Bruno, docente da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) e formadora de
gestores e coordenadores pedagógicos na rede municipal de São Paulo.
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Também se recomenda que o docente novato tenha um dos mais experientes


como mentor. E, de acordo com a figura a seguir, a troca pode ser muito rica: o
novato contribui com a inovação, o entusiasmo, enquanto o veterano contribui com a
experiência e o conhecimento da instituição. Mas a figura dá mais detalhes:

Figura 4. Disponível em Pellegrini (2011, p. 58).

Uma amiga nossa, quando passou por experiência na docência universitária,


disse ter tido receio de os alunos lhe fazerem alguma pergunta que ela não
soubesse responder (o que nunca ocorreu), de serem muito exigentes... Disse que a
21

universidade deixa o professor à vontade, ninguém se imiscui na aula alheia. No


entanto, ela sentia justamente a falta de um apoio, de um como fazer. Relatou que
sentiu diferença quando, por determinação do MEC, a universidade criou o curso de
Formação de Professores (pois ela estava ainda cursando seu Mestrado, mas, por
determinação do MEC, até certo mês de determinado ano era preciso que os
professores universitários tivessem concluído, ao menos, uma pós-graduação lato
sensu), o que fez com que muitos docentes, dentre eles alguns com anos de
experiência, compartilhassem suas experiências em sala de aula com os colegas.

A questão da formação de professores será discutida no capítulo três.


Questão essa muito importante, pois, segundo Perrelli e Garcia (2016, p. 10):

No mundo do trabalho, o iniciante enfrenta problemas os mais


diversos, entre estes a adaptação à burocracia, o isolamento dos seus
pares, a dificuldade de fazer com que os alunos aprendam aquilo que
ensina, a indisciplina, a adequação dos conteúdos ao tempo previsto e ao
público-alvo. É diante desses obstáculos que afloram no professor novato
as aprendizagens obtidas “por observação”: o professor se inspira nos
antigos mestres para conduzir a sua prática ou imita outros colegas. Em
geral, o fazem de forma acrítica, correndo o risco de desenvolverem uma
concepção técnica de ensino. (Grifos nossos.)

É por isso que é preciso haver uma formação adequada para o professorado.
Antes, porém, vejamos sobre a andragogia.
22

CAPÍTULO 2 – A ANDRAGOGIA

Figura 5. Disponível em
<http1.bp.blogspot.com_CJybtY61quMS7TyfqMYKEIAAAAAAAAAC0_3PGwDSXjSYs1600tabela01.jpg >

O que é andragogia? Andragogia é a “ciência ou conjunto de métodos para


ensinar adultos.” (Dicionário Priberam , on-line.) Portanto, andragogia é a educação
de adultos.
Lindeman (1926, apud LAB SSJ, s/d, p.8) afirma:

A educação de adultos representa um processo através do qual o


adulto se torna consciente de sua experiência e a avalia. Para fazer isso ele
não pode começar a estudar “disciplinas” na esperança de que algum dia
essas informações sejam úteis. Pelo contrário, ele começa dando atenção a
situações onde ele se encontra, a problemas que trazem obstáculos para
sua auto-realização (sic). São usados fatos e informações das diversas
esferas do conhecimento, não para fins de acumulação, mas por
necessidade de solucionar problemas.

Assim, o Ensino Superior é algo mais direcionado, específico. Por isso


também, a didática para esse ramo do ensino deve ser direcionada ao público-alvo
específico (mais adulto).
Hofer (in Svinicki e McKeachie, 2013, pp. 150 e 152), fala sobre autonomia,
autodeterminação e motivação. Ela sublinha:

(...) o ser humano tem uma necessidade fundamental de autonomia


e autodeterminação (Deci & Ryan, 2000). Em geral, as pessoas querem
controlar os próprios comportamentos e valorizam a sensação de controle
sobre o ambiente. É possível enfatizar a sensação de controle dos alunos
oferecendo oportunidades significantes de escolha e apoiando a autonomia
que, em troca, aumenta a motivação. (...)
Dedicar tempo para fazer feedback construtivo nos trabalhos dos
alunos e devolvê-los como oportunidade para ensino futuro pode facilitar o
engajamento e a motivação do aluno.
23

Soares e Cunha (2010, pp. 27 e 28) mencionam sobre a aprendizagem de


adultos:

Diversos estudos, cujo pioneiro foi o de Knowles (1984, apud


MARCELO GARCÍA, 1999), evidenciam que o processo de aprendizagem
de adultos pressupõe o seu engajamento consciente e voluntário. Isso
equivale a dizer que eles precisam compreender a finalidade de estudar os
conteúdos apresentados, entender sua lógica e ter possibilidade de
negociar as formas propostas pelo professor para trabalhar esses
conteúdos e para avaliar a aprendizagem realizada, pois, como explica o
autor, a evolução do adulto é marcada pela passagem da dependência para
a autonomia. (Grifos nossos.)

Rosa (2016) diz ser necessário que:

- As informações, as ideias, as práticas que estão sendo


transmitidas façam sentido. A sensação de estar sendo exposto à “cultura
inútil” hoje afasta as pessoas rapidamente.

- O aprendizado tem de ser colaborativo: professor com alunos,


alunos com alunos. É bom imaginar a sala de aula como um centro de
aprendizado e estímulo para todos.

Segundo o livro Andragogia. Aprendizagem efetiva para o desenvolvimento


de adultos, de LAB SSJ (s/d, pp. 9, 11-16):

Adultos aprendem melhor quando suas necessidades e interesses,


situações de vida, experiências, autoconceitos e diferenças individuais são
levados em consideração. (...)

[Alguns] princípios da Andragogia:

Necessidade de saber – Por que você está me ensinando isso?


Adultos precisam saber por que necessitam aprender algo antes de
começar a aprendê-lo. (...)

O papel das experiências – Minhas experiências são a base do meu


aprendizado.
(...) as técnicas que utilizam a experiência dos adultos aprendizes – como
discussões em grupo, exercícios de simulação, atividades de resolução de
problemas, estudos de caso e métodos de laboratório – serão mais eficazes
que as técnicas de transmissão.

Prontidão para aprender – Qual problema vou resolver com isso que você
quer que eu aprenda?
Os adultos têm predisposições para aprender aquilo que devem saber e
precisam para se tornar capacitados para enfrentar as situações da vida
real.

Orientação para aprendizagem – Estou aprendendo matérias ou ganhando


ferramentas?
(...) Os adultos são motivados a aprender conforme percebem que a
aprendizagem os ajudará a executar tarefas ou lidar com problemas que
24

vivenciam em sua vida. (...) eles assimilam novos conhecimentos,


percepções, habilidades, valores e atitudes de maneira mais eficaz quando
são apresentados a contextos de aplicação a situações da vida real.

Motivação – E daí que isso cai na prova...


(...) os fatores motivacionais mais poderosos são as pressões internas (o
desejo de ter maior satisfação no trabalho, autoestima, qualidade de vida).

Barreto (2009, p. 28) lança luz sobre o assunto ao dizer:

(...) independente da faixa etária do discente e de seu nível


de formação, consideramos que as teorias de aprendizagem podem e
devem ser aplicadas a toda relação professor-aluno. Sendo as relações
interpessoais o meio de transmissão do conhecimento construído, através
das quais existe a troca de significados, o docente sempre se apresenta
como um modelo. Da mesma forma que os pais, para as crianças, se
transformam em referência, o docente, mesmo na formação de adultos,
também ocupa este lugar.

Tinoco (2015, p. 40) comenta:

(...) apesar de muitos professores do ensino superior não


acreditarem em uma pedagogia, eles não podem dispensar a pedagogia
que se aprende a partir da reflexão sobre a própria experiência decorrente
do ensino de uma disciplina, quando se está atento ao seu efeito sobre os
alunos e quando se procura tornar o trabalho tão eficaz quanto possível.

Podemos substituir a palavra “pedagogia” por “andragogia” para o


entendimento da afirmação acima. O fato é que o professor, para sê-lo, necessita
mais do que apenas conhecer o conteúdo. Isso nos leva a outra questão.
25

CAPÍTULO 3 – A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES

Muito se tem discutido sobre o tema acima. Afinal, o que faz alguém ser
professor?
“Professores, há aos milhares. Mas professor é profissão, não é algo que se
define por dentro, por amor. Educador, ao contrário, não é profissão, é vocação. E
toda vocação nasce de um grande amor, de uma grande esperança.” (Rubem Alves,
apud Viana, 2015, p. 52; grifo nosso.)

Morosini (2000, pp. 11 e 12) afirma:

Se nos reportarmos à formação docente, não há uma unidade. Exige-


-se, cada vez mais, capacitação permanente em cursos de pós-graduação
da área de conhecimento. Mas o docente está preparado didaticamente
para o exercício acadêmico? Por premissa, considerando o tipo de
graduação realizada, encontramos, exercendo a docência universitária,
professores com formação didática obtida em cursos de licenciatura; outros,
que trazem sua experiência profissional para a sala de aula; e, outros ainda,
sem experiência profissional ou didática, oriundos de curso de
especialização e/ou stricto sensu. O fator definidor da seleção de
professores, até então, era a competência científica.
Com o processo de globalização, que se adentrou de forma
acentuada pelo panorama nacional, a concepção de docência universitária
está sofrendo alterações. No plano da capacitação da área de
conhecimento, os parâmetros são claros. No plano da didática, embora
esses parâmetros não sejam claros, da etapa da docência universitária,
caracterizada pelo laisse-faire (sic), passa-se à etapa da exigência de
desempenho docente de excelência. Tornam-se definidores: um cidadão
competente e competitivo; inserido na sociedade e no mercado de trabalho;
com maior nível de escolarização e de melhor qualidade; utilizando
tecnologias de informação na sua docência; produzindo seu trabalho não
mais de forma isolada, mas em redes acadêmicas nacionais e
internacionais; dominando o conhecimento contemporâneo e manejando-o
para a resolução de problemas, etc. Um docente que domine o trato da
matéria do ensino, a integre ao contexto curricular e histórico-social, utilize
formas de ensinar variadas, domine a linguagem corporal/gestual e busque
a participação do aluno (Cunha, 1990).
(...) no plano da formação didática, a LDB se abstém.

Fazendo uma ponte entre didática e a formação docente, Libâneo (1995, pp.
71 e 74) afirma:

(...) a Didática é a disciplina que estuda o processo de ensino tomado


em seu conjunto, isto é, os objetivos educativos e os objetivos de ensino, os
conteúdos científicos, os métodos e as formas de organização do ensino, as
condições e meios que mobilizam o aluno para o estudo ativo e seu
desenvolvimento intelectual. Para isso, investiga as leis e princípios gerais
do ensino e da aprendizagem, conforme as condições concretas em que se
desenvolvem. Os conhecimentos teóricos e metodológicos, assim como o
domínio dos modos do fazer docente, propiciam uma orientação mais
segura para o trabalho profissional do professor. (...)

A Didática, assim, oferece uma contribuição indispensável à formação


dos professores, sintetizando no seu conteúdo a contribuição de
26

conhecimentos de outras disciplinas que convergem para o esclarecimento


dos fatores condicionantes do processo de instrução e ensino, intimamente
vinculado com a educação e, ao mesmo tempo, provendo os
conhecimentos específicos necessários para o exercício das tarefas
docentes. (Grifos nossos.)

De acordo com Rodrigues (2014, p. 24):

O corpo docente das IES é formado por um grupo misto de


professores especialistas, mestres e doutores. É exigência legal (LDB - Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96)) que estas
tenham um percentual mínimo de 1/3 (um terço) de mestres e doutores,
sendo possível notar, porém, em algumas IES, números maiores do que
estes exigidos legalmente.
É possível identificar uma preferência de um modo geral pelos
professores com títulos de mestres ou doutores, porém tal preferência não
promove garantia de uma melhor qualificação, no que diz respeito as (sic)
habilidades em pedagogia e didática, destes profissionais. Segundo Lobo
(2003) existe um princípio equivocado de que a contratação de professores
doutores em detrimento de profissionais competentes é garantia de bom
ensino de graduação.
Não são exigidos conhecimentos de base para o magistério ou
mesmo uma formação sistemática propiciadora da construção de uma
identidade profissional para a docência (Anastasiou, 2003). Essa ausência
da formação dos professores para a docência no ensino superior torna este
um lugar de atividade “assistemática, com escasso rigor e pouca
investigação”, segundo Marcelo Garcia.
Ao observarmos a grade curricular dos cursos de pós-graduação,
tanto lato sensu quanto stricto sensu, (exceto aqueles da área de educação)
percebemos que não estão necessariamente inseridas as disciplinas
voltadas a pedagogia, didática, avaliação etc., tão importantes no preparo
ao desempenho da função docente.
Veiga et al. (2000, p.190), afirmam: “Se a especificidade e
identidade da profissão docente é o ensino, é inadmissível que professores
universitários que detenham o domínio do conhecimento em um campo
científico não recebam uma formação mais condizente com as reais
necessidades dos alunos e do ser professor.”

Isso nos faz refletir. Afinal, não deveria o professor universitário ter uma
formação voltada para o ensino e a didática? Os cursos de Mestrado e Doutorado
não deveriam, ademais do preparo para a pesquisa, incluir disciplinas voltadas para
o ensino-aprendizagem e a abordagem didático-pedagógica para jovens e adultos?

De acordo com Pimenta e Anastasiou (2014, pp. 251 e 252), há um programa


da USP chamado PAE – Programa de Aperfeiçoamento do Ensino – que existe
desde 2001 e o Programa Estágio de Docência, desenvolvido pela Capes, os quais
visam à formação pedagógica dos docentes universitários. No entanto, parecem ser
insuficientes. O ideal seria que houvesse essa preocupação em todos os cursos de
pós-graduação.

Cunha (2004, apud Rodrigues, 2014, p. 25) afirma:

A concepção da docência como dom carrega um desprestígio da


sua condição acadêmica, relegando os conhecimentos pedagógicos a um
segundo plano e desvalorizando esse campo na formação do docente de
todos os níveis, mas, principalmente, o universitário.
27

Não somente Cunha o diz. Outros autores também. Imbernón (2006, p. 29)
destaca:
A profissão docente comporta um conhecimento pedagógico
específico, um compromisso ético e moral e a necessidade de dividir a
responsabilidade com outros agentes sociais, (...) não pode nem deve ser
uma profissão meramente técnica de “especialistas infalíveis” que
transmitem unicamente conhecimentos acadêmicos. Como diz Lanier
(1984), “os professores possuem um amplo corpo de conhecimentos e
habilidades especializadas que adquirem durante um prolongado
(prolongado se aceitarmos a formação como desenvolvimento durante toda
a vida profissional) período de formação, (...) emitem juízos e tomam
decisões que aplicam a situações únicas e particulares com que se
deparam na prática”. A profissão docente se moverá então em um delicado
equilíbrio entre as tarefas profissionais (alguns autores as chamam de
acadêmicas) e a estrutura de participação social. (Grifos nossos.)

E acrescenta, à página 30: “(...) a especificidade da profissão está no


conhecimento pedagógico”.

Viana (2015, pp. 55, 57-59) declara:

As habilidades e competências exigidas do profissional docente


requerem uma preparação acadêmica tanto na área específica do
conhecimento quanto no campo da cognição das teorias de aprendizagem e
das novas linguagens como o uso dos novos recursos tecnológicos na
educação. (...) Diante das novas tecnologias... a didática deve pensar em
novas formas de relações sociais, novas pedagogias e estratégias emotivas
e cognitivas, que integrem a produção do conhecimento bem como sua
socialização. (...) Formar professores universitários... implica compreender a
importância do papel da docência, propiciando uma profundidade científico-
-pedagógica que os capacite a enfrentar questões fundamentais e
desafiadoras na atualidade, como ser sujeito de sua ação profissional que, a
partir de um processo cooperativo de estudo e análise compartilhada da
prática docente, pautada em referenciais teóricos e experiências
profissionais, aprenda a fazer críticas e enfrente as próprias limitações,
articulando múltiplos saberes que se manifestam na ação docente, de tal
maneira que a aprendizagem seja significativa e não mecânica.

(...) a educação... na esfera do ensino superior (...), deve propiciar a


formação de profissionais pensantes, reflexivos, capazes de atuar no
mundo com criticidade e possibilidade de transformar o mundo e sua própria
existência. (Destaques nossos.)

Também Tinoco (2015, pp. 40 e 41) fala sobre a formação dos professores e
inclui algo mais:

(...) além da necessidade de capacitações pontuais, leituras


pedagógicas e amplas discussões sobre o tema, busca-se melhoria no fazer
docente. (...) É preciso deixar claro que a tarefa de ensinar implica não só
em domínio pedagógico ou de conhecimentos de sua área de atuação, mas
também, depende em (sic) opções éticas, em professores sensíveis e
preocupados com os resultados do ensino e com o seu fazer político na
sociedade. (Grifos nossos.)
28

Tinoco (2015, p. 38) diz, além disso, que os professores devem atualizar-se e
estar bem informados no que tange “aos conhecimentos científicos, curriculares,
pedagógicos e institucionais”.

Menezes (2009, p. 216), baseada em Imbernón (2004), diz que “é a formação


inicial que deve [tornar os futuros docentes] aptos à tarefa de ensinar e fornecer as
bases para a construção do conhecimento pedagógico especializado.”

Imbernón (2006, pp. 60 e 61) comenta que a formação inicial dos docentes
deve capacitá-los a apoiar

(...) suas ações em uma fundamentação válida para evitar cair no paradoxo
de ensinar a não ensinar, ou em uma falta de responsabilidade social e
política que implica todo ato educativo e em uma visão funcionalista,
mecânica, rotineira, técnica, burocrática e não reflexiva da profissão, que
ocasiona um baixo nível de abstração, de atitude reflexiva e um escasso
potencial de aplicação inovadora. (Grifos nossos.)

Também Soares e Cunha (2010, pp. 28, 32-34) escreveram sobre a formação
dos docentes. Elas dizem:

A complexidade da docência universitária se configura, também, por


ela ser um espaço de conexão de conhecimentos, subjetividades e culturas,
que exige um conteúdo científico, tecnológico ou artístico altamente
especializado, orientado para a formação de uma profissão. (Lucarelli,
2004) Formação que, no dizer de Tardiff (2002a), deve ser voltada para a
reflexão, o discernimento e a compreensão de situações problemáticas do
contexto da prática profissional e para a definição de objetivos pertinentes à
situação e à identificação dos meios adequados para atingi-los. Isso implica,
para o docente universitário, a tarefa de compreender criticamente a
profissão em foco e o contexto mais amplo no qual ela se insere. Precisa,
ainda, possibilitar, ao estudante, uma articulação consistente entre teoria e
prática na formação de profissionais comprometidos com a transformação
social, críticos, reflexivos e autônomos. (...)

A formação desse profissional precisa garantir articulação entre


teoria e prática, levando em conta a reflexão epistemológica da prática “(...)
de modo a que aprender a ensinar seja realizado através de um processo
em que o conhecimento prático e o conhecimento teórico possam integrar-
-se num currículo orientado para a ação.” (Marcelo García, 1999, p.29)
(...) Não existe uma tradição, nas sociedades ocidentais, de formação
inicial do docente universitário...

Salvo experiências isoladas, (...) a formação desse professor tem se


revelado, na prática, como um conjunto de atividades caracterizadas por
sua brevidade e concreção, destinada a professores já contratados.
Portanto, a participação em cursos com essa finalidade não se constitui em
critério de seleção. (Destaques nossos.)

Há os que dizem que não é necessário ter uma formação específica para
ensinar. Basta ter o conhecimento de uma profissão ou de um idioma, por exemplo,
querer ensinar e ter vocação para isso. Será correto esse pensamento? O patrono
29

da educação brasileira, Paulo Freire, disse algo muito importante quanto a isso
numa entrevista dada ao Jornal dos Professores, do Sindicato dos Professores de
São Paulo, em dezembro de 1991. A reprodução da entrevista, abaixo, foi retirada
de Araújo Freire, 2014 (pp. 369 e 370):

JORNAL DOS PROFESSORES: O que o levou a ser professor?

PAULO FREIRE: Eu dizia que havia duas razões visíveis para eu ter
me entregue ao magistério. Uma era a necessidade de ajudar. A minha
família sofreu o impacto da crise de 1929, tivemos que nos mudar do Recife
para Jaboatão, foi uma espécie de decisão mágica da família, para ver se
fora seria melhor, mas não deu certo. A falta de dinheiro e o endividamento
continuaram lá. Quando eu tinha os meus 18 ou 19 anos, estudante de
ginásio, eu precisava ajudar em casa. Meus dois irmãos estavam
trabalhando normalmente, muito sacrificados, minha irmã estava no último
ano da Escola Normal e a única maneira de eu ajudar era ensinando.

A segunda, na verdade, foi uma questão de gosto intelectual. Eu era


muito menino quando descobri uma certa paixão pelos estudos de
gramática e dei saltos por mim mesmo. Eu li todos os bons gramáticos
brasileiros e portugueses que eu conseguia comprar em sebos, tinha uma
paixão enorme e foi exatamente me servindo dos conhecimentos que fui
adquirindo que eu me tornei, antes mesmo de estar dando aula, competente
para dar aula. Dando aula a jovens de classe média, tão apertados quanto
eu em Jaboatão, que fui me tornando professor. Quando digo que ninguém
nasce professor, eu tenho uma experiência viva disso. (Grifos nossos.)

Como deve ser a preparação dos futuros professores? O que devem ensinar?
Freire (2016, p. 101) responde:

(...) não posso ser professor sem me achar capacitado para ensinar certo e
bem os conteúdos de minha disciplina, não posso, por outro lado, reduzir
minha prática docente ao puro ensino daqueles conteúdos. Esse é um
momento apenas de minha atividade pedagógica. Tão importante quanto
ele, o ensino dos conteúdos, é... a preparação científica... (Grifos nossos.)

Muitos dizem que, para ser professor, basta saber algo e querer transmiti-lo.
Existem até livros e vídeos na internet que advogam que não é necessário ter uma
formação específica para ensinar, inclusive (e especialmente) numa universidade.
Essas declarações desmerecem a profissão e fazem-na parecer apenas um trabalho
informal, o popular “bico”.

A falta de profissionais faz a necessidade abrir exceções. Acontece isso com


o Ensino Básico. Muitos licenciados em determinada disciplina, ensinam outras que
são denominadas correlatas, como História e Geografia, Matemática e Física. Os
formados no curso de Letras ficam de fora dessa constatação porque, em geral,
quem faz Letras tem dupla formação: no idioma pátrio e em uma língua estrangeira,
seja moderna (inglês, espanhol, francês, alemão, entre outras), ou clássica (latim ou
grego). Entretanto, a falta de professores em certas áreas (ao menos na Educação
Básica), abre a exceção de se contratar bacharéis (não licenciados). Claro, do
30

conteúdo eles entendem; porém lhes faltam conhecimentos específicos sobre como
ensinar dito conteúdo. Algo similar ocorre no Ensino Superior quando são
contratados como docentes profissionais que, embora graduados, não têm uma
formação específica para ensinar.

Por exemplo, Rosa (2016) afirma:

(...) estava interagindo com um ex-executivo de mais ou menos 50 anos que


não desejava voltar mais ao mundo corporativo e buscava alternativas. Vi
que ele tinha excelente experiência e um bom currículo, que incluía até
mesmo um curso de média duração em Harvard. Além disso, tinha
excelente fluência verbal e uma ótima cultura geral. Veio-me a ideia óbvia a
sugerir-lhe:

– Você poderia dar umas aulas, em pós-graduação. (Grifos nossos.)

É verdade que a fluência verbal não deve ser desprezada, tampouco a


experiência. Mas é preciso muito mais para ser professor! A formação para tornar-se
docente incluirá disciplinas pedagógicas já na graduação ou, em seu defeito, ao
menos na pós-graduação.

Curioso o que o mesmo Rosa (2016) diz mais adiante:

Quem pode habilitar-se a dar aulas em faculdades? A pessoa que


tem: a) conhecimento suficiente; b) credenciais – formação superior e saber
prático ou pós-graduação (se tiver mestrado e doutorado, muito melhor); c)
habilidade didática suficiente. (...)

Conhece aquele velho método (da piada) de treinar nadadores para


as Olimpíadas? Jogue a pessoa na água e solte o tubarão! Assim é com a
didática: aprende-se fazendo. Um dos fatores mais importantes para um
aprendizado rápido é ter atitudes adequadas: a) não querer impressionar ou
brilhar, mas, sim, colaborar, ajudar; b) autoconfiança – advinda de uma
preparação adequada; c) não ver os alunos como avaliadores que estão ali
para julgar e condenar; d) disposição para construir a aula junto com o
aluno. (Grifos nossos.)

Concordamos com certas afirmações, como estar bem preparado, construir a


aula com o aluno... Mas parece haver uma contradição. Aprende-se didática
fazendo? Então, o que é estar bem preparado? Não é estudar, obter uma formação
para o ensino? Seria o preparar a aula? E como adquirir habilidade didática sem
estudar Didática e sem uma prática reflexiva? É mesmo necessário um “aprendizado
rápido”? É a velocidade que determina a qualidade do aprendizado? Ou é melhor,
mesmo que se demore mais um pouco, que se possa fazer todos os alunos
entenderem, compreenderem, aprenderem e apreenderem o que se ensina?

Concordamos com a afirmação de Cury (2003, pp. 57e 58; grifos nossos;
mantivemos a ortografia):

Bons professores têm uma boa cultura acadêmica e transmitem


com segurança e eloqüência as informações em sala de aula. Os
31

professores fascinantes ultrapassam essa meta. Eles procuram conhecer o


funcionamento da mente dos alunos para educar melhor. Para eles, cada
aluno não é mais um número na sala de aula, mas um ser humano
complexo, com necessidades peculiares. (...)

O primeiro hábito de um professor fascinante é entender a mente do


aluno e procurar respostas incomuns, diferentes daquelas a que o jovem
está acostumado.

Isso implica conhecer ao menos o que escreveram/estudaram Vigotsky e


Piaget sobre o pensamento e a linguagem.

Pensando na formação e nos estudos de pós-graduação para o professor, é


bem verdade que o Mestrado e o Doutorado tampouco estão voltados para a
docência. Antes, direcionam-se à pesquisa, à formação do pesquisador, daquele
que participa em congressos, do que produz artigos e publica-os em periódicos
especializados. No entanto, de acordo com Pimenta (2012), in Pimenta e Anastasiou
(2014, p. 13):

Entendendo que a democratização do ensino passa pelos


professores, por sua formação, por sua valorização profissional e por suas
condições de trabalho, pesquisadores têm apontado para a importância do
investimento no seu desenvolvimento profissional, que envolve formação
inicial e continuada, articulada a um processo de valorização identitária e
profissional dos professores. Identidade que é epistemológica, ou seja, que
reconhece a docência como um campo de conhecimentos específicos
configurados em quatro grandes conjuntos, a saber:

1. conteúdos das diversas áreas do saber e do ensino, ou seja, das


ciências humanas e naturais, da cultura e das artes;
2. conteúdos didático-pedagógicos, diretamente relacionados ao campo da
prática profissional;
3. conteúdos relacionados a saberes pedagógicos mais amplos do campo
teórico da educação;
4. conteúdos ligados à explicitação do sentido da existência humana
individual, com sensibilidade pessoal e social. (Grifos da autora.)

Portanto, caso se nos pergunte: “Para ensinar algo, basta saber esse algo
(conteúdo) e nada mais? É verdade que se aprende a ensinar ensinando?” É certo
que a prática é fundamental e que adaptamos nossa maneira de ensinar a cada
turma ou aluno (no caso dos alunos particulares). Ninguém é igual a ninguém e uma
aula não é necessariamente igual à outra. No entanto, não basta saber o conteúdo e
aprender, como se diz popularmente, “na raça”.

Soares e Cunha (2010, p. 85) observam algo interessante:

Desperta curiosidade a ausência de atenção acerca das motivações


dos candidatos e dos pós-graduandos, muitos deles docentes universitários
de outras áreas, para a escolha de um Programa de Pós-Graduação em
Educação e o fato de a análise das motivações se restringir aos projetos de
pesquisa, que em geral não revelam a busca de saberes pedagógicos para
32

o ensino superior em função da inexistência de linhas e grupos de pesquisa


consolidados nos programas sobre a pedagogia universitária. Essa postura
parece estar coerente com a perspectiva da centralidade da formação do
pesquisador em detrimento da formação docente.

Falando sobre a capacitação docente, Bredda (2017, pp. 32 e 33) afirma:

Atualmente ter uma prática pedagógica nas escolar (sic) é um


grande desafio para o professor, pois exige que ele seja muito bem
preparado, capacitado para trabalhar com alunos de gerações diferentes e
novas problemáticas presentes no cotidiano da sociedade... A formação
continuado (sic) docente é muito mais que um suporte para que o professor
consiga trabalhar e desenvolver sua função diante da sociedade, fazendo
do momento da sua aula seja (sic) de total aprendizado. (Grifos nossos.)

Isso mostra que não só deve haver uma formação específica para o trabalho
docente, senão que também deve haver formação contínua.
Soares e Cunha (2010, p. 62) ponderam:

Se o domínio de conteúdos específicos é parte indispensável do


arsenal de que precisa o docente universitário para assegurar que seu
ensino seja capaz de engendrar aprendizagens nos estudantes, ele não é
suficiente. Para que o professor da educação superior contribua para a
construção do saber pelo estudante, é preciso que ele próprio domine,
também, uma gama de saberes, entre os quais, os saberes pedagógicos.
(Grifos nossos.)

Sobre a prática, é claro que esta é fundamental. Inclusive, é este o objetivo do


estágio. Pellegrini (2011, p. 12) diz o seguinte:

O papel do estágio é proporcionar a observação da prática para


teorizá-la e permitir ao futuro professor vivenciar situações formativas. “É
uma oportunidade de ter contato com o dia a dia de uma escola e conhecer
as situações de sala de aula”, diz Luzia Orsolon, diretora administrativa do
Colégio Assunção, na capital paulista.

E isso é verdadeiro. No entanto, o estágio só é previsto na graduação, não na


pós-graduação (seja esta última lato ou stricto sensu). Assim, não há estágio para o
futuro professor universitário.
Pimenta (2012) diz:

O trabalho docente está impregnado de intencionalidade, pois visa a


formação humana por meio de conteúdos e habilidades de pensamento e
ação, implicando escolhas, valores, compromissos éticos. O que significa
introduzir objetivos explícitos de natureza conceitual, procedimental e
valorativa em relação aos conteúdos da matéria que se ensina; transformar
o saber científico ou tecnológico em conteúdos formativos; selecionar e
organizar conteúdos de acordo com critérios lógicos e psicológicos em
função das características dos alunos e das finalidades do ensino; utilizar
métodos e procedimentos de ensino específicos inserindo-se em uma
33

estrutura organizacional em que participa das decisões e das ações


coletivas. Por isso, para ensinar, o professor necessita de conhecimentos e
práticas que ultrapassem o campo de sua especialidade. (Grifos nossos.)

Ou seja: o professor precisa estudar a fim de ensinar, ter uma preparação


específica. “É aprendendo que se ensina.”

Figura 6. Disponível em < http://educaja.com.br/2009/06/e-aprendendo-que-se-ensina.html>

Em entrevista ao programa Tela Mackenzie (disponível em


<https://www.youtube.com/watch?v=ech4cv157rQ>), com o tema “Ser Professor na
Educação Superior”, o Prof. Dr. Ítalo Francisco Curcio disse: “A tentativa e erro não
é o ideal da ciência.” E completou dizendo que o fato de alguém trabalhar como
professor universitário sem uma formação adequada faz os alunos padecerem pela
inexperiência do professor. Disse ademais que se o profissional não se sente
capacitado para ser professor, deve preparar-se e que isso fará a diferença! “Se ele
quer ser docente, a nossa sugestão é que ele se forme para ser docente.” E
prosseguiu:

O aluno tem que se sentir beneficiado. O aluno tem que perceber:


“Puxa, que professor! Que agradável! Como eu entendi! Agora, sim! Olha,
eu li, reli o texto no livro, não entendi nada. Mas ainda bem que eu assisti à
aula desse professor! Ele me ajudou!” (Transcrição do vídeo.)

De acordo com Pimenta e Anastasiou (2014, pp. 36-41):

O que identifica um professor? E um professor universitário? Essa


questão tem sido considerada em vários países, tanto no âmbito da
pesquisa sobre os processos de formação como nas formulações das
políticas de ensino superior no que se refere ao ensino e à pesquisa,
exigências que caracterizam o exercício da profissão de modo geral. No
tocante à formação, os estudos têm mostrado que: “(...) o professor
universitário aprende a sê-lo mediante um processo de socialização em
34

parte intuitiva, autodidata ou (...) seguindo a rotina dos ‘outros’. Isso se


explica, sem dúvida, devido à inexistência de uma formação específica
como professor universitário. Nesse processo, joga um papel mais ou
menos importante sua própria experiência como aluno, o modelo de ensino
que predomina no sistema universitário e as reações de seus alunos,
embora não há que se descartar a capacidade autodidata do professorado.
Mas ela é insuficiente” (Benedito, 1995, p. 131).

Essa constatação tem favorecido iniciativas que valorizam a formação


contínua ou em serviço, mediante cursos, seminários, disciplinas de pós-
-graduação lato sensu, palestras, estágios, etc. No entanto, essas iniciativas
não constituem regra geral, pois há certo consenso de que a docência no
ensino superior não requer formação no campo de ensinar.

Na maioria das instituições de ensino superior, incluindo as


universidades, embora seus professores possuam experiência significativa
e mesmo anos de estudos em suas áreas específicas, predomina o
despreparo e até um desconhecimento científico do que seja o processo de
ensino e de aprendizagem, pelo qual passam a ser responsáveis a partir do
instante em que ingressam na sala de aula. (...)

Examinando o panorama internacional, constatam-se, nos meios


educativos dos países mais avançados, um crescimento da preocupação
com a formação e o desenvolvimento profissional de professores
universitários e com as inovações no campo da Didática. Um dos fatores
explicativos dessa preocupação é, sem dúvida, a expansão quantitativa da
educação superior e o consequente aumento do número de docentes.
Dados da Unesco demonstram que o número de professores universitários,
no período de 1950 a 1992, saltou de 25 mil para um milhão, isto é,
aumentou 40 vezes. No entanto, em sua maioria, são professores
improvisados, não preparados para desenvolver a função de pesquisadores
e sem formação pedagógica (Unesco/Cresalc, 1996).

Contribuindo para ampliar a questão da docência no ensino superior,


há que considerar a influência das novas configurações do trabalho na
sociedade contemporânea da informação e do conhecimento, das
tecnologias avançadas e do Estado mínimo, reduzindo a empregabilidade.
Em decorrência, nota-se um afluxo dos profissionais liberais, ex-
-empregados, ao exercício da docência no ensino superior, cuja oferta de
empregos se encontra em expansão. Essa expansão se explica pelas
características dessa mesma sociedade que faz aos trabalhadores em geral
a exigência de permanente requalificação como condição de trabalho. O
resultado disso é a expansão da oferta de cursos superiores de graduação
e de pós-graduação lato e stricto sensu.

No Brasil, a LDBEN n° 9.394/96, que define as diretrizes e bases da


educação nacional, e o Decreto 2.207/97, que regulamenta o Sistema
Federal de Ensino, estimulam essa demanda...

“a preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em


nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e
doutorado. Parágrafo único: O notório saber, reconhecido por universidade
com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título
acadêmico” (LDBEN, art. 66).
35

No que se refere à exigência de titulação, o Decreto


2.207/97determina que, no segundo ano de sua vigência, as instituições de
ensino superior deverão contar com 15% de seus docentes titulados na pós-
-graduação stricto sensu, dos quais 5% de doutores, pelo menos; no quinto
ano de vigência, com 25%, dos quais 10% de doutores, pelo menos; e no
oitavo ano de vigência, com um terço, dos quais 15% de doutores, pelo
menos.

(...) se nota uma ausência da formação para a docência superior nos


programas de pós-graduação das demais áreas. (...) a não exclusividade da
formação nesse nível, expressa na lei, tem provocado um crescimento da
oferta de cursos de pós-graduação lato sensu (especialização) ou mesmo a
introdução neles de disciplina denominada Metodologia do Ensino Superior
ou Didática do Ensino Superior, especificamente voltada à formação
docente. (Grifos nossos.)

Ainda comentando sobre a Lei de Diretrizes e Bases e a questão da formação


docente, as autoras Pimenta e Anastasiou (2014, pp. 23, 24, 104, 105 e 107) fazem
notar:

A formação de docentes para o ensino superior no Brasil não está


regulamentada sob a forma de um curso específico como nos outros níveis.
De modo geral, a LDB admite que esse docente seja preparado nos cursos
de pós-graduação tanto stricto como lato sensu, não se configurando estes
como obrigatórios. No entanto, a exigência legal de que todas as
instituições de ensino superior tenham um mínimo de 30% de seus
docentes titulados na pós-graduação stricto sensu aponta para o
fortalecimento desta como o lugar para formação do docente.

(...) a docência universitária constitui tema relevante... se se admite a


necessidade de as instituições de nível superior desenvolverem programas
de preparação de seus professores para o exercício da docência. Preparo
este que os ponha a par da problemática e da complexidade do ensinar e
do formar no ensino superior; do formar profissionais, do formar
pesquisadores e do formar professores.

(...) os profissionais das diversas áreas... na maioria das vezes nunca


se questionaram sobre o que significa ser professor. Do mesmo modo, as
instituições que os recebem já dão por suposto que o são, desobrigando-se,
pois, de contribuir para torná-los. Assim, a sua passagem para a docência
ocorre “naturalmente”; dormem profissionais e pesquisadores e acordam
professores! Não sem traumas nem sem, muitas vezes, ocasionar danos
aos processos de ensino e aos seus resultados. (...) [Trata-se] de
reconhecer e valorizar a importância da profissão docente no ensino
superior. (...)

Os elementos constitutivos da profissão docente – a saber: formação


acadêmica, conceitos, conteúdos específicos, ideal, objetivos,
regulamentação, código de ética – têm características próprias que
36

constituiriam a formação inicial, se ela ocorresse. Como ela não ocorre,


esses aspectos devem ser considerados nos processos de
profissionalização continuada. (Destaques das autoras.)

Percebe-se a crítica à falta de formação específica para o docente do ensino


superior.

Falando sobre a formação, Pellegrini (2011, p. 42) lista quatro atitudes que ela
denomina fundamentais para o professor:

1) Ler muito;
2) Ter uma agenda cultural;
3) Usar e abusar da internet e
4) Participar de palestras e workshops.

Isso evidencia que a formação deve ser contínua.


Fávero e Tauchen (2013, p. 241) dão as seguintes sugestões para uma
formação adequada do professorado:

(...) acreditamos ser necessário vislumbrar e criar condições de


possibilidade para esta reprofissionalização nas diversas etapas de
formação:

a) Na formação pós-graduada – os estágios de docência, quando incluem a


participação do pós-graduando no processo de planejamento, na tomada de
decisão sobre os materiais e as atividades a serem desenvolvidas, bem
como a medição dos processos de aprendizagem, potencializam a
(re)construção de entendimentos sobre o sistema didático, sobre as
dimensões da formação dos estudantes e o acompanhamento das diversas
demandas formativas do professor universitário. A formação pós-graduada
pode incluir, também, disciplinas como Metodologia ou Docência no Ensino
Superior, oportunizando espaços de estudos e discussões sobre a estrutura
e funcionamento deste nível de ensino, suas atividades e formas de
organização.

b) No acompanhamento da iniciação à docência – o acompanhamento do


estágio probatório na educação superior pode ser potencializado por um
processo de tutoria, visando à mediação e o assessoramento às demandas
institucionais, a socialização na cultura profissional universitária, o
acolhimento junto aos grupos e núcleos de pesquisa, entre outros; e

c) Na formação permanente que pode ter espaço na constituição de grupos


interdisciplinares, nos núcleos de pesquisa sobre a educação superior e a
docência, nos programas institucionalizados de formação continuada, nos
processos participativos de gestão universitária, entre outros.

Mesmo havendo cursos de formação para professores, ainda existem certas


ilusões (para usar uma palavra mencionada por Houssaye [1995, apud Pimenta e
Anastasiou, 2014]). Segundo as autoras (p. 85), algumas dessas ilusões são:
37

a ilusão do fundamento do saber pedagógico no saber disciplinar: eu sei o


assunto; consequentemente, sei o fazer da matéria;

a ilusão do saber didático: sou especialista da compreensão do como-fazer-


-saber esse ou aquele saber disciplinar; portanto, posso deduzir o saber-
-fazer do saber;

a ilusão do saber das ciências do homem: sou capaz de compreender como


funciona a situação educativa; posso, então, esclarecer o saber-fazer e
suas causas;

a ilusão do saber pesquisar: eu sei como fazer compreender mediante esse


ou aquele instrumento qualitativo e quantitativo; por isso, considero que o
fazer-saber é um bom meio de descobrir o saber-fazer, mais ou menos
como se a experiência se reduzisse à experimentação;

a ilusão do saber-fazer: na minha classe, sei como se faz; por isso, sou
qualificado para o fazer-saber.

As menções a pesquisa nos levam à pergunta: é preciso que o professor seja


um pesquisador?
38

CAPÍTULO 4 – O PROFESSOR PESQUISADOR

Figura 7. Disponível em <http://www.ricardoantunes.com.br/geraldo-julio-psb-sai-bem-na-frente-de-


joao-paulo-pt-na-primeira-pesquisa-do-segundo-turno-70-contra-29>

Primeiro de tudo, o que é pesquisa? De acordo com Rocha (s/d, pp. 5 e 7):

A pesquisa escolar é uma maneira inteligente de estudar e aprender.


(...) Para que a pesquisa cumpra seu papel, ela não deve somar
conhecimentos, mas multiplicá-los. Você deve acabar sua pesquisa
compreendendo melhor o assunto pesquisado. (...) A pesquisa é como um
jogo no qual formulamos perguntas e nós mesmos temos que dar as
respostas.

Segundo a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados (2001, pp. 33 e


38):

O que é pesquisa? É a busca minuciosa de informações sobre


determinado assunto. Inclui ler e exige a aplicação dos princípios do estudo.
Também pode envolver entrevistas. (...)

Avalie os resultados. Depois da colheita do trigo, o grão tem de ser


tirado da palha. O mesmo acontece com as pesquisas que faz. Antes de
usar as informações que encontrou, você precisa separar o que é valioso do
que é supérfluo.

Qual a importância da pesquisa no Ensino Superior e na prática do docente?

A LDB (Lei de Diretrizes e Bases, 9.394/96), artigo 43, inciso III, fala sobre a
finalidade da educação superior (apud Atuati, 2017, p. 237): “incentivar o trabalho de
pesquisa e investigação científica, visando o desenvolvimento da ciência e da
tecnologia e da criação e difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o
entendimento do homem e do meio em que vive”. E Atuati (2017, p. 237 e 238)
também afirma:
39

A função mais genérica de uma universidade é a de contribuir,


através do desenvolvimento de seu papel específico de instituição de ensino
superior, para os requisitos de transformação ou modificação da sociedade
global. Complementam esta função as de pesquisa, profissionalização e
extensão à comunidade (Barros, 2000).

A ciência, como pesquisa básica e processo racional de


conhecimento, produz ideias, hipóteses e teorias. A pesquisa, além de ser
uma via para a construção de conhecimento e informação, é base para o
progresso humano no mundo científico, tecnológico e cultural. (...)

O ensino superior, seja graduação, seja pós-graduação, tem se


mostrado como um dos setores mais eficazes da educação brasileira. Para
Cardoso, Pinelli e Galvão (2008), “é indispensável que os cursos de
graduação desenvolvam um projeto pedagógico, em que ensino, pesquisa e
extensão estejam indissociavelmente integrados. Não pode existir ensino de
qualidade sem pesquisa”. (...)

Segundo Demo (1995), a alma da vida acadêmica é constituída pela


pesquisa como princípio científico e educativo, ou seja, como estratégia de
geração de conhecimento científico e de promoção da cidadania. (Grifos
nossos.)

Freire (2016, pp. 30 e 31) diz:


Ensinar exige pesquisa. Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem
ensino. (...) Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca,
a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação permanente, o
professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador.
(...) Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago.
Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me
educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou
anunciar a novidade. (Destaques nossos.)

Ana Maria Araújo Freire (2014, pp. 170 e 171) reproduz um diálogo de seu
esposo, Paulo Freire, com universitários uruguaios, publicado pela primeira vez em
1990. Diz o seguinte:

(...) eu não aprendo sem ensinar; para aprender a ensinar tenho de


ensinar, mas tenho de ensinar aberto para aprender a ensinar. (...) ensinar e
aprender... para ensinar, ao mesmo tempo há que aprender... não é
possível ensinar sem investigar. Uma verdadeira docência é investigação...
(Grifos nossos.)

Svinicki e McKeachie (2013, p. 5) esclarecem:

Para os professores novos, um aspecto crítico da cultura local é


justamente a definição do papel correto de um membro do corpo docente.
Por exemplo, em muitas universidades, as definições formais dos critérios
de promoção dão a mesma importância à pesquisa e ao ensino, mas não é
tão comum perceber que ambos se equivalem.

Estudos demonstraram que pesquisa e ensino não são,


necessariamente, conflitantes. Muitos docentes são excelentes no campo
40

da pesquisa e do ensino, alguns pesquisadores excelentes são péssimos


professores, e alguns mestres excelentes não publicam pesquisas. (Grifos
nossos.)

Pimenta e Anastasiou (2014, pp. 190 e196) comentam que

(...) o objetivo fundamental da pós-graduação é a prática sistemática da


pesquisa...

(...) o método de ensino ou o ato de ensinar tem especificidade própria... por


sua complexidade e temporalidade, exige um processo de reflexão
sistemática e, portanto, de pesquisa por parte daqueles que pretendem
efetivá-lo com competência e seriedade. (Grifos nossos.)

Perrelli e Garcia (2016, p. 18) dizem:

Não negamos aqui a importância da formação do pesquisador na


atuação como docente. Os conhecimentos desenvolvidos nesse contexto, o
adensamento teórico em um determinado tema de pesquisa são válidos no
âmbito do ofício da pesquisa, mas são epistemologicamente distintos
daqueles exigidos para o magistério. No entanto, a formação para a
pesquisa pode auxiliar o pesquisador professor universitário, quando bem
orientado, a olhar a docência como um fenômeno dinâmico e a levantar
questões sobre diferentes aspectos relacionados ao ser professor e, com
espírito investigativo, abrir-se para a busca de respostas às suas
indagações. Não se pode considerar a pesquisa como uma atividade
intelectual superior ao ensino e vice-versa. (Destaque nosso.)

Também Ingvarson (1987, apud Imbernón, 2006, p.74) fala sobre pesquisa:

(...) a maneira mais eficaz de realizar a formação permanente é mediante o


estudo, de forma cooperativa por parte dos próprios docentes, dos
problemas e temas que integram sua intenção de realizar uma prática
coerente com seus valores educativos... Os objetivos desse enfoque
possibilitam um maior controle sobre o que pode ser considerado um
conhecimento válido para os professores.

E Imbernón (2006, p. 75) acrescenta:

(...) é possível assinalar alguns elementos em comum que configuram os


passos deste modelo de formação:

a) Os professores e professoras identificam um problema ou um tema de seu


interesse a partir de uma observação ou uma conversa reflexiva.

b) Propõem formas diferentes de recolher a informação sobre o problema


inicial, que pode implicar tanto um estudo bibliográfico como partir dos
dados obtidos em sala de aula ou na escola.

c) Esses dados são analisados individualmente ou em grupo.

d) Por fim, são realizadas as mudanças pertinentes.


41

e) E volta-se a obter novos dados e idéias (sic) para analisar os efeitos da


intervenção realizada e continuar o processo de formação a partir da
prática.

Cortelazzo e Romanowski (2007, p. 24-26) ponderam:


Na formação de professor, a pesquisa assume papel didático,
principalmente nos cursos de formação inicial, as licenciaturas, pois, ao
mesmo tempo em que o futuro professor compreende a abrangência da
docência, desenvolve habilidades e capacidades para a realização de
investigação em educação. Argumenta André (2001) que a pesquisa
possibilita entender a prática, constituir indicativos teóricos sobre o saber
docente e contribui com o processo de profissionalização e autonomia do
professor.

A pesquisa na formação docente... tem... como um de seus principais


objetivos a realização de trabalhos com a participação conjunta de alunos
dos cursos de graduação, dos professores da educação básica e dos
pesquisadores, para que possam empreender o refinamento de suas
metodologias de pesquisa e de ensino, compartilhar problemas e encontrar
alternativas de encaminhamentos. (...)

A pesquisa abrange a prática profissional do docente, o trabalho do


professor, a organização dos projetos pedagógicos e o processo didático. O
propósito é articular ensino e pesquisa, como metodologia para a formação
de professores nas disciplinas e fundamentos pedagógicos, de metodologia
de ensino e no estágio supervisionado. Desse modo, pode contribuir para a
construção dos saberes docentes. (Grifos nossos.)

Soares e Cunha (2010, pp. 117 e 118) apontam reflexões e dilemas sobre a
formação do docente da educação superior. Dizem:

O ensino não se instala como uma atividade que possui e exige


saberes próprios, porquanto fica subsumido à pesquisa. Os coordenadores
dos programas [de pós-graduação] reconhecem a competência de
pesquisar como principal atributo do docente universitário, por considerarem
que a pesquisa é um meio fundamental para desenvolver, nos estudantes, o
questionamento, a reflexão crítica e a problematização na perspectiva da
formação da autonomia. (...)

Conforme Paoli (1998), o ensino com pesquisa e o ensino para


pesquisa, embora tenham elementos comuns, não são a mesma coisa. O
ensino com pesquisa constitui-se em uma proposta de trabalho educativo
que toma os pressupostos investigativos como base do ensinar e do
aprender. Contrapõe-se ao ensino livresco, baseado na transmissão de
verdades estabelecidas. Possibilita a construção de atitudes e práticas
científicas, a valorização da dúvida e da crítica, o desenvolvimento da
capacidade de discernimento, da percepção aguçada para lidar com o
conhecimento e da habilidade de expressão, argumentação e de escrita.
Procura formar o sujeito cognoscente, capaz de interpretar e intervir no seu
campo profissional de forma efetiva e com autonomia intelectual.

O ensino para a pesquisa, desenvolvido nos cursos de pós-


graduação stricto sensu, visa à produção de um conhecimento ou
42

interpretação original, envolve um razoável domínio das pesquisas já


desenvolvidas acerca do objeto em estudo, bem como das teorias e
modelos concernentes aos conceitos que lhe são inerentes. Pressupõe rigor
no levantamento, organização e interpretação dos dados, em consonância
com os critérios das diferentes comunidades científicas. Visa formar o
pesquisador. (Grifos nossos.)

De modo que a pesquisa ajuda no método de ensino, embora não garanta


que o pesquisador seja um exímio professor, conforme já visto anteriormente.
Certamente, concordamos com o fato de que o professor deve ser pesquisador para
se reciclar, para conhecer novos métodos, novos conceitos (pois nenhuma ciência é
estática), formas distintas de levar o conhecimento aos seus alunos e de fazer os
próprios alunos desenvolverem ou construírem conhecimento(s). E, como já
mencionado por Cortelazzo e Romanowski, a pesquisa deve fazer-se inclusive sobre
o próprio processo de ensinar, contribuindo para os saberes docentes.

Se pensarmos num professor universitário advindo do mundo corporativo,


sem um preparo para o Ensino Superior, é bem provável que ele desanime ou se
sinta perdido no mundo acadêmico no que toca à pesquisa, ou que se sinta
motivado a pesquisar justamente para aprender e aprimorar a técnica de ensino.
Espera-se que a segunda alternativa seja a que ocorra com frequência (indispomos
de dados a respeito).

Todo o dito acima nos faz refletir: é preciso que o professor do ensino
superior se prepare, estude especificamente para sua prática, que pesquise para
aumentar/criar conhecimento e para aprender e/ou inovar seu modo de ensinar. E
isso é sério. Afinal, a docência é uma profissão e, como tal, deve ser respeitada e
levada a sério. No que toca à docência no ensino superior: é a formação de
profissionais e, se a graduação for uma licenciatura, é a formação de formadores.
Deve ser muito refletida, pensada, ponderada, planejada. E a pesquisa deve levar
ao melhor modo de ensinar, a novos métodos, a novos conhecimentos, a
descobertas e a criações. A pesquisa deve ser suporte para o ensino.
43

CAPÍTULO 5 – QUEM É O PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR?

Qual é o papel do professor no ensino superior? Comunicar o entusiasmo dele sobre o


assunto. (Svinicki e McKeachie, 2013, p. 75)

“Como quem é? É um ser humano que ensina numa universidade!” – dirão


alguns. Mas a ideia é identificar esse docente, mostrar o seu perfil. Aliás, cabe
destacar que nem sempre ele é professor universitário. Não existem apenas as
universidades. Há outras instituições.

Sobre isso, Pimenta e Anastasiou (2014, p. 141) escrevem:

A atual conformação legal (LDB 9.394/96) admite uma variedade de


tipos de instituições de ensino superior:

Universidade, que se caracteriza por autonomia didática, administrativa e


financeira, por desenvolver ensino, extensão e pesquisa e, portanto, contar
com número expressivo de mestres e doutores.

Centro universitário, que se caracteriza por atuar em uma ou mais áreas,


com autonomia para abrir e fechar cursos e vagas de graduação e ensino
de excelência.

Faculdades integradas, que reúnem instituições de diferentes áreas do


conhecimento e oferecem ensino e, às vezes, extensão e pesquisa.

Institutos ou escolas superiores, que atuam em área específica do


conhecimento e podem ou não fazer pesquisa, além de ensino, mas
dependem do Conselho Nacional de Educação para criação de novos
cursos.

Isso nos mostra que, devido à diversidade de lugares para trabalhar, também
a relação de trabalho do professor de ensino superior será diferente. Claro, em todas
essas instituições o ensino é atividade comum. Mas também existem regimes
distintos de trabalho: o professor de tempo integral, parcial e os horistas. Há
algumas instituições que exigem dedicação exclusiva.
Fávero e Tauchen (2013, p. 237) questionam:

Quem é o professor universitário? Como ocorre seu processo


formativo? Qual é a sua identidade profissional? Como as atividades que
desenvolve articulam-se ao seu processo de formação? A docência
universitária é uma profissão ou é o local onde executamos um trabalho?

Pimenta e Anastasiou (2014, pp. 104 e 105) tocam num ponto sobre o qual se
deve ponderar:
44

(...) os profissionais das várias áreas (médicos, dentistas,


engenheiros, advogados, economistas, etc.) adentram o campo da docência
no ensino superior como decorrência natural dessas suas atividades e por
razões e interesses variados. Se trazem consigo imensa bagagem de
conhecimentos nas suas respectivas áreas de pesquisa e de atuação
profissional, na maioria das vezes nunca se questionaram sobre o que
significa ser professor. Do mesmo modo, as instituições que os recebem já
dão por suposto que o são, desobrigando-se, pois, de contribuir para torná-
-los. Assim, sua passagem para a docência ocorre “naturalmente”; dormem
profissionais e pesquisadores e acordam professores! Não sem traumas
nem sem, muitas vezes, ocasionar danos aos processos de ensino e aos
seus resultados. Não se trata, em absoluto, de culpabilizar os professores
pelas mazelas do ensino, mas de reconhecer e valorizar a importância da
profissão docente no ensino superior. (Destaques das autoras.)

Barreto (2009, p. 27) diz que Nóvoa (in Fazenda, 1995, p.33) delineia
algumas características que identificam a profissão de professor:

1) No professor, não é possível separar as dimensões pessoais e


profissionais;

2) A forma como cada um vive a profissão de professor é tão (ou mais)


importante do que as técnicas que aplica ou os conhecimentos que
transmite;

3) Os professores constróem (sic) a sua identidade por referência a


saberes (práticos e teóricos), mas também por adesão a um conjunto de
valores.

Sobre a identidade do professor do ensino superior, Pimenta e Anastasiou


(2014, p. 88) afirmam:

A docência na universidade configura-se como um processo contínuo


de construção da identidade docente e tem por base os saberes da
experiência, construídos no exercício profissional mediante o ensino dos
saberes específicos das áreas de conhecimento. Para que a identidade de
professor se configure, no entanto, há o desafio de pôr-se, enquanto
docente, em condições de proceder à análise crítica desses saberes da
experiência construídos nas práticas, confrontando-os e ampliando-os com
base no campo teórico da educação, da pedagogia e do ensino, o que
permitiria configurar uma identidade epistemológica decorrente de seus
saberes científicos e os de ensinar. Mas também sua identidade é
profissional, ou seja, a docência constitui um campo específico de
intervenção profissional na prática social. Assim, o conceito de
desenvolvimento profissional dos professores do ensino superior nos parece
ser mais adequado do que o de formação, uma vez que envolve ações e
programas quer de formação inicial quer de formação em serviço.
(Destaques das autoras.)

E citam depoimentos de professores em um processo de profissionalização


continuada (pp. 91 e 92 – citamos apenas três de dez):
45

(...) Não há relação direta entre o educador ensinar e o educando


aprender; cabe ao educador sistematizar o seu método de ensino para ser
ele o fio condutor da disciplina e transformá-la em atraente e instigadora.
(...)

A profissão de professor não pode ser exercida por quem não esteja
preparado; o professor deve ter o conhecimento prévio da docência. (...)

É preciso contextualizar o aluno em sua inter-relação com a


universidade. O professor, dominando inicialmente um conteúdo que o
aluno desconhece, precisa desabrochar talentos, pois o aluno vem com
enorme vontade de que as coisas aconteçam, vontade que esmorece com o
tempo. (...)

São relatos acerca de novos posicionamentos, derivados de


conteúdos didáticos que se referem a formas específicas de atuar como
professor. Por esses depoimentos, podem-se inferir as possibilidades dos
processos de formação contínua na construção identitária do docente do
ensino superior.

Carvalho (s/d, p. 6) fala sobre a postura profissional, enquadrando-a na


formação do professor e na sua identidade e perfil:

Vamos entender por postura o modo como nos apresentamos junto


aos nossos colegas profissionais. Este aspecto envolve o modo como
externamos nosso profissionalismo interior através de fazeres, atitudes,
gestos, dizeres. Espera-se que nosso comportamento seja adequado ao
meio para que os alunos, clientes, companheiros de trabalho formulem uma
imagem positiva de nossa pessoa. NIAS (1995 apud NÓVOA, 1997, p. 25)
afirma que “O professor é a pessoa. E uma parte da pessoa é o professor.”
Para Massetto (1998) a formação de profissionais envolve o
desenvolvimento no aspecto afetivo-emocional; de habilidades; de atitudes
e valores. (Destaques nossos.)

Surgem, então, as perguntas: Como me vejo? Como meu aluno me vê?


Como foi minha aula hoje? Como estava a sala hoje? O conteúdo permitiu uma aula
mais dinâmica?

Quanto a como se vê o professor universitário e sobre sua identidade,


importância, relevância e valor na sociedade, Hoffmann et al. (2017, pp. 258 e 259)
assinalam:

A profissão docente é reconhecida por sua elevada relevância social,


visto que a sua atuação está diretamente relacionada à formação de
profissionais em diversas áreas do conhecimento, disso decorre a
importância do trabalho docente, que pode ser vista sob três enfoques: do
indivíduo, da instituição de Ensino Superior (IES), e do país.

Em relação ao indivíduo, é considerado elemento fundamental no


processo ensino-aprendizagem, cuja atenção e experiência do professor
irão influenciar diretamente o destino profissional, conforme enfatizam Koetz
et al. (2013, p. 1022), “Ser professor está relacionado a participar da
independência das pessoas, a torná-las mais livres, menos dependentes
46

econômica, política e socialmente [...]”, para além de ensinar, contribuem


para a formação de cidadãos críticos, capazes de discernir sobre as suas
escolhas de maneira consciente.

No que condiz à IES, também terá seu desempenho influenciado pela


atuação dos professores, não apenas pelo grau de titulação apresentado,
mas também pelo relacionamento interpessoal entre colegas e chefias, e
iniciativas de articulação de projetos inovadores, qualidade das aulas
ministradas, capazes de gerar procura e preferência entre os estudantes, e
suscitar promissor destino profissional de seus egressos. E, como resultado
desse encadeamento de influências, a profissão docente exerce função
primordial, e até mesmo determinística para o desenvolvimento
socioeconômico de um país, na medida em que é responsável pela
formação do contingente de profissionais de todos os setores da economia.
(Grifos nossos.)

É interessante que há um paralelismo entre o que escreveram Koetz et alii e o


que escreveram Araújo e Freire. Referimo-nos ao que Koetz et alii (2013 apud
Hoffmann et al., 2017, p. 258) dizem sobre ser professor, e mencionam que “está
relacionado a participar da independência das pessoas, a torná-las mais livres,
menos dependentes econômica, política e socialmente [...]”.

Araújo (2000, pp. 135, 136, 165 e 183) fala sobre upaya: termo indiano que se
refere ao “conjunto de lances no relacionamento educador/educando,
mestre/discípulo, culminando na autocondução, na emancipação do que era dirigido”
(p. 183). Araújo insiste que o professor deve “upayar” seus alunos, ajudá-los a
chegar ao autoconhecimento por um processo de autocondução. Diz ainda que o
processo upaya leva à autocondução ou intercondução, a qual também se chama
autogestão ou cogestão. Ela conclui (Araújo, 2000, p. 165):

Upayando grupos os mais diversos, sentia a urgência de passar a


colegas de magistério ou de caminhada na vida esta experiência...

Foi assim que consegui proporcionar o meu pensar-sentir-agir. (...)


passei a estimular fortemente o hemisfério esquerdo, lendo, estudando,
criticando, escrevendo, falando em público, lecionando, pesquisando.

Freire (2016, p. 15) informa: “A questão da formação docente ao lado da


reflexão sobre a prática educativo-progressiva em favor da autonomia do ser dos
educandos é a temática central em torno da qual gira este texto.” (Destaques
nossos.)

Koetz et alii (2013 apud Hoffmann et al., 2017, p. 261) acrescentam: “O


trabalho do professor envolve criar vínculos sociais, estimular a autonomia e a
responsabilidade através de uma atividade teórico-prática, intelectual e
administrativa”, o que implica grande diversidade de competências e habilidades.

Carvalho (s/d, pp. 2 e 3) faz a diferenciação entre identidade e perfil, e


relaciona a formação docente às habilidades e competências. Em suas palavras:
47

(...) a nossa identidade profissional desenvolve-se e adapta-se ao


contexto em que estamos inseridos enquanto professores, o que nos leva a
ver, por exemplo, no contexto atual, o “ser professor” como um adendo a
nossa profissão de origem: médico, advogado, administrador.

Já o perfil profissional, muitas vezes, confundido com identidade


profissional, desenvolve-se durante a formação acadêmica. Neste caso, a
formação docente, em que podemos encontrar a relação entre as
competências e as habilidades que o profissional apreende durante a sua
formação.

O perfil acadêmico do profissional não muda de acordo com o meio


onde está inserido, enquanto a sua identidade profissional pode moldar-
se ao contexto histórico, econômico, político e social.

De acordo com Pimenta (2002), a identidade do professor passa,


necessariamente, pela mobilização dos saberes advindos da experiência,
constituídos pela própria prática docente, cada vez mais valorizada na
formação atual do professor. Portanto, de acordo com a autora, a
identidade não é um dado imutável ou uma roupagem que possa ser
adquirida, caracterizando-se como um processo de construção do sujeito
historicamente situado em um tempo-espaço.

Entretanto, não basta uma formação docente baseada na prática e na


experiência que reproduzam apenas aspectos técnicos. Exige-se uma
formação docente baseada na prática reflexiva e investigativa, na busca de
uma reformulação constante de nossa identidade de professor, dos nossos
saberes e fazeres, ou seja, de nossas competências e habilidades.
(Destaques da autora.)

Para nós, fica claro que a identidade do professor de Ensino Superior é a do


profissional que escolheu a docência, aquela pessoa que optou por ensinar e
qualificou-se para lecionar no Ensino Superior. Embora haja os profissionais das
mais diversas áreas que depois enveredam para o ensino, muitos o fazem como
primeira opção. Os cursos de licenciatura são uma prova disso. Então, para terem
acesso ao ensino superior, esses docentes fazem pelo menos uma pós-graduação
lato sensu com vistas a trabalhar no terceiro grau. E esses docentes devem ter claro
o fato de que precisa existir uma formação contínua, afinal, o ser professor se
constitui pelo formar-se, pelo pesquisar (ou estudar) e pelo praticar e refletir a sua
prática. Tal qual diz Freire (2016, p. 39): “Ensinar exige reflexão crítica sobre a
prática... A prática docente crítica... envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o
fazer e o pensar sobre o fazer.” (Grifos nossos.)
48

Figura 8. Disponível em < https://www.slideshare.net/hamiltonnobrega7/didtica-ensino-superior>

5.1 O professor na era das TICs:

Kenski (in Castro e Carvalho, 2005, pp. 95 e 96) faz a seguinte reflexão:

Pensar no papel do professor no atual estágio da sociedade é


identificar uma multiplicidade de ações diferentes para a mesma função. O
que vem a ser na atualidade este profissional, no final das contas? (...)

Na lógica publicitária apresentada em algumas “organizações de


aprendizagem”, o mérito de ensinar na sociedade contemporânea seria para
a utilização plena de “bons programas eletrônicos”, plenos de recursos e
que não dependem mais da intervenção do docente. Permitem que “todos
aprendam sozinhos”. Aprendem? Alguma coisa, sim. Tudo? Com certeza,
não. Independem de professor? Será?

(...) O que é um professor na sociedade digital, afinal? (...) “Um


profissional que persiste, apesar de tudo”, dizem uns. “Alguém que,
ironicamente, quer sempre aprender”, é a opinião de outro. (...) Essa é
talvez uma das principais características desse profissional: a preocupação
com a atualização de seus conhecimentos e práticas, a melhoria do seu
desempenho. (...) vemos... o crescente número de professores em busca de
novos conhecimentos; professores que enchem as salas dos cursos de
atualização, participam de seminários, simpósios e congressos, compram
livros e estudam espontaneamente. Professores que desejam mudar a sua
maneira de ensinar, que querem se adaptar às exigências educacionais dos
novos tempos, que sentem que a sociedade... mudou e querem
acompanhar o ritmo dessas alterações. (Destaque da autora.)
49

As afirmações acima são uma clara demonstração da identidade do docente


do século XXI: ele procura se atualizar, quer incluir as TICs (Tecnologias da
Informação e Comunicação) nas suas aulas. Na nossa experiência como professor
de Espanhol e Português (este tanto como língua materna, quanto como língua
estrangeira), temos utilizado vídeos e mensagens pelo Whatsapp, além de sites
interativos com exercícios nas aulas. Os resultados têm sido positivos.

Há de se tomar certo cuidado, porém. Martins (in Bredda, 2017, p. 24) declara
o seguinte:
Há que se lembrar que (sic) o uso da tecnologia, ainda que abra
possibilidades ótimas, não é solução para todos os problemas. Um exemplo
é o cuidado necessário para que não se use a tecnologia simplesmente
para criar uma versão digital das práticas pedagógicas tradicionais.

E, citando Souza (2016), agrega (pág. 25): “É evidente a insatisfação dos


alunos em relação a aulas ditas ‘tradicionais’, ou seja, aulas expositivas, nas quais
são utilizados apenas o quadro-negro ou o, pouco mais moderno, quadro-branco e
giz”.

Às páginas 26 e 28, Martins (in Bredda, 2017) raciocina:

Se os alunos se interessam tanto pela tecnologia, por que não usar


(sic) em favor da aula?

(...) Uma quebra de paradigmas na capacitação docente é urgente,


visto que as TIC ainda são praticamente desconhecidas para boa parte dos
professores.

(...) O computador tem de ser usado de forma a tornar a aula


interativa e envolvente; e, para isso, é necessário cuidado para que não
simplesmente se passem as lições do quadro-negro para o computador, o
que não muda a qualidade da aula.

(...) O uso das tecnologias na escola... implica aliar método e


metodologia na busca de um ensino mais interativo.

É preciso haver um uso consciente e planejado das tecnologias em sala de


aula.

Amem e Nunes (2006, p. 174) afirmam:

(...) é importante estar familiarizado com as TIC, que potencializam o


aprendizado e a permanente atualização, sem nos esquecer do contexto
social e da diversidade cultural. Uma questão significativa é rever a
obrigação da universidade na formação profissional, com responsabilidade
social e compromisso com a cidadania.

Alvarez (2013, p. 41) diz algo interessante sobre o uso das tecnologias pelos
professores da chamada “geração Y” (nascidos entre a década de 80 e meados da
de 90):
50

Essa é a primeira geração que não precisou aprender como lidar com
equipamentos eletrônicos e em pouco tempo de vida presenciou os maiores
avanços da tecnologia. Ao chegar ao mercado de trabalho, esses
profissionais foram considerados inovadores e empreendedores. Mas, o que
acontece quando eles escolhem ser professores? Se engana (sic) quem
pensa que, por terem tanta familiaridade com o uso de recursos
tecnológicos, eles sejam seus entusiastas. Muito pelo contrário: consideram
a tecnologia algo natural, mas não veem sentido em usá-la em sala de aula
sem um claro propósito. (Grifos nossos.)

Isso mostra que o uso das tecnologias por parte dos professores (mesmo dos
já acostumados a elas) é feito com critério. Alvarez (2013, p. 46) nos diz como é
esse professor (adaptação feita por nós da forma de gráfico para lista):

Como é o professor da nova geração:

Acredita que o trabalho é realização pessoal, precisa sentir prazer em


ensinar;
Troca de escola se não se identificar com o projeto pedagógico;
Está aberto ao diálogo com os alunos;
Acredita em práticas educativas que extrapolem o ambiente escolar;
Estimula a criatividade dos alunos com brincadeiras, jogos e campeonatos;
Aproveita sua experiência pessoal em outras áreas para enriquecer as
aulas;
Usa as novas tecnologias com parcimônia: apenas quando faz sentido para
o conteúdo a ser estudado.

De modo que o uso das TICs deve ser pensado, planejado e só se deve
recorrer a elas se houver um propósito definido, com a finalidade de facilitar o
aprendizado.
51

CAPÍTULO 6 – ENSINAR

Figura 9. Disponível em <https://www.pensador.com/frase/ODAzMw>

O que é ensinar? O que implica? Como ensinar?

Freire (2016, p. 47) nos diz o que não é ensinar: “(...) ensinar não é transferir
conhecimento...” (Destaque do autor.)

Então, o que é? O Dicionário escolar da língua portuguesa/Caldas Aulete


(2012, p. 343) afirma (eliminamos as abreviaturas e exemplos): “1 Orientar, educar.
2 Dar aulas (de); lecionar. 3 Fazer adquirir ou adotar, por ensinamento ou por
experiência. 4 Mostrar, indicar. 5 Adestrar (animal).” (Destaque nosso.)

Já Castro (in Castro e Carvalho, 2005, pp. 14 e 15) diz:

Numa antiga acepção, o termo ensinar era entendido como assinalar,


mostrar, anunciar... Mas será esse o significado atual do verbo ensinar?
Poderei referir-me a ensino quando nas conversas cotidianas há relatos de
acontecimentos ou troca de informações? Ou quando a intercomunicação
assume a forma de debate ou discussão, ora no nível mais elevado,
incluindo argumentações e explicações, ora perdendo a objetividade?

(...) o processo de ensino poderia ser examinado apenas como


especial modalidade do processo de comunicação e informação...

(...) a televisão pode servir para transmissão de um noticiário e de


uma aula. Nesta última, as informações serão organizadas, incluirão
desenvolvimentos explicativos ou demonstrativos, reunidos com a finalidade
expressa de ensinar, ou melhor, com a intenção de produzir aprendizagem.
Entre os espectadores poderão estar aqueles que têm igualmente a
intenção de aprender e que, por suas próprias condições de
desenvolvimento e experiência, poderão conseguir realizá-la. Outros, por
assisti-la sem aquele propósito ou sema as condições necessárias, não
chegarão a esse final feliz. Por outro lado, informativos que não têm o
objetivo de ensinar (no sentido intencional acima referido) poderão ser
captados por interessados em aprender, tornando-se exemplos didáticos,
não obstante tivessem em vista apenas informar ou distrair. Esse
qualificativo didático desde a Grécia antiga é usado com referência a obras
ou situações destinadas a ensinar. O que variou, passados mais de dois mil
52

anos que nos separam da antigüidade (sic) clássica, foi o conceito de


ensino e não o intento que o dirige.

A primeira peculiaridade do processo de ensinar, pois, seria sua


intencionalidade, ou seja, pretender ajudar alguém a aprender. Não
corresponde a uma certeza, mas a um esforço. E se refere sempre a quem
recebe a comunicação didática. Numa relação interpessoal direta ou em
procedimentos de transmissão à (sic) distância haverá, forçosamente,
alguém a quem se quer ensinar alguma coisa. (Grifos da autora.)

De modo que ensinar é plurissignificativo: implica mostrar, dar aula, orientar,


educar, e tem a intenção de que ocorra aprendizado. Mas só se efetua se a outra
parte também tiver o interesse e a intenção de aprender.

Novamente, Pimenta e Anastasiou (2014) nos dão rica contribuição para


elucidar o assunto. Afirmam, nas páginas 48 e 49:

O ensino, fenômeno complexo, enquanto prática social realizada por


seres humanos com seres humanos, é modificado pela ação e relação
destes sujeitos – professores e alunos – historicamente situados, que são,
por sua vez, modificados nesse processo. Então nos parece mais
interessante compreender o ensino como uma situação em movimento e
diversa conforme os sujeitos, os lugares e os contextos onde ocorre. (Grifos
das autoras.)

Freire (2016, pp. 25, 26 e 44) tem concepção similar:


Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa, e foi aprendendo
socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era
possível ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo, que ao longo dos
tempos mulheres e homens perceberam que era possível – depois, preciso
– trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar.

(...) foi aprendendo socialmente que mulheres e homens,


historicamente, descobriram que é possível ensinar. (Grifo do autor.)

O ensino se dá de modo social, pois inexiste ensinar sem que haja dois
atores: um que ensina e outro que aprende. A exceção é o caso do autodidata.
Apesar disso afirmamos que, mesmo sozinho, o autodidata também aprende
socialmente, ainda que indiretamente, visto que os conhecimentos existem numa
sociedade ou em diversas sociedades e países. De modo que, mesmo que o
autodidata aprenda por si, depende também do estudo e produção de conhecimento
produzido por outros. Assim, dizemos que o ensino é social porque ocorre uma
interação, seja entre o aprendente e o ensinante, seja entre o aprendente e a
sociedade (direta ou indiretamente), seja entre o aprendente e um livro (um
ensinante, ainda que a distância).

É claro que o dito no parágrafo anterior poderia ser contestado com o


argumento de que alguns produzem conhecimento sem dependerem do
conhecimento alheio (poderíamos citar o caso de alguns filósofos). Mas, na verdade,
53

nem que seja para contestar o anterior, um novo conhecimento tem relação com
algo já conhecido e, portanto, tem vínculo com a sociedade e o social.

Ainda falando do ensino, porém relacionando-o com a Didática, Pimenta e


Anastasiou (2014, pp. 48 e 49) afirmam:

Nessa perspectiva do ensino como fenômeno complexo e do ensinar


como prática social, a tarefa da Didática é a de compreender o
funcionamento do ensino em situação, suas funções sociais, suas
implicações estruturais; realizar uma ação autorreflexiva como componente
do fenômeno que estuda, porque é parte integrante da trama do ensinar (e
não uma perspectiva externa que analisa e propõe práticas de ensinar); pôr-
-se em relação e diálogo com outros campos de conhecimentos construídos
e em construção, numa perspectiva múlti e interdisciplinar, porque o ensino
não se resolve com um único olhar; proceder a constantes balanços críticos
do conhecimento produzido no seu campo (as técnicas, os métodos, as
teorias), para dele se apropriar, e criar novos diante das novas
necessidades que as situações de ensinar produzem.

Figura 10. Disponível em < https://theshynessproject.wordpress.com/2011/02/27/raising-hand-in-


class-fear-and-shyness>

As autoras também dizem, às páginas 103, 104 e 164-166 que:

(...) a tarefa de ensinar na universidade supõe as seguintes disposições:

a) pressupor o domínio de um conjunto de conhecimentos, métodos e


técnicas científicas que devem ser ensinados criticamente (isto é, em
seus nexos com a produção social e histórica da sociedade); a
condução a uma progressiva autonomia do aluno na busca de
conhecimentos; o desenvolvimento da capacidade de reflexão; a
habilidade de usar documentação; o domínio científico e profissional do
campo específico;

b) considerar o processo de ensinar e aprender como atividade integrada à


investigação;
54

c) propor a substituição do ensino que se limita a transmissão de


conteúdos teóricos por um ensino que constitua um processo de
investigação do conhecimento;

d) integrar a atividade de investigação à atividade de ensinar do professor,


o que supõe trabalho em equipe;

e) buscar criar e recriar situações de aprendizagem;

f) valorizar a avaliação diagnóstica e compreensiva da atividade mais do


que a avaliação como controle;

g) procurar conhecer o universo cognitivo e cultural dos alunos e, com


base nisso, desenvolver processos de ensino e aprendizagem
interativos e participativos.

Essas características do ensinar requerem, além de preparação nas


áreas dos conhecimentos específicos e pedagógicos, opções éticas,
compromissos com os resultados do ensino, sensibilidade e sabedoria
dos professores.
-----------------------------------------------------------------------------------------------
(...) o ensino na universidade... constitui um processo de busca, de
construção científica e de crítica ao conhecimento produzido, ou seja,
ao seu papel na construção da sociedade. Nesse sentido, algumas
atribuições o marcam:

a) propiciar o domínio de um conjunto de conhecimentos, métodos e


técnicas científicos, que assegurem o domínio científico e
profissional do campo específico e devem ser ensinados
criticamente (isto é, em seus nexos com a produção social e
histórica da sociedade). Para isso, o desenvolvimento das
habilidades de pesquisa é fundamental;

b) conduzir a uma progressiva autonomia do aluno na busca de


conhecimentos;

c) considerar o processo de ensinar/aprender como atividade


integrada à investigação;

d) desenvolver a capacidade de reflexão;

e) substituir a simples transmissão de conteúdos por um processo de


investigação do conhecimento;

f) integrar, vertical e horizontalmente, a atividade de investigação à


atividade de ensinar do professor, o que supõe trabalho em equipe;

g) criar e recriar situações de aprendizagem;

h) valorizar a avaliação diagnóstica e compreensiva da atividade mais


do que a avaliação como controle;
55

i) conhecer o universo cultural e de conhecimentos dos alunos e


desenvolver, com base nele, processos de ensino e aprendizagem
interativos e participativos.

Essas atribuições do ensinar na universidade exigem uma


ação docente diversa da tradicionalmente praticada. (...) o professor
universitário precisa atuar como profissional reflexivo, crítico e
competente no âmbito de sua disciplina, além de capacitado a
exercer a docência e realizar atividades de investigação. (...)
O aperfeiçoamento da docência universitária exige, pois, uma
integração de saberes complementares.
(...) a docência... [é] um campo de conhecimentos específicos
configurados em quatro grandes conjuntos, a saber:

1) conteúdos das diversas áreas do saber e do ensino, ou seja,


das ciências humanas e naturais, da cultura e das artes;

2) conteúdos didático-pedagógicos, diretamente relacionados ao


campo da prática profissional;

3) conteúdos relacionados a saberes pedagógicos mais amplos do


campo teórico da prática educacional;

4) conteúdos ligados à explicitação de sentido da existência


humana individual, com sensibilidade pessoal e social.

Sobre a ética e o ensino crítico, Freire (2016, pp. 17-19, 39, 61, 64, 93, 136 e
137) já disse:

Este pequeno livro se encontra... permeado em sua totalidade pelo


sentido da necessária eticidade que conota expressivamente a natureza da
prática educativa, enquanto prática formadora. Educadores e educandos
não podemos... escapar à rigorosidade ética.
(...) É por esta ética inseparável da prática educativa... que devemos
lutar. E a melhor maneira de por ela lutar é vivê-la em nossa prática, é
testemunhá-la, vivaz, aos educandos em nossas relações com eles. Na
maneira como lidamos com os conteúdos que ensinamos, no modo como
citamos autores de cuja obra discordamos ou com cuja obra concordamos.
Não podemos basear nossa crítica a um autor na leitura feita por cima de
uma ou outra de suas obras. Pior ainda, tendo lido apenas a crítica de quem
só leu a contracapa de um de seus livros.
(...) O preparo científico do professor ou da professora deve coincidir
com sua retidão ética.
(...) a transgressão dos princípios éticos é uma possibilidade mas não
é uma virtude. Não podemos aceitá-la. (...)
A prática docente, especificamente humana, é profundamente
formadora, por isso, ética. Se não se pode esperar de seus agentes que
sejam santos ou anjos, pode-se e deve-se deles exigir seriedade e retidão.
(...)
Este é outro saber indispensável à prática docente. O saber da
formação ética dos educandos.
-----------------------------------------------------------------------------------------------------
56

A prática docente crítica... envolve o movimento dinâmico, dialético,


entre o fazer e o pensar sobre o fazer.
(...) quanto mais pomos em prática de forma metódica a nossa
capacidade de indagar, de comparar, de duvidar, de aferir, tanto mais
eficazmente curiosos nos podemos tornar e mais crítico se pode fazer o
nosso bom-senso. (...)
Como educadores... não apenas não podemos desconhecer a
televisão, mas devemos usá-la, sobretudo discuti-la. (...)
Não podemos nos pôr diante de um aparelho de televisão “entregues”
ou “disponíveis” ao que vier. (...) A postura crítica e desperta nos momentos
necessários não pode faltar.

Pimenta e Anastasiou (2014, p. 98) também falam dos desafios


contemporâneos da educação e da universidade. Listam três:

a) sociedade da informação e sociedade do conhecimento;


b) sociedade da esgarçadura das condições humanas, traduzida na
violência, na concentração de renda na mão de minorias, na
destruição da vida pelas drogas, pela destruição do meio ambiente,
pela destruição da relação interpessoal, etc.;
c) sociedade do não emprego e das novas configurações do trabalho.

Breve exame desses desafios permite que se apontem as


demandas para as instituições educativas, especialmente a
universidade, e para seus professores, examinando aspectos
relacionados a sua profissão e identidade.

6.1 Como ensinar – métodos e técnicas:

Como ensinar? Ou, melhor: como fazer com que o que é ensinado realmente
alcance o seu objetivo, a aprendizagem? Como fazer que o que se ensina seja
absorvido, apreendido?

Vejamos a seguinte ilustração:


57

Figura 11. Disponível em Bredda (2017, p. 37). Adaptação de


http://revistapontcom.org.br/matérias/o-cone-da-aprendizagem.

De acordo com o gráfico acima, o que se ensina se fixa ou se aprende melhor


quando a aprendizagem é ativa. As aulas expositivas são algo que escutamos e
vemos (o que garante 50% do conteúdo). Ao contrário, se o aluno se envolve, faz,
participa, seja ele mesmo apresentando algo (seminários), seja simulando uma
experiência real, seja realizando, a retenção sobe para 90%.

Bredda (2017, p. 38) cita estudo de Glasser, o qual explica que “(...) a maioria
dos alunos aprendem efetivamente com você, fazendo. (...) o grau de aprendizagem
está relacionado diretamente com a técnica utilizada”. Essa afirmação concorda com
a que diz que aprendemos mais quando ensinamos a outros.

Figura 12. Disponível em <https://i.ytimg.com/vi/yyYR3JM7Kig/maxresdefault.jpg>


58

Segundo Bredda (2017, p. 33): “(...) os docentes precisam... propor aos seus
alunos variadas formas de obtenção do conhecimento, trabalhando com recursos
diversos fazendo com as aulas (sic) tornem-se mais motivadoras e dinâmicas”.

Conforme Comênio (apud Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados,


2001, p. 58): “Ensinar não é nada mais do que mostrar a diferença entre uma coisa e
outra no que se refere aos seus objetivos, suas formas e suas origens. (...) Portanto,
quem explica bem as diferenças ensina bem”. (Grifos nossos.) Assim, uma das
técnicas para ensinar (ou como ensinar), é mostrar a diferença entre as coisas
(podemos também dizer as semelhanças). Seguindo essa técnica, temos as
gramáticas contrastivas entre dois idiomas, por exemplo.

Ainda falando sobre a habilidade de ensinar, a Sociedade Torre de Vigia de


Bíblias e Tratados (2001, pp. 57, 58, 60, 61, 240-243) diz que é preciso incentivar os
ouvintes a raciocinar por meio de perguntas de opinião, por fazer comparações e/ou
ilustrações, símiles e metáforas, usar exemplos, histórias fictícias ou episódios da
vida real, mostrar a aplicação e explicar o significado.

Sobre o como fazer, Rosa (2016) aconselha a usar dinâmicas, falar da


prática, que o professor fale menos (entre um terço e metade do tempo da aula) e
deixe o restante do tempo para os alunos falarem e fazerem atividades e aconselha
a simplificar; afinal, a teoria e os conceitos estão nos livros. Concordamos com ele
nesses pontos.

É curioso que o livro Beneficie-se da Escola do Ministério Teocrático


(Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, 2001, p. 254) diz algo similar: “Em
vez de só você falar, (...) aprenda a usar com tato perguntas e ilustrações para
incentivá-lo [ao ouvinte] a raciocinar”.

Rosa (2016) diz também:

O papel do professor hoje é criar formas para que a transmissão do


saber se dê de modo colaborativo, voltado para problemas e soluções,
visando a mudança nos modos de pensar, sentir e agir dos alunos. Para
isso, ele tem de recorrer a métodos de envolvimento e planejar suas aulas
de modo que os alunos tenham um papel ativo e significativo. (Grifos
nossos.)

E menciona alguns recursos que podem ser usados, como incluir algum caso
da vida real, fazer perguntas ao grupo ou a um aluno, usar um objeto (e explica que
certo professor levou uma bola de cristal para falar sobre planejamento, o qual
envolve prospecção do futuro), pedir que se leia algo, projetar um filme (incluiríamos
aqui a ideia de usá-lo como input para uma discussão em grupo ou para um
trabalho, ou ainda, usá-lo para a realização de alguma atividade preparada de
antemão), aplicar um teste, fazer algum jogo, pedir soluções para alguma história ou
caso, criar uma discussão em duplas (ou trios, ou grupos), aplicar um exercício ou
uma dinâmica de grupo.
59

Quanto abarcar de matéria? A Watchtower Bible and Tratc Society (1971, p.


156) diz (mantivemos a ortografia):

A fim de que os ouvintes raciocinem sôbre um assunto precisam ter à


sua disposição informações suficientes...

Para fazer isso com eficiência, cuide de não abranger pontos demais.
A parte boa de sua matéria se perderá se fôr apresentada às pressas. (...)
Responda a perguntas como: Por quê? Quem? Como? O quê? Quando?
Onde? Ajudará assim os seus ouvintes a compreender a idéia mais
plenamente...

Sempre é bom fazer perguntas para ajudar os ouvintes a raciocinar.


As perguntas retóricas... acompanhadas de pausas apropriadas,
estimularão o raciocínio.

Uma editora associada, a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados


(2001, pp. 251 e 252) expõe:

A argumentação que induz a raciocinar, além de ser muito


persuasiva, estimula uma análise imparcial, apresenta pontos para reflexão
posterior...

(...) leve em conta a formação dos ouvintes. (...)

Fale com convicção...

Em vez de apressar-se para responder às perguntas, use ilustrações


ou outras perguntas para ajudar a pessoa a raciocinar sobre o assunto.

Crie o hábito de ajudar os ouvintes a raciocinar... mostrando como o


contexto e outros textos esclarecem o sentido, ou usando um exemplo que
demonstre como aplicá-los. (Grifo nosso.)

Por falar em argumentar, o que é? Existe diferença entre argumentar e


persuadir ou convencer? Segundo Abreu (s/d, pp. 9 e 10):

Argumentar é a arte de convencer e persuadir. Convencer é saber


gerenciar informação, é falar à razão do outro, demonstrando, provando.
Etimologicamente, significa vencer junto com o outro (com + vencer) e não
contra o outro. Persuadir é saber gerenciar relação, é falar à emoção do
outro. A origem dessa palavra está ligada à preposição per, “por meio de” e
a Suada, deusa romana da persuasão. Significava “fazer algo por meio do
auxílio divino”. Mas em que convencer se diferencia de persuadir?
Convencer é construir algo no campo das idéias (sic). Quando
convencemos alguém, esse alguém passa a pensar como nós. Persuadir é
construir no terreno das emoções, é sensibilizar o outro para agir. Quando
persuadimos alguém, esse alguém realiza algo que desejamos que ele
realize. (...)

Argumentar é, pois, em última análise, a arte de, gerenciando


informação, convencer o outro de alguma coisa no plano das idéias (sic) e
de, gerenciando relação, persuadi-lo, no plano das emoções, a fazer
alguma coisa que nós desejamos que ele faça.
60

Por outra parte, Pimenta e Anastasiou (2014, pp.185, 203, 205-208) dão mais
detalhes sobre a teoria do ensinar e desenvolvem, inclusive, o conceito de
ensinagem. Dizem elas:

No enfoque hermenêutico ou reflexivo, o ensino é uma atividade


complexa que ocorre em cenários singulares, claramente determinados pelo
contexto, com resultados em grande parte imprevisíveis, carregada de
conflitos de valor, o que requer opções éticas e políticas. O professor, por
sua vez, deve ser um intelectual que tem de desenvolver seus saberes (de
experiência, do campo específico e pedagógicos) e sua criatividade para
fazer frente às situações únicas, ambíguas, incertas, conflituosas nas
aulas... Assim, o conhecimento do professor é composto da sensibilidade da
experiência e da indagação teórica. Emerge da prática (refletida) e se
legitima em projetos de experimentação reflexiva e democrática no próprio
processo de construção e reconstrução das práticas institucionais. (...)

Na história da Didática houve época em que a importância do ensinar


predominou sobre o aprender. Nessa perspectiva, a ênfase nos métodos,
nos recursos e no professor como figura central do processo constituiu a
base do conhecimento didático. Assim foi a didática comeniana, que se
pretendeu uma arte de ensinar tudo a todos, a didática herbartiana, com a
precisão dos passos formais definindo uma prescrição metodológica, e, em
tempos mais recentes, a crença no poder das tecnologias e das mídias
como formas mais eficazes para a transmissão das informações.

(...) o verbo ensinar contém uma utilização intencional – a intenção da


aprendizagem – que nem sempre vem acompanhada da obtenção da meta
– a efetiva ocorrência da aprendizagem por parte do aprendiz (cf. Sheffler,
1974). Na ensinagem, a ação de ensinar é definida na relação com a ação
de aprender, pois, para além da meta que revela a intencionalidade, o
ensino desencadeia necessariamente a ação de aprender. Essa perspectiva
possibilita o desenvolvimento do método dialético de ensinar.

(...) o ato de ensinar não se resume ao momento da aula. (...)

Benedito (1995) aponta como responsabilidade do docente a


efetivação das ações correspondentes aos três momentos do ciclo didático,
a saber: 1) preparatório ou pré-ativo; 2) de ação docente ou interativo; 3) de
avaliação ou pós-ativo.

(...) a ação de ensinar não se limita à simples exposição dos conteúdos,


mas inclui a necessidade de um resultado bem-sucedido daquilo que se
pretendia fazer – no caso, ensinar. (...) exigindo condições temporais, local
planejado e estipulado e participação conjunta dos sujeitos envolvidos no
processo, professores e alunos.

(...) a aula – como momento e espaço privilegiado de encontro e de ações –


não deve ser dada nem assistida, mas construída, feita pela ação conjunta
de professores e alunos.

(...) Nas aulas, para além do “o quê” e do “como”, deve-se ensinar também
“a pensar”, aspectos que se determinam e se condicionam mutuamente,
configurando o ensino como atividade do professor e do aluno, acentuado
61

na atividade do primeiro, e a aprendizagem como atividade do professor e


do aluno, acentuada na atividade do segundo. (Destaques das autoras.)

A seguir, listamos variadas sugestões e apontamentos de Svinicki e


McKeachie (2013) sobre o ensinar e como ensinar (os grifos são dos autores):

O importante é o aprendizado, não o ensino.


As aulas são imprevisíveis.
Há muitas metas importantes no ensino universitário e uma delas é
aumentar a motivação e capacidade do aluno para continuar o aprendizado
depois que sair da universidade.
Na maioria das vezes, o aprendizado do aluno ocorre fora da sala de aula.
Um ponto importante para melhorar o processo de ensino é a reflexão –
pensar nos objetivos pretendidos e em como alcançá-los. (pp. 6 e 7)
------------------------------------------------------------------------------------------------
[Sobre usar um livro didático] (...) [o] procedimento do próprio professor
compilar as leituras necessárias... oferece flexibilidade, vários pontos de
vista e oportunidade de manter o máximo interesse. (...)
As desvantagens de não usar um livro... sem o livro, o trabalho de
integração pode ser tão grande que os docentes acabam desistindo de
fazê-lo. Com um livro didático bem escolhido, o professor pode ter a certeza
de que os alunos vão obter conteúdo e estrutura da matéria por meio da
leitura e, assim, fica mais livre para variar os procedimentos e os recursos
pedagógicos em sala de aula. (p. 14)
----------------------------------------------------------------------------------------------
A leitura passiva de uma publicação resulta em um aprendizado mais
pobre que a leitura com uma atividade em mente, como o preparo de uma
questão para ser discutida em aula, a elaboração de um mapa conceitual ou
exemplos com possíveis aplicações. (p. 19)
--------------------------------------------------------------------------------------------
(...) o aprendizado é facilitado pela organização.
(...) [treinar] tanto a leitura crítica [analisando a leitura] como a sumarização
[explicar a leitura que fizeram]...
O problema básico pode ser encontrado no significado da palavra ler.
Para muitas pessoas, “ler” é simplesmente passar os olhos nas palavras...
É necessário ensinar aos alunos como se lê – como ler com
compreensão, como pensar sobre os propósitos do autor, sobre as relações
com o aprendizado anterior e sobre como usar o que acabaram de
absorver. (pp. 34 e 25)
----------------------------------------------------------------------------------------------
(...) Sugira que seus alunos:
1. Leiam os títulos dos tópicos antes de estudarem todo o capítulo.
2. Escrevam perguntas às quais gostariam de responder.
3. Façam anotações conforme leem.
4. Sublinhem ou destaquem os conceitos importantes.
5. Tenham um diálogo ativo com o autor.
6. Comentem sobre a leitura em seus diários.

(...) investigue a leitura primeiro, elabore algumas perguntas às quais o


texto parece responder e, depois, leia, reflita, revise, destrinche,
repense e reavalie. (pp. 36 e 37)
--------------------------------------------------------------------------------------------
62

(...) Seu trabalho de professor palestrante dispensa menos conhecimento do


que aquele necessário para ensinar os alunos a aprender a pensar. (p. 62)
-----------------------------------------------------------------------------------------------------
(...) treinar os alunos para se tornarem melhores ouvintes.
(...) pedir aos alunos que ouçam com toda a atenção o que você tem a dizer
(de 5 a 15 minutos). Durante sua fala, eles não poderão fazer nenhuma
anotação. Depois de concluída a exposição, peça aos alunos que elaborem
um resumo do que ouviram. Você pode, então, pedir que comparem os
resumos com um ou dois colegas...
(...) eles terão 5 minutos ao final da aula para resumir os pontos principais
da palestra para alguém sentado próximo a eles. (pp. 70 e 71)
---------------------------------------------------------------------------------------------------- -
(...) o desenvolvimento como professor é uma atividade recursiva. (...)
reflexão e pensamento sobre o ensino...
Como desenvolver habilidades e estratégias eficazes? A resposta fácil é
“prática, prática, prática”. Pratique com feedback – tenha conhecimento dos
resultados.
(...) No caso de o professor não conhecer métodos de ensino... ele terá de
buscar informações e conhecimentos, atualizar-se e estudar muito. (...)
Assinar uma publicação científica ou acessá-la regularmente...
oferece estímulos para pensar em novas ideias.
(...) todos podem aprender. Nossa missão é facilitar o aprendizado, motivar
os alunos, apresentar conteúdo adequado, organizar atividades que
promovam a aprendizagem e ensiná-los a aprender de maneira eficaz.
[Veja-se o capítulo sete, abaixo.]

(...) Em todas as disciplinas, há conceitos ou habilidades que parecem


extremamente difíceis de serem ensinados. Muitas vezes, os professores
experientes têm estratégias para superar essas dificuldades.
(...) Se não tiver tempo para fazer um portfólio, pelo menos mantenha um
diário no qual pode escrever regularmente sobre seu ensino, seus alunos e
suas aulas.
Não há ensinar sem aprender. Brom e Aguiar (2010) afirmam que
ensinar e aprender são indissociáveis. (...) O desenvolvimento profissional
do professor ocorre em um complexo processo de aprender, conhecer,
refletir, vivenciar, praticar, transpor, representar e simbolizar. Processo que
se retroalimenta continuamente. Um constante observar, ouvir, criticar,
compreender e transformar. “Não há fazer docente desacompanhado do
pensar, do compromisso com os aprendizes e suas especificidades, da
busca do sentido e da razão da educação. É a ideia do professor reflexivo,
que é um pesquisador da própria prática, simultaneamente sujeito e objeto
da atividade de ensinar. (...) um processo de formação continuada, jamais
concluída”. (pp. 352-355 e 363.)

Essa última parte nos faz lembrar o que escreveu Paulo Freire. Em Freire
(2016, pp. 25 e 83), lemos:

Não há docência sem discência... Quem ensina aprende ao ensinar e


quem aprende ensina ao aprender. (...) Ensinar inexiste sem aprender e
vice-versa...
Como professor devo saber que sem a curiosidade que me move,
que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem ensino. (...)
63

Estimular a pergunta, a reflexão crítica sobre a própria pergunta, o


que se pretende com esta ou com aquela pergunta... O fundamental é que o
professor e alunos saibam que a postura deles, do professor e dos alunos, é
dialógica, aberta, curiosa, indagadora e não apassivada, enquanto fala ou
enquanto ouve. (Grifos do autor.)

Hofer, in Svenicki e McKeachie (2013, pp. 155-157), dá alguns conselhos:

Quando o aluno que vai bem em um trabalho e ouve “Você é muito


bom nisso!”, ele fará o que for necessário para preservar essa imagem,
talvez até nem fale na aula enquanto não tiver certeza da resposta, escolha
trabalhos menos exigentes e evite atividades novas. O aluno que ouve
“Você foi muito bem e deve ter trabalhado muito para entender tudo isso”
provavelmente se sente reconhecido pelo esforço e quer continuar a vencer
desafios. (...)
É aconselhável promover a motivação intrínseca dos alunos para que
venham para as aulas bem preparados. Para tanto, o professor deve tornar
as palestras e os debates mais interessantes, variar o formato instrucional...
estimular a reflexão e acrescentar elementos interativos... Os alunos se
sentem mais motivados a ir à aula quando a experiência de aprendizagem
coletiva ultrapassa claramente aquilo que pode ser copiado das anotações
dos colegas.

O supracitado nos mostra que o docente deve variar os métodos e primar


pela participação dos alunos. Estes, de fato, devem sentir a aula como algo
agradável e devem participar em construir o conhecimento. Portanto, surgem as
perguntas: O que é aprender? Como fazê-lo?
64

CAPÍTULO 7 – APRENDER

Figura 13. Disponível em <http://www.humanizeconsulting.com/en/preparandonos-para-aprender-a-


aprender>

Aprender – o que é? Basta aprender? É necessário mais? E compreender? E


apreender? Como aprender a aprender?

O Dicionário escolar da língua portuguesa/Caldas Aulete (2012) assim define


aprender (eliminamos as notações gramaticais e os exemplos): “1 Alcançar o
conhecimento, a compreensão ou o domínio de, por meio do estudo ou da prática. 2
Adquirir a habilidade de; tornar-se adestrado em. 3 Fixar na memória; memorizar;
decorar. 4 Entender melhor, tirar como lição.”

Freire (2016, p. 68) contradiz a terceira acepção supracitada. Defende (grifos


dele):

(...) aprender é uma aventura criadora, algo... muito mais rico do que
meramente repetir a lição dada. Aprender para nós é construir, reconstruir,
constatar para mudar, o que não se faz sem abertura ao risco e à aventura
do espírito.

(...) toda prática educativa demanda a existência de sujeitos, um que,


ensinando, aprende, outro que, aprendendo, ensina, daí o seu cunho
gnosiológico...

Perrenoud (2000, p. 28) concorda com Freire. Ele diz que “aprender não é
primeiramente memorizar, estocar informações, mas reestruturar seu sistema de
compreensão de mundo.” (Destaques do autor.)

Já Piazzi (2014) dá outra perspectiva. Para ele, cabe aos professores


ensinarem aos alunos a assistir às aulas; devem exigir silêncio absoluto se o
momento é de explicação. Diz ele que (p. 190): “(...) a aula não é a parte mais
importante do processo de aprendizagem, mas isso não significa que ela não seja
65

importante.” E completa dizendo que a aula “É o momento da explicação, da


motivação, do despertar da curiosidade.”

Segundo Piazzi (2014, p. 190), “a tarefa [ou lição de casa] é a parte mais
importante do processo”. Diz ainda que cabe aos professores incutir nos alunos o
prazer pela leitura, que se deve sugerir algum livro, jamais obrigá-los a ler este ou
aquele. E que, quando o aluno perguntar o que vai cair na prova, a resposta deve
ser : “TUDO!!!”.

E acrescenta (p.192): “Deve-se, principalmente, orientar o aluno sobre a


importância do ‘fazer’. Sempre estudar com um lápis na mão. Sempre estar
‘fazendo’”.

Aos alunos, Piazzi (2013, pp. 42-45, 54 e 61-64) aconselha:

Estude pouco! (...) Você não deve estudar mais, deve estudar
melhor. (...) Quando? A resposta é “pouco... mas todo dia”! (...) Existe o
momento da aula... e o momento do exame: O vencedor é o que estuda
imediatamente depois da aula... Aula assistida hoje é aula estudada...
hoje!

No Brasil, infelizmente, criou-se a cultura estranha que focaliza a


aprendizagem na sala de aula.

Isso é um equívoco.

Na aula você não aprende... na aula você entende.

Você só consegue aprender de verdade quando estiver sozinho!

Para estudar, é indispensável estudar fazendo. (...) Nunca estude


sem ter um lápis em atividade sobre um pedaço de papel.

Se o objeto de estudo for um texto de história (sic), por exemplo, não


se limite a lê-lo ou, pior, em tentar decorá-lo. (...) descubra quais os
conceitos e fatos mais importantes... e escreva-os numa folha de papel.

O próprio ato de escrever é que permite maior fixação posterior


durante a noite.

(...) durante as aulas, normalmente você ouve e vê e pouco faz. Isso


significa que, durante a aula, se muito, você entende.

Depois, no momento do estudo, é que você tem a chance de fazer.

Fazer por ocasião da resolução de problemas, fazer enquanto estiver


elaborando o resumo de um texto, fazer ao escrever e desenhar.

(...) é no momento do estudo que você aprende, ou seja, prepara as


condições para que as suas redes neurais, naquela mesma noite, se
reconfigurem alterando fisicamente a estrutura de seu cérebro.

O bom professor não dá aula para fazer o aluno aprender.


66

Ela (sic) dá aula para fazer o aluno entender a matéria e,


principalmente, para fazê-lo gostar do que está sendo apresentado. (Grifos
do autor.)

É curioso que ele defende que o momento para aprender é estudando em


casa, pois assim o estudante estará sozinho, exercitando o entendido em aula. Para
Piazzi, portanto, assistir à aula é algo coletivo e passivo; estudar é algo solitário e
ativo. E é no ato de estudar que se aprende, de fato.

Lembramo-nos de um curso para professores de espanhol realizado em


fevereiro de 2011 nas dependências da Fundação Fisk. Neste, foi-nos dito sobre o
“aprendendo a aprender”. É fato que se destacou a aprendizagem de idiomas, mas
acreditamos que são conselhos válidos para tudo. Mencionaram-se diversas coisas,
entre elas (baseado em nossas anotações):

É preciso adquirir um hábito de estudo. Não se deve estudar para os


exames, mas para aprender (isto coincide com o que afirma Piazzi).

Aprender um novo idioma exige adquirir uma nova habilidade:

Entender como funciona não é suficiente: é preciso praticá-lo!


Necessita-se passar por uma fase de automatização que vem com a
prática. (A prática, ou fazer, também foi citada pelo professor Pierluigi
Piazzi.)

Também Elbow e Sorcinelli (in Svinicki e McKeachie, 2013, pp. 226 e 227)
falam sobre o momento fora da sala de aula:

Muitos professores pedem aos alunos que mantenham um diário com


reflexões informais sobre as leituras e aulas. O objetivo é levar os alunos a
processar o que estão estudando e a estabelecer uma conexão com o
restante de suas experiências, pensamentos e sentimentos.
(...) aprender uma disciplina significa aprender seu “discurso”, mas os
alunos não dominam uma área até que consigam escrever e falar sobre os
conceitos com a própria linguagem pessoal e impessoal. A repetição bem-
-sucedida da linguagem do livro didático pode mascarar a falta de
entendimento. (Destaque dos autores.)

Falando da dedicação dos alunos/estudantes aos estudos, Weinstein et al. (in


Svinicki e McKeachie, 2013, pp. 312, 315 e 316) dizem (adaptamos a pontuação;
grifos nossos):

Talvez você queira entrevistar os alunos para promover a


autoconsciência com relação às estratégias, fazendo as seguintes
perguntas quando estiverem se preparando para a primeira grande prova ou
trabalho: “Quantas horas por semana você estuda para esse curso? Você
está acompanhando as leituras e os trabalhos do curso? Como você toma
notas ou estuda enquanto lê o livro? Como você toma notas nas aulas?
Você revisa suas anotações? Quando? Como? Você para com frequência e
verifica se está entendendo a matéria?” (...)
67

Devemos lembrar que, como docentes, podemos servir de modelo de


aprendizagem autônoma (Pintrich, 1995). (...) Ao modelar a autonomia de
aprendizagem, oferecendo feedback e diretrizes, o professor consegue
afetar de maneira significativa a emancipação do aluno para o estudo
(Schunk e Zimmerman, 2007). (...)
As formas mais simples de estratégias de aprendizagem envolvem
repetição ou revisão, como repetir a leitura de algum trecho difícil de um
livro, uma equação ou regra.

A menção à repetição nos faz lembrar o que diz Watchtower Bible and Tract
Society (1971, p. 128; destaque nosso): “Diz-se apropriadamente que a repetição é
a mãe da retenção. A repetição é uma das técnicas essenciais do ensino.” Embora
se esteja falando de ensino e que essa é uma técnica para o instrutor ou ensinante,
a repetição também serve para que o aluno retenha a informação.
Em entrevista ao site Canal C (disponível em
<http://canalc.pt/index.php/2017/04/17/jose-pacheco-nao-e-aceitavel-um-modelo-
educacional-em-que-alunos-do-seculo-xxi-sao-ensinados-por-professores-do-seculo-
xx-com-praticas-do-seculo-xix/>), quando a entrevistadora afirma “Diz que numa
aula não se aprende nada”, o professor português José Pacheco responde:

A afirmação é radical. Mas toda regra tem exceção. Aprendi Francês


escutando aula, porque me apaixonei pela professora. A aprendizagem é
antropofágica. Não se aprende o que o outro diz, apreendemos o outro. Um
professor não ensina aquilo que diz, transmite aquilo que é. Poderá
acontecer aprendizagem em sala de aula, se forem criados vínculos e
esses vínculos não são apenas afetivos, também são do domínio da
emoção, da ética, da estética…

Pimenta e Anastasiou também dão sua contribuição. Ao definirem


aprendizagem, mencionam (2014, pp. 209-211; itálicos das autoras e negritos
nossos):

A aprendizagem exige a compreensão do conteúdo pelo aluno.


Comprehendere, por sua vez, significa “aprender em conjunto”. Isso exige a
descoberta ou construção de uma rede de relações...
O aluno tem de ativamente refletir (no sentido de dobrar-se de novo
e de novo – tanto quanto seja necessário), para apropriar-se do quadro
teórico objetivado pelo professor e pelo currículo no processo de ensino.
Para efetivar o processo de apropriação, é preciso superar o
aprender, que significa “tomar conhecimento de, reter na memória mediante
o estudo, a observação ou a experiência”, na direção do apreender, do latim
apprehendere, que significa “segurar, agarrar, prender, pegar, assimilar
mentalmente, entender, compreender”.
Daí a necessidade atual de revisar o “assistir a aulas”, pois a ação de
apreender não é passiva. Exige informar-se, exercitar-se, instruir-se. (...)
Apreender... exige... a escolha e execução de uma metodologia
adequada aos objetivos e conteúdos do objeto de ensino e aos alunos.
Exige do professor, além do domínio do conteúdo a ser ensinado, a
competência para uma docência da melhor qualidade (Rios, 2001). (...)
68

exige-se do professor uma competência docente capaz de planejar e


efetivar um processo contínuo de ações que possibilitem aos alunos ir
construindo, agarrando, apreendendo o quadro teórico-prático pretendido
em momentos sequenciais e de complexidade crescente.

Com isso constatamos, portanto, que os alunos também devem esforçar-se


para atingir o objetivo do processo de ensino-aprendizagem. Como se pode,
entretanto, intercalar, interseccionar ou cruzar os caminhos do ensino e da
aprendizagem?
69

CAPÍTULO 8 – ENSINAGEM

Figura 14. Disponível em <http://caujak.blogspot.com.br/2012/05/didatica-des-aula-3-ensinagem-um-


novo.html>

O que é ensinagem? De onde surge essa expressão? Para esclarecer da


melhor forma, vamos valer-nos do que dizem Pimenta e Anastasiou (2014, pp. 214 e
217; itálico das autoras e negrito nosso):

(...) é importante o estabelecimento de uma relação contratual na qual


ambos, professor e aluno, terão responsabilidades na conquista do
conhecimento. A esse processo compartilhado de trabalhar os
conhecimentos, no qual concorrem conteúdo, forma de ensinar e resultados
mutuamente dependentes, é que estamos denominando de processo de
ensinagem (Anastasiou, 1998).

Ensinar é um projeto coletivo.

A Didática moderna não se centra mais no professor, mas sim no aluno.

Figura 14. Disponível em <http://didaticanamicro.blogspot.com.br/>


70

Anastasiou in Anastasiou e Alves (2015, p. 20, nota 3) explica:


A expressão ensinagem foi inicialmente explicitada no texto de
ANASTASIOU, L. das G. C., resultante da pesquisa de doutorado:
Metodologia do ensino superior: da prática docente a uma possível teoria
pedagógica. Curitiba: IBPEX, 1998, p. 193-201. Termo adotado para
significar uma situação de ensino da qual necessariamente decorra a
aprendizagem, sendo a parceria entre professor e alunos a condição
fundamental para o enfrentamento do conhecimento, necessário à formação
do aluno durante o cursar da graduação.

E a autora acrescenta nas páginas 20 e 21:

(...) o termo ensinagem, usado... para indicar uma prática social complexa
efetivada entre os sujeitos, professor e aluno, englobando tanto a ação de
ensinar quanto a de apreender, em um processo contratual, de parceria
deliberada e consciente para o enfrentamento na construção do
conhecimento escolar, decorrente de ações efetivadas na sala de aula e
fora dela.
Trata-se de uma ação de ensino da qual resulta a aprendizagem do
estudante, superando o simples dizer do conteúdo por parte do professor,
pois é sabido que na aula tradicional, que se encerra numa simples
exposição de tópicos, somente há garantia da citada exposição, e nada se
pode afirmar acerca da apreensão do conteúdo pelo aluno. Nessa
superação da exposição tradicional como única forma de explicitar os
conteúdos é que se inserem as estratégias de ensinagem.
(...) propõe-se uma unidade dialética processual, na qual o papel
condutor do professor e a autoatividade do estudante se efetivem em dupla
mão, num ensino que provoque a aprendizagem por meio de tarefas
contínuas dos sujeitos, de tal forma que o processo interligue o aluno ao
objeto de estudo e os coloque frente a frente. (Grifos nossos.)

As últimas afirmações recordam-nos o que disse Araújo (2000) sobre “upayar”


os alunos (emancipá-los, levá-los ao autoconhecimento, à autocondução). Deve-se
entender, então, que a ensinagem leva o aluno a conduzir o seu próprio
aprendizado, em trabalho conjunto com o professor.
Interessante a observação que faz Perrenoud (2000, pp. 34 e 37; destaques
do autor):
(...) a construção do conhecimento é uma trajetória coletiva que o professor
orienta, criando situações e dando auxílio, sem ser o especialista que
transmite o saber, nem o guia que propõe a solução para o problema. (...)
Como tornar o conhecimento apaixonante por si mesmo? (...)
A paixão pessoal não basta, se o professor não for capaz de
estabelecer uma cumplicidade e uma solidariedade verossímeis na busca
do conhecimento.

Em outras palavras: o conhecimento e o ensino-aprendizagem (a ensinagem)


se constroem em conjunto: entre professor(es) e aluno(s).
71

8.1 Ensinar a pensar:


“A mente é um fogo a ser aceso, não um vaso a preencher.” (Plutarco)

Visto que os discentes devem estar tão envolvidos na ensinagem quanto os


docentes, é óbvio que precisam aprender a pensar. É possível ensinar a pensar?

Halonen (in Svinicki e McKeachie, 2000, pp. 325, 326) nos informa:

(...) os professores voltados para os alunos... acreditam que os alunos que


lutam com as ideias passam por um aprendizado mais significativo e
duradouro. (...) os professores voltados para os alunos regularmente se
voltam para estratégias de aprendizagem ativa, com o propósito de engajá-
los no processo de reflexão crítica. (Grifos nossos.)

Já nas páginas 330 e 331, Halonen aconselha (ao docente):

Não responda a todas as perguntas. Transforme-as em


oportunidades para que todos os alunos encontrem um caminho de reflexão
para uma resposta satisfatória e vivenciem o processo de satisfação. (...)

No início de uma educação universitária, é normal, do ponto de vista


do desenvolvimento, resistir às formas complexas de pensamento. A arte do
ensino universitário eficaz envolve criar estratégias sobre meios de diminuir
a resistência e aumentar a empolgação dos alunos para maiores
investimentos cognitivos (Destaques nossos.)

Cury (2003, pp. 68, 70 e 71) explana (negrito-itálico do autor; itálico simples
nosso):

Bons professores cumprem o conteúdo programático das aulas,


professores fascinantes também cumprem o conteúdo programático, mas
seu objetivo fundamental é ensinar os alunos a serem pensadores e
não repetidores de informações. (...)

As provas escolares... deveriam ser abertas, promover a criatividade,


estimular o desenvolvimento do livre pensamento, cultivar o raciocínio
esquemático, expandir a capacidade de argumentação dos alunos. (...)

Nas provas deveria ser valorizado qualquer raciocínio esquemático,


qualquer idéia (sic) organizada, mesmo que estivessem completamente
errados em relação à matéria dada. É possível dar nota máxima para um
raciocínio brilhante baseado em dados errados. Isso valoriza pensadores.
72

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Em primeiro lugar, gostaríamos de desculpar-nos pela quantidade de


citações. Foi-nos imperioso fazê-lo, haja vista a necessidade de clareza e força (ou
autoridade) para podermos defender aquilo que lemos e em que cremos.
Deixaremos para pôr o nosso parecer e as nossas conclusões aqui nas
considerações finais.

Isso posto, gostaríamos, agora, de dar nosso parecer sobre o tema lido,
pesquisado e escrito, quanto à docência no Ensino Superior e os desafios que
encontra o professor neófito em seu mister.

É fato que qualquer profissional sente certo temor ao iniciar suas atividades.
Parece até que nós, professores, sempre sentimos essa classe de ansiedade em
cada trabalho (sala) novo(a). Entretanto, no que tange ao magistério superior, o
principiante pode sentir-se desesperado por pensar em questões como: “Saberei
ensinar bem? E se me fizerem uma pergunta que eu não saiba responder? Será que
me verão como um mau professor? E se os alunos, ao acessarem a internet, tiverem
alguma informação que eu desconhecia? Será que posso ser demitido caso haja um
alto índice de notas baixas? E se muitos tiverem notas altas, desconfiarão de algo?
Preciso conhecer só o conteúdo ou é preciso ir além? Já sei sobre Piaget, Vigotsky,
Wallon, Pimenta, Anastasiou... Faltará algo?”.

Cremos que esses devem ser os principais temores de um docente iniciante


no Ensino Superior. E a resposta é clara: é preciso, sim, ter conhecimento do
conteúdo, das novas tecnologias, de Didática, Pedagogia/Andragogia. Não obstante,
não há motivo para se desesperar. Para isso existe (e deve-se investir na) Formação
Contínua. Para isso existem cursos de formação de professores.

O que os teóricos acima escreveram dá embasamento para a prática na sala


de aula, é fato. Isso não significa, porém, que não se possa ensinar sem se
conhecer o que eles escreveram/estudaram. Nós começamos a dar aulas de
idiomas antes mesmo de fazer Letras. A única orientação que tínhamos era a parte
orientações pedagógicas do livro do professor. Então, começamos a frequentar as
oficinas (workshops) que a Disal e a Santillana oferecem. Isso nos ajudou
sobremaneira! Depois, quando iniciamos a faculdade de Letras, tivemos mais
suporte teórico para as aulas. Na Pós-Graduação sobre Formação de Professores
do Ensino Superior, tivemos ainda mais apoio metodológico e didático, voltado
especificamente para o Ensino Superior. Isso não significa que os professores
tenham um conhecimento “mágico” e “secreto” que ninguém mais possui; mas a
ideia é que o ser professor deve ser visto como uma profissão em si, que precisa,
portanto, de formação específica. Com isso, não queremos desanimar ninguém de
ser professor; mas é necessário ter preparo.
73

O professor deve ter consciência de que lhe é imperioso estudar! Um docente


não pode ficar parado. Deve estar na sala de aula dos dois lados – ensinando, mas
também aprendendo. Ele precisa ser aluno e professor.

Falando da nossa própria, foi-nos uma grata experiência o fato de cursar a


Pós-Graduação em Formação de Professores para o Ensino Superior (em algumas
instituições, chamada de Docência no Ensino Superior). Temos a convicção de que
nos deu o suporte necessário para lidar com situações de ensino-aprendizagem
(ensinagem).

Pelos argumentos de Pimenta e Anastasiou (2014), de Svinicki e McKeachie


(2013), e de muitos outros supracitados, afirmamos que o professor deve basear sua
prática em conhecimento. Não só o conhecimento da sua área específica (ou da
“matéria”, como dizem os estudantes), mas também no conhecimento de como
funciona o pensamento, de como se aprende, da Didática, de estratégias para que o
ensino alcance seu objetivo: a aprendizagem. É por isso que nos agrada muito a
ideia de ensinagem: é o ensino que implica, necessariamente, o alvo, a
aprendizagem. Entretanto, isso requer como que um contrato por ambas as partes:
docentes e discentes. Todos devem contribuir para atingir a meta final.

Podemos afirmar que a formação para a docência universitária é


imprescindível. Ela dará base ao ensinante para que ele tenha segurança ao
ensinar, para que possa pesquisar, para que se forme a si mesmo e a outros. Não
se deve afastar a teoria da prática e a prática deve ser exercida baseada na teoria.
Ou seja: o estudo (a preparação) deve impulsionar o ensino (a prática), embora
também a prática do ensino sirva de autoestudo (formação) para o docente.

Não basta o conhecimento técnico e prático da profissão para ensinar; é


preciso ter o conhecimento das teorias do conhecimento, a Didática, a Pedagogia, a
Andragogia... Dizer que só com saber algo é possível dar aulas em universidade é
desmerecer a profissão de professor e sucatear o ensino. Precisamos estudar no
mínimo um lato sensu para dar aulas em universidades. E é por esse tipo de
descuido que há “professores” que sabem muito para si, mas não conseguem
transmitir a outros!

Por tudo isso, cremos que o professor deve ter uma base, a qual somente se
faz possível mediante a preparação, o estudo, a formação adequada. Já disse
Perrenoud (2000, p. 31):

(...) o professor deve, evidentemente, ter conhecimentos em didática e em


psicologia cognitiva. De início, deve interessar-se pelos erros, aceitando-os
como etapas estimáveis do esforço de compreender, esforçar-se, não
corrigi-los (“Não diga, mas diga!”), proporcionando ao aprendiz, porém, os
meios para tomar consciência deles, identificar sua origem e transpô-los.
(Grifos do autor.)
74

Reconhecemos, portanto, a importância de existirem cursos como esta Pós-


-Graduação da UNIP, “Formação de Professores para o Ensino Superior”. O curso é
pontual na preparação de futuros docentes para o magistério superior.

É preciso que os que entram na profissão de professor a encarem como isso


mesmo, uma profissão. Faz-se necessário haver uma conscientização de que para
ser docente faz falta uma formação: estudo, prática e reflexão sobre a prática. A
teoria embasa a prática e a prática conversa com e complementa a teoria. Na
formação inicial dos professores do ensino básico, por exemplo, existe o estágio;
para o docente do ensino superior, não. E a questão é que muitos profissionais das
mais diversas áreas vão dar aulas em universidades sem ter o mínimo conhecimento
de didática, de como se constrói o conhecimento; e esse saber é fundamental.
75

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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Teocrático. Nova Iorque, 1971.
79

ANEXO:

Transcrição do vídeo: Ser professor na educação superior – Tela Mackenzie


53 (apenas das partes utilizadas). Vídeo disponível em
<http://www.youtube.com/watch?v=ech4cv157rQ>.

De 6’53” a 8’30”:

ENTREVISTADOR: Quais são os prejuízos que um aluno pode ter, por exemplo,
se... um profession... um profissional não estiver preparado pra dar aula?

PROF. DR. ÍTALO F. CURCIO: Eh... Na verdade, todo profissional... uma pessoa...
eu acredito também que existam pessoas autodidatas. Claro! A humanidade está
cheia de bons exemplos nesse sentido. Mas bons exemplos... poucos comparados
com o mundo de profissionais que nós temos. Ora, eu tenho que me colocar como
aluno. Eu tenho que me colocar como pai de aluno. Será que eu gostaria de ser
aluno de alguém que vem ensaiar comigo para que daqui a alguns anos ele seja um
excelente professor? Mas hoje, eu sou cobaia. Claro que existem diversas formas de
chegar à sala de aula, né, e uma delas, talvez, é lembrar um pouco de cada um dos
nossos professores lá do passado. “Puxa, eu quero imitar o meu professor X! Nossa,
eu gostaria de ser parecido com ele!” Então, ele treina bastante; ele até consegue,
muitos até conseguem. Mas, veja, a tentativa e erro não é o ideal da ciência. Ela até
existe, mas isso tem que ser em casos esporádicos.

ENT.: Até acertar já prejudicou muitos estudantes, né?

PROF.: Muitos estudantes. Imagine que eu esteja trabalhando com uma, duas, três
turmas e daqui a três, quatro anos eu serei um exímio professor. Mas quantos
alunos meus padeceram na minha mão pela minha inexperiência? Vale a pena?

De 12’11” a 12’45”:

PROF.: Como são formados esses professores [da universidade]? Então, nós
devemos evitar esse... essa tentativa e erro. Por isso que, se o professor não se
sente capacitado, não se sente... ou o profissional – perdão! – não se sente
capacitado para ser professor, eu... ah... a minha sugestão é que ele se prepare; é
questão de tempo, mas o tempo é importante nesse momento. Veja que um curso
de especialização, por exemplo, nessa área, ele dura aproximadamente um ano e
meio. E isso vai fazer uma diferença!

De 14’08” a 14’35”:

PROF.: Nós vamos passar para esses alunos [do curso de Formação de Docentes
para a Educação Superior] conteúdos que eles certamente não tiveram na sua
formação técnica. E não é erro do curso que eles são originários. Não! Os cursos
deles são cursos excelentes, muito bem dados. Só que o objetivo daquele curso não
80

era a docência. Então, se ele quer ser docente, a nossa sugestão é que ele se forme
para ser docente.

De 21’59” a 22’14”:

PROF.: O aluno tem que se sentir beneficiado. O aluno tem que perceber: “Puxa,
que professor! Que agradável! Como eu entendi! Agora, sim! Olha, eu li, rei o texto
no livro, não entendi nada. Mas ainda bem que eu assisti à aula desse professor! E
ele me ajudou!”.

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