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REVISTA BRASILEIRA DE

Usina de Santo Antônio | Divulgação Santo Antônio Energia


COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS
ANO III Nº 03 ABRIL 2016 R$ 30,00
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REPARO, PROTEÇÃO E
IMPERMEABILIZAÇÃO
EM ESTRUTURAS
DE CONCRETO

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EDITORIAL

Segurança e gestão de risco


COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS – CBDB
Não poderia deixar de escrever sobre o tema
REPRESENTANTE DA COMISSÃO INTERNACIONAL DE
GRANDES BARRAGENS (ICOLD-CIGB) NO BRASIL que hoje predomina no meio técnico de profissionais
dedicados à Engenharia de Barragens: segurança e
DIRETORIA
PRESIDENTE BRASIL PINHEIRO MACHADO
gestão de risco. No Brasil, temos uma valiosa linha de
VICE-PRESIDENTE FABIO DE GENNARO CASTRO defesa, a Lei No. 12.334/2010, que estabelece a Política
DIRETOR-SECRETÁRIO LUCIANO NOBRE VARELLA Nacional de Segurança de Barragem (PNSB) e suas
DIRETOR DE COMUNICAÇÕES RICARDO AGUIAR MAGALHÃES
resoluções complementares produzidas pelo Conselho Nacional de Recursos
DIRETOR TÉCNICO CARLOS HENRIQUE MEDEIROS
SUPERINTENDENTE PEDRO PAULO SAYÃO BARRETO Hídricos (CNRH), pela Agência Nacional de Águas (ANA), pela Agência Nacional
de Energia Elétrica (ANEEL) e pelo Departamento Nacional de Produção Mineral
NÚCLEOS REGIONAIS - DIRETORES
(DNPM). Apesar disso, tem sido fácil e recorrente criticar a eficácia da legislação
BA - ROBERTO FACHINETTI
CE - ANA TERESA DE SOUSA PONTE em vigor, eleita a vilã dos acidentes.
GO/DF - EM PROCESSO DE RENOVAÇÃO Entretanto, precisamos ser justos e coerentes, na medida em que somos parte
MG - TERESA CRISTINA FUSARO responsável pelo imenso passivo ou legado de estruturas de barragens, vulneráveis e
PR - CARLOS INFANTE
PE - AURÉLIO ALVES DE VASCONCELOS
inseguras em sua maioria, de propriedade dos setores de recursos hídricos e de rejeito
RJ - CELSO JOSÉ PIRES FILHO de mineração e industrial. São barragens em condições de extrema vulnerabilidade
RS - LÚCIA WILHELM VÉRAS DE MIRANDA devido ao estado de conservação e passíveis de acidentes, fato que tira o sono
SC - SÉRGIO CORRÊA PIMENTA
de muitos profissionais responsáveis pela avaliação da condição de segurança. A
SP - CLÓVIS RIBEIRO LEME
situação tem provocado indignação naqueles que reconhecem a importância da lei e
COMISSÕES TÉCNICAS NACIONAIS - COORDENADORES
sua capacidade de mobilização para reorganizar setores deficitários.
BARRAGENS DE CONCRETO
JOSÉ MARQUES FILHO Há quem diga que a nossa Engenharia de Barragens não possui a expertise
BARRAGENS DE ENROCAMENTO COM FACE DE CONCRETO necessária para o enfrentamento de problemas dessa magnitude. Também há quem
BAYARDO MATERON diga que não devemos nos intimidar e devemos avançar com as lições dos acidentes.
BARRAGENS DE REJEITOS
JOAQUIM PIMENTA DE ÁVILA
Esse é o motivo que nos remete a manter o foco nos resultados da apuração dos fatos
BARRAGENS DE TERRA E ENROCAMENTO e nas causas dos acidentes com barragens, principalmente, naqueles onde tem sido
RICARDO AGUIAR MAGALHÃES recorrente a afirmação de que tudo estava sob controle e todos os procedimentos
CONDICIONANTES REGULATÓRIOS À REALIZAÇÃO DE
padrões de inspeção e monitoramento haviam sido concebidos e implementados.
BARRAGENS E RESERVATÓRIOS
RAYMUNDO GARRIDO Temos uma janela de oportunidades reservada para entidades com o perfil do
FORMAS DE CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE ENGENHARIA Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB), que podem assumir o papel de protagonista
E CONSTRUÇÃO
no estudo e discussão desses acidentes, através de ações que promovam o avanço
SÉRGIO ABUJAMRA MISAEL
HIDRÁULICA EM BARRAGENS do conhecimento, na qualidade de agente de interlocução entre comunidade técnica
BRASIL PINHEIRO MACHADO e sociedade. A presença do CBDB nesses episódios é relevante e permite o acesso
IMPACTO AMBIENTAL DE BARRAGENS E RESERVATÓRIOS às informações reivindicadas por nossos colaboradores, ávidos por explicações sobre
SANDRA ELISA FAVORITO RAIMO
OBRAS DE PROTEÇÃO E CONTENÇÃO DE FLUXO DE DETRITOS
as causas dos acidentes que maculam a imagem e a reputação da Engenharia de
DIMITRY ZNAMENSKY Barragens brasileira.
PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO TÉCNICA Finalizo convidando a todos para que nos ajudem a fortalecer este espaço, através
DENISE ARAÚJO VIEIRA KRUGER
de publicação de artigos sobre os mais variados e relevantes temas que compõem o
REGISTRO DE BARRAGENS
SÉRGIO CORRÊA PIMENTA universo da Engenharia de Barragens. Desejo uma boa leitura, e sejam rigorosos nos
SEGURANÇA DE BARRAGENS comentários sobre os temas aqui abordados e a qualidade técnica de nossos artigos.
CARLOS HENRIQUE MEDEIROS
USOS MÚLTIPLOS DE RESERVATÓRIOS
FÁBIO DE GENNARO CASTRO Carlos Henrique Medeiros
Diretor Técnico CBDB
CBDB - Comitê Brasileiro de Barragens
Rua Real Grandeza, 219 - Bloco C - Sala1007
Bairro Botafogo - Rio de Janeiro/RJ - Brasil
CEP 22281-900 FAX 055 21 2528 5959
ERRATA
TELEFONES 055 21 2528 5320 | 055 21 2528 5283 Na segunda edição da Revista Brasileira de Engenharia de Barragens (Maio/2015) houve um erro em um
E-MAIL cbdb@cbdb.org.br WEB www.cbdb.org.br parágrafo das conclusões do trabalho. O artigo “Proposição de um critério brasileiro para a faixa de inspeção a
jusante de barragens de terra-enrocamento” publicado na revista, acabou sendo veiculado com um equívoco.
ICOLD - International Commission on Large Dams
Onde se lê: “No estabelecimento do critério aqui proposto, se recomenda para barragens de menor porte
CIGB - Commission Internationale des Grands Barrages
(H<20 m), um mínimo de 15 m de largura a jusante do pé da barragem. Para o caso de estruturas com poços
Comissão Internacional de Grandes Barragens
de alívio a jusante o indicado é um mínimo de 10 m para o caso de barragens com enrocamento de pé”, o
61, avenue Kléber - 75116 - Paris - France
correto seria: “No estabelecimento do critério aqui proposto, se recomenda para barragens de menor porte
TÉL. FAX +33 1 4704 1780 FAX +33 1 5375 1822
(H<20m), um mínimo de 15 m de largura a jusante do pé da barragem, para o caso de estruturas com poços
E-MAIL secretaire.general@icold-cigb.org
de alívio a jusante, e um mínimo de 10 m para o caso de barragens com enrocamento de pé”.
WEB http://www.icold-cigb.net

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 3


SUMÁRIO
COMITÊ EXECUTIVO
BRASIL PINHEIRO MACHADO
CARLOS HENRIQUE MEDEIROS
Publicação de responsabilidade do CBDB
COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS
RICARDO AGUIAR MAGALHÃES
ARTIGOS GERÊNCIA DE PUBLICAÇÕES
A Revista Brasileira de Engenharia de
PEDRO PAULO SAYÃO BARRETO
Barragens (RBEB) é uma publicação
6 Informe Especial: Hidrelétrica Santo Antônio, técnica aperiódica do Comitê Brasileiro
COORDENAÇÃO EDITORIAL
quarta maior geradora hídrica do Brasil de Barragens (CBDB), distribuída em RICARDO AGUIAR MAGALHÃES
todo o território nacional e direcionada JORNALISTA RESPONSÁVEL
aos profissionais que atuam na
12 Compatibilização do uso dos recursos CLÁUDIA RODRIGUES BARBOSA
Engenharia de Barragens em geral e em
hídricos: o conflito entre a geração hidrelétrica obras associadas. Os artigos assinados
PROJETO GRÁFICO

com os demais usuários de água são de expressa responsabilidade E DIAGRAMAÇÃO


de seus autores e não refletem, URSULA FUERSTENAU
Tema: Usos Múltiplos | País / Edição: Brasil / 2016
necessariamente, a opinião do CBDB.
Autora: Mônica de Aquino Galeano Massera da Hora FOTOLITO / IMPRESSSÃO
Todos os direitos reservados ao CBDB.
GRÁFICA PALLOTTI
Nenhuma parte de seus conteúdos pode
19Impactos da regulamentação e implantação da Política ser reproduzida por qualquer meio sem a TIRAGEM
autorização, por escrito, dos editores.
Nacional de Segurança de Barragens no setor mineral 500 EXEMPLARES

Tema: Segurança de Barragens | País / Edição: Brasil / 2016


A Revista Brasileira de Engenharia de Barragens (RBEB) tem por objetivo a
Autor: Luiz Paniago Neves
publicação de artigos científicos e de relatos técnicos inerentes à Engenharia de
Barragens em geral, de modo a explicitar os conhecimentos técnicos atualizados,
26 Modelo de previsão de cheias durante
que sejam úteis tanto para a operação das empresas que projetam, constroem ou
a construção da UHE São Roque operam barragens, como para os centros de pesquisa e as universidades que se
dedicam ao desenvolvimento da Engenharia de Barragens.
Tema: Hidrologia | País / Edição: Brasil / 2016
O Conselho Editorial, abaixo nominado, é o órgão responsável pela definição
Autores: Anaximandro Steckling Muller, Diego David Baptista de
da linha editorial e pela qualidade técnica dos trabalhos. Está composto por
Souza e Guilherme Piaie de Oliveira Palma
membros selecionados entre os sócios do Comitê Brasileiro de Barragens
(CBDB) com comprovada experiência profissional ou acadêmica em cada um
32 Aspectos econômicos, técnicos e gestão de riscos na dos 16 temas a seguir relacionados.
implantação de empreendimentos – uma visão de acionista
TEMAS E COMPOSIÇÃO DO CONSELHO EDITORIAL
Tema: Energia | País / Edição: Brasil / 2016
HIDRÁULICA E VERTEDORES
Autores: Cleber José de Carvalho, Flávio Dutra Doehler e Octávio Viggiano
MARCELO GIULIAN MARQUES, NELSON LUIZ DE SOUZA PINTO
Barbosa Nascimento de Souza
GEOTECNIA E FUNDAÇÕES
ALBERTO DE SAMPAIO FERRAZ JARDIM SAYÃO, MILTON ASSIM KANJI
41 PCHs Indaiazinho e Indaiá Grande: um caso de GEOLOGIA DE ENGENHARIA
interação geologia - engenharia na concepção das obras RICARDO ANTÔNIO ABRAHÃO, SÉRGIO NERTAN ALVES DE BRITO
HIDROLOGIA
Tema: Geologia de Engenharia | País / Edição: Brasil / 2016 HEINZ DIETER FILL, MÁRIO CICARELLI PINHEIRO
Autores: Zsolt Miklós Gombossy, Sérgio Solino Ramos, David Prado Pulino ENERGIA
e Gustavo Barros Mattos FLÁVIO MIGUEZ DE MELLO, JERSON KELMAN, FRANCISCO LUIZ SIBUT GOMIDE
CONCRETO, TECNOLOGIA E MATERIAIS
SELMO SHAPIRA KUPERMAN, WALTON PACELLI DE ANDRADE, JOSÉ
47 A importância dos pêndulos diretos na MARQUES FILHO
instrumentação das barragens de concreto EQUIPAMENTOS HIDROMECÂNICOS
Tema: Instrumentação | País / Edição: Brasil / 2016 PAULO CEZAR FERREIRA ERBISTI, JOÃO CARLOS MATHEUS
BARRAGENS DE TERRA E DE ENROCAMENTO
Autor: João Francisco Alves Silveira
CIRO HUMES, PAULO TEIXEIRA DA CRUZ, CÁSSIO BAUMGRATZ VIOTTI
BARRAGENS DE FACE DE CONCRETO E DE NÚCLEO ASFÁLTICO
BAYARDO MATERÓN, CIRO HUMES
CAPA INSTRUMENTAÇÃO
ARSENIO NEGRO JR., JOÃO FRANCISCO ALVES SILVEIRA, RUBEN JOSÉ
UHE Santo Antônio RAMOS CARDIA
Em operação desde março de 2012, a Hidrelétrica Santo Antônio, localizada no rio BARRAGENS DE CONCRETO COMPACTADO A ROLO (CCR)
FRANCISCO RODRIGUES ANDRIOLO, WALTON PACELLI DE ANDRADE
Madeira, em Porto Velho, Rondônia, vem ampliando sua capacidade de geração de
MEIO AMBIENTE
energia, de fonte limpa e renovável, a cada nova turbina que coloca em funcionamento.
MARÍLIA PIRONI SCOMBATTI, SÍLVIA HELENA PIRES
Hoje, suas 38 turbinas em operação representam 76% da capacidade total de SEGURANÇA DE BARRAGENS
geração de energia, quantificada por uma potência instalada de 2.714,72 Megawatts. CARLOS HENRIQUE DE A. C. MEDEIROS, TERESA CRISTINA FUSARO
Quando estiver com a 50ª turbina em operação, em novembro deste ano, a TÚNEIS
TARCÍSIO BARRETO CELESTINO
Hidrelétrica Santo Antônio atingirá a capacidade de geração de 3.568 Megawatts. É
RECURSOS HÍDRICOS
energia suficiente para atender ao consumo de 45 milhões de pessoas, consolidando
BENEDITO PINTO FERREIRA BRAGA JÚNIOR
a posição de quarta maior geradora hídrica do País, de acordo com relatório do MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Operador Nacional do Sistema (ONS). MARIA ASSUNÇÃO FAUS DA SILVA DIAS

4 WWW.CBDB.ORG.BR
HOLOFOTE

ICMS na produção de energia por hidrelétricas


Exemplo de carência de lógica da legislação federal
Flavio Miguez de Mello

Uma das primeiras medidas tributárias positivas do governo do presidente Humberto Alencar Castello
Branco, inspirada pelo então ministro do Planejamento Roberto Campos foi a transformação do imposto
sobre vendas e consignações, altamente deletério por ser em cascata, em Imposto sobre Circulação de
Mercadorias (ICM). Naquela ocasião, ele seguiu o modelo do Mercado Comum Europeu. Para estruturar
a mudança, que tantos benefícios trouxe à economia nacional, foi formado um grupo de trabalho com participação dos ilustres juristas
Gilberto Ulhoa Canto e Rubens Gomes de Souza, e do destacado engenheiro Mário Henrique Simonsen. Para a criação do ICM, cobrado
sobre o valor acrescido, em 1965 foi promulgada a Emenda 18 à Constituição Nacional de 1946. Posteriormente ampliado, o imposto
passou a abranger também serviços especiais, formando o atual ICMS.
O ICMS é regido por Lei Complementar Federal que estabelece princípios gerais, explicitando o que é previsto na Constituição.
É recolhido por estados da União e Distrito Federal seguindo leis estaduais. Na legislação brasileira há estranhezas como a única
exceção no recolhimento do ICMS para estados produtores de combustíveis fósseis. Nesse caso, o recolhimento favorece estados
consumidores desses produtos, penalizando estranhamente estados produtores, ambientalmente impactados.
As legislações estaduais estabelecem diferentes incidências de imposto, o que possibilita, há décadas, a guerra fiscal. Neste
cenário, governos estaduais concedem, por longos períodos, abatimentos ou isenções para as indústrias. O objetivo é que elas
instalem suas fábricas em seus territórios. A prática difundida encontra resistência do Supremo Tribunal Federal (STF).
Os estados têm a prerrogativa de estabelecer critérios de cobrança do ICMS relativo à energia elétrica gerada em seus territórios.
Considerando o difundido costume em nossa terra, verifica-se que o ICMS sobre a geração de energia elétrica é muito elevado
na maioria dos estados. A História auxilia: desde a Derrama, no século XVIII, que gerou a Inconfidência Mineira, o brasileiro vive com
impostos cada vez maiores em contraste com serviços e assistências governamentais cada vez mais precários.
Contribui para a comprovação dos cálculos divulgados em 2015 pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN) o fato
de as tarifas médias de energia elétrica das indústrias do País serem as mais altas do mundo. A consequência desta diferença é que
a competitividade da indústria nacional acaba sendo prejudicada no mercado globalizado.
Além do exuberante valor do ICMS que incide nas tarifas de energia elétrica, há aspectos curiosos que merecem avaliação. Em hidrelétricas
construídas em rios que delimitam estados da Federação ou que atravessam limite estadual, tendo casa de força em um estado e reservatório
predominantemente em outro, a legislação “estranhamente” determina que o ICMS seja recolhido para o estado onde está a casa de força.
O legislador ignorou que uma usina hidrelétrica é formada por uma barragem que acumula energia potencial no seu reservatório,
e que essa energia é transformada em energia mecânica pelas turbinas. Em seguida, ela é convertida em energia elétrica pelos
geradores. Portanto, a produção de energia elétrica é iniciada no reservatório, mesmo que operado a fio d’água.
A exclusividade do ICMS para o estado onde está a casa de força fomenta a disputa entre os estados para abrigá-la. Ciente disso,
o empreendedor joga com governadores e prefeitos com o intuito de causar uma pequena guerra fiscal. É justamente desse modo
que ele costuma obter vantagens fiscais para seu empreendimento.
Por outro lado, nas hidrelétricas instaladas em limites estaduais, frequentemente o empreendedor é pressionado por estados e municípios
no que se refere à posição da casa de força, tendo em vista a arrecadação do ICMS. Nesse caso, o empreendedor pode ter um aliado no estado
selecionado como local da casa de força. Mas, vale lembrar que esta alternativa provavelmente venha a desagradar importantes setores da
política regional de residentes na margem oposta - acarretando dificuldades adicionais às muitas já enfrentadas na implantação de uma usina.
Com base no acima exposto e objetivando trazer justiça para estados limítrofes e o benefício da tranquilidade aos empreendedores
de usinas hidrelétricas, urge alterar a legislação visando à partição do ICMS nos casos em que a usina esteja em mais de um estado.

Flavio Miguez. Formado em engenharia em 1967 e em mestrado em geologia, ambos pela UFRJ. Chefe de divisão de Furnas, diretor técnico
da Enge-Rio, diretor adjunto da Poli-UFRJ, diretor da ABCE, presidente do CBDB, diretor da ANE, professor da UFRJ.

COMENTÁRIOS DOS LEITORES


Comentários sobre o trabalho “CONSIDERAÇÕES SOBRE A AMEAÇA OCHCRE”, publicado na Figura 1.
Revista Brasileira de Barragens Nº 02, de Maio de 2015, de autoria de Bruno Neves, da Light Energia. Colmatação das
camadas de areia,
Nesse trabalho o termo “ochcre” não é apropriado. Venho sugerir que o mesmo seja substituido por ferro- pedrisco e brita na
zona de oscilação
bactérias termo já empregado há várias décadas em nosso meio técnico. Por se tratar de uma foto bem do NA (seta)
didática, apresenta-se na Fig. 1 a ação de ferro-bactérias no filtro a jusante da barragem, com as camadas de um filtro, pela
de areia, pedrisco e brita colmatadas pela ação das mesmas, na zona de oscilação do nível d’água. ação de ferro-
bactérias (Fonte:
João Francisco Alves Silveira | SBB Engenharia SBB).

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 5


INFORME ESPECIAL

HIDRELÉTRICA
SANTO ANTÔNIO
QUARTA
Em operação desde março de 2012, a Hidrelétrica
Santo Antônio, localizada no rio Madeira, em Porto Velho,
Rondônia, vem ampliando sua capacidade de geração de

MAIOR
energia, de fonte limpa e renovável, a cada nova turbina que
coloca em funcionamento.
Hoje, suas 38 turbinas em operação representam 76% da

GERADORA
capacidade total de geração de energia, quantificada por uma
potência instalada de 2.714,72 Megawatts.
Quando estiver com a 50ª turbina em operação, em

HÍDRICA
novembro deste ano, a Hidrelétrica Santo Antônio atingirá
a capacidade de geração de 3.568 Megawatts. É energia
suficiente para atender ao consumo de 45 milhões de
pessoas, consolidando a posição de quarta maior geradora

DO PAÍS hídrica do País, de acordo com relatório do Operador


Nacional do Sistema (ONS).

Posição da Hidrelétrica 1ª - Itaipu 2ª - Tucurui 3ª - Jirau 4ª - Santo Antônio 5ª - Xingó

Geração Média Mensal em MWh 8.906,05 4.040,05 1.293,93 1.268,67 1.126,01

6 WWW.CBDB.ORG.BR
Tecnologia de ponta na Amazônia
As turbinas utilizadas na Hidrelétrica Santo Antônio são do corrente contínua de 600 kV, pelo denominado “Linhão do Madeira”,
tipo bulbo, as mais indicadas para geração de energia para grandes com uma extensão 2.375 km. Considerada a mais longa linha de
vazões e baixas quedas. Por isso, não requerem a formação de um transmissão do mundo, ela atravessa 90 municípios brasileiros.
grande reservatório, o que reduz substancialmente os impactos A energia produzida pela estrutura Santo Antônio abastecerá o
socioambientais naturais durante a implantação e operação de uma Sudeste do País, bem como as diversas regiões brasileiras (inclusive
hidrelétrica. Rondônia, onde foi produzida) por meio do Sistema Interligado
Com potência média de 71,6 Megawatts, as turbinas da Nacional (SIN).
estrutura Santo Antônio são consideradas uma das maiores em Mas, a Hidrelétrica Santo Antônio possui um diferencial em
funcionamento no mundo – seja em relação à sua capacidade de relação à distribuição da energia que produz: ela também abastece
geração ou às suas dimensões: são nove metros de diâmetro e 900 diretamente Rondônia e Acre. Isto ocorre por meio de uma linha
toneladas, cada uma. de transmissão de 230 kV construída pela própria hidrelétrica. Esta
A energia produzida pela Hidrelétrica Santo Antônio é linha será alimentada exclusivamente pelas seis turbinas que fazem
transmitida até a subestação coletora de Porto Velho, por meio de parte da ampliação promovida pela geradora. O projeto original
duas linhas de transmissão. previa 44 turbinas. Até novembro deste ano, a hidrelétrica terá 50
De lá, segue para Araraquara, no interior de São Paulo, em unidades geradoras.

Energia produzida no local abastece Rondônia, Acre e o Sudeste do País As turbinas do complexo estão entre as maiores do mundo em atividade

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 7


HIDRELÉTRICA SANTO ANTÔNIO :: QUARTA MAIOR GERADORA HÍDRICA DO PAÍS

Sustentabilidade,
já analisados, o maior número de notas máximas na categoria
Implantação, de acordo com avaliação independente realizada pela
International Hydropower Association (IHA). Fundada há quase 20
o principal pilar anos, com o suporte da UNESCO, a organização sem fins lucrativos
mede a sustentabilidade de empreendimentos hidrelétricos em todo
da Hidrelétrica o mundo.
O resultado da avaliação se dá após a análise de 20 tópicos

Santo Antônio baseados em diferentes quesitos: avaliação, gestão, comunicação


com stakeholders, apoio das partes interessadas, concordância,
conformidade e resultados. Todos os tópicos exigem documentação
Aplicar as melhores práticas de sustentabilidade sempre foi técnica, além de entrevistas internas e externas, e comprovação das
um dos principais compromissos da Santo Antônio Energia antes, evidências em sustentabilidade.
durante e após o início de geração da sua hidrelétrica. Acima de todas as avaliações obtidas pelas demais hidrelétricas
O mesmo cuidado sempre foi demonstrado nas práticas e analisadas em diversos países, inclusive no Brasil, o resultado
conceitos aplicados durante a construção da hidrelétrica, que conquistado pela Hidrelétrica Santo Antônio nada mais é do que a
completa oito anos em setembro de 2016. tradução plena e isenta de que seus compromissos com as melhores
Certamente, o compromisso com estas práticas fizeram com práticas globais em sustentabilidade são exemplo para o setor no
que a Hidrelétrica Santo Antônio alcançasse, entre todos os projetos País e fora dele.

O investimento da Hidrelétrica Santo Antônio em sustentabilidade chegará a R$ 2 bilhões até o término da implantação da usina

8 WWW.CBDB.ORG.BR
Programas
socioambientais
O projeto da Hidrelétrica Santo Antônio se beneficiou
das características naturais do rio Madeira para aproveitar ao
máximo o seu potencial hídrico e gerar energia.
As suas turbinas são movidas pelas características únicas da
vazão do rio Madeira, que apresenta uma variação entre 4 mil
m3/s no período de seca e mais de 40 mil m3/s no período de cheia.
O uso de turbinas bulbo dispensa a formação de grandes A ampliação da usina respeita as melhores práticas de sustentabilidade
reservatórios, como é o caso da Hidrelétrica Santo Antônio.
Ela possui um reservatório de 422 km2, área praticamente igual
à ocupada pelo rio Madeira durante os períodos de cheia.
Hoje, a hidrelétrica apresenta um dos melhores coeficientes
de geração do País, que é de nove Megawatts para cada km2 de
reservatório.
A geração de grande quantidade de energia com um
reservatório relativamente pequeno é um dos principais
benefícios socioambientais atribuídos ao projeto que norteou
a construção e operação da estrutura Santo Antônio.
Mas o investimento para a implantação da Hidrelétrica
Santo Antônio não foi apenas conceitual. Ele respeitou as
melhores práticas em sustentabilidade e seguiu à risca os
Princípios do Equador, que fiscalizam todo o empreendimento,
Programas socioambientais protegem o ambiente físico e o meio biótico
com duras sanções em caso de descumprimento das normas
estabelecidas para a área socioambiental.
No caso da usina Santo Antônio, o
investimento em sustentabilidade chegará
a R$ 2 bilhões até o final da implantação.
A verba foi investida em 28 programas
socioambientais, focados em ações voltadas
para a população local, proteção do
ambiente físico (solo, clima, lençóis freáticos
e sedimentos) e do meio biótico (flora e
fauna aquática e terrestre, qualidade da
água, supressão da vegetação e resgate da
fauna), reassentamento de comunidades e
investimentos nas áreas de saúde pública,
educação e infraestrutura. desse modo a
hidrelétrica contribuiu para a melhoria da
qualidade de vida de milhares pessoas, nos Resgate da fauna e supressão da vegetação são aspectos primordiais no processo
mais diversos aspectos.

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 9


HIDRELÉTRICA SANTO ANTÔNIO :: QUARTA MAIOR GERADORA HÍDRICA DO PAÍS

Conhecimento compartilhado
A implantação da Hidrelétrica Santo Antônio, em Porto de temas pertinentes à região, ao setor e ao empreendimento, foi
Velho, abriu oportunidades para ampliar o conhecimento local distribuída nestes locais. O livro Peixes do rio Madeira, com cerca
em diversas frentes, como tecnologia, história natural e humana de mil páginas, também fez parte desta ação social.
da região, entre outras. Outra publicação distribuída pela Santo Antônio Energia foi o
O compromisso em compartilhar o conhecimento adquirido Guia de Fauna das Espécies Resgatadas. A obra mostra os animais
sempre foi constante na empresa. Publicações específicas silvestres da região que foram encontrados durante as atividades
entregues para entidades de ensino e centro de pesquisas são do Programa de Conservação de Fauna, realizado em áreas do
alguns dos exemplos neste sentido. A coleção Saiba Mais, que trata canteiro de obras e do reservatório.

GUIA DE FAUNA
PEIXES DO DAS ESPÉCIES
COLEÇÃO SAIBA MAIS RIO MADEIRA RESGATADAS
Disponível no site da Santo Disponível no Disponível no
Antônio Energia: www. site da Santo site da Santo
santoantonioenergia.com.br Antônio Energia Antônio Energia

Com as 50 turbinas, o total de royalties pagos anualmente pela hidrelétrica deve superar os R$ 100 milhões

10 WWW.CBDB.ORG.BR
A Hidrelétrica Santo Antônio iniciou a geração de energia nove meses antes do que previa o cronograma original

Incremento de receita
No Brasil, todas as hidrelétricas pagam royalties pelo uso das
águas que geram energia. Esta operação é denominada Compensação
Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos para Fins de
Geração de Energia Elétrica (CFURH), instituída pela Constituição
Federal de 1988 e regulamentada pela lei nº 7990/1989.
A Hidrelétrica Santo Antônio iniciou a geração de energia em 30
de março de 2012 – nove meses antes do que previa o cronograma
original. Desde então, a Santo Antônio Energia, concessionária
responsável pela construção e operação da hidrelétrica, paga
mensalmente royalties de acordo com a sua geração efetiva.
Estes royalties são divididos da seguinte forma: 45% para
Rondônia, 45% para Porto Velho e 10% para a União. Para todas
as esferas, o recebimento de royalties representa um incremento
substancial de recursos que podem ser aplicados em diversos
setores, buscando o desenvolvimento local e regional e a melhoria da
qualidade de vida das pessoas.
De abril de 2012 até dezembro de 2015, o total de royalties pagos
pela Hidrelétrica Santo Antônio, e divididos de acordo com a forma
descrita acima, soma mais de R$ 126 milhões.
A partir da geração plena, que será atingida com as 50 turbinas
em operação, estima-se que o total de royalties pagos anualmente Em quase três anos, o total de royalties pagos pela usina soma mais de R$ 126 milhões

pela hidrelétrica supere os R$ 100 milhões.


REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 11
USOS MÚLTIPLOS

COMPATIBILIZAÇÃO DO USO
DOS RECURSOS HÍDRICOS:
O CONFLITO ENTRE A GERAÇÃO
HIDRELÉTRICA COM OS DEMAIS
USUÁRIOS DE ÁGUA
Mônica de Aquino Galeano Massera da HORA | Professora e Coordenadora da
Pós-Graduação em Defesa e Segurança Civil - Universidade Federal Fluminense

RESUMO ABSTRACT

A garantia do uso múltiplo da água é um dos objetivos principais da The guarantee of multiple-use water systems is one of the
gestão de recursos hídricos no Brasil. Entretanto, o papel das usinas main objectives of Brazilian water resource management.
hidrelétricas ainda não está claro para o alcance de tal finalidade. However, the role of hydropower plants is still unclear in the
Este artigo apresenta uma metodologia para apoiar a operação das achievement of this objective. This paper introduces a method
usinas hidrelétricas, levando em consideração a compatibilização da to support hydropower plants operation taking into account
geração de energia com possíveis perdas associadas ao atendimento the compatibility of energy generation with possible losses
de demandas de outros usuários, representadas por retiradas de associated in meeting upstream water demands. A case study
água a montante dos aproveitamentos. Como aplicação do método of the Tocantins and Araguaia basins is presented. The results
foi escolhida a bacia dos rios Tocantins e Araguaia. Os resultados obtained corroborate the applicability of the proposed method.
obtidos confirmam a aplicabilidade da metodologia proposta.
12 WWW.CBDB.ORG.BR
1. INTRODUÇÃO São Paulo e Rio de Janeiro adotam o valor de 50% de Q7,10;
Rio Grande do Norte, Ceará e Paraíba adotam o valor de 90%

A
Lei 9.433/1997 trouxe uma inovação na gestão, no de Q90%; Sergipe adota 100% de Q90%; Bahia adota 80% de Q90%
ordenamento e no planejamento do uso da água e Tocantins adota 75% de Q90%. Observa-se que conforme o
nas bacias hidrográficas, principalmente pelos valor de VMO estipulado, alguns órgãos estaduais são mais
instrumentos previstos para implementação da legislação. restritivos do que a ANA, em termos de quantidade de água
Destaca-se, dentre eles, a outorga. A outorga é o instrumento disponível para uso nos rios. Isto ocorre em Minas Gerais,
administrativo e legal do poder público de facultar o uso da São Paulo e Rio de Janeiro, enquanto que outros são menos
água em uma determinada quantidade durante um prazo restritivos como Sergipe, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba,
fixo. De natureza complexa, a outorga tem a função de ratear Bahia e Tocantins.
a água disponível entre demandas atuais e futuras visando o Por outro lado, a concessão de água para outros usos
benefício de um conjunto de usuários nos aspectos econômicos a montante dos aproveitamentos hidrelétricos implica
(p.ex. abastecimento industrial e agrícola), sociais (p.ex. diretamente na redução da geração de energia, uma vez que
abastecimento humano) e de sustentabilidade ambiental. Ela ela é função da vazão afluente, da queda e dos rendimentos dos
respeita ainda a classe em que o curso d’água estiver enquadrado grupos turbina-gerador-transformador, sendo expressa por:
e os seus usos múltiplos (navegação, geração hidráulica de E = f (Qaflu,h,g,η)
energia, recreação, etc).
O presente artigo buscou analisar a compatibilização do onde E representa a energia, em MWh; Qaflu é a vazão
uso da água e da geração hidráulica de energia. Para tanto afluente ao aproveitamento hidrelétrico, em m3s-1; h é a queda
foi simulada a operação de reservatórios de regularização. O líquida, em m; g é a aceleração da gravidade e igual a 9,81
procedimento foi fundamentado com fórmulas matemáticas m3s-2; e η representa o rendimento do grupo turbina-gerador-
que incorporaram os usos múltiplos. Para avaliar a metodologia transformador.
proposta foi desenvolvida a ferramenta computacional Para estimativa da vazão afluente ao aproveitamento
denominada SisUca (Sistema de Simulação de Usinas e Usos hidrelétrico, a Empresa de Pesquisa de Energia (EPE) recomenda
Consuntivos de Água). Como estudo de caso foi escolhida a a adoção do histórico de vazões naturais definido pelo Operador
bacia dos rios Tocantins e Araguaia. Nacional do Sistema Elétrico (ONS), (EPE, 2008 [2]). A vazão
natural é obtida por meio de um processo de reconstituição, e
corresponde àquela que ocorreria em uma seção do rio se não
2. USOS MÚLTIPLOS DOS RECURSOS houvesse as ações antrópicas na bacia contribuinte. Ou seja,
HÍDRICOS se retira os efeitos da operação dos reservatórios existentes a
montante e incorpora as vazões relativas à evaporação líquida
Dada a necessidade do conhecimento do volume de água nos reservatórios e aos usos consuntivos da água a montante do
disponível nos rios para rateio entre demandas de usos atuais e reservatório (ONS, 2007 [3]).
futuros (do conceito de outorga), foi estipulado o termo Vazão Neste caso, os valores referentes aos usos consuntivos são
Máxima Outorgável (VMO), ou seja, máxima vazão disponível oriundos das resoluções publicadas pela ANA, quando da
para os usos múltiplos em rios. Como o uso ilimitado da água emissão da Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica
pode gerar escassez hídrica ou conflitos entre usuários, os (DRDH) (EPE, 2008 [2]). Esta, por sua vez, é transformada
órgãos públicos gestores de recursos hídricos têm adotado, automaticamente em outorga de direito de uso de recursos
como critério conservador, restringir a outorga aos seguintes hídricos à instituição ou empresa que receber a concessão ou
valores de referência: vazões Q95% ou Q90%, obtidas das curvas de a autorização de uso do potencial de energia hidráulica (artigo
permanência no tempo ou, ainda, a vazão Q7,10, menor média 5º da Lei 13.081/2015). A DRDH tem por finalidade reservar
anual em sete dias consecutivos com 10 anos de recorrência ao aproveitamento as vazões médias mensais correspondentes
(ANA, 2007 [1]). à diferença entre a vazão natural no local do empreendimento
A Agência Nacional de Águas (ANA), responsável pela e os usos consuntivos a montante dele (ANA, 2009).
emissão de outorgas em rios de domínio da União, define a Para definição da série de usos consuntivos, a ANA utiliza
VMO como sendo 70% da Q95%. Já os rios de domínio estadual o Sistema para Estimativa de Usos Consuntivos da Água
seguem os critérios definidos pelos seus respectivos órgãos (SEUCA), que gera as séries das vazões de retirada, de retorno
gestores de recursos hídricos. Por exemplo: Minas Gerais, e de consumo em cada município das bacias incrementais que

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USOS MÚLTIPLOS :: COMPATIBILIZAÇÃO DO USO DOS RECURSOS HÍDRICOS: O CONFLITO ENTRE A GERAÇÃO HIDRELÉTRICA COM OS DEMAIS USUÁRIOS DE ÁGUA

compõem uma determinada área de interesse ou DRDH


estudo. O sistema considera as seguintes atividades Q95% VMO
USINA RIO RESOLUÇÃO QUSOS_CONSUNTIVOS(1)
de usos consuntivos: irrigação, abastecimento (M S ) (M3S-1)
3 -1

urbano, abastecimento rural, criação animal e ANA (M S


3 -1
)
abastecimento industrial. Para cada uma delas, as JIRAU MADEIRA Nº 555/2006 90,0 4.789(2) 3.352

vazões geradas são oriundas de informações dos STO. ANTONIO MADEIRA Nº 556/2006 90,0 4.869 (2)
3.408

censos agropecuários, demográficos municipais BELO MONTE XINGÚ Nº 48/2011 11,8 939 (3)
657

e industriais divulgados pelo Instituto Brasileiro


Tabela 2 – Usos consuntivos Q95% e VMO nos locais dos aproveitamentos
de Geografia e Estatística (IBGE) (ONS, 2005 [4]). De posse
hidrelétricos localizados nos rios Madeira e Xingú
da série de usos, cabe ao empreendedor a apresentação do
resultado dos estudos energéticos contendo a energia firme (1) Maior valor observado na série histórica de usos consuntivos.
ou acréscimo de energia firme da usina ao sistema para os (2) Extraído de ANA (2006 [7]).
seguintes cenários de usos consuntivos a montante: sem usos (3) Extraído de ANA (2009b [8]).
consuntivos, com usos consuntivos e com a projeção de usos
consuntivos para o período de concessão do aproveitamento Esta divergência também pode atravessar fronteiras,
hidrelétrico (ANA, 2009a [5]). principalmente quando se tratarem de aproveitamentos
Com base no exposto, cabe destacar os critérios distintos hidrelétricos em rios transfronteiriços, como é o caso do rio
que a ANA adota quando da emissão de uma outorga. Se a Madeira. A reserva de água destinada ao atendimento de outros
emissão for para um usuário que não seja um aproveitamento usos consuntivos a montante das usinas de Jirau e Santo Antonio
hidrelétrico (p.ex. irrigação, indústria ou concessionária de teve caráter bastante restritivo (90 m3s-1), quando comparada
saneamento), o procedimento de análise do pleito da outorga ao valor da VMO calculada nos locais dos aproveitamentos
é função da VMO calculada no ponto onde o usuário se (3.352 e 3.408 m3s-1, respectivamente). Novamente, se observa
instalará. Se o usuário for um aproveitamento hidrelétrico, o a existência de um saldo positivo de água que ainda pode ser
procedimento é função dos resultados dos usos consuntivos utilizado ao longo dos anos pelos demais usuários localizados a
gerados pelo SEUCA, que não incorpora o conceito da montante dos empreendimentos. Entretanto, mais uma vez, se
VMO. Esta divergência de critérios pode assumir distorções verifica que as reservas de disponibilidade hídrica emitidas pela
preocupantes, pois da análise de algumas DRDH publicadas ANA para o setor elétrico restringem esses usos. E, por se tratar
em resoluções da ANA, se observa que os valores de usos de um rio transfronteiriço, os possíveis conflitos decorrentes
consuntivos gerados pelo SEUCA são consideravelmente podem assumir proporções de caráter internacional.
inferiores àqueles passíveis de serem outorgados quando
estimados pela VMO, como ilustrado nas Tabelas 1 e 2. 3. MODELO PROPOSTO PARA
SIMULAÇÃO DA
DRDH
RESOLUÇÃO QUSOS_CONSUNTIVOS*
Q95%** VMO OPERAÇÃO DE USINAS
USINA
ANA (M3S-1)
(M3S-1) (M3S-1) HIDRELÉTRICAS
CANA BRAVA Nº 212/2004 17,76 179 125
A utilização das águas de um reservatório
SÃO SALVADOR Nº 212/2004 17,92 200 140
de uma usina hidrelétrica para outros
PEIXE ANGICAL Nº 212/2004 22,18 347 243
fins ou a diminuição das vazões afluentes,
LAJEADO Nº 212/2004 24,17 439 307
motivada por retiradas de água, reduzem
TUCURUÍ Nº 212/2004 73,10 2.037 1.426 a energia por ela assegurada, (BAJAY et
al., 2008 [9]). Além disso, a restrição das
Tabela 1 – Usos consuntivos Q95% e VMO nos locais dos aproveitamentos vazões afluentes acarreta em perdas de benefícios energéticos e,
hidrelétricos localizados no rio Tocantins consequentemente, financeiros.
No que tange à operação, a usina hidrelétrica é representada
* Maior valor observado na série histórica de usos consuntivos.
pela equação do balanço hídrico, como se segue:
** Extraído de ANA/MAGMA/COHIDRO (2007 [6]).
ΔVi = [Qaflu i − Qturbi − Qvert i − Qevapi ] ⋅ ns

14 WWW.CBDB.ORG.BR
onde ΔVi representa a variação do volume da usina i, em m3; • Nível d´água do reservatório no mês anterior entre o máximo
Qaflu i é a vazão afluente à usina i, em m3s-1; Qturbi é a vazão normal e o máximo maximorum: nesta condição, o reservatório
turbinada na usina i, em m3s-1; Qvert i é a vazão vertida na estaria cheio, então a vazão turbinada seria igual a vazão máxima
usina i, em m3s-1; Qevapi é a vazão evaporada no reservatório turbinável.
da usina i, em m3s-1 e ns representa o número de segundos de A vazão regularizada foi definida como sendo a maior vazão
um mês médio e igual a 2,6298 * 106. turbinada de forma constante, ao longo do período de simulação,
A metodologia proposta por HORA (2008 [10]) buscou durante a condição de enchimento ou deplecionamento do
introduzir uma nova variável representada por retiradas de reservatório. Portanto, ela representa a média das vazões
água (Qusos), limitada à totalidade do valor da VMO. Assim, afluentes do período em que o reservatório estava totalmente
a vazão afluente passará a contabilizar cenários de retiradas cheio (100%), passou pelo instante em que ficou vazio (0%),
de água a montante de cada aproveitamento de uma cascata, e tornou a ficar cheio novamente (100%), sem reenchimentos
permitindo ao usuário avaliar a evolução das possíveis perdas totais intermediários - utilizando, neste intervalo de tempo,
de geração de energia em função do incremento dos usos todo o volume útil do reservatório. Por sua vez, o volume útil do
consuntivos. A vazão afluente a uma usina será expressa por: reservatório da usina i num mês t ( Vutil i,t ) será expresso por:

Qaflu i = Qincri + ∑ Qdeflu k − Qusos Vutil i,t = Vutil i,t−1 + (Qaflu i,t ⋅ ns) − (Qturbi,t ⋅ ns) − Vevap i,t
k∈M
onde Vutil i,t−1 é o volume útil da usina i no mês anterior, t-1, em
Qaflu i =[Qnat i − ∑ Qnat k ]+ ∑ [Qturb k + Qvert k ] − Qusos m3; Qaflu i,t é a vazão afluente à usina i no mês t, em m3s-1; Qturbi,t
k∈M k∈M
é a vazão turbinada na usina i no mês t, em m3s-1 e definida a partir
Qusos ≤ VMO
do nível d´água correspondente ao volume útil do mês anterior;
onde Qincri é a vazão natural incremental no trecho entre Vevapi,t é o volume evaporado na usina i no mês t, em m3.
a usina i e a(s) usina(s) de montante, em m3s-1 (representa a Em resumo, o objetivo da formulação proposta é o de
vazão natural da usina i descontada da vazão natural da usina representar, da melhor forma possível, a operação dinâmica do
de montante k); Qdeflu k é a vazão defluente das usinas de conjunto de usinas de uma cascata em uma bacia hidrográfica,
montante, em m3s-1 (representa a soma das vazões turbinada qual seja: a afluência a uma usina i é função da vazão defluente
e vertida na usina de montante k); Qusos representa a vazão da usina de montante i-1, acrescida da vazão incremental entre
retirada no trecho entre as usinas k e i, em m3s-1 (representa os ambas, levando em consideração as retiradas para outros usos,
usos consuntivos, limitados à VMO, no trecho intermediário limitadas ao valor da VMO, e ainda, os efeitos da evaporação
entre a usina i e a existente imediatamente a montante de i); M na operação do reservatório da usina i.
é o conjunto das usinas imediatamente à montante da usina i. Nas usinas a fio d´água não existe a vazão regularizada,
A produção mensal de energia da usina é representada por: sendo o turbinamento função apenas da vazão afluente limitada
ao engolimento máximo das máquinas. Neste caso, a regra de
E i = 0,00981⋅ ηi ⋅ h i ⋅Qturbi ⋅ n h operação é do tipo “o que entra” é igual ao que “sai”, ou seja:
onde Ei representa a produção média mensal de energia da usina Qdefl i,t = Qaflu i,t − Qevapi,t
i, em MWmês; h i é a queda líquida da usina i, em m; Qturbi é a
vazão turbinada no mês na usina i, em m3s-1; ηi é o rendimento onde Qevapi,t é a vazão evaporada na usina i no mês t, em m3s-1.
do conjunto turbina-gerador da usina i; nh representa o número
de horas de um mês médio e igual a 730,5. 4. PRINCIPAIS RESULTADOS DA
Sob o enfoque da compatibilização do uso múltiplo da SIMULAÇÃO DA OPERAÇÃO
água com a geração de energia, se propõe uma nova regra de
turbinamento, de modo a viabilizar um possível aumento da
DA GERAÇÃO HIDRÁULICA
disponibilidade hídrica para jusante dos aproveitamentos, que ENERGÉTICA
passará a ser definida em dois patamares:
• Nível d´água do reservatório no mês anterior entre o mínimo Para a simulação hidráulica energética do conjunto de usinas
normal e o máximo normal: nesta condição, o reservatório da bacia dos rios Tocantins e Araguaia, foram selecionados os
estaria em fase de enchimento ou deplecionamento, então a seguintes aproveitamentos: Serra da Mesa (SM), Cana Brava
vazão turbinada seria igual a vazão regularizada; (CB), São Salvador (SS), Peixe Angical (PA), Lajeado (L),

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Couto Magalhães (CM), Santa Isabel (SI) e Tucuruí (T), cuja As informações das principais características físicas, hidráulicas
topologia esquemática é mostrada na Figura 1. e energéticas dos aproveitamentos hidrelétricos estão relacionadas
na Tabela 3 e foram extraídas do banco de dados do Sistema
de Informação do Potencial Hidrelétrico Brasileiro (SIPOT) da
Eletrobrás.
Os cenários para atendimento às demandas de água para outros
usos foram estabelecidos a partir de porcentagens da VMO: 25%,
50%, 75% e 100%. A partir destes cenários, foi simulada a operação
hidráulica energética através da utilização do SisUca para as
seguintes condições de contorno:
• Sem retirada de vazões ao longo do período de 1931 a 2006;
• Com retiradas crescentes de 25%, 50%, 75% e 100% da VMO
(primeira usina da cascata) e das parcelas de 25%, 50%, 75% e 100%
da VMO incremental (demais usinas da cascata) da série de vazões
ao longo do período de 1931 a 2006.
Os resultados encontrados, em energia produzida e perdas
decorrentes por uso consuntivo da água, são apresentados na Tabela
4, onde se pode observar a variação da energia média, resultante da
simulação do período de 1931 a 2006, e da energia firme, resultante
da simulação do período crítico do sistema (junho de 1949 a
novembro de 1956). Observa-se que as perdas na bacia hidrográfica
para o conjunto de usinas consideradas variaram entre 2,9% e 12,1%
Figura 1 – Configuração esquemática das usinas na bacia dos rios
para a energia média, e 4,2% e 16,7% para a energia firme.
Tocantins e Araguaia

Potência Queda de Volume NA Normal


NA Normal (m) Volume Útil
Usina Instalada n Referência (hm3)
(hm3)
(MW) (m) Mínimo Máximo Mínimo Máximo
SM 1.275 93,0 117,20 417,30 460,00 11.150,0 54.400,0 43.250,0
CB 471,6 91,0 43,60 333,00 333,00 1.906,1 1.906,1 0,0
SS 280,0 90,0 22,66 287,00 287,00 952,0 952,0 0,0
PA 452,1 92,3 27,71 261,00 263,00 2.223,7 2.223,7 0,0
L 902,5 93,3 29,00 212,30 212,30 4.711,1 4.711,1 0,0
CM 150,0 92,0 145,0 620,00 620,00 46,26 46,26 0,0
SI 1.080 93,0 26,20 125,00 125,00 1.850,0 1.850,0 0,0
T 8.365 93,6 63,35 51,60 74,00 11.292,8 50.275,2 38.982,4

Tabela 3 – Principais características dos aproveitamentos hidrelétricos

Cascata da Bacia dos rios Tocantins e Araguaia


Porcentagem da Retirada da VMO Energia Média Perda na Geração Energia Firme Perda na Geração
(103 MWano) (103 MWano) (%) (103 MWano) (103 MWano) (%)
0% 61.729 0 0,0 49.148 0 0,0
25% 59.940 1.789 2,9 47.103 2.045 4,2
50% 57.979 3.750 6,1 45.046 4.102 8,3
75% 56.081 5.648 9,2 42.979 6.169 12,6
100% 54.258 7.471 12,1 40.955 8.193 16,7
Tabela 4 – Perdas globais na geração de energia pela retirada crescente de vazões para outros usos

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Concomitantemente à perda de energia, o atendimento crescente de em bacias hidrográficas de maior conflito, que passariam a operar
vazões para outros usos a montante de aproveitamentos hidrelétricos de forma diferenciada da praticada pelo setor elétrico. Neste
implica diretamente na redução das vazões regularizadas e, caso, as usinas passariam a ser comandadas pela demanda
consequentemente, na disponibilidade hídrica para jusante, como hídrica da bacia e não pela demanda energética de curto prazo
pode ser observado nos resultados mostrados na Tabela 5. do sistema interligado.

Serra da Mesa Tucurui


Porcentagem
Vazão Regularizada Vazão Reduzida Vazão Regularizada Vazão Reduzida
da VMO
(m3s-1) (m s )
3 -1
(%) (m3s-1) (m3s-1) (%)
0% 627,9 0 0 3.030,7 0 0
25% 601,5 26,4 4,2 2.699,1 331,6 10,9
50% 574,9 53,0 8,8 2.367,6 663,1 21,9
75% 548,5 79,4 13,8 2.036,1 994,6 32,8
100% 523,3 104,6 19,1 1.706,2 1.324,5 43,7

Tabela 5 – Impacto da redução da vazão regularizada pela retirada crescente de vazões para outros usos

Nota-se, ao analisar a Tabela 5, que a redução da vazão 6. PALAVRAS-CHAVE


regularizada em Tucuruí é expressiva quando as retiradas
para outros usos alcançam 100% da VMO. Cabe ressaltar a Vazão máxima outorgável, perda de energia, SisUca, SEUCA.
importância da existência dos reservatórios de regularização
que atenuam a redução da disponibilidade hídrica para
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
jusante, já que nos aproveitamentos a fio d´água a redução da
vazão afluente e da disponibilidade hídrica são diretamente
[1] AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS – ANA (2007) – “Diagnóstico da
proporcionais.
Outorga de Direito de Uso de Recursos Hídricos – Fiscalização dos Usos de Recursos
Hídricos no Brasil (Caderno de Recursos Hídricos, 4)” – Distrito Federal – DF, 166p.
5. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES [2] EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA – EPE (2008) – “Metodologia
de Cálculo da Garantia Física das Usinas – EPE–DEE–RE–099/2008-r0” – Rio de
No que tange à repartição da água, o atendimento crescente Janeiro – RJ, 15p.
de vazões para os demais usos múltiplos implica diretamente [3] Operador Nacional do Sistema – ONS (2007) – “Atualização de Séries
na redução da produção de energia. A redução na energia Históricas de Vazões – Período 1931 a 2006 – ONS RE-3/237/2007 R1” – Rio de
firme pode comprometer o cumprimento dos contratos de Janeiro – RJ, 34p.
concessão. Assim sendo, é importante que o concessionário [4] Operador Nacional do Sistema – ONS (2005) – “Estimativas das Vazões para
tenha a real noção de que o seu empreendimento poderá as Atividades de Uso Consuntivo da Água em Bacias do Sistema Interligado Nacional
não atender, futuramente, à energia contratada. É vital a – SIN” – Rio de Janeiro – RJ, 205p.
definição de regras claras que não venham a penalizar os [5] AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS – ANA (2009a) – “Manual de Estudos
concessionários nem a prejudicar os demais usuários de de Disponibilidade Hídrica para Aproveitamentos Hidrelétricos – Manual do
recursos hídricos. Usuário” – Distrito Federal – DF, 45p.
Recomenda-se que as energias asseguradas e, portanto, [6] AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS/CONSÓRCIO MAGMA ENGENHARIA
as garantias físicas, sofram revisões a cada período, de LTDA./COHIDRO CONSULTORIA ESTUDOS E PROJETOS – ANA/MAGMA/
modo a atualizar possíveis reduções e preparar o setor COHIDRO (2007) – “Plano Estratégico de Recursos Hídricos da Bacia dos Rios
elétrico, de maneira adequada, ao planejamento dos Tocantins e Araguaia – Relatório do Diagnóstico – Anexo 9 – Disponibilidade Hídrica
novos empreendimentos para expansão da geração. É Superficial – Nº 1329-R-FIN-PLD-15-01” – Distrito Federal – DF, 69p.
aconselhável que sejam desenvolvidos estudos para avaliar [7] AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS – ANA (2006) – “Nota Técnica
os possíveis impactos energéticos e econômicos advindos n.º 100/2006/GEREG/SOF-ANA – Reserva de disponibilidade hídrica para os
destas reduções. aproveitamentos hidrelétricos Santo Antônio e Jirau, localizados no rio Madeira” –
Sugere-se, por fim, que a regra de operação proposta seja adotada Distrito Federal – DF, 64p.

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USOS MÚLTIPLOS :: COMPATIBILIZAÇÃO DO USO DOS RECURSOS HÍDRICOS: O CONFLITO ENTRE A GERAÇÃO HIDRELÉTRICA COM OS DEMAIS USUÁRIOS DE ÁGUA

[8] AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS – ANA (2009b) – “Nota Técnica


n.º 129/2009/GEREG/SOF-ANA – Reserva de disponibilidade hídrica para o
Mônica de Aquino Galeano Massera da Hora
aproveitamento hidrelétrico Belo Monte” – Distrito Federal – DF, 59p.
[9] BAJAY, S. V.; OLIVEIRA, I. M.; DOMINGUES, P. C. M.; CONTI, A. M.; Engenheira Civil formada pela Universidade Federal
ROCHA, G. P.; SUGAI, M.; GONDIM FILHO, J. G. C.; BARRETTO, L. A. L.; Fluminense com mestrado e doutorado em Engenharia
VIEIRA JUNIOR, M. (2008) – “Avaliação da Atual Metodologia de Cálculo da Civil pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, área de
Energia Assegurada de Usinas Hidrelétricas” – Revista PCH Notícias & SHP News, Concentração de Recursos Hídricos. Professora Adjunta
IV do Departamento de Engenharia Agrícola e do Meio
Itajubá – ano 9, nº 36, pp.24-28.
Ambiente da Escola de Engenharia e Coordenadora do
[10] HORA, M. A. G. M – HORA (2008) – “Metodologia para a Compatibilização
Programa de Pós-Graduação em Defesa e Segurança Civil
da Geração de Energia em Aproveitamentos Hidrelétricos com os demais Usos da Universidade Federal Fluminense. Possui 30 anos de
dos Recursos Hídricos. Estudo de Caso: Bacia Hidrográfica do Rio Tocantins” – experiência na área de Projetos de Usinas Hidrelétricas
Dissertação (Doutorado em Engenharia Civil) – Universidade Federal do Rio de com ênfase em Hidrologia, Gestão de Recursos Hídricos e
Janeiro – Rio de Janeiro – RJ, 143p. Sedimentologia Fluvial.

18 WWW.CBDB.ORG.BR
SEGURANÇA DE BARRAGENS

IMPACTOS DA REGULAMENTAÇÃO
E IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA
NACIONAL DE SEGURANÇA DE
BARRAGENS NO SETOR MINERAL
Luiz Paniago NEVES | Geólogo, Mestre, Especialista em Segurança de Barragens

RESUMO ABSTRACT

A Lei nº 12.334, de 20 de setembro de 2010, a qual estabeleceu The Law nº 12.334 of September 20, 2010, which established the
a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) no Brasil, National Dam Safety Policy in Brazil, delegated to the regulatory
delegou aos órgãos fiscalizadores de alguns setores governamentais agencies of some government departments tasked to surveillance
a incumbência de inspecionar e criar regulamentos sobre o tema and create regulations on the subject to its audited dams. Specifically
para suas barragens vistoriadas. O Departamento Nacional de the National Department of Mineral Production (DNPM),
Produção Mineral (DNPM) regulamentou os artigos 8º, 9º, 10º, 11º regulated the Articles 8, 9, 10, 11 and 12 of the said Law, creating
e 12º da citada Lei, criando novas atribuições aos empreendedores new assignments to entrepreneurs in order to improve the safety
no sentido de aprimorar a gestão da segurança das barragens de management Mining Dams for it audited. This paper aims to
mineração fiscalizadas pelo órgão. O presente trabalho tem por compare the management and consequently security of mining dams
objetivo comparar a gestão e, consequentemente, a segurança das before the enactment of the laws on the subject with the current
barragens de mineração antes da promulgação das legislações scenario. For this, the Critical Risk was used as base of this study
sobre o tema diante do cenário atual. Para tal, se utilizou o Risco using the comparative methodology between the pre and post data
Crítico (RC) como balizador deste estudo. Usou-se a metodologia entry into force of normative legal acts. In the study it was found that
comparativa entre os dados pré e pós entrada em vigor dos atos with the implementation of the laws, there has been a qualitative
normativos legais. Com o estudo foi possível constatar que com improvement in the management and reduction of critical risk of
a implementação das legislações, houve melhora qualitativa na mining dams, these audited by the DNPM.
gestão e diminuição do Risco Crítico das barragens de mineração
fiscalizadas pelo DNPM. Keywords: Dam Safety, regulation, surveillance, Critical Risk

Palavras-chave: Segurança de Barragens, regulamentação,


fiscalização, Risco Crítico.

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 19


SEGURANÇA DE BARRAGENS :: IMPACTOS DA REGULAMENTAÇÃO E IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE SEGURANÇA DE BARRAGENS NO SETOR MINERAL

1. INTRODUÇÃO grandes empreendimentos de barragens. Porém, em sua grande


maioria, eram para uso múltiplo. Na década de 70, foram

O
elaborados muitos projetos e executadas obras de barragens
histórico legal sobre Segurança de Barragens no
com ênfase para a geração de energia (Usina Hidrelétrica de
mundo remonta a décadas passadas onde, por
Sobradinho, Tucuruí, Itaipu e Balbina).
exemplo, em Portugal, a legislação sobre o tema é de
No contexto da mineração, o “boom mineral” ocorrido nos
1990. Entretanto, nas últimas décadas houve uma crescente
anos 2006/2007 promoveu alterações substanciais no cenário
preocupação a respeito do assunto e com a necessidade de uma
existente até então. O citado “boom” fez com que os preços das
maior participação do Estado brasileiro. É fato que as barragens
commodities se elevassem fazendo com que as escalas de produção
são de grande importância para o desenvolvimento de
das minas aumentassem, bem como dando oportunidade para
qualquer sociedade (armazenamento de água para os diversos
a abertura de novas minas. Por consequência, as barragens de
usos, regularização de vazão, geração de energia, retenção de
rejeito de mineração existentes tiveram que ser “alteadas” e
resíduos minerais e/ou industriais). Contudo, essas estruturas
até mesmo novas barragens de rejeitos foram construídas. De
podem aumentar a exposição da sociedade, das infraestruturas
maneira análoga, os empreendimentos industriais seguiram a
e dos locais existentes à jusante daquelas, a níveis de riscos
mesma tendência.
considerados relevantes.
Após a promulgação da Lei 12.334/2010, em 21 de setembro
Especificamente em relação às empresas de mineração, é
do citado ano, e das regulamentações por parte dos órgãos
sabido que diversas companhias de grande, médio ou pequeno
responsáveis, em especial o DNPM, (em 03 de setembro de
porte já detinham a essência do tema de Segurança de Barragens
2012 e em 11 de dezembro de 2013 o DNPM regulamentou
inseridas em seu cotidiano. Entretanto, adequações se fizeram
todos dispositivos legais a ele imputados), foi possível fazer
necessárias com o advento da referida lei. Outras empresas
um comparativo de como estava a gestão de Segurança das
que não detinham esta temática em sua essência tiveram que
Barragens por ele fiscalizadas e como ficou esta gestão após a
se adequar seguindo o exposto na legislação vigente (tanto em
publicação dos citados dispositivos legais. Essa comparação é
relação à lei quanto aos seus consequentes regulamentos).
de grande importância para se poder constatar se a criação/
A inserção legal do Brasil na temática de Segurança de
promulgação de uma lei (e seus regulamentos - com o fim de
Barragens se deu com a promulgação da Lei n.º 12.334, de 20
aumentar a segurança das barragens) atingiu seu objetivo e se é
de setembro de 2010, quando os diversos órgãos fiscalizadores
necessário aperfeiçoar/retificar tais atos legais.
foram inseridos no assunto, como a Agência Nacional de Águas
(ANA), a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL),
o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos 2. DESENVOLVIMENTO
Naturais Renováveis (IBAMA) e seus órgãos descentralizados,
e o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). As Pelo fato do presente trabalho abordar uma análise
instituições de inspeção tiveram que, de acordo com obrigações pioneira, haja vista a recente publicação dos normativos que
advindas da Lei 12.334/2010, criar Resoluções e Portarias com o regulamentaram o tema, o estudo histórico e literário se baseou
fim de regulamentar alguns artigos da citada legislação federal. nas legislações de outros países, além de projetos de lei e
No País, dentre os motivos que levaram a aglutinação de legislações brasileiras.
esforços para a elaboração e aprovação da Lei nº 12.334/2010, Em Portugal, foi publicado o Decreto-Lei nº 11 em 6 de
cabe destaque ao reconhecimento do elevado nível de janeiro de 1990. Ele versa sobre a regulamentação geral e
problemas de natureza organizacional, responsável pelo estado ampla de segurança das barragens no país. Já em 1993, ainda
geral de abandono de milhares de barragens brasileiras, com em Portugal, foi publicado um regulamento mais direcionado
vulnerabilidades latentes em projetos, construção e operação às pequenas barragens. Nos Estados Unidos, o tema começou
de estruturas existentes. No Nordeste, as barragens eram a ser tratado e regulamentado desde 1920, no estado da
projetadas para a condição de máximo aproveitamento do vale, Califórnia, mas foi estruturado anos depois com as agências
com a formação de grandes reservatórios de água. Os projetos federais, como o U.S. Army Corps of Engineers (USACE) e o
eram elaborados tendo como prioridade a utilização da água Departamento de Interior. Durante o início do século XX,
para o consumo humano e dessedentação de animais, sendo foram construídas muitas barragens e institucionalizadas
as atividades de irrigação e de geração de energia consideradas diversas normas de segurança.
secundárias. Durante as décadas de 70 e 80 foram construídos Os projetos de lei analisados serviram como arcabouço e

20 WWW.CBDB.ORG.BR
estrutura para a elaboração da publicada Lei nº 12.334/2010, do empreendimento, os planos e procedimentos (operação,
assim como a legislação estadual (Decreto nº 10.752/1977, manutenção, inspeção, monitoramento e instrumentação),
São Paulo). Todos estes seguiam a metodologia de gestão os registros e controles (operação, manutenção, inspeção,
continuada nas barragens e sugeriam auditorias regulares nas monitoramento, instrumentação, bem como os testes de
estruturas. equipamentos hidráulicos, elétricos, mecânicos e etc.), os
relatórios de inspeção (regulares e especiais, caso haja), além
2.2 OBJETIVO da revisão periódica de segurança da barragem e o Plano de
Ação de Emergência de Barragem de Mineração (PAEBM) -
O objetivo deste trabalho é fazer um comparativo de como este quando exigido.
estava a gestão da Segurança de Barragens de mineração antes Para classificar uma barragem (nos termos da Resolução
da promulgação da Lei nº 12.334/2010 e seus regulamentos com CNRH nº 143/2012), é necessário somar os itens do quadro de
o cenário atual, após a implementação destes atos normativos categorização de uma barragem para o quesito Risco Crítico
legais. Tendo em vista que o marco temporal para poder executar (que contempla três itens, com 17 subitens), somar os subitens
o comparativo alvo do estudo em tela foi a partir de 21 de setembro do Dano Potencial Associado (que contém um item com quatro
de 2010, se analisou o banco de dados do DNPM das barragens subitens) e verificar suas pontuações de acordo com o range de
de mineração antes da referida lei e seus regulamentos, e as pontos atingido. Deste modo, a barragem será catalogada em
informações colhidas após cinco anos de sua implementação. As baixo, médio ou alto, tanto em relação a seu Dano Potencial
informações alvo de comparação são semelhantes e permitem Associado quanto ao seu Risco Crítico. Destes parâmetros,
fazer um comparativo seguro e confiável. as barragens são classificadas em A, B, C, D ou E, de acordo
A Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) com uma matriz Dano Potencial versus Risco Crítico. A
tem como instrumentos de aplicação (art. 6º): o sistema de matriz elaborada pelo DNPM e descrita na Portaria DNPM nº
classificação de barragens por categoria de risco e por dano 416/2012 é explicitada na figura 01 a seguir.
potencial associado; o Plano de Segurança de Barragem
(PSB); o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de
Barragens (SNISB); o Sistema Nacional de Informações sobre
o Meio Ambiente (Sinima); o Cadastro Técnico Federal de
Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental; o Cadastro
Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras
ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, e o Relatório de
Segurança de Barragens.
Um ponto importante da lei foi a delimitação de quais
estruturas estariam ou não dentro da PNSB. Para que uma
barragem esteja dentro da PNSB deve atender a Lei nº
12.334/2010 em plenitude. Ou seja, ela deve apresentar pelo FIGURA 1 – Classes das barragens de mineração de acordo com Portaria
menos uma das seguintes características: DNPM nº 416/2012. Fonte: Portaria DNPM nº 416/2012 – anexo I
a. Altura do maciço, contada do ponto mais baixo da
fundação à crista, maior ou igual a 15 m (quinze metros); Conforme o art. 4º da Resolução CNRH nº 143/2012, quanto
b. Capacidade total do reservatório maior ou igual a à categoria de risco, as barragens serão classificadas de acordo
3.000.000m³ (três milhões de metros cúbicos); com aspectos da própria barragem que possam influenciar na
c. Reservatório que contenha resíduos perigosos conforme possibilidade de ocorrência de acidente. São levados em conta
normas técnicas aplicáveis; critérios como: características técnicas (englobando a altura
d. Categoria de Dano Potencial Associado (DPA), médio do barramento, o comprimento do coroamento da barragem,
ou alto, em termos econômicos, sociais, ambientais ou de o tipo de barragem quanto ao material de construção, o tipo
perda de vidas humanas, conforme definido no art. 6o. de fundação da barragem, a idade da barragem, o tempo de
O PSB é um instrumento criado pela Lei nº 12.334/2010 recorrência da vazão de projeto do vertedouro); estado de
com o intuido de maximizar a gestão da Segurança das conservação da barragem (abrangendo: confiabilidade das
Barragens. Ele contempla, ao menos, as informações gerais estruturas extravasoras; confiabilidade das estruturas de adução;
da barragem e do empreendedor, a documentação técnica eclusa; percolação; deformações e recalques; deterioração
REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 21
SEGURANÇA DE BARRAGENS :: IMPACTOS DA REGULAMENTAÇÃO E IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE SEGURANÇA DE BARRAGENS NO SETOR MINERAL

dos taludes); Plano de Segurança da Barragem (englobando: 2.2 RESULTADOS E DISCUSSÕES


existência de documentação de projeto da barragem; estrutura
organizacional e qualificação dos profissionais da equipe Dentre as incumbências atribuídas aos empreendedores de
técnica de segurança da barragem; procedimentos de inspeções barragens expressas na Portaria DNPM nº 416/2012 está a de
de segurança e de monitoramento; regra operacional dos cadastrar as barragens de mineração existentes, estejam elas
dispositivos de descarga da barragem; relatórios de inspeção em construção, operação ou em desativação. Para as Barragens
de segurança com análise e interpretação). de Mineração (BM) que não se enquadram na PNSB, a única
O Dano Potencial Associado de uma barragem, que é obrigação a estes empreendedores imputada pela portaria supra,
outro critério usado na citada resolução para a classificação está a de cadastrar suas estruturas no DNPM.
de uma barragem, é o dano que pode ocorrer devido a De 2010, quando se obteve o primeiro diagnóstico das
eventual rompimento, vazamento, infiltração no solo ou mau barragens geridas pelo DNPM, até maio de 2015, é possível
funcionamento de uma barragem, independentemente da constatar que houve significativo acréscimo delas no cadastro
sua probabilidade de ocorrência, podendo ser graduado de do órgão. Em 2010 existiam 243 BMs cadastradas no DNPM
acordo com as perdas de vidas humanas e impactos sociais, ante as 661 atualmente existentes no mesmo cadastro. Houve
econômicos e ambientais. É um fator não tão gerenciável pelo um acréscimo de 418 BMs tanto nas barragens inseridas na
empreendedor como o Risco Crítico, tendo em vista que o DPA PNSB quanto nas barragens fora da citada política. Contudo, em
é inerente a “o que está abaixo da barragem”. O Risco Crítico 2012, ano da entrada em vigor da Portaria DNPM nº 416/2012
se refere a “como a barragem está sendo cuidada e gerida”. Para e já com dois anos em vigor da Lei nº 12.334/2010, é possível
se classificar o DPA, é preciso levar em consideração o uso e a constatar um acréscimo da ordem de 10% no cadastro de 2012
ocupação atual do solo. para 2015 (de 594 para 661 BMs cadastradas), explicitando que
Para o foco deste trabalho, a definição de barragens de o aumento não foi tão vertiginoso quanto de 2010 para 2012
mineração é a explicitada no artigo 2º da Portaria DNPM (ver figura 02).
nº 416/2012: “barragens, barramentos, diques, reservatórios, Não foi possível comparar as BMs inseridas na PNSB em
cavas exauridas com barramentos construídos, associados 2010 com as de 2012 e 2015 pelo fato de que o cadastro do órgão
às atividades desenvolvidas com base em direito minerário, àquela época não detinha as informações necessárias para poder
utilizados para fins de contenção, acumulação ou decantação saber se a citada estrutura está ou não na referida política.
de rejeito de mineração ou descarga de sedimentos provenientes
de atividades em mineração, com ou sem captação de água
associada, compreendendo a estrutura do barramento e suas
estruturas associadas”.
Neste trabalho se analisou o quadro de classificação referente
ao Risco Crítico de modo a se comparar o “antes” e o “depois”
da vigência da lei, suas resoluções e portarias. Tal metodologia
foi aplicada tendo em vista que a barragem de mineração estará
instalada próxima à unidade mineira, a qual está relacionada com a
presença do minério e não com a conveniência de sua construção.
Divergentemente das barragens de uso múltiplo e energia elétrica
que podem ser construídas com maior flexibilidade, as barragens
de mineração são construídas de acordo com a implantação deste
complexo mineiro e a rigidez locacional da jazida. Por este fato, FIGURA 2 – Barragens de Mineração cadastradas no DNPM nos anos
não se tem gerência sobre o que estará a jusante dessa estrutura. de 2010, 2012 e 2015
Portanto, não seria didático e prático analisar algo que não
atenderia ao estudo proposto. A análise se ateve na gestão das Outro ponto notório na análise dos dados é que o estado
estruturas estudadas para verificar se a gestão e a segurança das de Minas Gerais continua tendo o maior quantitativo de BMs
citadas barragens de mineração melhoraram ou pioraram após a no País. Em 2010, representava 45% das barragens cadastradas.
entrada em vigor das referidas legislações. Em 2015, apresenta 48%, conforme figuras 03 e 04 a seguir.

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FIGURA 3 – Barragens de mineração cadastradas no DNPM
subdivididas por estado (2010)

FIGURA 5 – Barragens de mineração classificadas por seu Risco


Crítico (2012)

FIGURA 4 – Barragens de mineração cadastradas no DNPM


subdivididas por estado (2015)

Para o comparativo sobre os itens de Risco Crítico e


Dano Potencial Associado só foi possível executá-lo com o
banco de dados de 2012 e 2015. O comparativo com o banco
de dados de 2010 não foi possível pelo fato de a Resolução
CNRH nº 143/2012, a qual definia os critérios e itens para a
classificação das barragens, ter sido publicada em setembro de
2012, impossibilitando tal análise temporal. Contudo, foram
analisados os bancos de dados de 2012 e de 2015.
Das 362 BMs inseridas na PNSB dentro do cadastro de 2012,
FIGURA 6 – Barragens de mineração classificadas por seu Risco
36 estavam com Risco Crítico alto, perfazendo 9,94% do total, e
Crítico (2015)
das 401 que se tem em 2015, 28 estão com RC alto, dando 7,1%
do total. A redução é de cerca de 3%. Para Risco Crítico baixo,
Outra análise realizada partiu da avaliação pontual de dez
tivemos um aumento de 3% (85% frente 88%) ante um Risco
mineradoras detentoras de BMs que já estavam no cadastro
Crítico médio que se manteve estatisticamente no mesmo
em 2012 e 2015. Nelas foi verificada a evolução na gestão
patamar de 4,7%. Tais dados mostram que houve migração
de segurança através do Risco Crítico destas estruturas
do Risco Crítico alto para o baixo, conforme demonstram os
temporalmente. Para verificar esta evolução ou involução,
gráficos das figuras 05 e 06.
vistorias in loco em todas as citadas estruturas foram efetuadas.
REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 23
SEGURANÇA DE BARRAGENS :: IMPACTOS DA REGULAMENTAÇÃO E IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE SEGURANÇA DE BARRAGENS NO SETOR MINERAL

Das dez estruturas analisadas em 2012 e em 2015, ocorreu fato de os dados que munem esse item (Dano Potencial Associado)
evolução na gestão da segurança em oito empreendimentos. serem independentes da citada gestão. A barragem está onde o
Ou seja, o risco de colapsos ou problemas nestas estruturas foi minério está, independente do que está a jusante da estrutura. Do
minimizado em três anos. As duas estruturas que não tiveram mesmo modo, o que está a jusante do barramento ali permanecerá.
evolução qualitativa, mantiveram suas posições (Risco Crítico Dificilmente uma cidade ou infraestrutura será retirada pelo fato de
baixo nas duas) pois já detinham em seu cotidiano a Segurança existir uma barragem a montante dessas ocupações.
de Barragens como premissa. Estas citadas estruturas tiveram
apenas que se adequar à legislação, substancialmente em sua
forma: organização e apresentação de registros e documentos.
A tabela 01 resume os dados coletados nas vistorias,
representando o nome das barragens por letras, a fim de manter
o sigilo dos empreendedores analisados.

Risco Crítico
Barragem de Mineração
2012 2015
A médio baixo
B baixo baixo
C alto baixo
D alto médio
E médio baixo
F médio baixo
G alto baixo
H baixo baixo
FIGURA 8 – Barragens de mineração classificadas por DPA (2015)
I médio baixo
J alto médio
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tabela 01 – Comparativo de dez barragens de mineração classificadas por seu
Risco Crítico nos anos de 2012 e 2015
Depreende-se dos dados analisados e resultados apresentados
que, notoriamente, a promulgação da Lei nº 12.334/2010,
e consequentemente as resoluções do CNRH e as Portarias
regulamentadoras do DNPM, promoveram aumento na qualidade
da gestão das barragens de mineração. Dois anos após a promulgação
da lei, o cadastro do DNPM cresceu 145%. E, após a entrada em vigor
das portarias, houve acréscimo de 10% neste quantitativo. O cadastro
do DNPM foi majorado mostrando que existiam estruturas que não
estavam sendo gerenciadas pelo órgão.
Entretanto, o item mais importante alcançado com o estudo
proposto foi o fato de que houve diminuição percentual do Risco
Crítico das BMs. Ocorreu decréscimo percentual de 3% nas BMs
classificadas com Risco Crítico alto, e consequentemente aumento
percentual, também em 3%, das BMs classificadas em Risco Crítico
baixo (figuras 05 e 06). A comprovação é oriunda da análise do banco
de dados do órgão gestor da segurança das barragens de mineração. Da
FIGURA 7 – Barragens de mineração classificadas por DPA (2012) mesma forma, o estudo avaliou pontualmente dez BMs do cadastro de
2012 e 2015, onde o Risco Crítico destes foi diminuído, ou seja, houve
Analisando os gráficos referentes ao Dano Potencial Associado, migração de Risco Crítico alto para médio ou para baixo (tabela 01).
é perceptível o que foi relatado antes: a análise por Dano Potencial A regulamentação de um tema de tão grande magnitude
Associado não nos permite uma clara conclusão da evolução ou e importância, tanto para os empreendedores quanto para os
involução da gestão da Segurança das Barragens. Isto ocorre pelo fiscalizadores e, especialmente, à sociedade civil, foi essencial. A

24 WWW.CBDB.ORG.BR
entrada em vigor dos dispositivos legais trouxe à tona a necessidade PORTUGAL. Decreto-Lei n. 409. Regulamento de Pequenas Barragens. Lisboa:
de se ter parâmetros para a gestão e a segurança das barragens. Com Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, 1993. Diário da República,

essa homogeneização de procedimentos, a segurança das estruturas 290/93 Série IA, 14 dez. 1993.
PORTUGAL. Decreto-Lei n. 344, 15 out. 2007. Regulamento de Segurança de
foi maximizada e a tendência é que a referida segurança seja sempre
Barragens. Lisboa: Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, 2007.
crescente, de modo a garantir harmonia entre os entes envolvidos
Diário da República, Série 1, n.198, 15 out. 2007.
em um ambiente sustentável. É certo que quem mais ganha com isso Relatório de segurança de barragens 2011. Agência Nacional de Águas. Brasília:
é a sociedade civil, pois o risco para a vida humana e para o meio ANA. (2012).
ambiente são mitigados. Regulatory Impact Analysis: A Tool for policy coherence 2009. OECD Reviews of
Regulatory Reform.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS RODRIGO, D (2005). Regulatory Impact Analysis in OECD Countries. Challenges
for Developing Countries, OECD, Paris.
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CNRH (2012). Resolução nº 143/2012. Seção 1 do D.O.U de 4 de setembro de 2012. Procedure Draft. Washington DC: Engineering and Design, 2003.
CNRH (2012). Resolução nº 144/2012. Seção 1 do D.O.U de 4 de setembro de 2012. VISEU, T.; MARTINS, R. Safety risks of small dams. In: BERGA, L. (Ed.) Dam Safety.
COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS. Guia básico de segurança de barragens. Rotterdam: Balkema, 1998. p. 283-288.
São Paulo: CBDB, 2001. VOGEL, A. Risk classification of dams in relation to a failure-cause-specific break
DNPM (2012). Portaria do Diretor Geral do DNPM nº 416/2012. Seção 1 do D.O.U mechanism. In: BERGA, L. (Ed.) Dam Safety. Rotterdam: Balkema, 1998. p. 377-381.
de 5 de setembro de 2012.
DNPM (2013). Portaria do Diretor Geral do DNPM nº 526/2013. Seção 1 do D.O.U
de 11 de dezembro de 2013. Luiz Paniago Neves
MENESCAL, R. A.; VIEIRA, V. P. P. B.; OLIVEIRA, S. K. F. Terminologia para Geólogo, mestre, especialista em Segurança de Barragens.
análise de risco e segurança de barragens. In: MENESCAL, R. A. (coord.) A segurança Experiências profissionais: Departamento Nacional de
de barragens e a gestão de recursos hídricos. Brasília: Ministério da Integração Nacional, Produção Mineral (DNPM); Especialista em Recursos
2005a. p. 31-49. Minerais; Coordenador de Fiscalização da Pesquisa Mineral;
PALÁCIO DO PLANALTO (2010). Lei nº 12.334/2010. Seção 1 do D.O.U de 21 de Gestor Segurança de Barragens de Mineração e Portarias
setembro de 2010 DNPM nº 416/2012 e 526/2013. Atuou também na IBRAM-
PORTUGAL. Decreto-Lei n. 11, 06 jan. 1990. Regulamento de Segurança de DF, Votorantim Metais e Jardim Botânico de Brasilia. Ministrou
Barragens. Lisboa: Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, 1990. workshop Gestão de Segurança de Barragens de Mineração e
Diário da República, Série 1, n.5, 06 jan. 1990. Cursos de Gestão de Segurança de Barragens de Mineração.

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Anaximandro Steckling MULLER | Engenheiro Civil, M.Sc – Engevix Engenharia S.A.
Diego David BAPTISTA de Souza | Coordenador, M.Sc – Engevix Engenharia S.A.
Guilherme Piaie de Oliveira PALMA | Engenheiro Civil – Engevix Engenharia S.A.

RESUMO ABSTRACT

Este trabalho apresenta o estudo de caso de implantação de This paper presents a case study of a rain-flow model for weather
um modelo chuva-vazão para previsão meteorológica durante forecast during the construction of São Roque HPP, in Canoas
a construção da Usina Hidrelétrica (UHE) São Roque, no rio River, Santa Catarina State. The model was based on artificial
Canoas, estado de Santa Catarina. O modelo foi elaborado com neural networks technique (NARX), and showed great results. The
base na técnica de Redes Neurais Artificiais (RNA) e apresentou flow forecast has allowed anticipating to the site works the flood
ótimos resultados. A previsão das vazões permitiu antecipar à obra events in a weekly basis, adding greater security on the planning
com antecedência semanal os eventos de cheia, agregando maior and construction.
segurança ao planejamento e construção.
26 WWW.CBDB.ORG.BR
1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS Energética S/A. A construção está sendo realizada em regime
Engineering, Construction and Procurement (EPC) pela Engevix

A
construção de uma Usina Hidrelétrica (UHE) Construções S/A, e o projeto executivo está sendo desenvolvido pela
sempre lida com um risco associado a cada uma de Engevix Engenharia S/A.
suas etapas. É o chamado risco hidrológico. Como as A UHE São Roque possui um reservatório de acumulação com
estruturas componentes da usina são construídas no leito do volume útil de 459 hm³, com deplecionamento de 14 m. A barragem
rio e em suas proximidades, elas devem estar protegidas em é em Concreto Compactado com Rolo (CCR) com fechamento
caso de ocorrência das cheias naturais do rio. nas ombreiras em enrocamento com núcleo. A altura máxima da
A proteção dada às estruturas é definida em função de um risco barragem é de 60 m. O vertedouro é de soleira livre, com 390 m de
hidrológico associado, diante do tipo de estrutura, do custo da comprimento e capacidade para passagem da cheia QMP de 12.928
proteção, e do impacto que viria a ser causado em caso de inundação m³/s, sendo um dos maiores vertedouros de soleira livre do Brasil
e/ou ruptura. Também pode ser definida com estudo de mínimo em termos de vazão de projeto. A potência instalada da usina é de
impacto global através do valor esperado do risco. 141,9 MW, dividida em três máquinas Francis.
Assim, mesmo contando com obras de proteção como A Figura 1 apresenta o arranjo geral do empreendimento.
ensecadeiras e/ou septos, as estruturas
de uma usina hidrelétrica estão sujeitas a
galgamentos, rupturas e/ou inundações -
na medida do critério do risco hidrológico
adotado e/ou calculado -, que podem
causar prejuízos financeiros ou de
cronograma. No pior cenário podem
causar ainda mortes de seres humanos.
Torna-se essencial fornecer à equipe
de construção da usina uma previsão
confiável da probabilidade de ocorrência
de eventos de cheia superiores aos previstos
nos critérios de projeto, com antecedência suficiente que permita FIGURA 1 – Arranjo geral do empreendimento
a rápida adaptação da obra, de maneira a evitar e/ou minimizar os
prejuízos. Para a construção da usina, foram planejadas duas fases de
Este artigo apresenta o sistema de previsão de cheias adotado para desvio do rio. Na primeira fase, o rio Canoas foi estrangulado
a construção da UHE São Roque. O sistema se baseia na aplicação através de uma ensecadeira longitudinal (ensecadeira de 1ª fase). No
de um modelo chuva-vazão desenvolvido através do método das recinto ensecado foram construídas as adufas de desvio e parte do
Redes Neurais Artificiais (RNA), calibrado com dados das estações barramento e vertedouro. A Figura 2 apresenta a 1ª etapa de desvio.
pluviométricas e fluviométricas na região
do empreendimento. O artigo apresenta
também exemplo da aplicação deste sistema
para eventos reais de cheia ocorridos
durante a construção da usina.

2. A USINA
HIDRELÉTRICA
SÃO ROQUE
A Usina Hidrelétrica São Roque está
em construção no rio Canoas, em Santa
Catarina, entre os municípios de Vargem
e São José do Cerrito. A concessionária da usina é a São Roque FIGURA 2 - Desvio de 1ª etapa UHE São Roque - modelo 3d
REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 27
HIDROLOGIA :: MODELO DE PREVISÃO DE CHEIAS DURANTE A CONSTRUÇÃO DA UHE SÃO ROQUE

Na 2ª fase de desvio, as águas do rio Canoas foram Para a calibragem das vazões foram utilizados dados
direcionadas para as adufas de desvio através de duas disponíveis de precipitação e vazão. Para a modelagem foi usada
ensecadeiras transversais ao rio (ensecadeiras de 2ª fase). uma rede neural artificial auto-regressiva não linear com entrada
A Figura 3 apresenta a 2º etapa de desvio. O critério de exógena (NARX), que tem sua arquitetura típica apresentada
projeto para o risco hidrológico foi de uma cheia com tempo na Figura 4 [1].
de recorrência de dez anos. As redes neurais do tipo NARX permitem a previsão de
eventos utilizando dados dependentes
(Y) calculados com a própria rede no
horizonte em que se deseja, sendo
esta uma variação das redes neurais
recorrentes [1].

3.1. DADOS DE CALIBRAÇÃO

Para que se obtenha um modelo


capaz de realizar uma boa generalização
é necessário possuir uma grande
quantidade de dados de qualidade. Para
isto foi utilizada a rede de monitoramento
FIGURA 3 – Desvio de 2ª etapa UHE São Roque – modelo 3d hidrológico da Agência Nacional de Águas (ANA) disponível em
http://mapas-hidro.ana.gov.br/.[3].
De maneira a dar suporte ao planejamento da obra, A rede de monitoramento hidrológico da ANA, na bacia do rio
principalmente durante a 2ª etapa de desvio, o projeto de Canoas, conta com cinco estações telemétricas de precipitação com
engenharia elaborou um sistema de previsão de cheias, através atualização a cada 15 minutos: Encruzilhada II, Passo Marombas,
da criação de um modelo chuva-vazão que, com base nas Ponte Alta do Sul, Rio Bonito e Vila Canoas. Na bacia há também
previsões meteorológicas de precipitação dos órgãos oficiais, a estação telemétrica da UHE Garibaldi (que fica logo a jusante da
indica para a obra as previsões de cheia. Assim, possibilita que UHE São Roque) e seus dados de vazão são atualizados a cada hora.
a obra se adeque ao evento com a antecedência necessária. Para a calibração do modelo foi utilizada a precipitação
média na bacia calculada com o método de Thiessen para
3. O MODELO CHUVA X VAZÃO as estações telemétricas. As vazões da UHE Garibaldi foram
corrigidas para a UHE São Roque com a relação das áreas de
A modelagem chuva-vazão da UHE São Roque teve como objetivo drenagem entre elas. Foram usados os dados de 23/06/2013 até
a previsão de vazões para a construção em um horizonte de até uma 30/08/2015.
semana. Para isto foi selecionada a técnica das Redes Neurais Artificiais.
3.2. ARQUITETURA E CALIBRAÇÃO DA NARX

Para a implementação da rede NARX foi utilizado o MATLAB


[2]. O estabelecimento da arquitetura da rede foi feito de maneira
interativa. Buscou-se minimizar o erro das previsões. A arquitetura
que melhor atendeu a este critério foi a com os dados de precipitação
e vazão de três períodos antecedentes, e com dez neurônios na
camada oculta e um neurônio na camada de saída. Na Figura 5 é
apresentado o esquema da arquitetura determinada.
Para a calibração, os dados foram divididos em 70% para calibração,
15% validação e 15% teste. Para o ajuste dos pesos foi utilizado o
algoritmo Levenbergb - Marquardt backpropagation. Na Figura 6 são
FIGURA 4 – Rede NARX com três neurônios ocultos apresentados os resultados do treinamento da rede NARX.

28 WWW.CBDB.ORG.BR
O processo de calibração da rede obteve o melhor resultado para
a 5ª época de ajuste dos pesos, apresentando um R² de 0,98. Para a
validação e teste da calibração os R² foram, respectivamente, 0,95 e 0,98.
Após calibração, validação e teste, a arquitetura da rede é
modificada para aplicação na previsão em um horizonte de mais de
um dia. Para estas situações, os valores de vazão são os calculados pela
própria rede. Na Figura 7 é apresentada a arquitetura modificada.

FIGURA 7 – Arquitetura rede NARX para a aplicação

4. APLICAÇÃO
O procedimento em aplicação consiste em semanalmente
encaminhar para a obra a previsão de vazões e níveis do rio Canoas
FIGURA 5 – Arquitetura rede NARX para a calibração na região do empreendimento. Essa previsão é acompanhada
diariamente e a cada mudança significativa nas previsões hidro-

meteorológicas são revisados os resultados e comunicados à obra. As


etapas de aplicação do monitoramento são descritas a seguir.

4.1. PREVISÃO DE PRECIPITAÇÃO

A previsão dos dados de precipitação é obtida a partir do site do


Centro de Informações de Recursos Ambientais e de Hidrometeo-
rologia de Santa Catarina (CIRAM), no endereço http://ciram.epagri.
sc.gov.br/. [4]. Para cada uma das 17 cidades estações na bacia do rio
FIGURA 6 – Resultado da calibração Canoas contribuintes para a UHE São Roque se determina a previsão

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 29


HIDROLOGIA :: MODELO DE PREVISÃO DE CHEIAS DURANTE A CONSTRUÇÃO DA UHE SÃO ROQUE

de precipitação média na bacia com o método de Thiessen. a. Execução do CCR de 2ª etapa em patamares
Os dados de previsão de precipitação são coletados com
o horizonte de sete dias no início de cada semana, e vão sendo A adoção de um planejamento da execução do CCR em diversos
gradativamente atualizados ao longo deste período. As previsões patamares possibilita que, no caso de ocorrência de algum evento de
podem ser drasticamente alteradas, sendo este o fator limitante da galgamento, a produção não seja interrompida, uma vez que existem
precisão do modelo. blocos em elevações acima do nível da água do evento de cheia.
Os acessos da obra para a barragem foram também otimizados de
4.2. PREVISÃO DE VAZÕES maneira a permitir este trabalho com a barragem CCR em diferentes
níveis. A Figura 9 ilustra a execução do CCR 2ª etapa com a adoção
de patamares.
Com a vazão anterior obtida a partir do Sistema de Monitoramento
Hidrológico da ANA e com a previsão de precipitações médias
b. Execução da ensecadeira de jusante para acesso
na bacia, os cálculos são efetuados com o modelo chuva-vazão.
Determinam-se, então, as previsões de vazões na região da UHE São
Para permitir a continuidade na execução do CCR no caso de
Roque. Na Figura 8 são apresentados os resultados da aplicação do
galgamentos foi executada uma ensecadeira provisória de jusante
modelo para o mês de setembro com a precipitação aferida.
para promover o acesso dos equipamentos. A
Figura 10 ilustra a ensecadeira executada.

c. Retirada de equipamentos de injeção da laje


de montante

Com o monitoramento dos níveis da água e a


previsão de vazões é possível realizar a retirada dos
equipamentos e materiais utilizados na execução
das injeções da laje de montante do CCR com a
FIGURA 8 – Aplicação do modelo chuva x vazão adequada antecedência.

4.3. AVALIAÇÃO DE NÍVEIS

Após determinar a previsão de vazões na UHE São Roque, os


níveis de água na região são avaliados tendo por base as curvas-chave
zde cada etapa de desvio. Tomando esses níveis como parâmetros é
possível verificar a suscetibilidade de galgamentos das ensecadeiras
existentes e o comportamento dos níveis a montante e jusante do
empreendimento. Para o caso de galgamento da barragem CCR são
consideradas as elevações da barragem atualizadas semanalmente
pela obra. A partir desta análise é realizada a comunicação ao
empreendedor e à equipe de obra para que os mesmos tomem as FIGURA 9 – Construção barragem CCR em patamares
devidas providências caso haja indícios de galgamento.

4.4. ADOÇÃO DE MEDIDAS MITIGADORAS

O acompanhamento frequente dos eventos de cheia e a


previsão de vazão colaboraram para a segurança da obra
durante a 2ª etapa do desvio, permitindo mitigar os prejuízos
causados por eventuais eventos de cheia.
No caso da UHE São Roque podemos citar algumas medidas
tomadas pela construção para enfrentar os eventos de cheia. FIGURA 10 – Ensecadeira provisória de jusante

30 WWW.CBDB.ORG.BR
4.5. EVENTO DE CHEIA 26/09/15 A 30/09/15 O trabalho apresentou, ao final, o relato do evento de cheia do
término de setembro de 2015, o que ocasionou o galgamento do
No dia 24/09/15, tendo por base as previsões de precipitação, foi trecho rebaixado da barragem CCR. A previsão confiável desta
enviado para a obra um alerta de evento de cheia para o período cheia permitiu à obra planejar antecipadamente as ações a serem
de 26/09/15 – 30/09/15. As estimativas indicavam que as vazões tomadas, como, por exemplo, a retirada de equipamentos e pessoal.
afluentes na UHE São Roque causariam galgamento dos blocos do Assim, garantiram a segurança de todos durante o evento. A medida
CCR na margem esquerda provocando uma sobrelevação do N.A a permitiu ainda a retomada rápida das atividades.
montante na cota 721,0 m.
Conforme pode ser observado nas Figuras 11 e 12, o evento 6. PALAVRAS-CHAVE
previsto ocorreu e provocou o galgamento dos blocos de CCR em
uma sobrelevação na cota 720,97 m. Modelo chuva x vazão, hidrologia, redes neurais, previsão
meteorológica, UHE São Roque.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] HAYKIN, S. (1994) “Neural Networks – A Comprehensive Foundation”, New
York: Macmillan College Publishing Company;
[2] MATLAB (2015) “Neural Network Toolbox Documentation”. Disponível
em: <http://www.mathworks.com/access/helpdesk/help/toolbox/nnet.shtml?BB=1>
Acesso em julho. 2015.
[3] Rede de monitoramento hidrológico da agencia nacional de águas (ANA).
FIGURA 11 – Galgamento CCR 27/09/2015 Disponível em:<http://mapas-hidro.ana.gov.br> Acesso de Julho a Setembro 2015.
[4] Centro de Informações de Recursos Ambientais e de Hidrometeorologia de
Santa Catarina (CIRAM) Disponível em:< http://ciram.epagri.sc.gov.br> Acesso de
Julho a Setembro 2015.

Anaximandro Steckling Muller


Graduado em 2007 em Engenharia Civil pela Universidade
Estadual de Santa Catarina. Mestre em 2011 em Engenharia
Hidráulica e Sanitária pela Escola Politécnica da Universidade de
São Paulo. MBA em Gerenciamento de Projetos pela Fundação
Getúlio Vargas. Possui oito anos de experiência em projetos
FIGURA 12 – Galgamento CCR 27/09/2015 hidráulicos com principal foco em usinas hidrelétricas. Exerce
função de Engenheiro e coordena projetos na empresa Engevix
Engenharia S.A. no departamento de Hidráulica e Hidrologia.
5. CONCLUSÕES
Diego David Baptista de Souza
Engenheiro Civil pela Universidade Federal do Paraná com
O presente trabalho apresentou a sistemática de previsão
mais de 15 anos de experiência em projetos de energia, usinas
meteorológica desenvolvida para fornecer subsídio à construção da hidrelétricas e recursos hídricos. Mestre em Engenharia de
UHE São Roque. Recursos Hídricos e Ambiental pela mesma instituição. MBA
Para tanto foi desenvolvido um modelo chuva x vazão baseado em Gerenciamento de Projetos, MBA em Gestão Empresarial
e MBA do setor elétrico, todos pela Fundação Getúlio Vargas.
na técnica de Redes Neurais Artificiais. O modelo foi calibrado com Atua na Engevix Engenharia como Project Manager de
dados de chuva das estações pluviométricas telemétricas disponíveis Contratos e Propostas. É coordenador da área de Hidráulica e
na bacia do empreendimento. Também foram usados dados de vazão do departamento de Projetos Civis. Professor de Hidráulica no
curso de Engenharia Civil das Universidades Estácio. Possui
determinados através das réguas instaladas no empreendimento
certificado Project Manager Professional.
e medidos na estação fluviométrica da UHE Garibaldi, localizada
Guilherme Piaie de Oliveira Palma
imediatamente a jusante da UHE São Roque.
Graduado em 2014 em Engenharia Civil pela Universidade
O modelo apresentou resultados excelentes no processo de Federal de Santa Catarina. Exerce função de Engenheiro na
calibração na previsão de vazões, fornecendo para a construção empresa Engevix Engenharia S.A. atuando no departamento
previsões consistentes das cheias com antecedência semanal. de Hidráulica e Hidrologia.

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 31


ENERGIA

ASPECTOS ECONÔMICOS,
TÉCNICOS E GESTÃO DE
RISCOS NA IMPLANTAÇÃO
DE EMPREENDIMENTOS –
UMA VISÃO DE ACIONISTA
Cleber José de CARVALHO | Cia Energética de Minas Gerais S.A.
Flávio Dutra DOEHLER | Cia Energética de Minas Gerais S.A.
Octávio Viggiano Barbosa Nascimento de SOUZA | Aliança Geração de Energia S.A.

RESUMO ABSTRACT

A gestão do Grupo Cemig, hoje com 200 empresas, requer The head of the Cemig Group, today holding 200 companies,
atendimento a preceitos de sua estratégia. No caso de projetos de requires adherence to precepts of their strategy. For projects of
geração de energia, são adotados modelos de gestão de participação, power generation, management models of participation, even
mesmo quando não há controle societário. Este trabalho apresenta o when there is corporate control are adopted. This paper presents
gerenciamento de um megaprojeto de Usina Hidrelétrica, por meio the management of a hydroelectric megaproject, by monitoring
do monitoramento e análise financeiros, de engenharia e de meio and analyzing financy, engineering and environmental aspects
ambiente, na visão do acionista. Uma equipe de analistas técnicos, under the shareholder point of vew. A staff of technical analysts,
apoiada por áreas especializadas da Cemig, avalia sistematicamente supported by specialized areas of Cemig, systematically evaluates
as informações da Sociedade de Propósito Específico (SPE). Após the informations provided by the SPC, comparing them with the
compara-as com o previsto no seu Plano de Negócios da participação the original Cemig participation in the business plan, to seek
para buscar soluções de problemas em comitês da SPE. É uma solutions for questions coming from the SPC committees. It is a real
verdadeira ferramenta de gestão de projetos inserida na governança project management tool inserted in the SPC corporate governance
corporativa, visando à preservação da qualidade Cemig. in order to preserve the Cemig standard of quality.
32 WWW.CBDB.ORG.BR
1. INTRODUÇÃO 2.2. O EMPREENDIMENTO

A
implantação de empreendimentos de geração deve O empreendimento prevê a construção em quatro sítios:
ser acompanhada pelo empreendedor acionista, Pimental, Belo Monte, Canal de Derivação e Diques. O sítio
considerando variáveis do projeto, tais como o seu Pimental consiste em uma barragem no rio Xingu, no estado do
porte e o montante a ser investido, dentre outras. O modelo Pará, com uma casa de força complementar e um vertedouro,
de gestão adotado no escopo desse trabalho visa atender à localizados cerca de 40 km a jusante da cidade de Altamira. Este
necessidade dos acionistas ativos, ou seja, aqueles que buscam complexo forma o reservatório principal.
influenciar positivamente na implantação do projeto. O resultado A partir desse reservatório, a água será desviada pelo Canal de
esperado de sua operação deve ser a elevação da capacidade dos Derivação, com 20 km de extensão, para formar o reservatório
tomadores de decisão do trabalho. Isto ocorre com o subsídio intermediário, na região denominada Volta Grande do Xingu.
técnico e estratégico na seleção de alternativas viáveis acerca O reservatório intermediário será formado com a construção
do empreendimento, trazendo assim uma efetiva vantagem de 28 diques e três barragens. A área total dos dois reservatórios
competitiva para a preservação da taxa de retorno do projeto e a será de 478 km², dividida entre os municípios de Vitória do
prevenção do conflito de agência. Xingu (248 km²), Brasil Novo (0,5 km²) e Altamira (267 km²),
As informações para subsidiar o investidor que irá realizar o sendo 359 km² do reservatório principal situado no rio Xingu
acompanhamento podem ser apresentadas por meio de relatórios e 119 km² no reservatório intermediário formado fora da calha
de avanço físico e financeiro do empreendimento, fornecido pelo do rio Xingu.
agente responsável pela implantação. O vertedouro terá 18 comportas de 20 m x 22,3 m, com
É importante que essas informações sejam verificadas por capacidade máxima de vazão de 62.000 m³/s. Será construído
profissionais capacitados para atestar o avanço no campo e adjacente à barragem um sistema de transposição de peixes.
monitorar a qualidade das entregas, bem como a identificação A usina terá duas casas de força. A casa de força principal será
de riscos técnicos e não técnicos que podem impactar o construída no sítio Belo Monte e terá 18 turbinas tipo Francis,
empreendimento. Os impactos podem ser positivos ou com potência instalada total de 11 mil MW, vazão máxima de
negativos. Oportunidades pertencem ao primeiro grupo. Já as engolimento de 13.950 m³/s e queda líquida de 87 m. A casa de
ameaças são características da segunda opção e podem alterar força complementar será construída no sítio Pimental e terá seis
significativamente a qualidade, os custos e os prazos. turbinas Kaplan de eixo horizontal, com potência total instalada
A proposta do trabalho é customizar o controle, alinhado com de 233,1 MW, queda líquida de 11,4 m e vazão máxima turbinada
os anseios das principais partes interessadas no empreendimento. de 2.268 m³/s.
Foi estabelecido um hidrograma para garantir um nível
mínimo da água no trecho de vazão reduzida, variável ao longo
2. CARACTERIZAÇÃO DO do ano, a fim de assegurar a navegabilidade do rio e as condições
satisfatórias para a vida aquática.
EMPREENDIMENTO – AMAZÔNIA
ENERGIA
3. CARACTERIZAÇÃO DO
2.1. CASO DA PARTICIPAÇÃO DA AMAZÔNIA NO EMPREENDEDOR
EMPREENDIMENTO
O porte do empreendimento, a região na qual ele está inserido
A Amazônia Energia, empresa que tem parte da Cemig Geração e os tipos de sócios ou acionistas participantes, em geral, são
e Transmissão e da Light Serviços de Eletricidade, iniciou sua informações que indicam o nível de controle que deverá ser
participação na Usina Hidrelétrica (UHE) Belo Monte em outubro de aplicado, alinhado com a governança das respectivas empresas.
2011, com a aquisição do percentual de 9,77% do empreendimento.
A partir dessa data, a empresa tomou a decisão de realizar o 3.1. PARTES INTERESSADAS
acompanhamento da implantação por meio de um modelo de gestão
de uma forma prática. A medida tinha o foco no ciclo completo do Destacam-se entre as partes interessadas no projeto: acionista,
investimento, desde a implantação até a operação e a manutenção. empregados do agente responsável pela implantação ou SPE, agente

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 33


ENERGIA :: ASPECTOS ECONÔMICOS, TÉCNICOS E GESTÃO DE RISCOS NA IMPLANTAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS – UMA VISÃO DE ACIONISTA

construtor e agente financiador. O modelo de gestão foi elaborado 3.1.4. AGENTE CONSTRUTOR
com o foco do acionista.
É a empresa responsável pela construção do empreendimento
3.1.1. ACIONISTA e seus subcontratados.

O acionista que detém parte do capital da empresa, seja 3.2. GOVERNANÇA


majoritário ou minoritário, tem interesse no sucesso do
empreendimento. Portanto, deve considerar necessário O objetivo principal da governança é garantir ou recuperar
acompanhar a implantação e a operação, considerando todos a confiabilidade da empresa por meio de mecanismos de
os riscos inerentes. Geralmente, o acionista majoritário monitoramento para assegurar que o comportamento dos
participa da gestão da SPE e deve atender aos requisitos legais gestores esteja sempre alinhado com o interesse dos acionistas.
e de governança da empresa. Dentre as várias características da governança, destaque
para os seguintes aspectos: transparência, responsabilidade,
3.1.2. SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO (SPE) orientação por consenso e aferição dos resultados esperados.

A SPE é a empresa criada para implantação e exploração do 3.2.1. CONFLITO DE AGÊNCIA


empreendimento. Ela deve elaborar um sistema abrangente de
controle e apresentação dos resultados, sobretudo daqueles A relação de agência tem sua origem na separação entre
mais relevantes para o sucesso da implantação e que estão propriedade e gestão. Como consequência desse rompimento,
vinculados à qualidade, custo e prazo. O avanço físico frente surgiu a necessidade de se delegar ao subordinado, o agente,
ao desembolso realizado possibilita uma avaliação mensal do a realização de tarefas ou decisões conforme os objetivos de
andamento do empreendimento. A maioria das informações quem delega: o principal acionista [1].
é oriunda das empresas contratadas para realização dos Entretanto, o agente contratado para maximizar o retorno
serviços, seja qual for a modalidade de contratação. Portanto, financeiro do acionista não deixaria de ter e perseguir seus
é necessário que a SPE tenha equipe capacitada para atestar próprios interesses. Assim sendo, quando estabelecida a
no campo se o avanço físico informado nos relatórios de relação de agência, as decisões realizadas no âmbito da empresa
acompanhamento e nos boletins de medição está de acordo tendem a ser conflituosas e ocorre frequentemente um choque
com o contrato e seus anexos e com o desembolso realizado. entre o que as partes entendem ser o melhor.
Em geral, a SPE utiliza empresas contratadas para Haverá dias em que as decisões maximizam o retorno para o
complementar o serviço, que é um dos mais relevantes tanto acionista e datas em que as definições maximizam os interesses
do ponto de vista técnico quanto sob a ótica do custo da dos gestores executivos.
“engenharia do proprietário”. A grande missão da SPE na fase Para que os interesses das duas partes não entrem em conflito,
de implantação é realizar as entregas previstas nos contratos é preciso adotar ações preventivas. Podemos observar pelo
de concessão e seus anexos rigorosamente dentro do prazo. menos quatro pontos da gestão em que o conflito de agência
vem de encontro aos objetivos dos acionistas: gestão focada no
3.1.3. AGENTE FINANCIADOR curto prazo, autobeneficiamento, diretrizes impactantes não
consensadas e agenda positiva.
Os grandes empreendimentos, em geral, têm uma instituição No plano estratégico, os gestores podem preferir movimentos
financiadora que participa do negócio com a liberação dos mais defensivos, não optando por cartadas de maior risco, que,
recursos financeiros aprovados na fase de formatação do se bem gerenciadas, poderiam resultar em maior retorno para
projeto. Essas instituições liberam o financiamento da obra e o acionista. Dessa forma, os gestores ficam mais protegidos
dos fornecimentos, em parcelas, de acordo com o andamento contra demissões por resultados não alcançados.
do empreendimento. Portanto, o controle da evolução dos Por consequência, ações que atendem mais aos interesses
cronogramas físico e financeiro, bem como o controle de dos gestores podem ser realizadas em detrimento dos interesses
qualidade, são fatores importantes e devem ser considerados do acionista, deixando de alcançar os melhores resultados.
no processo.

34 WWW.CBDB.ORG.BR
4. MODELO DE GESTÃO NA VISÃO DO Para atender à expectativa da principal parte interessada aqui
considerada, o acionista, é necessário elevar a sua capacidade de
ACIONISTA tomar decisões sobre o empreendimento. A SPE, em geral, informa
o ocorrido por meio de relatórios técnicos e administrativos. Essas
O modelo de gestão, Figura 1, elaborado para atender a
informações são analisadas e um relatório é emitido com os registros
necessidade do acionista ativo (aquele que participa ativamente
das impressões e alertas da equipe técnica para o acionista.
do acompanhamento da implantação do empreendimento), tem
As informações com potencial de maior impacto para o
o objetivo de prevenir sobre o conflito de agência, gerenciando
empreendimento são analisadas por meio de ferramentas adequadas
os riscos e analisando a sensibilidade dos impactos no
visando ao esclarecimento do acionista. Ele deve saber os motivos
empreendimento.
do que está acontecendo, qual a tendência em curto e médio prazos,
Como resultado, o modelo de gestão deve fornecer ao acionista,
e quais ações poderiam ser tomadas para mitigação.
de forma antecipada, os impactos relevantes e a estruturação de
O objetivo, portanto, é municiar o acionista com informações
soluções tempestivas. Ele deve fornecer ainda o monitoramento
sobre os riscos e oportunidades, considerando os aspectos técnicos
da coerência entre os avanços físicos e financeiros, alertando o
e econômicos para auxiliá-lo na tomada de decisão.
acionista para os principais riscos e oportunidades. Além disso,
O modelo de gestão coleta as informações necessárias junto
deve estar atento às variações de premissas estabelecidas na origem
à SPE (relatórios técnicos e informações originadas de visitas ao
do plano de negócio, utilizando, quando necessário, o corpo técnico
campo), e realiza a consolidação dessas informações para a emissão
disponível para otimização dos resultados do negócio.
de relatório com registros das
impressões e alertas da equipe
técnica para o acionista.

5. DEFINIÇÃO DA
METODOLOGIA E
RECURSOS

5.1. METODOLOGIA

A metodologia aplicada tem


como base as melhores práticas
do Project Management Institute
(PMI) e do Independent Project
Analysis (IPA). É importante que
a SPE e seus contratados tenham
FIGURA 1 – Resumo do modelo de gestão a cultura da gestão de projetos
para facilitar o controle do acionista. Caso não exista essa cultura
implantada, a estrutura elaborada possibilita preencher essa
Os dados obtidos por meio de relatórios de acompanhamento
lacuna.
elaborados pelo agente responsável pela construção e seus
A Front-End Loading (FEL) [2], desenvolvida pelo IPA, é
contratados são analisados e complementados com visitas
uma metodologia que objetiva a definição detalhada, sequencial
ao campo. O objetivo dessa análise é fornecer aos acionistas
e contínua de um projeto com a finalidade de minimizar as
informações que possam subsidiá-los na tomada de decisões
ameaças e maximizar a confiança dos acionistas na obtenção
sobre o empreendimento em quatro áreas de análise:
do sucesso. Torna-se, dessa maneira, um instrumento eficaz
• Performance econômica-financeira;
para dar suporte à decisão executiva na medida em que confere
• Performance física-financeira,
previsibilidade, responsabilidade, transparência e competitividade
• Riscos;
aos empreendimentos. A metodologia FEL cria condições para que
• Taxa Interna de Retorno (TIR).

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 35


ENERGIA :: ASPECTOS ECONÔMICOS, TÉCNICOS E GESTÃO DE RISCOS NA IMPLANTAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS – UMA VISÃO DE ACIONISTA

os projetos sejam executados otimizando prazo e custo, com maior A análise de risco é realizada com o software @RISK [4]. Cada
segurança e confiabilidade operacional. risco mapeado tem o seu impacto no custo (CAPEX) e no prazo
O PMBOK [3] é um guia de boas práticas em gestão de projetos (cronograma) identificado em três cenários: pessimista, mais
elaborado pelo PMI. Esse guia apresenta as boas práticas para provável e otimista. O software, por meio da simulação de Monte
estruturação de processos e ferramentas que podem ser utilizadas Carlo, realiza diversas interações entre os dados e fornece como
de acordo com a necessidade de cada projeto, sendo, portanto, saída as distribuições probabilísticas de variação do CAPEX e da
bastante flexível e aplicável a todos empreendimentos. data de entrada em operação.

5.2. RECURSOS 5.2.2.2 PLANO DE NEGÓCIO

5.2.1. EQUIPE Consiste em uma planilha de dados estruturada para


possibilitar o acompanhamento do empreendimento. Ela
Os recursos necessários para implantação da metodologia considera que as premissas utilizadas no início da implantação
de acompanhamento considera uma estrutura organizacional sofrem alterações na medida em que o empreendimento
apresentada na Figura 2. As equipes de especialistas são ajustadas avança e podem afetar o resultado. Sendo assim, afeta o
de acordo com o empreendimento. Valor Líquido Presente (VPL) e a Taxa Interna de Retorno
(TIR), indicadores disponibilizados online pela metodologia
proposta no trabalho. É importante ressaltar a necessidade do
acionista de calcular os seus indicadores visto que
o cálculo realizado pela SPE não considera o custo
de capital próprio. Portanto, o empreendimento
tem rentabilidades distintas na visão da SPE e na
visão do acionista.

6. ASPECTOS DE CONTROLE
Os aspectos de controle consideram as nove
áreas do conhecimento do PMBOK mais o plano de
negócio. Os itens escopo, tempo, custo, qualidade,
recursos humanos, comunicação, risco, aquisição e
integração são analisados em ciclos do PDCA.
FIGURA 2 – Estrutura organizacional para o modelo

6.1. ESCOPO
5.2.2. FERRAMENTAS
O controle do escopo na visão do acionista está focado
5.2.2.1 OFFICE 365 no avanço físico do empreendimento. A Figura 3 considera,
portanto, que toda infraestrutura necessária para a construção
Foram adotados o Microsoft SharePoint On-line que possibilita a está sendo realizada e não entrará no controle.
criação e o gerenciamento de sites customizados para o empreendimento
e para a equipe, e o Microsoft Office 365 para melhorar a segurança dos 6.2. TEMPO
acessos e a possibilidade de compartilhar e editar documentos em
tempo real com outros usuários, bem como sincronizar documentos O acompanhamento do cronograma averigua a entrada
com a sua estação de trabalho e arquivar na nuvem. em operação de cada unidade geradora nas datas contratuais.
A escolha do Office 365 levou em conta a facilidade de operação A partir do cronograma da SPE são selecionadas as
do programa. Não é necessário ter conhecimento avançado de macroatividades para elaborar um novo cronograma na visão
Tecnologia da Informação (TI) para usá-lo. Qualquer usuário com do acionista, no qual é visualizado o empreendimento numa
conhecimento básico pode configurar e usar seus recursos. quantidade reduzida de atividades.

36 WWW.CBDB.ORG.BR
6.5. RECURSOS HUMANOS

A avaliação dos indicadores de saúde e segurança


do trabalho deve ser realizada pela SPE de forma
especial porque impacta diretamente na imagem da
empresa.

6.6. COMUNICAÇÃO

O plano de comunicação contém as informações


necessárias ao acompanhamento do projeto. Essas
informações são disponibilizadas tempestivamente
ao acionista por meio do site. Os documentos
técnicos e contratuais, as atas de reuniões do
conselho de administração e dos comitês técnicos,
disponibilizados pelo agente responsável pela
implantação, são analisados para emissão do
relatório mensal.

6.7. RISCO

As análises de risco são realizadas considerando


as premissas vigentes no plano de negócio. Os
riscos são identificados, qualificados, quantificados
e acompanhados.

6.8. AQUISIÇÃO
FIGURA 3 – Avanço físico-financeiro
O acompanhamento da aquisição de materiais e serviços deve
ser realizado considerando o alinhamento, prioritariamente, com
6.3. CUSTO as aquisições que impactam a qualidade, o custo e o prazo de
implantação do empreendimento.
A análise de custo deve buscar atender às premissas
estabelecidas no plano de negócio considerando a implantação
e a operação. Entretanto, variações no prazo de implantação, na 6.9. INTEGRAÇÃO
qualidade e no custo da operação impactam significativamente o
retorno para o acionista. A visão de curto prazo frequentemente A integração das áreas que participam da implantação do
exercida pelo agente responsável pela implantação tende a não empreendimento é realizada por meio do site. Lá as informações
considerar essas variáveis no longo prazo. estão disponibilizadas aos técnicos e ao acionista.

6.4. QUALIDADE 6.10. PLANO DE NEGÓCIO

A avaliação da qualidade da implantação deve ser realizada À medida que o empreendimento avança, as premissas podem
pelas equipes técnicas com o objetivo de garantir a segurança ser confirmadas ou alteradas em função de cenários econômicos e
operacional de acordo com o órgão regulador e evitar impactos alterações de projeto necessárias e relevantes. Assim sendo, a TIR
no prazo e no custo. é calculada e os impactos avaliados.

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 37


ENERGIA :: ASPECTOS ECONÔMICOS, TÉCNICOS E GESTÃO DE RISCOS NA IMPLANTAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS – UMA VISÃO DE ACIONISTA

7. ANÁLISE TÉCNICA 8. AFERIÇÃO DA TIR


A análise tem a finalidade de atender a necessidade do acionista O painel da TIR é calibrado a partir do plano de negócios do
de monitorar a TIR, bem como orientá-lo para se posicionar junto acionista (como mostra a Figura 5) para possibilitar aferições
ao conselho de administração da SPE. de sensibilidade de cada variável a partir do resultado do painel
A primeira análise tem um foco de retrovisão, ou seja, avaliação apresentado na Figura 4.
física e financeira do realizado, comparando-as com o estabelecido O painel da TIR divide o projeto em três etapas no tempo: realizado,
nas premissas do plano de negócio na sua origem. A segunda realizado mais premissas futuras e variação das premissas futuras de
análise tem um foco de avaliar a tendência nos meses seguintes, acordo com a análise de risco. Partindo-se do resultado do plano de
tendo como base o realizado. A terceira avaliação tem um foco negócio na origem se obtém a variação da TIR em função dos riscos
de antevisão, ou seja, inclui a análise da variação das premissas relevantes identificados para as fases de implantação e de operação.
estabelecidas no plano de negócios.
O painel apresentado na Figura 4 lista todos os riscos 9. ENTREGAS
identificados. Assim é possível realizar a seleção de um ou mais
riscos. Como resultado aparece a variação do CAPEX e a definição O site do projeto (Figura 6) contém as informações online do
da data de início de operação. acompanhamento, como relatórios, banco de imagens, repositório

FIGURA 4 – Gestão de riscos - Painel de cenários

38 WWW.CBDB.ORG.BR
FIGURA 5 – Painel da TIR
10. CONCLUSÕES
de documentos, dashboard, agenda do projeto e reuniões técnicas Considerando que:
e do conselho de administração. • O acionista necessita ter visão ampliada contemplando todo
O site do empreendimento disponibiliza também o painel o ciclo de vida do empreendimento (implantação, operação e
dinâmico de aferições de sensibilidade na TIR com base nos descomissionamento);
cenários de riscos identificados. Os itens de maior impacto são • A SPE fornece ao acionista somente informações básicas sobre
listados no painel de questões com o objetivo de demonstrar o a implantação do empreendimento;
resultado das análises de ação direta do acionista, já priorizadas • Há conflito de agência entre o acionista e a SPE;
pela ação da equipe própria. • O acionista deve se posicionar de maneira segura quanto ao
empreendimento;
• As obras, por vezes,
sofrem atrasos e sobrecusto,
é plausível analisar algumas
conclusões.
Sendo assim, o acionista
deve realizar um controle
próprio e eficiente do empre-
endimento para se certificar
da situação real com o objetivo
de ampliar a visão fornecida
pela SPE. O acionista deve
ter capacidade de antever os
riscos e agir preventivamente.
Ele tem que confrontar as
informações geradas pela SPE
com as da sua equipe própria,
melhorando a capacidade
de tomar decisões junto ao
conselho de administração e
mitigando o risco do conflito
de agência.

FIGURA 6 – Tela principal do site da Amazônia Energia

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 39


ENERGIA :: ASPECTOS ECONÔMICOS, TÉCNICOS E GESTÃO DE RISCOS NA IMPLANTAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS – UMA VISÃO DE ACIONISTA

11. AGRADECIMENTOS
Cleber José de Carvalho
Agradecemos às empresas Amazônia Energia, Cemig e Light Na Cemig desde 1983, atuou na área de segurança de
barragens até 1997 e no Laboratório de Solos até 2006 como
pela permissão e oportunidade de publicar esse trabalho. Eng. geotécnico e coordenador. A partir de 2006, como
coordenador das atividades relativas à prestação de serviços de

12. PALAVRAS-CHAVE Engenharia do Proprietário para empreendimentos de geração


e de transmissão. A partir de 2013, participou da implantação
do Empreendimento Belo Monte para Amazônia Energia até
agosto de 2015. A partir de agosto de 2015 está atuando como
Visão do acionista, análise de risco, taxa interna de retorno, coordenador da Engenharia do Proprietário para implantação
implantação. do empreendimento de Itaocara.

Flávio Dutra Doehler


13. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Flávio Dutra Doehler, Engenheiro Civil (1984), MSC Engª
Nuclear (2003), Bel. Direito (2010), UFMG, Brasileiro, casado,
[1] COSENZA, J.P.; ALEGRÍA, A.I.Z.; LAURENCEL, L.C. Implicações 54 anos, atual Sup. de Novos Negócios da Cemig; 29 anos
na empresa no desenvolvimento e implantação de (i) UHEs:
da caracterização principal-agente nas abordagens de preços de transferência.
N Ponte, Miranda, Igarapava, Irapé, P. Estrela (102MW),
Revista Contabilidade Vista & Revista, ISSN 0103—734X, Universidade Federal Queimado (105MW), Funil (150MW), Aimorés (330MW),
de Minas Gerais, Belo Horizonte, v. 22, n. 3, p. 127-162, jul./set. 2011. Baguari (140MW), B. Monte (11.233MW), S. Antônio
(3.568MW) e Itaocara (150MW), Tapajós (8.000MW) e UTEs
[2] GIBSON, G. E. Jr; PAPPAS, M. P. Preproject Planning Processes and
e (ii) de LTs, destaque para Transchile/210km/230KVa. Dois
Project Scopes of Work. In: GIBSON, G. E. Jr; PAPPAS, M. P. in conjunction anos responsável pela Engª de manutenção de UHEs, LTs e SEs.
with the Federal Facilities Council Standing Committee on Organizational
Octávio Viggiano Barbosa Nascimento de Souza
Performance and Management. Starting Smart – Key Practices for Developing
Engenheiro Industrial Mecânico, certificado como Project
Scopes of Work for Facilities Projects. Washington, D.C.: The National Academies Management Professional (PMP) e pós-graduando em Gestão
Press: 2003. p. 14-26. Estratégica com ênfase em Finanças. Possui mais de nove
anos de experiência em empreendimentos de grande porte
[3] PMI (2012), A Guide to the Project Management Body of Knowledge,
nas áreas de geração e transmissão de energia. Atualmente
5th Ed. realiza o monitoramento da implantação do projeto da UHE
[4] Site do @Risck – www.palisade-br.com Belo Monte e do Complexo Eólico Santo Inácio na visão dos
acionistas Aliança Energia.

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GEOLOGIA DE ENGENHARIA

PCHs INDAIAZINHO E INDAIÁ


GRANDE: UM CASO DE INTERAÇÃO
GEOLOGIA - ENGENHARIA
NA CONCEPÇÃO DAS OBRAS
Zsolt Miklós GOMBOSSY | Geólogo - SZIKLA Geologia de Engenharia Ltda.
Sérgio Solino RAMOS | Engenheiro Civil - HE Consultoria de Engenharia Ltda.
David Prado PULINO | Engenheiro Civil - HE Consultoria de Engenharia Ltda.
Gustavo Barros MATTOS | Engenheiro Eletricista - Omega Energia Renovável

RESUMO ABSTRACT

As Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) Indaiazinho e Indaiá The Indaiazinho and Indaiá Grande Small Power Plants were built
Grande foram implantadas no rio Indaiá Grande, perto da borda in the Indaiá Grande river, near the northwest border of the Paraná
noroeste da Bacia Sedimentar do Paraná, no estado de Mato Grosso. Sedimentary Basin, in the Ma-to Grosso state. Their foundations are
Suas fundações estão no derrame basáltico inferior da formação Serra in the lowest basaltic layer of the Serra Geral Formation, immediately
Geral, imediatamente acima do arenito Botucatu, principal compo- above the Botucatu sandstone, the main component of the Guarani
nente do Aquífero Guarani, que se estende ao Paraguai, Uruguai e Aquiferous, that reaches Paraguay, Uruguay and Argentina lands.
Argentina. As desfavoráveis características hidrogeomecânicas deste The unfavorable hydrogeomechanical characteristics of this contact
contato exigiram forte interação entre Geologia e Engenharia para demanded a strong interaction of Geology and Engineering to define
definir a posição espacial das casas de força, cuja escavação mais the power house’s spatial location, which deepest excavation could
profunda poderia criar risco de prazo e custo de construção. Este be a risk to the construction schedule and cost. This geological
condicionamento geológico prevaleceu na concepção final das conditioning prevailed on the overall conception of the plants,
usinas, inclusive em seus equipamentos de geração. including the generation equipments.
REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 41
GEOLOGIA DE ENGENHARIA :: PCHs INDAIAZINHO E INDAIÁ GRANDE: UM CASO DE INTERAÇÃO GEOLOGIA - ENGENHARIA NA CONCEPÇÃO DAS OBRAS

1. INTRODUÇÃO 2. CARACTERÍSTICAS GERAIS


DAS USINAS

A
s Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) Indaiazinho
e Indaiá Grande pertencem à Omega Energia Renovável
2.1 RESUMO DOS ESTUDOS E PROJETOS
e possuem potência instalada de 12,5 e 20,0 MW, res-
pectivamente. Elas foram implantadas no rio Indaiá Grande,
O trecho do rio Indaiá Grande onde estão implantadas as PCHs
no município de Cassilândia, no Mato Grosso do Sul, 70 km
foi primeiramente estudado em 2000, quando a Empresa Energética
a oeste de sua sede, distando 10 km uma da outra (Figura 1).
do Mato Grosso do Sul (Enersul) emitiu os estudos de inventário
hidrelétrico do rio Sucuriú, identificando cinco aproveitamentos
no rio Indaiá Grande, seu afluente esquerdo. A primeira versão
do projeto básico foi apresentada à Agência Nacional de Energia
Elétrica (ANEEL) em 2004.
Após algumas trocas de concessões entre 2005 e 2008,
foram elaborados e apresentados ao órgão os correspondentes
projetos básicos consolidados. Seguiu-se a contratação dos
projetos executivos e das obras, que consumiram 20 meses até
o início da operação comercial, em setembro de 2012.

2.2 EVOLUÇÃO DAS CONCEPÇÕES

A evolução da concepção das PCHs é mostrada nas Figuras 2 e


FIGURA 1 - Localização das PCHs Indaiazinho e Indaiá Grande 3 − ambas com o projeto básico à esquerda e a versão consolidada
(Google Earth®)

Pela proximidade da borda


noroeste da Bacia Sedimentar
do Paraná, as fundações das
casas de força estão junto a
base do mais inferior derrame
basáltico da formação Serra
Geral, imediatamente acima do
arenito da formação Botucatu,
principal compo-nente do
Aquífero Guarani.
As características hidro-
geomecânicas do contato entre
essas formações geológicas
exigiram forte interação das
disciplinas de Geologia e
Engenharia para a definição
da posição espacial das casas
de força − até mesmo dos
equipamentos de geração − e,
indiretamente, também dos
vertedouros.

FIGURA 2 - PCH Indaiazinho: evolução do arranjo geral

42 WWW.CBDB.ORG.BR
– onde houve problemas impostos
pelo nível piezométrico do arenito −
permitiu trazer à escala local os dados
regionais do mesmo mapa.
As cotas piezométricas foram
confrontadas com as do terreno natural:
460 a 430 m na PCH Indaiazinho e
430 a 400 m na PCH Indaiá Grande.
Confirmou-se o risco de as escavações
das casas de força − mais profundas
e originalmente previstas nas Els.
425 e 393 m − atingirem o topo do
arenito, podendo comprometer o
ritmo e o custo das obras. Era preciso
que as fundações resultassem acima
do contato arenito-basalto para que
a espessura preservada deste último
compensasse, sem controle artificial, a
subpressão do artesianismo. Impunha-
FIGURA 3 - PCH Indaiá Grande: evolução do arranjo geral se detalhar a posição e as características da faixa de contato. Ao final das
à direita − e sempre num mesmo enquadramento topográfico. Sua numerosas sondagens rotativas, o cenário geológico ficou caracterizado
parte superior evidencia que os eixos de barramento não sofreram conforme a Figura 4 e o texto que a segue.
mudança muito expressiva e a inferior destaca que as estruturas de
concreto tiveram sua posição significativamente modificada. A razão
disso está nas casas de força, pois elas foram as primeiras estruturas a
ter sua posição redefinida para onde o topo do arenito Botucatu fosse
mais profundo. Daí decorreu a posição dos vertedouros − ditada
também por aspectos hidráulicos – e das barragens de terra, que
respeitaram uma distância segura da cabeceira da cachoeira presente
nas duas PCHs.

3. CARACTERÍSTICAS GEOLÓGICAS
DO MACIÇO ROCHOSO
FIGURA 4 - Seção geológica pelo circuito hidráulico de geração das PCHs
3.1 RESUMO DAS INVESTIGAÇÕES REALIZADAS
3.2 BASALTO
Como as usinas estão junto à borda noroeste da Bacia Sedimentar
do Paraná, o primeiro passo no desenvolvimento dos projetos básicos O mesmo derrame basáltico está presente nas duas obras, mas
consolidados foi analisar detidamente o mapa hidrogeológico do somente a sua porção densa cinza-escura, de textura fina, livre das
Aquífero Guarani [1]. Ele contém, à escala 1:2.500.000, um detalhado típicas juntas-falhas, geralmente situadas sob o pacote vesicular-
estudo desta unidade geológica, com valiosos dados sobre a posição do amigdalóide superior. A espessura que remanesceu da erosão e do
topo do arenito Botucatu e de suas linhas isopiezométricas, com curvas intemperismo varia de 35 a 40 m, conforme o relevo natural, por
de nível a cada 400 e 100 m, respectivamente – as que o mapa permite. cima, e o topo do arenito Botucatu, por baixo. A faixa superficial do
Essa primeira atividade evidenciou que ambas as PCHs se situam maciço, com até 4,5 m de espessura, é relaxada, semidecomposta,
numa região em que o topo do arenito está ao redor da El. 400 m, muito fraturada e certamente muito permeável, pois os ensaios de
com cota piezométrica abaixo da El. 450 m e no limite provável de seu perda d’água foram frequentemente impedidos justamente pelo
artesianismo surgente. A análise de outras obras implantadas na área intenso fraturamento. Essa faixa relaxada ainda abriga o lençol

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 43


GEOLOGIA DE ENGENHARIA :: PCHs INDAIAZINHO E INDAIÁ GRANDE: UM CASO DE INTERAÇÃO GEOLOGIA - ENGENHARIA NA CONCEPÇÃO DAS OBRAS

freático, quando não a base do solo residual. Logo abaixo dela,


porém, o maciço rapidamente ganha altos índices de qualidade
hidrogeomecânica (permeabilidade, sanidade, consistência e
fraturamento).
As fraturas do basalto se dividem equitativamente em
suborizontais e subverticais conchoidais, raramente inclinadas,
como é típico dos basaltos densos. Imediatamente acima do
contato com o arenito, está presente o também típico e delgado
horizonte de basalto vesicular-amigdalóide, semidecomposto,
intensamente fraturado e muito permeável – onde novamente os
ensaios foram em boa parte impedidos. FIGURA 6 - Níveis piezométricos no arenito Botucatu (PCH Indaiá Grande)

3.3 ARENITO Diante da pequena variação mostrada pela figura acima,


se admitiu que os níveis piezométricos estavam estabilizados
Nos primeiros metros de seu topo, o arenito é muito friável, entre as Els. 408 e 405 m, coerentes com as indicadas no mapa
sendo que as sondagens rotativas quase sempre recuperaram hidrogeológico regional [1]. Significava que a carga piezométrica
apenas amostras lavadas contendo areia fina, solta, marrom (Figura média atuante na base do basalto denso na área da casa de força
5). Sua parcela rochosa foi mais bem recuperada e amostrada em seria da ordem de 30 mca, estaticamente compensável pela
apenas três sondagens, mas ainda como um material brando, preservação de cerca de dez metros deste material nas escavações.
amarelo claro, pouco estratificado horizontalmente e com textura Mesmo sem leituras contínuas, a situação era semelhante na
fina, bem selecionada. PCH Indaiazinho. A diferença era que, ali, os níveis piezométricos
giravam em torno da El. 436 m, embora com os mesmos 30 mca
sobre a área da casa de força. Os piezômetros foram preservados
ao final das obras, permitindo leituras por algum tempo após o
enchimento dos reservatórios.
Na PCH Indaiazinho, o topo do arenito, interpretado com base
nos resultados das diversas sondagens, está situado ao redor da
El. 425 m sob o leito do rio, rebaixando-se para montante à El.
FIGURA 5 - Aspecto típico da faixa de contato basalto denso-arenito 405 m na área da casa de força e tornando a se elevar à El. 410 m
a montante da cachoeira. Descontando uma presumível espessura
Ensaios Standard Penetration Test (SPT) no topo fragilizado de cinco a 10 m de blocos soltos de basalto imediatamente a
do arenito revelaram índices bastante elevados – como 10/5, 13/6. jusante e abaixo dessa cachoeira, se concluiu que sua base também
–, correspondentes a um material muito compacto. A experiência está ao redor da El. 420 m e que o topo do arenito está ali exposto,
em outras obras implantadas em cenário geológico similar, porém, embora submerso.
mostra que ele é franca e rapidamente erodível se exposto a fluxo Este cenário vinculou o arenito não só à evolução da cachoeira
de água, mesmo quando com consistência ainda mais elevada, em si como ao consequente relaxamento sofrido pelo basalto
dada a sua fraca cimentação. Os ensaios de perda d’água foram nas duas margens a jusante dela: o caráter friável dos sedimentos
dificultados pela instabilidade dos furos depois de atingido o eólicos os torna facilmente erodíveis pelo fluxo do rio, criando
arenito, até impedidos em algumas sondagens. A permeabilidade “negativos” que abrem as fraturas subverticais, permitindo a
revelada foi de 3,5 a 4,0x10-4 cm/s – mas certamente bem mais penetração da água superficial e resultando na oxidação que se
alta, como visto em outras obras implantadas em cenário similar, viu nas amostras das sondagens. Num grau mais intenso de
coerentemente com sua característica de aquífero. relaxamento do basalto, a água contida no arenito tende a se elevar
Em ambos os aproveitamentos, dois furos de sondagem foram por tais fraturas, aliviando a pressão piezométrica antes incidente
usados para instalar piezômetro tipo Casagrande no topo do arenito, e fazendo-a ter equilíbrio com o nível do rio. Por fim, num grau
mas apenas na de Indaiá Grande foi possível sistematizar as leituras – extremo de influência da presença do arenito, os blocos e prismas
ainda assim por breve período. Elas constam no gráfico da Figura 6, do basalto situados sobre o arenito cedem sob seu próprio peso,
no qual se nota que os níveis piezométricos decresciam ligeiramente dando início a novo ciclo evolutivo da cachoeira.
com a estiagem, caracterizando a área como zona de recarga. Já na PCH Indaiá Grande, o topo do arenito está situado em

44 WWW.CBDB.ORG.BR
torno da El. 360 m sob o leito do rio, segundo uma sondagem a 4.3 BARRAGENS DE TERRA
montante da cachoeira. Como a base dela está ao redor da El. 400
m, esta diferença de 40 m indica ausência de relação com o arenito. Como já comentado, as alterações do eixo das barragens de terra
em ambas as margens dos dois aproveitamentos decorreram de
Na região da casa de força, o topo do arenito vai ganhando cotas
simples geometria, buscando alcançar os pontos topograficamente
progressivamente mais altas, alcançando a El. 410 m no trecho mais elevados a partir dos componentes em concreto.
final da barragem de terra à direita. Ele desenha em planta uma
superfície convexa bastante evidente. Sua geratriz, por assim dizer,
mostra uma inclinação de 8° com a horizontal para leste, coerente 5. IMPLICAÇÕES NOS PROJETOS
com o que se dá em escala regional da bacia sedimentar como um MECÂNICOS
todo, mas não necessariamente o reflexo local disso.

Em paralelo ao crescente conhecimento geológico e ao


4. IMPLICAÇÕES NOS PROJETOS CIVIS desenvolvimento dos projetos civis, se avançava também na
seleção dos equipamentos de geração das casas de força, buscando
4.1 CIRCUITOS DE GERAÇÃO
alternativas que exigissem fundações mais rasas – e, portanto,
verticalmente mais afastadas da faixa de contato basalto-arenito
O cenário hidrogeológico descrito no item anterior
–, sem deixar de levar em conta os inerentes aspectos de custo.
representou um forte condicionante para o desenvolvimento
Verificou-se que, com o resultado das investigações, essa limitação
dos projetos básicos consolidados e, depois, para a parte
deixou de existir, mesmo para as máquinas de eixo vertical, pois
civil dos projetos executivos. Conforme se obtinham dados
o nível de implantação mais baixo da estrutura como um todo foi
das novas sondagens, os da etapa anterior foram sendo
previsto cerca de 10 m acima dele.
continuamente reavaliados, num crescente conhecimento
do cenário hidrogeológico local. Isso foi particularmente
importante para as estruturas do circuito de geração, cujo 6. ALGUNS ASPECTOS
posicionamento espacial foi sendo sucessivamente redefinido CONSTRUTIVOS
até situá-las fora da faixa de 100 m em que o maciço basáltico
estava relaxado − evitando, também, expor o arenito nas
escavações mais profundas das casas de força. Também se As escavações foram monitoradas por empresa especializada em
avaliaram hidraulicamente alternativas para os canais de fuga, controle de vibrações e lograram preservar a “laje” de basalto
resultando nos arranjos finais já mostrados nas Figuras 1 e 2. denso nos cerca de 10 m acima das fundações das casas de força,
A experiência com outras obras implantadas em cenário geológico até nos poços de esgotamento e drenagem – de posição ainda mais
similar também contribuiu sobremaneira para o estágio alcançado profunda. A Figura 7 exibe alguns momentos das duas obras.
ao final dos trabalhos. Notoriamente, a influência do arenito começa
a se manifestar mesmo alguns metros acima de seu topo, devido à 7. CONCLUSÕES
pressão piezométrica que atua nas fraturas subverticais abertas da
base do basalto. Isto permitiu definir que a cota mais profunda da Este trabalho mostra a importância de, ainda na fase de
escavação das casas de força fosse fixada em cerca de 10 m acima do projeto básico de futuros empreendimentos situados nas bordas
topo do arenito, situação depois confirmada por análises numéricas da Bacia Sedimentar do Paraná, conhecer antecipadamente a
mais precisas realizadas nos correspondentes projetos executivos. posição espacial do contato entre os basaltos da formação Serra
Geral e o arenito Botucatu em relação às cotas previstas de
4.2 VERTEDOUROS
implantação de suas escavações mais profundas – até, eventual
e principalmente, se forem subterrâneas. Algumas usinas
Suas estruturas são unidas às tomadas d’água por muros
implantadas anteriormente em cenário hidrogeológico idêntico
de concreto e foi o caráter relaxado do maciço basáltico o
ao das PCHs Indaiazinho e Indaiá Grande exigiram intenso
responsável geológico por seu posicionamento. Previu-se uma
sistema de poços de rebaixamento ao redor da casa de força,
calha curta em concreto, de modo que o fluxo imediatamente a
por vezes tendo enfrentado até mesmo problemas com erosão
jusante incidisse diretamente sobre o basalto são do leito do rio.
tubular remontante (piping) nas escavações no arenito.
Em Indaiazinho, isto foi feito de forma a que o final da calha
Um bom método para conduzir os dados regionais
resultasse logo a montante da crista da cachoeira, enquanto que
citados [1] à escala local dos projetos é o imageamento (ou
em Indaiá Grande a calha devolvesse a água já a jusante dela.
REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 45
GEOLOGIA DE ENGENHARIA :: PCHs INDAIAZINHO E INDAIÁ GRANDE: UM CASO DE INTERAÇÃO GEOLOGIA - ENGENHARIA NA CONCEPÇÃO DAS OBRAS

Sérgio Solino Ramos


Engenheiro Civil (USP) com especialização em hidráulica (USP,
UFMG e PUC) e gerenciamento de projetos (FGV), com 35
anos de experiência no setor elétrico brasileiro. Sócio-diretor da
HE Consultoria de Engenharia (Belo Horizonte, MG, fundada
em 1996), empresa de projeto e gerenciamento de implantação
de empreendimentos de geração e consultoria em hidráulica.
Engenheiro hidráulico e coordenador de projetos nas empresas
HIDROSERVICE, THEMAG e IESA. Professor de pós-graduação
em administração da FGV- Belo Horizonte desde 2006.

David Prado Pulino


Engenheiro Civil (USP) com especialização em hidráulica, vias
navegáveis interiores, irrigação e pequenas centrais hidrelétricas
(USP), com 37 anos de experiência no setor elétrico brasileiro.
Sócio-diretor da HE Consultoria de Engenharia (Belo Horizonte,
MG, fundada em 1996), empresa de projeto e gerenciamento de
implantação de empreendimentos de geração e consultoria em
hidráulica. Atuou como engenheiro hidráulico e coordenador de
FIGURA 7 - Escavações (acima) e estruturas concluídas (abaixo)
projetos nas empresas CNEC, GH e IESA.

caminhamento) geoelétrico, embora nas usinas aqui citadas


ele não tenha sido aplicado. Seus resultados delimitarão Gustavo Barros Mattos
com boa aproximação o contato basalto-arenito. Assim, as Engenheiro eletricista formado pela Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp) e com especialização MBA CEAG da
sondagens rotativas de detalhe poderão se restringir a essas Fundação Getúlio Vargas – FGV, com 16 anos de experiência no setor
áreas, reduzindo seu custo e prazo de execução, além de de elétrico, especificamente em energia renovável. Co-fundador da
proverem maior segurança técnica aos empreendimentos. Omega Energia, empresa que possui 470MW em empreendimentos
de PCHs e parques eólicos em operação e construção. Atua como
Convém aproveitar parte delas para instalar piezômetros ao Diretor de Desenvolvimento Implantação. Atuou previamente na
nível do contato, onde seja possível preservá-los durante as Siemens, Voith e Guascor.
obras e até após o enchimento do reservatório, permitindo
aferir as premissas de projeto quanto à subpressão atuante nas
estruturas mais suscetíveis ao fenômeno.
Por fim, os dados apresentados neste trabalho sobre a
posição do contato basalto-arenito e seu comportamento
piezométrico poderão servir de balizamento para outros
eventuais projetos hidrelétricos na região.

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] CAMPOS, H. (2000) – “Mapa Hidrogeológico do Aquífero Guarani”,
publica-do pelo Convênio CNPq − Universidade do Vale dos Sinos (Centro de
Ciências Exatas e Tecnológicas).

Zsolt Miklós Gombossy


Desde que se formou no Instituto de Geociências da USP (1974),
ganhou experiência em estudos de inventário e viabilidade,
projetos básicos e executivos − em grandes empresas brasileiras
ENGENHARIA E SUSTENTABILIDADE
FLORIANÓPOLIS, SC
de projeto e consultoria − complementando-a nas obras de
Itaipu e outras. À frente da SZIKLA Geologia de Engenharia WWW.GEOENERGY.COM.BR +55 48 3222.4262
Ltda. desde 1997, agregou a análise crítica de projetos no Brasil
e fora dele, nos aspectos de fundação, escavação e materiais de
construção. Atua na avaliação de riscos geológicos para clientes
variados, visando reduzir prazos e/ou custos.

46 WWW.CBDB.ORG.BR
INSTRUMENTAÇÃO

A IMPORTÂNCIA DOS PÊNDULOS


DIRETOS NA INSTRUMENTAÇÃO
DAS BARRAGENS DE CONCRETO
João Francisco Alves SILVEIRA | Consultor em Instrumentação e Segurança de
Barragens - SBB Engenharia Ltda.

RESUMO ABSTRACT

Procura-se apresentar nesse trabalho as vantagens dos pêndulos In this paper are emphasized the advantages of direct pendulums
diretos na instrumentação das barragens de concreto, sejam elas do in the monitoring of gravity type, buttress or arch concrete dams.
tipo gravidade, contrafortes, gravidade-aliviada ou arco. Por se tratar As an instrument of high precision, mechanical devices and low
de um instrumento de boa precisão, concepção mecânica e baixo cost, it allows the measurement of horizontal dam displacement
custo, o mesmo permite a medição dos deslocamentos horizontais throughout its useful dam life, which is around 50 years. Many
da barragem durante toda sua vida útil - no mínimo 50 anos. Muitas of the Brazilian concrete dams are being monitored with geodetic
das barragens de concreto estão sendo monitoradas com medições measurements, which do not ensure the required accuracy and the
geodésicas, que não asseguram a precisão necessária, e com custo annual measurement budget is much higher than with the use of
anual de medição que suplanta em muito ao dos pêndulos. direct pendulum.
Recomenda-se ao final, após se mostrar as vantagens dos pêndulos It is recommended at the end, after showing the several advantages
sobre as medições geodésicas, que toda barragem de concreto com of pendulums over the geodetic measurement, that all concrete
altura igual ou superior a 40 m seja dotada de pêndulos diretos, o dam with more than 40 m high, would have to be monitored with
que deveria passar a ser uma exigência das novas guias e normas direct pendulum, which recommendation should be included at a
da Agência Nacional de Águas (ANA) e da Agência Nacional de requirement of the new ANA and ANEEL guidelines.
Energia Elétrica (ANEEL).
REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 47
INSTRUMENTAÇÃO :: A IMPORTÂNCIA DOS PÊNDULOS DIRETOS NA INSTRUMENTAÇÃO DAS BARRAGENS DE CONCRETO

1. NO QUE CONSISTE O PÊNDULO 2. COMO PROCEDER A UMA BOA


DIRETO LOCAÇÃO DOS PÊNDULOS

O
Pêndulo Direto (PD) nada mais é que um fio de prumo Os pêndulos diretos devem ser instalados nos “blocos
de precisão instalado entre a crista da barragem e chaves” da barragem, ou seja, nos blocos principais que
sua fundação com um fio de aço e um peso em sua receberão os vários tipos de instrumentos. O Pêndulo Direto
extremidade inferior. O fio deve utilizar um aço inox de alta irá medir os deslocamentos horizontais da crista da barragem
resistência, suportando pelo menos 60 kgf/mm2. O peso é em relação à sua base, sendo importante que esses mesmos
cilíndrico e dotado de aletas, mantido dentro de um tanque “blocos chaves” sejam dotados também de pêndulo invertido,
com óleo para assegurar a rápida estabilização das leituras. ou roseta de extensômetros múltiplos na fundação.
A Figura 1 mostra um Pêndulo Direto instalado no Os pêndulos invertidos devem ser instalados nos blocos
laboratório de concreto da Usina Hidrelétrica (UHE) Itaipu dotados de poços de investigação na fundação, sendo
Binacional. Ela apresenta os vários componentes, tais como o substituídos por rosetas de extensômetros de hastes quando
aparelho de suspensão e fixação do fio, o tanque com o peso e não houver poços de drenagem ou de prospecção. Essa foi a
a base do coordinômetro. Os deslocamentos horizontais do fio técnica utilizada com sucesso na instrumentação da barragem
em relação à parede de concreto da galeria são medidos com principal de Itaipu, assim como nas barragens de Três Irmãos,
um coordinômetro ótico ou eletrônico, segundo as direções Xingó, Itá, dentre outras.
montante/jusante e margem direita/esquerda. O sistema de A Figura 2 apresenta o esquema que tem sido utilizado
coordinômetro eletrônico é confeccionado com micrômetros com sucesso no lugar dos pêndulos invertidos. Ele é feito com
que asseguram a medição de deslocamentos com resolução de uma roseta de extensômetros de hastes. Ressalta-se que para a
0,01 mm, e precisão da ordem de ± 0,05 mm. obtenção dos deslocamentos horizontais há sempre necessidade
de três extensômetros de hastes na roseta, e não de apenas
dois. O emprego de apenas dois extensômetros não permite
a medição do deslocamento horizontal da barragem com a
Aparelho de
fixação do fio precisão necessária. Na Figura 2, a seguir, os deslocamentos
medidos pelos extensômetros são designados de δ1, δ2, δ3,
enquanto R é o deslocamento resultante da barragem. [1]

Base do
coordinômetro

FIGURA 2 - Barragem
gravidade instrumentada
com roseta de
extensômetros no lugar
de pêndulo invertido e
determinação da resultante
FIGURA 1 - Ilustração de um pêndulo com seus vários componentes dos deslocamentos

48 WWW.CBDB.ORG.BR
- Monitorar os deslocamentos “absolutos” dos “blocos chaves” em
relação a um referencial profundo no maciço rochoso de fundação;
- Monitorar os deslocamentos diferenciais entre blocos ao longo
de toda a extensão da barragem.
Com esse arranjo dá para ter um bom controle dos deslocamentos
da barragem (Fig. 3), de modo a assegurar a pronta detecção de
qualquer eventual anomalia, em termos de deslocamento estrutural.
FIGURA 3 – Mais adiante é apresentado o caso do acidente que ocorreu na
Representação dos barragem em arco de Zeuzier, na Suíça, após 20 anos de operação
deslocamentos da estrutura, o qual foi prontamente detectado pelo sistema de
horizontais da pêndulos diretos.
barragem e da
fundação
3. DESLOCAMENTOS HORIZONTAIS
Na fase de elaboração do projeto de instrumentação das MEDIDOS EM BARRAGENS
estruturas de concreto é importante dotar os “blocos chaves”
instrumentados de pêndulos e as juntas de contração entre blocos Os deslocamentos horizontais da barragem, durante o período
de medidores triortogonais de junta. Esses medidores devem ser de enchimento do reservatório e operação, são dependentes dos
instalados em todas as juntas de contração, ao longo da extensão da seguintes fatores:
galeria. Com esse arranjo da instrumentação é possível: - Ação do empuxo hidrostático sobre o paramento de montante,

FIGURA 4 - Deslocamentos horizontais medidos pelo PD em um “bloco chave” da barragem principal de Itaipu

REVISTA BRASILEIRA DE ENGENHARIA DE BARRAGENS 49


INSTRUMENTAÇÃO :: A IMPORTÂNCIA DOS PÊNDULOS DIRETOS NA INSTRUMENTAÇÃO DAS BARRAGENS DE CONCRETO

deformando a fundação; para uma boa definição da elástica da estrutura. Maiores detalhes
- Ação do empuxo hidrostático sobre o paramento de montante, sobre os resultados nos pêndulos na barragem principal de Itaipu
deformando a estrutura de concreto da barragem; poderão ser obtidos nas referências [2] e [3].
- Variação da temperatura ambiente anual sobre o concreto. Verifica-se, no exemplo acima, que mesmo blocos de uma
A ação desses fatores sobre os deslocamentos da barragem barragem com 180 m de altura, como em Itaipu, os deslocamentos
ocorre durante os períodos de enchimento do reservatório e máximos de caráter “elástico” que ocorreram na fase de enchimento
operação. Durante o período operacional se observa deslocamentos do reservatório foram de apenas de 12 mm. Para uma barragem de
da crista da barragem para jusante em função do resfriamento concreto tipo gravidade com 50 m de altura, esses deslocamento
do paramento de jusante no inverno, e, também, a sua volta para são da ordem de 5 mm, apenas. Esses exemplos são relativos às
montante no verão - portanto, com variações cíclicas entre jusante e barragens sobre derrames basálticos. Nota-se, dessa forma, que
montante, conforme mostrado na Fig. 4, para um pêndulo instalado deslocamentos dessa magnitude precisarão ser medidos com
na barragem principal de Itaipu. instrumentos que assegurem uma precisão da ordem de ± 0,1 mm,
Na Figura 4 cabe ressaltar, também, a boa qualidade dos gráficos excepcionalmente de ± 0,5 mm.
de acompanhamento da UHE Itaipu, no qual os deslocamentos Às vésperas do enchimento do reservatório da UHE Cana
horizontais medidos pelo PD são apresentados conjuntamente com Brava, barragem de concreto gravidade com altura máxima da
as variações da temperatura ambiente e níveis de água a montante ordem de 60 m, houve a oportunidade de prestar assessoria na
e a jusante, o que facilita e agiliza a análise dos deslocamentos instrumentação, e opinar sobre a instalação dos Marcos Superficiais
medidos pelos pêndulos. (MS) que estavam previstos sobre a crista da barragem. Foi solicitada,
Na Figura 5 está posta a imagem de uma seção transversal de um então, uma reunião com a equipe de topografia, para saber qual seria
“bloco chave” com 180 m de altura com os deslocamentos horizontais a previsão que se conseguiria com os equipamentos disponíveis na
no sentido montante-jusante, medidos em diferentes alturas da usina, tendo em vista as grandes distâncias envolvidas nas medições
estrutura. O ano de 1984 corresponde ao final do enchimento geodésicas.
do reservatório. Apresentam-se também os deslocamentos Ao serem informados que os deslocamentos medidos teriam
medidos até 1998, após cerca de 14 anos de operação. As bases de que sê-lo com uma precisão da ordem de ± 0,5 mm, pelo menos, a
coordinômetro nesse bloco foram instaladas a cada 25 m de altura, equipe de topografia comunicou que com os equipamentos existentes
na usina a precisão seria de ± 5,0 mm. Constatou-se que somente
alugando equipamentos de alta precisão seria possível conseguir a
exatidão necessária. Em decorrência do alto custo da locação desses
equipamentos, a solução encontrada foi eliminar os Marcos Superficiais
(MS). Passou-se a monitorar os deslocamentos das estruturas usando
apenas os pêndulos diretos, associados aos medidores triortogonais de
junta instalados ao longo da galeria de drenagem.
Tendo por base essa experiência na medição dos deslocamentos
das estruturas de concreto de Cana Brava, é considerável salientar
que, no caso de outras barragens gravidade de dimensões similares,
se fossem realizadas reuniões prévias com a equipe de topografia
para a análise da precisão necessária, muitos dos MS instalados
nessas barragens teriam sido eliminados - o que viria implicar em
economias significativas no custo anual de monitoramento.

4. A IMPORTÂNCIA DOS PÊNDULOS


NA DETECÇÃO DO ACIDENTE COM
A BARRAGEM DE ZEUZIER, NA SUÍÇA

Durante medições de controle dos deslocamentos da crista


FIGURA 5 – Elástica dos deslocamentos horizontais medidos pelo PD da barragem em arco de Zeuzier (Figura 6), na Suíça, com 156 m
em um “bloco chave” da barragem principal de Itaipu de altura máxima, foram observados grandes deslocamentos

50 WWW.CBDB.ORG.BR
em operação e com comportamento absolutamente normal até a
época de escavação do túnel rodoviário nas proximidades.

5. AS GRANDES VANTAGENS DOS


PÊNDULOS DIRETOS EM RELAÇÃO
AOS MARCOS GEODÉSICOS
Destacam-se dentre as grandes vantagens dos pêndulos diretos:
- A precisão dos deslocamentos medidos, geralmente de até
± 0,05 mm;
- A vida útil do instrumento superior a 50 anos, portanto,
compatível com a da barragem ou usina hidrelétrica;
- A boa robustez do instrumento, pois sendo mecânico, é
FIGURA 6 – Vista aérea da região da barragem em arco de Zeuzier
muito resistente, requerendo apenas cuidados no transporte e
para montante, após 19 anos de operação da estrutura. A crista manuseio do aparelho portátil de medição;
começou a se deslocar para montante, apesar do reservatório se - Baixo custo, pois são instrumentos mecânicos que são
encontrar praticamente estabilizado. As medições geodésicas, que se confeccionados em nosso País, sem necessidade de importação.
encontravam interrompidas nesta época, em decorrência do período As medições geodésicas, além de não permitirem a medição
de inverno, foram retomadas assim que houve condições, vindo de deslocamentos com essa precisão, em função das grandes
confirmar as medições realizadas com os pêndulos da barragem (4). distâncias envolvidas, necessitam do emprego de equipamentos
Até o final de 1981 os deslocamentos medidos geodesicamente na de alto custo e de equipes altamente especializadas para se
região da barragem revelaram os seguintes valores (Vide Figura 7) conseguir a medição mínima necessária para as barragens de
- Recalque da barragem ........................................................ 11 cm concreto (± 0,5 mm), o que nem sempre é viável.
- Aproximação entre ombreiras .......................................... 06 cm
- Deslocamento para montante da crista .......................... 11 cm
As investigações que se seguiram vieram mostrar que os recalques
6. PRINCIPAIS CONCLUSÕES
da barragem, assim como a aproximação entre ombreiras, estavam
sendo causados pela escavação de um túnel rodoviário distante Procurou-se nesse trabalho mostrar as grandes vantagens dos
cerca de 3,0 km da barragem, cujas infiltrações estavam provocando pêndulos diretos na medição dos deslocamentos horizontais das
o recalque de uma espessa camada de calcário localizada abaixo da barragens de concreto, particularmente quando associados a
estrutura. pêndulos invertidos (ou rosetas de extensômetros) instalados na
Ressalta-se aqui a importância dos pêndulos diretos na fundação. São instrumentos de alta precisão, boa robustez, baixo
instrumentação das barragens de concreto, pois na de Zeuzier custo e vida útil compatível com a da barragem.
foram os primeiros instrumentos a detectar a ocorrência de Ressalta-se que há cerca de 40 anos acontecia no Brasil projetos
deslocamentos anômalos da crista da estrutura. Deslocamentos de instrumentação de alta qualidade, similar ao padrão empregado
esses que passaram a ocorrer após cerca de 20 anos da barragem nos países mais desenvolvidos. Destacam-se como barragens
que foram muito bem instrumentadas nessa época as de Ilha
Solteira, Água Vermelha, Três Irmãos, São Simão, Paulo Afonso
IV, etc., com “blocos chaves” instrumentados com pêndulos
e extensômetros múltiplos na fundação. Nos últimos anos,
entretanto, tem se observado certo “lapso” na instrumentação
de barragens de concreto em território nacional. Afinal, mesmo
estruturas dotadas de blocos com 60 a 70 m de altura têm sido
deixadas de ser instrumentadas com pêndulos diretos.
FIGURA 7 – Esquema
Conforme mostrado aqui para a UHE Cana Brava, envolvendo
representativo dos
blocos de concreto com cerca de 60 m de altura, as medições
deslocamentos da
geodésicas foram canceladas. Isto porque após reunião com a equipe
barragem

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INSTRUMENTAÇÃO :: A IMPORTÂNCIA DOS PÊNDULOS DIRETOS NA INSTRUMENTAÇÃO DAS BARRAGENS DE CONCRETO

de topografia, ficou constatado que os equipamentos da usina não 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


iriam assegurar a precisão adequada (± 0,5mm), e que o aluguel de
equipamentos de alta precisão ficaria muito oneroso para justificar [1] SILVEIRA, J.F.A., ZNAMENSKY, D. (1976) – “Metodologia Adotada na
a alternativa. Observação do Comportamento das Estruturas de Concreto da Barragem de Água
Vermelha Durante os Períodos Construtivo e Enchimento do Reservatório”, Anais XI
7. RECOMENDAÇÕES Seminário Nacional de Grandes Barragens, Tema III, Rio de Janeiro;
[2] SOUZA LIMA, V.M., SILVEIRA, J.F.A., DEGASPARE, J.C. (1989) – “Nota

Toda barragem de concreto com altura igual ou superior Sobre os Deslocamentos Horizontais na Barragem Principal de Itaipu”, Anais XV

a 40 m deveria ser dotada de pêndulos diretos, nos “blocos Seminário Nacional de Grandes Barragens, Tema III, Rio de Janeiro;

chaves” instrumentados. Isso em decorrência de sua precisão [3] BETIOLI, I., PORTO, E.C., PIASENTIN, C., SILVEIRA, J.F.A., SUCHAROV,

na medição dos deslocamentos horizontais da barragem, M. (1999) – “Comportamento das Estruturas de Concreto da Usina Hidrelétrica de

alertando prontamente sobre qualquer eventual anomalia, Itaipu Após 16 Anos de Operação”, Anais Seminário Nacional de Grandes Barragens,

conforme mostrado aqui com o acidente da barragem de pg. 223 a 234 – Belo Horizonte.

Zeuzier, na Suíça. [4] WASSER ENERGIE (1982) – “Comportement Anormal du Barragem Voûte

Fica aqui a recomendação para que a ANA e a ANEEL de Zeuzier (Suisse)”, Edição Especial para ICOLD, Abril/82.

monitorem com pêndulos diretos toda barragem de concreto


ou usina hidrelétrica com 40 m de altura, ou maior. Para tal,
João Francisco Alves Silveira
a instalação deles deverá ser prevista desde a fase de projeto, Atua na área de Instrumentação e Segurança de Barragens
deixando tubulações verticais entre a galeria de drenagem desde 1973, tendo participado do projeto e análise da
e a crista da barragem. A sua instalação deve ser ao final do instrumentação das Usinas Hidrelétricas de Itaipu, Água
Vermelha, Marimbondo, Três Irmãos, Xingó, Itá, Itapebi,
período construtivo.
Dona Francisca, Jirau e Belo Monte, dentre outras. Autor de
cerca de 120 trabalhos técnicos e de dois livros dedicados
8. PALAVRAS-CHAVE à instrumentação e segurança de barragens. Presidiu a
Comissão Internacional “Ad Hoc Committee on Small Dams”
do ICOLD – International Commission on Large Dams, no
Instrumentação, barragem, medição deslocamento, segurança. período entre 2005 e 2011.

SERVIÇOS NA ÁREA DE
CONSULTORIA GEOTÉCNICA

Elaboração de pareceres técnicos de geotecnia


Estudos e projetos geotécnicos
Inspeção, monitoramento e instrumentação de barragens
Elaboração de Plano de Segurança de Barragens - PSB
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NORMAS EDITORIAIS

1. INTRODUÇÃO
Os trabalhos a serem apresentados ao Conselho Editorial da A página de rosto deve ser limitada a uma única página, ou seja, todas
Revista Brasileira de Engenharia de Barragens do CBDB deverão as informações necessárias devem estar nela contidas (título, nome e
ser inéditos, não tendo sido antes publicados por quaisquer meios. cargo dos autores, Resumo e Abstract).
Apenas profissionais qualificados deverão ser aceitos como autores. 7.1 - Cabeçalho
Profissionais recém-formados ou estagiários poderão ser aceitos, O Cabeçalho, a ser apresentado apenas na página de rosto, está
desde que participem como colaboradores. indicado no exemplo a seguir. A fonte é Arial 10, iniciais em maiúscula
ou versalete (conforme a versão do Word 97 for Windows ou superior).
2. EXTENSÃO DO TRABALHO Na primeira linha deve ser digitado: Comitê Brasileiro de Barragens.
Os trabalhos, para serem aceitos para divulgação, deverão ter no Na segunda linha: Revista Brasileira de Engenharia de Barragens do
máximo dez páginas, incluindo as ilustrações, esquemas e o sumário CBDB.
em português e inglês. Os trabalhos que excederem este número de Na terceira linha: a data; exemplo: 11 de abril de 2013.
páginas serão devolvidos aos autores para sua eventual redução. 7.2 – Título do trabalho
O título do trabalho deve ser digitado em letra maiúscula, negrito e
3. TIPO DE ARQUIVO MAGNÉTICO alinhamento centralizado. Este é o único item do trabalho que recebe
Os trabalhos a serem recebidos pelo Conselho Editorial da Revista negrito.
Brasileira de Engenharia de Barragens do CBDB deverão estar em 7.3 – Autores e coautores
formato Word 97 for Windows ou superior. Não serão recebidos Os nomes dos autores deverão ser apresentados com apenas um
arquivos em separado, isto é, com o texto e as ilustrações em arquivos dos sobrenomes todo em letras maiúsculas. Abaixo do nome de cada
diferentes. As ilustrações deverão ser agrupadas no corpo dos um dos autores deverá ser indicado, com letras maiúsculas iniciais,
trabalhos em formato JPEG. o título profissional (Consultor, Título Universitário, Diretor Técnico,
Coordenador Geral, etc) e ao lado, separado por um traço, a empresa
4. NÚMERO DE AUTORES E COAUTORES ou instituição do autor (ver também item 4).
Os autores e coautores estão limitados a um número máximo de 7.4 – Resumo / Abstract (item sem numeração)
quatro, ou seja, um autor e até três coautores. Os trabalhos com mais Cada trabalho deverá ser iniciado por um resumo em português, não
de quatro participantes serão devolvidos aos autores para atendimento excedendo dez linhas, seguido de um resumo (também de no máximo
a esta diretriz. Caso haja mais colaboradores no trabalho, os mesmos dez linhas) em inglês (Abstract), para permitir seu cadastramento por
poderão ser citados em Agradecimentos (ver item 10). organismos internacionais. Para auxiliar na versão dos resumos para o
inglês, consultar os dicionários técnicos do CBDB/ICOLD disponíveis
5. CONFIGURAÇÃO DE PÁGINA no site www.cbdb.org.br.
A configuração de página deve obedecer a seguinte formatação: Serão devolvidos os trabalhos que não apresentarem adequadamente
Margens: o Resumo e o respectivo Abstract.
- Superior: 2,5 cm; Quando houver necessidade, o Resumo e o Abstract poderão ter
- Inferior : 2,0 cm; mais que dez linhas, desde que caibam na página de rosto e não haja
- Esquerda: 2,5 cm; discordância com os demais itens desta diretriz.
- Direita: 2,5 cm;
- Medianiz: 0 cm. 8. ITEMIZAÇÃO GERAL
A partir da margem: Os itens principais do trabalho deverão ser numerados sequencialmente,
- Cabeçalho: 1,27 cm; com a Introdução recebendo o N° 1 e as Referências Bibliográficas
- Rodapé: 1,27 cm. recebendo o número final. Estes deverão ser digitados com letra
Tamanho do Papel: maiúscula e centralizados na linha, com recuo esquerdo de 0,50 cm.
- A4 (21 x 29,7 cm); Exemplo:
- Largura: 21 cm; 1. INTRODUÇÃO
- Altura: 29,7 cm; Os itens secundários serão alinhados sempre à esquerda, com a
- Orientação: retrato em todo o trabalho. designação sequencial, por exemplo: 2.1, 2.2, 2.3, etc., em minúsculo
com apenas a primeira letra em maiúsculo, usando a formatação em
6. PADRÃO DE LETRAS E ESPAÇAMENTO maiúscula ou versalete, conforme a versão do Word 97 for Windows
Os trabalhos deverão ser digitados em arquivo Word 97 for Windows ou superiror. Caso haja a necessidade de nova itemização, a mesma
ou superior, com as seguintes formatações de fonte: deverá ser, por exemplo: 3.1.1, 3.1.2, 3.1.3, etc., em itálico, com as
Fonte: letras minúsculas e somente a primeira letra maiúscula.
- Arial; Exemplo:
- Tamanho 12 em todo o trabalho. 2.1 Item Secundário
Parágrafo: 2.1.1 Item Terciário
- Espaçamento entre linhas: simples; O primeiro parágrafo, após cada item ou subitem, deverá ser iniciado
- Alinhamento: justificado; uma linha após o título do item (ou subitem), com alinhamento justificado.
- Marcadores como o desta linha (traço) poderão ser utilizados sempre A primeira palavra deverá começar junto à margem esquerda.
que necessário. Entre um parágrafo e outro deverá sempre ser deixada uma linha de
espaçamento, sendo que entre a última linha do último parágrafo e o
7. PÁGINA DE ROSTO item seguinte deverão ser deixadas duas linhas.
Apenas na primeira página deverá constar o Cabeçalho (ver item 7.1).
O título do trabalho deverá ser escrito a 60 mm do topo (configurar 9. CONCLUSÕES
apenas esta página com margem superior de 6 cm), em letra Neste item o(s) autor(es) deverá(ão) apresentar de forma bem sucinta as
maiúscula, em negrito e centralizado na página. Na sequência deverão principais conclusões ou recomendações que resultaram de sua pesquisa,
ser apresentados os nomes dos autores, com os respectivos títulos trabalho ou relato de um determinado evento técnico. (Adaptado das
profissionais e instituição (ver item 7.3). Em seguida, o Resumo e o “Diretrizes para apresentação de trabalhos para seminários, simpósios
Abstract (ver item 7.4). e workshops organizados pelo CBDB” do XXIX Seminário Nacional de

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NORMAS EDITORIAIS

Grandes Barragens (SNGB), Porto de Galinhas, PE, 2013). em cores, sempre que necessário. Caso sejam utilizadas cores
Trabalhos sem uma conclusão final serão devolvidos aos autores para para representar desenhos e figuras, deverá haver convenções de
as devidas complementações. representação que permitam identificações independentes da cor.
As ilustrações poderão ser apresentadas com a orientação retrato ou
10. AGRADECIMENTOS (item opcional) paisagem, ou seja, poderão ser giradas na página de forma a mudar a
A critério do autor, poderão ser apresentados agradecimentos às sua orientação. A configuração da página deve permanecer sempre
empresas e/ou pessoas que contribuíram para a elaboração do orientada como retrato para garantir a posição do rodapé uniforme em
trabalho, sempre após o item Conclusões. todo o documento (ver item 5). Desta forma, o título da ilustração também
permanecerá com a orientação retrato. Não serão aceitos trabalhos com
11. PALAVRAS-CHAVE as ilustrações em separado ou em outro programa que não seja o Word 97
Após os Agradecimentos, deverá ser apresentada uma relação de no for Windows ou superior.
mínimo três e no máximo cinco palavras-chave, para possibilitar a
localização do trabalho em função das mesmas na versão eletrônica 14. TABELAS
dos anais (CD). Caso não haja Agradecimentos, o item Palavras-Chave As tabelas deverão ser incorporadas ao texto, não devendo ser
deverá ser apresentado após o item Conclusões. apresentadas em separado. A tabela deverá ter alinhamento centralizado.
O tamanho da fonte pode ser inferior ao especificado para todo o trabalho
12. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (Arial 12), desde que o conteúdo permaneça legível e a fonte não seja
O item Referências Bibliográficas é o último. Ele encerra o trabalho. inferior a Arial 7. Todas as referidas tabelas deverão ser identificadas pela
Deverá estar posicionado após o item Palavras-chave. O padrão para palavra “TABELA” e numeradas sequencialmente. A palavra “TABELA”,
a apresentação das referências bibliográficas é o mesmo da Comissão sua numeração e título deverão ser apresentados abaixo da mesma e
Internacional das Grandes Barragens (ICOLD), conforme diretrizes a também centralizados. O título das tabelas deverá ser escrito com a
seguir, com exemplo ilustrativo: primeira letra em maiúsculo. A referência a elas no texto do trabalho deve
Todas as referências bibliográficas deverão ser indicadas no texto com ser em minúsculo, apenas com a inicial em maiúscula.
a numeração respectiva; As tabelas poderão ser apresentadas com a orientação retrato ou paisagem,
Todas as referências apresentadas deverão ser numeradas ou seja, poderão ser giradas na página de forma a mudar a sua orientação.
sequencialmente (na ordem em que aparecem no texto) mostrando o A configuração da página deve permanecer sempre orientada
número em destaque e entre colchetes após a citação; como retrato, para garantir a posição do rodapé uniforme em todo
O nome do(s) autor(es) deverá(ão) ser apresentado(s) em letras o documento (ver item 5). Desta forma, o título da tabela também
maiúsculas, com o sobrenome por extenso, seguido das iniciais do permanecerá com a orientação retrato.
primeiro nome e dos nomes intermediários, separadas por ponto;
Na sequência, deverá ser indicado, entre parênteses, o ano de 15. SIMBOLOGIA E FÓRMULAS
publicação dos anais ou do livro consultado, com hífen ao final; Todas as grandezas físicas deverão ser expressas em unidades do
Na sequência, indicar entre aspas o título do trabalho ou do livro Sistema Métrico Internacional. As equações e fórmulas devem ser
consultado, com apenas a primeira letra maiúscula e com vírgula ao localizadas à esquerda e numeradas, entre parênteses, junto ao
final; limite direito na mesma linha, deixando uma linha em branco entre
Indicar na sequência os anais em que o trabalho foi apresentado, as equações/fórmulas e o texto. Todos os parâmetros das equações
seguido do tema, volume dos anais e país ou cidade em que o mesmo e fórmulas deverão ser indicados com suas respectivas unidades.
foi realizado. A referência a elas no texto do trabalho deve ser com a palavra
Exemplo: “Equação” ou “Fórmula” e o respectivo número ao lado, ou seja, em
O texto deverá estar com alinhamento justificado e recuo especial com minúsculo, apenas com a inicial em maiúscula.
deslocamento de 1,00 cm (Formatar Parágrafo).
Exemplo: 16. TEMÁRIO / CONTRIBUIÇÕES
[1] DUNNICLIFF, J. (1989) – “Geotechnical Instrumentation for Field O tema deverá ser indicado pelo autor, quando do encaminhamento
Performance”, livro editado pela John Wiley & Sons, Inc., New York; do trabalho ao Conselho Editorial da Revista Brasileira de Engenharia
[2] HOWLEY, I., McGRATH, S. e STEAWRT, D. (2000) – “A Business de Barragens do CBDB.
Risk Approach to PrioritizingDam Safety Upgrading Decisions”, Anais Caso o Conselho Editorial não concorde com o assunto selecionado
Congresso Internacional ICOLD, Beijing, Q.76 – R.17; pelo autor, este poderá ser eventualmente deslocado para outro tópico.
[3] SILVEIRA, J.F.A. (2003) – “A Medição do Coeficiente de Poisson em Se o trabalho não se encaixar em nenhum dos temas selecionados
uma de Nossas Barragens”, Anais XXV Seminário Nacional de Grandes para o evento mas apresentar bom nível ténico, poderá ser publicado
Barragens – CBDB, Salvador, BA. como Contribuição Técnica.

13. ILUSTRAÇÕES 17. LÍNGUA


As eventuais ilustrações dos trabalhos técnicos, sejam elas figuras, Todos os trabalhos a serem publicados na Revista Brasileira de
gráficos, desenhos ou fotos, deverão estar sempre incorporadas ao Engenharia de Barragens do CBDB deverão ser elaborados em língua
texto, não devendo ser apresentadas em separado. Ao formatar a portuguesa, assim como todas as ilustrações que o acompanham
figura, o layout deve ter a disposição do texto alinhada e o texto deve deverão conter legenda também em português. Apenas os trabalhos
estar com o alinhamento centralizado. Todas as referidas ilustrações citados como referências bibliográficas deverão estar na língua original
deverão ser identificadas pela palavra “FIGURA” e numeradas em que os mesmos foram elaborados.
sequencialmente. A palavra “FIGURA”, sua numeração e título deverão Os trabalhos eventualmente recebidos pelo Conselho Editorial em
ser apresentados imediatamente abaixo das respectivas ilustrações, outro idioma (que não seja o acima mencionado) serão encaminhados
também com o alinhamento centralizado. O título de cada figura de volta aos autores para sua tradução para o português.
deverá ser escrito com a primeira letra em maiúsculo. A referência a
elas no texto do trabalho deve ser em minúsculo, apenas com a inicial 18. LICENÇA PARA PUBLICAÇÃO DOS TRABALHOS
em maiúscula. Para que o trabalho seja aceito é necessário que um dos autores envie
As fotos ou outras ilustrações quaisquer poderão ser apresentadas autorização devidamente preenchida e assinada.

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