Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Pinho, M. R. & Menezes, Gui (2009), Demersal fishery off the Azores.
Boletim do Núcleo Cultural da Horta, 18: 85-102.
Summary: The Azorean demersal fishery is considered a multigear fishery, because several
different hook and line gears are used, and multispecies, because several species are caught or
landed at the same time. It is also considered as small scale, because the fleet is composed mainly
by small vessels with limited autonomy. This fishery operated on a very complex ecosystem,
characterized by spatial discontinuity, where the predominant structures are the seamounts. The
dynamic of the resources and the interaction between the different habitats (islands, banks and
seamounts) are poorly known. Interactions at larger scales (EEZ and Mid Atlantic Ridge) are
also unknown. The resources are considered intensively exploited although results of the stock
assessments are considered uncertain. There is no management objectives defined for almost
all the demersal/deep-water species. Management has been based on technical measures under
the precautionary principle. The complex fisheries governance system on the region has been
delayed the adaptive management of the local fishery and conservation of the ecosystem and
resources. This paper is an attempt to review and update the Azorean demersal fishery.
Introdução
São consideradas por definição como internacionais dos quaisl Portugal é
espécies demersais aquelas que habi- membro como o Comité Internacio-
tam junto ao substrato marinho, po- nal da Exploração do Mar (CIEM)
dendo apresentar comportamento que define claramente como espécies
dependente do fundo (bentónicas) de profundidade aquelas que habitam
ou habitar na interface entre o fundo abaixo dos 400 m. A FAO no entanto
e a coluna de água (bentopelágicos). considera como espécies de profundi-
A definição é no entanto plástica dade as espécies que habitam abaixo
porque as espécies se estruturam por dos 200 m de profundidade. Assim, é
comunidades em função da profun- também comum generalizar a clas-
didade. Assim, podemos falar de es- sificação da pescaria açoriana como
pécies demersais, profundidade ou de Demersais/Profundidade.
grande profundidade correspondendo Por último deve salientar-se a comple-
a um grupo específico de espécies que xidade do sistema de governança das
habitam uma amplitude específica de pescas associado à região enquanto
estratos de profundidade. Embora região autónoma e ultraperiférica da
conveniente ao homem para efeitos União Europeia.
de gestão e conservação esta defini- A complexidade destas questões para
ção também não é estanque porque efeitos de conservação e gestão au-
algumas espécies distribuem-se, às mentam consideravelmente quando
vezes de uma forma complexa, por consideramos as características do
todos os estratos de profundidade. ecossistema da região dos Açores, a
Uma outra classificação importante biologia das espécies, a forma como
para a conservação e gestão é a rela- se estrutura e exerce a pesca no espa-
cionada com as pescarias dirigidas a ço e no tempo e a estrutura institucio-
estes recursos, porque se relaciona di- nal da governança das pescas. Assim,
rectamente com o impacto do homem este artigo pretende caracterizar de
no ecossistema. A pescaria Açoriana forma resumida a estrutura do ecos-
tem sido classificada genericamente sistema, espécies, frotas e gestão e
como de demersais. No entanto, esta inferir o estado actual dos recursos
classificação não se ajusta ao forma- e da pesca.
to utilizado por alguns organismos
Mário Rui Pinho & Gui Menezes 87
Figura 1: O ecossistema dos Açores. Na figura são apresentados em contraste de cores a batimetria, a
distribuição dos montes submarinos e áreas chave de gestão (100 milhas, ZEE, área estatística ICES Xa2,
área de proibição de arrasto e limites sul comités internacionais). Adicionalmente está também representado
o esforço de pesca dirigido a demersais durante o ano de 2007. Fonte: ImagDop.
picais de oeste para o norte. O sistema sistema dos Açores (Menezes et al.,
de correntes que envolve os Açores é 2006).
complexo mas na prática é dominado O ecossistema dos Açores pode ser
a norte por um braço sul da corrente considerado um micro ecossistema
fria do atlântico norte (NAC) e a sul oceânico do Atlântico Norte na qual
pelo sistema frontal da corrente dos se podem definir para efeitos de ges-
Açores, transportando à superfície tão e conservação ecossistemas parti-
massas de água quente, atravessando culares correspondentes às estruturas
a crista média atlântica entre os para- topográficas do mesmo da qual se
lelos 34º N e 36º N (Alves & Verdière, destacam as zonas costeiras das ilhas,
1999; Bashmachnikov et al., 2004). os montes submarinos e a fontes hi-
Na região são detectadas em profun- drotermais (Fig. 1). O conhecimento
didade, abaixo da termoclina, massas das dinâmicas a várias escalas destes
de água com origem no atlântico norte ecossistemas e as suas interacções no
central acima dos 700 m. Nas profun- macro ecossistema do Atlântico Norte
didades intermédias (700-2000 m) são são ainda limitados.
detectadas massas de água subpolares A estrutura de gestão associada a
do norte e sul e do mar do Lavrador. este ecossistema oceânico é por si só
São ainda detectadas massas de água complexa sendo por exemplo a região
de origem Mediterrânica entre os 800- abrangida pelas convenções OSPAR,
‑1200 m de profundidade (Johnson & Comissão de Pesca do Atlântico
Stevens, 2000). Entre os 2000-4000 m Nordeste (NEAFC), Comité Inter-
predominam massas de água fria de nacional para a Exploração do Mar
profundidade do atlântico norte. (CIEM), Comité Internacional para
A temperatura de superfície apresen- a Conservação do Atum do Atlântico
ta variações sazonais consideráveis, (ICAAT) e Comité das Pescas para o
aumentando de Sul para Norte com a Atlântico Central Este (CECAF). Os
progressão das estações do ano com Açores estão no limite sul abrangido
um máximo no verão (http://oceano. pelas áreas da Convenção OSPAR,
horta.uac.pt/detra/). ICES e NEAFC correspondendo a
Embora os Açores sejam dominados uma zona de transição latitudinal das
por sistemas oceânicos predominan- características do ambiente e da fauna
tes de oeste, a fauna litoral tem mais (40º-50º N) e ao limite da distribui-
afinidades com o Atlântico leste, evi- ção (norte ou sul) de alguns recursos
denciando a complexidade do ecos- como os atuns.
90 Boletim do Núcleo Cultural da Horta
Existe uma grande variedade de artes lance diário de 8000 anzóis. A com-
genericamente designadas de linhas- ponente de embarcações cabinadas
‑de-mão e dois tipos base de palan- (12-24 m) utiliza linhas-de-mão e pa-
gre-de-fundo (bentónico ou de pedra- langre-de-fundo explorando recursos
-pedra e bentopelágico ou de pedra- de todos os estratos de profundida-
‑bóia) (http://www.pescas.net/artes- de, mas concentra preferencialmente
pescas.php). Devido à utilização de mais esforço de pesca nos estratos
vários desenhos de arte de pesca, que intermédios (200-700 m). As linhas-
permitem dirigir o esforço a um con- ‑de-mão são utilizadas fundamental-
junto específico de espécies, a pes- mente nas áreas costeiras das ilhas e o
caria demersal dos Açores é também palangre, devido a legislação recente,
classificada como de multiartes. é utilizado quase exclusivamente nos
O regime de operação da frota varia bancos e montes submarinos. Esta
consideravelmente em função do ta- componente palangreira efectua via-
manho da embarcação e arte que uti- gens de três a dez dias de pesca com
liza. A componente artesanal (com- um lance diário, (ocasionalmente
primento <12 m) utiliza fundamental- mais dependendo do tipo de embarca-
mente artes de linhas-de-mão e opera ção), utilizando em média entre 8 a 10
na área de influência do porto de re- mil anzóis por lance. As embarcações
gisto. Efectua normalmente viagens que operam com linhas-de-mão efec-
diárias de pesca, embarcando um ou tuam em média três dias de viagem
dois pescadores, e dirige o esforço de e utilizam fundamentalmente de 15 a
pesca a recursos costeiros das comu- 30 linhas-de-mão de deriva com 20
nidades demersais e de profundida- anzóis cada. A componente indus-
de. Esta componente da frota é a que trial (> 24 m) opera exclusivamente
apresenta maior variabilidade nas es- nos bancos e montes submarinos
pécies alvo da pesca ao longo do ano explorando os recursos dos estratos
(Silva & Goulding, 2003). As maio- intermédios (200-700 m) e profundos
res embarcações desta componente (> 700 m). Efectuam em média via-
da frota, particularmente as cabinadas gens de 8 a 12 dias de pesca, com um
e as embarcações de boca aberta de ou mais lances diários de aproxima-
S. Miguel operam também nalguns damente 14000 anzóis cada. Este re-
bancos e montes submarinos situados gime médio de operação da frota pode
mais próximo das ilhas. Algumas em- variar ao longo do ano entre embarca-
barcações desta componente utilizam ções, áreas de pesca, artes e espécies
a arte de palangre-de-fundo podendo alvo. A espécie alvo da frota é o goraz
efectuar dois dias de mar com um (Pagellus bogaraveo) observando-se
94 Boletim do Núcleo Cultural da Horta
5000
20000
4000
Euros (10 )
Peso (ton)
15000
3000
10000
2000
3 milhas
1000 5000
0 0
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
2004
2006
2008
Anos
Peso Valor
Figura 4: Desembarques totais em peso e valor de espécies demersais nos Açores. No gráfico são também
apresentados os períodos de introdução de duas medidas técnicas de gestão relevantes (a “box” das três
milhas e captura total autorizada para algumas espécies alvo – TAC).
Mário Rui Pinho & Gui Menezes 95
1600
1400
1200
Desembarques (t)
1000
800
600
400
200
0
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
2004
2006
2008
Anos
Pagelus bogaraveo Phycis phycis Beryx splendens Helicolenus dactylopterus
Pontinus kuhlii Poliprion americanus Conger conger Beryx Decadactylus
Lepidopus caudatus Mora mora Serranus atricauda Pagrus pagrus
Raja clavata Scorpaena scrofa Galeorhinnus galeus Pagellus acarne
Ruvettus pretiosus Zeus faber Molva macrophtalma Muraenidae
Aphanopus carbo Hoplostethus atlanticus Centrophorus squamosus Chaceon Affinis
Dalatias licha Diversos
Figura 5: Desembarques em peso da frota comercial Açoriana de demersais por espécie. Fonte: Lotaçor.
Serranus atricauda
Pagrus pagrus
6000 Raja sp
Scorpaena scrofa
Galeorhinnus galeus
Pagellus acarne
4000
Ruvettus pretiosus
Zeus faber
Molva macrophtalma
2000 Muraenidae
Aphanopus carbo
Hoplostethus atlanticus
Barroso
0 C. Affinis
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
Dalatias licha
Phycis blenoides
Anos Epigonus telescopus
Figura 6: Desembarques em valor da frota comercial Açoriana de demersais por espécie. Fonte: Lotaçor.
96 Boletim do Núcleo Cultural da Horta
Indíce de abundância
35 350
Desembarques (t)
Indice de abundância
Desembarques (t)
400 20
30 300
25 300 16 250
20 12 200
15 200 150
8
10 100
100 4
5 50
0 0 0 0
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
Ano Ano
80
Indíce de abundância
Desaembarques (t)
Desembarques (t)
20 30
700
600 25 60
15 500 20
10 400 40
15
300
200 10
5 20
100 5
0 0 0 0
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
Ano Ano
Indíce de abundância
Desembarques (t)
Desembarques (t)
120 1400 180
1200 500
100
1000 400
80 120
800 300
60 600
40 60 200
400
20 200 100
0 0 0 0
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
Ano Ano
Desembarques (t)
70 30
Desembarques (t)
Indíce de abundância
300 200
60 25
250
50 20 150
200
40 15 100
150
30 10
20 100 50
5
10 50 0 0
0 0
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
Ano
Ano
Indíce de abundância Desembarques
Figura 6: Abundância anual de algumas espécies de demersais dos Açores estimados a partir de cruzeiros
de investigação de primavera de palangre-de-fundo dos Açores.
98 Boletim do Núcleo Cultural da Horta
Gestão e Conservação
Figura 7: Resumo ilustrado das medidas técnicas de gestão dirigidas a espécies demersais dos Açores.
100 Boletim do Núcleo Cultural da Horta
Conclusão
Referências
Arhan, M.; Verdiere, A. Colin de & (2002), Directly measured mid-depth
H. Mercier (1989), Direct observations circulation in the North Atlantic Ocean.
of the mean circulation at 48o N in the Nature, 419: 603-607.
Atlantic ocean, Journal of Physical Ocea-
ICES (2006), Report of the Working Group on
nography, 19: 161-181.
the Biology and Assessment of Deep-Sea
Azevedo, J. M. M.; Portugal Ferreira, M. Fisheries Resources (WGDEEP). ICES
R. & Martins, J. R. (1991), ���������
The emer- CM 2006/ACFM: 28.
gent volcanism of Flores Island, Azores.
Arquipélago, Life and Marine Sciences, ICES (2008), Report of the Working group
9: 37-46. for regional ecosystem description
(WGRED). ICES Advisory Committee.
Bashmachnikov, I.; Lafon, V. & Martins, ICES CM 2008/ACOM: 47.
A. (2005), Sea Surface Temperature
Variability in the Subtropical North-East Isidro, E. J. (1996), Biology and population
Atlantic. 31st International Symposium dynamics of selected demersal fish species
on Remote Sensing of Environment of the Azores archipelago. PhD thesis.
(ISRSE). 20-24.June.2005, St.Petersburg. Department of Environmental and Evolu-
WWW site: http://www.isprs.org/publica- tionary Biology, Port Erin Marine Labo-
tions/related/ISRSE/html/papers/692.pdf. ratory, University of Liverpool, England.
249 pp.
Bower, A. S.; Le Cann, H.; Rossby, T.; Zenk,
W.; Gould, J.; Speer, K.; Richardson, Martins, J. A. (1986), Potencialidades da
P. L.; Prater, M. D. & Zhang, H.-M. ZEE Açoriana. Relatório da VI Semana
102 Boletim do Núcleo Cultural da Horta
das Pescas dos Açores, 6 (1985), 125-132. Governance and Management of Deep-sea
Ed. by Secretaria Regional de Agricultura Fisheries, Conference Poster and Dunedin
e Pescas, Direcção Regional das Pescas Workshop Papers. FAO Fish. Proc. 3/2.
dos Açores, Horta, Açores. Silva, H. M. & Pinho, M. R. (2007), Small
Martins, J. A. (1987), Investigação das pes- Scale Fisheries in Seamounts (Chapter 16):
cas nos Açores: present e futuro. Relató- 335-360. In Pitcher, T. J.; Morato, T.;
rio da VII Semana das Pescas dos Açores, Hart, P. J. B.; Clark, M. R.; Haggan, N.
149-158. Ed. by Secretaria Regional de & Santos, R. S. (eds,), “Seamounts: Ecol-
Agricultura e Pescas, Direcção Regional ogy, Conservation and Management». Fish
das Pescas dos Açores, Horta, Açores. and Aquatic Resources Series, Blackwell,
Oxford, UK., p. 533.
Meneses, G. M.; M. F. Sigler; H. M. Silva
& M. R. Pinho (2006), Structure and Santos, R. S.; S. Hawkins; L. Monteiro; M.
zonation of demersal and deep-water fish Alves & E. Isidro (1995), Case studies
assemblages off the Azores Archipelago and reviews. Marine research, resources
(mid-Atlantic). Marine Ecology Progress and conservation in the Azores. Aquatic
Series, 324:241-260. Conservation: Marine and Freshwater
ecosystems, Vol. 5: 311-354.
Morato, T.; M. Machete; A. Kitchingman;
White, M.; Bashmachnikov, I.; Aristegui, J.
F. Tempera; S. Lai; G. Menezes; R. S.
& Martins, A. (2007), Physical Pro-
Santos & T. J. Pitcher (2008a), Abun-
�����
cesses and Seamount Productivity. In
dance and distribution of seamounts in the
“Seamounts: Ecology, Conservation
Azores. Marine Ecology Progress Series,
and Management” (eds. Pitcher, T. J.;
357: 17-21. doi:10.3354/meps07268.
Morato, T.; Hart, P. J. B.; Clark, M. R.;
Pinho, M. R. & Menezes, G. (2005), Azorean Haggan, N. & Santos, R. S.), Fish and
Deepwater Fishery: Ecosystem, Species, Aquatic Resources Series, Blackwell, Ox-
Fisheries and Management Approach As- ford, UK., p. 533. ISBN: 9781405133432,
pects. Deep Sea 2003: Conference on the Chapter 4, pp. 65-84.