Você está na página 1de 6

INFLUÊNCIA DA RAZÃO Ca/P NA SÍNTESE DE

BIOCERÂMICAS DE FOSFATO CÁLCIO

ALBUQUERQUE, J. S. V., LOURENÇO, E. R. A., SALES, J. C., NOGUEIRA, R. E.


F. Q.
Universidade Federal do Ceará, Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais.
E-mail para contato: svalbuquerque@gmail.com

RESUMO – As biocerâmicas de fosfato de cálcio são biomateriais promissores


em aplicações biomédicas. Do ponto de vista da engenharia de materiais e de
tecidos, estas biocerâmicas se destacam por permitirem através de processos de
elaboração, a obtenção de biomateriais com microestrutura e microporosidade
semelhante à apatita óssea do esqueleto humano. Dentre as biocerâmicas de
fosfato de cálcio o fosfato tricálcio (TCP) são as mais empregadas em aplicações
clínicas. Esta pesquisa teve como objetivo comparar características superficiais de
apatitas sintetizadas sob mesmas condições exceto em sua razão molar. As
amostras foram caracterizadas por DRX, FTIR e BET. A difração de raios-X
identificou os picos característicos da fase β-Fosfato Tricálcio (β-TCP). Na FTIR
foram identificados os grupos funcionais fosfatos e água em todas as amostras. O
ensaio BET mostrou que para a amostra preparada com razão molar 1,67 a área
superficial foi 83 m2g-1, 74% maior do que para a amostra com razão molar 1,5
que apresentou área superficial de 47,80 m2g-1.

1. INTRODUÇÃO
As biocerâmicas de fosfato de cálcio são biomateriais promissores em aplicações
biomédicas, isto se deve as características mineralógicas, morfológicas, da microestrutura e
por apresentarem boa biocompatibilidade. Do ponto de vista da engenharia de materiais e de
tecidos, estas biocerâmicas se destacam por permitirem através de processos de elaboração, a
obtenção de biomateriais com microestrutura e microporosidade semelhante a da apatita óssea
do esqueleto humano (Camargo, et al., 2007). Dependendo dos métodos e reagentes utilizados
na obtenção dos materiais à base de fosfato de cálcio, observa-se uma grande variação de
comportamentos dos produtos obtidos, atribuída a diferenças em população e tipos de
defeitos cristalinos, área superficial, afinidade por materiais orgânicos encontrados no meio
fisiológico, etc. Dentre as biocerâmicas de fosfato de cálcio o fosfato tricálcio (TCP) são as
mais empregadas em aplicações clínicas. O fosfato tricálcio (TCP) é considerado um material
reabsorvível, que em contato com os fluidos corpóreos tende a se desintegrar em certas
condições de pH permitindo a sua substituição pelo tecido ósseo, sendo parcialmente
reabsorvido entre seis e quinze semanas após o implante (Lavernia e Shoenung, 1991, Lin et
al., 2007). O controle da quantidade relativa de fases durante o processo de produção de
biocerâmicas sintéticas permite a produção de materiais mais ou menos reabsorvíveis. A
síntese dos fosfatos via precipitação aquosa consiste na adição de grupos fosfatos a
suspensões que contenham íons cálcio, podendo partir de diferentes reagentes (Albuquerque
et al., 2004).
O objetivo deste trabalho foi comparar as características superficiais de apatitas
sintetizadas com razão Ca/P diferentes.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Produção dos Pós


Nesta pesquisa foram obtidas nanoparticulas de apatitas por precipitação em pH 8 com
razão molar 1,5 e 1,67 a partir das soluções de Ca(OH) 2, H3PO4 e CH3CHCO2HOH que foram
preparadas separadamente e deixadas sob agitação . NH4OH foi adicionado à solução para a
precipitação dos pós em pH 8. Os pós foram secos em estufa a 80 ºC por 24 horas e, em
seguida, desagregados em um almofariz de ágata. Em seguida as amostras foram sinterizadas
a 1200 °C por 2 horas a uma taxa de aquecimento de 5 ºC por minuto.

2.1. Caracterizações
As amostras foram caracterizadas por difração de raios X (DRX), realizadas em
difratômetro Rigaku (DMAXB) com tubo de cobre operando com voltagem de 40KV e uma
corrente de 40 mA. Os difratogramas foram obtidos varrendo a faixa de 20º - 60º e numa
velocidade de varredura de 0,5º por minuto. Na Espectroscopia de raios infravermelhos, os
espectros foram obtidos a 4 cm-1 como resolução e uma média de 128 varreduras, utilizando
um espectrômetro Nicolet 800 associado a uma célula MTech PAS. A câmara de amostra da
célula PAS foi evacuada com gás hélio e seca empregando-se percloreto de magnésio como
agente desumidificante. A faixa utilizada foi de 400 a 4000 cm-1. A área superficial específica
foi determinada adotando o método de adsorção gasosa (Quantachrome Instruments modelo
Autosorb-1C), utilizando gás N2 a 77K. de acordo com o método BET (Brunauer, Emmet,
Teller), conhecendo-se o valor da área superficial específica é possível estimar o tamanho
médio das partículas (DBET).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Difração de Raios-X (DRX)


Foram obtidos difratogramas de raios X das amostras precipitadas em pH 8 conforme
indicado na Figura 1. Os resultados de DRX serviram como apoio na identificação das fases
presentes nos pós de fosfatos de cálcio. Tal resultado realizado sobre os pós com razão Ca/P
1,5 e 1,67 revelaram em seu espectro a presença predominante da fase β- Fosfato Tricálcio (β-
TCP). Todos os picos foram analisados e corresponde aos encontrados na ficha cristalográfica
JCPDS – 070-2065.
Os pós precipitados em pH 8 se decompõem em -TCP. A decomposição dos pós em
valores mais baixos de pH indica que as apatitas assim produzidas não são hidroxiapatitas
estequiométricas. De fato, a literatura indica que hidroxiapatitas cálcio-deficientes e com
substituições por grupos carbonato apresentam menor estabilidade (Williams, 1999; Lin et al.
2007).
3500 1200

3000
CP  CP
1000
C a/P = 1,5
Ca/P = 1,6
2500
Intensidade (u.a)

800

Intensidade (u.a)

2000 
600
1500

400  
1000

   
200 
500          
       
0 0
20 30 40 50 60
20 30 40 50 60
2 graus) 2 graus)

Figura 1 – Difratogramas de raios X das apatitas sinterizadas a 1200ºC.

3.2 Espectroscopia de Infravermelho por Transformada de Fourier (FITIR)


A análise dos espectros na região do infravermelho é uma ferramenta importante para
uma avaliação qualitativa da presença de grupos inorgânicos (fosfatos) e também
complementa a análise de difração de raios X. Para verificar a eficácia do processo de
obtenção dos pós de fosfatos de cálcio identificaram-se as bandas características. A
Figura 2 mostra os resultados de espectroscopia de infravermelho das amostras precipitadas
em pH 8 não sinterizada. Esse fato concorda com os resultados de difração de raios X que
indica que as amostras sinterizadas em temperaturas de 800 ºC a partir de pós precipitados
apresentaram a presença da fase -TCP que é um fosfato de cálcio livre de hidroxila (OH-). As
amostras exibiram bandas alargadas, características da água, a 3425 cm-1 e 1595 cm-1,
atribuídas ao processo de precipitação aquosa.
80
80
70

70
H 2O
60 H 2O
H 2O
Transmitância (%)

Transm itância (% )
60 H 2O
50

50 3-
PO4 40
3-
PO 4
40 Fosfato de C‫ل‬lcio Fosfato de C‫ل‬lcio
30
pH 8 pH 8

30 Ca/P 1,50 Ca/P 1,67


20
3-
PO 4
3- PO 4
20 10
0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000 4500 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000 4500
-1 -1
nn m ero de onda (cm ) nn m ero de onda (cm )

Figura 2 – IVTF dos pós precipitados em pH 8 (não sinterizados).

3.3 BET
A área superficial especifica e o diâmetro médio do poro dos pós de fosfato de cálcio foi
determinado utilizando a técnica de adsorção de nitrogênio (BET) (Lacerda et al., 2006). A
partir dos resultados da análise de área superficial foi possível obter o tamanho médio das
partículas do material através da equação:

onde, é o diâmetro médio de partícula , é a densidade teórica e é a área


superficial (m2/g).
As isotermas de adsorção das duas amostras (Figura 3) são convexas, evidenciando
dificuldade de adsorção em baixas pressões relativas. O processo de dessorção apresenta um
caminho diferente, caracterizando o processo como uma histerese. Isto ocorre devido ao
processo de preenchimento por condensação capilar ser diferente do esvaziamento, que é uma
característica de materiais mesoporosos (Marsh e Reinoso, 2006; Rouquerol et al., 2013;
Auxilio et al., 2009), ou seja, que apresentam poros entre numa faixa de 2 a 50 nm. As duas
isotermas são classificadas, segundo a IUPAC, como sendo do tipo IV (Marsh e Reinoso,
2006).
300 300
A dsorç‫م‬o Adsorç‫م‬o
D essorç‫م‬o Dessorç‫م‬o
250 250
C a/P 1,50 Ca/P = 1,67
Q uantidade Adsorvida, m m ol/g

Q uantidade Adsorvida, m m ol/g


200 200

150 150

100 100

50 50

0 0
0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0

Press‫م‬o Relativa, p/p 0 p/p 0

Figura 3 – Isotermas de adsorção-dessorção a 77 K dos pós precipitados em pH 8.

A tabela 1 mostra os resultados obtidos na análise BET para área superficial e diâmetro
médio dos poros. Pode-se verificar que os pós sintetizados são considerados nanopartículas
com diâmetro médio das partículas inferior a 100 nm. O valor da área superficial específica
está relacionado com o diâmetro médio das partículas que compõe os fosfatos de cálcio.
Segundo Teixeira et al. (2001) quanto menor o tamanho das partículas, maior a área
superficial específica.

Tabela 1 - Resultados obtidos das análises por BET.


Amostra Área Superficial BET Diâmetro Médio das
(m2/g) Partículas (nm)
Ca/P-1,50 47,80 23,5
Ca/P-1,67 83,00 40,8

4. CONCLUSÃO
Os resultados de difração de raios x constataram os picos característicos do β-fosfato
tricálcico nas amostras. Com os resultados de infravermelho foi possível identificar os grupos
funcionais fosfatos e água nas amostras. O teste BET mostrou que para as amostras
preparadas com razão molar 1,67, a área de superfície específica foi de 83 m 2g-1, 74% maior
do que para a amostra com razão molar de 1,5 que apresentou a área de superfície de 47,80
m2g-1. Por outro lado, os diâmetros médios dos poros foram 23,5 nm e 40,8 nm,
respectivamente, mostrando que essas amostras contêm mesoporos. A existência de
mesoporos também foi observada pela presença de histerese nas isotermas de adsorção de N2 a
77 K, estas isotermas são o tipo V de acordo com a classificação IUPAC.
5. AGRADECIMENTOS
À Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciência de Materiais e a
UFC pela oportunidade de realização desta pesquisa. A Capes e o CNPQ, pelo apoio
financeiro.

6. REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, J. S. V.; NOGUEIRA, R. E. F. Q.; PINHEIRO DA SILVA, T. D.; LIMA,
D. O.; PRADO DA SILVA, M. H. Porous Triphasic Calcium Phosphate Bioceramics. Key
Engineering Materials, v. 254-256, pp. 1021-1024, 2004.

AUXILIO, A. R.; ANDREWS, P. C.; JUNK, P. C.; SPICCIA, L. The Adsorption Behaviour of
C.I. Acid Blue 9 onto Calcined Mg-Al Layered Double Hydroxides. Dyes and Pigments, v.
81, pp. 103–112, 2009.

CAMARGO, N. H.; SOARES, C.; GEMELLI, E., Elaboration and characterization of


nanostructured biocements for biomedical applications. Materials Research, v. 10, pp. 135 –
140, 2007.

LAVERNIA, C.; SHOENUNG, J. M. Calcium phosphate ceramics as bone substitutes, Amer.


Ceram. Soc. Bull. v.70, p. 95-100, 1991.

MARSCH, H.; REINOSO, F.R. Activated Carbon, 1st Edition, Elsevier Science, p. 554, 2006.

LACERDA, K. A.; LAMEIRAS, F. S.; SILVA, V. V. Síntese e caracterização de matrizes


porosas de hidroxiapatita para aplicação como fontes radioativas em braquiterapia. Rem: Rev.
Esc. Minas [online], v.59, n.2, pp.217-223, 2006.

LIN, K.; CHANG, J.; LU, J.; WU, W.; ZENG, Y. Properties of b-Ca3(PO4)2 bioceramics
prepared using nano-size powders, Ceram. Inter. v. 33, pp. 979–985, 2007.

ROUQUEROL, J.; ROUQUEROL, F.; LLEWELLYN, P.; MAURIN, G.; SING, K.S.W.
Adsorption by powders and porous solids: principles, methodology and applications, 2nd
Edition, Academic Press, p 646, 2013.

TEIXEIRA, V. G.; COUTINHO, F. M. B.; GOMES, A. S. Principais métodos de


caracterização da porosidade de resinas à base de divinilbenzeno. Química Nova. v. 24, n.6, p.
808-818, 2001.

WILLIAMS, D. F. The Williams Dictionary Of Biomaterials, Liverpool, UK, Liverpool


University Ptress, 1999.

Você também pode gostar