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Capítulo 4

Operadores lineares

Neste capítulo vamos introduzir os primeiros conceitos sobre operadores em es-


paços normados. De interesse especial são os operadores que preservam as duas
operações algébricas dos espaços vectoriais. No caso do espaço de chegada ser
R ou C então o operador é chamado um funcional. Os operadores limitados ou
funcionais limitados formam uma classe muito importante visto que estes podem
tirar partido da estrutura vectorial. O resultado mais importante é aquele que esta-
belece que um operador é limitado se e só se é contínuo. Também de importância
básica é o espaço formado pelos operadores limitados o qual forma um espaço
normado B(X, Y). Em particular o conjunto dos funcionais lineares contínuos so-
bre um espaço normado X denotado por X ! forma um espaço de Banach.

4.1 Definições e exemplos


Definição 4.1 (Operador linear) Sejam X, Y dois espaços vectoriais sobre o mesmo
corpo K. Uma aplicação T : D(T ) ⊂ X −→ Y diz-se um operador linear se

1. D(T ) é um espaço vectorial e a imagem R(T ) ⊂ Y,

2. para quaisquer x, y ∈ D(T ) e escalares α, β ∈ K temos

T (αx + βy) = αT x + βT y.

Vamos usar a seguinte notação:

• D(T ) denota o domínio de T ,

99
• R(T ) denota o conjunto das imagens de T e

• N(T ) denota o núcleo de T , isto é, N(T ) = {x ∈ D(T )| T x = 0}.

Note que a propriedade 2. na definição de operador linear diz que T preserva


as duas operações do espaço vectorial.

Exemplo 4.2 Sejam X e Y dois espaços vectoriais dados.

Operador identidade O operador IX : X −→ X definido por I X x := x para


qualquer x ∈ X chama-se operador identidade. Temos D(I X ) = X e é claro
que IX é linear.

Operador nulo O operador 0 : X −→ Y, x &→ 0x := 0 para qualquer x ∈ X é


chamado operador nulo o qual é linear.

Operador diferenciação Seja X = P([0, 1]) o espaço vectorial dos polinómios


definidos em [0, 1] e o operador T : X −→ X,

T : X −→ X, p &→ (T p)(t) := p! (t),

onde p! (t) designa a derivada do polinómio p. O operador T é linear e,


atendendo a que a derivada de um polinómio ainda é um polinómio, então
R(T ) ⊂ X.

Operador integração Seja X = C([0, 1]) o espaço vectorial das funções reais
contínuas definidas em [0, 1]. Definimos
! t
T : C([0, 1]) −→ C([0, 1]), x &→ (T x)(t) := x(s)ds.
0

Como o integral é uma operação linear, então o operador T também é linear.

Operador multiplicação Seja ainda X = C([0, 1]) e consideremos o operador

T : C([0, 1]) −→ C([0, 1]), x &→ (T x)(t) := tx(t).

Este operador é usado na física quântica como sendo o operador posição.

100
Operador matriz Consideremos uma matriz real n × m A = (ai j ) i=1,...,n . Então
j=1,...,m
podemos definir um operador T como

T : Rm −→ Rn , x &→ T x := Ax.

É claro que T é linear porque a multiplicação por uma matriz é uma opera-
ção linear. Se T x = y = (y1 , . . . , yn ) e x = (x1 , . . . , xm ), então temos
    
 y1   a11 a12 . . . a1m   x1 
    
 y2   a21 a22 . . . a2m   x2 
 ..  =  .. .. .   . 
 .   . . . . . ..   .. 
    
yn an1 an2 . . . anm xm

onde
(
n
yi = ai j x j , i = 1, . . . m.
j=1

Operador integral No espaço C([0, 1]) consideremos o operador


! 1
(T x)(t) := K(t, s)x(s)ds,
0

onde K é uma função contínua definida em [0, 1]2 e chamada o núcleo do


operador integral T . É claro que T é um operador linear.

Teorema 4.3 (Imagem e núcleo) Seja T : X → Y um operador linear dado.


Então

1. o núcleo de T , N(T ), é um espaço vectorial,

2. a imagem de T , R(T ), é um espaço vectorial,

3. se dim D(T ) = n < ∞, então dim R(T ) ≤ n.

Em particular na prova do ponto 3. do teorema anterior é importante notar que


os operadores lineares preservam a dependência linear.

101
Exercícios
Exercício 4.1 Mostre o Teorema 4.3.

Exercício 4.2 Considere os operadores T i : R2 −→ R2 , i = 1, 2, 3 definidos por

T 1 (x, y) := (x, 0)
T 2 (x, y) := (y, x)
T 2 (x, y) := (αx, αy), α ∈ R.

1. Mostre que estes operadores são lineares.


2. Calcule D(T i ) e N(Ti ), i = 1, 2, 3.
3. Escreva os operadores T i , i = 1, 2, 3 usando matrizes 2 × 2.

4.2 Operadores lineares limitados e contínuos


Vamos agora analisar uma classe muito importante de operadores lineares, os ope-
radores lineares limitados.

Definição 4.4 (Operador limitado) Sejam X, Y espaços normados e T : D(T ) ⊂


X −→ Y um operador linear. Então T diz-se limitado se existe uma constante M
tal que para todos x ∈ D(T ) temos

|T x| ≤ M|x|. (4.1)

Note que, a presente definição de operador limitado difere da de função li-


mitada da análise, pois, uma função limitada é aquela cujo conjunto imagem é
limitado no caso dos operadores lineares só o operador nulo tem o conjunto ima-
gem limitado.
Qual será a menor constante M tal que (4.1) seja verdadeira para qualquer
x ∈ D(T )\{0}? Podemos deixar x = 0 ∈ D(T ) de forma, pois, T 0 = 0. Temos
|T x|
≤M
|x|
tomando o supremo em ambos os lados obtemos
|T x|
sup ≤M
x∈D(T )\{0} |x|

102
assim, este supremo é a constante mais pequena tal que (4.1) se verifica. Esta
constante é denotada por *T * e é chamada norma de T , isto é,
|T x|
*T * = sup
x∈D(T )\{0} |x|

Por definição se D(T ) = {0} pomos *T * = 0. Note que com M = *T * a desigual-


dade (4.1) dá lugar
|T x| ≤ *T * |x|
a qual será aplicada frequentemente no que se segue.

Lema 4.5 (Norma) Seja T um operador linear limitado.


1. Então a norma de T é dada por
*T * = sup{|T x| x ∈ D(T ), |x| = 1}. (4.2)

2. A aplicação *·* verifica as propriedades (N1)-(N3) de norma.


x
Prova. 1. Seja x ∈ D(T )\{0} e y := tal que |y| = 1. Como T é linear temos
|x|
)) * +))
|T x| ) x ))
*T * = sup = sup ))T ) = sup |T y|
x∈D(T )\{0} |x| x∈D(T )\{0} ) |x| ) y∈D(T )
|y|=1

pelo que (4.2) está mostrado.


2. (N1) Condição necessária. Suponhamos que *T * = 0 com vista a mostrar que
T = 0. Assim, de *T * = 0 resulta que T x = 0 para qualquer x ∈ D(T ), logo T = 0.
Condição suficiente. Se T = 0, então *T * = 0, pois *T * = supx∈D(T )\{0} |T|x|x| = 0.
(N2) Para qualquer α ∈ K temos
*αT * = sup{|αT x| x ∈ D(T ), |x| = 1}
= sup{|α||T x| x ∈ D(T ), |x| = 1}
= |α| sup{|T x| x ∈ D(T ), |x| = 1}
= |α| *T * .
(N3) Sejam T , U dois operadores limitados. Então temos
*T + U* = sup{|(T + U)x| x ∈ D(T ) ∩ D(U), |x| = 1}
≤ sup{|T x| + |U x| x ∈ D(T ) ∩ D(U), |x| = 1}
≤ sup{|T x| x ∈ D(T ), |x| = 1} + sup{|U x| x ∈ D(U), |x| = 1}
= *T * + *U* .

103
A interpretação geométrica do número *T * é a seguinte: *T * é o supremo da
deformação dos vectores x ∈ D(T ) tais que |x| = 1 pela acção de T .

Exemplo 4.6 Sejam X, Y espaços normados.

Operador identidade O operador IX é limitado e *I X * = 1, pois,

*IX * = sup{|IX x| x ∈ X, |x| = 1} = 1.

Operador nulo Por definição o operador nulo 0 é limitado e *0* = 0.

Operador diferenciação O operador de diferenciação

T : X −→ X, x &→ (T x)(t) := x! (t)

não é limitado. X = P([0, 1]) é o conjunto dos polinómios definidos em


[0, 1]. Com efeito, consideremos a sucessão de polinómios x n (t) := tn ,
n ∈ N0 . Temos

|xn | := max{|xn (t)|, t ∈ [0, 1]} = 1, ∀n ∈ N0

e então
|(T xn )(t)|
= n max{|tn−1 | t ∈ [0, 1]} = n.
|xn |
Assim, não existe M tal que para todos n ∈ N tenhamos
|(T xn )(t)|
≤M
|xn |
logo T não é limitado.

Operador integração Consideremos o operador


! t
T : C([0, 1]) −→ C([0, 1]), x &→ (T x)(t) := x(s)ds
0

104
é limitado e *T * = 1. De facto, por um lado temos
))! t ))
)) )
|T x| = max |(T x)(t)| = max ) x(s)ds))
t∈[0,1] t∈[0,1] ) 0 )
! t ! t
≤ max |x(s)|ds ≤ max max |x(s)|ds
t∈[0,1] 0 t∈[0,1] 0 s∈[0,1]
! t
= max |x(s)| max ds = max |x(s)| max t
s∈[0,1] t∈[0,1] 0 s∈[0,1] t∈[0,1]
= max |x(s)| = |x|.
s∈[0,1]

Assim, |T x| ≤ |x| pelo que tomado o supremo em ambos os lados nesta


desigualdade sobre todos os x ∈ C([0, 1]) com norma 1 obtemos
*T * = sup{|T x|, x ∈ C([0, 1]), |x| = 1} ≤ sup{|x|, x ∈ C([0, 1]), |x| = 1} = 1
pelo que *T * ≤ 1. Por outro lado, a aplicação x0 : [0, 1] −→ R, t &→ x0 (t) :=
1 é tal que x0 ∈ C([0, 1]), |x0 | = 1 e
))! t ))
) )
|T x0 | = max |(T x0 )(t)| = max )) ds)) = 1.
t∈[0,1] t∈[0,1] ) ) 0

Como 1 = |T x0 | ≤ *T * |x0 | = *T *, logo também *T * ≥ 1. Das duas desi-


gualdades concluímos que *T * = 1 e T é limitado.
Operador multiplicação Consideremos o operador de multiplicação
T : C([0, 1]) −→ C([0, 1]), x &→ (T x)(t) = tx(t).
Então T é limitado e *T * = 1. Temos
|T x| = |tx| = max |tx(t)| ≤ max |x(t)| = |x|
t∈[0,1] t∈[0,1]

pelo que passando ao supremo em ambos os lados sobre todos x ∈ C([0, 1])
com |x| = 1 obtemos
*T * ≤ 1.
Mas para x0 (t) = 1 temos |x0 | = 1, x0 ∈ C([0, 1]) e
|T x0 |
= max |(T x0 )(t)| = max |t| = 1.
|x0 | t∈[0,1] t∈[0,1]

Como
|T x0 |
*T * ≥ = 1,
|x0 |
então resulta *T * = 1.

105
Operador matriz Dada uma matriz real A = (ai j ) i=1,...,n e o operador
j=1,...,m

T : Rm −→ Rn , x &→ T x = Ax,

então T é limitado e *T * ≤ M, onde


(
n (
m
2
M := a2i j .
i=1 j=1

De facto, denotando T x = y = (y1 , . . . , yn ) temos


(
m
yi = ai j x j
j=1

logo
 m 2
(
n (
n (
 
|y|2 = |yi |2 =  ai j x j  .
 
i=1 i=1 j=1

Aplicando a desigualdade de Cauchy-Schwarz obtemos


(
n (
m (
m (
n (
m
2
|y| ≤ a2i j x2j = a2i j |x|2
i=1 j=1 j=1 i=1 j=1
2345
|x|2

e, assim
(
n (
m
2 2 2 2
|T x| ≤ M |x| , M = a2i j ,
i=1 j=1

logo |T x| ≤ M|x| de onde resulta *T * ≤ M.

Operador integral Dada a função contínua K : [0, 1] × [0, 1] −→ R defi-


nimos o operador
! 1
T : C([0, 1]) −→ C([0, 1]), x &→ (T x)(t) = K(t, s)x(s)ds.
0
61
Então T é limitado e *T * = maxt∈[0,1] 0
|K(t, s)|ds. De facto, temos

|x(t)| ≤ max |x(t)| = |x|,


t∈[0,1]

106
logo
! 1 ! 1
|T x| = max |(T x)(t)| ≤ max |K(t, s)x(s)|ds ≤ |x| max |K(t, s)|ds.
t∈[0,1] t∈[0,1] 0 t∈[0,1] 0

Passando ao supremo na desigualdade anterior sobre todos x ∈ C([0, 1])


com |x| = 1 obtemos
! 1
*T * = sup{|T x|, x ∈ C([0, 1]), |x| = 1} ≤ max |K(t, s)|ds,
t∈[0,1] 0

logo T é limitado. Note que, como K é contínua nas duas variáveis,


então |K(t, s)| ≤ k. É possível mostrar que
! 1
*T * = max |K(t, s)|ds.
t∈[0,1] 0

Teorema 4.7 Seja X um espaço normado de dimensão finita. Então todo o ope-
rador linear em X é limitado.
Prova. Seja {e1 , . . . , en } uma base em X de tal forma que se x ∈ X temos
(
n
x= xi ei .
i=1

Como T é um operador linear definido em X, então


(
n (
n
|T x| = |xi ||T ei | ≤ max |T ei | |xi |.
1≤i≤n
i=1 i=1

Aplicando o Lema 2.20 obtemos


)) ))
(
n
1 ))( n ) 1
|xi | ≤ )) xi ei ))) = |x|
i=1
C ) i=1 ) C

de tal forma que


1
|T x| ≤ M|x|, max |T ei |.
M :=
C 1≤i≤n
Daqui resulta que *T * ≤ M, logo T é limitado.

Vamos de seguida investigar a relação entre operadores lineares limitados e


operadores lineares contínuos.

107
Definição 4.8 (Operador contínuo) Sejam X, Y espaços normados e T : D(T ) ⊂
X −→ Y um operador linear dado. Então T é contínuo em x 0 ∈ D(T ) se para
qualquer ε > 0 existe δ > 0 tal que

∀x ∈ D(T ) |x − x0 | ≤ δ =⇒ |T x − T x0 | < ε.

T diz-se contínuo se for contínuo em todos os pontos x ∈ D(T ).

Teorema 4.9 Seja T : D(T ) ⊂ X −→ Y um operador linear entre espaços nor-


mados. Então

1. T é contínuo se e só se T é limitado.

2. Se T é contínuo num ponto, então é contínuo .

Prova. O caso T = 0 não tem interesse. Assim, supomos que T ! 0 pelo que
*T * ! 0.
1. Condição suficiente. Suponhamos que T é limitado com vista a mostrar que
T é contínuo. Seja ε > 0 dado e x0 ∈ D(T ) um elemento arbitrário. Escolhendo
δ = *Tε * e para qualquer x ∈ D(T ) tal que

|x − x0 | ≤ δ

temos
|T x − T x0 | = |T (x − x0 )| ≤ *T * |x − x0 | < *T * δ = ε.
Logo T é contínuo em x0 ; da arbitrariedade de x0 ∈ D(T ) resulta que T é contínuo.
Condição necessária. Suponhamos agora que T é contínuo com vista a mostrar
que T é limitado. Assim, para qualquer x0 ∈ D(T ) e qualquer ε > 0 existe δ > 0 e
para todo os x ∈ D(T ) com |x − x0 | < δ temos

|T x − T x0 | < ε.

Para y ! 0 em D(T ) definimos


δ δ
x := x0 + y ⇐⇒ x − x0 = y =⇒ |x − x0 | = δ.
|y| |y|
Logo )) * +))
) δ )) δ
|T x − T x0 | = |T (x − x0 )| = ))T y = |T y| < ε
) |y| )) |y|

108
ou ainda
|T y| ε
< .
|y| δ
Passando ao supremo em ambos os lados sobre todos os y ∈ D(T ) tal que |y| = 1
obtemos *T * < εδ , isto é, T é limitado.

2. Se T é contínuo num ponto, então pela segunda parte da prova de 1. T é


limitado, logo por 1. T é contínuo.

Corolário 4.10 Seja T : D(T ) ⊂ X −→ Y um operador linear limitado.

1. Se (xn )∞
n=1 ⊂ D(T ) é uma sucessão tal que xn −→ x, n → ∞ e x ∈ D(T ),
então T xn −→ T x.

2. O núcleo de T N(T ) é um espaço fechado.

Prova. 1. Como T é linear limitado, temos

|T xn − T x| = |T (xn − x)| ≤ *T * |xn − x| −→ 0, n → ∞.

2. Seja x ∈ N(T ) dado com vista a mostrar que x ∈ N(T ). Assim, existe uma
sucessão (xn )∞
n=1 ⊂ N(T ) tal que xn −→ x, n → ∞. Pela alínea anterior temos
T xn −→ T x. Como para cada n ∈ N temos T xn = 0, então T x = 0, logo x ∈ N(T ).

Definição 4.11 (Igualdade, restrição, extensão) 1. Dois operadores T 1 e T 2


dizem-se iguais, denotado T 1 = T 2 , se têm o mesmo domínio D(T 1 ) = D(T 2 )
e se T 1 x = T 2 x para qualquer x ∈ D(T 1 ) = D(T 2 ).

2. A restrição do operador T : D(T ) ⊂ X −→ Y a um subconjunto B ⊂ D(T ),


denotada por T | B , é o operador T |B : B −→ Y tal que T |B x = T x para
qualquer x ∈ B.

3. A extensão do operador T : D(T ) ⊂ X −→ Y a um conjunto M ⊃ D(T ),


denotada por T̃ , é o operador T̃ : M −→ Y tal que T̃ |D(T ) = T , isto é,
T̃ x = T x para qualquer x ∈ D(T ). Assim, T é a restrição de T̃ a D(T ).

109
Teorema 4.12 (Extensão linear limitada) Seja T : D(T ) ⊂ X −→ Y um ope-
rador linear limitado, sendo X um espaço normado e Y um espaço de Banach.
Então T admite uma extensão T̃ : D(T ) −→ Y, onde T̃ é linear limitado com
77 77
7T̃ 7 = *T * .

Prova. 1. Definição de T̃ . Seja x ∈ D(T ) dado, então existe uma sucessão


(xn )∞
n=1 ⊂ D(T ) tal que xn −→ x, n → ∞. Temos

|T xn − T xm | = |T (xn − xm )| ≤ *T * |xn − xm |

o que mostra o facto de (T xn )∞ n=1 ser uma sucessão de Cauchy em Y. Como Y é


completo, então existe y ∈ Y tal que T xn −→ y. Definimos T̃ x := y.
É claro que a definição de T̃ não depende da escolha da sucessão (xn )∞n=1 . De

facto, se (zn )n=1 é outra sucessão em D(T ) tal que zn −→ x, n → ∞, então

|T xn − T zn | ≤ *T * |xn − zn | ≤ *T * (|xn − x| + |zn − x|) −→ 0, n → ∞,

logo as sucessões (T xn )∞ ∞
n=1 e (T zn )n=1 têm o mesmo limite. Isto mostra que T̃ está
bem definido.

2. É claro que T̃ é uma extensão de T , pois, T̃ x = T x para qualquer x ∈ D(T ).

3. Norma de T̃ . Temos
|T xn | ≤ *T * |xn |
pelo que passando ao limite n → ∞, usando a continuidade da norma, obtemos

|T̃ x| ≤ *T * |x|.
7 7
Passando ao supremo sobre todos os x ∈ D(T ) tais que |x| = 1 obtemos 77T̃ 77 ≤ *T *.
Por outro lado, é claro que
77 77
7T̃ 7 = sup{|T̃ x|, x ∈ D(T ), |x| = 1} ≥ sup{|T x|, x ∈ D(T ), |x| = 1} = *T * .
7 7
Assim, temos 77T̃ 77 = *T *.

110
Exercícios
Exercício 4.3 (Operador multiplicação por uma função) Considere o espaço nor-
mado das funções contínuas C([0, 1]) e a ∈ C([0, 1]) um elemento dado. Defini-
mos T por

T : C([0, 1]) −→ C([0, 1]), x &→ (T x)(t) := a(t)x(t).

1. Mostre que T é linear.

2. Prove que T é limitado.

3. Calcule a norma de T .

Exercício 4.4 Mostre que o operador T definido por


8 z 9∞
∞ ∞ n
T : % (C) −→ % (C), z &→ T z :=
n n=1

é linear e limitado. Calcule a norma de T .

Exercício 4.5 Seja X = C([0, 1]) o espaço das funções contínuas e T i , i = 1, 2


definidos em X por
! 1
(T 1 x)(t) := et−s x(s)ds
0
! 1
(T 2 x)(t) := tn sm x(s)ds, n, m ∈ N.
0

Calcule *T 1 * e *T 2 *.

4.3 Espaço de operadores lineares


Nesta secção vamos investigar o conjunto formado pelos operadores lineares li-
mitados entre dois espaços normados B(X, Y) com o objectivo de mostrar que
B(X, Y) é ele mesmo também um espaço normado. Para tal precisamos introduzir
uma estrutura de espaço vectorial em B(X, Y). Sejam T, U ∈ B(X, Y) e α, β ∈ K
dados. Definimos

T + U : D(T ) ∩ D(U) −→ Y, x &→ (T + U)x := T x + U x.

111
αT : D(T ) −→ Y, x &→ (αT )x := αT x.
Com estas duas operações o conjunto B(X, Y) torna-se num espaço vectorial. O
elemento neutro para a adição é o operador nulo 0 do Exemplo 4.2. Por outro lado,
vimos no Lema 4.5 que a aplicação *·* possui as propriedades de uma norma, pelo
que o espaço vectorial B(X, Y) com esta norma *·* torna-se num espaço normado.
Mais interessante é saber quando é que B(X, Y) é um espaço de Banach, isto
é, um espaço normado completo. Surpreendentemente, a condição para que tal
possa acontecer não envolve X!

Teorema 4.13 (B(X, Y)-espaço de Banach) Se Y é um espaço de Banach, então


B(X, Y) é um espaço de Banach sendo que X é pelo menos um espaço normado.
Prova. Consideremos uma sucessão de Cauchy arbitrária (T n )∞ n=1 em B(X, Y) com
vista a mostrar que (T n )∞
n=1 converge para um operador T ∈ B(X, Y). Para qualquer
ε > 0 existe Nε tal que se n, m > Nε temos

*T n − T m * < ε.

Para qualquer x ∈ X e n, m > Nε obtemos

|T n x − T m x| ≤ *T n − T m * |x| < ε|x| (4.3)

de tal forma que se x ∈ X é um elemento fixo, então escolhendo ε̃ = ε|x| resulta


|T n x − T m x| < ε̃, pelo que (T n x)∞
n=1 é uma sucessão de Cauchy em Y. Como Y é
completo, então existe y ∈ Y tal que

T n x −→ y = T x, n → ∞.

Definimos T como

T : X −→ Y, x &→ T x := y = lim T n x.
n→∞

Vamos mostrar que T ∈ B(X, Y). É claro que T é linear, pois

T (αx + βy) = lim (T n (αx) + T n (βx) = αT x + βT y.


n→∞

Por outro lado, fazendo m → ∞ in (4.3) obtemos

|T n x − T x| ≤ ε|x|

112
de onde resulta *T n − T * ≤ ε, ou seja, T n − T é limitado. Finalmente, notamos que
T é a soma de dois operadores limitados, T = T n − (T n − T ) de onde resulta que T
é limitado porque B(X, Y) é um espaço vectorial. Temos ainda que

*T n − T * ≤ ε, ∀ε > 0, n > Nε ,

o que mostra a convergência T n −→ T .

4.4 Funcionais lineares e espaço dual


Um funcional é um operador cujo conjunto imagem está no corpo K. Assim, se X
é um espaço normado complexo, então um funcional sobre X é uma aplicação

f : X −→ C, x &→ f (x).

Os funcionais serão denotados por f, g, h e a imagem de x por intermédio de f


por f (x). Como K é um espaço normado completo, então um funcional também é
um operador. Entre todos os funcionais definidos sobre um espaço normado X os
lineares limitados serão considerados mais frequentemente.

Definição 4.14 (Funcional linear) Seja X um espaço normado sobre K e f :


D( f ) ⊂ X −→ K um operador dado.

1. Então f diz-se um funcional linear se D( f ) é um espaço vectorial e a apli-


cação f é linear.

2. Um funcional linear f diz-se limitado se existe M > 0 tal que para todos
x ∈ D( f ) temos
| f (x)| ≤ M|x|.

3. A norma do funcional linear limitado f é dada por

* f * := sup | f (x)| = sup{| f (x)| x ∈ D( f ) |x| = 1}.


x∈D( f )\{0}

Exemplo 4.15 No que se segue X denota um espaço normado sobre K.

113
Norma Consideremos a aplicação
| · | : X −→ R, x &→ |x|.
Então | · | é um funcional não linear, pois em geral temos
|x + y| ! |x| + |y|.

Integral definido Seja X = C([0, 1]) o espaço normado das funções contínuas.
Definimos ! 1
f : C([0, 1]) −→ R, x &→ f (x) := x(t)dt.
0
Então f é um funcional linear limitado com norma * f * = 1. Que f é linear
é claro e pela monotonia do integral temos
! 1 ! 1
| f (x)| ≤ |x(t)|dt ≤ max |x(t)| dt = max |x(t)| = |x|.
0 t∈[0,1] 0 t∈[0,1]

Tomando o supremo na desigualdade anterior sobre todos x ∈ C([0, 1]) com


|x| = 1, obtemos
* f * ≤ 1.
Escolhendo x0 (t) = 1, t ∈ [0, 1] temos |x0 | = 1 e f (x0 ) = 1
| f (x0 )| ≤ * f * |x0 | ⇐⇒ 1 ≤ * f * .
Das duas desigualdades resulta que * f * = 1.
Espaço C([0,1]) Seja t0 ∈ [0, 1] fixo e f a aplicação definida por
f : C([0, 1]) −→ R, x &→ f (x) := x(t0 ).
Então f é um funcional linear limitado. Na verdade, que f é linear resulta
da definição, pois
f (αx + βy) = (αx + βy)(t0 ) = αx(t0 ) + βy(t0 ) = α f (x) + β f (y).
Por outro lado
| f (x)| = |x(t0 )| ≤ max |x(t0 )| = |x|,
t∈[0,1]

logo * f * ≤ 1. Para x0 (t) = 1, ∀t ∈ [0, 1] temos |x0 | = 1 e f (x0 ) = 1, logo


| f (x0 )| ≤ * f * |x0 | ⇐⇒ 1 ≤ * f * .
Portanto, * f * = 1

114
Espaço %2 (C) Seja w ∈ %2 (C) uma sucessão fixa. Definimos um funcional f sobre
%2 (C) por

(
2
f : % (C) −→ C, z &→ f (z) := (z, w)%2 (C) = zi w̄i ,
i=1

sendo a série absolutamente convergente. Então f define um funcional li-


near limitado e * f * = |w|%2 (C) . A linearidade resulta do produto interno ser
linear na primeira variável. Pela desigualdade triangular generalizada e de
Cauchy-Schwarz temos
:
; :
;

( (∞ (∞
| f (z)| ≤ |zi ||wi | ≤ |zi |2 |wi |2 = |z|%2 (C) |w|%2 (C) < ∞,
i=1 i=1 i=1

logo a série é absolutamente convergente. Aplicando o supremo em ambos


os lado resulta
* f * ≤ |w|%2 (C) .
Quando z = w, temos

| f (w)| ≤ * f * |w|%2 (C) ⇐⇒ |w|2%2 (C) ≤ * f * |w|%2 (C) ⇐⇒ |w|%2 (C) ≤ * f *

pelo que * f * = |w|%2 (C) . Vamos ver que a situação deste exemplo é típica
para espaços de Hilbert.

O conjunto dos funcionais lineares sobre um espaço normado X forma um es-


paço vectorial denotado por X ∗ e chamado dual algébrico de X. As operações de
adição e multiplicação por um escalar são definidas da mesma forma como defi-
nimos estas operações para os operadores em B(X, Y), cf. Secção 4.3. Podemos
pensar outra vez no dual algébrico de X ∗ denotado por (X ∗ )∗ = X ∗∗ como o con-
juntos dos funcionais lineares sobre X ∗ e chamado o segundo dual algébrico de X.
Os elementos de X ∗∗ serão denotados por F, G, H, . . . Este espaço só tem interesse
porque existe uma relação entre X e X ∗∗ . De facto, para cada x ∈ X podemos
associar um elemento G x ∈ X ∗∗ da seguinte forma

G x : X ∗ −→ K, f &→ G x ( f ) := f (x).

É claro que G x é linear, pois

G x (α f + βg) = (α f + βg)(x) = α f (x) + βg(x) = αG x ( f ) + βG x (g)

115
pelo que G x ∈ X ∗∗ . A aplicação C que a cada x ∈ X associa G x ∈ X ∗∗ é linear e
chama-se injecção canónica. Mais precisamente,
C : X −→ X ∗∗ , x &→ C(x) : X ∗ −→ K, C(x)( f ) := G x ( f ) := f (x)
é linear, pois
C(αx + βy)( f ) = Gαx+βy ( f ) = f (αx + βy) = α f (x) + β f (y)
= αG x ( f ) + βGy ( f ) = αC(x)( f ) + βC(x)( f )
= α(C(x) + C(y))( f ).
Se C for sobrejectiva, e assim bijectiva, então X diz-se reflexivo algébrico. No
caso de dim X < ∞, então X é reflexivo algébrico.
Mais importante na prática é o espaço dos funcionais lineares limitados.

Definição 4.16 (Espaço dual X ! ) Seja X um espaço normado. Então o conjunto


dos funcionais lineares limitados sobre X, denotado por X ! , é um espaço normado
com norma *·* o qual é chamado o dual de X.
É claro que o espaço dual de um espaço normado X é um espaço de Banach,
cf. Teorema 4.13. O estudo mais detalhado dos espaço X ! será feito na cadeira de
Análise Funcional II. Por agora, vamos nos concentrar no caso em que X = H é
um espaço de Hilbert. Antes de mais, notamos que o produto interno define um
funcional linear limitado sobre H. De facto para u ∈ H fixo o funcional
f : H −→ K, x &→ f (x) := (x, u)
é linear e limitado com * f * = |u|. A linearidade é evidente e, pela desigualdade de
Cauchy-Schwarz, temos
| f (x)| ≤ |x||u|
de onde resulta que * f * ≤ |u|. Para x = u vem
| f (u)| ≤ * f * |u| ⇐⇒ |u|2 ≤ * f * |u| ⇐⇒ |u| ≤ * f * .
Portanto * f * = |u|.

Teorema 4.17 (Representação de Riesz) Seja f um funcional linear limitado so-


bre o espaço de Hilbert H. Então existe um único elemento u ∈ H tal que
f : H −→ K, x &→ f (x) = (x, u) (4.4)
e * f * = |u|.

116
Prova. Já vimos que * f * = |u| pelo que só falta determinar u de forma que (4.4)
seja verdadeiro. Se f = 0, então u = 0 e já está. Suponhamos que f ! 0 e por
conseguinte u ! 0. Por outro lado, para x ∈ N( f ) temos f (x) =(x, u) = 0 e então
u ⊥ N( f ). Como N( f ) é um subespaço fechado em H, cf. Corolário 4.10, então
pelo Teorema 3.17 H pode ser representado como

H = N( f ) ⊕ N( f )⊥ .

Como f ! 0, então N( f ) ! H, pelo que a igualdade anterior implica N( f ) ⊥ ! {0}.


Portanto existe x0 ! 0 em N( f )⊥ . Para qualquer x ∈ H definimos

z := f (x)x0 − f (x0 )x

de tal forma que f (z) = 0, ou seja z ∈ N( f ). Então temos

0 = (z, x0 ) = f (x)|x0 |2 − f (x0 )(x, x0 ).

Resolvendo em ordem a f (x) obtemos

f (x0 ) f (x0 )
f (x) = (x, x0 ) = (x, u), u := x0
|x0 |2 |x0 |2
e, assim, a representação (4.4) esta mostrada.
Finalmente vamos mostrar que u é único. Se existir um outro u ! ∈ H tal que

f (x) = (x, u) = (x, u! ) ⇐⇒ (x, u − u! ) = 0, ∀x ∈ H,

em particular para x = u − u! obtemos

|u − u! |2 = 0 ⇐⇒ u = u!

e, assim, u é único.

117
Exercícios
Exercício 4.6 Diga quais dos seguintes funcionais em C([0, 1]) são lineares limi-
tados. No caso de ser linear limitado calcule a sua norma.
! 1
f1 (x) := t1/2 x(t)dt,
0
* +
1
f2 (x) := x ,
2
! 1
f3 (x) := x(t) sin(t)dt,
0
! 1
f4 (x) := x(t2 )dt,
0
f5 (x) := max x(t).
t∈[0,1]

Exercício 4.7 Considere o espaço de Hilbert L2 ([0, 1]) e os funcionais


! 1
f1 (x) := t−1/3 x(t)dt,
0
! 1
f2 (x) := t1/2 x(t2 )dt,
0
! 1
f3 (x) := x(t) sin(t)dt.
0

Mostre se são lineares limitados ou não e calcule a sua norma.

Exercício 4.8 Seja X = %∞ (C) e considere os funcionais em X

f1 (z) := z1 ,
(∞
zi
f2 (z) := ,
i=1
2i
(∞
zi
f3 (z) := .
i=1
i

Calcule a norma dos funcionais lineares limitados.

118
Exercício 4.9 Mostre que o dual H ! de um espaço de Hilbert H é um espaço de
Hilbert com produto interno definido por

( fz , fw)H ! := (w, z),

onde fz : H −→ K, x &→ fz (x) = (x, z).

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