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REDAÇÃO

Texto poético

A caracterização do texto poético é muito complexa. Já começa


pelas diferentes denominações. Podemos falar em texto poético,
artístico, literário, ficcional, sem nos referirmos à possibilidade de
denominar como texto as diferentes manifestações artísticas. Por
que não falar em texto musical, pictórico etc.?

[...]
Seja como for, o texto poético é ficcional no sentido etimoló-
gico. Poderíamos, contudo, distinguir uma ficção poética, onde
predomina a tensão, desvelamento e velamento como poiesis, “Cada palavra é,
segundo sua essência,
e uma ficção-ilusão. O imaginar se funda no velar e é o contraponto do um poema.”
figurar. O contraponto indica a presença da tensão do limite e do ilimi- Guimarães Rosa em
tado, do discurso e da linguagem. Quando tal acontece teríamos o texto entrevista a Gunter
Lorenz.
poético.
[...]

No texto poético, a palavra comparece em todo o seu poder e densidade


de ambiguidade, e a separação entre língua e realidade é artificial e abstrata,
pois a língua é a realidade se manifestando concretamente, de tal maneira
que não é possível falar em significante e significado. O significado, a ideia,
é o significante se fazendo realidade como linguagem, ou seja, sentido e ver-
dade é o som se fazendo música do silêncio. Desta concretude surge o fato
de que, no texto poético, cada palavra é única e insubstituível, dando origem
às dificuldades da tradução e à necessidade de uma verdadeira re-criação.
O ritmo, a melodia, enfim, a musicalidade se torna uma dimensão funda-
mental da linguagem poética, pela qual a realidade se manifesta em sua ple-
nitude de velamento. Na e pela palavra poética, o som se faz linguagem. O
discurso poético não se apresenta como a mediação de um emissor e um
receptor nem as palavras têm qualquer função: não há mensagem na poiesis,
apenas a realidade se processando e presentificando como linguagem numa
ambiguidade radical. Toda grande obra é portadora de um ritmo e melodia
únicos e inimitáveis e nos lança nas grandes questões do ente e real/ser. É
nisto que o texto poético se distingue de todos os outros textos. [...].

Adaptado de: http://aprender.unb.br/ Acesso em novembro de 2008.

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Veja esse poema abaixo, escrito pelo autor Fernando Pessoa:

Não: não digas nada!


Supor o que dirá
A tua boca velada
É ouvi-lo já
É ouvi-lo melhor
Do que o dirias.
O que és não vem à flor
Das frases e dos dias.

És melhor do que tu.


Não digas nada: sê!
Graça do corpo nu
Que invisível se vê.

Fernando Pessoa, 5/6-2-1931

A distinção entre prosa e verso

Os textos em prosa apresentam uma característica marcante: as linhas


são contínuas e se agrupam em parágrafos. Quando você lê uma carta, uma
crônica, uma notícia ou reportagem de jornal, um conto ou um romance,
você está lendo textos em prosa.
Nos textos em verso, as palavras são dispostas graficamente em linhas
descontínuas chamadas versos, como nos poemas que aparecem no início
desta parte ou no texto Cajueiro Pequenino, a seguir.

O verso: classificação

Os versos podem ser de duas espécies:

 verso medido ou tradicional


 verso livre ou moderno

3.2.1. O verso medido ou tradicional é o verso que tem o mesmo núme-


ro de sílabas em toda a estrofe ou em todo o poema. Observe o número de
sílabas na primeira estrofe do poema Cajueiro Pequenino, de Juvenal Ga-
leno:

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Sílaba
tônica
1 2 3 4 5 6 7
Ca ju ei ro pe que ni no
Ca re ga di nho de flor
À som bra das tu as fo lhas
Vê nho can tar meu a mor
A com pa nha do so men te
Da bri as pe lo ru mor
Ca ju ei ro pe que ni no
Car re ga di nho de de flor

No verso medido ou tradicional, contam-se as sílabas até a última sílaba


tônica. Os versos do poema Cajueiro Pequenino têm, portanto, sete síla-
bas. Duas ou mais vogais, quando se encontram no fim de uma palavra e no
começo de outra e podem ser pronunciadas numa só emissão de voz, unem-
se numa única sílaba.

O verso tradicional ou medido, além de ter o mesmo número de sílabas


em todas as estrofes do poema, apresenta uma disposição regular das sílabas
tônicas. Nos versos do poema Cajueiro Pequenino são sílabas tônicas:

 a 1ª, a 3ª, a 5ª e a 7ª
 a 1ª, a 3ª e a 7ª
 a 1ª, a 4ª e a 7ª
 a 3ª, a 5ª e a 7ª
 a 2ª, a 4ª e a 7ª
 a 2ª, a 5ª e a 7ª
 a 3ª e a 7ª
 a 4ª e a 7ª

Há uma distribuição das sílabas tônicas na quinta estrofe. Nós negrita-


mos as sílabas tônicas que obedecem à disposição mencionada:

1 2 3 4 5 6 7
Crês ces te cres ce mos am bo
No sa a mi za de tam bém vo
E ras tu o meu em le
O meu a fe to teu bem te
Se tu so fri as eu tris
Cho ra va co mo nin guém
Ca ju ei ro pe que ni no
Por mim so fri as tam bém
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É necessário mencionar ainda outro elemento do verso tradicional


ou medido: a rima. Rima é a coincidência de sons no fim de palavras
ou versos. As rimas não estão presentes apenas nos poemas tradicio-
nais. Elas aparecem com a mesma força em:

Provérbios:
Lé com lé, cré com cré, um sapato em cada pé.
Água mole em pedra dura tanto bate até que fura.

Linguagem do dia a dia:


Como vai, vai bem? Veio a pé ou veio de trem?
Sol e chuva, casamento da viúva; chuva e sol, casamento do espanhol.

Você conhece o ditado


“água mole em pedra dura Linguagem publicitária:
tanto bate até que fura”? Amor com Primor se paga.

Nos jogos e nas brincadeiras:

Uni, duni, tê
Salamê, minguê
Um sorvete colored
O escolhido foi você!

Quem diz que de muitos gosta,


Quem diz que a muitos quer bem,
Finge carinhos a todos,
Mas não gosta de ninguém.
Quadra Popular

Nas estrofes, as disposições mais frequentes das rimas são as seguintes:

Rimas emparelhadas, quando se sucedem duas a duas:

“No rio caudaloso que a solidão retalha,


na funda correnteza na límpida toalha,
deslizam mansamente as garças alvejantes;
nos trêmulos cipós de orvalho gotejantes...”
Fagundes Varela

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Rimas alternadas, quando, de um lado, rimam entre si os versos ímpares


e, de outro, os versos pares:

“Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada


E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha...”
Olavo Bilac

Rimas opostas, quando o 1º verso rima com o 4º e o 2º com o 3º:

Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,


Da vossa alta clemência me despido,
Porque quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado...
Gregório de Matos

O verso tradicional pode conter até 12 sílabas. Versos com uma sílaba
são muito raros. Os com duas sílabas são mais comuns. Observe os que se-
guem:

Tu, ontem, Que louco


Na dança Senti!
Que cansa, Valsavas:
Voavas - Teus belos
Co’ as faces Cabelos,
Em rosas Já soltos,
Formosas Revoltos,
De vivo, Saltavam,
Lascivo Voavam,
Carmim; Brincavam,
Na valsa, No colo
Tão falsa Que é meu:
Corrias, E os olhos
Fugias, Escuros
Ardente, Tão puros,
Contente, Os olhos
Tranquila, Perjuros
Serena, Volvias,
Sem pena Tremias,
De mim! Sorrias,
Quem dera Pra outro
Que sintas Não eu!
As dores De amores Casimiro de Abreu

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Nas quadras e trovas populares, nas cantigas de roda e nos desafios, os versos
têm, em geral, sete sílabas, como os do poema Cajueiro Pequenino.

Eu não quero nem brincando,


Dizer adeus a ninguém:
Quem parte leva saudades.
Quem fica sofre também.
Quadra Popular

1 2 3 4 5 6 7

Eu não que ro nem brin can do

Os versos a seguir têm dez sílabas. Confira:

O que eu adoro em ti é no teu rosto


O angélico perfume da pureza;
São teus quinze anos numa fronte santa
O que adoro em ti, minha Tereza!
São os loiros anéis de teus cabelos,
O esmero da cintura pequenina,
Da face a rosa viva, e de teus olhos
A safira que a alma te ilumina!
Álvares de Azevedo

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O que eu a do ro em ti é no teu ros to

3.2.2 Verso livre ou moderno


O verso livre ou moderno não tem um número fixo de sílabas em cada
verso, nem uma disposição regular das sílabas tônicas, nem rimas, muitas
vezes. Os poemas a seguir são belos exemplos de poemas com versos livres.

Projeto

Quando eu morrer com certeza vou


pro céu.
O céu é uma cidade de férias, férias
boas que não acabam mais.
Álvaro Moreyra

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Verso avulso

“O meu amor é belo como um barco!”


Mário Quintana

Imagem

“O gato é preguiçoso como uma segunda-feira.”


Mário Quintana

Retomando a definição de poesia

Que é Poesia? “O gato é preguiçoso


uma ilha como uma segunda
feira”
cercada de palavras Mário Quintana
por todos os lados (...)
Cassiano Ricardo

Poesia é palavra. É linguagem. Todo o gênio do poeta reside na invenção


verbal (Jean Cohen - crítico de literatura). Poesia é uma forma peculiar de
dizer, de expressar. Poesia não é, pois, a mera expressão de sentimentos. De
uma dor de cotovelo. De uma decepção amorosa. De uma canção de amor.
Poesia não é a comoção diante de um pôr do sol ou diante de uma paisagem.
Até pode haver poesia numa declaração de amor ou num poema que descre-
va o entardecer. Mas - insista-se - a essência da poesia não está no próprio
assunto, na expressão do sentimento, da comoção, do encantamento. Poe-
sia é palavra.

Não é com ideias que se fazem


versos, é com palavras.
Mallarmé, poeta francês

Na poesia, a língua ultrapassa sua função meramente comunicativa e se


torna, ela própria, a matéria prima para a obra de arte. Dito de outro modo,
na função poética, o esforço do autor incide sobre a estrutura da mensagem,
sobre a forma de dizer. Se evidenciam as potencialidades da linguagem: a
conotação, a metáfora, todas as figuras de linguagem, a sonoridade, o rit-
mo; em suma, a maneira peculiar, diferente, nova, artística, criativa de se
expressar.

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Os versos contêm o mesmo número de sílabas.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
De/re/pen/te/do/ri/so/fez-/se o/ pran/to
si/len/ci/o/so e/bran/co/co/mo a/bru/ma
e/das/bo/cas/u/ni/das/fez-/se a es/pu/ma
e/das/mãos/es/pal/ma/das/fez-/se o/pran/to

Observações:

 A contagem das sílabas dos versos vai até a última sílaba tônica.
Quando duas (ou mais) vogais se encontram no fim de uma palavra e
no começo de outra, podendo ser pronunciadas numa única emissão
de voz, unem-se numa só sílaba.
 As palavras rimam.
 As sílabas tônicas repetem-se com intervalos regulares. Observe a
incidência da sílaba tônica na 6ª e na 10ª sílabas:
 A sucessão de sílabas tônicas e átonas com intervalos regulares ca-
dencia o verso, tornando-o melodioso.
 Os versos agrupam-se dentro de uma fórmula especial.
 A reiteração mencionada, além de dar ritmo e melodia ao poema, é
uma maneira (insistente) de o poeta expressar como se deu a separa-
ção.
 Há a utilização de figuras como a antítese, a comparação, a metáfora.

Antítese

A antítese consiste na aproximação de palavras ou expressões de sentido


oposto.

Comparação

A comparação, como o próprio nome diz, é o fato de confrontar, de esta-


belecer semelhanças entre seres ou coisas, tendo por finalidade tornar mais
clara, mais compreensível e mais expressiva a ideia que se quer expressar:

Silencioso e brando como a bruma

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Metáfora

Metáfora é o uso de uma palavra ou expressão num sentido diferente da-


quele que lhe é comum. As metáforas, portanto, por serem palavras e ex-
pressões usadas em sentido figurado devem ser “traduzidas”, ou melhor,
bem decodificadas.

METÁFORAS DECODIFICAÇÃO
(linguagem artística) (linguagem comum)

De repente do riso fez-se o pranto De repente a felicidade virou tristeza

De repente da calma fez-se o vento De repente a paz virou desarmonia

O poema de Gil Dumont Vêneto tem rima e ritmo: é uma valsa. É român-
tico. É delicado. Expressa o amor. Com certeza, agrada à maioria dos jovens.
Mas não é poesia!
Não basta rimar para escrever poesia. Não basta ter ritmo para ser poe-
sia. Um texto não é poesia por ser romântico, por emocionar, por ser uma
declaração de amor.
Poesia é palavra, é linguagem, é invenção verbal, é originalidade. E no po-
ema “Amor” não há isso. Há só lugares-comuns. “Tanger de mansinho”, “ter-
nos versos”, “berço de rosas macias”, “sono formoso”, “ao som das cantigas
que a brisa cicia”, “ao som das espumas e das ondas do mar”, “música leve
do teu respirar”, etc. são exemplos de que não há invenção verbal, exemplos
de lugares-comuns, de expressões que, de tão repetidas, se tornaram gastas,
surradas, sem originalidade.

O sentir, o amar, o apaixonar-se é comum a todos; cabe ao poeta expres-


sar o sentimento, o amor, a paixão de uma maneira singular. Tudo já foi
dito. O poeta expressa o que foi dito mediante uma forma inusitada. Para
finalizar, o poema a Consoada Manuel Bandeira é uma lição de poesia. Em
dez linhas apenas, com palavras simples, conhecidas (com exceção, talvez,
de “consoada”, “caroável” e “sortilégios”), expressa sua preparação para re-
ceber a morte (a Indesejada das gentes), que vem para um último encontro,
para uma “consoada” (refeição ao final do dia) e encontrará o poeta com o
dever cumprido (“encontrará lavrado o campo”) e preparado para recebê-la
(“a casa limpa, a mesa posta, com cada coisa em seu lugar”). Não há rimas (a
rima nem sempre é a solução). Os versos não apresentam o mesmo número
de sílabas. O ritmo não é marcado. Isso tudo não importa. O que confere
status de poesia ao poema é a maneira peculiar (a linguagem figurada) com

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que o poeta expressa sua alta preparação para receber a morte, que vem
para um “jantar”, um encontro a dois, e “Encontrará lavrado o campo, a casa
limpa, / A mesa posta, / Com cada coisa em seu lugar.” Ao concluirmos esta
seção, queremos sublinhar, uma vez mais, o seguinte: para escrever poesia,
é preciso ter cuidado especial com a forma, com a maneira de expressar, ex-
plorando com originalidade todos os recursos que o sistema linguístico ofe-
rece nos planos fônicos (rimas, ritmos, etc.), léxico (escolha das palavras),
sintático (combinação de palavras de forma inusitada, singular) e semântico
(emprego da linguagem figurada, etc.), revelando, assim, novas formas de
ver o mundo.
Poesia é isso: uma aventura de linguagem. A arte de dizer o comum de
forma incomum. O texto poético assim construído se torna intocável, isto
é, as palavras que o autor utilizou, as combinações que fez, os recursos que
empregou não podem ser alterados sob pena de comprometer a obra, des-
construí-la, despoetizá-la. Cabe lembrar, para encerrar, que um texto em
forma de prosa pode ser considerado poesia, se a função predominante for
a função poética, se nele estiver presente a linguagem poética. Trata-se de
um texto em prosa, em sua forma; poesia – em sua essência. Dito de outro
modo é prosa poética.

O poeta: um lutador

Retomemos a segunda estrofe do poema de Cassiano Ricardo:

Que é o poeta?
Manuel Bandeira, um um homem
dos mais importantes que trabalha o poema
escritores da literatura
brasileira com o suor de seu rosto
um homem
que tem fome
como qualquer outro
homem.

Fixemo-nos na definição de que o poeta é “um homem que tra-


balha o poema com o suor de seu rosto.” De imediato, percebemos
que escrever poesia não é tarefa fácil... não é algo que se produz
num momento de inspiração. Implica trabalho. Esforço. Suor. Bus-
ca de originalidade. Da metáfora iluminadora. É uma dura estiva de
desembarcar no papel e ideias novas, novas concepções de mundo.
Muitos poetas escreveram a respeito de seu esforço criador. Por
exemplo, Olavo Bilac, no soneto A um poeta

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“Longe do estéril turbilhão da rua,


Beneditino escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!”

No poema, é necessário ressaltar que a poesia é palavra.

A luta que o poeta trava com a palavra, a busca pela perfeição formal, a ân-
sia de almejar, alcançar a beleza a qualquer custo, e a impotência, a angústia
experimentada pelo poeta para a realização dessa tarefa - isso tudo está ex-
presso no poema clássico de Olavo Bilac, Inania verba (Fúteis palavras).

Inania verba

Ah! quem há-de exprimir, alma impotente e escrava,


O que a boca não diz, o que a mão não escreve
- Ardes, sangras, pregada à tua cruz e, em breve,
Olhas, desfeito em lodo, o que te deslumbrava...

O Pensamento ferve, e é um turbilhão de lava:


A forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve...
E a Palavra pesada abafa a Ideia leve,
Que, perfume e clarão, refulgia e voava.

Quem o molde achará para a expressão de tudo


Ai! quem há-de dizer as ânsias infinitas
Do sonho e o céu que foge à mão que se levanta

E a ira muda e o asco mudo e o desespero mudo


E as palavras de fé que nunca foram ditas
E as confissões de amor que morrem na garganta
Olavo Bilac

É tamanha a ânsia, o esforço do poeta na busca do ideal poético que chega


a sentir-se um fracassado, considerando impossível a expressão correta das
ideias pelas palavras. Para Bilac, a construção de um poema é também com-
parada a uma cidadela inconquistável:

“Nunca estarei jamais no teu recinto;


na sedução e no fulgor que exalas,
ficas vedada, num radiante cinto
de riquezas, de gozos e de galas.” (Perfeição)

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É a mesma a concepção de João Cabral de Melo Neto acerca do processo


de criação de um poema em O ferrageiro de Carmona (ferrageiro = ferrei-
ro; Carmona = cidade da Espanha e, também, uma espécie de tranca).
O poema distingue duas maneiras de trabalhar o ferro: a fundição e o for-
jamento. Na fundição, o ferro é derretido e derramado no molde. Ao esfriar,
torna-se sólido, tomando o formato do molde. Já no forjamento, o ferro é
aquecido e trabalhado/moldado pelo ferreiro com o auxílio do malho (um
grande martelo de ferro).
Segundo o poema, o trabalho com a linguagem é análogo ao trabalho com
o ferro. A “fundição” deve ser entendida como a construção de um poema a
partir de uma fórmula, em que, por isso, não há originalidade; o “forjamen-
to” é criação, é enfrentar dificuldades no fazer artístico. Assim, o poema
“forjado” é fruto do esforço, do suor, resultado do trabalho intenso e não de
uma inspiração fugaz, da imitação - sinônimo de facilidade.

Conclusão

No uso comum, poesia é termo utilizado para nomear o texto es-


crito em forma de verso. No rigor do termo, no entanto, “poesia” não
é sinônimo de verso metrificado, rimado. A essência da poesia é a
palavra. O trabalho com a palavra. O dizer o comum de forma in-
comum. O dizer poeticamente. De forma original. Inventando me-
táforas novas. Comparações inusitadas. Impactando. Oferecendo a
palavra como espetáculo.
Esqueça, pois, que poesia é sentimento. Comoção. A expressão do
amor. De uma saudade. De uma dor de amor. Não diga a sua amada
que quer vê-la repousando num berço de rosas macias, ao som das
cantigas que a brisa cicia, no doce balanço das ondas do mar. Que ela
é o sol de sua vida, o pão com que você saciará sua fome de carinho.
Seu ontem. Seu hoje. Seu amanhã. Seu sempre. Aliás, diga tudo isso,
mas de forma poética, nova, original. Afinal, poesia é a arte de dizer.
Olavo Bilac,
escritor brasileiro. Da palavra. Nova.

Adaptado de: http://www.pucrs.br/gpt/poesia.php / Acesso em novembro de 2008.

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