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REFLEXÕES ACERCA DAS BENZEDEIRAS E REZADEIRAS:

DESCOBRINDO O OFÍCIO

INTRODUÇÃO

Este presente trabalho está dedicado ao aprofundamento no que se refere às


benzedeiras ou rezadeiras. É necessário falar sobre tal assunto, haja vista que estas
mulheres estão presentes na sociedade desde os tempos antigos até a
contemporaneidade e apresentam sua importância nas ações em que são direcionadas a
executar. Pode-se também pensar o papel delas na construção ou na evidenciação de
uma religiosidade presente na sociedade brasileira. Para que o entendimento acerca
disso seja satisfatório, é preciso que não haja dúvida em relação aos aspectos mais
básicos, como, por exemplo, a definição de benzedeiras ou rezadeiras. Para Diniz e
Diniz,

“As rezadeiras, benzedeiras ou até mesmo curandeiras, são


mulheres que realizam as benzeduras em busca de curar o
individuo doente de alguma enfermidade e para executar esta
prática, elas acionam conhecimentos do catolicismo popular,
utilizando ‘súplicas’ e ‘rezas’, que tem o objetivo de restabelecer o
equilíbrio material ou físico e espiritual das pessoas que buscam a
sua ajuda. É interessante perceber que a prática da reza é bastante
realizada por mulheres, porém, também existem homens que
realizam esta prática” (SANTOS apud DINIZ; DINIZ, 2012, p.
01).

É importante esclarecer, da mesma forma, que os conhecimentos que são


executados pelas benzedeiras foram e são repassados, por anos na História, por
intermédio da tradição oral, como é a maioria dos conhecimentos de comunidades e
povos tradicionais. Com a maior democratização do acesso à Academia, há uma
divulgação e registro físico do que se descobre sobre tais saberes, porém, o que
predomina, ainda assim, é o repasse de forma oral.

1. A origem e o modo como se veem


Não se sabe, ao certo, a origem dessa função social de grande importância,
mas há registros de benzedeiras ou algo similar há séculos, quiçá milênios. É
imprescindível colocar que o seu instrumento principal é a fala, pois é pelo uso da
oração, da reza, que elas cumprem o objetivo de

“Tirar olho gordo, quebrante, cobreiro, dor de cabeça, dor de


dente, peito aberto, espinhela caída, desvirar vento virado, dor de
cabeça de sol, ziquezira, aguamento, espinhela caída, piriri, mau
olhado, estômago fraco, ardência nos olhos, distorcer nervo, cozer
tornozelo destroncado, unha rachada, fazer criança perder medo de
andar, tirar verruga, desatar nó nas tripas, fazer cabelo crescer,
tirar friagem, sentimento...” (SIUDA-AMBROZIAK, 2018, p.
133).

Esta última citação se refere a uma fala de uma benzedeira de Florianópolis,


a qual foi entrevistada para que a autora compusesse em seu artigo sobre este assunto.
Foram entrevistadas duas neste caso. Elas discorrem sobre a responsabilidade que
possuem e como deve ser lidada ação de benzer. Para as duas, é um dom divino que
deve ser lidado com responsabilidade. Não se aprende, apenas se recebe. Elas se veem
como instrumentos nas mãos de uma criatura divina, Deus, justificando o fato de que
elas não fazem nada, apenas são usadas como intercedentes (IDEM, 2018, p. 128).
É necessário que se tenha vocação para sê-la, a fim de que os
conhecimentos sejam repassados, visto que eles são direcionados para a pessoa que se
identificar e apresentar características próprias, em se tratando de perceber se ela seria
uma boa benzedeira. O texto coloca que ter uma boa memória também é um fator
positivo (IDEM, 2018, p. 128).
Outro ponto importante a ser dito é que, já que elas receberam um dom, um
presente destinado ao auxílio de outras pessoas, não é permitido que se utilizasse disso
para ganhar dinheiro. É algo divino que não deve ser capitalizado, pois a essência do
ofício está nas intenções sem ganância nem ambição, apenas no intuito de ajudar sem
julgar quem está necessitado. A partir disso, é possível diferenciar também dos
profissionais formais da área, que, muitas vezes, estão mais interessados no ganho de
salários do que em ajudar necessitados, por exemplo.

“As benzedeiras entendem que possuem o ‘dom’ para exercer seu


ofício como uma ‘missão’, um ‘serviço’ – algo que receberam de
graça para servir aos outros e que, portanto, não pode ser
comercializado. Por isso, atendem a todos que as procuram
indistintamente. O ofício do benzimento é uma realização pessoal,
pois as benzedeiras dizem gostar do que fazem, se sentem como
recebendo ‘força’ e ‘boas energias’. Talvez seja por isso que a
prática de benzer rompa com regras do mercado profissional de
saúde. As benzedeiras fazem cura de boa vontade e gratuitamente,
pensando na sua plena disponibilidade para atender aos pacientes”
(IDEM, 2018, p. 128).

Elas creem que não devem parar de benzer nunca, pois receberam algo
muito importante e o justo é que todos que queiram e acreditam possam ter acesso a
esse tipo de trabalho, de abordagem com o corpo e o espírito. Segundo as benzedeiras,
elas não devem pedir nada, mas se lhes for dado voluntariamente algo, podem aceitar de
bom grado. Desta forma, cria-se uma relação de gratidão por parte de quem foi ajudado
com quem o benzeu. E sua forma de gratidão não é apenas em dinheiro, apesar de ser
majoritariamente desse jeito, mas se dão galinhas, frutas, leites e muitos outros, várias
são as formas de agradecer a alguém.
Sobre as crenças, pode-se pensar que somente são participantes de religiões
de matrizes africanas que benzem, mas há um equívoco nisso. As duas senhoras
entrevistadas pela pesquisadora, por exemplo, são católicas e se orgulham, de fato,
disso. Quando benzem, oram ao Deus cristão e monoteísta, além de rogar aos santos
católicos para que ajam conforme o pedido da benzedeira.

2. As dificuldades encontradas

Com o avanço da medicina, mas, principalmente, das tecnologias, a


credibilidade destas frente à medicina local, aos saberes populares, os quais são
guardados e repassados com o cuidado milenar de preservação, está cada vez maior.
Como relata uma das senhoras, ela não consegue alguém para repassar o que sabe, pois
não há disposição para aprender por parte de uma das filhas, a escolhida, e uma das
netas que também foi escolhida para haver esse repasse. Se isso começar a acontecer em
maiores escalas, é possível que se perca no tempo, pois, como já foi dito, é um
conhecimento que segue a tradição oral, e não é escrita como a cultura formal,
preenchida nos livros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Levando isso em consideração, portanto, é preciso que haja um cuidado
maior em manter viva a existência da benzedeira, que participou sempre da história
social do país, influenciando o espírito e a religiosidade que rege o pensamento
brasileiro, desde a pequena comunidade até a metrópole. Devem-se haver buscas para
preservar, não só essa, mas toda a cultura oral que pode estar em perigo devido ao
desinteresse desencadeado pela modernidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DINIZ, E. E. C. S.; DINIZ, E. C. S. A arte de curar: saberes e práticas de rezadeiras e


benzedeiras no cuidar da saúde. Paraíba: Editora Realize, 2012.
SIUDA-AMBROZIAK, R. Benzedeiras em vias deextinção na Ilha da Magia. Caxias
do Sul: Revista Métis, 2018.

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