e a autoatenção às enfermidades entre os índios Munduruku do Amazonas, Brasil. Cosmology and Intermedicality: the religious field and illnesses self-care among Munduruku indians of the Amazon, Brazil.
Cosmología e Intermedicalidade: el campo religioso
y la autoatención de los padecimientos de los indios Munduruku del Amazonas
Daniel Scopel1 biomedicina. Os dados levantados apontam
Raquel Paiva Dias-Scopel2 que essas redes de relações sociais projetam-se Flávio Braune Wiik3 para além dos limites da terra indígena, para espaços rurais e urbanos, e frequentemente RESUMO estabelecem diálogos interétnicos. Os itinerários terapêuticos acompanhados indicam Este artigo fundamenta-se em uma etnografia a heterogeneidade das práticas de saúde sobre práticas de saúde na aldeia Kwatá, desenvolvidas pelos Munduruku com destaque dos Índios Munduruku, localizados no Rio à autoatenção, à atuação política e à inserção Canumã, no município de Borba, Amazonas, econômica no cenário local e regional. Brasil. Essas práticas de saúde extrapolam o circuito biomédico de atenção e abrangem Palavras-chave: Atenção à Saúde, redes de atores sociais que podem ser descritos Xamanismo, Índios Sul-Americanos, como participantes de um “campo religioso” Antropologia, Religião e Medicina. de atenção às enfermidades. Verificou-se que o papel da autoatenção nos processos de saúde e ABSTRACT doença é fundamental para a constituição desse campo, no qual se destacam forças convergentes This paper is grounded on an ethnography e antagônicas do xamanismo, do cristianismo, about health practices of the Munduruku da umbanda, do espiritismo kardecista e da Indians in Canumã River, Borba, Amazonas 1 Doutorando na Universidade Federal de Santa Cata- State, Brazil. These practices go beyond the rina, Programa de Pós-Graduação em Antropologia So- biomedical health care services. They comprise cial, Brasil networks of social actors as participants in a 2 Pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz, Instituto “religious field” of illnesses care. We have Leônidas e Maria Deane, Manaus, Brasil e doutoranda identified that the role of self-care in health na Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de and illnesses processes is fundamental to the Pós-Graduação em Antropologia Social, Brasil. constitution of this field, which merge opposing 3 Professor Doutor em Antropologia no Departamento and converging forces, from shamanism, e Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina, Brasil. christianism, Afro-Brazilian umbanda and
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Kardec spiritualism to biomedicine. The No presente artigo analisamos relações e data collection has indicated that these social redes sociais de apoio mútuo e cuidados a partir networks go beyond the limits of Munduruku’s das práticas de autoatenção às enfermidades territory boundaries, they include both rural and entre os Índios Munduruku do Amazonas. Os urban spaces, and often respond to establishing índios Munduruku, cuja língua pertence ao interethnic dialogues. They further indicate the tronco Tupi, são numerosos e habitam diversas heterogeneity of therapeutic health practices terras indígenas situadas nos estados do Pará, developed by the Munduruku, specially, as a Mato Grosso e Amazonas. Cada uma dessas way of their political and economic interactions terras abriga uma parcela dos Munduruku em in both local and regional levels. situação sociocultural específica. Na Terra Indígena Kwatá Laranjal, no município de Key words: Health Care, Shamanism, South Borba (AM), são cerca de 2.500 indígenas American Indians, Anthropology, Religion and distribuídos em 33 aldeias. Todos falam Medicine português. O Rio Canumã, principal rio da Terra Indígena Kwatá-Laranjal, situa-se na RESUMEN área de abrangência do Baixo Madeira, uma área caracterizada pela topografia plana e pela Este artículo se basa en una etnografía de las presença de múltiplos rios, muito suscetíveis prácticas de salud de los indios Munduruku del às variações de nível durante as cheias e as Río Canumã en el municipio de Borba, Estado vazantes. del Amazonas, Brasil. Estas prácticas van más allá de la asistencia sanitaria de la biomedicina. O principal objetivo da pesquisa etnográfica Estas prácticas comprenden las redes de foi acompanhar e observar práticas de actores sociales que pueden ser descritos como autoatenção à saúde entre os indígenas no participantes en un “campo religioso” de la seu cotidiano. Em diversas viagens à Terra atención a las enfermedades. Se encontró que Indígena, entre 2007 e 2011, que totalizaram el papel de autoatención en los procesos de cerca de oito meses de período de campo, foram salud y la enfermedad es fundamental para la utilizadas diferentes técnicas de pesquisa, constitución de este campo, en el que destacan principalmente: observação participante com las fuerzas del chamanismo, del cristianismo, anotações em diário, entrevistas abertas e de la santería afro-brasileña o umbanda, del semiestruturadas, registro de narrativas e espiritualismo karcedicista y de la biomedicina. levantamento de genealogias. Los datos recogidos indican que estas redes sociales sobresalen más allá de los límites de No que tange à conceitualização do sus tierras indígenas para espacios rurales y termo autoatenção, seguimos o conceito urbanos y, a menudo, establecen un diálogo sugerido por Eduardo Menéndez 1, pelo qual interétnico. Las trayectorias terapéuticas a autoatenção refere-se às atividades que a indican la heterogeneidad de las prácticas de população utiliza “para diagnosticar, explicar, salud desarrolladas por los Munduruku y sobre atender, controlar, aliviar, aguentar, curar, todo, la acción política y económica en los solucionar ou prevenir os processos que niveles local y regional. afetam sua saúde” 1. Essas atividades, em um sentido restrito de autoatenção, caracterizam- Palabras clave: Atención a la Salud, se pela intencionalidade dos atores sociais Chamanismo, Indígenas Sudamericanos, frente aos processos de saúde e doença. Todas Amerindios, Antropología, Religión y as atividades de autoatenção situam-se de Medicina. maneira relativamente autônoma ao trabalho de especialistas ou profissionais em saúde, Introdução, Metodologia e Abordagens uma vez que a autoatenção é forma primeira Conceituais. de atenção, frequentemente, no âmbito da família. É também no nível da autoatenção que
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são tomadas decisões sobre como lidar com teórico-metodológica, mas não deve ser os casos mais graves e sobre quais recursos e considerada como uma separação rígida. Cabe quais especialistas devem ser consultados. ressaltar que não é objetivo do presente artigo debater sobre as fronteiras de tal separação. Para Desse modo, focalizar as práticas de uma discussão mais aprofundada sobre saberes autoatenção permitiu-nos a identificação de senso comum e saberes sistematizados, da multiplicidade de formas de atenção às recomendamos leituras complementares dos enfermidades e dos espaços de intermedicalidade autores Clifford Geertz 3 e Allan Young 4. percorridos pelos indígenas da aldeia Kwatá. Assim, a autoatenção é uma das várias formas Metodologicamente, focalizar nas práticas de atenção pelas quais os atores sociais buscam de autoatenção requer que a pesquisa seja intervenção e minimização dos efeitos danosos iniciada com os não especialistas isto é: no vividos frente às enfermidades, e é coexistente âmbito das práticas articuladas pelo grupo a outras formas, tais como a: biomedicina, familiar no seu cotidiano, para com isso seguir medicinas “populares” e “tradicionais”, grupos o sentido do fluxo das ações nas redes sociais de autoajuda, etc. de apoio e cuidados estabelecidos pelas ações e decisões dos sujeitos nesse nível da atenção. Por espaço de intermedicalidade 2 Segundo Menéndez 1, consideramos o campo de atuação e de forças produzido pelos diversos atores sociais, do En términos metodológicos iniciamos qual emergem saberes “híbridos” voltados ao la descripción a través de los sujetos y los processo de saúde, doença e atenção, ou seja, um espaço demarcado por negociações entre atores conjuntos sociales porque a partir de los diversos. A relação entre intermedicalidade mismos, especialmente de la trayectoria de la e autoatenção ocorre na medida em que esta, “carrera del enfermo” o “carrera del paciente” em sentido estrito, por ser caracterizada podemos identificar todas o, por lo menos, por uma intencionalidade específica, tem a capacidade de articular diferentes formas de la mayoría de las formas de atención que atenção. Ao partir do nível da autoatenção, e intervienen en un contexto determinado, lo não dos especialistas, é possível destacar as cual sería difícil de obtener –por muy diversas articulações práticas que os sujeitos fazem de razones – si partimos inicialmente de los diferentes formas de atenção à saúde, ou seja, a atualização pragmática de “sistemas” ou curadores. “modelos” diversos e até mesmo antagônicos caso fossem analisados a partir da posição Seguir tal princípio exigiu-nos residir em estratégica de especialistas nos processos de um segmento residencial da aldeia para, a saúde e doença. partir dali, “mapear” as diferentes formas de atenção à saúde articuladas pelos sujeitos No que tange à diferença entre conhecimento engajados em processos de saúde e doença. leigo e conhecimento profissional, considerou- Também nos permitiu observar que, muitas se que ela foi importante metodologicamente vezes, os próprios especialistas atuam no para guiar nossa pesquisa etnográfica, com nível da autoatenção, podendo consultar a finalidade de driblar os efeitos de uma e buscar tratamento para si com outros descrição que ressalta apenas antagonismos e especialistas, o que sugere que a diferença concorrência entre especialistas de diferentes entre leigo e profissional não é uma diferença formas de atenção como, por exemplo, os categórica absoluta. É importante lembrar que antagonismos frequentemente originados o papel social de cada indivíduo pode variar pelas tendências eurocêntricas da biomedicina. dependendo da situação ou contexto da ação A separação entre leigos e profissionais, ou e, também, que a legitimidade em considerar- especialistas, é importante para a orientação se ou ser considerado um especialista em
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saúde pode não ser matéria de unanimidade indígenas, “caboclos” e “brancos”. No cenário nos grupos sociais. Essa característica político e econômico colonial, os Munduruku relacional é, para nós, constitutiva dos espaços desempenharam importante papel. Eram de intermedicalidade, o qual evidencia a temidos, por outros povos indígenas, como heterogeneidade e o dinamismo dos atores e caçadores de cabeças e, pelo colonizador, práticas sociais e culturais em processos de pela sua força bélica. Já no século XIX, saúde e doença e o papel decisivo da autoatenção começaram a se inserir na economia global, nesses processos. Consideramos a autoatenção primeiro como produtores de farinha, depois como um processo estruturador de relações como seringueiros. Nesse período, foi forte sociais e, portanto, de diferenças entre atores. a investida missionária católica, por meio de E esse processo faz parte das experiências missões jesuítas e franciscanas, para convertê- de alteridade dos atores sociais, pela qual los. Ao mesmo tempo, o grupo expandiu sua “os coletivos constroem e comunicam a sua área de ocupação em direção ao norte, para as identidade tanto interna quanto externamente, áreas mais planas e ricas em recursos naturais. legitimam suas práticas e políticas estratégicas, Essa expansão em direção ao Baixo Tapajós, sejam elas voltadas para a aliança ou seu oposto” ao Rio Madeira e ao Rio Canumã, segundo 5 . Essas diferenças são constitutivas de espaços Murphy 6,7, produzira uma significativa de intermedicalidades, que no caso do campo mudança nos padrões culturais e na organização religioso Munduruku, articulam-se forças social tradicionais por conta de um incremento convergentes e antagônicas do xamanismo, do das relações comerciais entre brancos e índios. cristianismo, da umbanda, do kardecismo e da biomedicina1. Para exemplos de apropriação A partir do século XIX, o grupo que ritual de elementos da biomedicina realizada permaneceu no Rio Canumã adotou uma por xamãs no Peru e Brasil, recomendamos a posição de vanguarda no desejo de conhecer, leitura de Greene 2 e Scopel 6. absorver e se apropriar das inovações inauguradas com as relações interétnicas Argumentaremos que essa intermedicalidade com os pariwat, especialmente o consumo de é uma premissa da cosmologia Munduruku, a mercadorias e a abertura para a possibilidade qual prevê relações entre diferentes agentes e de casamentos com “civilizados”. planos, como no caso da relação dos curadores Esclarecemos que o termo pariwat designa com seus espíritos aliados, os quais são também os não Munduruku, especificadamente, os curadores em seus mundos de origem. Esse “brancos” ou “civilizados” 7. O distanciamento argumento abarca também a feitiçaria, que está com o grupo do Tapajós, inclusive, propiciou imbricada nas noções de saúde e doença nativas, distinções linguísticas reconhecidas atualmente mas como rede de reciprocidades negativas pelos Munduruku do Canumã e na lenta adoção desse campo cosmopolítico. Por abranger uma do português no cotidiano. Apesar desse dimensão política e cosmológica, a articulação distanciamento, os Munduruku do Canumã prática de saberes em processos de saúde e continuaram recebendo sucessivas migrações doença que se promove no nível de autoatenção de índios do Alto Tapajós, movimento de produz diálogos intra e interétnicos, os quais migração que enfraqueceu ao longo do século atualizam constantemente esses saberes. XX.
História de contato, transformações A adoção de práticas e relações consideradas
socioculturais e considerações etnológicas “civilizadas”, em especial as relações de atuais sobre os Munduruku do Amazonas. compadrio e adoção de nomes cristãos foram estimuladas pela Igreja Católica. Porém, Segundo abordagens etnológicas clássicas, segundo Murphy7, o trabalho missionário não a história dos Munduruku configura-se como foi determinante no processo de mudança social uma pluralidade de situações, um intenso pelo qual o grupo passou. Mais importantes, processo de trocas com outros grupos parecem ter sido as motivações próprias
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dos Munduruku em apropriar-se dos bens do Instituto Lingüístico de Verão (Summer produzidos pelo modelo econômico capitalista Institute of Linguistics - SIL), dos Estados à cargo da sociedade nacional em seu entorno, Unidos, interessadas em traduzir a bíblia assim como fruto de relações econômicas produzidas localmente pela inserção do grupo para o Munduruku, que se iniciaram cultos neste tipo de economia de mercado, seja pela evangélicos protestantes. A conversão da produção de excedentes de farinha e castanha esposa do cacique da época, que segue trocados com os regatões e pelo sistema de como principal líder da “sua igreja”, foi aviamento que caracterizou o ciclo da borracha na Amazônia 7,8. Entretanto, pelo menos no caso fundamental para a manutenção de uma igreja dos festejos católicos consagrados aos santos, protestante na aldeia até os dias de hoje. O festas que seguem o modelo das “comunidades início de cultos protestantes não implicou em amazônicas” descritas por Wagley 9 e por antagonismo com os índios católicos. Pelo Galvão 10, o interesse Munduruku foi sempre evidente 7. Conforme pudemos observar, ainda contrário, há um constante trânsito entre as hoje, essas festas acontecem em vários meses duas igrejas cristãs que são consideradas do ano nas aldeias do Rio Canumã e constituem mais como parte constitutiva da aldeia do que importante motivação para os jovens no como representações de grandes instituições encontro de seus futuros cônjuges. Quando os Munduruku casados são questionados sobre religiosas. Isso é interessante, uma vez que o como conheceram seus parceiros a resposta é ideal de desenvolvimento e organização do quase sempre a de que se conheceram nessas espaço físico da aldeia Kwatá é baseado na festas. apropriação Munduruku dos elementos do processo de urbanização dessa aldeia, como Mesmo com as mudanças ocorridas e a construção de uma rua pavimentada e uma percebidas pelos Munduruku no conjunto de praça, por volta de 2008, e a eletrificação das ritos e celebrações ao longo da sua história casas em 2010. Vale a pena esclarecer que não de contato com o colonizador e trabalho há automóveis na aldeia e o acesso até ela é feito missionário católico, a visão de mundo, apenas pelo rio Canumã. Com a eletrificação ethos e cosmologia xamânicas continuaram das casas, a aldeia conquistou uma estrada de fundamentais para a experiência e vida social acesso ao rio Madeira com 13 quilômetros, indígena. Murphy 11 já havia apontado o porém não há trânsito de veículos nela. desaparecimento de certos ritos e celebrações ligados à guerra e à caça, mas foi enfático em Essa organização do espaço da aldeia integra destacar o papel dos xamãs na cura de doenças. várias benfeitorias, além das igrejas, escolas, Essa prática continua central para a vida na posto de saúde, posto da Fundação Nacional aldeia, mesmo com o aumento da presença do Índio - FUNAI, quadra de esportes, caixa do serviço oficial biomédico de saúde e com d’água, palco de eventos, etc. A organização as mudanças, inovações e diversificação de espacial da aldeia sugere que, idealmente, estilos das práticas dos curadores indígenas. os Munduruku fazem uma previsão para “conquistar” ou “apropriar” cada vez mais a Sobre a atuação do cristianismo protestante, diversidade de “recursos” que a relação com os pelo menos na Aldeia Kwatá, a maior aldeia “brancos” possibilita. O espaço físico da Aldeia do rio Canumã, só foi a partir da década Kwatá configura-se inspirado nas cidades de 1970, com a presença de missionárias
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vizinhas, como Nova Olinda do Norte, Borba e terra Munduruku, não conta com um aparelho Manaus. Nesse cenário, tanto o posto de saúde de ultrassom, ainda que as mulheres indígenas quanto as igrejas e demais construções fazem tenham que compulsoriamente realizar parte da constituição da aldeia e preenchem o consultas rotineiras no programa de pré-natal ideal Munduruku de melhoria e crescimento. para que as famílias possam obter recursos em Esse processo parece ser uma contrapartida dinheiro de programas assistenciais. Munduruku ao processo colonial, nos quais as forças políticas do cristianismo e da O processo colonialista e de imposição da biomedicina são “assimiladas” pela sociedade biomedicina como modelo médico hegemônico Munduruku. Esse trânsito livre pelas igrejas e a tem graves implicações sobre a saúde indígena, abertura para o modelo urbanístico das cidades contudo, ressaltamos que os Munduruku pariwat indica a influência importante do ethos não são “passivos” nesse processo. A rua Munduruku na emergência de espaços de pavimentada que citamos acima, por exemplo, intermedicalidade, como um princípio que rege foi fruto de intensa reivindicação dos indígenas a relação dos Munduruku com a alteridade. Ao junto à prefeitura e além de representar para mesmo tempo, esses modelos cosmológicos eles um passo na “urbanização” da aldeia é difundidos pelo colonialismo fundamentam a considerada como uma benfeitoria que veio expansão do modelo biomédico hegemônico. trazer conforto aos Munduruku, pois as pessoas podem passear sem andar na lama durante Greene2, apoiando-se em diversos autores a estação chuvosa. Mesmo as consultas das críticos do colonialismo, destaca que a gestantes são consideradas importantes para a biomedicina teve um papel de cumplicidade manutenção de sua saúde individual e coletiva, na expansão do imperialismo europeu desde ainda que os indígenas tenham consciência da o início. O processo histórico das “reduções”, falta de equipamentos básicos nos serviços de que iniciou o surgimento de cidades na saúde para essas consultas. Os Munduruku do Amazônia, fundamentou-se na criação de Amazonas também tem um papel ativo nas núcleos urbanos cuja ordenação espelha-se na reuniões dos Conselhos Local e Distrital de ideologia dos colonizadores. Assim, igrejas e Saúde Indígena, através dos quais discutem hospitais surgiram lado a lado como elementos e avaliam planos de aplicação de recursos centrais fisicamente e socialmente, servindo financeiros para a atuação de equipes do de monumentos da própria ordem colonialista Ministério da Saúde em sua terra indígena. que se impunha. Esse processo se estende até Seguindo a Política Nacional de Atenção a os dias atuais, embora assuma renovas versões. Saúde dos Povos Indígenas, até o ano de 2010, Greene destaca que há ainda uma ampla essas equipes eram geridas pela Fundação difusão da ideologia biomédica, a qual alcança Nacional de Saúde A atuação dessa fundação até mesmo o interior da Amazônia, ao mesmo foi marcada por graves problemas operacionais tempo em que os recursos biomédicos tendem e de gestão. Em razão de constantes falhas a ser centralizados nas grandes cidades2. operacionais, os Munduruku estabeleceram a Mesmo na atualidade, por exemplo, a cidade estratégia de ocupar, na medida do possível, de Nova Olinda do Norte, mais próxima da cargos na estrutura organizacional das equipes
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de saúde, como por exemplo, motorista de usavam a estratégia de migrar para evitar lancha, técnico administrativo e Agentes tais acusações de feitiçaria. O “feiticeiro”, Indígenas de Saúde (AIS), o que lhes garante ibokaipatxat, tem o poder de causar doenças uma operacionalização mínima nos casos de e morte, e não de curá-las. Nossos dados ausência total de equipes do serviço de saúde na etnográficos apontam ainda para o fato de que, aldeia, eficaz, ao menos, em efetuar a remoção para os Munduruku, idealmente, a habilidade de pacientes até a cidade mais próxima. para ser um especialista é algo de “nascença”, ou “de dom”, e não é “aprendida”. O feiticeiro é um Nesse sentido, no longo processo histórico “aprendista”, que leu em “livros” e não possui de relações interétnicas, os Munduruku do Rio conhecimento de “dom” ou de “nascença”. Canumã assumiram uma posição de vanguarda Por sua vez, o curador volta sua ação para a na ocupação do território e no desejo de se cura de doenças e possui o conhecimento apropriar dos recursos advindos das relações que é necessário para sua atuação desde o com os pariwat. E é essa posição de vanguarda nascimento, portanto, a especialidade não se que caracterizou e continua marcando uma das trata de uma aquisição de habilidade durante especificidades dos Munduruku do Amazonas. o curso da vida. É uma contradição perguntar “com quem você aprendeu” a um curador, Cosmologia e atuação de curadores pois a resposta culturalmente padronizada é: “com ninguém”. Contudo, há exceções, já que A Cosmologia Munduruku prevê a atuação frequentemente se supõe que o papel de curador de especialistas em cura, o wamuat, ou curador e de feiticeiro pode ser realizado pela mesma (anotamos que na menção destes termos, pessoa, ou seja, o papel do xamã é considerado seguimos a fonética que registramos com ambíguo pelo poder que tem. Qualquer pessoa interlocutores do Rio Canumã ou a grafia é potencialmente um “feiticeiro”, inclusive um sugerida por Murphy). Este autor 11 descreveu curador, ou pode realizar um ato de feitiçaria, essa cosmologia como xamânica e fixou especialmente por vingança. A relação entre o sua análise nos rituais, celebrações e mitos “curador” e o feiticeiro é de agressão. do grupo. Ele também destacou o papel do xamã na cura de doenças. Contudo, Murphy Vários interlocutores nos narraram sobre o descreveu a figura do xamã genericamente e assassinato de um curador. A história começa não mostrou diferenças entre os especialistas com a morte de uma mulher com tuberculose xamãs. Inclusive, certo tom de pessimismo que, segundo rumores, fora vítima de um perpassa a obra de Murphy, sugerindo que os curador / feiticeiro da etnia Mura. O marido xamãs Munduruku desapareceriam, seja pela fez tocaia ao suposto feiticeiro e o matou perda de importância ritual, seja pelo perigo de com um tiro. Os parentes do curador morto serem acusados de feitiçaria e mortos. Como exigiram a prisão do assassino. O marido foi veremos, há diversas especialidades entre preso e passou muitos anos na cadeia na cidade os curadores Munduruku que habitam no rio de Borba. A história é lembrada como tragédia Canumã. causada por “fuxicos” e teve impactos na atuação dos curadores da terra indígena, pois a Murphy também notou que muitos xamãs
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morte do suposto feiticeiro não foi legitimada afastamento de espíritos maus e que alteram as socialmente, já que o conflito envolveu a força qualidades quente / frio, seco / úmido, “corpo policial. No passado, a atuação de feiticeiros aberto” / “corpo fechado”. Contudo, isso não era punida pelos indígenas com morte e a é o mesmo que supor que todos tenham igual acusação de feitiçaria se constituía em uma legitimidade como especialistas. O fato de ter forma de atuação política e de resolução de ou não o dom é importante, e isso se reflete conflitos 7,11. em uma hierarquia de saberes, habilidades e prestígio. Esse prestígio implica uma divisão Ainda hoje, o feiticeiro é considerado um social do trabalho de cura, que atribui maior agente do mal e o contrafeitiço ou vingança é força àqueles que são capazes de curar doenças ação esperada, inclusive, a retirada do feitiço consideradas mais graves. Isso reflete um grau do corpo do doente é uma das principais de especialização, e também legitimidade, técnicas de cura, e espera-se que o feitiço seja o que leva os Munduruku a expressar uma reenviado ao feiticeiro, matando-o. Outras tipologia esquemática de especialistas em seu técnicas importantes referem-se ao afastamento discurso, conforme listamos a seguir: de “espíritos maus” e não implicam em retirada de feitiços do corpo do doente. Como vingança, a) Pegadores de dismintidura e rasgadura. o contrafeitiço pode ser feito por qualquer um É considerado “mecânico dos ossos” e que tenha o conhecimento de como vingar-se, músculos, trabalha com massagens e fricções ou é encomendado ao curador, ou este ensina geralmente utilizando “banhas” de animais à pessoa que está sofrendo com o feitiço como (tartaruga, cobras, tamanduá, entre outros). fazer sua vingança. Uma interlocutora relatou Várias pessoas na aldeia possuem esse dom, sobre a morte de seu pai, vingada por ela mas apenas algumas são reconhecidas por mesma com um contrafeitiço realizado com “pegar bem”. Até as crianças podem utilizar as a camisa do seu pai, espinhos de tucumã e técnicas uma nas outras. Já a técnica chamada tucupi sobre o túmulo dele. O feiticeiro era o de “costurar” é utilizada para juntar músculos próprio tio, que morreu pelo ato de vingança considerados “rasgados” por esforço físico da sobrinha. O feitiço de vingança, nesse caso, ou acidentes, o que é feito através da técnica fora ensinado por uma curadora. Em relação simpática de costurar com pano, agulha e linha, aos curadores entrevistados que moram na e requer benzimento sobre a área afetada. terra indígena, todos negaram realizar feitiços, ainda que tivessem poder para isso, afirmando b) Parteiras. Além de acompanhar a que se trata de um caminho sem volta, que o gestação e realizar partos, tratam a “mãe do curador que se entrega a fazê-los torna-se mau corpo” das mulheres, por meio de massagens e provavelmente terá um fim trágico. chamadas de “puxação”. Muitas mulheres já “partejaram”, ou seja, já auxiliaram no parto de Do ponto de vista da difusão das práticas alguém. Na aldeia, o parto é feito com a mulher xamânicas de cura, muitas delas referem-se às sentada em um banquinho o marido a auxilia práticas usuais realizadas por não especialistas, segurando-a pelas costas. A parteira é quem como o uso de plantas para banhos e defumações. “pega a criança” e corta o cordão umbilical. Tratam-se, especialmente, de técnicas de Cuidados especiais devem ser tomados com
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as roupas e o sangue da “mulher parida”, a figura do “banqueiro” é importante. Ele é que não podem ser lavados na beira do rio, o ajudante do curador, prepara, organiza, dá pois atraem os botos encantados. A técnica suporte e acompanha todo o trabalho ritual, de “pegar barriga” é realizada por parteiras mas sem incorporar espíritos. O uso do tauarí durante a gravidez para “encaixar a criança no é comum a quase todos os curadores. Trata- nascedouro”. A técnica de colocar “no lugar se de um cigarro especial feito com tabaco, a mãe do corpo” é realizada como cura de canauaru, sacaquinha e alecrim usado para enfermidades causadas pelo seu deslocamento trabalhar com espíritos do fundo. O curador dentro do corpo e pode ser feita a qualquer é o especialista que tem o poder de combater momento da vida da mulher adulta. “mal olhado de boto”, o “roubo da sombra” e a “assombração de bicho ou mortos”. c) Rezadores e benzedores. A prática da reza é comum a todos os especialistas, O curador sacaca é considerado o mais entretanto, distinguem-se pela força que sua poderoso com habilidade de ir até o “fundo” reza tem. O benzedor está apto a “benzer o ou “Encante”. Na cosmologia Munduruku, quebranto”, por exemplo, uma enfermidade que o ambiente é dividido em espaços de “terra causa diarreia e é causada não intencionalmente firme” e “água” habitados por diferentes seres. por alguém que está com fome e tenta agradar A palavra no idioma Munduruku ipibeat é uma criança muito nova. traduzida como “da terra”, e a palavra iribibeat, como “da água”. Gentirana ou kokeriwat são d) Curador, pajé, espiritista, sacaca. pessoas pequenas que vivem em baixo da terra. Categorias similares que identificam aquele que As pessoas podem se relacionar com esses “pega caboclo”, ou seja, trabalha com espíritos seres, aliás, mulheres podem mesmo ter filhos aliados e pode, dependendo do curador, realizar com eles. Os mundos subterrâneo e subaquático todas as práticas descritas acima. A principal têm um paralelismo com o mundo da terra, “lá, característica dos curadores é a relação com os tem tudo como aqui!”. Taufú são seres maus ou seres do “Encante”, os espíritos da mata e do ar. feiticeiros que comem o “bucho” das pessoas, Por Encante referem-se às cidades submersas depois as enchem de folhas, e elas então onde vivem os “botos” e os “encantados”, adoecem e morrem sem haver cura. O boto os quais podem ser espíritos aliados dos ou biupotep é o principal vilão da relação entre curadores sacacas ou, ainda, espíritos maus humanos e encantados, ele causa doenças por que causam doenças. No decorrer deste texto, “mau olhado” ou “assombro” e “persegue” as daremos preferência ao termo curador por ser pessoas, deixando-as “doidas” ou levando-as o mais utilizado pelos próprios Munduruku. para o “fundo”. O boto ainda pode engravidar Os curadores, em sua maior parte, trabalham as mulheres. A palavra para alma, espírito ou com “banca”, que é uma mesa com uma toalha sombra em Munduruku é ibiumbuk e a palavra branca na qual se dispõem os objetos rituais, ašik (o fonema š tem som de x, como em xadrez) os quais variam de curador para curador e é traduzida como espírito, mas se refere aos podem incluir estátuas de santos, velas, copos espíritos desencarnados que vagam, nesse caso, com água, pedras, fitas coloridas, miniaturas como espíritos dos mortos “afogados, atirados ou partes de animais, etc. No caso das bancas,
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e enforcados”, os quais fazem “perseguição” Itinerários Terapêuticos e a Autoatenção aos vivos para levá-los consigo. Alguns lugares possuem “donos” ou “mães”, e para utilizar- O exemplo a seguir refere-se à busca por se dos recursos disponíveis nesses lugares é tratamento realizada por um jovem curador preciso “pedir licença” a eles. O olho d’água ou Munduruku, Perí (os nomes utilizados cacimba tem um dono que pode causar doenças correspondem a pseudônimos), que, por conta se for desrespeitado ou engravidar mulheres de “sua doença”, torna-se especialista através que se banhem menstruadas na cacimba. A do cuidado obtido junto a outro curador “mãe da caça”, cuja palavra Munduruku é ancião, Ubirajara, um índio Mura que vive putxa ši, é a guardiã e também produtora dos fora da aldeia Munduruku e trabalha com animais de caça; cada animal de caça tem sua “espíritos do fundo”. Esse exemplo também “mãe” e havia um ritual para atrair putxa ši nos mostra que a emergência de espaços de executado pelos antigos curadores que não é intermedicalidade não se resume ao binômio mais realizado atualmente. As cabeças dos índios / “brancos”, podendo ocorrer entre animais caçados eram enfileiradas e um canto diferentes povos indígenas. Observou-se que o era proferido ritualmente para atrair a mãe da próprio especialista “curador” deve estar sob o caça e propiciar fartura. Hoje, os caçadores, tratamento de outro “curador” para “endireitar a individualmente, devem “pedir licença” aos linha e limpar o corpo”, ou seja, ao analisarmos “donos do lugar” para caçar, senão podem a carreira de um curador, procurando entender sofrer vingança deles, como “flechadas” que o quê o levou a tornar-se um curador, verifica- causam doença, loucura e morte. se que essa carreira sobrepõe-se a uma carreira de enfermo. Isso é importante, uma vez Conforme citado anteriormente, embora que não estamos focalizando nossa análise muitas práticas de cura xamânica sejam na “iniciação” do curador, como fazem os domínio do senso comum, podendo ser estudos clássicos antropológicos de ritos de executas por qualquer pessoa, os especialistas passagem, mas na articulação entre processos em cura Munduruku distinguem-se dos leigos de autoatenção e as demais formas de atenção porque possuem um “dom” de nascença. Em à saúde. Neste ponto, enfatizamos que não alguns casos, o “dom” de curador, pajé ou estamos negando a importância dos estudos sacaca manifesta-se através de episódios de clássicos, apenas ressaltamos que nossa doença considerados graves relacionadas abordagem implica em focalizar perguntas com os seres do “Encante”, e a cura resulta de pesquisa diferentes daquelas clássicas dos dos cuidados e tratamentos feitos por outro estudos de xamanismo. curador para “endireitar a linha”, isto é, afastar espíritos maus e contratar parcerias com outros. A “doença” de Peri teve início na Endireitar a linha significa reconhecer o dom adolescência, quando ele ficara “doido” ao e aceitar a responsabilidade de ser curador. A passar pelo cemitério. “Ficar doido” refere-se linha é como um fio fino, como uma delicada a eventos nos quais espíritos tomavam o corpo teia de aranha, e está localizada dentro do de Peri quando nem mesmo a força de muitos corpo do curador. homens podia impedi-lo de fugir ou jogar-se na água. Foi Ubirajara quem identificou que
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Peri tinha o dom para ser curador. O tratamento identificado pelos indígenas como um curador consistiu em “endireitar a linha” de Peri, ou seja, que trabalha com espíritos do ar. afastar “espíritos maus” e firmar “parcerias” com espíritos encantados que acompanharão O exemplo a seguir demonstra a apropriação Peri até o fim da vida. Como explicou Ubirajara, de elementos de diferentes formas de atenção à ele próprio tornara-se se curador porque fora saúde (xamanismo e biomedicina) no nível das tratado por outra curadora. Um curador pode, práticas cotidianas relacionadas ao processo e mesmo deve, portanto, tratar-se com outro, de recuperação de uma enfermidade grave. inclusive, em diversas ocasiões durante sua Como dizem os Munduruku, Maíra “apanhou vida. Idealmente, todo o curador pratica um derrame”. Por esse termo, os indígenas autoatenção cotidianamente como forma de não se referem apenas ao acidente vascular se proteger e fortalecer sua “reza” para poder cerebral hemorrágico, conforme diagnosticado curar melhor as pessoas que lhe procuram. Sem pelo serviço de saúde biomédico, mas a uma esses cuidados o curador pode adoecer ou ficar condição mais ampla, cujo sentido se constrói doido. Esses cuidados são intencionalmente a posteriori, de acordo com uma experiência realizados como uma forma de prevenção, pois de doença específica, a qual abrange toda diferentemente do materialismo científico que a “carreira” de uma pessoa com suas influencia a biomedicina, para os Munduruku, enfermidades. Portanto, quando nos referimos corpo e espírito se relacionam holisticamente. ao “derrame”, o leitor não deve buscar uma conexão direta e reduzida dessa categoria nativa Em outro contexto, presenciamos um de doença à categoria biomédica. O exemplo trabalho ritual no qual outro velho curador a seguir trata-se da articulação de diferentes Munduruku, Pedro Guaraciaba, defumou um formas de atenção por parte de atores sociais velho índio Tucano do Rio Negro que estava “leigos”. fazia pouco tempo morando na aldeia. Esse índio Tucano não falava português e, segundo Dona Maíra (90 anos), uma das poucas sua família, também era curador no Rio Negro. índias que fala Munduruku no Kwatá, é muito O propósito do trabalho ritual foi apresentar o ativa, simpática, lúcida e considerada uma velho Tucano a um dos “caboclos encantados”, das principais conhecedoras dos “tempos dos chamado Tangará, que vive no Encante do antigos”. Ela é hipertensa e sofre de catarata. fundo do Rio Canumã. Essa apresentação foi Vive sob os cuidados de diversos membros de para que o velho Tucano voltasse a trabalhar sua família extensa e, principalmente, sob os ritualmente, uma vez que sem trabalhar, o velho cuidados de Iara, uma de suas filhas de criação. Tucano ficaria doente. Outra curadora da aldeia Antes de ter sofrido derrame, Dona Maíra Kwatá, Maria Tainá, que havia iniciado seu submeteu-se a uma cirurgia para remoção da tratamento com Ubirajara, terminou-o com um catarata em um dos olhos, na cidade de Manaus, curador não indígena, João Coragem, que mora o que lhe restaurou alguma autonomia na vida na cidade de Borba. Este último curador, de cotidiana. Porém, no início de agosto de 2010, Borba, esteve algumas vezes na aldeia Kwatá e Maíra sofreu um derrame enquanto visitava um seu trabalho segue o estilo “umbandista”, que é de seus filhos que mora em Manaus. Pudemos acompanhar os cuidados de Dona Maíra e sua
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família e as várias tentativas de fazer com que fortes que podem atrair ou repelir a “doença” ela se recuperasse das sequelas (paralisia facial, como, por exemplo, a mucuracaá, a qual é dormência nas pernas e sensação de frio, além repulsiva para os “botos encantados do fundo”. de uma contusão causada por uma queda). Felizmente, ela recuperou-se bem do derrame, As práticas terapêuticas realizadas pelo fato que não é muito comum na aldeia. São núcleo familiar no cuidado de Dona Maíra vários os idosos que sofrem das consequências abrangeram também o uso de medicamentos de um derrame, que é considerado uma doença alopáticos (anti-inflamatório não esteróide e do ar pelos Munduruku. anti-hipertensivos se uso contínuo) obtidos no posto de saúde da aldeia. Ela teve Como na cosmologia Munduruku a agência acompanhamento médico do Pólo Base, parte não é uma prerrogativa apenas humana, as do Subsistema de Saúde Indígena, integrante doenças podem ter agência e intencionalidade. É do Sistema Único de Saúde (SUS), uma comum o uso da expressão “apanhou derrame”, vez que durante o processo de doença havia mas é interessante notar que nas narrativas o atendimento na aldeia. Esse médico realizou sujeito da ação é sempre o derrame, como se várias consultas em Dona Maíra, inclusive fosse o derrame que “apanhasse” a pessoa. realizando visitas domiciliares para verificar Todas as precauções nesse sentido, para evitar a pressão arterial e acompanhar o uso de derrame, encontram-se fundamentadas em não medicamentos. Esse padrão de atendimento dar oportunidade para que o “frio” entre na na casa da paciente converge com a atuação pessoa (evitar choques térmicos, por exemplo), dos curadores em casos graves, quando a e as técnicas de recuperação associam-se ao expectativa é de que o curador vá até a casa do afastamento do frio que os acometidos de enfermo e não o inverso. derrame sentem em seu corpo (dormência e paralisia). A prática terapêutica dos “banhos” Dona Maíra também obteve medicamentos foi central para o tratamento de Dona Maíra. alopáticos com o pastor da Igreja Batista. Ela Trata-se de uma das práticas xamânicas de tem papel ativo na igreja evangélica da aldeia tratamento e cura mais comuns no grupo. e tem contato frequente com missionários e pastores que visitam a aldeia. Foi por meio de Em geral, o uso de banhos com ervas um desses pastores que conseguiu um frasco articula noções de cheiros que atraem ou de colírio para aliviar seu problema de visão. afastam seres ou espíritos e sensações de Nesse caso, a indicação de medicamentos quente e frio que agem inversamente ao alopáticos opera da mesma forma que a sintoma do frio. Frio, nesse caso, não se refere indicação das plantas para chás e banhos, apenas a uma propriedade física ou de sensação com a diferença de que, na aldeia, o prestígio térmica, mas a um conjunto de sintomas ou a simbólico dos medicamentos industrializados uma categoria êmica de agente causador de é muito maior. Quando o frasco terminou, doenças. As propriedades de algumas plantas Dona Maíra encomendou a compra de outro são valorizadas como a casca da castanheira e a frasco junto ao seu “patrão”, o comerciante da pimenta, consideradas quentes. Muitas plantas cidade com quem tem crédito para aquisição de possuem ação terapêutica por terem odores produtos e mercadorias, o qual mandou trazer
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de Manaus, o frasco de colírio. Ela pagou o como vimos anteriormente, com outras etnias medicamento junto com os demais produtos indígenas. alimentícios de sua compra mensal. A seguir, apresentamos outro exemplo de Neste ponto, para maior aprofundamento uma indígena que buscou a uma curadora não sobre o papel e o prestígio de medicamentos indígena na cidade para tratar seu filho. Esse industrializados como capital simbólico exemplo também ilustra a relação interétnica recomendamos a leitura de Garnelo12, que desencadeada pelo processo de saúde e doença. trabalhou nas aldeias Baniwa do Alto Rio A doença do filho era de “mau olhado de bôta” Negro. Para os Munduruku, o prestígio (boto fêmea). O rapaz sentia muita dor de também é diferenciado em relação aos cabeça, gemia dormindo à noite, emagrecera e “banhos comprados” em casas de umbanda vinha sentindo muito medo, o que lhe impedia em relação aos banhos feitos com plantas de pescar. O rapaz contou para seus pais que obtidas nos quintais e na mata. Embora os toda noite sonhava com uma mulher. Tratava- produtos industrializados tenham grande se de uma mulher do Encante, que o estava prestígio na aldeia, gostaríamos de ressaltar perseguindo. A decisão da família foi de que o a importância das práticas “caseiras”, como caso era grave por conta dos riscos potenciais dizem os Munduruku, e para os princípios que os sintomas indicavam, pois o “mau olhado estruturadores da práxis xamânica que guiam de boto” pode levar à morte pelo “roubo da essas práticas. Consideramos relevante que, no sombra”, ou seja, o boto pode levar a pessoa exemplo etnográfico de Dona Maíra, a forma para morar no Encante. xamânica de atenção pelo uso de banhos com ervas foi articulada com a forma biomédica Durante o sono, a pessoa é levada até o pelo uso de medicamentos alopáticos sem que Encante e lá lhe oferecem comida. Ao passo isso repercutisse em contradições no nível da que a pessoa vai se familiarizando com o boto, autoatenção. as relações tornam-se íntimas. O problema é que essas relações fazem adoecer e culminam O exemplo de Dona Maíra demonstra com a morte. Quando o processo de doença que, no nível da autoatenção, os atores começou, não havia um curador na aldeia Kwatá podem articular diferentes formas de atenção que pudesse tratar do rapaz. Os pais decidiram e mesmo alterná-las. Essas possibilidades procurar uma curadora na cidade seguindo a constituem o espaço de intermedicalidade, no indicação de um vizinho da aldeia, que já se qual aparecem também os serviços religiosos tratara com essa curadora anteriormente pelo e comerciais, os quais possibilitam relações mesmo problema. A curadora confirmou que o interétnicas e importantes vias de acesso à rapaz estava muito doente porque uma “bôta” ideologia e aos recursos que estão além do tinha levado sua “sombra” para o fundo, no xamanismo Munduruku. Nesse caso, quando Encante. Nesse caso, “sombra” não é o mesmo nos referimos às relações interétnicas não que espírito, o que aponta para a noção de estamos restringindo apenas a relação entre os alma como sendo dupla. Para uma análise do índios e os “pariwat” (os não Munduruku, os conceito de alma Munduruku, recomendamos “brancos” ou os “civilizados”), mas, também, a leitura de Murphy 11. O rapaz precisou ficar
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alguns dias na cidade para fazer seu tratamento que propõe está a “venda” de garrafas contendo com banhos com ervas, poções perfumadas, banhos de umbanda vindos da Bahia. defumações e benzimentos sempre realizados às seis horas da tarde. Ainda que tivesse O paralelo interessante aqui é o de que há, seguido os conselhos e o tratamento, o entre os Munduruku, a expectativa de que rapaz não melhorou e retornou para a aldeia o xamã tenha o poder de viajar ou conhecer continuando a sentir medo, dores de cabeça lugares distantes. O curador sacaca tem o e a sonhar com a mulher “bôta”. Foi quando poder de ir até as “cidades encantadas” do chegou para morar na aldeia outro curador. Ele fundo do rio ou, como nesse caso, ter viajado havia se mudado com sua mulher e filhos de para lugares dos quais os Munduruku só outra aldeia pequena e distante para a aldeia ouviram falar. O caso do rapaz mostra que os Kwatá, segundo ele, a convite do cacique, mas indígenas, durante os processos de doença, há comentários que havia sido em decorrência buscam auxílio entre curadores a partir das de conflitos na aldeia de origem. expectativas que emergem da visão de mundo xamânica e podem recorrer a especialistas não Parte de seu tratamento incluiu, além dos indígenas que atuam fora da terra indígena. O banhos, defumações e benzimentos, também a fato de o primeiro tratamento não ter surtido proibição de retornar a pescar no igarapé onde efeito não se deve a um suposto “erro” de supostamente o rapaz havia encontrado a “bôta diagnóstico, uma vez que esse havia sido encantada”. O interessante é que a identidade feito ainda no nível da autoatenção. Ambos indígena deste curador. Ele é o único dos os especialistas consultados, nesse caso, curadores entrevistados que admite ter recebido apenas ratificaram o diagnóstico da família. seu dom durante a infância, através de um O sucesso do segundo tratamento se deve sonho com Nossa Senhora. Ele também diz ter mais a atribuição da força do benzimento do aprendido parte de seu conhecimento em livros. segundo curador, e à proibição ao rapaz de não Além disso, sua identidade foi construída retornar ao igarapé onde vive a “bôta”, do que em torno de outras ambiguidades. Embora às práticas terapêuticas realizadas. seja casado com uma mulher Munduruku, não há consenso entre os indígenas de que Considerações finais ele seja Munduruku. Ele conta que nasceu Os exemplos etnográficos citados no rio Canumã, mas teria sido levado para demonstram que as práticas de autoatenção Manaus ainda criança, onde fora criado em um seguem algumas premissas da cosmologia orfanato. São marcantes, nas narrativas desse xâmanica Munduruku. O xamanismo curador, as longas viagens feitas por ele para Munduruku, entretanto, não é provido de diferentes lugares do Brasil e até do mundo. Em natureza estática ou imutável. Ele segue suas narrativas sobre seu passado, ele procura algumas premissas, ou melhor, orienta algumas destacar as relações sociais que construiu e expectativas que podem ser preenchidas com mantém com pessoas importantes fora da terra elementos obtidos nas relações com a alteridade, indígena, como centros de umbanda, exército, portanto, eminentemente histórico, contextual empresas e universidades. Entre os tratamentos e relacional, negando ou confirmando a eficácia
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das práticas realizadas. Para esse autor, o xamanismo da Amazônia está presente em cidades e no meio rural, mas Segundo Allan Young 4, há uma relação há uma atração inversa que une os xamãs intrínseca entre as práticas de saúde e a urbanos e os da floresta. De um lado, a cidade cosmologia, pois ideologias e práticas simboliza riqueza que atrai os xamãs rurais, de respondem a imperativos instrumentais e outro, a floresta exerce fascínio semelhante, morais a partir do conjunto de princípios atraindo xamãs urbanos, ambos interessados cosmológicos. Nesse caso, seria um erro em apropriar saberes diversos as suas práticas assumir a oposição entre práticas e ideologias, xamânicas 15. visto que estas são também práticas sociais13. Inspirados por Young, sugerimos que Com efeito, esse fenômeno indicado os princípios instrumentais que regem o por Chaumeil pode ser analisado entre processo de autoatenção podem não ser os os Munduruku do Amazonas a partir da da biomedicina 4. O processo de autoatenção intermedicalidade, o que não implica em simples implica em refletir sobre essa efetividade instrumentalização da alteridade. A emergência e traz consequências sobre a própria de espaços de intermedicalidade demonstra construção social de cosmologias, pois as que a abertura para o diálogo interétnico é pessoas estão experimentando os resultados uma das principais características. Da mesma de sua intervenção em um ciclo contínuo forma, observa-se que a intermedicalidade de diagnóstico, tratamento e avaliação de nessa cosmologia apresenta-se mesmo em suas ações terapêuticas 14. O processo de seus princípios e premissas, pois a relação autoatenção pode colocar os indivíduos em entre curador e espírito aliado é uma relação situações extremas, nas quais o resultado de parceria entre curadores, visto que o espírito esperado das ações pode tanto negar, quanto dos botos e encantados são considerados confirmar princípios cosmológicos, mesmo curadores das cidades do mundo subaquático. quando práticas e tratamentos não surtem o Nesse cenário complexo, não é de surpreender efeito desejado podem estar reafirmando essas o interesse dos Munduruku na apropriação de premissas 4. práticas de outras formas de atenção, como da biomedicina, por exemplo, visto que além da De certa forma, o xamanismo Munduruku intermedicalidade ser uma característica do projeta-se para além dos limites étnicos e até processo de autoatenção também o é de seu mesmo subverte os princípios “tradicionalistas” xamanismo. de construção de uma identidade “indígena”, a qual reside na construção culturalista e Com efeito, para o observador pouco atento, nacionalista de uma imagem de “índio” as novas formas de atuação xamânica com genérica. Uma das características do estéticas da umbanda, espiritismo, cristianismo xamanismo Munduruku seria estabelecer-se em e biomedicina constituiriam um panorama de uma rede de relações duplas, com idas e vindas “ecletismo”, “sincretismo” e “perda” cultural para dentro e para fora do mundo Munduruku, do que seria o “tradicional” xamanismo melhor compreendida pelo que Chaumeil 15 Munduruku. Contudo, se seguirmos as chamou de o “retorno de um círculo completo”. observações de Greene2 sobre o xamanismo
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Aguaruna do Perú, podemos compreender sentidos conceituais das matrizes evolucionista que o “xamanismo Munduruku” é, antes de e funcionalista, evitando fragmentar os saberes articulados pelas “religiões” 16. Todavia, é qualquer coisa, um dispositivo para a ação preciso estar atento para não imaginar as aberto à produção de “medicinas híbridas” sociedades indígenas como “culturas isoladas”, Se fizermos um paralelo com a biomedicina, ou seja, sem inserção geográfica, histórica e a apropriação da alteridade seria vista como social em contextos regionais e globais. “inovação” científica. Grenne chama a atenção Vimos que o “pluralismo religioso” para o preconceito da stasis, que tende a ver Munduruku estaria em consonância com nos povos indígenas uma constante estagnação. a práxis xamânica que se manifesta nas Para Greene, o xamã é um especialista em articulações realizadas pelas práticas de autoatenção à saúde e também na atuação relações com a alteridade, o que inclui as dos especialistas indígenas. É através dessas relações com a sociedade envolvente. práticas que se estabelecem importantes redes de relações sociais que extrapolam os limites Sob vários aspectos, o “pluralismo da terra indígena Munduruku. A pesquisa religioso” entre os Munduruku é resultado etnográfica nos mostrou que as relações com o “mundo espiritual” são centrais para a vida das práticas de autoatenção. Não é novidade cotidiana na aldeia. Essas relações fazem parte que as “religiões” cumpram uma “função das diversas esferas políticas que incluem médica”. Entretanto, é necessário ressaltar as relações com o Estado, com os pariwat que há limitações no conceito de religião 16. O (“brancos”), com outros grupos indígenas e conceito de religião se insere na matriz teórica com os espíritos dos mortos e dos encantados. evolucionista como contraponto aos conceitos Todas essas relações com a alteridade, em de magia e ciência ou como uma “religião maior ou menor grau, implicam em perigos primitiva”. O problema com essa matriz e riscos à saúde e, especificamente, no caso é a suposta superioridade entre diferentes das relações com espíritos dos mortos e dos saberes, com o pressuposto de que a magia e encantados, geram doenças socioculturalmente a religião seriam inferiores à ciência, o que reconhecidas. Nesse sentido, o que chamamos tende a reproduzir preconceitos eurocêntricos. de autoatenção exerce um papel importante Outro problema com o conceito de xamanismo dentro desse campo de forças, pois se orienta está em sua versão culturalista, como um por um princípio prático que é a resolução ou conjunto de atributos culturais essenciais que alívio dos sofrimentos e enfermidades. Isso caracterizariam um povo ou cultura estáticos, implica a constante abertura de possibilidades contra o qual este texto assenta sua maior para a articulação de práticas e atores sociais crítica 2,14,16. O conceito de religião também é e, portanto, possibilidades de parcerias e central para a matriz conceitual funcionalista, conflitos. na qual a religião expressaria um dos quatro campos do interesse antropológico, junto com parentesco, política e economia. O problema com essa divisão não é o de definir temas de REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS estudo e interesse etnográfico. O problema está na conclusão de que a separação entre essas 1. Menéndez EL. Modelos de atención de esferas seja sustentável etnograficamente 17. los padecimientos: de exclusiones teóricas y Além disso, essa separação coloca em segundo articulaciones prácticas. Ciênc. saúde coletiva. plano outros temas etnográficos como, por 2003;8:185–207. exemplo, saúde, arte, etc. Como alternativa, o termo cosmologia seria mais adequado à 2. Greene S. The Shaman’s Needle: descrição etnográfica, pois não evocaria os Development, Shamanic Agency, and
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11. Murphy RF. Mundurucu religion. Colaboradores
Berkley:University of California Press; 1958. O trabalho de campo para coleta de dados foi 12. Garnelo L. Poder, hierarquia e reciprocidade: realizado por Scopel e Dias-Scopel. A primeira saúde e harmonia entre os Baniwa do Alto Rio Negro. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2003. versão deste artigo foi redigida por Scopel. Dias-Scopel e Wiik fizeram revisões, inclusões 13. Rabinow P. Antropologia da razão: ensaios. e sugestões de ordens teórica e analítica as Rio de Janeiro: Relume Dumará; 2002. quais resultaram na realização da versão final 14. Langdon EJ. A negociação do oculto : do artigo.
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Agradecimentos
Este artigo é fruto de um amplo projeto
de pesquisa e de formação de redes de pesquisadores do Instituto Brasil Plural, intitulado “Práticas de autoatenção, redes, itinerários e políticas públicas” coordenado por Esther Jean Langdon. Agradecemos à professora Langdon pela orientação e diálogo constante sobre muitas questões tratadas neste artigo, embora os autores assumam toda a responsabilidade por ele.
Agradecemos ao Instituto Brasil Plural e da
Fundação de Amparo a Pesquisa do Amazonas pelo financiamento da pesquisa de campo.