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Renúncia Ao Direito Fundam Ental À Nacionalidad E: Novas Pers Pectivas Teóricas A Partir Da Extradição N.º 1.462 Julgada Pelo Supremo Tribunal Federal
Renúncia Ao Direito Fundam Ental À Nacionalidad E: Novas Pers Pectivas Teóricas A Partir Da Extradição N.º 1.462 Julgada Pelo Supremo Tribunal Federal
E s ta d o , De m o c r a c i a C o n s t i t u c i o n a l e D i r e i t o s F u n d a m e n ta i s
Resumo
Abstract
This paper analyze the legal feasibility of renouncing the fundamental right
to nationality, demonstrating that this institute distinguishes itself from the
loss of nationality as diciplined in the Federal Constitution. Therefore, after
examining nationality as an essential right, it discusses the foundations,
assumptions and elements of the renunciation of fundamental rights, in
order to analyze Extradition number 1462, in which a native Brazilian born
Lucas Giacomini Priule • Roberto Baptista Dias da Silva
INTRODUÇÃO
A tese segundo a qual art. 2º, § 1º, contém ‘um direito fundamental autôno-
mo, que garante a liberdade geral de ação humana, tem enormes consequ-
ências. A liberdade geral de ação é uma liberdade de se fazer ou deixar de
fazer o que se quer. Pressupor que essa liberdade é garantida pelo art. 2º,
§ 1º, significa duas coisas: De um lado, a cada um é prima facie – ou seja,
caso nenhuma restrição ocorra- permitido fazer ou deixar de fazer o que
quiser (norma permissiva). De outro, cada um tem prima facie – ou seja,
caso nenhuma restrição ocorra – o direito, em face do Estado, a que este
não embarace sua ação ou sua abstenção, ou seja, a que o Estado nelas não
intervenha (norma de direitos).
NOTAS
1 “§ 4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos: (Redação dada pela Emenda Constitucional de
Revisão nº 3, de 1994)”
2 “LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado
antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins, na forma da lei;”
3 Essa nomenclatura pode ser encontrada em: DOLINGER, Jacob. Direito internacional privado:
parte geral. 11ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 49; TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de
direito constitucional. Texto revisado e atualizado por Maria Garcia. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1991. p. 562; STRENGER, Irineu. Direito internacional privado. 5. ed. São Paulo:
LTr, 2003. p. 203.
4 Esses elementos também podem ser observados em: DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo.
Teoria geral dos direitos fundamentais. 5. ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2014. p. 41.
5 Pode-se elencar os seguintes juristas: SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional
positivo. 37ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 327; FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves.
Curso de direito constitucional. 32ª. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2006. p. 109; “A
nacionalidade é qualificada como um direito fundamental da pessoa humana cuja outorga cabe
ao Estado soberano, não se excluindo, mediante determinados pressupostos e circunstâncias,
a possibilidade de o indivíduo optar por outra nacionalidade, nem a dimensão do direito do in-
divíduo à sua nacionalidade” (SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO,
Daniel. Curso de direito constitucional. 2. ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
p. 627.)
6 “1 – Toda pessoa tem direito a uma nacionalidade. 2 – Toda pessoa tem direito à nacionalidade
do Estado em cujo território houver nascido, se não tiver direito a outra. 3 – A ninguém se deve
privar arbitrariamente de sua nacionalidade nem do direito de mudá-la”.
7 “Art. 1° A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), ce-
lebrada em São José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, apensa por cópia ao presente
decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém”.
8 Especificamente sobre a disponibilidade do direito fundamental à vida, ver DIAS, Roberto.
direitos fundamentais: os deveres e os custos dos direitos. Por uma liberdade com respon-
sabilidade: estudos sobre direitos e deveres fundamentais. Coimbra: Coimbra, 2007, p. 163 a
196; DIMOULIS, Dimitri & MARTINS, Leonardo. Deveres fundamentais. In LEITE, Jorge Salo-
mão; SARLET, Ingo Wolfgang e CARBONELL, Miguel (Coords.). Direitos, deveres e garantias
fundamentais. Salvador: Jus Podium, 2011, p. 325-345; VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os
direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 3ª ed. Coimbra: Almedina, 2006,
p. 159-170; LLORENTE, Francisco Rubio. Los deberes constitucionales. Revista Española de
Derecho Constitucional, nº 62, año 21, mayo/agosto 2001, Madrid: Centro de Estudios Políticos
y Constitucionales, p. 11-56.
10 A autonomia e autodeterminação do indivíduo, na ordem jurídica brasileira, são associadas à
dignidade da pessoa humana, contendo, portanto, respaldo constitucional, uma vez que o referido
princípio configura-se como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil previsto no
art. 1º, III, da Constituição Federal. Sobre a autonomia da vontade como fundamento da dignidade
humana, ver KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos,
Trad. de Leopoldo Holzbach. São Paulo: Martin Claret, 2005, p. 70-71. Para Kant, o fundamento
da dignidade humana e único princípio da moral é a autonomia da vontade, entendida como “não
escolher senão de modo a que as máximas da escolha do próprio querer sejam simultaneamente
incluídas como lei universal”.
11 “Artigo 2 [Direitos de liberdade]
(1) Todos têm o direito ao livre desenvolvimento da sua personalidade, desde que não violem
os direitos de outros e não atentem contra a ordem constitucional ou a lei moral.”
12 Para os conceitos de liberdade negativa e positiva, ver, por todos, Isaiah Berlin. Este autor, ao
tratar da liberdade negativa, afirma que “sou considerado livre na medida em que nenhum ho-
mem ou grupo de homens interfere com a minha atividade. A liberdade política nesse sentido é
simplesmente a área na qual um homem pode agir sem ser obstruído por outros”. Já o “sentido
‘positivo’ da palavra ‘liberdade’ provém do desejo que o indivíduo nutre de ser seu próprio senhor.
Desejo que minha vida e minhas decisões dependam de mim mesmo, e não de forças externas de
qualquer tipo. Desejo ser o instrumento de meus próprios atos de vontade, e não dos de outros
homens. Desejo ser um sujeito, e não um objeto” (BERLIN, Isaiah. Dois conceitos de liberdade, in:
BERLIN, Isaiah. Estudos sobre a humanidade: uma antologia de ensaios. Tradução de Rosaura
Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 229 e 236-237.
13 A renúncia como forma de exercício de um direito fundamental também pode ser denominada
como “não exercício em sentido impróprio” ou “não exercício como modalidade de exercício” de
um direito fundamental, sendo uma espécie do gênero “não exercício” de um direito fundamental
que se opõe ao “não exercício em sentido próprio”. O não exercício de um direito fundamental,
portanto, pode ser entendido como uma abstenção de exercer um direito ou como o próprio
exercício de um direito através da abstenção, ou seja, o não exercício pode ser diferenciado em
razão de sua face negativa (não exercício em sentido próprio) e de sua face positiva (não exercício
em sentido impróprio ou modalidade de exercício). Quando se fala em não exercício em sentido
próprio, pretende-se dizer que ocorre uma abstenção ao exercício de um direito fundamental.
Trata-se de um fenômeno que se observa nos direitos fundamentais de liberdade, em razão de
sua natureza dúplice. Assim, pode-se exercer a liberdade religiosa professando uma determinada
fé ou pela desnecessidade de se ter uma fé, assim como em relação à liberdade profissional,
em que se pode exercer uma profissão ou não exercer nenhuma atividade profissional, ou em
relação ao direito de greve, que pode ou não ser exercido. Nessa hipótese, o não exercício dessas
liberdades públicas não é sinônimo de renúncia a um direito fundamental tal como propomos.
Note-se que o conteúdo dos direitos fundamentais permanece intacto, podendo o titular escolher
entre exercer algumas posições garantidas pelo direito ou abster de exercê-las. Esse não exercício
em sentido próprio ou abstenção, que é observado nos direitos fundamentais de liberdade, se
enquadra na concepção de que cada direito fundamental vem acompanhado da possibilidade de
exercer ou não a posição jurídica garantida pela norma jusfundamental, sendo parte integrante
do mesmo. Para evitar confusões terminológicas, entendemos que a expressão “não exercício de
direitos fundamentais” deve ter sua utilização restrita aos direitos fundamentais que consagrem
liberdades públicas (não exercício em sentido próprio), guardando para a expressão “renúncia” a
denominação que poderia caracterizar o não exercício ou abstenção de um direito fundamental
em seu sentido impróprio ou como modalidade de exercício. Sobre a temática, conferir: ADAMY,
Pedro Augustin. Renúncia a direito fundamental. Malheiros Editores, 2011. p. 43-45; MIRAN-
DA, Jorge. Manual de direito constitucional: direitos fundamentais. Tomo IV. Coimbra Editora.
5ª edição, 2014. p. 358; NOVAIS, Jorge Reis. Direitos fundamentais: trunfos contra a maioria.
Coimbra: Coimbra Editora, 2006. p. 221-222.
14 Embora não seja objeto central deste artigo, cumpre fazer a observação de que no caso da
uma interpretação conforme a Constituição. In IKAWA, Daniela; PIOVESAN, Flávia; FACHIN, Melina
Girardi (Coords.). Direitos humanos na ordem contemporânea: proteção nacional, regional
e global. Curitiba: Juruá, 2010, v. 4, p. 151 a 177.
16 Vê-se que na hipótese de perda da nacionalidade prevista no art. 12, § 4º, inciso I, da Constitui-
ção Federal, será possível a reaquisição da nacionalidade brasileira apenas no caso de uma ação
rescisória desconstituir a decisão judicial que cancelar a naturalização, nos termos da legislação
processual civil. Da mesma forma, na perda da nacionalidade prevista no art. 12, § 4º, inciso II, da
Carta da República, é possível a reaquisição desse direito ou até mesmo a revogação do ato que
determinou a perda da nacionalidade, nos termos do art. 76 da Lei nº 13.445/2017. Não obstante,
o brasileiro que perder sua nacionalidade não possui direito subjetivo à reaquisição da qualidade
de nacional, uma vez que a concessão da nacionalidade brasileira deve observar os requisitos do
art. 254 do Decreto 9.199/2017. Portanto, embora seja possível a reaquisição da nacionalidade
brasileira, não necessariamente ela será concedida, o que permite dizer que a perda da nacio-
nalidade brasileira com fundamento no art. 12, § 4º inciso II, da Constituição, produz efeitos in
perpetuum para o cidadão, já que não dependerá apenas dele a possível reaquisição daquela.
17 Segundo os clássicos entendimentos sobre Teoria Geral do Estado, este seria composto por
três elementos, a saber: território, povo e governo soberano. É no povo, enquanto elemento
constitutivo do Estado moderno, que se encontra o instituto da nacionalidade. A comunidade
nacional representa a dimensão pessoal do Estado soberano e, justamente por ser inerente ao
Estado, este é livre para conferir disciplina legal à sua nacionalidade. Cf. DALLARI, Dalmo de
Abreu. Elementos de teoria do Estado. 32. ed. -São Paulo: Saraiva, 2013. pp. 79-80 e 100-107.
Vale ressalvar que o autor ainda indica como elemento formador do Estado a finalidade, conceito
que não interfere no presente trabalho.
18 GUIMARÃES, Francisco Xavier da Silva. Nacionalidade: aquisição, perda e reaquisição. Rio de
Janeiro: Forense, 1995. p. 117. Note-se que o autor não concebe a nacionalidade como direito
fundamental do indivíduo, partindo de premissas diversas das por nós adotadas, e chega à
conclusão de que somente o Estado poderia suprimir a nacionalidade de alguém.
19 “Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao
jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão”.
20 Pode-se ler expressamente no formulário: “A única condição de perda da nacionalidade brasileira
REFERÊNCIAS
BERLIN, Isaiah. Dois conceitos de liberdade. In: BERLIN, Isaiah. Estudos sobre
a humanidade: uma antologia de ensaios. Tradução de Rosaura Eichenberg.
São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
BONAVIDES. Paulo. Curso de direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Mal-
heiros, 2010.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria do Estado. 32. ed. - São Paulo:
Saraiva, 2013.
DOLINGER, Jacob. Direito internacional privado: parte geral. 11. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2014.
REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 13. ed.
São Paulo: Saraiva, 2011.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 37. ed. São
Paulo: Malheiros, 2013.
STRENGER, Irineu. Direito internacional privado. 5. ed. São Paulo: LTr, 2003.
TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 13. ed. rev. e atual.
– São Paulo: Saraiva, 2015.