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Formação docente: ciência, técnica e arte

Ana Carolina Aleixo de Souza*

Resumo

O presente trabalho visa abordar a formação docente enquanto ciência, técnica e arte, priorizando a
subjetividade tanto do professor quanto do seu alunado. Diante de tantas mudanças ocorrendo a
cada instante, faz-se necessário voltarmos nossa atenção a formação do educador. Não mais
tratando a escola como aquela que será a responsável pela revolução na sociedade, mas como um
espaço de crescimento, será destacada ainda a importância da Ciência Psicológica tanto para a
formação docente quanto para a sua prática profissional. Trataremos ainda da licenciatura e de suas
disciplinas pedagógicas Além do conhecimento adquirido, é apresentado como requisito parcial
para obteção de nota na disciplina Práticas de Ensino, ministrata pela professora Maria Helena
Lima.

Palavras-chave: Formação; docência; educação; psicologia; licenciatura.

Atualmente, nos mais variados contextos da sociedade, é possível observar uma


forte pressão para a ocorrência de mudanças. Alonso (1999) afirma estarmos passando por
um momento marcado por instabilidades, em que os fenômenos acontecem e se
transformam a cada instante, gerando certo grau de insegurança e incerteza. Os avanços
tecnológicos, a globalização da economia, os processos de desumanização observados no
mundo todo (SANTOS NETO, 2002), têm levado ao que Furlanetto (2002) se refere como
"um tempo de crise", tendo em vista que, diante de tantas mudanças e reformulações, fica
cada vez mais claro que nossos sistemas educacionais não atendem de maneira singular as
necessidades dos alunos e da sociedade.

Acredita-se que o momento é de "crise" porque durante muito tempo pensou-se a


escola como a esperança de uma revolução na sociedade brasileira e, vendo agora que ela
não está conseguindo acompanhar tantas mudanças, os profissionais da educação precisam
a cada dia, com cada prática, encontrar mecanismos para sanar as necessidades surgidas a

*
Bacharel em Psicologia graduada pela Universidade da Amazônia em 2007, aluna do último ano
para a Formação Específica de Psicólogo e do último semestre da Licenciatura Plena em Psicologia
na mesma Instituição de Ensino.
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partir das demandas emergentes. Neves (2008) acrescenta dizendo que não somente na
prática docente, mas também em outros exercícios profissionais, diante de situações
conflitantes ou ainda desafiantes, por vezes a aplicação de técnicas convencionais já não é
o suficiente. A autora destaca que não se trata de descartar as técnicas na prática docente,
mas afirma que em alguns momentos o professor se deparará com situações pouco ou
ainda não tratadas na literatura e, portanto, não terá como guiar-se somente por critérios
técnicos pré-estabelecidos, tornando-se necessário valer-se de estratégias criativas, não
planejadas, para resolver "problemas" do dia-a-dia.

Para tanto, é importante que a formação do professor não fique presa somente à
lógica da racionalidade técnica, mas que seja também conduzida por um caminho que leve
ao desenvolvimento de um pensamento crítico e uma práxis reflexiva. Segundo Schön
(1997), a formação docente deve combinar ciência, técnica e arte. Diante disto, talvez seja
este o melhor momento para direcionarmos a atenção ao processo formativo dos
professores. Se pouco pode ser feito para ocorrerem mudanças substanciais na escola, faz-
se necessário acreditar que ao menos a formação docente qualificada poderá alterar
determinados quadros do atual cenário (MONTEIRO; SPELLER, 2008).

A partir desta visão, o professor torna-se um dos principais agentes de mudança


dentro da escola, para que esta instituição possa acompanhar o cenário transitório da
sociedade como um todo. Assim, é quase impossível falar em qualidade de ensino sem
tratar da formação teórico-prática daqueles que se caracterizam como os facilitadores do
processo de ensino-aprendizagem (NEVES, 2008).

Segundo Abramowicz (2002), tratar da formação implica pensar no processo por


meio do qual o professor é convidado a estudar, refletir e debater, discutindo e desvelando
as teorias que sustentam sua prática, buscando, se necessário, transformá-las. Alguns
estudos acerca da formação destacam a integração entre a prática e a teoria, entre o lugar
de aprender e o lugar de fazer, remetendo ao fato de ser necessário criar condições para
que se produza uma relação entre "saber fazer" e "poder fazer".

Neste contexto, o docente é um agente participante do processo, alicerçando seu


conhecimento e se constituindo em sujeito de sua prática. Neste momento, caracteriza-se o
professor não somente como um ser profissional, mas, com um pano de fundo crítico-
humanista, ele passa a ser também considerado um ser relacional, levando em consideração
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a sua condição existencial, sua especificidade pessoal, histórica e social (ABRAMOWICZ,


2002).

Santos Neto (2002, p. 44) fala em "aspectos humanos da formação docente"


referindo-se aos "elementos que são próprios da natureza humana e que dizem respeito à
interioridade, à intersubjetividade de cada ser humano", cabendo aqui destacar alguns
aspectos que, embora escapem ao controle absoluto da racionalidade técnica, política e
profissional, articulam-se com eles. São, portanto:

(...) identidade, projetos pessoais, representações, vida emocional,


intersubjetividade, consciência corporal, autoconceito, espiritualidade,
sensibilidade ao ouvir o outro, capacidade de disciplina pessoal,
generosidade, constância, compromisso pessoal com utopias.

Acredita-se que a atenção dada a estes aspectos, que compõem o que se


convencionou denominar "fator humano", constituirá o diferencial para a formação docente
(ABRAMOWICZ, 2002). Isto é, precisamos colocar no foco de nossas reflexões a
condição existencial do professor que vibra, que luta, que trabalha, que sofre e se frustra e
que, também assim, se constrói como sujeito no mundo, considerando os mais variados
papéis que assume dentro da sociedade (homem, mulher, pai, mãe, esposa, marido, filho,
estudante, professor, cidadão).

Sobre isso, Nóvoa (1995 apud SANTOS NETO, 2002, p. 44) afirma:

Hoje sabemos que não é possível separar o eu pessoal do eu profissional,


sobretudo numa profissão impregnada de valores e ideais e muito
exigente do ponto de vista do empenhamento e da relação humana.
Houve um tempo em que a possibilidade de estudar o ensino, para além
da subjetividade do professor, foi considerada um sucesso científico e um
passo essencial em direção a uma ciência da educação. Mas as utopias
racionalistas não conseguiram pôr entre parênteses a especificidade
irredutível da ação de cada professor, numa óbvia relação com as
características pessoais e com as suas vivências profissionais como
escreve Jennifer Nias: "O professor é a pessoa; e uma parte importante da
pessoa é o professor".

Acredita-se que, a partir do momento que o professor é visto como um ser social e
relacional, a probabilidade de que ele também veja seu aluno desta maneira passa a ser
maior. Neste caso, podemos ressaltar a importância da Psicologia para a formação docente,
por ser esta a Ciência que estuda o comportamento humano e as relações estabelecidas com
o outro nos mais variados contextos a que este sujeito está inserido.
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Adentrando na formação de licenciados, tema a que este estudo se propõe abordar,


pode-se dizer que as instituições de Ensino Superior organizam suas grades dividindo-as
em disciplinas específicas da área de origem e disciplinas denominadas pedagógicas.
Dentre estas, tradicionalmente, a Psicologia Educacional tem composto a grade por ser
uma disciplina acadêmica, cujo campo de pesquisas mantém relações estreitas com a
prática educacional (GUIMARÃES; BZUNECK; SANCHES, 2002).

Compreender os fatores relacionados ao envolvimento dos estudantes com a


aprendizagem escolar é uma tarefa considerada complexa, tendo em vista a pluralidade dos
elementos presentes na situação (GUIMARÃES; BZUNECK; SANCHES, 2002). A partir
do momento que os educadores se permitem compreender o envolvimento individual do
seu alunado, observando como fatores internos e situacionais influenciam diretamente na
motivação, este professor é capaz então de criar e desenvolver estratégias de envolvimento
em sala de aula.

Atualmente, pesquisas têm sido feitas como um esforço para a identificação das
condições dos contextos sociais que promovem ou prejudicam as potencialidades humanas,
tanto no aspecto teórico-prático, ampliando o conhecimento formal; quanto para
proporcionar ambientes sociais favoráveis ao crescimento e desenvolvimento dos
indivíduos (GUIMARÃES; BZUNECK; SANCHES, 2002).

No entanto, esta realidade que pode ser encarada como um atrativo para alguns, na
maioria das vezes passa despercebida por muitos. São muitas as instituições superiores que
oferecem os cursos de licenciatura, mas o número de alunos que procura por esta formação
ainda é pouco significativo. Guimarães; Bzuneck; Sanches (2002) acreditam que a
desvalorização das licenciaturas pode estar presente nas percepções dos alunos em relação
às disciplinas pedagógicas. Os autores acreditam ainda que empregar determinado grau de
esforço nessas disciplinas pode representar para os alunos um empenho acima das
expectativas culturalmente vivas em nosso meio.

O que se tem, portanto, é uma enorme necessidade de apresentar a proposta


pedagógica aos alunos de cursos superiores, discutindo sobre cada uma das disciplinas que
compõem a grade e convidando-os a construir a sociedade a partir de uma educação mais
qualificada.
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CONCLUSÃO

Em muitos momentos, mas, principalmente, no início de cada semestre, me


perguntava de onde surgira o interesse pela licenciatura. Já formada como Bacharel em
Psicologia, por que me propor a cursar mais três disciplinas além daqueles ditas
"obrigatórias" para a Formação como Psicóloga?

Ao longo da construção deste trabalho, refletindo acerca da formação docente,


consegui compreender este interesse tão vivo pela docência. Talvez eu nunca tivesse
realmente percebido a proximidade entre o fazer pedagógico e o fazer psicológico. Na
clínica psicológica, damos suporte para que o cliente trilhe seu caminho, identificando suas
potencialidades e re-significando suas limitações; nós, psicólogos, damos apenas o suporte.
Aprendemos com o cliente e ele aprende conosco. Muitas vezes indicamos o caminho e ele
nos mostra uma outra maneira de ver o mundo. Caminhamos juntos em busca do
conhecimento...

E já aí percebo as semelhanças entre Psicologia e Pedagogia. Em sala de aula,


enquanto professores, disponibilizamos as ferramentas necessárias para que os alunos
encontrem suas respostas. Damos apoio e precisamos validar o que é dito por eles,
compreendendo suas potencialidades, suas motivações, seus interesses, suas frustrações.
Nem sempre teremos respostas e poderemos, sim, encontrá-las junto ao grupo, trocando a
idéia de fraqueza ou incompetência pela sinceridade de admitir que esta resposta não temos
mas poderemos pesquisar e garantir mais este aprendizado juntos. Enxergando o aluno
como ser humano, podemos até mesmo parafrasear Jennifer Nias dizendo: "O aluno é a
pessoa; e uma parte importante da pessoa é o aluno". Caminhamos juntos em busca do
conhecimento...

Além de tantas semelhanças, a produção deste artigo possibilitou a identificação de


deficiências quanto à formação de licenciados. No contexto acadêmico muito se fala em
interdisciplinaridade, mas pouco se vive esta proposta. Mais especificamente sobre a
Licenciatura Plena em Psicologia, as incertezas sempre foram muito presentes quanto as
disciplinas que deveríamos cursar e o objetivo de cada uma delas dentro da nossa
formação. Observou-se a ausência da fomentação de práticas pedagógicas partidas do
Centro de Psicologia direcionadas ao seu alunado. Poucas foram as tentativas de
esclarecimento quanto ao processo de licenciatura e como este processo se daria. Outro
ponto diz respeito à algumas disciplinas cursadas nos primeiros quatro anos do curso de
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Psicologia que são comuns para a formação de licenciados, apesar de não haver sido dito
aos alunos.

Diante disto, acredita-se que o Centro de Psicologia e sua coordenação poderia


imprimir maiores esforços quanto à promoção e o fortalecimento de práticas pedagógicas.
As ditas disciplinas pedagógicas poderiam ser apresentadas e discutidas com os alunos, de
maneira mais clara e viva durante todo o período acadêmico, a fim de, com o
conhecimento de todo o processo, aumentar a possibilidade de interesse pela formação
docente.

Por fim, os Centros responsáveis pelos cursos de Psicologia e Pedagogia poderiam


viabilizar formas de gerar integração não somente entre os cursos, a partir da Grade
Curricular de cada um, mas, principalmente, entre os alunos, para que compreendem
mutuamente a importância dos Psicólogos e dos Pedagogos, não somente dentro de sala de
aula ou da Escola, mas da importância destes exercícios profissionais para a Sociedade.

REFERÊNCIAS

ABRAMOWICZ, M. Avaliação do desempenho e formação docente: desafios, rupturas e


possibilidades. In.: FAZENDA, I. C. A.; SEVERINO, A. J. (orgs.). Formação docente:
rupturas e possibilidades. São Paulo: Papirus, 2002. p. 83-91.

ALONSO, M. Formar professores para uma nova escola. In.: ALONSO, M. (org.). O
trabalho docente: teoria e prática. São Paulo: Pioneira, 1999. p. 9-18.

FURLANETTO, E. C. A formação de professores: aspectos simbólicos de uma pesquisa


interdisciplinar. In.: FAZENDA, I. C. A.; SEVERINO, A. J. (orgs.). Formação docente:
rupturas e possibilidades. São Paulo: Papirus, 2002. p. 69-82.

MONTEIRO, S. B.; SPELLER, P. Formação docente e as questões da pós-


modernidade. In.: Universidade Federal de Mato Grosso. Disponível em: < http://www.
ufmt.br/revista/arquivo/rev13/form_docente_e_as_quest.html>. Acesso em 19/MAI/2008.

NEVES, L. O. R. O professor, sua educação e sua prática. In.: Centro de Referência


Educacional: consultoria e assessoria em educação. Disponível em: <http://www.
centrorefeducacional.com.br/profprat.htm>. Acesso em 19/MAI/2008.
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SANTOS NETO, E. Aspectos humanos da competência docente: problemas e desafios


para a formação de professores. In.: FAZENDA, I. C. A.; SEVERINO, A. J. (orgs.).
Formação docente: rupturas e possibilidades. São Paulo: Papirus, 2002. p. 41-51.

S. E. R. GUIMARÃES; J. A. BZUNECK; S. F. SANCHES. Psicologia educacional nos


cursos de licenciatura: a motivação dos estudantes. Psicologia educacional e escolar.
v.6 n.1 Campinas jun. 2002. Disponível em: <http://scielo.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=
sci_arttext&pid=S1413-85572002000100002>. Acesso em 19/MAI/2008.

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